Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
4129/19.3T8FNC.L1.S1
Nº Convencional: 2.ª SECÇÃO (CÍVEL)
Relator: MARIA DA GRAÇA TRIGO
Descritores: RECURSO DE REVISTA
ADMISSIBILIDADE DE RECURSO
COMPETÊNCIA MATERIAL
TRIBUNAL COMPETENTE
TRIBUNAL DO TRABALHO
TRIBUNAL CÍVEL
ASSOCIAÇÃO
ASSOCIAÇÃO PATRONAL
DELIBERAÇÃO DA ASSEMBLEIA GERAL
Data do Acordão: 01/28/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA
Indicações Eventuais: TRANSITADO EM JULGADO
Sumário : I. Estando em causa a questão da alegada violação de regras relativas à competência em razão da matéria, o presente recurso é admissível ao abrigo do art. 629.º, n.º 2, al. a), do CPC, circunscrito, porém, e de acordo com a jurisprudência consolidada do STJ, à apreciação de tal questão.

II. Na interpretação e aplicação do art. 126.º, n.º 1, al. r) da LOSJ, não oferece dúvida a qualificação da entidade ré como “associação de empregadores” em face das respectivas competências elencadas no artigo quatro dos estatutos e, especificamente, da competência para negociar e outorgar convenções colectivas de trabalho.

III. Quanto ao elemento objectivo de tal norma, considerando-se que o conhecimento das pretensões do autor pressupõe necessariamente o controle da legalidade das deliberações associativas e que o pedido de que seja ordenada a execução de tais deliberações implica ou pode implicar o controlo da legalidade do funcionamento da associação ré, entende-se que a competência material para apreciar a presente acção cabe ao tribunal de trabalho.

Decisão Texto Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça



1. AA. intentou acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra AITRAM - Associação dos Industriais de Táxi da Região Autónoma da Madeira e BB., pedindo a condenação de ambos ou do R. que vier a ser considerado para o efeito, em função da prova produzida, requerendo:

a) A declaração de validade e eficácia das deliberações adoptadas na Assembleia Geral Extraordinária da AITRAM, de 18 de abril de 2018, constantes da Acta junta à petição inicial (cfr. doc.6);

b) O cumprimento integral das deliberações adoptadas na Assembleia Geral Extraordinária, de 18 de abril de 2018 da AITRAM, constantes da Acta junta à petição inicial, dando execução a todas as suas determinações (cfr. doc. 6);

c) Em consequência, deve ser ordenada a execução de tais deliberações, em cumprimento das quais deverá ser condenado o R. BB., na qualidade de Presidente da Direcção:

(i) A formalizar o mandato emitido pela Assembleia Geral a favor do Presidente da Mesa, através da outorga de instrumento notarial, nos termos do qual deverá transferir, a favor do A., os poderes de representação (cfr. artigo 19.º dos Estatutos) e os poderes de vinculação da AITRAM (cfr. artigo 21.º dos Estatutos) para que, em nome da mesma, possa outorgar a escritura pública de alteração dos respectivos Estatutos,

(ii) Ou a outorgar, em representação da AITRAM, a necessária escritura pública destinada à alteração dos Estatutos, nos termos e condições consignados nas deliberações da Assembleia Geral Extraordinária da AITRAM, constantes da Acta de 18.04.2018 (cfr. artigo 21.º, n.º 1 dos Estatutos), conforme lhe impõe a alínea d), do artigo 18.º dos Estatutos;

e) Em qualquer dos casos, a condenação do R. BB. no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória de multa em valor nunca inferior a €100,00 (cem euros) por cada dia de atraso, na concretização das deliberações tomadas em Assembleia Geral da AITRAM de 18.04.2018.

Para o efeito alegou, em síntese, que é Presidente da Mesa da Assembleia Geral e associado da AITRAM; o 2.º R. é Associado da AITRAM, sendo Presidente da Direcção da AITRAM; em 18.04.2018 teve lugar Reunião Geral Extraordinária de Sócios da AITRAM, na qual foram aprovadas propostas de alteração aos Estatutos da AITRAM; o R. BB., enquanto Presidente da Direcção da Assembleia, recusa-se a cumprir e a formalizar o mandato emitido pelos associados reunidos em Assembleia Geral a favor do A., enquanto Presidente da Mesa da Assembleia, através de instrumento notarial para a transferência dos poderes de representação e de vinculação, para que, em nome da AITRAM, o A. possa outorgar a escritura pública de alteração dos respectivos Estatutos, bem como se recusa a marcar e a outorgar na qualidade de Presidente de Direcção e em representação da AITRAM, a mencionada escritura pública destinada a alteração dos Estatutos nos termos e condições consignados nas deliberações constantes da Acta da Assembleia Geral Extraordinária de 18.04.2018.

