Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
1320/11.4TVLSB.L1.S1
Nº Convencional: 2ª SECÇÃO
Relator: JOÃO TRINDADE
Descritores: ALTERAÇÃO ANORMAL DAS CIRCUNSTÂNCIAS
CONTRATO DE COMPRA E VENDA
RESOLUÇÃO DO NEGÓCIO
MODIFICAÇÃO
RISCO
Data do Acordão: 03/30/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO CIVIL - DIREITO DAS OBRIGAÇÕES / FONTES DAS OBRIGAÇÕES / CONTRATOS / ALTERAÇÃO DAS CIRCUNSTÂNCIAS / RESOLUÇÃO DO CONTRATO.
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 432.º, N.º 2, 437.º, 438.º.
Sumário :
I - Embora a crise económica que afectou o nosso país seja um facto notório, não é, por si só, suficiente para que se possa recorrer, sem mais, ao instituto da alteração anormal das circunstâncias previsto no art. 437.º do CC, sendo antes necessário que haja uma correlação directa, que seja factualmente demonstrada, entre a crise económica geral e a actividade económica concreta de determinado agente económico.

II - Para que seja possível a resolução ou, ao menos, a modificação das cláusulas do contrato fundada na alteração anormal das circunstâncias, mister se torna que: (i) a alteração ocorrida não seja o desenvolvimento previsível de uma situação conhecida à data da celebração do contrato; (ii) essa alteração torne o cumprimento da obrigação ofensivo dos princípios da boa fé; e (iii) não esteja coberta pelos riscos próprios do contrato.

III - É próprio dos contratos de compra e venda de imóveis, com opção de recompra em determinado prazo, o risco de o vendedor não conseguir exercer o direito de opção de (re)compra quando apenas se propôs recomprar se e quando encontrasse interessado na compra do bem, por valor superior ao da recompra.

IV - A possibilidade de o vendedor não exercer os referidos direitos de opção, apesar de ser um cenário indesejado, não era um cenário que as partes pudessem não ter previsto no momento em que celebraram os contratos, sendo que as circunstâncias em que as partes fundaram a decisão de contratar só são relevantes para efeitos de revisibilidade ou resolubilidade do negócio se forem comuns a ambas.

V - Não resultando dos referidos contratos que o vendedor tivesse a obrigação de recomprar em determinado prazo, mas antes apenas que tinha a opção, ou seja, o direito de o fazer, não há obrigação que se possa exigir (e cujo cumprimento pudesse afectar gravemente os princípios da boa fé), nem espaço para a aplicação do art. 437.º do CC por falta de verificação dos respectivos pressupostos.

VI - Mesmo que se verifiquem os pressupostos da resolução, a parte que não esteja em condições de restituir o que houver recebido não tem o direito de resolver o contrato (art. 432.º, n.º 2, do CC).

Decisão Texto Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:


1 - AA - Investimento Turístico e Imobiliário, S.A. intentou,

 contra BB - Fundo de Investimento Imobiliário, gerido e legalmente representado pela CC Mangement - Sociedade Gestora de Fundos Investimento Mobiliário, S.A. e DD - Fundo de Investimento Imobiliário, gerido e legalmente representado também pela CC Management,

acção de condenação, com processo ordinário, pedindo,

- i) Seja declarada a nulidade dos contratos de compra e venda celebrados pela Autora e pelo 1.º Réu, relativos às fracções designadas pelas letras AB-B, AB-C, AB-D, AB-E, AB-F, AB-G, AB-H, AB-I, AB-L, AB-M, AB-N e AB-O, que constituem o Lote 33, às fracções designadas pelas letras AC-A, AC-B, AC-D, AC-E, AC-F, AC-G, AC-H, AC-I, AC-J, AC-L, AC-M, AC-N, AC-O e AC-P, que constituem o Lote 34, às fracções designadas pelas letras “L” do lote 18, “N” do Lote 20, às fracções designadas pelas letras “X-I”, “X-J”, “X-M” e “X-N”, todas integrantes do Lote 29, às fracções designadas pelas letras AE-A, AE-B, AE-C, AE-D, AE-E, AE-F, AE-G, AE-H, AEI, AE-J e AE-L que constituem o Lote 36, e às fracções designadas pelas letras AD-A, AD-B, AD-C, AD-E, AD-F, AD-G, AD-H, AD-I, AD-J, AD-L, AD-M e AD-N que constituem o Lote 35, todas estas descritas na Certidão de Registo Predial de Cascais, inscritas na Conservatória sob o n.º 02…/05…, Y, …, bem como dos contratos de reserva celebrados sobre estas mesmas fracções;

ii) Seja declarada a nulidade dos contratos de compra e venda celebrados pela Autora e pelo 2.º Réu, relativos às fracções designadas pelas letras YA, YB, YC, YD, YE, YF, YG, YH e YI, que constituem o Lote 30, e às fracções designadas pelas letras ZA, ZB, ZC, ZD, ZE, ZF, ZG e ZH, que constituem o Lote 31, todas estas descritas na Certidão de Registo Predial de Cascais, inscritas na Conservatória sob o n.º 02…/05…, Y, …, bem como dos contratos de reserva celebrados sobre estas mesmas fracções;

Subsidiariamente

iii) Caso se entenda que os negócios jurídicos celebrados pela Autora com os Réus não são nulos, seja reconhecida a alteração anormal das circunstâncias e em consequência declarada a resolução dos contratos celebrados entre Autora e Réus (compras e vendas e contratos de reserva) com as consequências legais nos termos do Artº 437º do Código Civil; ou

Subsidiariamente relativamente ao pedido anterior

iv) Se se entender que não se justifica a resolução dos contratos peticionada sejam os mesmos ser modificados de acordo com a equidade o que imporá, designadamente, a extensão dos prazos durante os quais a Autora pode readquirir os imóveis supra identificados e a redução das remunerações financeiras e demais encargos suportados pela Autora nos termos dos contratos de reserva.



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2 - Para tanto e em síntese alegou que

- a A. adquiriu um terreno onde se propôs construir e promover um empreendimento imobiliário de luxo, composto por 36 lotes de terreno, subdivididos em 120 unidades de alojamento e 11 outras fracções, umas de utilização comum, outras de exploração turística, que incluíam infra-estruturas gerais, portaria e serviços, espaços verdes, recepção e escritório, estacionamento, ténis, piscina, minimercado, restaurante, apoio desportivo;

- em 19/05/1999 foi celebrado com o então EE um mútuo de 1.500.000.000$00 destinado ao financiamento das obras de infraestruturas, garantido por hipoteca sobre a quase totalidade das fracções (entretanto constituídas, mas não construídas);

- o contrato foi celebrado no pressuposto de que o banco financiaria também as unidades de alojamento até que a A. pudesse dispor de proveitos próprios com a venda das mesmas, sabendo o banco que a A. não tinha meios para liquidar as responsabilidades decorrentes do contrato de empréstimo senão depois de construir e comercializar as unidades de alojamento;

- as infraestruturas ficaram concluídas em finais de 2001 e a A. começou a solicitar outros financiamentos cuja concessão o EE foi protelando até que, em 2003, recusou, propondo como alternativa o financiamento através de fundos de investimento geridos pela sociedade gestora detida pelo banco;

- dada a natureza e regime legal dos fundos, a operação teria de passar pela aquisição dos lotes pelos fundos;

- o preço a pagar pelos fundos teria de ser utilizado, em primeiro lugar, para liquidar as responsabilidades decorrentes do empréstimo contraído junto do EE e cancelamento da hipoteca, e, em segundo lugar, para financiar a construção das fracções de utilização comum e de exploração turística;

- a A. ficaria com uma opção de recompra dos lotes vendidos, por cinco anos prorrogáveis;

- assim, entre Novembro de 2003 e Fevereiro de 2007, a A. vendeu aos RR. doze lotes de terreno, compreendendo um total de 88 fracções pelo valor global de € 23.000.000,00;

- paralelamente, a Autora celebrou com os Réus Contratos de Reserva sobre as fracções vendidas, adquirindo uma opção de compra sobre estas, pelo prazo de 5 anos (prorrogável), mediante o pagamento de determinadas remunerações financeiras, que, pagas até Março de 2009, totalizaram € 4.586.614,75;a Autora efectuou e custeou a construção, incluindo projectos e licenciamentos, das 8 fracções imobiliárias de utilização comum (que incluem infraestruturas gerais, portaria e serviços, espaços verdes, recepção e escritório, estacionamento, ténis e piscina) e das 3 fracções imobiliárias de exploração turística; efectuou e custeou a construção, incluindo projectos e licenciamentos de construção e utilização de 27 moradias; assegurou os serviços de manutenção e conservação das propriedades cedidas aos Réus até á presente data, cujo custo não foi seguramente inferior a € 1.100.000; readquiriu 14 fracções pelo valor total de € 6.790.381,09;

- com a contracção económica que se instalou a partir de 2008, a A. não conseguiu readquirir as fracções como esperava e iniciou negociações com os RR. no sentido de prorrogarem os prazos de reaquisição pela A.;

- desde Março de 2009, os RR. não só não recusaram as negociações, como reconheceram por escrito que as circunstâncias económicas impunha a renegociação das condições contratuais;

- até que, por carta de 28/02/2011, os RR. negam-se a equacionar prorrogações de prazos e exigem o pagamento das remunerações financeiras vencidas e não pagas.


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3 - Em sede de contestação, com reconvenção, os RR. alegam, resumidamente, que:

- inexistiram na celebração dos contratos entre as partes quaisquer intenções que não as que naturalmente correspondem às estipulações inseridas nos mesmos contratos;

- a A. não pagou aos RR., desde 2009 até se extinguirem por caducidade ou resolução, os contratos de reserva e os direitos de compra neles previstos;

- a A. embolsou a quantia de € 1.150.000,00, paga pelo 1.º R. com vista à construção de moradias no lote 34 e não as construiu;

- o contrato de reserva relativo ao lote 34 foi resolvido pelo 1.º R. com fundamento em incumprimento pela A., e a A. foi interpelada para restituir a quantia, sem que, até à data, o tenha feito;

- entre 31/12/2009 e 01/08/2011, os contratos de reserva findaram, uns por caducidade pelo decurso do tempo, e outros por resolução declarada pelos RR. com fundamento no incumprimento definitivo da A.;

- os RR. são donos das fracções adquiridas à A. e esta tem recusado a entrega das mesmas, o que impede os primeiros de a venda ou o arrendamento das fracções em causa.

