Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
8727/06.7TBCSC.L1.S1
Nº Convencional: 2ª SECÇÃO
Relator: MARIA DA GRAÇA TRIGO
Descritores: CONTRATO DE COMPRA E VENDA
BEM IMÓVEL
DEFEITOS
MENSAGEM PUBLICITÁRIA
CONTRATO DE MEDIAÇÃO IMOBILIÁRIA
INCUMPRIMENTO DO CONTRATO
OBRIGAÇÃO DE INDEMNIZAR
MEDIADOR
REPRESENTAÇÃO
MANDATÁRIO
ACTOS DOS REPRESENTANTES LEGAIS OU AUXILIARES
ATOS DOS REPRESENTANTES LEGAIS OU AUXILIARES
CADUCIDADE
DENÚNCIA
EMPREITADA
Data do Acordão: 02/11/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDAS EM PARTE AS REVISTAS
Área Temática:
DIREITO COMERCIAL - CONTRATOS COMERCIAIS / CONTRATO DE MEDIAÇÃO IMOBILIÁRIA.
DIREITO CIVIL - RELAÇÕES JURÍDICAS / FACTOS JURÍDICOS / NEGÓCIO JURÍDICO - DIREITO DAS OBRIGAÇÕES / CUMPRIMENTO E NÃO CUMPRIMENTO DAS OBRIGAÇÕES.
DIREITO DA PUBLICIDADE - PRINCÍPIOS GERAIS - ACTIVIDADE PUBLICITÁRIA ( ATIVIDADE PUBLICITÁRIA ) / RESPONSABILIDADE CIVIL.
DIREITO DO CONSUMO - VENDA DE BENS DE CONSUMO.
Doutrina:
- Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2014, p.. 29 e ss.
- Calvão da Silva, Venda de bens de consumo, 2003, pp. 69, 95.
- Carlos Ferreira de Almeida, Contratos, IV – Funções. Circunstâncias. Interpretação, 2014, p. 262.
- Evaristo Mendes / Fernando Sá, Comentário ao Código Civil – Parte Geral, Univ. Católica Editora, 2014, p. 489.
- Menezes Cordeiro, “Do contrato de mediação”, in O Direito, 2007, III, pp. 517, 541.
- Pais de Vasconcelos, Direito Comercial, Vol. I, 2011, p. 197.
- Pinto Monteiro, Direito Comercial – Contratos de distribuição comercial, 2002, p. 102.
- Ribeiro Mendes, Recursos em Processo Civil, 2009, p. 52.
- Romano Martinez, Direito das Obrigações – Contratos, 2007, p. 145.
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 217.º, N.º 1, 236.º, 800.º, 805.º, N.º 3, PRIMEIRA PARTE, 1225.º, Nº 1, 2ª PARTE, N.º 2, 1419.º, Nº 2.
CÓDIGO DA PUBLICIDADE: - ARTIGOS 3.º N.º 1, AL. A), 10.º, N.º 1, E 30.º, N.º 1.
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 635.º, N.º4, 682.º, N.ºS 1 E 3.
D.L. N.º 211/2004, DE 20-08 (VIGENTE À DATA DOS FACTOS): - ARTIGOS 16.º, N.º 1, ALS. C) E D).
D.L. N.º 67/2003, DE 08-04: - ARTIGOS 2.º, N.º 3, 5.º.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:
-DE 15 DE FEVEREIRO DE 2012, PROC. N.º 5223/05.3TBOER.L1.S1, WWW.DGSI.PT ;
-DE 24 DE ABRIL DE 2012, PROC. N.º 2565/10.0TBSTB.S1. WWW.DGSI.PT .
Sumário :
I - No âmbito de um contrato de mediação imobiliária, não representando o mediador a parte que o contratou, a conduta por si assumida apenas vinculará o vendedor nos casos em que este lhe tenha atribuído poderes de representação.

II - A violação dos deveres, previstos no art. 16.º, n.º 1, al. c) e d), do DL 211/2004, de 20-08 (vigente à data dos factos), que recaem sobre o mediador imobiliário apenas responsabiliza este último e não o vendedor que o tenha contratado.

III - A existência de uma placa promocional, exposta no exterior de um prédio, anunciando que os imóveis para venda são equipados com cozinha da marca x, integra uma declaração negocial do vendedor que o vincula ao cumprimento da respectiva obrigação (arts. 217.º, n.º 1, e 236.º do CC) e constitui um acto publicitário que se encontra sujeito ao princípio da veracidade no que toca às características das fracções em venda (arts. 3.º n.º 1, al. a), 10.º, n.º 1, e 30.º, n.º 1, do Código da Publicidade).

IV - O incumprimento da referida obrigação faz incorrer o vendedor na obrigação de indemnizar.

V - Nos casos em que o vendedor do imóvel tenha sido simultaneamente o seu construtor, é de um ano, desde a denúncia, o prazo para a propositura da acção pelo comprador com vista ao exercício do direito de reposição da falta de conformidade do bem com o contrato, por meio de reparação ou de substituição (art. 1225.º, n.º 2, do CC), por estar em causa um prazo mais favorável do que o previsto no art. 5.º do DL 67/2003, de 08-04 (na sua redacção originária) e este ter a natureza de protecção mínima.

VI - Conhecendo o comprador, no momento da celebração do contrato de compra e venda, os defeitos do bem (ou não os podendo razoavelmente ignorar) e aceitando-o tal qual estava, fica impedido de se prevalecer dos direitos resultantes dessa falta de conformidade contra o vendedor, que, em consequência, não pode pela mesma ser responsabilizado (art. 2.º, n.º 3, do DL n.º 67/2003, de 08-04).

Decisão Texto Integral:
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça



1. AA e BB intentaram acção contra CC - Sociedade de Gestão e Promoção Imobiliária, S.A., pedindo a condenação, com fundamento em cumprimento defeituoso de contrato de compra e venda de bem imóvel: a) à entrega dos electrodomésticos da marca DD, com as características previstas e conforme orçamento, ou à entrega da quantia de €9.446,98, necessária para a sua aquisição; b) à entrega da quantia de €32.500, necessária para a aquisição de uma garagem que compense as trocas de locais de garagem e arrecadação que deveriam ter sido entregues pela R.; c) à reparação ou pagamento da reparação dos defeitos de obra que totalizavam a importância de €1.000; d) à reparação ou pagamento da reparação do piso em pedra Moleanos, no montante de €1.135, acrescido do pagamento do custo da colocação, no montante de €260; e) ao pagamento de €3.000, correspondente ao custo de dez dias de alojamento hoteleiro para o agregado familiar dos AA., correspondente à duração prevista para as reparações na sua fracção; f) à devolução da quantia de €582,96, cobrada pela R. aos AA., como juros de mora na celebração da escritura de compra e venda; g) ao pagamento da indemnização de €500 por cada mês decorrido, desde a data da escritura de compra e venda até ao total ressarcimento dos autores relativamente aos defeitos e demais prejuízos, que na data da propositura da acção totalizavam o valor de €3.000; h) ao pagamento de uma indemnização por danos não patrimoniais de €10.000; i) ao pagamento de juros de mora desde a citação, até efectivo e integral pagamento sobre as quantias peticionadas.

A R. contestou por impugnação, concluindo pela improcedência da acção. Os AA. replicaram, pugnando pela procedência da acção.

Por sentença de fls. 493, a acção foi julgada improcedente, absolvendo-se a R. dos pedidos por ter decorrido o prazo de caducidade da segunda parte do art. 5º, nº 4, do Decreto-Lei nº 67/2003, de 8 de Abril.