Os RR. apresentaram contestação, tendo, além do mais, excepcionado a incompetência material do juízo local cível onde o processo foi instaurado, por ser da competência dos juízos de trabalho, bem como arguido as excepções de ilegitimidade do A. e de ineptidão da petição inicial.

Terminam pugnando pela improcedência da acção.

Por despacho de 12.12.2019 foi ordenada a notificação das partes para se pronunciarem quanto à arguida incompetência material do juízo local cível.

O A. defendeu a competência material do tribunal.

Os RR. pugnaram pela incompetência material.

Em 21 de Janeiro de 2020 foi proferida decisão que julgou o tribunal materialmente incompetente para apreciar a causa e, em consequência, absolveu os RR. da instância, «ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 65.º, 96.º, al. a), 97.º, 99.º, n.º 1, 278.º, n.º 1 al. a), 576.º, n.º 1 e 2, 577.º al. a), 578.º e 590.º, n.º 1 al. a) e n.º 3 todos do Código de Processo Civil».

Inconformado com esta decisão, o A. interpôs recurso para o Tribunal da Relação … .

Por acórdão de 10 de Setembro de 2020, foi proferida a seguinte decisão:

«Pelo exposto, julga-se procedente o recurso, e consequentemente, decide-se revogar a decisão recorrida, ordenando-se a sua substituição por outra que, julgando o tribunal materialmente competente, determine o prosseguimento da acção, se a tanto nada mais obstar.»


2. Vem BB., por si e na qualidade de Presidente da AITRAM, interpor recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, formulando as seguintes conclusões:

«i. Vem douto Acórdão do Tribunal da Relação, proferido nos autos à margem referenciados, considerar improcedente a sentença da 1.ª instância, declarando competente o Juízo Cível para aferir a questão in contendo, entendendo que, a decisão, nada contente com as competências do Juízo de Trabalho, ora entende-se, com o devido respeito, o contrário.

ii. Na verdade, qualquer situação tendente a publicação, alteração, efetivação/cumprimento dessas mesmas deliberações, e ou outros, referente aos Estatutos da AITRAM, é matéria que é regulada pelo Código de Trabalho, sendo, portanto competente os Juízos de Trabalho.

iii. Pelo que, a competência material para aferir a questão, in contendo, é, pois, do Juízo de Trabalho, ao abrigo do artigo 126.º n.º 1 alínea R) da Lei de Organização do Sistema Judiciário.

iv. Por outro, acresce que, o AA., requerente dos presentes autos, perdeu a sua qualidade de associado, ao abrigo do artigo 9. n.º 1 alínea d) dos Estatutos, conforme ata n.º …../2019 da reunião mensal da AITRAM, junta aos autos a 19 de março de 2020, ref. …...

v. Pelo que, fez o Tribunal da Relação uma errada interpretação das normas aplicáveis.»

Termina pedindo que se revogue a decisão e se substitua por outra que declare a competência do juízo de trabalho para apreciar a questão, bem assim requerendo o conhecimento da ilegitimidade do A. para intervir na presente acção, atendendo à perda da sua qualidade de associado.

