Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
4279/16.8T8LSB.L1.S1
Nº Convencional: 4ª SECÇÃO
Relator: GONÇALVES ROCHA
Descritores: ARGUIÇÃO DE NULIDADE DE ACÓRDÃO
CADUCIDADE
ALTERAÇÃO DO HORÁRIO DE TRABALHO
FALTAS JUSTIFICADAS
JUSTA CAUSA
ASSÉDIO
Data do Acordão: 03/01/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA EM PARTE
Área Temática:
DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO – PROCESSO DE DECLARAÇÃO / PROCESSO COMUM / SENTENÇA / ARGUIÇÃO DE NULIDADES DA SENTENÇA.
DIREITO DO TRABALHO – CONTRATO DE TRABALHO / CESSAÇÃO DE CONTRATO DE TRABALHO / DESPEDIMENTO POR INICIATIVA DO EMPREGADOR / MODALIDADES DE DESPEDIMENTO / DESPEDIMENTO POR FACTO IMPUTÁVEL AO TRABALHADOR.
Doutrina:
-António Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, 17.ª Edição, p. 314;
-António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2016, Almedina, 3.ª Edição, p. 367 e ss.;
-Júlio Gomes, Direito do Trabalho, Volume I, 2007, p. 426, 428, 436 e 437;
-Maria do Rosário Palma Ramalho, Tratado de Direito do Trabalho, Parte II, Situações Laborais Individuais, 6.ª Edição, Almedina, p. 839;
-Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, 17.ª Edição, 2014, p. 173.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DO PROCESSO DE TRABALHO (CDT): - ARTIGO 77.º, N.º1;
CÓDIGO DO TRABALHO (CT): - ARTIGO 357.º, N.º2
Jurisprudência Nacional:






ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

- DE 22-02-1995, CJSTJ, 279/1;
- DE 02-05-2007, PROCESSO N.º 06S4717, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 30-09-2009, PROCESSO N.º 623/09;
- DE15-10-2009, PROCESSO N.º 1547/10.6TTLSB.L3.S1;
- DE 17-12-2009, PROCESSO N.º 343/05.7TTCSC, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 07-03-2012, PROCESSO N.º 17/10.7TTEVR.E1.S1, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 30-04-2013, PROCESSO N.º 1154/09.6TTLSB.L1.S1, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 13-11-2013, PROCESSO N.º 196/12.9TTBRR.L1.S1, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 15-10-2014, PROCESSO. 1037/12.2TTLSB.L1.S1;
- DE 16-06-2015, PROCESSO N.º 363/05.1TTCSC.L1.S2;
- DE 21-04-2016, PROCESSO N.º 299/14.5T8VLG.P1.S1;
- DE 16-06-2016, PROCESSO N.º 3008/14.5TTLSB.L1.S1;
- DE 30-06-2016, PROCESSO N.º 605/11.4TTLRA.C1.S1, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 14-07-2016, PROCESSO N.º 506/12.9TTTMR-A.E1.S1, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 29-09-2016, PROCESSO N.º 291/12.4TTLRA.C1.S2, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 29-09-2016, PROCESSO N.º 291/12.4TTLRA.C1.S2;
- DE 12-01-2017, PROCESSO N.º 69/13.8TTLRS.L2.S1, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 03-12- 2014, PROCESSO N.º 712/12.6TTPRT.P1.S1.
Sumário :

I- Conforme impõe o artigo 77º, nº 1 do CPT, a arguição de nulidades apontadas ao Acórdão da Relação tem de ser feita, expressa e separadamente, no requerimento de interposição do recurso, sob pena de delas se não conhecer. Por isso, sendo tal arguição circunscrita ao texto alegatório, é a mesma inatendível.

II- Quando não exista comissão de trabalhadores e o trabalhador não seja representante sindical, o prazo de 30 dias para proferir a decisão final do procedimento conta-se a partir da data da conclusão da última diligência de instrução, conforme estabelece o n.º 2 do artigo 357º do CT.

III- Tendo a trabalhadora requerido na resposta à nota de culpa que fosse notificada do teor da decisão final dum processo de despedimento por extinção do posto de trabalho e respectivos fundamentos que teria existido, bem como que se ordenasse a junção de todos os contratos em vigor na empresa, respectivos cargos e funções, e tendo a instrutora apreciado este requerimento, indeferindo-o por despacho fundamentado, despacho de que foi notificado o mandatário da arguida, o prazo de 30 dias para proferir decisão conta-se desde a data da sua prolação.