Termina pedindo que a acção seja julgada não provada e improcedente, com a sua consequente absolvição do pedido; e que a reconvenção seja julgada procedente, por provada, devendo, em consequência:

a) Condenar-se a A. a pagar ao Primeiro R. a quantia de € 2.510.649,90 (correspondente à soma das quantias acima especificadas relativas às prestações mensais devidas pela A. como contrapartida dos direitos de compra e não pagas e da quantia paga pelo Primeiro R. ao abrigo da adenda ao contrato de reserva relativo ao lote 34, que a A. não restituiu), acrescida de juros, à taxa legal, desde as datas do vencimento das obrigações, acima assinaladas, até integral embolso, que nesta data se liquidam em € 186.704,29;

b) Condenar-se a A. a pagar ao Segundo R. a quantia de € 221.313,25 (correspondente à soma das quantias acima especificadas relativas às prestações mensais devidas pela A. como contrapartida dos direitos de compra e não pagas), acrescida de juros, à taxa legal, desde as datas do vencimento das obrigações, acima assinaladas, até integral embolso, que nesta data se liquidam em € 26.332,98;

c) Declarar-se extintos por caducidade, conforme acima especificado, os contratos de reserva e os direitos de compra neles previstos relativos aos lotes 18 (fracção autónoma L), 20 (fracção autónoma N), 33 (fracções autónomas ABB, AB-C, AB-D, AB-E, AB-F, AB-G, AB-H, AB-I, AB-L, AB-M, AB-N, ABO), 35 (fracções autónomas AD-A, AD-B, AD-C, AD-D, AD-E, AD-F, ADG, AD-H, AD-I, AD-J, AD-L, AD-M, AD-N) e 36 (frações autónomas AEA, AE-B, AE-C, AE-D, AE-E, AE-F, AE-G, AE-H, AE-I, AE-J, AE-L), e por resolução os contratos de reserva e os direitos de compra neles previstos relativos aos lotes 30 (frações autónomas YA, YB, YC, YD, YE, YF, YG, YH, YI), 31 (frações autónomas ZA, ZB, ZC, ZD, ZE, ZF, ZG, ZH) e 34 (frações autónomas AC-A, AC-B, AC-C, AC-D, AC-E, AC-F, AC-G, AC-H, AC-I, AC-J, AC-L, AC-M, AC-N, AC-O, AC-P), condenando-se a A. a reconhecer a extinção desses contratos e a reconhecer os RR. como proprietários das fracções autónomas relativas a esses lotes acima identificadas;

d) Declarar-se extinto por caducidade o direito de compra previsto na cláusula 10.ª, n.º 3, do documento complementar à escritura pública de compra e venda do lote 29 e a obrigação de não vender ou prometer vender prevista no n.º 4 dessa mesma cláusula, condenando-se a A. a reconhecer a extinção desses direito e obrigação e a reconhecer os RR. como proprietários das frações autónomas X-I, X-J, X-M, X-N, relativas a esse lote;

e) Condenar-se a A. a abster-se da prática de qualquer ato material de uso ou gozo das fracções autónomas acima identificadas relativas aos lotes 18, 20, 29, 30, 31, 33, 34, 35 e 36, incluindo a respectiva promoção para venda a terceiros, visitas ou acessos, cessando toda e qualquer utilização seja de que forma for das mesmas, e a entregar ao Primeiro R. as chaves de acesso às moradias existentes nas fracções autónomas relativas aos lotes 29 e 33 de que este R. é proprietário;

f) Condenar-se a A. a pagar ao Primeiro R., a título de sanção pecuniária compulsória, a quantia de € 500,00, por dia, até ser feita prova da efectiva devolução das chaves de acesso às identificadas fracções relativas aos lotes 29 e 33 e completa cessação da utilização das mesmas.

A A. replicou, pugnando pela improcedência do pedido reconvencional.

Houve tréplica.

Subsequentemente, a A. desistiu do pedido relativamente à fração AB-E do lote 33, e a R. desistiu do pedido reconvencional no que à mesma fracção respeita, a que correspondia o valor proporcional de € 60.070,12 (€ 53.323,27 a título de capital e € 6.746,85 a título de juros vencidos à data da contestação).

Em consequência, o primeiro pedido reconvencional passa a: a) Condenar-se a A. a pagar ao Primeiro R. a quantia de € 2.457.326,63 (correspondente à soma das quantias acima especificadas relativas às prestações mensais devidas pela A. como contrapartida dos direitos de compra e não pagas e da quantia paga pelo Primeiro R. ao abrigo da adenda ao contrato de reserva relativo ao lote 34, que a A. não restituiu), acrescida de juros, à taxa legal, desde as datas do vencimento das obrigações, acima assinaladas, até integral embolso, que nesta data se liquidam em € 179.957,44.


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4 - Foi proferido despacho que saneou o processo e fixou os factos tidos como provados, elaborando-se base instrutória com os que subsistiam como controvertidos.


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5 - Após realização da audiência de discussão e julgamento foi proferida sentença em que julgando

a acção totalmente não provada e improcedente, absolveu os RR. dos pedidos;

a reconvenção procedente por provada e, em consequência foi condenada a A:

a). a pagar ao Primeiro R. a quantia de € 2.457.326,63 (correspondente à soma das quantias relativas às prestações mensais devidas pela A. como contrapartida dos direitos de compra, e não pagas, e da quantia paga pelo Primeiro R. ao abrigo da adenda ao contrato de reserva relativo ao lote 34, que a A. não restituiu), acrescida de juros, à taxa legal, desde as datas do vencimento das obrigações, acima assinaladas, até integral embolso, que na data da contestação importavam em € 179.957,44.

b) a A. a pagar ao Segundo R. a quantia de € 221.313,25 (correspondente à soma das quantias relativas às prestações mensais devidas pela A. como contrapartida dos direitos de compra e não pagas), acrescida de juros, à taxa legal, desde as datas do vencimento das obrigações, acima assinaladas, até integral embolso, que na data da contestação importavam em € 26.332,98;

c) Declarados extintos por caducidade os contratos de reserva e os direitos de compra neles previstos relativos aos lotes 18 (fracção autónoma L), 20 (fracção autónoma N), 33 (fracções autónomas ABB, AB-C, AB-D, AB-F, AB-G, AB-H, AB-I, AB-L, AB-M, AB-N, ABO), 35 (frações autónomas AD-A, AD-B, AD-C, AD-D, AD-E, AD-F, ADG, AD-H, AD-I, AD-J, AD-L, AD-M, AD-N) e 36 (fracções autónomas AEA, AE-B, AE-C, AE-D, AE-E, AE-F, AE-G, AE-H, AE-I, AE-J, AE-L), e por resolução os contratos de reserva e os direitos de compra neles previstos relativos aos lotes 30 (fracções autónomas YA, YB, YC, YD, YE, YF, YG, YH, YI), 31 (fracções autónomas ZA, ZB, ZC, ZD, ZE, ZF, ZG, ZH) e 34 (fracções autónomas AC-A, AC-B, AC-C, AC-D, AC-E, AC-F, AC-G, AC-H, AC-I, AC-J, AC-L, AC-M, AC-N, AC-O, AC-P), condenando a A. a reconhecer a extinção desses contratos e a reconhecer os RR. como proprietários das fracções autónomas relativas a esses lotes;

d) Declarado extinto por caducidade o direito de compra previsto na cláusula 10.ª, n.º 3, do documento complementar à escritura pública de compra e venda do lote 29 e a obrigação de não vender ou prometer vender prevista no n.º 4 dessa mesma cláusula, condenando a A. a reconhecer a extinção desses direito e obrigação e a reconhecer os RR. como proprietários das frações autónomas X-I, X-J, X-M, X-N, relativas a esse lote;

e) Condenada a A. a abster-se da prática de qualquer ato material de uso ou gozo das fracções autónomas acima identificadas relativas aos lotes 18, 20, 29, 30, 31, 33, 34, 35 e 36, incluindo a respectiva promoção para venda a terceiros, visitas ou acessos, cessando toda e qualquer utilização seja de que forma for das mesmas, e a entregar ao Primeiro R. as chaves de acesso às moradias existentes nas fracções autónomas relativas aos lotes 29 e 33 de que este R. é proprietário;

f) Condenada a A. a pagar ao Primeiro R., a título de sanção pecuniária compulsória, a quantia de € 500,00, por cada dia de atraso na devolução das chaves de acesso às identificadas fracções relativas aos lotes 29 e 33.


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6 - Inconformada, recorreu desta decisão a Autora.


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7 - A Relação julgou improcedente a apelação.


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8. É desta decisão que foi interposta revista pela A., que encerra as alegações com as seguintes conclusões:

1ª- O Acórdão recorrido é nulo por omissão de pronúncia relativamente à questão especificamente suscitada na conclusão 28.ª das alegações do recurso de apelação, verificando-se portanto a nulidade prevista no artigo 615.°, n.° 1, alínea d) do CPC.

2ª Atentos os factos provados - Factos 37 a 39, 100, 106, 122 a 125 - o pedido reconvencional de "devolução" da quantia de € 1.150.000,00 acrescida de juros deve ser julgado improcedente, uma vez que o que está demonstrado é que a Autora cumpriu as obrigações a que estava adstrita no âmbito do aditamento referido em 37.

3ª Está provado que em Setembro de 2008 se deu uma alteração das circunstâncias relevante (Facto 56) e que a Autora não estava em mora nessa data o que apenas se veio a verificar em Março de 2009 (Facto 57) e precisamente já por efeito da alteração das circunstâncias (Facto 103-B) e assim o Acórdão recorrido é nulo por contradição entre os fundamentos e a decisão, e consequente violação do disposto no artigo 615.°, n.° 1, alínea c), do CPC quando dispõe que "a existência de mora pela banda da autora que como ficou assente cessou o pagamento das remunerações devidas em março de 2009 (...) torna até inútil a apreciação da verificação dos demais requisitos do instituto. "

4ª Comparadas as fundamentações da sentença proferida na l.ª instância e do Acórdão recorrido resulta evidente que na 1ª instância a ratio decidendi assentou na suposta não verificação dos pressupostos exigidos pelo artigo 437.° do Código Civil, enquanto que no Acórdão recorrido, a improcedência da pretensão da Autora assenta única e exclusivamente na aplicação do artigo 438.° do Código Civil.

5ª É, assim, evidente que estamos perante um caso em que a fundamentação que motivou a decisão recorrida do Tribunal da Relação é essencialmente diferente da que presidiu à sentença proferida em primeira instância.

6ª O artigo 438.º do Código Civil dispõe expressamente que a parte lesada só não poderá resolver ou modificar o contrato com base na alteração das circunstâncias se "estava em mora no momento em que a alteração das circunstâncias se verificou”, razão pela qual a decisão recorrida é manifestamente errada e contrária à citada disposição legal atentos os factos provados 56, 57 e 103-B, sendo evidente que in casu não existia qualquer mora do lesado.

7ª Os factos provados 56, 103, 103-A e 103-B demonstram à saciedade que as circunstâncias fundamentais em que as partes aceitaram contratar sofreram uma alteração anormal que não se encontra abrangida pelos riscos próprios do contrato.

8ª Os factos provados 86 a 95 inclusive, 101, 102, 118, 119 e 120 demonstram que a manutenção dos contratos nos termos originalmente estabelecidos envolve grave lesão para a Autora ora Recorrente e que tal manutenção afectaria gravemente os princípios da boa-fé.

9ª O Acórdão recorrido encontra-se, quanto à concreta questão da mora relevante para efeitos do Art° 438° do Código Civil, em directa contradição com o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, no processo n.° 1770/08.3TBFAR.L1-7, datado de 11-09-2012, publicado em www.dgsi.pt, do qual não foi interposto recurso pelo que transitou em julgado, tendo baixado à 1ª instância em 6-11-2012, encontrando-se o processo em arquivo sob a ficha n° 1460/169, razão pela qual não foi ainda possível obter certidão do mesmo, que se protesta juntar.