Os AA. recorreram para o Tribunal da Relação de Lisboa. A R. contra-alegou e ampliou o âmbito do recurso. Por acórdão de fls. 611, a apelação dos AA. foi julgada parcialmente procedente, condenando-se a R. à reparação dos defeitos descritos nos factos provados sob as alíneas 18. a 31, que correspondem aos pedidos formulados sob as alíneas c) e d) da petição inicial.


2. A A. recorre para o Supremo Tribunal de Justiça, formulando as seguintes conclusões:

 a) Foi dado como provado que os autores sentem-se ludibriados pela ré.

 b) Foi dado como provada a existência dos defeitos elencados pela recorrente.

 c) Foi dado como provada a venda da fracção com a instalação dos electrodomésticos que estavam incluídos no preço de aquisição.

 d) Na douta sentença proferida conclui-se que a sociedade vendedora incumpriu o contrato de compra e venda celebrado com a recorrente e seu ex-marido.

 e) O pedido, no que concerne à matéria alegada pelos autores e dada como provada, apenas improcedeu por se ter entendido que o direito dos autores caducou.

 f) Agora, em sede de recurso, vê a recorrente revogada a decisão do Tribunal de 1ª Instância por diferentes interpretações da lei que respeitam à responsabilização do devedor através de um seu auxiliar.

 g) O contrato de compra e venda, objecto do processo, foi celebrado no dia 26/4/2006.

 h) A tradição do imóvel deu-se em Dezembro de 2005.

 i) A denúncia dos defeitos, através de carta à sociedade construtora/vendedora foi em 27/01/2006.

 j) Facto nº 7 da matéria de facto dada como provada: Aquando da negociação da compra referida em 1), o Senhor EE, enquanto promotor imobiliário, informou os autores que o preço de aquisição da fracção incluía a instalação completa de electrodomésticos da marca DD na cozinha.

 k) Facto nº 8 dado como provado: Existia uma placa promocional, exposta no exterior dos blocos que constituem o prédio, dizendo que os imóveis para venda eram equipados com cozinha DD.

 I) Facto nº 9: O Senhor EE combinou com os autores que a escolha dos electromésticos seria efectuada em deslocação a estabelecimento comercial.

 m) Facto nº 10: Tais electrodomésticos constavam de: um forno, uma placa de gás, um exaustor, uma máquina de lavar roupa, um KF 888 e um micro ondas.

 n) Facto provado nº 11: no valor global de 9.446,98 Euros.

 o) Facto nº 13: O Sr. EE acordou com os autores que um dos estacionamentos da fracção seria fechado em box, por meio da montagem de uma parede divisória e de uma porta de correr com respectivo motor eléctrico.

 p) Facto nº 15 da matéria de facto dada como provada: O Senhor EE foi informado que tal era essencial para os autores se decidissem a comprar a fracção.

 q) Facto nº 44 da matéria dada como provada: O Senhor EE era promotor imobiliário, o qual procedeu à venda de alguns dos apartamentos que a ré tinha construído no prédio urbano formado pelos Blocos A e B, situado na Rua …, nº …, nas Pedreiras, freguesia de Alcabideche, concelho de Cascais.

 r) São estes os factos que urge apreciar para se aplicar o direito.

 s) Refere o Venerando Acórdão que nos termos do DL 211/2004 de 20 de Agosto que regulava o exercício da actividade de mediação imobiliária, no seu artigo 16º impunha às entidades que desenvolviam a actividade determinadas obrigações.

 t) O Sr. EE foi o promotor imobiliário da construtora/vendedora, que havia uma placa promocional anunciando as cozinhas DD colocada no imóvel, dúvidas não há que o promotor não incorreu em nenhum incumprimento que causasse dano à ora recorrente. Pelo contrário, confirmou aquilo que estava a tentar vender e que constava da placa promocional da CC.

 u) Refere ainda o Venerando Tribunal da Relação que não se provou que os compromissos assumidos pelo mediador tenham sido, de alguma forma, ratificados pela sociedade Ré pelo que ela a eles não se pode considerar obrigada.

 v) Salvo o devido - e muito - respeito assim não é.

 w) Coube à recorrente alegar e provar - o que conseguiu em 1ª instância - que a promoção da venda dos apartamentos referia a cozinha DD e que o promotor imobiliário da recorrida confirmou o preço de venda incluía os electrodomésticos.

 x) O próprio representante da recorrida, deslocava-se várias vezes ao imóvel e naturalmente se a promoção ali colocada fosse desconhecida da recorrida, por isso, era impossível desconhecer o facto anunciado e publicitado da venda dos andares com electrodomésticos.

 y) Ao contrário do que é referido no Venerando Acórdão, a recorrida obrigou-se ao fornecimento dos electrodomésticos, à atribuição de lugares concretos de garagem e arrecadação e fecho em box.

 z) Se o fez através de um auxiliar - o promotor imobiliário - é a devedora a responsável como dispõe o artigo 800º do Código Civil.

 aa) Como refere a douta sentença proferida em 1ª Instância, o artigo 800º do Código Civil estatui que o devedor é responsável perante o credor pelos actos dos seus representantes legais ou das pessoas que utilize para o cumprimento da obrigação, como se tais actos fossem praticados pelo próprio devedor.

 bb) Este preceito legal consagra a responsabilidade de carácter objectivo, nos termos do qual o devedor, independentemente de culpa, deve indemnizar o credor pelos danos por este sofridos em virtude do comportamento dos auxiliares a que recorra para realizar o cumprimento ou por causa da conduta dos seus representantes.

 cc) O mediador é um auxiliar independente que acordou determinadas condições de contrato (cozinha equipada com electrodomésticos da marca DD, box fechada, etc.) com os autores e nessa medida vinculou a ré. cfr. páginas 34 e 35 da douta sentença de 1ª Instância.

 dd) O artigo 800º do Código Civil não exige uma relação de dependência.

 ee) A lei portuguesa faculta de um modo geral ao devedor a utilização de auxiliares no cumprimento da obrigação, seja qual foi a natureza desta. Porém, e segundo a interpretação a dar ao artigo 800º, nº 1, o devedor que confiou ao auxiliar a realização da prestação responde pela falta de cumprimento ou pelo incumprimento defeituoso da obrigação nos mesmos termos em que responderia se, em vez do auxiliar, fosse ele devedor, quem deixou de cumprir ou cumpriu defeituosamente. Vide A. Varela, RU, 1192-125.

Em consequência, deve ser dado provimento ao presente recurso, ou seja:

a)  Manter-se a decisão do Tribunal de 1ª Instância em toda a matéria que considerou provada e que seria procedente não fosse o problema da caducidade - a nosso ver mal - conforme confirmação do Tribunal da Relação de Lisboa que deu provimento ao recurso da recorrente nessa parte.

b) Decidida agora a questão da caducidade pelo Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, que seja reapreciada a decisão dando procedência aos pedidos da recorrente na parte em que os factos alegados foram dados como provados na douta sentença proferida - o incumprimento quanto ao contrato de compra e venda, os defeitos denunciados e a falta de electrodomésticos que faziam parte do preço pago pela aquisição da fracção.

c) Que seja agora proferida decisão pelo Tribunal a quo quanto ao valor da indemnização pedida com base na matéria alegada e provada e, se for o caso, reduzir o pedido, por improcedente, na matéria dada como não provada.