O Recorrido contra-alegou, concluindo nos termos seguintes:

«1. A única questão a resolver, através do presente Recurso, restringe-se a saber se é ao Tribunal "a quo" que compete a apreciação da matéria a que os presentes autos respeitam, ou se, ao invés, essa competência deve ter-se como atribuída, como se entendeu na Ia Instância, ao Juízo do Trabalho;

2. Depois de proferida uma Decisão em primeira instância não pode ser apreciada, em sede de Recurso Jurisdicional qualquer questão nova, como sucede com a alegada questão suscitada pelo Recorrente de ilegitimidade ativa do Autor/Recorrido decorrente da alegada perda da qualidade de associado da AITRAM por parte do Autor/ Recorrido;

3. Ainda assim sempre se dirá que, à data da interposição da presente Ação de Condenação no Cumprimento Integral das Deliberações adotadas em Assembleia Extraordinária da AITRAM em 02.09.2019, o Autor/Recorrido era inquestionavelmente Associado da Associação, sendo a alegada expulsão promovida pelo Réu/Recorrente BB., posterior porque de 03.12.2019, conforme melhor resulta daquela ATA que junta às respetivas Motivações;

4. De qualquer forma, tal questão constitui uma questão nova, em relação a qual deverá o Supremo Tribunal de Justiça declarar-se impedido de conhecer, como bem sabe ou tinha obrigação de saber o Recorrente;

5. Considerando que a presente ação visa obrigar/compelir os Réus/Recorrentes ao cumprimento das deliberações traduzidas em alterações aos estatutos da AITRAM, os quais permitirão que tais deliberações se tornem eficazes, designadamente mediante a celebração de escritura pública ou outorga de mandato para o efeito;

6. Pois que, o Autor/recorrido não visa a declaração de nulidade daquelas deliberações, nem a impugnação dos Estatutos da AITRAM;

7. Pelo facto da apreciação judicial da validade/legalidade das deliberações, objeto da presente ação judicial, ter sido já efetuada, declarada e confirmada, em sede de Recurso, por Acórdão do Douto Tribunal da Relação …, transitado em julgado a 11.07.2019, conforme melhor resulta da respetiva certidão junta via CITIUS Ref …….. a 21.10.2019 constante nos autos de Fls... proferido no âmbito do procedimento cautelar de suspensão 'de tais deliberações da AITRAM n.° 2420/18…, que correu os seus termos no ...º Juízo Local Cível do Tribunal Judicial …;

8. Aliás, tal processo judicial n.° 2420/18…….. teve origem na ação judicial instaurada por este mesmo Réu, BB., no Juizo Civel Local …. contra  a  AITRAM  e  contra  o  aqui Autor/Recorrido, através da qual o Recorrente impugnou, mas sucumbiu no Recurso, a validade e legalidades das deliberações da Associação que o Autor pretende concretizar através dos presentes autos.

9. Salvo melhor opinião, entendem os aqui Autores/Recorridos que, a concretização/cumprimento das deliberações tomadas por aquela Assembleia Geral da AITRAM é matéria que não integra as ações reguladas nos artigos 162.° e seguintes, nomeadamente 164.° e 164-A do CPT, já que não se pode entender como englobada no "controlo da legalidade da constituição, do funcionamento e dos estatutos", que aí se consigna;

10. Para além de que, o Recorrente não consegue vislumbrar em que é que a sujeição das associações patronais ao regime jurídico das associações - no que nele existe de imperativo - pode contender com os princípios da liberdade de associação e da sua gestão democrática;

11. Razão pela qual deverá ser mantida a competência ao tribunal "a quo" para a apreciação da matéria a que os presentes autos respeitam.»


3. Estando em causa a questão da alegada violação de regra relativa à competência em razão da matéria, o presente recurso é admissível ao abrigo do art. 629.º, n.º 2, alínea a), do Código de Processo Civil circunscrito, porém, e de acordo com a jurisprudência consolidada deste Supremo Tribunal [cfr., exemplificativamente, os acórdãos de 08/11/2018 (proc. n.º 478/08.4TBASL.E1.S1), de 17/10/2019 (proc. n.º 873/16.5T8VCT.G1.S1) e de 11.11.2020 (proc. n.º 214.17.4T8MNC.G1.S1), disponíveis em www.dgsi.pt], à apreciação de tal questão. Assim, e independentemente de mais considerações, não se conhecerá da questão da alegada ilegitimidade activa.

4. Com relevo para apreciação da questão da competência material, encontra-se provado o que consta do relatório supra.

5. Está em causa a interpretação da alínea r) do n.º 1 do art. 126.º da Lei da Orgânica do Sistema Judiciário (Lei n.º 62/2013, de 26 de Agosto).