10ª É portanto admissível o recurso de revista excepcional neste caso, o que se alega à cautela para a hipótese, que por zelo de patrocínio de coloca, de não ser admitido o recurso de revista normal.

11ª O presente recurso deverá também ser admitido a título excepcional nos termos das alíneas a) e b) do n° 1 Art° 672° do CPC na medida em que a apreciação das questões suscitadas pelo instituto da alteração das circunstâncias e pela interpretação dos artigos 437° e 438º do Código Civil, pela sua relevância jurídica, é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito e, atentas as circunstâncias do tempo, assume particular relevância social.

12ª Com efeito, a perturbação e destruição causadas pela crise de 2008 na economia e no sistema financeiro - em particular na generalidade das empresas de promoção imobiliária - provocou um volume importante (na quantidade de casos e sobretudo nas consequências práticas para as empresas envolvidas) de litígios em que estão em causa alegações de alteração anormal das circunstâncias, razão pela qual parece imperiosa, em face da disparidade da jurisprudência produzida sobre a matéria -designadamente a corporizada no aludido Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27/01/2015 e no Acórdão ora recorrido que decidem ao arrepio do que era doutrina uniforme - uma intervenção clarificadora do Supremo Tribunal de Justiça que ponha termo à situação de grave incerteza jurídica suscitada pela aplicação da figura da alteração das circunstâncias e em particular da questão da mora da parte lesada.

13ª Em qualquer destas hipóteses deverá decidir-se que apenas releva para efeitos do disposto no Art° 438° do Código Civil a mora que ocorre em momento anterior à alteração das circunstâncias.

 

Termos em que deve o presente recurso de revista ser admitido e julgado procedente, devendo o Acórdão recorrido ser revogado e substituído por decisão que julgue procedente o pedido de resolução ou modificação dos contratos formulado pela A. e improcedentes os pedidos reconvencionais das Rés, assim se fazendo a devida e costumada

Foram apresentadas contra-alegações com as seguintes conclusões:

I - O objecto do presente recurso - a decisão sobre a resolução/modificação dos contratos celebrados entre as partes com fundamento em alteração das circunstâncias — é impossível.

II - Está transitada em julgado (e não está abrangida pelo objecto do presente recurso) a decisão sobre a reconvenção dos Recorridos que declarou extintos os contratos de reserva, seja por caducidade, seja por resolução. Isto por si só impossibilita e inviabiliza a procedência do presente recurso.

III - Não podem ser resolvidos nem modificados por alteração das circunstâncias -que é o objecto do presente recurso -, contratos que foram declarados extintos por decisão judicial transitada em julgado, sob pena de violação do disposto nos artigos 619.° e 625.° do CPC.

Para além disso,

IV - O presente recurso não é admissível — nem pode ser admitido — ao abrigo do disposto no artigo 671.°, n.° 3, do CPC,

V - Porquanto o Acórdão recorrido confirmou, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a Sentença apelada.

VI - Com efeito, o facto de a sentença apelada ter concluído pela impossibilidade de resolução dos contratos por alteração das circunstâncias em virtude do não preenchimento dos "pressupostos positivos" desse instituto e o Acórdão recorrido ter alcançado o mesmo resultado, mas pela não verificação do "pressuposto negativo" da existência de mora da "parte lesada", não constitui "fundamentação essencialmente diferente", para os efeitos do artigo 671.°, n." 3, do CPC.

VII - Donde, havendo dupla conformidade entre as decisões das instâncias, não pode o presente recurso ser admitido como Revista "comum".

Depois,

VII - Também não pode o presente recurso ser admitido como revista excepcional: não estão reunidos os pressupostos invocados pela Recorrente de que dependeria a admissibilidade desse recurso.

VIII - Isto porque, o acordão -fundamento invocado pela Recorrente e o acórdão recorrido não versam, sequer, sobre a mesma questão fundamental de direito, nem sequer a aplicam a mesma norma jurídica ao mesmo núcleo essencial de factos: o primeiro refere expressamente não serem aplicáveis ã factualidade dos autos os pressupostos da alteração das circunstâncias; o segundo, pelo contrário, diz que a aplicação desse regime poder-se-ia cogitar, não fosse o facto de a Recorrente estar em mora.

IX - Em qualquer caso, não se verificaria, sequer, a assinalada contradição. Do Acórdão recorrido não resulta que seja irrelevante, para os efeitos do artigo 438.°, se a mora é anterior ou posterior â alteração das circunstâncias. Pelo contrário: decidiu-se que a mora é relevante porque anterior à eventual alteração das circunstâncias, em linha com o que vem dito — em mero obiter dictum — no Acórdão-fundamento.

X - Donde, o presente recurso não preenche a hipótese legal da alínea c) do n.° 1, do artigo 672.° do CPC, pelo que não deve ser admitido.

Para além disso,

XI - As questões suscitadas pela Recorrente não só não tem relevância jurídica, como é manifestamente desnecessária a intervenção deste Venerando Tribunal para uma melhor aplicação do direito.

XII - É que, não só no caso em apreço a interpretação dada ao artigo 438.° do Código Civil, quanto à mora da "parte lesada" está em linha com o ''entendimento pacífico" da doutrina e jurisprudência sobre a questão.

XIII - Como, para além disso, não se conhece - porque não existe — qualquer divergência doutrinal nem jurisprudencial. Na verdade, a resposta a esta questão é tão simples que diríamos mesmo que se trata de uma "não –questão ".

XIV - Assim, é patente que o recurso não pode ser admitido como revista excepcional ao abrigo da al. a) do n.° 1 do artigo 672.° do CPC — em cuja previsão o presente caso está longe se poder ser subsumível.

Quanto às invocadas nulidades do acórdão recorrido,

XV - O Acórdão ligada à sorte dos pedidos da Autora (...) Assente a validade c a eficácia dos contratos ajuizados não se vê como pode a Autora fugir ao que se obrigou".

XVI - Também não existe qualquer contradição entre os fundamentos e a decisão: como já se disse, seguindo o percurso decisório do Acórdão recorrido, resulta claro que é dada relevância à mora da "parte lesada" porque ela é anterior à alteração das circunstâncias.

XIX - É impossível o objecto — e, bem assim, a procedência — do presente recurso:

a Recorrente quer, com base numa alegada alteração de circunstâncias, a resolução/modificação de contratos que estão extintos, a saber, os de compra e venda pelo cumprimento e os de reserva por caducidade ou resolução (por incumprimento) declaradas por sentença transitada em julgado.

XX - Não pode este Venerando Tribunal, sob pena de ofensa do caso julgado formado nos presentes autos (e violação do disposto nos artigos 619.° e 625.º do CPC), sequer conhecer o mérito do presente recurso: o objecto do mesmo é impossível.

Em qualquer caso, sempre se dirá por mero dever de patrocínio que.

XXI - Não estão provados, nos autos, quaisquer factos que pudessem preencher a hipótese legal da alteração das circunstâncias.

XXII - Donde, não tem a Recorrente o direito de resolver/modificar os contratos celebrados entre as partes.

XXIII - Desde logo, não está preenchido o "pressuposto negativo", qual seja a inexistência de mora da "parte lesada" - a Recorrente constitui-se em mora em Março de 2009; os efeitos da crise, com relevância no que toca à relação das partes, fizeram-se sentir, sobre essa relação depois dessa data.

XXIV - Pelo que não está preenchida a hipótese legal do artigo 438.° do Código Civil, o que como doutamente decidiu o Acórdão recorrido "tomaria até inútil a apreciação da verificação dos demais requisitos do instituto".

Não obstante,

XXV - Também não estão preenchidos os pressupostos positivos do instituto da alteração das circunstâncias.

XXVI - Não houve alteração anormal das circunstâncias em que as partes fundaram a decisão de contratar — i.c, não houve alteração da base do negócio comum a ambas as partes.

XXVII - O facto de as partes terem contratado no pressuposto de que o prazo acordado para o exercício da opção de compra pareceu suficiente não revela que tivessem contratado de forma diversa se soubessem que o não seria.

XXVIII - De resto, a configuração que deram aos contratos - atribuindo à Recorrente a opção de vir a comprar (ou não) os imóveis — revela precisamente que cogitaram como possível a hipótese de "não-recompra" por qualquer causa.

XXIX - Se não tivessem previsto essa hipótese ter-se-iam, ambas, obrigado a vender e a comprar (ou, pelo menos, prometido vir a fazê-lo), O que não foi o caso.

XXX - Também não resultaram provados quaisquer factos subsumíveis no pressuposto do instituto que impõe que tenha havido "lesão gerada pela alteração das circunstâncias". Nem se vê que lesão pudesse a Recorrente ter sofrido: por força dos contratos de reserva ficou a Recorrente titular de direitos potestativos sobre os Recorridos que, por seu turno, se encontravam num estado de sujeição.

XXXI - O que, de resto, se prende com o requisito seguinte: dos contratos de reserva não resulta a obrigação, para a Recorrente, de (re)comprar os imóveis. Portanto, não há uma obrigação cuja exigência pudesse afectar os princípios da boa fé — simplesmente, porque a obrigação inexiste.

XXXII - Por fim os efeitos da eventual alteração das circunstâncias sempre estariam cobertos pelos riscos próprios dos contratos — citando a Sentença Apelada 'V próprio deste negócio o risco de o vendedor não conseguir exercer o direito de opção de (re)compra, quando apenas se propõe recomprar se e quando encontrar interessado na compra do mesmo bem, por valor superior ao da recomprei

XXXIII - Precisamente por haver esse risco - normal e previsível — é que a (re)compra foi juridicamente enquadrada como uma opção, totalmente dependente da vontade/possibilidade da recorrente.

XXXIV - Também não resultaram provados quaisquer factos subsumíveis no pressuposto do instituto que impõe que tenha havido "lesão gerada pela alteração das circunstâncias". Nem se vê que lesão pudesse a Recorrente ter sofrido: por força dos contratos de reserva ficou a Recorrente titular de direitos potestativos sobre os Recorridos que, por seu turno, se encontravam num estado de sujeição.

XXXV - O que, de resto, se prende com o requisito seguinte: dos contratos de reserva não resulta a obrigação, para a Recorrente, de (re)comprar os imóveis. Portanto, não há uma obrigação cuja exigência pudesse afectar os princípios da boa fé — simplesmente, porque a obrigação inexiste.

XXXVI - Por fim os efeitos da eventual alteração das circunstâncias sempre estariam cobertos pelos riscos próprios dos contratos — citando a Sentença Apelada 'V próprio deste negócio o risco de o vendedor não conseguir exercer o direito de opção de (re)compra, quando apenas se propõe recomprar se e quando encontrar interessado na compra do mesmo bem, por valor superior ao da recompra

XXXVII - Precisamente por haver esse risco - normal c previsível — é que a (re)compra foi juridicamente enquadrada como uma opção, totalmente dependente da vontade/possibilidade da recorrente.

XXXVIII - Não fosse esse um risco próprio, normal e até previsto, teriam as partes -repetimos — configurado juridicamente a (re)compra como uma obrigação.

XXXIX - Pelo exposto se conclui que, uma vez que não estão provados quaisquer factos subsumíveis na norma do artº 437.°, n.° 1, do Código Civil, não tem a Recorrente o direito a resolver, nem a modificar os contratos, como bem decidiram as instâncias, no que deve ser mantido por este Supremo Tribunal de Justiça.