Por não existir caducidade dos direitos da recorrente no caso sub judice, porque o enquadramento jurídico não foi, com o devido respeito, correctamente aplicado, deve ser dado provimento ao presente recurso, mandando-se reapreciar a questão suscitada pela recorrente em 1ª Instância, dada a matéria dada como provada, que poderá, depois de reapreciada dar como procedente parcialmente o pedido da recorrente a essa matéria em virtude do provimento dado à questão da falta de existência de caducidade no caso sub judice fazendo-se assim, Venerandos desembargadores, a costumada Justiça.”


Recorre a R. para o Supremo Tribunal de Justiça, formulando as seguintes conclusões:

1ª - Não obstante os Autores terem conhecimento dos defeitos verificados na fracção autónoma por si adquirida antes da celebração da escritura, não se recusaram a celebrar o contrato definitivo de compra e venda, nem fizeram qualquer ressalva ou salvaguarda aquando da sua celebração;

2ª - Ou seja, os Autores aceitaram, sem reserva, o imóvel dos autos;

3ª - Assim, quer seja aplicável o regime da venda de bens de consumo, quer seja aplicável o regime da venda das coisas defeituosas e/ou o da empreitada, verifica-se um caso de renúncia abdicativa legalmente presumida, de forma absoluta e inilidível;

4ª - Com efeito, conhecendo os Autores/compradores, no momento da compra, os vícios ou desconformidades da coisa comprada, não os invocando nesse momento, já não os poderão opor à Ré/vendedora;

5ª - Indiscutivelmente assim é, pelo menos quanto ao defeito verificado na pedra moleanos do hall da entrada, do corredor, do hall dos quartos e das casas de banho;

6ª - Tal defeito não foi denunciado pelos Autores antes da celebração da escritura de compra e venda, não obstante ser já por eles conhecido;

7ª - Trata-se de um defeito visível e, por isso, aparente, presumindo-se assim o seu conhecimento por parte dos Autores;

8ª - Logo, adquirindo a fracção sem qualquer ressalva ou reserva quanto a esses defeitos, presume-se a sua aceitação por parte dos Autores;

9ª - Decidindo como decidiu, o douto Acórdão violou, designadamente, as normas dos art.s 2° n.º 3 do Decreto-Lei n° 67/2003, de 8 de Abril, 914°, 1218° n.ºs 1 e 5 e 1219° n.ºs 1 e 2 do C. Civil.


Cumpre decidir.


3. Vem provado o seguinte:

1. Por escritura pública lavrada no dia 26 de Abril de 2006, a ré declarou vender à autora e o autor marido declarou comprar por si e na qualidade de procurador da autora a fracção autónoma, designada pela letra "G", que corresponde ao Bloco A, quarto piso, segundo andar direito, um fogo com dois estacionamentos designados por "P23" e "P24" e uma arrecadação designada por "A 12", no primeiro piso (cave), do prédio urbano formado pelos Blocos A e B, situado na Rua de …, n.° …, nas Pedreiras, freguesia de Alcabideche, concelho de Cascais, descrito na 2.ª Conservatória do Registo Predial de Cascais sob o n.° …29, daquela freguesia, pelo preço de € 175.000, sendo € 125.000 pagos com dinheiro da autora sua representada, e o restante mediante empréstimo contraído pelos autores no mesmo acto.

2. A fracção autónoma referida em 1. consta descrita na 2.8 Conservatória do Registo Predial de Cascais, sob o n.° …29-G, da freguesia de Alcabideche e corresponde ao Bloco A, quarto piso, segundo andar direito, sendo constituída por um fogo com dois lugares de estacionamento designados por "P23" e "P23" e uma arrecadação designada por 'A12" no primeiro piso (cave).

3. A ré não entregou electrodomésticos aos autores.

4. Os autores habitam a fracção referida em 1) desde Dezembro de 2005 e até 14 de Maio de 2006 ocuparam nos locais actualmente sinalizados como estacionamentos "P21" e "P22", e arrecadação "AIO".

5. Em 17 de Janeiro de 2006, a ré remeteu carta dirigida aos condóminos e proprietários do prédio referido em 1), que os autores receberam solicitando que os lugares de estacionamento e arrecadações fossem ocupados em conformidade com a planta de constituição da propriedade horizontal.

6. Aquando da outorga da escritura referida em 1), os autores pagaram à ré a quantia de €582,96, concernente a atraso na celebração da escritura.

7. Aquando da negociação da compra referida em 1), o Senhor EE, enquanto promotor imobiliário, informou os autores que o preço de aquisição da fracção incluía a instalação completa de electrodomésticos da marca DD na cozinha.

8. Existia uma placa promocional, exposta no exterior dos blocos que constituem o prédio, dizendo que os imóveis para venda eram equipados com cozinha DD.

9. O Senhor EE combinou com os autores que a escolha dos electrodomésticos seria efectuada em deslocação a estabelecimento comercial.

10. Tais electrodomésticos constavam de: Um forno, modelo H4641 BP KAT Inox; Uma Placa da Gás, modelo KM 361 G; Um exaustor DA 3060; Uma máquina de Lavar Louça, G 1830 SC; -Um KF 888 iNid-1; Uma máquina de lavar Roupa modelo W 2659 i DIRT; Um microondas modelo M 8261, em Inox, tudo da marca DD.

11. No valor global de € 9.446,98.

12. Aquando das visitas ao local enquanto negociava com os autores, o Senhor EE afirmou que os estacionamentos da fracção "P23" e "P24" e a arrecadação "A12", estavam localizados nos locais actualmente sinalizados como estacionamentos "P21" e "P22", e arrecadação "AIO".

13. Na mesma ocasião, o Senhor EE acordou com os autores que um dos estacionamentos da fracção seria fechado em box, por meio da montagem de uma parede divisória e de uma porta de correr com respectivo motor eléctrico.

14. O que seria a expensas da ré segundo informação dada pelo Senhor EE aos autores.

15. O Senhor EE foi informado que tal era essencial para os autores se decidissem a comprar a fracção.

16. Os autores têm bens móveis que contavam guardar na referida box.

17. E não têm outro local onde os guardar.

18. A fracção referida em 1. apresenta vários azulejos partidos, nas paredes da cozinha.

19. E uma peça cerâmica da sanca da bancada da cozinha está solta.

20. E todos os "espelhos" dos puxadores das portas da fracção não se encontrando na posição vertical.

21. E o tecto do quarto principal tem um desnível de cerca de Va cm num espaço de 3 metros.

22. E não existe furo na pedra do chão da sala, o que não permite o funcionamento do fecho de correr interior da porta.

23. E não foi aberta pelo lado interior da cozinha a comunicação com a grelha de ventilação exterior,

24. E não foi dado acabamento final na porta de entrada da fracção.

25. E a infraestrutura de televisão por cabo não está concluída.

26. E a instalação de som ambiente, não dispõe de nenhuma fonte de som ligada à consola, nem de cabos de ligação que permitam ligar uma fonte própria.

27. E a torneira de um dos lavatórios de casa de banho liga à água quente quando se orienta para o sinal de água fria e vice-versa;

28. E falta a pega de comando da válvula de fecho de um lavatório de casa de banho.

29. E falta um travão de portada exterior de uma janela.

30. E parte dos travões de portadas estão mal posicionadas ou avariados, não permitindo o fecho das mesmas

31. A pedra Moleanos que reveste o chão do hall de entrada, do corredor, do hall dos quartos e das casas de banho apresenta manchas e humidade.