IV- Competindo ao empregador definir, no âmbito do seu poder de direcção, os horários de trabalho dos trabalhadores ao seu serviço, dentro dos condicionalismos legais, a sua alteração não pode ser unilateralmente determinada nos casos em que os horários tenham sido individualmente acordados.

V- Sendo ilegal a fixação de novo horário de trabalho em virtude da trabalhadora não ter dado o seu acordo à alteração do horário que tinha acordado por escrito com a empresa, recusando-se a cumprir o novo horário unilateralmente fixado pela empregadora, a trabalhadora não incorre em faltas injustificadas.

VI- Não é toda e qualquer violação dos deveres da entidade empregadora em relação ao trabalhador que pode ser considerada assédio moral, exigindo-se que se verifique um objectivo final ilícito ou, no mínimo, eticamente reprovável, para que se tenha o mesmo por verificado.

Decisão Texto Integral:

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:

1----

AA impugnou judicialmente a regularidade e a licitude do seu despedimento, efectuado por

BB, Lda., por comunicação recebida em 4 de Fevereiro de 2016.

Realizada a audiência de partes, e não tendo esta derivado na sua conciliação, veio a empregadora apresentar o procedimento disciplinar que conduziu àquele despedimento e o articulado motivador, tendo alegado que a justa causa de despedimento fundou-se em conduta da trabalhadora gravemente violadora dos deveres de obediência, assiduidade e pontualidade, elencados no artigo 128º, nº 1, do Código de Trabalho, porquanto apresentou-se para trabalhar às 17 horas para sair às 19 h durante 33 dias, quando deveria ter entrado ao serviço às 10 horas.

Conclui que deve ser declarada a licitude do despedimento a que procedeu e declara opor-se à reintegração da A. no seu posto de trabalho por tal acarretar grave perturbação na sua organização.

Na contestação apresentada ao articulado de motivação do despedimento, a A veio alegar que se verifica a caducidade do direito da R. de proferir a decisão de despedimento; que os factos que lhe são imputados não são verdadeiros na sua totalidade; que alguns deles nem sequer constavam da nota de culpa, pelo que não devem considerar-se para a apreciação da justa causa; que a R. tentou alterar o seu local e horário de trabalho em infracção às disposições legais aplicáveis, em face do que apenas não cumpriu as ordens e instruções por serem contrárias aos seus direitos e garantias, ao abrigo do disposto no artigo 128º, nº 1, al. e), parte final, do CT; que foi vítima de assédio moral, com a imposição de férias forçadas por não ter acedido a um convite para por fim ao contrato de trabalho; que lhe foi comunicada a intenção da empresa proceder ao seu despedimento por extinção do posto de trabalho, nunca tendo sido notificada da respectiva decisão final; e que, por fim, foi vítima duma alteração ilegal do local e do horário de trabalho e posterior despedimento sob a aparência da sua licitude; que não deve ser deferida a oposição à sua reintegração; e que a R. tem valores em dívida, que peticionou.

E rematou o seu articulado, deduzindo reconvenção nos seguintes termos:

Que seja considerada provada e procedente a excepção de caducidade ora deduzida, com todas as consequências legais.

Se assim não se entender, requer que:

1) Ao abrigo do disposto nos artº, 357º, nº 4, do CT e 98,°-J do CPT, sejam considerados como não escritos todos os factos constantes dos artigos 49, 57, 69, 72, 73, 74 (na parte segundo a qual AA "frequentava ainda em 28.01.2003 o 4°. Ano do curso de licenciatura em Sociologia"), 76 e 77, porque se trata de factos que não constam da nota de culpa.

2) O despedimento de AA seja considerado ilícito, com base na impugnação motivada ora deduzida pela trabalhadora;

3) Seja indeferido o pedido de exclusão da reintegração formulado pela sociedade BB, Lda., também com base na impugnação motivada ora deduzida pela trabalhadora.

