Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
1/16.7P3LSB-H.S1
Nº Convencional: 3ª SECÇÃO
Relator: PAULO FERREIRA CUNHA
Descritores: HABEAS CORPUS
PRISÃO ILEGAL
PRISÃO PREVENTIVA
PRAZO DA PRISÃO PREVENTIVA
FALSIFICAÇÃO
EXCEPCIONAL COMPLEXIDADE
EXCECIONAL COMPLEXIDADE
Data do Acordão: 12/30/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: HABEAS CORPUS
Indicações Eventuais:
DIREITO PROCESSUAL PENAL – MEDIDAS DE COACÇÃO E DE GARANTIA PATRIMONIAL / MEDIDAS DE COACÇÃO / REVOGAÇÃO, ALTERAÇÃO E EXTINÇÃO DAS MEDIDAS / HABEAS CORPUS EM VIRTUDE DE PRISÃO ILEGAL.
Doutrina:
- Hans Vaihinger, Die Philosophie des Als Ob, 5.ª ed., Leipzig Félix Meiner, 1920;
- T. A. Castaglia, La Filosofia del 'Als ob' nel diritto, Rivista Internazionale di Filosofia del Diritto, ano V, 1926, p. 98 ss..
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO PENAL (CPP): - ARTIGOS 215.º, N.ºS 2, ALÍNEA D) E 3 E 222.º, N.º 2.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:


- DE 05-09-2019, 5.ª SECÇÃO.
Sumário :
I -    É o habeas corpus uma providência de todo diversa, independente do recurso, distinguindo-se deste pelo seu âmbito. O controlo que este Supremo Tribunal de Justiça deve fazer no âmbito do habeas corpus é independente do que seria o de recurso, designadamente não se imiscuindo nas questões da prova e todas as matérias que poderão ser do âmbito dessa outra possível diligência. Encontra-se estritamente vinculada pelos termos constitucionais e legais do regime que regula o instituto.

II - Os requisitos para a concessão de habeas corpus no caso de prisão ilegal são os constantes das alíneas do n.º 2 do art. 222.º do CPP.

III - Um arguido em prisão preventiva, inter alia já condenado por crime de falsificação de documento, “crime de catálogo” abrangido pela al. d) do n.º 2 do art. 215.º do CPP, cujo prazo máximo de prisão preventiva é de 3 anos e 4 meses, nos termos do n.º 3 desse normativo, e tendo sido declarada a excecional complexidade do procedimento, não pode considerar-se em situação de haver sido esgotado o prazo máximo da prisão preventiva a que se encontra sujeito.

Decisão Texto Integral:
I

Relatório




1. AA, preso preventivamente no Estabelecimento Prisional de …, veio peticionar a providência de Habeas Corpus junto deste Supremo Tribunal de Justiça, ao abrigo do disposto no art. 222, n.° 2, alínea c) do CPP, nos termos e pelos fundamentos que imediatamente sintetizamos.


2. Tendo o arguido AA sido detido em 30.05.2017 e sujeito a prisão preventiva, encontrava-se preso, no momento da referida petição, há 2 anos, seis meses, e vinte dias.


3. O processo foi declarado de excecional complexidade em sede de inquérito.


4. Entretanto, o arguido não foi pronunciado pelo crime de associação criminosa, previsto no art. 299 do CP, assim como, por acórdão proferido no dia 29.11.2019, foi absolvido do crime de branqueamento de capitais, previsto no artigo 368-A do CP, assim como os seus coarguidos.


5. Contudo, o arguido seria condenado pelo crime de furto qualificado, e ainda por um crime de falsificação de documento, previsto e punível nos termos do artigo 256, n.º 1 e) e n.° 3 do CP.


6. Alega que, partir do momento em que foi absolvido do crime de branqueamento de capitais, deixariam de existir os pressupostos dos números 2 e 3 do artigo 215 do CPP, para efeitos da extensão do prazo máximo de prisão preventiva.


7. Invoca a libertação, na sequência de outro Habeas Corpus, decidido por este mesmo Supremo Tribunal, de alguns coarguidos, a partir do momento em que não mais impendia sobre eles (como ocorre consigo) a acusação de branqueamento de capitais e associação criminosa, por não pronúncia e por absolvição.


8. Invoca ainda Acórdão deste Supremo Tribunal proferido no processo 256/16PAPVVZ-B.S1, onde estavam em causa os crimes de furto e de falsificação.