32. Os autores sentem-se ludibriados pela ré.

33. A ré recusa-se a reparar os defeitos acima descritos,

34. Os defeitos acima referidos já se verificavam quando os autores foram morar para a fracção, na data referida em 4.

35. Os defeitos acima referidos já se verificavam aquando da escritura referida em 1.

36. Em 8 de Janeiro de 2006, a ré remeteu aos autores, que a receberam, carta registada com aviso de recepção com o seguinte teor: "Referência: Marcação de escritura pública. (...) Vem esta sociedade nos termos da 5." cláusula do Contrato promessa de compra e venda, proceder à notificação de V.ªs Exas. de que o prazo de celebração da escritura pública, venceu-se aos 31 Dezembro de 2005. Assim, vimos por esta carta requerer a V.ªs Exas. marcação de escritura pública de compra e venda da fracção G, no prazo de cinco dias. Findo o prazo estipulado, se não verificarmos a marcação da mesma, informamos que procederemos nos termos do n.° 3 daquela cláusula à marcação pretendida, com data, notário, local e hora, onde a mesma se deverá realizar"

37. Em 15 de Janeiro de 2006, os autores remeteram carta registada com aviso de recepção à ré sobre o assunto Marcação de Escritura Pública, com o seguinte teor: "(...) as n/ desculpas por não ter com mais antecedência comunicado com V. Exas., vimos pedir a dilação de 30 dias prevista no n.° 2 da Cláusula 5." do Contrato promessa de compra e venda. Com efeito, aconteceu um ligeiro atraso no processo de pedido de financiamento bancário no Banco FF. Contamos pois muito em breve poder marcar a escritura para data anterior àquele prazo dilatório.'"

38. Em 27 de Janeiro de 2006, os autores remeteram à ré carta registada com aviso de recepção, com o seguinte teor: "Acusamos a recepção da carta enviada por V. Exas., datada de 17 de Janeiro de 2006 e recepcionada no dia 22 do corrente, sobre o lema: Informação sobre Distribuição de Parqueamentos e Arrecadações, que mereceu a n/ melhor atenção. Estranhamos e deploramos o seu teor, tanto mais que os lugares de estacionamento e arrecadação que ocupamos neste momento são os que V. Exas. nos indicaram como pertencentes à fracção autónoma prometida adquirir, e correspondem à sinaléctica que até há poucos dias os senhores tinham afixado no local. Trata-se pois de uma substancial alteração ao contratado entre nós e essa sociedade, com graves e importantes prejuízos para a nossa parte. Tão mais graves, quando é certo, que os lugares que nos tinham sido atribuídos por V. Exas. e devidamente marcados, conforme documentação fotográfica em nosso poder, iam ser fechados a expensas de V. Exas., sendo que os lugares que agora nos pretendem atribuir não permitem tal tipo de obra. Por outro lado, a arrecadação que agora nos indicam tem uma área de praticamente metade da anterior. Solicitamos informação urgente de como nos pretendem ressarcir face a tal situação. Por outro lado detectámos uma importante incorrecção na descrição matricial predial da fracção prometida adquirir: o andar que prometemos comprar é composto de 4 divisões, conforme planta que nos foi fornecida e efectiva e real configuração. No entanto na caderneta predial consta como sendo um 3 divisões. Solicitamos pois que com urgência e em momento anterior à respectiva escritura pública de compra e venda, seja feita a correspondente rectificação material Mais dois assuntos mos merecem ainda esclarecimento e reposição. O primeiro prende-se com os equipamentos que deveriam ler sido fornecidos na fracção autónoma prometida adquirir e que até este momento não foram entregues e montados. Na verdade, aquando das negociações conducentes à compra da fracção autónoma, foi-nos indicado que a cozinha seria equipada, com eletrodomésticos da marca DD. Aliás existia mesmo um cartaz publicitário relativo à venda das diversas fracções que transmitia exactamente essa informação. Com efeito foi-nos mesmo referido que o equipamento em questão da marca DD, corresponderia aos seguintes electrodomésticos: Forno, placa de fogão, exaustor, frigorífico combinado, máquina de lavar loiça, máquina de lavar roupa e micro-ondas, e foram-nos mesmo mostrados cada um desses electrodomésticos como modelo num outro fogo onde eles já estavam instalados. Até esta data e pese já estarmos a habitar a referida fracção e de já terem sido alvo de reclamação da nossa parte os electrodomésticos em causa ainda não foram entregues nem montados. Solicitamos com urgência tal entrega e montagem. O segundo ponto prende-se com alguns defeitos de obra que foram detectados e cuja reparação desde já solicitamos. Os defeitos em causa são os constantes da lista que se anexa: Lista de defeitos detectados na fracção (Anexo à carta à CC em 27.0J.06): - 2 azulejos partidos na cozinha; -1 peça da sanca da bancada da cozinha solta; - vários espelhos dos puxadores das portas interiores mal colocados; - tecto do quarto principal com desnível visível a olho nu de cerca de uns 2 cms em 3 metros; - Falta fazer furo no chão da sala para entrada do fecho de correr da porta de acesso à mesma; - Falta abrir pelo interior a ventilação da cozinha; - Falta o acabamento final da porta de entrada do andar, pelo lado exterior; - A instalação da TV Cabo e NetCabo; - A instalação de som não tem cabos de ligação e não pode ser testada; -1 torneira do lavatório da casa de banho principal tem a posição quente e frio trocada; - Falta a pega de comando do ralo do lavatório da casa de banho social; - Falta um travão exterior da portada do quarto principal; - Alguns de tais travões de portadas estão mal posicionados e perros, na prática não podendo ser utilizados; - Faltam alguns vedantes de furos de escoamento de águas da caixilharia de alumínio não permitindo pois um isolamento térmico adequado. Outras faltas: - Chave da entrada principal do prédio; - Chave para comando manual, do portão de garagem. Jardim infantil: - O tronco de um dos baloiços do parque infantil está derrubado, a segurança deste equipamento oferece pois algumas dúvidas'".

39. Em 6 de Março de 2006, GG, mandatária da ré remeteu aos autores carta registada com aviso de recepção, com o seguinte teor: "Assunto: Fracção correspondente ao 4. "piso, 2." andar direito do Bloco A-letra G Alcabideche (...) Serve a presente, para lhes solicitar que procedam à marcação de escritura pública de compra e venda no prazo máximo de 15 dias a contar da presente data, considerando o atraso verificado, não imputável a MI Constituinte. Aproveito ainda para informar Vªs. Exas. que à quantia em divida e a pagar no acto da escritura pública de compra e venda, acrescem juros de mora à taxa bancária de 5,624%/ano, tal como a MI Cliente tem vindo a suportar. De facto, não é legitimo que suporte a suas expensas juros bancários da fracção onde Vªs. Exas. residem e que irão adquirir, quando o atraso para a celebração da referida escritura não lhe é imputável. Os juros são devidos desde a data limite para a outorga da escritura pública, ou seja, 31 de Janeiro de 2006 até à data de efectivação da mesma".