Sob a epígrafe “Competência cível”, prescreve aquele preceito o seguinte:

«1 - Compete aos juízos do trabalho conhecer, em matéria cível:

(...)

r) De todas questões relativas ao controlo da legalidade da constituição, dos estatutos e respetivas alterações, do funcionamento e da extinção das associações sindicais, associações de empregadores e comissões de trabalhadores;

(...)»

No que se refere à natureza da entidade ré na presente acção, a AITRAM - Associação dos Industriais de Táxi da Região Autónoma da Madeira, cujos estatutos se encontram publicados na secção de Relações de Trabalho do Jornal Oficial da Região Autónoma da Madeira, IIIª Série, n.º 3, de 03.02.2014, não oferece dúvida a sua qualificação como “associação de empregadores”, em face das respectivas competências elencadas no artigo quatro dos Estatutos e, especificamente, da competência para “Negociar e outorgar convenções coletivas de trabalho, acordos, contratos e protocolos nos termos da lei e dos presentes estatutos”.

Estando abrangida pelo elemento subjectivo da previsão da alínea r) do n.º 1 do art. 126.º da LOSJ, falta apurar se a presente lide se encontra também abrangida pelo elemento objectivo de tal previsão.

As instâncias divergiram a este respeito.

No sentido de as pretensões da presente acção estarem incluídas no referido preceito, pelo que a competência para delas conhecer cabe ao tribunal de trabalho, pronunciou-se a 1.ª instância com a seguinte fundamentação:

«Nos termos do artigo 126.º n.º 1, alínea r) da Lei n.º 62/2013, de 26 de Agosto, e que aprova a LEI DA ORGANIZAÇÃO DO SISTEMA JUDICIÁRIO (LOSJ), compete aos juízos do trabalho conhecer, em matéria cível de todas questões relativas ao controlo da legalidade da constituição, dos estatutos e respetivas alterações, do funcionamento e da extinção das associações sindicais, associações de empregadores e comissões de trabalhadores". (sublinhado nosso).

A este respeito, regula presentemente o artigo 440.º a 456.º do Código de Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro, e suas alterações, na parte referente ao Direito coletivo, título III, Secção III denominada "Associação sindicais e associações de empregadores", adjetivado no artigo 162.º e seguintes do Código de Processo de trabalho, CAPÍTULO IV - Processo do contencioso de instituições de previdência, abono de família, associações sindicais, associações de empregadores ou comissões de trabalhadores.

Ora, face à causa de pedir e aos vários pedidos formulados, bem como o supra referido, resulta à saciedade que a matéria em apreço é da competência (material) do tribunal do Trabalho, impondo-se concluir que o Tribunal cível não é materialmente competente, para preparar e julgar a presente ação.

Pelo exposto, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 65.º, 96.º, al. a), 97.º, 99.º, n.º 1, 278.º, n.º 1 al. a), 576.º, n.º 1 e 2, 577.º al. a), 578.º e 590.º, n.º 1 al. a) e n.º 3 todos do Código de Processo Civil, julgo o presente tribunal materialmente incompetente para apreciação da causa e, em consequência, absolvo os Réus da instância.» [negrito nosso]

A Relação revogou a decisão da 1.ª instância, reapreciando a questão da aplicação da norma legal em causa nos termos seguintes:

«A competência determina-se em função da ação proposta, tanto na vertente objetiva - atinente ao pedido e à causa de pedir -, como na vertente subjetiva - respeitante às partes -, importando essencialmente para o caso ter em consideração a relação jurídica invocada.

O Tribunal recorrido considerou que a competência cabia ao Juízo do Trabalho, por força do disposto no art. 126.°, n.° 1, alíneas r) da Lei n.° 62/2013, de 26 de agosto (LOSJ).

Estabelece este preceito que:

(...)

Concatenando o teor da alínea r) do preceito citado com a petição inicial impõe-se desde já concluir que a ação não se insere nas causas a que alude aquela alínea. Com efeito, pese embora o pedido formulado na alínea a) se reportar à validade e eficácia das deliberações adotadas na Assembleia Geral Extraordinária, de 18 de Abril de 2018, o objeto da ação prende-se com efetivação/cumprimento dessas mesmas deliberações por parte dos RR., constituindo aquele pedido mero pressuposto/fundamento dos demais, a saber, de "condenação no cumprimento integral das deliberações adotadas na Assembleia Geral Extraordinária, de 18 de Abril de 2018, de determinação da execução de tais deliberações, em cumprimento das quais deverá ser condenado o Réu BB., na qualidade de Presidente da Direção, a formalizar o mandato emitido pela Assembleia Geral a favor do Presidente da Mesa, ou a outorgar em representação da AITRAM, a necessária escritura pública destinada à alteração dos Estatutos, a condenação do Réu BB. no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória de multa no valor nunca inferior a €700,00 por cada dia de atraso, na respetiva concretização das referidas deliberações" - não constituindo, em rigor, pedido autónomo.