Nestes termos e nos demais de direito, deve o presente recurso:

a) ser rejeitado, por o conhecimento do seu objecto estar impossibilitado pelo caso jugado formado nos presentes autos quanto à declaração de extinção dos contratos de reserva;

b) Ser rejeitado, por ser inadmissível, em virtude da dupla conformidade entre as decisões das instâncias, o recurso de revista comum, sendo também inadmissível, em qualquer caso, o recurso de revista excepcional, por não estarem verificados        os respectivos pressupostos;

Caso assim não se entenda,

Deve o presente recurso ser julgado totalmente improcedente por não provado e, consequentemente, confirmado o Acórdão recorrido .


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9 - Matéria de facto:

1. A Autora é uma sociedade comercial que tem por objecto, nomeadamente, a realização de “investimentos e promoção imobiliária e turística” e a “construção e desenvolvimento de empreendimentos imobiliários” (A).

2. Os RR. são fundos de investimento imobiliário que, nos termos dos respectivos Regulamentos de Gestão, devem constituir uma carteira de valores formada por activos diversificados, mas predominantemente imobiliários, em obediência a critérios de segurança, rendibilidade e liquidez (B).

3. Mais estabelecem os Regulamentos de Gestão dos RR. que as suas carteiras de valores podem ser constituídas por prédios já construídos, constituídos ou não em regime de propriedade horizontal, e prédios destinados ao desenvolvimento de projectos de construção, todos inscritos no registo predial como fazendo parte do Fundo, e que a aquisição de imóveis para a carteira do RR. terá por finalidade o arrendamento dos mesmos ou outra forma de exploração onerosa, bem como a sua revenda (C).

4. No âmbito da sua actividade comercial, a A. adquiriu um terreno com a área total de 205.414 metros quadrados, inserido no Parque Natural de Sintra Cascais, na freguesia de …, Concelho de Cascais, inscrito na matriz sob o artigo 12…, descrito na Conservatória do Registo Predial de Cascais – Segunda Secção (anteriormente 2ª Conservatória do Registo Predial de Cascais) sob o número 02…/05… (D).

5. Em 9 de maio de 1998, foi aprovado pela Direcção Geral do Turismo e depositado, o Título Constitutivo do empreendimento denominado “Aldeamento Turístico da FF” (adiante abreviadamente referido por “Empreendimento”) (E).

6. Nos termos do referido título constitutivo do Empreendimento, este seria composto por 36 lotes de terreno subdivididos em 120 unidades de alojamento a construir e 11 outras fracções imobiliárias (F).

(…)

9. Em 27 de Novembro de 1998, a Autora constituiu o regime de propriedade horizontal sobre o mesmo prédio, dividindo os 36 lotes de terreno em 120 unidades de alojamento, sendo 19 individualizadas (moradias unifamiliares com as características de T-5 (lotes 8 a 26, inclusive) e 101 em grupo, com as características de T-3 (56 unidades nos lotes 28, 29, 33, 34 e 36), T-2 (37 unidades nos lotes 27, 30, 32 e 35) e T-1 (8 unidades no lote 31), 3 fracções de exploração turística (lotes 6 e 7), destinadas a minimercado, restaurante, club-house e apoio desportivo e, finalmente, partes comuns que são constituídas por infraestruturas gerais e infraestruturas de utilização turística, o qual veio a ser objecto de rectificação por escritura pública de 31 de outubro de 2006 (I).

(…)

11. Na sequência dos factos descritos nos artigos precedentes, veio a ser celebrado em 19 maio de 1999 um contrato de empréstimo, garantido por hipoteca, pelo qual o actual Banco CC, à data denominado EE, (adiante referido como o “Banco”), concedeu à accionista maioritária da A. – denominada GG, SGPS, S.A. um mútuo de Esc. 1.500.000.000$00 (um milhão e meio de contos) destinado ao financiamento das obras de infraestruturas do Empreendimento, com as demais cláusulas constantes do documento de fls. 429 a 438 (K).

12. Conforme consta do respectivo título, para garantia do referido empréstimo a Autora constituiu em favor do Banco hipoteca sobre parte das fracções (L).

14. O EE foi incorporado pelo Banco CC, S.A. (N).

15. No dia 7 de agosto de 2003, a Autora celebrou com o 1.º Réu, então gerido e representado pela sociedade CC IMOVESTE, SOCIEDADE GESTORA DE FUNDOS DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO, S.A., Escritura Pública de Compra e Venda das fracções designadas pelas letras AB-A, AB-B, AB-C, AB-D, AB-E, AB-F, AB-G, AB-H, AB-I, AB-J, AB-L, AB-M, AB-N e AB-O, que constituem o Lote 33, Fracção AB, compostas por catorze unidades de alojamento do tipo T-3, com logradouro comum, jardim e piscina, descritas na Certidão de Registo Predial de Cascais já junta, inscritas na Conservatória sob o n.º 02…/05…, Y, …, pelo preço global de € 1.600.000,00 (um milhão e seiscentos mil euros) (O).

16. No mesmo dia 7 de agosto de 2003, a Autora celebrou com este 1º  Réu um contrato denominado de Reserva, pelo qual: — o Primeiro R. concedia à A. um direito de compra da totalidade das fracções autónomas por si adquiridas, pelo prazo de 5 anos, período durante o qual se obrigava a não vender nem prometer vender as fracções sem autorização da A. (cláusulas 1.ª, n.º 1, e 2.ª, n.º 1); — o preço de compra pela A. deveria ser igual ao valor do investimento do Primeiro R. (preço de compra acrescido dos custos da escritura e do registo) actualizado anualmente pelo índice de Preços do Consumidor, sem habitação, acrescido de 1% (cláusula 2.ª, n.º 2); — pela reserva mantida a seu favor, a A. obrigava-se a pagar mensalmente ao Primeiro R. o montante que resultasse da aplicação ao valor do investimento do Primeiro R. de uma taxa anual correspondente à Euribor a 12 meses acrescida de um “spread” de 3% (cláusula 3.ª); — caso a A. não exercesse o direito de compra das fracções dentro do prazo de 5 anos estabelecido no contrato, este cessaria automaticamente os seus efeitos (cláusula 5.ª); — caso ambas as partes acordassem no início da construção das fracções autónomas objecto do contrato, a parte do respectivo custo que viesse a ser suportada pelo Primeiro R. integraria o valor do seu investimento para efeitos de apuramento do preço de venda em caso de compra pela A. e para efeitos de apuramento da contrapartida prevista na cláusula 3.ª, e nos demais termos constantes do doc. de fls. 479 a 483 (P).

17. Em 12 de Novembro de 2003, a Autora celebrou com o 1.º Réu, Escritura Pública de Compra e Venda das fracções designadas pelas letras “L” do lote 18, “N” do Lote 20, “O” do Lote 21, “P” do Lote 22 e “Q” do Lote 23  pelo preço global de € 1.650.000,00 (um milhão seiscentos e cinquenta mil euros) (Q).

18. No mesmo dia 12 de Novembro de 2003, foi celebrado pela Autora e pelo 1.º Réu, o denominado Contrato de Reserva, relativo às mesmas fracções vendidas nos termos do doc. de fls. 489 a 493 (R).

19. A vigência do referido contrato de reserva foi depois, relativamente aos lotes 18, 20 e 23, prorrogada por mais 24 meses, em resultado de proposta da A. de 21 de Outubro de 2008 e aceitação do Primeiro R. de 7 de Janeiro de 2009 (S).

20. No dia 16 de Janeiro de 2004, a Autora celebrou com o 1.º Réu Escritura Pública de Compra e Venda sobre as fracções designadas pelas letras AC-A, AC-B, ACD, AC-E, AC-F, AC-G, AC-H, AC-I, AC-J, AC-L, AC-M, AC-N, AC-O e AC-P, que constituem o Lote 34, Fracção AC, compostas por quinze unidades de alojamento do tipo T-3 (a construir), com logradouro comum (jardim e piscina), pelo preço global de € 1.750.000,00 (um milhão setecentos e cinquenta mil euros) (T).

21. No mesmo dia 16 de Janeiro de 2004, a Autora celebrou com o 1.º Réu, um contrato de Reserva, relativo às mesmas fracções com conteúdo idêntico ao acima referido relativamente ao lote 33, nos termos do doc. de fls. 499 a 503 (U).

22. Em 18 de agosto de 2004, a Autora celebrou com o 1.º Réu, Escritura Pública de Compra e Venda de Bem Imóvel Futuro, integrando Documento Complementar, das fracções designadas pelas letras “X-A”, a “X-N”, todas integrantes do Lote 29, todas correspondentes treze unidades de alojamento do tipo T-3, ainda por construir, pelo preço global de € 5.850.000,00 (cinco milhões, oitocentos e cinquenta mil euros) (V).

23. Nessa escritura, a A. declarou ser essencial à sua vontade de contratar que os RR. expressamente reconheçam e aceitem a existência da possibilidade de reaquisição das futuras moradias e respectivos terrenos, objecto do contrato, a ter lugar nos termos da opção de compra regulada na cl. 10.ª do documento complementar anexo (W).

24. No documento complementar anexo à escritura pública de compra e venda de bem futuro, as partes acordaram que a Autora teria direito de opção de compra da totalidade do terreno e respectivas moradias; bem como acordaram os termos em que o preço acordado seria pago, ficando a Autora com a obrigação de proceder a essa construção, tudo conforme melhor consta do doc. de fls. 511 a 523 (X).

25. O Primeiro R. veio depois a conceder à A. uma prorrogação do prazo para o exercício do direito de compra pela A., previsto na cláusula 10.ª, n.º 3, do documento complementar, até 31 de Dezembro de 2009 (Y).

26. No dia 24 de agosto de 2005, a Autora celebrou com o 1.º Réu, Escritura Pública de Compra e Venda das fracções designadas pelas letras AE-A, a AE-L que constituem o Lote 36, Fracção AE, pelo preço global de € 1.349.990,00 (um milhão, trezentos e quarenta mil, novecentos e noventa euros) (Z).

27. No mesmo dia 24 de agosto de 2005, a Autora celebrou com o 1.º Réu um contrato de Reserva, relativo às mesmas fracções nos termos que constam do doc. de fls. 530 a 534 (AA).

28. No dia 27 de Março de 2006, a Autora celebrou com o 1.º Réu, Escritura Pública de Compra e Venda sobre as fracções designadas pelas letras AD-A, a AD-N que constituem o Lote 35, pelo preço global de € 1.750.000,00 (um milhão, setecentos e cinquenta mil euros) (AB).

29. No mesmo dia 27 de Março de 2006, a Autora celebrou com o 1.º Réu, um contrato de Reserva, relativo às mesmas fracções nos termos constantes do doc. de fls. 540 a 544 (AC).

30. No dia 14 de Setembro de 2006, a Autora celebrou com o 2.º Réu, gerido e legalmente representado pela sociedade CC GESTÃO DE ACTIVOS – SOCIEDADE GESTORA DE FUNDOS DE INVESTIMENTO MOBILIÁRIO, S.A., escritura pública de compra e venda sobre as fracções designadas pelas letras YA, a YI, que constituem o Lote 30, Fracção Y, pelo preço global de € 1.250.000,00 (um milhão, duzentos e cinquenta mil euros) (AD).