40. Em 15 de Março de 2006 os autores remeteram carta registada com aviso de recepção a GG, sobre o assunto escritura de compra e venda, com o seguinte teor: "Acusamos a recepção da carta de V. Exa., datada de 6 de Março p.p., relativamente à escritura de compra e venda da fracção que prometemos adquirir, tendo o respectivo teor merecido a nossa melhor atenção. Estamos a desenvolver todos os esforços junto da instituição onde requeremos o financiamento para que a escritura lenha lugar o mais rapidamente possível. Como tivemos ocasião de informar V Exa. o processo de empréstimo esteve suspenso enquanto não foi corrigido o teor da descrição da fracção autónoma prometida comprar, sendo que tal documento apenas nos foi devolvido no final de Fevereiro...Seguindo agora o processo a tramitação normal, esperamos que dentro das próximas duas semanas se possa efectivamente assinar a respectiva escritura. Não podemos deixar de estranhar a exigência de juros de mora, uma vez que já foi paga parte substancial do preço, e manifestamente a maior parte do atraso que se verifica se ficou a dever a problemas de natureza burocrática da responsabilidade da sociedade vendedora"

41. Em 17 de Março de 2006, os autores remeteram carta registada com aviso de recepção a GG, sobre o assunto CC Escritura, com o seguinte teor: "No seguimento da v/ carta do passado dia 15, pedimos o favor de nos remeter os seguintes documentos que nos foram pedidos pelo Banco FF para ultimação do processo de marcação da escritura pública de compra e venda: - Elemento identificativos dos Vendedores, ou seja, Certidão da conservatória do registo comercial, fotocópia dos BI dos representantes da sociedade, fotocópia do cartão de pessoa colectiva e outros documentos que comprovem os poderes de representação, se for caso disso, actas ou procurações: - Licença de Utilização; - Ficha Técnica de Habitação. Esperamos qua muito curto prazo voltar ao V/contacto para a marcação da data da escritura que nos será proposta pelo Banco FF."

42. Na mesma data de 17 de Março de 2016, GG, remeteu aos autores carta registada com aviso de recepção, com o seguinte teor:

"Conforme o solicitado na V/carta de 17 de Março do corrente ano, serve a presente para proceder ao envio ao envio - dos elementos identificativos da sociedade vendedora (Certidão De Registo Comercial), bem como os bilhetes de identidade e cartões de contribuinte dos seus administradores. -Fotocópia do cartão de pessoa colectiva. - Licença transmitida pela M/ Cliente, V. Exas. Há muito que estão na posse destes documentos, no entanto nada obsta a que volte a facultá-los. Mais lhes solicito urgência na marcação da Escritura Pública de compra e venda"

43. Em 9 de Dezembro de 2005, o autor marido remeteu a EE, com conhecimento a HH, da ré, com o Assunto: Cumprimento das condições acordadas para a venda do andar prometido comprar à CC, com a sua mediação, carta com o seguinte teor: "Deplorando veementemente a forma displicente e enganosa como tratou comigo o assunto em epígrafe, venho no entanto informá-lo de que, aguardarei durante mais 15 dias pela reposição da situação nos termos por nós acordados e testemunhados por terceiros, ou seja: - Fornecer a seu custo e responsabilidade os electrodomésticos da marca DD para a cozinha do andar por mim prometido comprar (placa de fogão, exaustor, forno, máquina de lavar loiça, maquina de lavar roupa, frigorifico combinado e micro ondas, tudo de encastrar); Custear e responsabilizar-se pelo encerramento da garagem cm box, com uma parede e uma porta de correr ou um basculante a tratar das autorizações oficiais e do condomínio para que tal possa acontecer no mais breve prazo possível. Registo entretanto que, se bem que com uma ligação de canalização por realizar, o armário com lavatório embutido que V. Ex. se comprometeu também a incluir no preço acordado e que encomendou ao Sr. II já está montado. Se bem que algumas deficiências de acabamentos ainda persistam, os dois itens acima indicados são os de mais vultuosa importância e impedem-me de usufruir do andar nas devidas condições. E por isso que, se até ao final daquele prazo a atitude de V. Exa. se mantiver inalterável, não me resta senão recorrer a todos os meios judiciais e administrativos ao meu alcance para a reparação dos danos causados pelo incumprimento, que, repito, pode ser testemunhados por várias pessoas."

44. O Senhor EE era promotor imobiliário, o qual procedeu à venda de alguns dos apartamentos que a ré tinha construído no prédio urbano formado pelos Blocos A e B, situado na Rua de …, n.° …, nas Pedreiras, freguesia de Alcabideche, concelho de Cascais.

45. Os autores intentaram a presente acção no dia 16 de Outubro de 2006.


4. Tendo em conta o disposto no nº 4 do art. 635º, do Código de Processo Civil, no recurso da A. estão em causa as seguintes questões:

- Obrigação da R. de atribuição de determinados lugares de parqueamento e arrecadação e pelo fecho em box de um daqueles lugares (conclusões a) e b) da parte final das alegações da A.);

- Obrigação da R. de instalação de electrodomésticos da marca DD na fracção vendida (conclusões a) e b) da parte final das alegações da A.);

- Direito à indemnização peticionada (conclusão c) da parte final das alegações da A.).


Esclareça-se que, além das questões indicadas, não tem cabimento apreciar a pretensão final da A., assim apresentada: “porque o enquadramento jurídico não foi, com o devido respeito, correctamente aplicado, deve ser dado provimento ao presente recurso, mandando-se reapreciar a questão suscitada pela recorrente em 1ª Instância, dada a matéria dada como provada, que poderá, depois de reapreciada dar como procedente parcialmente o pedido da recorrente a essa matéria em virtude do provimento dado à questão da falta de existência de caducidade no caso sub judice”. Com efeito, no nosso direito o sistema de recursos é substitutivo e não cassatório pelo que o tribunal de recurso, dentro da sua competência, profere uma nova decisão que substitui a decisão recorrida (cfr. Ribeiro Mendes, Recursos em Processo Civil, 2009, pág. 52, e Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2014, págs. 29 e ss.). Nos termos do art. 682º, nº 1, do CPC, “Aos factos materiais fixados pelo tribunal recorrido, o Supremo Tribunal de Justiça aplica definitivamente o regime jurídico que julgue adequado” pelo que o processo só volta ao tribunal recorrido nas hipóteses em que o Supremo Tribunal entenda que a decisão de facto podia e devia ser ampliada (nº 3, do art. 682º, do CPC), hipótese que não se aplica ao caso dos autos.


5. Também para o efeito do nº 4 do art. 635º, do CPC, no recurso do R. as questões são as seguintes:

- Direito dos AA. à reparação dos defeitos da fracção identificados nos factos provados 18. a 30.;

- Direito dos AA. à reparação do piso da fracção em pedra Moleanos correspondente ao defeito identificado no facto provado 31.


Apreciando o recurso da A.:

6. Quanto à questão de saber se a R. se obrigou perante os AA. a atribuir-lhes determinados lugares de garagem e arrecadação e neles construir uma box, relevam os seguintes factos provados:

1. Por escritura pública lavrada no dia 26 de Abril de 2006, a ré declarou vender à autora e o autor marido declarou comprar por si e na qualidade de procurador da autora a fracção autónoma, designada pela letra "G", que corresponde ao Bloco A, quarto piso, segundo andar direito, um fogo com dois estacionamentos designados por "P23" e "P24" e uma arrecadação designada por "A 12", no primeiro piso (cave), do prédio urbano formado pelos Blocos A e B, situado na Rua de …, n.° …, nas Pedreiras, freguesia de Alcabideche, concelho de Cascais, descrito na 2.ª Conservatória do Registo Predial de Cascais sob o n.° …29, daquela freguesia, pelo preço de € 175.000, sendo € 125.000 pagos com dinheiro da autora sua representada, e o restante mediante empréstimo contraído pelos autores no mesmo acto.

