Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
03S2175
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: VÍTOR MESQUITA
Descritores: RECURSO
ADMISSIBILIDADE
VALOR DA CAUSA
Nº do Documento: SJ200309240021754
Data do Acordão: 09/24/2003
Votação: UNANIMIDADE COM 1 DEC VOT
Tribunal Recurso: T REL LISBOA
Processo no Tribunal Recurso: 8582/02
Data: 02/05/2003
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA.
Sumário : 1. Configurando o caso dos autos uma situação de coligação activa entre dezoito AA., voluntária, e traduzindo-se a coligação numa cumulação de várias acções conexas, uma tal cumulação não determina a perda da individualidade de cada uma das respectivas acções, não obstante se encontrarem inseridas no mesmo processo. Os recursos de decisões ou da decisão final só serão admissíveis se e na medida em que os mesmos fossem legalmente admissíveis se processados em separado.
2. Tendo os AA. atribuído à acção o valor de 3.000.001$00 (€ 14.963,94), o qual não foi alterado, este representa o somatório do valor dos pedidos por cada um deles formulado, correspondendo o valor atendível para efeitos de alçada e da admissibilidade do recurso apenas a 1/18 do todo.
3. Sendo a alçada do Tribunal da Relação de 3.000.000$00 - art. 24 da Lei 03/99, de 13 de Janeiro (LOFTJ) - e não estando o tribunal superior vinculado à decisão que admita um recurso (art. 687, n. 4, do CPC), o presente recurso não é legalmente admissível, face ao disposto no n. 1 do art. 678 do CPC.
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:

1- A; 2 - B; 3 - C; 4 - D; 5 - E; 6 - F; 7 - G; 8 - H; 9 - I; 10 - J; 11 - L; 12 - M; 13 - N; 14 - O; 15 - P; 16 - Q; 17 - R; 18 - S,
vieram intentar acção emergente de contrato individual de trabalho, em processo comum, contra "T, S.A.", pedindo que a R. seja condenada:
a) a integrar os AA. a partir de 28 de Janeiro de 1995, respectivamente, nas seguintes categorias profissionais:
- 1º a 4º A. Motorista I (MOTI)
- 5º A. Técnico de Armazém I (TARI)
- 6º a 12º A. Técnico Operador de Telecomunicações I (TOTI)
- 13º a 18º A. Técnico de Manutenção de Artes e Ofícios I (TMAI).
b) a respeitar a evolução nos níveis de progressão previstos para aquelas categorias, bem como a pagar as diferenças remuneratórias que resultem da aplicação das remunerações mínimas decorrentes daqueles níveis a liquidar em execução de sentença.
c) a pagar juros de mora, à taxa legal, desde a citação sobre as diferenças salariais que se venham a liquidar.

Através de requerimento de fls. 44, a Autora J veio desistir da instância, a qual foi julgada válida por decisão de fls. 46.
Designada a audiência das partes, e frustrada a tentativa de conciliação, a R. apresentou contestação, tendo pedido a improcedência da acção e sua absolvição do peticionado.
Tendo-se procedido a julgamento, consideraram-se provados os factos constantes de fls. 186 a 194, e logo foi proferida sentença (fls. 195 a 222), que, julgando a acção improcedente, absolveu a R. dos pedidos.
Não se conformando com esta sentença dela interpuseram os AA. recurso de apelação para o T. R. Lisboa, que, por acórdão de fls. 255 a 272, negou provimento ao recurso, confirmando a sentença recorrida.
Ainda inconformados com este acórdão interpuseram os AA. o presente recurso de revista, e, tendo apresentado alegações e formulado conclusões, pediram a revogação do acórdão recorrido e a procedência da acção.
Apresentando contra-alegações a R. pugna pela manutenção do decidido pela Relação.
O Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu o "parecer" de fls. 308 e 309 no sentido de não ser admitido o presente recurso de revista, o qual, tendo sido notificado às partes, delas nenhuma resposta suscitou.