E pede que:

a) a sociedade BB, Lda seja condenada a reintegrar AA na loja da empresa das ... (ou, se assim não se entender, sem prescindir, na loja do ...), sem prejuízo da sua categoria e antiguidade e com o horário de trabalho das 17:00 h às 00:00 h, sem prejuízo do direito da trabalhadora poder optar pela indemnização substitutiva;

b) a sociedade BB, Lda seja condenada a pagar a AA os seguintes créditos vencidos à data do despedimento:

i) relativamente ao mês de Setembro de 2015, o valor total de 554,60 euros, correspondente ao cartão ... (115,00 euros), a 15 dias de trabalho (355,50 euros), a 68 horas de trabalho nocturno em dia de semana (69,73 euros), a 1 hora de trabalho diurno em Domingo (2,051 euros) e a 4 horas de trabalho nocturno em Domingo, (12,31 euros);

ii) relativamente ao mês de Outubro de 2015, o valor total de 741,71 euros, correspondente ao cartão ... (115,00 euros), a 21,77 dias de trabalho (515,95 euros), a 80 horas de trabalho nocturno em dia de semana (82,04 euros), a 8 horas de trabalho diurno em Domingo (16,41 euros) e a 4 horas de trabalho nocturno em Domingo, (12,31 euros);

iii) relativamente ao mês de Novembro de 2015, o valor total de 982,39 euros, correspondente ao cartão ... (115,00 euros), a 22,73 dias de trabalho (538,70 euros), a 80 horas de trabalho nocturno em dia de semana (82,04 euros), a 8 horas de trabalho diurno em Domingo (16,41 euros) e a 4 horas de trabalho nocturno em Domingo, (12,31 euros), e parte do Subsidio de Natal (217,93 euros);

iv) relativamente ao mês de Janeiro (em Dezembro AA esteve de baixa), o valor total de 936,76 euros, correspondente ao vencimento base (711,00 euros), ao cartão ... (115,00 euros), a 80 horas de trabalho nocturno em dia de semana (82,04 euros), a 8 horas de trabalho diurno em Domingo (16,41 euros) e a 4 horas de trabalho nocturno em Domingo, (12,31 euros);

c) a sociedade BB, Lda. seja condenada a pagar a AA todas as retribuições que deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do mesmo, com base nos valores constantes no parágrafo anterior - alínea iv);

d) seja declarado que a sociedade BB, Lda. praticou assédio sobre AA entre Março de 2015 e Janeiro de 2016;

e) a sociedade BB, Lda. seja condenada a pagar a AA uma indemnização no valor de 60.000 euros por danos não patrimoniais;

f) a sociedade BB, Lda. seja condenada a pagar a AA juros de mora à taxa legal desde a data de vencimento de cada um dos créditos e até integral pagamento.»

Em 2016.07.11, foi proferido despacho saneador que relegou para final o conhecimento da excepção da caducidade.

A A. veio requerer a fls. 152 que o tribunal “ordene à entidade empregadora que junte aos autos os documentos descritos no 2.º parágrafo do requerimento probatório da trabalhadora (constante da parte final da contestação), para prova do facto alegado no n.º 102 desse articulado, correspondente a um dos episódios de assédio imputados pela trabalhadora à entidade empregadora”.

Na audiência de julgamento que se iniciou em 3 de Outubro de 2016, apreciando tal requerimento, decidiu-se o seguinte:

«Uma vez que neste processo não está em causa aferir do preenchimento dos requisitos legais para o despedimento por extinção do posto de trabalho, o qual, como resulta dos autos, nem chegou a concretizar-se, julgo desnecessária a junção aos autos dos elementos referidos pela Trabalhadora no requerimento assinado referido e na parte final do articulado da contestação, indicados para prova do alegado no artigo 102º do mesmo articulado.»

E concluído o julgamento, foi proferida sentença, que terminou com o seguinte dispositivo:

“Por tudo o que ficou exposto, nos termos das disposições legais citadas, julgo a acção parcialmente procedente, declaro lícito o despedimento da trabalhadora e, em consequência:

a) - Condeno a empregadora a pagar-lhe a quantia de € 217,93, a título de remanescente do subsídio de Natal do ano de 2015, acrescida de juros legais a partir do respectivo vencimento e até integral pagamento;

b) – Absolvo a empregadora do demais peticionado.

Custas pela trabalhadora e empregadora, na proporção do decaimento - art. 527º, nºs 1 e 2 do CPC -, sem prejuízo do benefício do apoio judiciário que àquela foi concedido.