9. Reconhece, sem embargo, o Peticionante a sua condenação, ainda não transitada em julgado, por um dos crimes de catálogo, um crime de falsificação.

   Em tal se fundaria o Tribunal a quo para não proceder à sua libertação, por considerar não se encontrar ultrapassado o prazo máximo de prisão preventiva legalmente admissível, no caso, embora considere haver ordenado a libertação de todos os demais ao abrigo do princípio da igualdade, após a decisão deste Supremo Tribunal quanto ao Habeas Corpus já referido. Importa, contudo, cotejar esta generalização com o referido no ponto 14 e subsequente argumentação.


10. Recorta a sua questão, nesta providência a

“saber se este crime de falsificação juntamente com o crime de furto de que foi condenado por sentença não transitada, é suficiente para permitir a extensão dos prazos de prisão preventiva aos dois anos e seis meses, conforme previsto no artigo 215° do CPP, números 2 e 3, devendo o arguido manter-se em prisão preventiva.”


11. Considerando que a condenação sem trânsito em julgado de um crime de falsificação de documento, do artigo 256, n.º 1 e) e 3 do CP não seria por si só suficiente para justificar ou fundamentar o prolongamento do prazo de prisão preventiva, nos termos do artigo 215, n.º1 c) do CPP, tem para si que o prazo de prisão preventiva teria sido excedido desde a prolação do Acórdão proferido pela 1.ª instância, e consequentemente pedindo a libertação do arguido, nos termos do disposto nos números 1 e 2 do artigo 217 do CPP.


12. Por seu turno, a Informação a que alude o art. 223 n.º 1 do CPP, começando por referir que

“A medida de habeas corpus não se destina, salvo o devido respeito por outra opinião, a formular juízos de mérito sobre a decisão judicial de privação de liberdade.

Para esse efeito servem os recursos, os requerimentos e os incidentes próprios, na sede apropriada.”, explicita que está aqui e agora apenas em causa a verificação dos  pressupostos da prisão preventiva dos arguidos, se tais pressupostos constituem “patologia desviante” enquadrável em alguma das als. do art. 222, n.º 2 do CPP. É certo.


13. Depois de esclarecer o que se encontra em discussão neste Habeas Corpus, invoca a Informação referida os fundamentos constantes do despacho proferido a 10 de dezembro do ano em curso (ref. 39…55) que indeferiu a libertação de coarguidos que haviam apresentado pedido de libertação por razões semelhantes. Apesar de se recordar que idêntica solução, defendida pelo Conselheiro Carlos Rodrigues de Almeida, não tenha obtido vencimento de causa para outros casos.


14. Decisiva para a consideração do presente caso é a precedente decisão sobre dois coarguidos com situações de grande similitude com a presente.

Assim, como diz a Informação, os Conselheiros “Francisco Caetano e Manuel Braz, no douto Acórdão que obteve vencimento, decidiram: (...)

A situação processual do ora peticionante, o arguido AA, é exatamente a mesma que a dos co-arguidos M… C… e B… M… relativamente aos quais foi indeferida a respetiva providência de habeas corpus.

Por conseguinte, com base nesses mesmos fundamentos:

1) Mantém-se a prisão preventiva do arguido ora requerente da presente

providência de habeas corpus (art. 223º, n.º 1 do C.P.P.).”


15. Convocado o Tribunal e notificados o M.º P.º e a Mandatária, teve lugar a audiência, nos termos os art.º 223, n.º 3, e 435 do CPP.


Há agora que tornar pública a respetiva deliberação e, sumariamente, a discussão que a precedeu.



II

Fundamentação




1. Certamente nunca será demais recordar-se que prisão preventiva é uma providência de cariz gravoso, excecional e subsidiário (cfr. CRP, art. 28, n.º 2), altamente restritiva da liberdade de uma pessoa (ao ponto de em grande medida a anular no que diz respeito à circulação), e, pelo seu caráter essencialmente provisório e não decorrente de um juízo definitivo de condenação, tem, obviamente, que ser utilizada apenas em casos legalmente previstos e devidamente ponderados, de particular necessidade, gravidade e perigo. Como se afirma no Acórdão deste Supremo Tribunal de 23-10-2019 (pontos I e II do respetivo sumário):

“I. A drástica restrição ao direito fundamental à liberdade ambulatória que encerra, não permite que a prisão preventiva seja aplicada se não se revelar a única adequada a acautelar o normal desenvolvimento do procedimento (a finalidade primordial desta e de qualquer outra medida coativa) ou a obstar a que o arguido se exima à execução da fortemente previsível condenação.