31. No mesmo dia 14 de Setembro de 2006, a Autora celebrou com o 2.º Réu, representado pela sociedade CC GESTÃO DE ACTIVOS – SOCIEDADE GESTORA DE FUNDOS DE INVESTIMENTO MOBILIÁRIO, S.A., um contrato de Reserva, relativo às mesmas fracções designadas pelas letras YA, YB, YC, YD, YE, YF, YG, YH e YI, nos termos constantes do doc. de fls. 551 a 556 (AE).

32. No dia 22 de Fevereiro de 2007, a Autora celebrou com o 2.º Réu, Escritura Pública de Compra e Venda sobre as fracções designadas pelas letras ZA, a ZH, que constituem o Lote 31, Fracção Z, pelo preço global de € 650.000,00 (seiscentos e cinquenta mil euros) (AF).

33. No mesmo dia 22 de Fevereiro de 2007, a Autora celebrou com o 2.º Réu, um contrato de Reserva, relativo às mesmas fracções, conforme melhor consta do doc. de fls. 563 a 568 (AG).

34. Em 28 de Julho de 2006, a Autora e o 1.º Réu celebraram um aditamento ao Contrato de Reserva de 7 de agosto de 2003, dando nova redacção à Cláusula Terceira daquele, tendo-se em consequência acordado o pagamento pelo Réu do montante de € 5.400.000,00, a disponibilizar à medida do avanço da construção, bem como o alargamento do prazo para exercício do direito de recompra por mais 32 meses, e o mais que consta do doc. de fls. 569 a 578 (AH).

35. Em 13 de Junho de 2008, a Autora e 1.º Réu celebraram um segundo aditamento ao Contrato de Reserva de 7 de Agosto de 2003, alterando uma vez mais a Cláusula Terceira daquele e que consistia num aumento do valor da construção dos edifícios de € 600.000, i.e. de € 5.400.000 para € 6.000.000, e o mais que consta do doc. de fls. 579 a 584 (AI).

36. Em consequência, na data da assinatura da mesma Adenda, o 1º Réu pagou à Autora, a acrescer ao valor entregue na escritura, o referido valor de € 600.000 (AJ).

37. Em 2 de Maio de 2007, a Autora e o 1.º Réu, celebraram uma adenda ao contrato de reserva acordado em 16 de Janeiro de 2004, a qual visava fundamentalmente encarregar a Autora da concepção e construção das 15 moradias que constituíam o lote 34 e alargar o prazo para exercício do direito de opção, nos termos do doc. de fls. 585 a 594 (AK).

38. Nos termos previstos na mesma Adenda o 1º Réu entregou à Autora a quantia de € 1.150.000, o que fez através de dois pagamentos de € 575.000 efectuados em 2 de Maio de 2007 e em 23 de Novembro de 2007 (AL).

39. O segundo desses pagamentos foi feito na sequência da emissão do alvará de obras de construção pela Câmara Municipal de Cascais, que ocorreu em 16 de Novembro de 2007, no qual se previa o início da construção para 21 de Novembro de 2007 e que era válido até 11 de Novembro de 2009 (AM).

40. Em 22 de Janeiro de 2007, por Escritura Pública de Compra e Venda a Autora exerceu o seu direito de opção de compra relativo à fracção autónoma designada pela letra “O” do Lote 21, ainda por construir, pelo montante de € 388.426,20, conforme doc. de fls. 594 a 598 (AN).

41. Em 23 de Junho de 2006, por Escritura Pública de Compra e Venda a Autora exerceu o seu direito de opção de compra relativo à fracção autónoma designada pela letra “P” do Lote 22, ainda por construir, pelo montante de € 367.008,54, conforme doc. de fls. 599 a 608 (AO).

42. Em 20 de Março de 2009, por Escritura Pública de Compra e Venda a Autora exerceu o seu direito de opção de compra relativo à fracção autónoma designada pela letra “Q” do Lote 23, ainda por construir, pelo montante de € 399.383,00 (trezentos e noventa e nove mil, trezentos e oitenta e três euros), com a intenção de revender a mesma, conforme doc. de fls. 609 a 615 (AP).

43. Em 19 de Abril de 2007 a Autora exerceu a opção de compra e transmitiu o seu direito a terceiro que adquiriu a fracção designada pela letra “X-B” do Lote 29, pelo montante de € 486.010,00, conforme doc. de fls. 616 a 621 (AQ).

44. Em 11 de maio de 2007, por Escritura Pública de Compra e Venda, a Autora exerceu a opção de compra contratada e readquiriu o imóvel designado pela letra “X-F” do Lote 29, pelo montante de € 486.650,00 (quatrocentos e oitenta e seis mil seiscentos e cinquenta euros), conforme doc. de fls. 622 a 628 (AR).

45. Em 22 de Maio de 2007, a Autora exerceu a opção de compra contratada e transmitiu o seu direito a terceiro que adquiriu a fracção designada pela letra “X-D” do Lote 29, pelo montante de € 487.257,70 (quatrocentos e oitenta e sete mil, duzentos e cinquenta e sete euros e setenta cêntimos), conforme doc. de fls. 629 a 634 (AS).

46. Em 28 de Junho de 2007, por Escritura Pública de Compra e Venda, a Autora exerceu a opção de compra contratada e readquiriu o imóvel designado pela letra “X-A” do Lote 29, pelo montante de € 488.679,00 (quatrocentos e oitenta e oito mil, seiscentos e setenta e nove euros), conforme doc. de fls. 635 a 641 (AT).

47. Em 06 de Dezembro de 2007, por Escritura Pública de Compra e Venda, a Autora exerceu a opção de compra contratada e readquiriu o imóvel designado pela letra “X-L” do Lote 29, pelo montante de € 495.765,00 (quatrocentos e noventa e cinco mil, setecentos e sessenta e cinco euros), nos termos do doc. de fls. 642 a 646 (AU).

48. Em 29 de Setembro de 2008, por Escritura Pública de Compra e Venda, a Autora exerceu a opção de compra contratada e readquiriu o imóvel designado pela letra “X-C” do Lote 29, pelo montante de € 511.612,65 (quinhentos e onze mil, seiscentos e doze euros e sessenta e cinco cêntimos), conforme doc. de fls. 647 a 653 (AV).

49. Em 28 de Outubro de 2008, por Escritura Pública de Compra e Venda, a Autora exerceu a opção de compra contratada e readquiriu o imóvel designado pela letra “X-E” do Lote 29, pelo montante de € 513.352,00 (quinhentos e treze mil, trezentos e cinquenta e dois euros), nos termos do doc. de fls. 654 a 660 (AW).

50. Em 10 de Março de 2009, a Autora exerceu a opção de compra contratada e transmitiu o seu direito a terceiro que adquiriu a fracção designada pela letra “X-H” do Lote 29, pelo montante de € 516.542,00 (quinhentos e dezasseis mil, quinhentos e quarenta e dois euros), nos termos do doc. de fls. 661 a 671 (AX).

51. Em 26 de Junho de 2009, por Escritura Pública de Compra e Venda, a Autora exerceu a opção de compra contratada e readquiriu o imóvel designado pela letra “X-G” do Lote 29, pelo montante de € 516.070,00 (quinhentos e dezasseis mil e setenta euros), nos termos do doc. de fls. 672 a 678 (AY).

52. Por Escritura Pública de Compra e Venda datada de 4 de Dezembro de 2009, a Autora, exercendo o seu direito de opção, adquiriu ao 1.º Réu a fracção autónoma designada pelas letras AB-J, do lote 33, correspondente a moradia tipo T-3, de dois pisos, com garagem e área coberta de 120m2, pelo montante de € 583.415, conforme doc. de fls. 679 a 685 (AZ).

53. Em 18 de Agosto de 2010, a Autora exerceu a opção de compra contratada e transmitiu o seu direito a terceiro que adquiriu a fracção designada pelas letras “AB-A” do Lote 33, correspondente a moradia tipo T-3, de dois pisos, com garagem e área coberta de 120m2, pelo montante de € 550.000,00 (quinhentos e cinquenta mil euros), nos termos do doc. de fls. 686 a 694 (BA).

54. A Autora vendeu, portanto, aos Réus, entre Novembro de 2003 e Fevereiro de 2007, doze lotes de terreno, compreendendo um total de 88 fracções dos tipos T-1, T-2, T-3 e T-5 pelo valor global de € 23.000.000,00 (vinte e três milhões de euros) (BB).

55. Paralelamente, a Autora celebrou com os Réus Contratos de Reserva sobre as fracções vendidas, adquirindo uma opção de compra sobre estas, pelo prazo de 5 anos (prorrogável), mediante o pagamento das seguintes remunerações: Entre agosto de 2003 e agosto de 2010, a Autora pagou um total de € 1.237.623,59 relativa às fracções que compõem o Lote 33; Entre Dezembro de 2003 e Fevereiro de 2009, a Autora pagou um total de € 109.048,72 relativa às frações que compõem o Lote 18; Entre Dezembro de 2003 e Fevereiro de 2009, a Autora pagou um total de € 109.048,72 relativa às fracções que compõem o Lote 20; Entre Dezembro de 2003 e Janeiro de 2007, a Autora pagou um total de € 58.979,93 relativa às fracções que compõem o Lote 21;

Entre Dezembro de 2003 e Junho de 2006, a Autora pagou um total de € 46.056,44 relativa às fracções que compõem o Lote 22; Entre Dezembro de 2003 e Fevereiro de 2009, a Autora pagou um total de € 109.048,72 relativa às fracções que compõem o Lote 23; Entre Janeiro de 2004 e Fevereiro de 2009, a Autora pagou um total de € 693.181,36 relativa às frações que compõem o Lote 34; Entre agosto de 2004 e Setembro de 2009, a Autora pagou um total de € 1.189.164,25 relativa às fracções que compõem o Lote 29; Entre agosto de 2005 e Fevereiro de 2009, a Autora pagou um total de € 333.519,68 relativa às fracções que compõem o Lote 36; Entre Março de 2006 e Fevereiro de 2009, a Autora pagou um total de € 371.557,37 relativa às fracções que compõem o Lote 35. Entre Setembro de 2006 e Fevereiro de 2009, a Autora pagou um total de € 234.720,41 relativa às fracções que compõem o Lote 30; Entre Março de 2007 e Fevereiro de 2009, a Autora pagou um total de € 94.665,56 relativa às fracções que compõem o Lote 31 (BC).

56. Sucede que, a partir de 2008, com a profunda crise que começou por afectar os mercados financeiros e depois teve consequências graves noutros sectores da economia, em especial no imobiliário, se verificou uma contracção do crédito bancário para as empresas e particulares e subsequentemente uma redução rápida e progressiva das vendas de imóveis e a degradação acentuada dos respectivos preços (BD).

57. A Autora cessou o pagamento das remunerações devidas nos termos dos denominados Contratos de reserva em Março de 2009 (BE).

58. Por carta de 6 de Janeiro de 2010, cuja cópia está de fls. 695 a 699, os RR. mostraram-se receptivos a uma renegociação (BF).