Fixo à causa o valor de € 63.215,46 - art. 98º-P, nº 2, do CPT”.

           

Tendo a A apelado, proferiu a Relação a seguinte

“5. Decisão

Em face do exposto, decide-se:

5.1. não admitir o recurso de apelação interposto pela recorrente da decisão interlocutória proferida no início da audiência de julgamento (em 3 de Outubro de 2016);

5.2. conceder parcial provimento ao recurso no que diz respeito à decisão de facto e, em consequência:

5.2.1. elimina-se a alínea BC) dos factos provados;

5.2.2. acrescentam-se à decisão de facto as alíneas G-2), P-1), BG-1), BR-1), BS-1), AV-1) e CF);

5.3. aditar oficiosamente à matéria de facto a alínea G-1);

5.4. conceder parcial provimento ao recurso no que diz respeito à decisão de direito e, em consequência:

5.4.1. declara-se ilícito o despedimento de que foi alvo a recorrente AA por se verificar a caducidade do direito de aplicação da sanção;

 5.4.2. condena-se a recorrida BB, …, Lda. a proceder à reintegração da recorrente AA, sem prejuízo da sua categoria profissional e antiguidade e com o horário de trabalho convencionado entre as partes em Novembro de 1995;

5.4.3. condena-se a recorrida BB, …, Lda. a pagar à recorrente AA as retribuições de base e as quantias médias mensais de trabalho nocturno, trabalho diurno em Domingo e trabalho nocturno em Domingo, à razão mensal de  € 711,00, € 82,04, € 16,41 e € 12,31, respectivamente, vencidas e vincendas desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado do presente acórdão, sem prejuízo das deduções das quantias que a A haja recebido, nesse período a título de subsídio de desemprego - que deverão ser entregues pela Ré à Segurança Social, em conformidade com o estabelecido na al. c) do n.º 2 do art. 390º do Código de Trabalho -, acrescidas de juros de mora, à taxa legal, desde a data do vencimento de cada uma das prestações, a liquidar em oportuno incidente de liquidação [arts. 609º, nº 2, e 358º, nº 2, do CPC];

5.4.4. condena-se a recorrida BB, …, Lda. a pagar à recorrente AA:

a)         355,50 euros relativos a 15 dias de trabalho, 69,73 euros relativos a 68 horas de trabalho nocturno em dia de semana, 2,051 euros relativos a 1 hora de trabalho diurno em Domingo e 12,31 euros relativos a 4 horas de trabalho nocturno em Domingo, tudo relativo ao mês de Setembro de 2015;

b)        515,95 euros relativos a 21,77 dias de trabalho, 82,04 euros relativos a 80 horas de trabalho nocturno em dia de semana, 16,41 euros relativos a 8 horas de trabalho diurno em Domingo e 12,31 euros relativos a 4 horas de trabalho nocturno em Domingo, tudo relativo ao mês de Outubro de 2015;

c)        538,70 euros relativos a 22,73 dias de trabalho, 82,04 euros relativos a 80 horas de trabalho nocturno em dia de semana, 16,41 euros relativos a 8 horas de trabalho diurno em Domingo e 12,31 euro relativos a 4 horas de trabalho nocturno em Domingo, tudo relativo ao mês de Novembro de 2015;

d)        711,00 euros a retribuição base do mês de Janeiro, 82,04 euros relativos a 80 horas de trabalho nocturno em dia de semana, 16,41 euros relativos a 8 horas de trabalho diurno em Domingo e 12,31 euros relativos a 4 horas de trabalho nocturno em Domingo, tudo relativo ao mês de Janeiro de 2016;

e)         juros de mora à taxa legal sobre estas quantias, devidos desde a data do vencimento de cada uma das respectivas prestações e até integral pagamento;

5.4.5. condena-se a recorrida BB, …, Lda. a pagar à recorrente AA a quantia de € 20.000,00, a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a presente data;

5.4.6. absolve-se a recorrida BB, .., Lda. do demais pedido, nesta medida se revogando a sentença sob censura, com excepção da parte em que condenou a recorrida no pagamento do remanescente do subsídio de Natal  de 2015, segmento que não foi posto em causa na apelação.