II. Só pode manter-se enquanto for justificada pelas exigências cautelares que a determinaram e não pode, em qualquer caso, exceder o tempo fixado na lei – art. 27.º n.º 3 da Constituição da República.”


2. O Habeas Corpus, velho instituto britânico que se foi espalhando pelo mundo ao longo de séculos após a sua génese, encontra-se plenamente recebido, e de forma historicamente fundada e atualmente institucionalizada e em termos de grande abertura jurisdicional entre nós. É um instituto apto a uma expedita e eficaz tutela jurisdicional do direito humano e fundamental à Liberdade (e antes de mais valor superior – conforme desenvolvido, especialmente, pela doutrina espanhola com base logo no art. 1.º, n.º 1 da respetiva Constituição – mas com valor universal), podendo, se procedente, colocar termo, e de forma célere, a prisão ou detenção ilegais, nos termos constitucionais e da lei penal.

O seu caráter de direito humano e fundamental, e para mais Valor, coloca a Liberdade no zénite do firmamento jurídico-normativo, só a par da Igualdade e da Justiça (ou da Fraternidade – cf. o Preâmbulo da CRP) para boa parte da doutrina e de grandes metanarrativas de Direitos. É em coordenação com e dirigido à proteção desse valor que se tem de encarar o instituto.


3. É o Habeas Corpus, consequentemente, uma providência de todo diversa, independente e paralela ao recurso, distinguindo-se deste pelo seu âmbito. O controlo que este Supremo Tribunal deve fazer no âmbito do habeas corpus é outro e independente do que seria o de recurso, designadamente não se imiscuindo nas questões da prova e todas as matérias que poderão ser do âmbito dessa outra possível diligência. Na síntese do (Ac. STJ, 05-09-2019, 5.ª secção), no ponto III do respetivo sumário:

“Ao STJ, num pedido de habeas corpus por prisão ilegal, apenas incumbe verificar se a prisão resulta de uma decisão judicial proferida por um juiz com competência criminal, se a sua aplicação foi motivada pela prática de um facto que a admite e se foram respeitados os limites temporais da privação da liberdade fixados por lei ou em decisão judicial cf. art. 222.º, n.º 2, do CPP.”.

4. A jurisprudência em abono deste entendimento poderia reproduzir-se ad libitum. Brevitatis causa, como se refere no Acórdão deste Supremo Tribunal de 2 de Fevereiro de 2005, entende-se que

No âmbito da decisão sobre uma petição de habeas corpus, não cabe, porém, julgar e decidir sobre a natureza dos actos processuais e sobre a discussão que possam suscitar no lugar e momento apropriado (isto é, no processo), mas tem de se aceitar o efeito que os diversos actos produzam num determinado momento, retirando daí as consequências processuais que tiverem para os sujeitos implicados”. A providência de habeas corpus não decide, assim, sobre a regularidade de actos do processo com dimensão e efeitos processuais específicos, não constituindo um recurso de actos de um processo em que foi determinada a prisão do requerente, nem um sucedâneo dos recursos admissíveis.

5. Insista-se ainda que esta providência excecional não se substitui nem pode substituir-se aos recursos ordinários, ou seja, não é nem pode ser meio adequado de pôr termo a todas as situações de uma possível ilegalidade de uma situação de prisão. Está reservada, para os casos indiscutíveis de ilegalidade, que, por serem-no, impõem e permitem uma decisão tomada com imposta celeridade. Como afirmou este mesmo Supremo Tribunal, no seu Acórdão de 16 de Dezembro de 2003, trata-se aqui de

um processo que não é um recurso, mas uma providência excepcional destinada a pôr um fim expedito a situações de ilegalidade grosseira, aparente, ostensiva, indiscutível, fora de toda a dúvida, da prisão e, não, a toda e qualquer ilegalidade, essa sim, possível objecto de recurso ordinário e ou extraordinário. Processo excepcional de habeas corpus este, que, pelas impostas celeridade e simplicidade que o caracterizam, mais não pode almejar, pois, que a aplicação da lei a circunstâncias de facto já tornadas seguras e indiscutíveis (…)”.