2. A fracção autónoma referida em 1. consta descrita na 2.ª Conservatória do Registo Predial de Cascais, sob o n.° …29-G, da freguesia de Alcabideche e corresponde ao Bloco A, quarto piso, segundo andar direito, sendo constituída por um fogo com dois lugares de estacionamento designados por "P23" e "P23" [rectius “P24”] e uma arrecadação designada por 'A12" no primeiro piso (cave).

(…)

4. Os autores habitam a fracção referida em 1. desde Dezembro de 2005 e até 14 de Maio de 2006 ocuparam nos locais actualmente sinalizados como estacionamentos "P21" e "P22", e arrecadação "AIO".

5. Em 17 de Janeiro de 2006, a ré remeteu carta dirigida aos condóminos e proprietários do prédio referido em 1., que os autores receberam solicitando que os lugares de estacionamento e arrecadações fossem ocupados em conformidade com a planta de constituição da propriedade horizontal.

(…)

12. Aquando das visitas ao local enquanto negociava com os autores, o Senhor EE afirmou que os estacionamentos da fracção "P23" e "P24" e a arrecadação "A12", estavam localizados nos locais actualmente sinalizados como estacionamentos "P21" e "P22", e arrecadação "AIO".

13. Na mesma ocasião, o Senhor EE acordou com os autores que um dos estacionamentos da fracção seria fechado em box, por meio da montagem de uma parede divisória e de uma porta de correr com respectivo motor eléctrico.

14. O que seria a expensas da ré segundo informação dada pelo Senhor EE aos autores.

(…)

44. O Senhor EE era promotor imobiliário, o qual procedeu à venda de alguns dos apartamentos que a ré tinha construído no prédio urbano formado pelos Blocos A e B, situado na Rua de …, n.° …, nas Pedreiras, freguesia de Alcabideche, concelho de Cascais.


Quanto ao problema de saber se os AA. têm direito sobre os lugares de parqueamento e à arrecadação que lhes foram inicialmente atribuídos, ainda que não coincidentes com a planta de constituição da propriedade horizontal, a resposta é naturalmente negativa. A alteração do título constitutivo da propriedade horizontal só ser feita “por escritura pública ou por documento particular autenticado, havendo acordo de todos os condóminos” (art. 1419º, nº 2, do Código Civil). Relativamente à questão de saber se os AA. têm direito a ser compensados pelo facto de a R. não ter procedido ao “fecho em box” de um dos lugares de parqueamento como fora garantido pelo mediador imobiliário, EE, há que averiguar se os compromissos por este assumidos vinculam ou não a R. vendedora perante os AA. compradores.

Alega a A. que, ao abrigo do art. 800º do CC, a R. seria responsável pela conduta do mediador imobiliário que teria actuado como auxiliar independente. Não é esta, porém, a questão jurídica em causa. Na verdade, um mediador imobiliário pode funcionar como auxiliar independente do cumprimento das obrigações do vendedor. Mas no caso em análise não se trata do cumprimento de uma obrigação, mas sim de apurar se a conduta do mediador fez nascer alguma obrigação do vendedor. Ora, “a mediação caracteriza-se pela intermediação entre o comprador e o vendedor, ou entre as partes num outro negócio que não a compra e venda, em que o intermediário – o mediador – aproxima as partes no negócio, põe-nas em presença, por vezes até intervém na negociação para o promover, mas não participa no negócio. (…) Na sua versão mais típica – no cerne do tipoo mediador não atua por conta de nenhuma das partes embora seja contratado por uma delas, por instrução de quem procura e encontra a outra; sucede também que atue por conta de ambas as partes. Mas o mediador nunca representa qualquer delas e não intervém no negócio que vem a ser celebrado.” (Pais de Vasconcelos, Direito Comercial, Vol. I, 2011, pág. 197. No mesmo sentido, cfr. Pinto Monteiro, Direito Comercial – Contratos de distribuição comercial, 2002, pág. 102, e Menezes Cordeiro, “Do contrato de mediação”, in O Direito, 2007, III, pág. 517). Menezes Cordeiro (cit., pág. 541) distingue, a respeito do contrato de mediação em geral entre a mediação pura e a mediação mista ou combinada. Na primeira “o mediador obriga-se, simplesmente e numa situação de independência e de equidistância em relação às partes, a conseguir a celebração de certo negócio definitivo”. Na mediação mista ou combinada, “o mediador, para além dos serviços de mediação propriamente dita, exerce ainda uma actuação por conta de outrem (mandato), podendo igualmente assumir outros serviços: desde publicidade à prestação de apoio jurídico.” O mesmo autor admite que “a mediação mista pode ser uma actuação interessada, no sentido do solicitador ao qual, inclusive, o mediador poderá estar ligado, institucionalmente ou por contrato, incluindo, até poderes de representação. Já não será uma verdadeira mediação: poderemos falar em mediação imprópria.”

Que na mediação imobiliária o mediador não representa a parte que o contratou resulta também da jurisprudência deste Supremo Tribunal. Nas palavras do acórdão de 15 de Fevereiro de 2012: “a sociedade Ré, na qualidade de mediadora, nunca pode ser considerada, como sustentam os Autores/Recorrentes, representante das Rés promitentes vendedoras e não poderia de modo algum, mesmo que houvesse lugar à anulação do contrato-promessa, ser-lhe imposta co-responsabilidade solidária pela restituição do sinal pago” (proc. nº 5223/05.3TBOER.L1.S1, www.dgsi.pt).

Deste modo, em abstracto seria possível que o mediador fosse simultaneamente mandatário do vendedor ou até mesmo um seu representante, hipótese em que já não se estaria perante uma mediação verdadeira e própria. Certo é que a conduta do mediador apenas vincularia o vendedor se este tivesse atribuído àquele poderes de representação, o que, no caso dos autos, não foi nem alegado nem provado.

A R. vendedora não se encontra, assim, vinculada pelas promessas feitas pelo mediador EE. Só o mediador poderia ser responsabilizado por tais promessas (concretamente quanto ao encerramento de um parqueamento em box), designadamente por eventual violação dos deveres a que se encontra adstrito pelo regime legal que regula a actividade de mediação imobiliária, que, à data dos factos dos autos, era o Decreto-Lei nº 211/2004, de 20 de Agosto. No art. 16º, nº 1, deste diploma dispõe-se: “A empresa de mediação é obrigada a: c) Obter informação junto de quem a contratou e fornecê-la aos interessados de forma clara, objectiva e adequada, nomeadamente sobre as características, composição, preço e condições de pagamento do bem em causa; d) Propor com exactidão e clareza os negócios de que forem encarregadas, procedendo de modo a não induzir em erro os interessados.” A eventual violação destes deveres apenas pode responsabilizar o próprio mediador e não quem o contratou, neste caso a R. vendedora.


7. Relativamente à questão de saber se a R. se encontra obrigada à instalação de electrodomésticos da marca DD na fracção vendida aos AA., relevam os seguintes factos provados:

3. A ré não entregou electrodomésticos aos autores.

(…)

7. Aquando da negociação da compra referida em 1., o Senhor EE, enquanto promotor imobiliário, informou os autores que o preço de aquisição da fracção incluía a instalação completa de electrodomésticos da marca DD na cozinha.

8. Existia uma placa promocional, exposta no exterior dos blocos que constituem o prédio, dizendo que os imóveis para venda eram equipados com cozinha DD.

9. O Senhor EE combinou com os autores que a escolha dos electrodomésticos seria efectuada em deslocação a estabelecimento comercial.