Custas por A. e R., quer na 1.ª instância, quer no recurso, na proporção da sucumbência que resulta do presente acórdão, sem prejuízo, porém, do apoio judiciário de que goza aquela.”

            É agora a R que, inconformada, nos traz a presente revista, cuja alegação rematou com as seguintes conclusões:

A. A eliminação do facto constante da alínea BC) dos factos provados, pelo tribunal a quo teve por fundamento a avaliação da prova testemunhal efectuada pelo tribunal, ignorando o teor do documento de fls. 238 do processo disciplinar apensado, e que foi quase integralmente transcrito no facto assento sob a alínea AW), em violação do disposto no art 607°, n° 4 do Código de Processo Civil;

B. Naquele documento, enviado pelo mandatário da recorrida à recorrente, expressamente consta que "...A Sra. AA precisa e pretende continuar a trabalhar nos moldes contratuais em vigor com essa empresa", recusa manifesta em alterar o horário de trabalho, e replicada nas alíneas AU) e AV) dos factos assentes, porque não foi impugnado é prova a ter em consideração na decisão, assim incorrendo o acórdão em nulidade da sentença nesta parte, e fundamento de revista, devendo ser repristinado o facto e reparada a matéria de facto e ponderada na sua globalidade, revogando a decisão da apelação.

C. Julgou ainda o tribunal a quo ser de acrescentar uma nova alínea com o seguinte teor: P-1) Em Novembro de 1995 a A não frequentava qualquer tipo de estudos, incorrendo em erro na fixação da prova, ao dar como provado o que consta nesta alínea com fundamento no que considera ser as declarações de parte da A e "...o normal acontecer da vida", sobre dizer que o curso da recorrida, documentado de fls. 280 - certificado de frequência do 4º ano do curso de Sociologia, se iniciou cerca de 4 anos antes, ou seja muito depois de 1995.

D. Impondo os artigos 392º a 395º do Código Civil exclusões à admissibilidade da prova testemunhal cuja razão de ser radica na falibilidade da prova testemunhal, tida como inidónea para provar determinados factos com um grau de certeza que as testemunhas não podem dar, e não podendo ser objecto de ilações ou presunções baseadas na experiência de vida nem considerados julgados, com fundamento nas declarações de parte.

E. Em nome da previsibilidade e segurança do tráfego jurídico, a lei dá prevalência a prova documental sobre a prova testemunhal, coarctando a apetência das partes para recorrerem a esta com intuitos de infirmar aquela, pelo há que aplicar analogicamente os Artigos 393° a 395° do Código Civil quanto à inadmissibilidade/exclusão das declarações de parte, para dar como provado o que somente a Universidade via documento escrito, poderá fornecer, pelo que mal andou o tribunal a quo ao fixar o facto com este fundamento, o que é fundamento de revista nos termos do disposto no art. 671°, n° 3 do Código de Processo Civil.

F. Procedeu ainda o acórdão recorrido, ao aditamento dos factos que consignou sob a alínea BR-1) desta forma: A R. não entregou à A. trabalhadora uma comunicação contendo uma decisão final fundamentada relativa ao processo de extinção do posto de trabalho.

G. Defende a recorrente, o que o acórdão acolheu, que tal facto se deve considerar provado, por ter sido admitido por acordo, resultando tal da resposta dada nos artigos 43°. a 45°. da resposta à contestação, onde verifica que neles a ora recorrente admite que o processo de extinção do posto de trabalho se ficou pela resposta da trabalhadora, o que verbalmente lhe foi comunicado, pelo que, tendo presente o disposto nos artigos 60°. n° 4 do Código de Processo do Trabalho, e 574°. e 607° n°. 4, do Código de Processo Civil.

H. No entanto, no início da audiência do dia 03/10/2016, o Meritíssimo juiz de primeira instância proferiu o seguinte despacho:" Uma vez que neste processo não está em causa aferir do preenchimento dos requisitos legais para o despedimento por extinção do posto de trabalho, o qual como resulta dos autos, nem chegou a concretizar-se, julgo desnecessária a junção aos autos dos elementos referidos pela trabalhadora no requerimento assinado referido e na parte final do articulado da contestação, indicados para prova do alegado no artigo 102° do mesmo articulado."