59. Através de carta datada de 28 Fevereiro de 2011, os Réus comunicaram à Autora que não era possível “equacionar prorrogações de prazos de Contratos de Reserva (…) por se encontrarem caducados”, exigindo ainda, do mesmo passo, o pagamento dos montantes devidos a título de remunerações vencidas e não pagas, e o mais que consta de fls. 700 a 703 (BG).

60. Na venda dos lotes ou moradias a terceiros a Autora auferiu, e deveria auferir, uma margem considerável em relação ao montante do reembolso a efectuar aos Réus pela respectiva “revenda” (BH).

61. Foi a seguinte a relação entre os preços pelos quais as fracções autónomas ali identificadas foram vendidas pelo Primeiro R. à A. e os preços pelos quais esta última as alienou a terceiros:

Compra pela A. à 1.ª R. Venda pela A. a terceiros

Lote Fracção Data Valor Data Valor Diferença Lote 21 O 22-02-2007 388.426,20€ 07-03-2007 400.000,00 € 11.573,80 €

Lote 29 X-A 28-06-2007 488.679,00€ 28-06-2007 650.000,00 € 161.321,00€

Lote 29 X-C 29-09-2008 511.612,65€ 29-09-2008 710.000,00 € 198.387,35€

Lote 29 X-E 28-10-2008 513.352,00€ 28-10-2008 735.000,00 € 221.648,00€

Lote 33 AB-J 04-12-2009 583.415,00€ 04-12-2009 685.000,00 € 101.585,00€ 694.515,15 € (BI)

62. A A. não construiu as moradias a que se reporta a adenda de 2 de maio de 2007 (lote 34), nem restituiu a quantia de € 1.150.000,00 mencionada em AL) (BJ).

63. A A. efectuou o pagamento dos projectos de arquitectura e de especialidades, e das taxas urbanísticas e obteve o alvará de construção do lote 34 (BK).

64. Por notificação judicial avulsa realizada em 26 de maio de 2011, o Primeiro R. comunicou à A. a caducidade do contrato de reserva celebrado em 12 de Novembro de 2003 relativamente aos lotes 18 (fracção autónoma L) e 20 (fração autónoma N) (BL).

65. Por notificação judicial avulsa realizada em 26 de maio de 2011, o Primeiro R. comunicou à A. a caducidade do contrato de reserva celebrado em 18 de agosto de 2004 relativamente ao lote 29 (fracções autónomas X-I, X-J, X-M, X-N) (BM).

66. Por notificação judicial avulsa realizada em 26 de maio de 2011, o Primeiro R. comunicou à A. a caducidade do contrato de reserva celebrado em 7 de agosto de 2003 relativamente ao lote 33 (fracções autónomas AB-B, AB-C, AB-D, AB-E, AB-F, AB-G, AB-H, AB-I, AB-L, AB-M, AB-N, AB-O) (BN).

67. Por notificação judicial avulsa realizada em 26 de maio de 2011, o Primeiro R. comunicou à A. a caducidade do contrato de reserva celebrado em 27 de Março de 2006 relativamente ao lote 35 (frações autónomas AD-A, AD-B, AD-C, AD-D, AD-E, AD-F, AD-G, AD-H, AD-I, AD-J, AD-L, AD-M, AD-N) (BO).

68. Por notificação judicial avulsa realizada em 26 de maio de 2011, o Primeiro R. comunicou à A. a caducidade do contrato de reserva celebrado em 24 de agosto de 2005 relativamente ao lote 36 (fracções autónomas AE-A, AE-B, AE-C, AE-D, AE-E, AE-F, AE-G, AE-H, AE-I, AE-J, AE-L) (BP).

69. Por notificação judicial avulsa realizada em 5 de Julho de 2011, o Primeiro R. declarou resolvido o contrato de reserva celebrado em 14 de novembro de 2006 relativamente ao lote 30 (fracções autónomas YA, YB, YC, YD, YE, YF, YG, YH, YI) caso não fosse feito o pagamento das quantias devidas pela A. ao Primeiro R. no prazo de 15 dias, produzindo a resolução efeitos nos 10 dias seguintes ao termo desse prazo (BQ).

70. Por notificação judicial avulsa realizada em 5 de Julho de 2011, o Primeiro R. declarou resolvido o contrato de reserva celebrado em 22 de Fevereiro de 2007 relativamente ao lote 31 (fracções autónomas ZA, ZB, ZC, ZD, ZE, ZF, ZG, ZH) caso não fosse feito o pagamento das quantias devidas pela A. ao Primeiro R. no prazo de 15 dias, produzindo a resolução efeitos nos 10 dias seguintes ao termo desse prazo (BR).

71. Por notificação judicial avulsa realizada em 5 de Julho de 2011, o Primeiro R. declarou resolvido o contrato de reserva celebrado em 16 de Janeiro de 2004 relativamente ao lote 34 (fracções autónomas AC-A, AC-B, AC-C, AC-D, AC-E, AC-F, AC-G, AC-H, AC-I, AC-J, AC-L, AC-M, AC-N, AC-O, AC-P) caso não fosse feito o pagamento das quantias devidas pela A. ao Primeiro R. no prazo de 15 dias, produzindo a resolução efeitos nos 10 dias seguintes ao termo desse prazo (BS).

72. Os pagamentos exigidos não foram realizados (BT).

73. A A. tem impedido o acesso dos RR. às referidas fracções, nomeadamente às moradias construídas nas fracções autónomas que integram os lotes 29 e 33, relativamente às quais a A. se tem recusado a entregar as chaves de acesso a essas moradias (BU).

74. A retenção das fracções relativas aos lotes 29 e 33 pela A. impede os RR. de promover contactos e visitas com eventuais interessados na futura transmissão ou arrendamento das mesmas, uma vez que não lhe são acessíveis (BV).

75. A A. já assegurou e efectivou a reaquisição de 14 das fracções alienadas aos Réus, incluindo 11 fracções correspondentes a moradias já construídas (incluindo três mediante cessão da sua opção de compra a terceiros), tendo pago ao 1.º Réu o montante total de € 6.790.381,09 (seis milhões setecentos e noventa mil trezentos e oitenta e um euros e nove cêntimos) (BW).

76. O contrato de empréstimo com o EE foi negociado e acordados os respectivos termos com base num estudo de viabilidade económica do Empreendimento elaborado pelo então designado “Banco HH” (1.º).

77. Esse estudo de viabilidade económica do Empreendimento mereceu a aprovação dos responsáveis do Banco (2.º).

78. O Banco sabia que a Autora se propunha liquidar as responsabilidades decorrentes do contrato de empréstimo, dentro do prazo contratado, com a comercialização dos lotes ou das unidades de alojamento, pois era isso que constava do estudo de viabilidade (4.º e 5.º).

79. As obras de construção das infraestruturas do Empreendimento foram realizadas e ficaram concluídas em meados de 2001 – trata-se do que é designado no estudo de viabilidade por infraestruturas públicas essenciais (fls. 443 e 335) (6.º).

80. Em Outubro de 2001, a A. solicitou ao EE financiamento para a construção dos lotes 27 e 28, que veio a ser financiada por um banco terceiro, e que, em outubros de 2002, a A. solicitou ao EE a concessão de empréstimo para a construção do lote 29, que o CPP veio a negar por carta de 26/11/2002 (7.º e 8.º).

81. O banco sugeriu formas alternativas de a A. conseguir dar continuidade ao projecto (9.º).

82. No início de 2003, a A. entra em negociações com os RR., através da sua legal representante, então designada CC Imovest – Sociedade Gestora de Fundos de Investimento Imobiliário, S. A., com vista a encontrar uma solução que lhe permitisse dar continuidade ao projeto (10.º).

83. Entre as ideias sugeridas pelo banco, encontrava-se um possível acordo com fundos de investimento imobiliário geridos pela sociedade gestora detida pelo Banco (11.º).

84. O contrato a celebrar com o fundo estava limitado pelo regime jurídico dos fundos imobiliários, devendo passar pela aquisição de direitos sobre bens imóveis (12.º).

85. Dentro do conversado entre as partes, o preço pago pelos fundos para aquisição dos lotes seria utilizado pela Autora para, em primeiro lugar, liquidar as responsabilidades decorrentes do empréstimo, e, em segundo lugar, pagar a construção das fracções imobiliárias de utilização comum (ténis, piscina, parque infantil, portaria, entre outras) e de exploração turística (restaurante, clube, entre outras) e das unidades de alojamento previstas para cada lote de terreno, de acordo com o faseamento previsto (13.º).

86. Os preços das vendas aos RR. foram utilizados na liquidação das responsabilidades do empréstimo de Maio de 1999 do Banco e cancelamento das hipotecas incidentes sobre cada lote ou fracção alienada em favor dos fundos aqui Réus (14.º).

87. Os montantes sobrantes foram afectados à construção das fracções imobiliárias de utilização comum (ténis, piscina, parque infantil, portaria, entre outras) e de exploração turística (restaurante, clube, entre outras), cuja conclusão as partes tinham por fundamental para valorização do Empreendimento como um todo e para valorização de cada fracção autónoma por si própria (15.º).

88. Para pagar a construção das unidades de alojamento, a A. usou os montantes pagos pelos RR. no âmbito das adendas referidas nas alíneas AH, AI e AK (16.º).

89. Os edifícios (moradias) assim construídos permaneceriam, num momento inicial, na titularidade do fundo ou fundos de investimento imobiliário (17.º).

90. A Autora, através de contratos denominados de “reserva”, celebrados com o fundo adquirente dos lotes, simultaneamente com a respectiva compra e venda, ficava com uma opção de compra dos lotes vendidos ao fundo durante um prazo que, a manterem-se as condições de mercado, lhe pareceu suficiente para realizar as construções previstas e proceder à venda dos imóveis construídos aos clientes finais (18.º).

91. Durante o prazo de vigência do contrato “de reserva”, de 5 anos prorrogáveis, e até efectivação da sua opção de compra, a Autora pagaria ao fundo uma remuneração mensal que consistia na aplicação de uma taxa anual correspondente à Euribor a 12 meses acrescida de um Spread de 3% ao mês calculada sobre o montante do preço pago pelo fundo, acrescido dos custos com as escrituras de compra e venda e respectivos registos (19.º).

92. Nos termos dos contratos “de reserva”, a Autora conservaria, como conservou, a posse e disponibilidade dos imóveis alienados aos Réus, cabendo-lhe não só a sua conservação e manutenção, como inclusive o direito de promover a respectiva venda a terceiros (20.º e 26.º).

93. Quando assim o entendesse, a Autora poderia readquirir os imóveis ao fundo pelo valor acima referido (preço pago acrescido dos custos da escritura e registo) actualizado anualmente de acordo com o Índice de Preços do Consumidor, sem habitação, do Instituto Nacional de Estatística, acrescido de 1% e das remunerações entretanto vencidas ou até ceder a terceiros o direito de aquisição dos imóveis desde que assegurasse o pagamento do montante assim calculado (21.º).

94. Tendo em consideração que o Banco era titular de hipotecas sobre a quase totalidade do património da A., que os encargos decorrentes do empréstimo de Maio de 1999 se tinha acumulado, que o processo subjacente ao projecto do empreendimento era complexo, que o registo da propriedade horizontal incidente sobre o imóvel da Autora tinha natureza provisória, seria muito difícil à A. obter financiamento junto de outros bancos (22.º).