6. É, pois, o Habeas Corpus uma providência votada a uma rigorosa, mas rápida, apreciação da ocorrência eventual de abuso de poder traduzido em prisão ilegal, que não prejudica outras eventuais diligências mais aturadas.


7. São conhecidos os requisitos para a concessão de habeas corpus no caso de prisão ilegal: são os constantes do n.º 2 do art. 222 CPP in fine, para os casos de a prisão

a) Ter sido efetuada ou ordenada por entidade incompetente;

b) Ser motivada por facto pelo qual a lei a não permite; ou

c) Manter-se para além dos prazos fixados pela lei ou por decisão judicial.

No caso, apenas é alegada matéria que poderia eventualmente ser considerada à luz da previsão da alínea c), como decorre do que ficou dito supra.


8. O arguido AA foi condenado pela prática de 16 crimes de furto qualificado e um crime de falsificação de documento, como salienta a informação a que se refere o art. 223 n.º 1 do CPP, em processo de declarada alta complexidade.

A questão que se coloca é a de saber se se encontra ou não ultrapassado o prazo máximo de prisão preventiva, ou seja, se na sequência da absolvição do crime de branqueamento de capitais, o prazo máximo de tal medida de coação será de apenas 1 ano e 6 meses (art. 215, n.º 1, al. d) do CPP) ou de 3 anos e 4 meses, já que o processo foi declarado de excecional complexidade (art. 215, n.ºs 3 e 4 do CPP).


9. A questão não parece ser, prima facie, absolutamente linear, tanto mais que as soluções encontradas para diversos coarguidos foram diferentes, e não há inteira concordância entre os diferentes intervenientes, opinantes e decisores. Contudo, essa dificuldade poderá ser ultrapassada se nos concentrarmos, sem prejuízo das legítimas comparações cabíveis, no caso sub judice. E apenas nas situações realmente semelhantes e não noutras. Porque o procedimento analógico e afim, sobretudo em direito penal, tem as suas dificuldades, assim como, de resto, todo o pensamento hipotético e de “como se” (Hans Vaihinger, Die Philosophie des Als Ob, 5.ª ed., Leipzig Félix Meiner, 1920; T. A. Castaglia, La Filosofia del 'Als ob' nel diritto, in “Rivista Internazionale di Filosofia del Diritto“, ano V, 1926, p. 98 ss.). Sem prejuízo de contextualizar, há que ir à questão concreta.

10. Vejamos. Como é sabido, o art. 215 do CPP determina quais os prazos máximos de duração da prisão preventiva. Do seguinte modo:


«1 - A prisão preventiva extingue-se quando, desde o seu início, tiverem decorrido:

a) Quatro meses sem que tenha sido deduzida acusação;

b) Oito meses sem que, havendo lugar a instrução, tenha sido proferida decisão instrutória;

c) Um ano e dois meses sem que tenha havido condenação em 1.ª instância;

d) Um ano e seis meses sem que tenha havido condenação com trânsito em julgado.

2 - Os prazos referidos no número anterior são elevados, respetivamente, para seis meses, dez meses, um ano e seis meses e dois anos, em casos de terrorismo, criminalidade violenta ou altamente organizada, ou quando se proceder por crime punível com pena de prisão de máximo superior a 8 anos, ou por crime:

a) Previsto no artigo 299.º, no n.º 1 do artigo 318.º, nos artigos 319.º, 326.º, 331.º ou no n.º 1 do artigo 333.º do Código Penal e nos artigos 30.º, 79.º e 80.º do Código de Justiça Militar, aprovado pela Lei n.º 100/2003, de 15 de Novembro;

b) De furto de veículos ou de falsificação de documentos a eles respeitantes ou de elementos identificadores de veículos;

c) De falsificação de moeda, títulos de crédito, valores selados, selos e equiparados ou da respetiva passagem;

d) De burla, insolvência dolosa, administração danosa do sector público ou cooperativo, falsificação, corrupção, peculato ou de participação económica em negócio;

e) De branqueamento de vantagens de proveniência ilícita;

f) De fraude na obtenção ou desvio de subsídio, subvenção ou crédito;

g) Abrangido por convenção sobre segurança da navegação aérea ou marítima.