I. O referido despacho que indeferiu o meio de prova e esclareceu o objecto do litígio, notificado às partes na data em que foi proferido, já transitou em julgado, tendo aliás obstado ao conhecimento do recurso nesta parte

J. Ainda que o tribunal de recurso pudesse ter procedido ao aditamento de factos não relacionados com o objecto da acção, em violação do disposto no art. 607° e art. 5º ambos do Código do Processo Civil, tendo em conta que resulta de alegada confissão, sempre teria que constar do facto assente que "A R. não entregou à A. trabalhadora uma comunicação contendo uma decisão final fundamentada relativa ao processo de extinção do posto de trabalho, mas meramente comunicação verbal", por ser o que resulta do articulado pelo parte.

K. No entanto, transitado em julgado o despacho, cremos não poderá haver qualquer aditamento de factos provados relacionados com o que nos autos não foi admitido ser discutido pelas partes, nem poderá ser julgado como matéria assente o que não tem interesse para a causa, violando os contornos do litígio tal como configurados pelo tribunal de primeira instância

L. O tribunal a quo com vista à prolação do acórdão, fez uso dos poderes de aditamento oficioso de factos, acrescentando factos sob a alínea G-1), com fundamento de considerar plenamente provado por documento (fls. 100, 101 e 207 do procedimento disciplinar apenso) e por acordo.

M. No entanto, compulsados os referidos documentos, verifica-se que daqueles documentos não se podem extrair os factos provados com a amplitude que foram fixados na alínea G1, concretamente inexistem quaisquer documentos ou confissão donde decorra a data em que a resposta à nota de culpa foi "...recebida pela recorrida e pela mesma Sra. Instrutora em 21 de Dezembro de 2015".

N. Pelo contrário, dos documentos decorre que assim não foi, como facilmente resulta de mera consulta aos referidos documentos.

O. Não decorrendo dos documentos citados no acórdão, nem da confissão das Partes - o que de resto o acórdão em crise não fundamenta em nenhum segmento, conclui-se que o tribunal a quo fez uma utilização não consentida dos poderes que lhe são conferidos peio art. 607°, n° 4 do Código do Processo Civil, sendo-lhe vedado ter em consideração na fundamentação do acórdão, factos não admitidos por acordo ou provados por documento ou confissão reduzida a escrito, uso de poderes que deverá ser sindicado e em consequência eliminado o facto ou alterado.

P. O Tribunal a quo deu como verificada a excepção da caducidade do direito da ora recorrente de aplicar a sanção de despedimento com invocação de justa causa, alterando neste segmento a sentença de primeira instância, abrigo do disposto no art. 357° n° 1 do Código do Trabalho, com fundamento em pressupostos de facto e de direitos necessariamente errados.

Q. Atenta a tramitação processual do processo disciplinar apenso que determinou o despedimento da recorrida, verifica-se que há resposta à nota de culpa, diligências probatórias posteriores a esta, e extrema diligência na condução do processo disciplinar.

R. A recorrente deu cumprimento ao comando ínsito no citado artigo, em conformidade com o acórdão publicado no Diário da República, Ia série, de 08/11/2010 (acórdão n.° 338/2010), o Tribunal Constitucional declarou a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, do artigo 356.°, n.° 1 do Código do Trabalho. Nesta sequência, a Lei n.° 23/2012, de 25 de Junho, revogou o n.° 2 e alterou a redacção dos n.°s 1, 3, 5 e 7 do artigo 356.° do Código do Trabalho, pelo que a instrução permanece, como antes, obrigatória, o que significa que o empregador apenas pode deixar de realizar as diligências probatórias requeridas pelo trabalhador se as considerar patentemente dilatórias ou impertinentes, circunstância que terá de alegar por escrito e fundamentar.

S. No âmbito do procedimento disciplinar apenso, sancionava-se a falta de assiduidade da trabalhadora e a sua desobediência a instruções da entidade patronal, porquanto esta trabalhadora ao longo de mais de 2 meses, apresentou-se a trabalhar diariamente para prestar duas horas de trabalho, por recusar que lhe fosse alterado o horário de trabalho individualmente, ainda que tenha aceite a alteração temporária do local de trabalho. Na nota de culpa, datada de 02/12/2015 a entidade patronal fez constar no ponto 44 expressamente o seguinte: "A fixação de horário de trabalho no contrato da trabalhadora ocorreu exclusivamente por conveniência da trabalhadora arguida, uma vez que pretendia frequentar os estudos em regime diurno, estudos que já terão sido concluídos há vários anos".