10. Tais electrodomésticos constavam de: Um forno, modelo H4641 BP KAT Inox; Uma Placa da Gás, modelo KM 361 G; Um exaustor DA 3060; Uma máquina de Lavar Louça, G 1830 SC; -Um KF 888 iNid-1; Uma máquina de lavar Roupa modelo W 2659 i DIRT; Um microondas modelo M 8261, em Inox, tudo da marca DD.

11. No valor global de € 9.446,98.


Na medida em que a instalação de ele electrodomésticos DD corresponde a um compromisso do mediador imobiliário, a solução do problema seria, só por si, idêntica à da questão anterior: a conduta do mediador imobiliário não vincula a R. vendedora.

Temos, porém, que atender aqui à circunstância de ter ficado provado que “Existia uma placa promocional, exposta no exterior dos blocos que constituem o prédio, dizendo que os imóveis para venda eram equipados com cozinha DD.” Não está já em causa a conduta do mediador, mas a conduta da própria R. vendedora, na medida em que não se contestou que tenha sido esta a colocá-la, na qualidade de promotora imobiliária.

A existência de tal placa anunciando que as cozinhas das fracções autónomas à venda seriam equipadas com electrodomésticos DD integra, por si mesma, uma declaração negocial da R. vendedora, enquanto declaração expressa feita por escrito (art. 217º, nº 1, do CC). Na verdade, A existência de uma declaração negocial é determinada através das regras da interpretação (…) que, num processo incindível, decide não apenas sobre o conteúdo da declaração negocial, mas também sobre a sua existência, seja esta expressa ou tácita (…). Assim, como bem nota P. Mota Pinto [Declaração tácita e comportamento concludente, 1995, págs. 553 e seg.], o CC adotou um conceito amplo de declaração: ‘é declaração negocial qualquer forma de comportamento que de acordo com os critérios interpretativos tenha significado negocial’» (Evaristo Mendes / Fernando Sá, Comentário ao Código Civil – Parte Geral, Univ. Católica Editora, 2014, pág. 489).

Ora, em matéria de interpretação da declaração negocial, vigora no nosso direito a teoria da impressão do destinatário (art. 236º, nº 1, do CC), sempre que por este não seja conhecida a vontade real do declarante (art. 236º, nº 2, do CC): “A vontade negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele.” Nas palavras de Carlos Ferreira de Almeida (Contratos, IV – Funções. Circunstâncias. Interpretação, 2014, pág. 262), O sentido relevante é aquele que se considere corresponder à compreensão do comportamento do declarante, segundo um padrão de normal diligência, atenção e racionalidade, tendo em conta a projeção tipológica da personalidade do declarante real e as circunstâncias concretas que envolveram a declaração negocial. (…) A impressão do declaratário tem o alcance de uma compreensão presumida com base em fatores contextuais escolhidos pelo intérprete, observador da concreta interação comunicativa, pessoa exterior ou ato para quem o ato já é passado.” Não oferece dúvidas que a existência de “uma placa promocional, exposta no exterior dos blocos que constituem o prédio, dizendo que os imóveis para venda eram equipados com cozinha DD” constitui simultaneamente um factor de atracção de potenciais interessados na aquisição das fracções e um elemento que integra a declaração negocial da R. vendedora. É esse o sentido que corresponde à compreensão do comportamento do declarante, segundo um padrão de normal diligência, atenção e racionalidade. E a R. declarante vendedora não podia deixar de razoavelmente contar com esse sentido. Encontra-se, pois, a R. vinculada à instalação dos electrodomésticos DD, estando obrigada a indemnizar os AA. pela violação desta obrigação.

Também pelo regime próprio de publicidade a bens e serviços se chega ao apuramento da responsabilidade da R. perante os AA. Com efeito, a colocação, junto ao prédio no qual se situa a fracção autónoma, de uma placa indicando que as cozinhas das fracções autónomas à venda seriam equipadas com electrodomésticos DD integra o conceito legal de publicidade do art. 3º, nº 1, alínea a), do Código de Publicidade: Considera-se publicidade, para efeitos do presente diploma, qualquer forma de comunicação feita por entidades de natureza pública ou privada, no âmbito de uma actividade comercial, industrial, artesanal ou liberal, com o objectivo directo ou indirecto de: a) Promover, com vista à sua comercialização ou alienação, quaisquer bens ou serviços”. Estando em causa um acto publicitário, encontra-se sujeito ao princípio da veracidade (art. 10º, nº 1, do Código de Publicidade) que impõe que “A publicidade deve respeitar a verdade, não deformando os factos”, cuja violação faz nascer responsabilidade civil do anunciante: “Os anunciantes, os profissionais, as agências de publicidade e quaisquer outras entidades que exerçam actividade publicitária (…), respondem civil e solidariamente, nos termos gerais, pelos prejuízos causados a terceiros em resultado da difusão de mensagens publicitárias ilícitas” (art. 30º, nº 1, do Código da Publicidade).

Em conclusão, a R. vinculou-se contratualmente a vender a fracção autónoma vendida aos AA. com electrodomésticos DD e deve indemnizá-los pelo não cumprimento desta obrigação. Obrigação que sempre resultaria da violação do princípio da veracidade da publicidade acerca das características das fracções em venda.


8. Quanto ao direito à indemnização peticionada, não foram dados como provados factos integrantes dos pedidos formulados sob as alíneas e), f), g) e h) da p.i.. Resta apenas apreciar o pedido de juros de mora que os AA. formularam no sentido de que sejam contados “desde a citação, até efectivo e integral pagamento sobre as quantias peticionadas”. Ora, não existe mora enquanto o crédito não se tornar líquido (art. 805º, nº 3, primeira parte, do CC), não se aplicando aqui a ressalva da segunda parte deste preceito que prevê a constituição da mora desde a citação se estiver em causa responsabilidade civil delitual. No caso dos autos, sobre o crédito correspondente ao valor dos electrodomésticos, assim como sobre os valores de indemnização confirmados, em seguida, na apreciação do recurso do R., são devidos juros de mora desde a data da sentença.


         Apreciando o recurso da R.:

9. Quanto à questão de saber se os AA. têm direito à reparação dos defeitos da fracção identificados nos factos provados 18. a 30., relevam os seguintes factos provados:

1. Por escritura pública lavrada no dia 26 de Abril de 2006, a ré declarou vender à autora e o autor marido declarou comprar por si e na qualidade de procurador da autora a fracção autónoma, designada (…)

(…)

4. Os autores habitam a fracção referida em 1. desde Dezembro de 2005

(…)

34. Os defeitos acima referidos já se verificavam quando os autores foram morar para a fracção, na data referida em 4.

35. Os defeitos acima referidos já se verificavam aquando da escritura referida em 1.

(…)

38. Em 27 de Janeiro de 2006, os autores remeteram à ré carta registada com aviso de recepção, com o seguinte teor: (…). O segundo ponto prende-se com alguns defeitos de obra que foram detectados e cuja reparação desde já solicitamos. Os defeitos em causa são os constantes da lista que se anexa: Lista de defeitos detectados na fracção (Anexo à carta à Tiquino em 27.0J.06) (…)

(…)

45. Os autores intentaram a presente acção no dia 16 de Outubro de 2006.


Está em causa o regime da venda de bens de consumo, estabelecido pelo Decreto-Lei nº 67/2003, de 8 de Abril - à data dos factos, na sua versão originária -, designadamente o respeito pelos prazos previstos no art. 5º, nºs 1, 3 e 4, cujo conteúdo se pode assim sintetizar: “o prazo de duração de garantia ou responsabilidade é de dois ou cinco anos a partir da entrega da coisa móvel ou imóvel, respectivamente (nº1); o prazo para o cumprimento do ónus da denúncia do defeito é de dois meses ou de um ano, consoante a natureza móvel ou imóvel da coisa, a contar da data em que o tenha descoberto ou detectado (nº 2); a caducidade dos direitos (…), se a denúncia não ocorrer tempestivamente, vale dizer, se não for feita dentro do prazo de duração da garantia e até dois meses ou um ano depois de conhecido o defeito da coisa móvel ou imóvel, respectivamente (nº 4, 1ª parte); a caducidade dos direitos, seis meses após a denúncia tempestiva do defeito, verdadeiro prazo de caducidade da acção (nº 4, in fine).” (Calvão da Silva, Venda de bens de consumo, 2003, pág. 95).