95. Nos termos dos contratos de reserva celebrados, todas as despesas relativas às fracções autónomas, nomeadamente as despesas relativas a condomínio ou outros tipos de custos (excepto contribuição autárquica), seriam suportadas pela A. (24.º).

96. Estando também previsto que, caso as partes viessem a acordar na construção, toda a parte que viesse a ser suportada pelo Fundo integraria o valor do investimento mencionado na cl. 2.ª, para efeitos do apuramento do preço de venda numa futura aquisição pela A., bem como para os efeitos previstos na cl. 3.ª (25.º).

97. Em 28/07/2006, as partes fizeram o aditamento (junto aos autos a fls. 569-78) ao contrato de reserva de 07/08/2003, no qual, considerando que o BB reservou para a A. o direito de opção de compra da totalidade das fracções do lote 33, que ambas as partes pretendem se proceda à construção de 14 moradias nas fracções transmitidas, que o BB pretende encarregar a A. da concepção e construção das moradias, acordaram encarregar a A. dessa construção, comprometendo-se a A. a entregar ao BB as edificações resultantes da construção, pelo preço global de € 5.400.000,00 a ser pago de forma faseada (28.º).

98. A construção das 13 moradias correspondentes às designadas pelas letras “X-A”, “X-B”, “X-C”, “X-D”, “X-E”, “X-F”, “X-G”, “X-H”, “X-I”, “X-J”, “X-L”, “X-M” e “X-N”, todas integrantes do Lote 29, incluindo os respectivos projetos e licenciamentos de obras e utilização, foi efectuada pela Autora, tendo, pelo menos 5 das moradias ficado concluídas em 2007 (29.º).

99. A construção das 14 moradias correspondentes às fracções designadas pelas letras AB-A, AB-B, AB-C, AB-D, AB-E, AB-F, AB-G, AB-H, AB-I, AB-J, AB-L, AB-M, AB-N e AB-O, que constituem o Lote 33, Fração AB, incluindo os respectivos projectos e licenciamentos de obras e utilização, foi efectuada pela Autora (30.º).

100. Em 02/05/2007, as partes fizeram o aditamento (junto aos autos a fls. 585-94) ao contrato de reserva de 16/01/2004, no qual, considerando que o BB reservou para a A. o direito de opção de compra da totalidade das fracções do lote 34, que ambas as partes pretendem se proceda à construção de 15 moradias nas fracções transmitidas, que o BB pretende responsabilizar a A. pela concepção e edificação das moradias, a A. comprometeu-se a entregar ao BB as edificações resultantes da construção, e responsabilizou-se pelo processo de construção, pelo preço global de € 5.750.000,00 a ser pago de forma faseada (31.º).

101. A Autora efectuou e custeou a construção, incluindo projectos e licenciamentos, das 8 fracções imobiliárias de utilização comum (que incluem infraestruturas gerais, portaria e serviços, espaços verdes, recepção e escritório, estacionamento, ténis e piscina) e das 3 fracções imobiliárias de exploração turística (32.º).

102. A A. assegurou os serviços de manutenção e conservação das partes comuns, sem nada cobrar aos RR., até à data (34.º).

103. Quando celebraram os contratos de compra e venda dos lotes e os simultâneos contratos de “reserva”, as partes pensavam que as moradias seriam vendidas dentro dos prazos destes últimos e por preço superior ao que tinha sido pago pelos RR. (35.º).

104. A Autora tem contactado os Réus no sentido de, alegando a modificação das circunstâncias decorrente da crise económica, acordar soluções que permitam a manutenção do previsto e acordado entre as partes, designadamente a continuação da construção das unidades de alojamento e a manutenção dos direitos de opção (40.º e 41.º).

105. Até recentemente (reportado à data da propositura da acção) os RR. não recusaram a negociação, manifestando-se disponíveis para encontrar soluções (42.º e 43.º).

106. As partes acordaram oralmente em não dar início à construção das moradias previstas para o lote 34, enquanto tivessem parte considerável das outras ainda por vender (44.º e 71.º).

107. Durante o ano 2010, realizaram-se várias reuniões entre as partes com o intuito, pelo menos por parte da A., de renegociarem os acordos celebrados (45.º).

108. A A. apresentou várias propostas (46.º).

109. A carta datada de 28/02/2011 apenas foi recebida pela A. em 18/03/2011 (47.º).

110. Moradias do lote 33 foram avaliadas em 2010 pelo II Bank e pelo CC por € 800.000,00 (T-4+1), € 823.050,00 (T-4) e € 791.106,00 (T-3+1); o conjunto das 13 moradias do mesmo lote 33 foram avaliadas no mesmo ano 2010, a pedido da CC Management, por € 7.650.000,00; em 2013, a JJ avaliou o mesmo conjunto de moradias do lote 33 em € 5.742.000,00; em 2009, uma moradia do lote 29 (T-3) foi avaliada, a pedido da CC Management, em € 512.000,00; e em 2013, a JJ avaliou 4 das moradias do lote 29 (que no total são 13 T-3) por € 1.968.000,00 (50.º, 53.º e 55.º).

111. Em Abril de 2009, uma moradia T-2, no lote 27, já construída, foi avaliada pela KK por € 750.000,00 (51.º).

112. Os 220 m2 de terreno em que está implantada a moradia foram avaliados em € 245.000,00 (52.º).

113. Em 2010, os 240 m2 de terreno em que está implantada uma moradia T-4 do lote 33, foi avaliado pelo II Bank em € 264.000,00 (54.º).

114. Os lotes ainda não construídos – 18, 20, 30, 31, 34, 35 e 36 – foram avaliados em 2013, pela JJ, para a CC Management, pelo valor global de € 8.540.206,00 (56.º).

115. Todas as aquisições efectuadas pelos RR. à A. foram precedidas de avaliações dos prédios efectuadas por um avaliador interno e de avaliações efectuadas por dois peritos independentes, que comprovaram a razoabilidade dos preços estabelecidos (59.º).

116. Os valores de compra e venda pedidos pela A. foram logo aceites pelos RR. e foram calculados pela A. tendo em consideração os fundos necessários para prosseguir e desenvolver o seu projecto imobiliário (60.º).

117. Como os RR. bem sabem o valor por eles entregue à A. foi o necessário para distratar as hipotecas que incidiam sobre os imóveis hipotecados ao Banco e para financiar a construção das fracções imobiliárias de utilização comum e de exploração turística previstas no projecto do empreendimento e das unidades de alojamento previstas para cada “lote” de terreno, de acordo com o faseamento previsto (61.º).

118. A própria A. tinha interesse em que os preços atribuídos aos imóveis fossem tão baixos quanto possível por forma a minorar os encargos que teria de suportar (63.º).

119. Os RR. estavam disso conscientes (64.º).

120. Tal como nos contratos celebrados entre a A. e os RR. que têm por objecto a construção das moradias dos Lotes 29, 33 e 34, na qual a A. não auferia qualquer lucro ou margem na construção (65.º).

121. Os valores dos distrates foram os seguintes:

Data Lote Montante Valor do Distrate Diferença 07/08/2003

 33 € 1.600.000,00 € 883.848,00 € 716.152,00 12/11/2003 18, 20, 21, 22 e 23 € 1.650.000,00 € 1.023.884,00 € 626.116,00 16/01/2004

34 € 1.750.000,00 € 921.645,00 € 828.355,00 18/08/2004

29 * € 2.000.000,00 € 950.365,00 € 1.049.635,00 24/08/2005

36 € 1.349.900,00 € 211.071,00 € 1.138.829,00 27/03/2006

35 € 1.750.000,00 € 688.870,00 € 1.061.130,00

14/09/2006

30 € 1.250.000,00 € 505.000,00 € 745.000,00

22/02/2007

31 € 650.000,00 € 347.808,00 € 302.192,00 * Montante entregue na data da escritura pública de compra e venda de bem imóvel futuro - cf. Documento n.º 13 junto com a Petição Inicial e al. Z) da Matéria Assente. (67.º e 68.º)

122. Por carta datada de 29/09/2008, Autora comunicou ao 1.º Réu que perante a situação de crise era necessário prorrogar o prazo para construção do lote 34 (72.º).

123. Ao que o 1.º Réu, através do seu legal representante, anuiu por carta de 16/12/2008 (73.º).

124. A A. requereu a renovação do alvará de construção, tendo sido emitida novo alvará de obras de construção (75.º).

125. Depois, porque não era possível pedir nova renovação pura e simples do alvará de obras de construção, submeteu um projecto de alteração por forma a prorrogar a validade do alvará emitido (76.º).



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10 - Revista excepcional-Formação:

Num primeiro momento este STJ decidiu rejeitar a revista como recurso de revista normal, sem prejuízo da apreciação da revista excepcional, que é da competência da formação (artº 672º , 3 do CPC).


A formação admitiu a revista como de excepcional considerando que fulcralmente está aqui em discussão a relevância ou irrelevância da crise económica que começou em 2008 perante o regime do artigo 437.º e, bem assim, a interpretação do artigo 438.º.

A primeira das questões veio ao de cima com particular intensidade a propósito dos casos relativos aos “swaps” e logo se viu que arrastava imensas e profundas divergências com Pareceres de Ilustres Juristas em sentidos, por vezes, antagónicos e decisões dos tribunais, incluindo deste Supremo Tribunal, nem sempre convergentes.

A segunda também está longe de ser pacífica, tanto mais que, contraposta à interpretação puramente literal, há ilustres Juristas que defendem uma interpretação restritiva.

Tudo isto num quadro de particular relevância pelos interesses envolvidos, como resulta claramente do que consta supra em 1 e 2.



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10 - O mérito da causa:


A única questão a resolver prende-se com :

Alteração anormal das circunstâncias (artº 437 e 438º do CC) - Crise económica


Com bem nota a formação, fulcralmente está aqui em discussão a relevância ou irrelevância da crise económica que começou em 2008 perante o regime do artigo 437.º e, bem assim, a interpretação do artigo 438.º

Verificou-se alteração anormal das circunstâncias que justifica a resolução dos contratos celebrados entre Autora e Réus (compras e vendas e contratos de reserva), ou, pelo menos, a sua modificação, nomeadamente a extensão dos prazos durante os quais a A. pode readquirir os imóveis e a redução das remunerações suportadas pela A. nos contratos de reserva?

É tão só sobre este tema que nos podemos debruçar face ao teor da admissão da revista como excepcional.

Para sustentar a sua tese a A. invoca a contracção económica que se instalou a partir de 2008, que determinou a não readquisição das fracções como esperava, as circunstâncias fundamentais em que as partes aceitaram contratar sofreram uma alteração anormal que não se encontra abrangida pelos riscos próprios do contrato.

A R. tem posição oposta pois considera que não tem a recorrente o direito de resolver/modificar os contratos celebrados entre as partes, uma vez não está preenchido o "pressuposto negativo", qual seja a inexistência de mora da "parte lesada" ,a recorrente constitui-se em mora em Março de 2009 e os efeitos da crise, com relevância no que toca à relação das partes, fizeram-se sentir, sobre essa relação depois dessa data. Não está assim preenchida a hipótese legal do artigo 438.° do Código Civil, o que como doutamente decidiu o Acórdão recorrido "tomaria até inútil a apreciação da verificação dos demais requisitos do instituto".