T. Na resposta à nota de culpa, datada de 21/12/2015 a trabalhadora fez constar expressamente no ponto 38: "À data da assinatura do Doc.2 em anexo AA já não frequentava qualquer tipo de estudos".

U. No relatório final do processo disciplinar de 28/01/2016, no ponto L) dos factos provados, ficou a constar que a fixação do horário de trabalho no contrato da trabalhadora ocorreu exclusivamente por conveniência da trabalhadora uma vez que pretendia frequentar os estudos em regime diurno, o que é dado como provado com base no documento junto a fls. 280, que não foi pela trabalhadora impugnado nem requerida qualquer contraprova.

V. A lei não fornece expressamente ao instrutor do processo o que deva ser o critério a usar, este há-de ser um critério de razoabilidade e que tenha em conta os factos do processo disciplinar controvertidos, e foi o que o instrutor fez e prontamente deu à recorrida prazo para se pronunciar e requerer outros meios de prova!!!

W. As diligências probatórias referidas no artigo 356.°, n.° 5, do Código do Trabalho de 2009, não se circunscrevem àquelas que o trabalhador haja requerido na sua resposta à nota de culpa, abrangendo quaisquer outras que, na sequência daquelas, o instrutor do processo entenda, oficiosa e justificadamente, promover.

X. Refira-se que a diligência realizada era, para o instrutor do processo necessária somente na sequência da resposta dada pela trabalhadora à nota de culpa, nunca tendo ficado esclarecido se a trabalhadora fez estudos continuadamente ou com pausas.

Y. Nem tal se pode presumir, ainda para mais quando a trabalhadora em causa foi trabalhadora estudante, e considerando que nasceu em 1957 (conforme doc. de fls. 280 do processo disciplinar apenso) já tinha mais de 40 anos e dois filhos, uma das quais com 37 anos à data dos factos (factos provados BH) sendo pois expectável que não tivesse feito o curso em 5 anos seguidos, ou sequer que tenha feito somente um curso.

Z. No entanto, para a instrutora do processo, tornou-se não só relevante a junção de um documento que esclarecesse a trabalhadora que afinal em 2003, ao contrário do que dizia, ela ainda estava a estudar, o que já não acontecia quando se quis que esta trabalhasse por turnos, em 2015.

AA. É certo, como referido, que as diligências empreendidas reportavam-se e visaram esclarecer os factos da acusação e da defesa. Tendo a diligência esta finalidade, a mesma será pertinente e relevante, independentemente do seu efectivo resultado.

 BB. O recurso a vias de colmatação de lacunas da lei apenas é admissível perante a existência de um caso omisso, pois somente neste existe lacuna e, este, pressupõe que se esteja perante uma omissão não intencional da lei (art. 10°). Se a lei silenciou, intencionalmente, a resposta a determinada situação, não estamos perante caso omisso pelo que vedado estava ao tribunal a quo fazer aplicação do disposto no n°. 1 do art. 357° do Código de Trabalho nos termos em que fez, o que além do mais é abusiva e desproporcionada.

CC. Relativamente à instrução, pese embora o aludido princípio da celeridade processual imponha que a mesma decorra tão breve quanto possível, o legislador não quis estabelecer qualquer prazo ou limite de tempo entre diligências de instrução, mas apenas entre a última diligência ou a recepção dos pareceres referidos no n° 5 do art. 356° do Código do Trabalho, ou o decurso do respectivo prazo, e a decisão {art. 357°/1/2 do Código do Trabalho), cuja inobservância cominou com a caducidade do direito de aplicar a sanção, para além, obviamente, dos prazos de prescrição da infracção disciplinar (art. 329° /1 Código do Trabalho) e de caducidade e prescrição do procedimento disciplinar (art. 329° 2/3 Código do Trabalho), basta atentar na Jurisprudência fixada por este Supremo Tribunal de Justiça, firmado no Acórdão n° 14/2015 (Melo Lima), publicado no Diário da República n°. 212 SÉRIE I de 2015-10-‑29.