3 - Os prazos referidos no n.º 1 são elevados, respetivamente, para um ano, um ano e quatro meses, dois anos e seis meses e três anos e quatro meses, quando o procedimento for por um dos crimes referidos no número anterior e se revelar de excecional complexidade, devido, nomeadamente, ao número de arguidos ou de ofendidos ou ao carácter altamente organizado do crime.

4 - A excecional complexidade a que se refere o presente artigo apenas pode ser declarada durante a 1.ª instância, por despacho fundamentado, oficiosamente ou a requerimento do Ministério Público, ouvidos o arguido e o assistente.

5 - Os prazos referidos nas alíneas c) e d) do n.º 1, bem como os correspondentemente referidos nos nºs 2 e 3, são acrescentados de seis meses se tiver havido recurso para o Tribunal Constitucional ou se o processo penal tiver sido suspenso para julgamento em outro tribunal de questão prejudicial.

6 - No caso de o arguido ter sido condenado a pena de prisão em 1.ª instância e a sentença condenatória ter sido confirmada em sede de recurso ordinário, o prazo máximo da prisão preventiva eleva-se para metade da pena que tiver sido fixada.

7 - A existência de vários processos contra o arguido por crimes praticados antes de lhe ter sido aplicada a prisão preventiva não permite exceder os prazos previstos nos números anteriores.

8 - Na contagem dos prazos de duração máxima da prisão preventiva são incluídos os períodos em que o arguido tiver estado sujeito a obrigação de permanência na habitação».


11. Neste horizonte normativo, é certo que alguns coarguidos foram mandados libertar na sequência do Acórdão deste Supremo Tribunal de 19 de dezembro p.p.. – e isso, em teoria aproveitando à tese do peticionário, pela sua Mandatária é enfatizado.

Contudo, também é certo que nessa mesma decisão, além de haver um voto de vencido (que alargaria ainda mais as razões para manter a prisão preventiva, mas que não é a questão em apreço neste momento), na respetiva parte final se explicitam, com meridiana clareza, as razões que procedem para que os dois dos arguidos, M… C… e B… M…, não hajam sido devolvidos à liberdade. Assim explicita o referido aresto:

“Já os arguidos M…. C… e B… M… foram condenados não só por furtos, designadamente qualificados, mas também pela prática, cada um, de um crime de falsificação de documento, que configura crime de catálogo abrangido pela alín. d) do n.º 2 do art. 215º do C.P.P., cujo prazo máximo de prisão preventiva é de 3 anos e 4 meses, nos termos do n.º 3 desse normativo, face a ter sido declarada a excecional complexidade do procedimento.

(…) esse prazo ainda se não esgotou, pelo que os seus pedidos de habeas corpus são infundados”.

Aqui o lugar paralelo é absolutamente pertinente. Mas especificamente neste aspeto, e não mais que nele.


12. Com efeito, nesses dois casos, como no vertente, não se trata apenas de condenação por furtos (aliás, no caso, abundantes e qualificados), mas ainda a condenação, mais grave e de catálogo (art. 215, n.º 2, al. d),  pelo crime de falsificação de documento, previsto e punível nos termos do artigo 256, n.º 1 e) e n.° 3 do CP.


13. Assim, tendo sido declarada desde logo a excecional complexidade do procedimento, o prazo máximo da prisão preventiva será de 3 anos e 4 meses. Ora, como dito supra, no n.º 2 do Relatório, o arguido encontra-se preso há bastante menos tempo. E, portanto, não se está perante qualquer caso de prisão para além do prazo legal.


14. Donde se conclui que os argumentos invocados na presente petição para este Supremo Tribunal não alcançam valimento de causa, por se não adequarem à hipótese do art. 222, n.º 2, do CPP. Não se verificando nenhuma das situações elencadas no referido artigo e número, nem mesmo a constante da alínea c).



III

Dispositivo




Pelo exposto, deliberando nos termos dos n.ºs 3 e 4, alínea a), do artigo 223 do CPP, acorda-se na 3.ª Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça em indeferir o pedido por falta de fundamento bastante.

Custas pelo peticionante, fixando-se a taxa de justiça em 3 (três) UC, nos termos do artigo 8.º, n.º 9, e da Tabela III do Regulamento das Custas Processuais.


Lisboa, 30 de dezembro de 2019


Dr. Paulo Ferreira da Cunha (Relator)

Dr.ª Maria da Conceição Simão Gomes (adjunta)

Dr. Acácio das Neves (presidente)