Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
059466
Nº Convencional: JSTJ00002652
Relator: ALBUQUERQUE ROCHA
Descritores: DIREITO DE PREFERÊNCIA
PRAZO
UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Nº do Documento: SJ196405260594661
Data do Acordão: 05/26/1964
Votação: UNANIMIDADE
Referência de Publicação: DG Nº 142, IªS 1964/06/18, PÁG. 691; BMJ N º 137, ANO 1964, PÁG. 290 -
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PARA O PLENO
Decisão: UNIFORMIZADA JURISPRUDÊNCIA
Indicações Eventuais: ASSENTO 4/1964
Área Temática: DIR CIV - DIR CONTRAT.
Legislação Nacional: CPC39 ARTIGO 1511.
CPC876 ARTIGO 641 PAR2.
CPC61 ARTIGO 1459 N1 N2.
CCIV867 ARTIGO 815 PARUNICO ARTIGO 1566 PAR1 PAR4 ARTIGO 1678 ARTIGO 1704 ARTIGO 1708 ARTIGO 2195 PAR3 ARTIGO 2309 PAR3.
L 2030 DE 1948/06/22 ARTIGO 66 N1.
D 19126 DE 1930/12/16.
L 1662 DE 1924/09/04 ARTIGO 11.
Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃO STJ DE 1959/02/27 IN BMJ N84 PAG540.
ACÓRDÃO STJ PROC59466 DE 1962/06/22.
Sumário :
O paragrafo 1 do artigo 1566 do Codigo Civil e aplicavel se o conhecimento da venda não tiver sido dado mediante notificação judicial.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

Suscitou-se conflito de jurisprudencia quanto ao prazo para o exercicio do direito de preferencia no caso de interpelação extrajudicial.
O Supremo, por acordão de 27 de Fevereiro de 1959 -
- Boletim, n. 84, pagina 540 - decidiu, por maioria, ser de observar o prazo de 8 dias, estabelecido pelo artigo 1511 do Codigo de Processo Civil de 1939 - agora substituido pelos n. 1 e 2 do artigo 1459 do Codigo actual - mesmo no caso de interpelação judicial e ainda que simplesmente verbal.
Diametralmente oposta e a decisão do mesmo tribunal, no acordão recorrido:
Fora dos casos de renuncia, conforme com o paragrafo unico do artigo 815 do Codigo Civil, ou de notificação judicial regulada pelos citados artigos - 1511 do Codigo de 1939 e 1459 do actual - o prazo e o de 6 meses, estabelecido pelo artigo 1566 do Codigo Civil.
A recorrente - " A, Limitada " - defende a doutrina do acordão de 1959.
A recorrida - B - como o ilustre Procurador-Geral da Republica, sustentam a tese do acordão recorrido.
O douto magistrado sugere o seguinte assento:
" Os preferentes interpelados verbalmente estão sujeitos ao prazo regra fixado no paragrafo 4 do artigo 1566 do Codigo Civil".
Como bem decidiu a secção, ha manifesta oposição entre os dois acordãos em causa, sobre a mesma questão fundamental de direito.
Foram proferidos em diferentes processos, no mesmo dominio legislativo e e de presumir o caracter definitivo do acordão de 1959.
Cumpre conhecer do recurso e, decidindo-o, estabelecer doutrina obrigatoria.
A B, inquilina comercial do predio comprado pela "A, Limitada ", demandou esta para optar, conforme o n. 1 do artigo 66 da Lei n. 2030.
Foi excepcionada a caducidade porque a vendedora teria comunicado a inquilina a proposta da compradora e aquela declarara não pretender o predio.
Mas a caducidade foi tida por improcedente na primeira instancia, como no Supremo, que revogou a decisão contraria da Relação.
Ja sumariamos as decisões em conflito.
Ao conferir o direito de preferencia, a lei nem sempre indica o prazo para o seu exercicio.
E o que sucede com o n. 1 do artigo 66 da Lei n. 2030.
Ja o artigo 11 da Lei n. 1662 reconhecia identico direito ao locatario principal, em caso de venda, para ser exercido " nos termos da legislação geral ".
O Codigo Civil, em seus artigos 1678, 1704 e 1708, a proposito das referencias do senhorio directo e do enfiteuta, na enfiteuse e no censo reservativo, como na primitiva redacção do paragrafo 3 do artigo 2195, referido a preferencia do posseiro e quinhoeiros, estabelecia o prazo de 30 dias, a contar do aviso com indicação do preço oferecido que se pretendia aceitar.
Porem o artigo 1566 do citado Codigo, dispunha na sua primitiva redacção:
" Não podem os comproprietarios de coisa indivisivel vender a estranhos a sua respectiva parte, se o consorte a quiser tanto por tanto. O comproprietario, a quem não se der conhecimento da venda, pode depositando o preço, haver para si a parte vendida a estranho, contando que o requeira no prazo de 6 meses".
Entretanto, o Codigo de Processo Civil de 1876 no artigo 641, estabelecia o processo especial das " notificações para preferencia, nos contratos de alienação de bens, segundo os artigos 1566, 1678, 1704, 1708 e 2195 do Codigo Civil e casos semelhantes".