A matéria cível reservada aos Juízos do Trabalho prevista na citada alínea do art° 126° da LOSJ cinge-se ao controlo da legalidade "dos estatutos e respetivas alterações, do funcionamento e da extinção das (...) associações de empregadores." (...).

É, pois, inequívoco que na presente ação o A. não visa a declaração de nulidade daquelas deliberações nem a impugnação dos estatutos da R. (ações reguladas respetivamente nos art°s 164° e 164°-A do Código de Processo de Trabalho, sendo que para esta última apenas o Ministério Público tem legitimidade ativa) - pelo contrário, a ação destina-se a obrigar/compelir os RR. ao cumprimento das deliberações, traduzidas em alterações aos estatutos da R., adotando comportamentos que permitam que aquelas se tornem eficazes, designadamente mediante celebração de escritura pública ou outorga de mandato para o efeito.

Não está, assim, em causa qualquer questão relativa ao controlo da legalidade da alteração dos estatutos ou do funcionamento da R., ou qualquer outra prevista na alínea r) do art° 126° da LOSJ (nem prevista em outra alínea deste preceito legal).

Assim, nos termos do disposto no art° 130°, n° 1 da LOSJ, a tramitação e julgamento da presente ação é da competência residual do Juízo Local Cível.» [negritos nossos]

Quid iuris?

Ao assim ajuizar, foi a Relação sensível ao argumento do apelante, retomado em sede de contra-alegações ao presente recurso, segundo o qual, não obstante ter sido por si formulado pedido de “declaração de validade e eficácia das Deliberações adoptadas na Assembleia Geral Extraordinária, de 18 de abril de 2018, constantes na Acta junta à petição inicial”, a presente lide não visaria o controle de legalidade das deliberações de alteração dos Estatutos da AITRAM, mas tão-só a condenação dos RR. ao cumprimento das mesmas deliberações. Atendendo, aliás, a que, como invocou o mesmo apelante, aqui Recorrido, a validade das deliberações associativas foi apreciada em providência cautelar intentada pelo aqui 2.º R. contra a aqui 1.ª R..

Não pode acompanhar-se este entendimento.

Por um lado, porque, tanto por não existir identidade de partes entre a presente acção e o procedimento cautelar, como por a decisão aí proferida assumir carácter provisório, o conhecimento das pretensões do A. pressupõe necessariamente o controlo da legalidade das deliberações associativas em causa.

Por outro lado, porque, uma vez que a alínea r) do n.º 1 do art. 126º da LOSJ atribui aos tribunais de trabalho a competência para conhecer não apenas das questões “relativas ao controlo da legalidade da constituição, dos estatutos e respetivas alterações (...) das associações de empregadores”, mas também das questões “relativas ao controlo de legalidade (...) do funcionamento das ditas associações, se entende que também o pedido de que seja “ordenada a execução de tais Deliberações” implica, ou pode implicar, o controlo da legalidade do funcionamento da associação ré.

Em consequência, considera-se que a competência material para apreciar a presente acção cabe ao tribunal de trabalho, sendo o juízo local cível incompetente para o efeito.


6. Pelo exposto, julga-se o recurso procedente, revogando-se a decisão do acórdão recorrido e absolvendo-se os RR. da instância.

Custas pelo Recorrido.


Lisboa, 28 de Janeiro de 2021


Nos termos do art. 15º-A do Decreto-Lei nº 10-A/2020, de 13 de Março, aditado pelo Decreto-Lei nº 20/2020, de 1 de Maio, declaro que o presente acórdão tem o voto de conformidade das Exmas. Senhoras Conselheiras Maria Rosa Tching e Catarina Serra que compõem este colectivo.


Maria da Graça Trigo (Relatora)