No caso dos autos, não se discute que não se esgotara o prazo de garantia de cinco anos a contar da entrega do bem. Quanto ao prazo de denúncia dos defeitos identificados nos pontos 18. a 30., tendo a fracção autónoma sido entregue aos AA. em Dezembro de 2005, tendo ficado provado que esses defeitos já existiam nessa data, e tendo a denúncia dos defeitos sido feita por carta dos AA. de 27 de Janeiro de 2006, também não se esgotara, à data da denúncia, o respectivo prazo de um ano. O problema coloca-se quanto ao prazo de caducidade para a interposição da acção, de seis meses após a denúncia tempestiva. Tal prazo terminaria em 27 de Julho de 2006 pelo que, na data da propositura da acção (16 de Outubro de 2006), o direito dos AA. já teria caducado. Contudo, bem andou o acórdão recorrido ao entender que, num caso em que o vendedor do imóvel foi simultaneamente o construtor do mesmo, se aplicava antes o prazo de caducidade de um ano após a denúncia, conforme previsto no art. 1225º, nº 1, 2ª parte, do CC (“a indemnização deve ser pedida no ano seguinte à denúncia”). É orientação da jurisprudência deste Supremo Tribunal (acórdão de 24 de Abril de 2012, proc. 2565/10.0TBSTB.S1. www.dgsi.pt), que “Prescrevendo o art. 5.º do DL 67/2003, de 8 de Abril (Venda de bens de consumo e das garantias a ela relativas), na redacção originária, que o comprador (consumidor) pode exercer o direito de reposição da falta de conformidade do bem com o contrato, por meio de reparação ou de substituição, alem do mais, dentro do prazo de cinco anos a contar da data da entrega do imóvel, devendo denunciar ao vendedor tal defeito no prazo de um ano a contar da data em que o tenha detectado, caducando os direitos conferidos ao consumidor findos qualquer destes prazos sem que o mesmo tenha feito a denúncia ou decorridos seis meses sobre esta. Ora, sendo menor o prazo concedido por este diploma legal para o exercício dos direitos por banda do comprador, poderá o mesmo, contudo, intentar a acção na medida em que o direito comum lhe seja mais favorável pela previsão de prazo mais longo para esse efeito, como acontece na empreitada (art. 1225.º). Assim sucedendo dada a natureza da protecção mínima estabelecida pelo citado DL 67/2003, interpretado em conformidade com a Directiva nº 1999/44/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de Maio de 1999 (art. 8.º)”. Nas palavras de Romano Martinez (Direito das Obrigações – Contratos, 2007, pág. 145) – escritas na vigência da redacção originária do Decreto-Lei nº 67/2003, aplicável aos autos - “se o vendedor do imóvel foi quem o construiu, modificou ou reparou, aplicam-se as regras da empreitada, nos termos dos quais a garantia é de cinco anos a contar da entrega (art. 1225º, nº 1 CC), sendo o prazo para interpor a acção judicial de um ano desde a denúncia (art. 1225º, nº 2 CC)”.

Assim, não caducou o direito dos AA. a obterem compensação para reparação dos defeitos identificados nos pontos 18. a 30. dos factos provados.

Também aqui incidem juros de mora sobre o valor da compensação desde a data da sentença (art. 805º, nº 3, primeira parte, do CC).


10. Quanto à questão do direito dos AA. à reparação do piso da fracção em pedra Moleanos, correspondente ao defeito identificado no facto provado 31., relevam os seguintes factos provados:

1. Por escritura pública lavrada no dia 26 de Abril de 2006, a ré declarou vender à autora e o autor marido declarou comprar por si e na qualidade de procurador da autora a fracção autónoma, designada pela (…)

(…)

4. Os autores habitam a fracção referida em 1. desde Dezembro de 2005 (…)

31. A pedra Moleanos que reveste o chão do hall de entrada, do corredor, do hall dos quartos e das casas de banho apresenta manchas e humidade.

(…)

34. Os defeitos acima referidos já se verificavam quando os autores foram morar para a fracção, na data referida em 4.

35. Os defeitos acima referidos já se verificavam aquando da escritura referida em 1.

(…)

45. Os autores intentaram a presente acção no dia 16 de Outubro de 2006.


O problema do direito dos AA. à reparação do piso em pedra Moleanos coloca-se de forma distinta em relação aos demais defeitos, porque, tendo sido feita prova de que tal defeito existia já à data da entrega da coisa (Dezembro de 2005) não foi o mesmo denunciado pelos AA. em momento anterior ou concomitante à celebração da escritura pública de compra e venda da fracção autónoma. Ora, nos termos do art. 2º , nº 3, do Decreto-Lei nº 67/2003, “Não se considera existir falta de conformidade [com o contrato], na acepção do presente artigo, se, no momento em que for celebrado o contrato, o consumidor tiver conhecimento dessa falta de conformidade ou não puder razoavelmente ignorá-la (…)”. Nas palavras de Calvão da Silva (cit., pág. 69), “O que está em causa não é propriamente a inexistência de falta de conformidade. Se, na conclusão do contrato, o comprador conhece ou não pode razoavelmente ignorar a não conformidade – defeitos aparentes, visíveis, ictu oculi -, no circunstancialismo do caso, do que se trata é da não responsabilização do vendedor por esse defeito. Em última instância, porque o consumidor aceita o produto tal qual é, a sua entrega será conforme ao contrato (coincidência de Istbeschaffenheit e Sollbeschaffenheit), pelo que o comprador não poderá prevalecer-se dos direitos resultantes da falta de conformidade.”

Não se trata, pois, da questão da caducidade do direito dos AA. pelo decurso de um prazo, mas mais radicalmente, da inexistência desse direito pelo facto de, no momento da celebração do contrato de compra e venda, os AA. terem tido conhecimento do defeito do piso ou não poderem razoavelmente ignorá-lo, e, em consequência, se presumir que aceitam o bem tal como ele está.


11. Concede-se parcialmente a revista da A, condenando-se a R. ao pagamento da quantia de €9.446,98, correspondente ao valor dos electrodomésticos DD. Sobre esta quantia e sobre o montante correspondente à reparação dos defeitos identificados nos pontos 18. a 30. dos factos provados são devidos juros desde a data da sentença.

Concede-se parcialmente a revista da R., absolvendo-se a R. do pagamento da reparação do piso em pedra Moleanos, e custo da respectiva colocação.

No mais, mantém-se a decisão recorrida.


Custas da revista na proporção de 2/3 para a A. e de 1/3 para a R.

Custas da acção na proporção do decaimento e do vencimento.


Lisboa, 11 de Fevereiro de 2016


Maria da Graça Trigo (Relator)

Bettencourt de Faria

João Bernardo