O acórdão recorrido, alinha pela posição da R. recorrida:

 Do teor dos factos provados se retira desde logo a existência de mora pela banda da autora que como ficou assente cessou o pagamento das remunerações devidas em Março de 2009 fcto 57

Esta circunstância torna até inútil a apreciação da verificação dos demais requisitos do instituto.

Como vem decidido na parte final do Ac do STJ de 28.01.2015, supra citado : « A mora impede a “parte lesada” de beneficiar do direito de resolução ou modificação do contrato prevista no art. 437º, nº1, como assinala o art. 438º do Código Civil».

Da sentença proferida na l.ª instância e do Acórdão recorrido resulta que naquela a ratio decidendi assentou na suposta não verificação dos pressupostos exigidos pelo artigo 437.° do Código Civil, enquanto neste a improcedência da pretensão da Autora assenta única e exclusivamente na aplicação do artigo 438.° do Código Civil

Vejamos:

Todos conhecemos duma forma geral a invocada crise económica que afectou o nosso país. É um facto notório.

No entanto, tal, só por si não é suficiente, para que se possa recorrer, sem mais, deste instituto.

É necessário que haja uma correlação directa e demonstrada factualmente nos autos entre a crise económica geral e a actividade económica concreta de determinado agente para que se possa falar de uma alteração anormal das circunstâncias. ([1])

O regime do art.º 437.º/1 afasta, desde logo, aqueles casos em que a alteração das circunstâncias é coberta pelos riscos próprios do contrato, se a disciplina estiver no seu conteúdo, é de acordo com esta que o caso concreto se resolve. E neste ponto estamos de acordo com a recorrida quando defende que não resultaram provados quaisquer factos subsumíveis no pressuposto do instituto que impõe que tenha havido "lesão gerada pela alteração das circunstâncias". Nem se vê que lesão pudesse a recorrente ter sofrido: por força dos contratos de reserva ficou a Recorrente titular de direitos potestativos sobre os Recorridos que, por seu turno, se encontravam num estado de sujeição. O que, de resto, se prende com o requisito seguinte: dos contratos de reserva não resulta a obrigação, para a Recorrente, de (re)comprar os imóveis. Portanto, não há uma obrigação cuja exigência pudesse afectar os princípios da boa fé — simplesmente, porque a obrigação inexiste.

Para que seja possível a resolução ou, ao menos, a modificação das cláusulas do contrato fundada na alteração anormal das circunstâncias é necessário: (i) que a alteração ocorrida não seja o desenvolvimento previsível de uma situação conhecida à data da celebração do contrato e (ii) que essa alteração torne o cumprimento da obrigação ofensivo dos princípios da boa fé

Importa, portanto, debruçarmo-nos sobre a factualidade dada como provada para concluir se está verificado este último requisito, dado que o primeiro não está em causa.

E não podemos deixar de estar mais de acordo com a sentença da 1ª instância quando faz uma comparação entre a realidade económica provocada pela crise e o tipo de contrato ora em apreço, defendendo que “ a partir de 2008, com a profunda crise que começou por afectar os mercados financeiros e depois teve consequências graves noutros sectores da economia, em especial no imobiliário, se verificou uma contracção do crédito bancário para as empresas e particulares e subsequentemente uma redução rápida e progressiva das vendas de imóveis e a degradação acentuada dos respectivos preços (facto 56). Admitimos que se esteja perante uma grande e inesperada alteração das circunstâncias económico-sociais que se verificavam à data dos contractos, que foram sendo celebrados entre 07/08/2003 e 22/02/2007 (factos 15 a 33). Embora, diga-se de passagem, a euforia do imobiliário no mercado nacional tivesse começado a arrefecer nos primeiros anos do século (facto de conhecimento público, se a memória não for curta), é certo que a partir de 2008 o agravamento foi grande. No entanto, o efeito da crise no caso que ora nos ocupa - a A. não ter conseguido exercer os direitos de opção por não ter encontrado compradores para as fracções que iria recomprar - não está coberto pelo risco próprio dos negócios celebrados (venda de imóvel com opção de recompra em determinado prazo)? Não é próprio deste negócio o risco de o vendedor não conseguir exercer o direito de opção de (re)compra, quando apenas se propõe recomprar se e quando encontrar interessado na compra do mesmo bem, por valor superior ao da recompra? Parece-me que é.”

Sem querer interromper o raciocínio, permitimo-nos referir neste momento que a mera frustração de expectativas, como seja oportunidade de poder realizar negócios em contexto mais favoráveis, não pode ser abrangido pela previsão do artº 437º do CC.

Em todo o caso, não esqueçamos que as circunstâncias em que as partes fundaram a decisão de contratar só são relevantes para efeitos de revisibilidade ou resolubilidade do negócio se forem comuns a ambas as partes. Poderá dizer-se que ambas as partes fundaram a sua decisão de contratar na manutenção do status quo económico, social e financeiro que existia à data da celebração dos contratos? Creio que a resposta a esta questão, não pode deixar de ser negativa. A pergunta fundamental a fazer para aferir da bilateralidade da importância do status quo para as partes, é a seguinte: se a A. tivesse proposto aos RR., aquando da assinatura de cada par de contratos, a introdução de uma cláusula que permitisse à A. prorrogar unilateralmente o direito de opção pelo tempo necessário a conseguir a venda das frações a terceiros, os RR. teriam aceitado? A única resposta provável é negativa, e por várias razões. O BB é um fundo imobiliário fechado que teve início em julho de 2001, com uma duração inicial de 10 anos (ainda que prorrogável por períodos de cinco anos, sempre essas prorrogações seriam incertas e dependentes de futuras deliberações da Assembleia de Participantes). O DD não tem esta condicionante, pois é de duração indeterminada. Porém, ambos são fundos de investimento imobiliário, que visam o bom investimento em imóveis dos dinheiros dos participantes, não se coadunando com esse desejável investimento a colocação do seu património imobiliário, por tempo indeterminado, nas mãos de terceiros, através de contratos de opção cujo exercício lhes daria uma margem mínima (na recompra, o preço corresponderia ao valor do investimento do R. - preço de compra acrescido dos custos da escritura e do registo - atualizado anualmente pelo índice de Preços do Consumidor, sem habitação, acrescido de 1%). Todo indica, que a possibilidade de a A. não exercer os direitos de opção (ou todos eles, como foi o caso) era um cenário indesejado, mas que as partes não podem não ter previsto quando celebraram os contratos.

A A. sai, sem dúvida, lesada por não ter conseguido compradores para os imóveis, pelo menos pelos preços por si pretendidos. Mas não é líquido que a situação seja favorável aos RR. que têm em mãos um património cujo valor é altamente incerto, quando esperavam nesta altura ter recuperado o dinheiro investido. As avaliações descritas nos factos 110 a 113, e mesmo os valores das vendas pretéritas (facto 61), pouco dizem perante o incontornável facto de não haver, de momento, quem compre os imóveis pelos preços pretendidos, ou perto. Tanto significa que os valores actuais dos imóveis não têm correspondência com os que a A. pretende. Não sabemos sequer se os seus valores (ou seja, os valores pelos quais o mercado está, de momento, disposto a comprar) são superiores aos preços pelos quais os RR. compraram. Consequentemente, o pressuposto da parte lesada, que implica que uma das partes o seja, não se pode considerar um facto.

A impedir a procedência da acção por via da actuação do art. 437 do CC está, ainda, a impossibilidade de verificação do seguinte pressuposto: que a exigência das obrigações assumidas não afecte gravemente os princípios da boa fé. Com efeito, a A. não tinha a obrigação de recomprar em determinado prazo, tinha a opção, ou seja, o direito de o fazer. Não havendo obrigação assumida, não há obrigação que se possa exigir, nem espaço para aplicação do art. 437 do CC.

Não se verificam, pois, os pressupostos da resolução ou da modificação do contrato por alteração anormal das circunstâncias.

Acresce, ainda, que a parte que não esteja em condições de restituir o que houver recebido não tem o direito de resolver o contrato (art. 432, n.º 2, do CC). Repare-se como nos contratos dos autos, a resolução teria praticamente os mesmos efeitos do exercício do direito de opção pela A.:

- entrega pela A. aos RR. de quantia equivalente ao valor do investimento dos RR. (preço de compra acrescido dos custos da escritura e do registo, e valor das entregas feitas pelos RR. para a construção) - em caso de resolução o valor seria justamente actualizado pelos índices de inflação, pelo contrato, o valor seria atualizado anualmente pelo índice de Preços do Consumidor, sem habitação, acrescido de 1%;

- retorno do direito de propriedade à A.

A A. não exerceu os seus direitos de opção em tempo, porque não tinha disponibilidade financeira para tanto; assim como hoje não tem essa disponibilidade para retornar as prestações da contraparte, em caso de resolução. É também disso evidência o facto de a A. ter deixado de pagar as prestações dos contratos de reserva, em 2009, quando na sua maioria ainda vigoravam. Se se verificassem os pressupostos da resolução, ainda assim a resolução não poderia operar por a A. não estar em condições de retornar o que recebeu.


Acresce que mesmo quando se alteram as circunstâncias em que o negócio é feito (quod erat demonstradum) e um dos contraentes vê afectado o seu interesse, há que atender não só ao interesse desse contraente mas também ao do outro e ao interesse na estabilidade das convenções.(orlando)

Nos contratos, como os referidos em que as partes visam justamente negociar sobre a incerteza, o risco fornece o próprio objecto contratual pelo que a alteração das circunstâncias tem de ser de apreciável vulto ou proporções extraordinárias: o prejuízo só justifica a resolução ou modificação do contrato quando se verifique um profundo desequilíbrio do contrato, sendo intolerável com a boa - fé que o lesado o suporte.([2])

Deste forma não estamos em sintonia com o acórdão recorrido quando defende que, em relação ao caso em apreciação, a actual crise financeira pela dimensão da sua ocorrência, pela sua não antecipabilidade generalizada e pelo facto de ser global constitui uma alteração anómala e superveniente das circunstâncias em que as partes fundaram a vontade de contratar previsto no artigo 437º nº 1 do CC.

Também defendemos, o artº 438º do CC é claro, que não aproveita à parte lesada que esteja em mora. No entanto no caso em apreço as circunstâncias temporais dadas como provadas não nos permitem concluir como faz o acórdão recorrido. Os contratos dos autos datam de 2003, portanto de uma época em que não era expectável a crise que veio a ocorrer. A crise teve o seu início em 2008. A autora cessou o pagamento das remunerações devidas em Março de 2009.

Considerando que é de conhecimento geral que a crise se prolongou durante anos, não temos, no entanto, elementos factuais que nos permitam afirmar tão categoricamente como faz o acórdão recorrido que havia mora no momento em que a alteração das circunstâncias se verificou.


Caixa de texto: 11 - DECISÃO:
Nesta conformidade, acorda-se em negar provimento à revista.
Custas pela recorrente.
Notifique.



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Lisboa, 2017-03-30


João Trindade (Relator)

Tavares de Paiva

Abrantes Geraldes

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[1] Revista 187/10.4TVLSB.L2.S1-10-1-2013
[2] -Ac. Rel. Lisboa 10-4-08-Processo 1387/11