No paragrafo 2 determinava-se que " o interessado que pretender preferir devera declara-lo, por termo, no prazo de 30 dias a contar daquele em que tiver sido notificado".
Coincidia este prazo com o estabelecido pelos referidos artigos do Codigo Civil, excepto o do artigo 1566 que era de 6 meses.
Poderia, por isso, perguntar-se se o Codigo de Processo quisera uniformizar os prazos para o exercicio de qualquer direito de preferencia ou se apenas estabelecia um prazo para os casos de notificação judicial.
Que era esta ultima a sua intenção veio demonstra-lo o Decreto n. 19126, de 16 de Dezembro de 1930, alterando a redacção de varios artigos do Codigo Civil.
Entre os preceitos alterados contam-se o artigo 1 566, que ficou com quatro paragrafos, em substituição do unico da redacção primitiva, e o paragrafo 3 do artigo 2195.
Interessa reproduzir os textos actuais dos 1 e 4 paragrafos do artigo 1566 e do paragrafo 3 do artigo 2195, todos do Codigo Civil.
" Artigo 1566...;
" Paragrafo 1 - O comproprietario, a quem se não der conhecimento da venda, podera haver para si a parte vendida a estranhos, contanto que o requeira dentro do prazo de seis meses, a contar da data em que tenha conhecimento da venda...",
" Paragrafo 4 - O prazo a que se refere o paragrafo 1 deste artigo e extensivo a todos os outros casos de preferencia".
" Artigo 2195...
" Paragrafo 3 - O modo de exercer estas preferencias (do posseiro e dos quinhoeiros) e o mesmo que se estabelece nos paragrafos do artigo 2309 ".
E oportuno referir as profundas alterações trazidas pelo Decreto n. 19126 ao artigo 2309 do Codigo Civil.
Ampliou o corpo do artigo, a que introduzia cinco paragrafos. Ali se estabelece e regulamenta o direito de preferencia, nos casos de alienação, aforamento e arrendamento a longo prazo dos predios encravados e dos onerados com a respectiva servidão de passagem, em favor dos seus proprietarios.
Ora, no paragrafo 3 desse artigo 2309 ficou estabelecido:
" Para usarem do direito de preferencia, nos outros casos, ( o paragrafo anterior contempla os casos de arrematação judicial) - devem esses proprietarios ser notificados, nos termos do artigo 641 do Codigo de Processo Civil ( referia-se ao Codigo de 1876, então vigente, depois substituido pelo artigo 1 511 do Codigo de 1939 e pelo artigo 1459 do actual) e, na falta de notificação, poderão usar do seu direito, nos termos do paragrafo 4 do artigo 1566".
Da " Nota Oficiosa " publicada a proposito do Decreto n. 19126, onde se justificam os fins visados pelas alterações nele contidas, extratamos:
Quanto ao artigo 1566 "... abranger, de harmonia com o Codigo de Processo, toda a propriedade indivisa; precisar a data desde a qual se devem contar os 6 meses; ...obrigar o preferente a exercer o seu direito num prazo curto, obstando a situações indefinidas e causadoras de abusos e extorsões".
Quanto ao artigo 2309 "... os cinco paragrafos deste artigo (revogando e substituindo inteiramente a Lei n. 1621)... estabelecem um processo eficaz para o exercicio das preferencias".
Relativamente ao paragrafo 3 do artigo 2195. " O modo de exercer as preferencias encontra-se mais perfeitamente estabelecido nos paragrafos do artigo 2309".
Mais tarde, o Codigo de Processo Civil de 1939, preceituou, em seu
" Artigo 1511 - Pretendendo-se que alguem seja notificado para exercer, querendo, o direito de preferencia, especificar-se-ão no requerimento o preço e as condições do contrato-promessa e pedir-se-a que a pessoa seja notificada para declarar dentro de 8 dias, se quer preferir.