Cumpre apreciar e decidir.
A presente acção foi proposta, como se alcança do carimbo aposto na p.i., em 15/5/2000, tendo os AA. (18) atribuído à mesma o valor de 3.000.001$00 (€ 14.963,94).
O caso dos autos configura uma situação de coligação activa voluntária entre dezoito AA. (artº. 30º do CPC).
A coligação traduz-se praticamente na cumulação de várias acções conexas (Alberto dos Reis, CPC Anotado, I, 99).
Vem sendo jurisprudência constante deste STJ (vide p. ex. Acs. de 06/12/00, proc. 2373/00, de 14/11/01, procs. 710/01, 1588/01, 1821/01, e 1959/01, de 20/02/02) que a cumulação de acções resultantes da situação de coligação ou de litisconsórcio voluntário não determina a perda de individualidade de cada uma das respectivas acções, não obstante se encontrarem inseridas no mesmo processo, pelo que os recursos de decisões ou da decisão final só serão admissíveis se e na medida em que os mesmos fossem legalmente admissíveis se processados em separado.
Tal jurisprudência foi reafirmada noutros acórdãos mais recentes deste STJ (4ª Secção), em que, por sinal, a Ré é a mesma destes autos (vide Acs. de 06/03/2003, Revista 4067/02, de 06/3/03, Revista 3705/02).
Como se deixou assinalado neste último acórdão citado, atribuindo os AA. (eram 26) à acção o valor de 3.000.001$00, este representa o somatório do valor dos pedidos por cada um deles formulado, correspondendo o valor atendível para efeitos de alçada e de admissibilidade do recurso, apenas a 1/26 do todo.
Igual raciocínio vale para o caso dos autos.
A alçada do Tribunal da Relação é de 3.000.000$00 (€ 14.963,94) - artº. 24º da Lei 03/99, de 13 de Janeiro (LOFTJ).
O valor atribuído à acção não foi alterado, pelo que deve considerar-se definitivamente fixado (art. 315 do CPC).
Sendo certo, por outro lado, que a decisão que admita um recurso não vincula o tribunal superior (art. 687, n. 4, do CPC), o recurso presente não é, pois, legalmente admissível, face ao disposto no n. 1 do art. 678 do CPC.

Termos em que se decide não conhecer do recurso.
Custas pelos recorrentes.

Lisboa, 24 de Setembro de 2003
Vítor Mesquita,
Ferreira Neto,
Dinis Roldão. (Vencido, conforme declaração de voto que junto).
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DECLARAÇÃO DE VOTO:

O pedido formulado pelos Autores na presente acção tem uma redacção em que se não quantifica qualquer importância que seja devida a cada um deles e na qual a Ré deva ser condenada.
Nesse pedido se inclui, para além do mais, a condenação da Ré a integrar os Autores em determinadas categorias profissionais, por eles reivindicadas.
Em face deste segmento do pedido, afigura-se-me estarmos perante um caso nítido de acção em que estão em causa interesses imateriais dos demandantes, cujo valor vem definido no artigo 312º do Código de Processo Civil.
Em conformidade com essa norma processual, os Autores atribuíram à acção o valor de 3.000.001$00.
O nº. 1 do artigo 678º do Código de Processo Civil, aplicável nesta acção ex vi do disposto no artigo 1º, nº. 2, alínea a), do Código de Processo do Trabalho, faz depender a admissibilidade dos recursos ordinários de dois requisitos: o valor da causa e o valor da sucumbência (vide Cons Dr. Fernando Amâncio Ferreira, in "Manual dos Recursos em Processo Civil", 2ª edição, página 95).
No que concerne ao primeiro desses dois requisitos - como o salienta esse autor - o recurso só é admissível nas causas de valor superior à alçada do tribunal de que se recorre.
A alçada é «o limite até ao qual o tribunal julga sem recurso ordinário».
Estando a alçada da Relação actualmente fixada em 14.963,94 euros (3.000.000$00) por força do disposto no artº. 24º, nº. 1, da Lei nº. 3/99, de 13/1, e tendo esta acção o valor já referido, segue-se daí que, a meu ver, do acórdão proferido pela 2ª instância neste processo haja lugar ao recurso de revista interposto pelos Autores para este Supremo Tribunal, por estarem preenchidos os dois únicos requisitos colocados na lei adjectiva para a admissibilidade dos recursos ordinários.
Em minha opinião, a coligação voluntária de autores não afasta, no caso em presença, a regra geral da admissibilidade dos recursos ordinários.
O princípio geral do nosso ordenamento é o da recorribilidade das decisões judiciais e a irrecorribilidade é vista pela lei como uma excepção, independentemente da extensão prática dos casos de irrecorribilidade (Prof. Dr. Castro Mendes, in "Recursos", página 40, citado pelo Cons. Dr. Armindo Ribeiro Mendes, na sua obra "Recursos em Processo Civil", na página 151).
Para este último tratadista, a irrecorribilidade das decisões judiciais pode resultar de um de três factores:
A) - o valor da sucumbência relacionado com a alçada do tribunal a quo;
B) - a exclusão da lei;
C) - a exclusão por vontade da parte ou das partes (renúncia ao recurso).
Na presente acção nenhum desses factores se verifica.
Ora, tendo esta causa o valor que tem, não vejo motivo para não se admitir a revista só porque são vários os autores da acção (e não um só).
Discordo, por isso, da decisão de não conhecimento do recurso.
Dinis Roldão