Efectuada a diligencia, o requerimento e a certidão serão entregues pelo funcionario na Secretaria Judicial.
Querendo o notificado preferir...".
Com regulamentação mais pormenorizada, o mesmo processo e mantido no actual Codigo de Processo, que assim determina, em seu " Artigo 1459....
"1. Quando se pretende que alguem seja notificado para exercer, querendo, o direito de preferencia especificar-se-ão no requerimento o preço e as restantes clausulas do contrato projectado e pedir-se-a que a pessoa seja notificada para declarar, dentro de 8 dias, se querer preferir.
Autuado o requerimento, ordena-se a notificação pessoal do requerido, por meio de mandado, para dentro de 8 dias declarar se pretende preferir.
2 Querendo o notificado preferir, deve declara-lo dentro do prazo fixado..."
O prazo que era de 30 dias, no Codigo de 1876, passou pelos diplomas posteriores, a ser apenas de 8 dias, mas sempre contado da data da notificação, sendo esta, sempre, cominatoria.
E a notificação judicial, desde que efectuada nos termos legais, antes da celebração do contrato, e um meio eficaz, posto ao alcance de quem estiver obrigado a conceder preferencia, para compelir o titular do direito de preferir a, em curto prazo, a exercer esse direito, ou a ele renunciar.
A inactividade do notificado significa a sua renuncia, tão evidente e inequivoca como seria a que constasse de documento com os requisitos exigidos pelo paragrafo unico do artigo 815 do Codigo Civil, redigido com o afirmado proposito de " evitar o grande abuso que se esta praticando de obter por meio de testemunhas falsas a prova de direitos importantes, como o de opção".
Nota oficiosa, ja citada. O mesmo não podera dizer-se quando o titular do direito de preferencia, interpelado extrajudicialmente para preferir, nada diz, ou da uma resposta evasiva e equivoca, ou ainda se disser - mas so verbalmente - não querer preferir.
So na ultima hipotese haveria renuncia, mas esta não satisfez ao condicionalismo do artigo 815 do Codigo Civil, pelo que sempre sera ineficaz. E que, tanto a interpelação como a pretendida renuncia so poderiam provar-se pelos meios que o texto legal quis rejeitar.
Tanto basta, cremos, para repelir a tese do acordão de 1959 e impor a solução adoptada pelo acordão recorrido.
Ela foi tambem defendida com o costumado brilho e a autoridade de sempre reconhecida, pelo Professor Alberto dos Reis no segundo volume de Processos Especiais.
E assim de concluir que o titular do direito de preferencia se não for judicialmente notificado para exercer o seu direito, antes de celebrado o contrato em que pode optar, so perdera o direito de agir conforme o paragrafo 4 do artigo 1566 do Codigo Civil, se tiver renunciado nos precisos termos do paragrafo unico do artigo 815 do mesmo diploma.
E o que expressamente determina o paragrafo 3 do artigo 2309 do Codigo Civil.

Ali se formula um principio geral para que remete o paragrafo 3 do artigo 2195 do referido Codigo, pelas ja indicadas razões constantes da " nota oficiosa ".
Assim se nega provimento ao recurso, com custas pela recorrente e firmando como
ASSENTO:
" O paragrafo 1 do artigo 1566 do Codigo Civil e aplicavel se o conhecimento da venda não tiver sido dado mediante notificação judicial".

Lisboa, 26 de Maio de 1964

Albuquerque Rocha (Relator) - Gonçalves Pereira - Alberto Toscano - Jose Meneses - Fragoso de Almeida - Lopes Cardoso - F. Toscano Pessoa - Barbosa Viana - Lucena e Vasconcelos - Simões de Carvalho - João Caldeira - Torres Paulo - Tovar de Lemos - Albino Resende Gomes de Almeida.