DD. Em consequência de ter julgado a caducidade do direito de aplicar a sanção disciplinar, o Tribunal a quo, fazendo uso do disposto no art. 382° n° 1 do Código do Trabalho, considera "...que deverão do mesmo modo considerar-se ilícitos os despedimentos em que foi excedido o prazo de 30 dias para proferir a decisão de despedimento, e consequentemente concedida ao trabalhador tutela indemnizatória, reintegratória e compensatória prevista nos artigos 389° n°. 1, 390° e 391° do Código do Trabalho, mas inexiste norma que preveja esta consequência no Código do Trabalho, o que deve ser declarado com as legais consequências.

EE. Existe ambiguidade na declaração de ilicitude da alteração do horário de trabalho da recorrida, e como tal lícita a recusa da trabalhadora, em trabalhar nos meses de Outubro

e Novembro de 2015, para além do seu horário contido no horário de funcionamento do estabelecimento, como consta das alíneas AU) e AV) com a declaração de ser lícita a mudança do local de trabalho nos termos em que foi comunicada a 24/09/2015.

FF. Ao agir desta forma, o acórdão recorrido incorre em clara violação da lei substantiva, designadamente em violação do disposto no art. 194°, n° 1, alínea b) do Código do Trabalho, e omitindo pronúncia quanto à solução de direito concreta, dispensando-se de analisar e tratar o regime do conflito de direitos em presença, o que configura nulidade da sentença conforme disposto na al. d) do número 1 do art. 615° do Código de Processo Civil, tendo em conta o disposto no artigo 608°, n° 2, ex vi do disposto no artigo 663°, n°. 2 do Código do Processo Civil, que altera o horário em função da alteração consentida do local de trabalho.

GG. Ao decidir desta forma, o tribunal a quo, não tomou posição entre o manifesto conflito de direitos que reconhece a ambas as partes, o que devia ter feito para que então pudesse decidir se a prestação de trabalho pela trabalhadora, de duas horas diárias durante todo o mês de Outubro e Novembro de 2015, constitui ou não clara e intencional violação dos deveres de obediência, de assiduidade e pontualidade previstos no art. 128°, n° 1, al. b) do Código do Trabalho.

HH. Tendo em conta o quadro legal dado pelos artigos 194°, n° 1, al. b), 196°, 212°, n° 1 e 217° n° 4 todos do Código do Trabalho, e tendo em conta os factos provados constantes das alíneas: L), M), N), O), P), Q) T) e também que além de todas as lojas se situarem em Lisboa, o que consta em U) ou seja que a loja das ... era a única com um horário de funcionamento e de abertura ao público das 10h às 23 horas, V) W) X), AO), AT) AU) e AV) e BB) tinha o tribunal a quo que ter tomado posição expressa sobre a compatibilização do direito da empregadora em transferir a trabalhadora a partir do dia 02/10/2015 para a loja do ... - não dispondo de outra com um horário de funcionamento que pudesse acomodar o horário de trabalho da recorrida, com o direito da trabalhadora em ver o seu horário de trabalho inalterado sem o seu acordo.

II. Deve o tribunal ad quem expressamente resolver o conflito de direitos, no âmbito do quadro legal supra exposto, atendo-se para tal à regra atinente à colisão de direitos - o artigo 335º do Código Civil, que determina que havendo colisão de direitos iguais ou da mesma espécie, como é o caso, devem os titulares ceder na medida do necessário para que todos produzam igualmente o seu efeito, sem maior detrimento para qualquer das partes, revogar a decisão tomada pelo tribunal a quo e imputar à recorrida a prática da infracção disciplinar que lhe foi imputada no respectivo processo disciplinar, mantendo assim a justa causa de despedimento declarada em primeira instância.

JJ. Com a declaração de ilicitude do despedimento operada pelo tribunal a quo, entendeu este que a questão das consequências do despedimento ilícito deixou de estar prejudicada pela solução dada ao litígio, e que por os autos fornecerem os elementos necessários, cabia aquele tribunal, nos termos do artigo 665°, n°. 2 do Código de Processo Civil, aplicável ex vi do artigo 87°. n°. 1 do Código de Processo do Trabalho, conhecer desta questão.

KK. No entanto assim não se verifica, não tendo à recorrida sido dada oportunidade para sobre esta matéria se pronunciar, verifica-se a preterição de uma formalidade prevista no n°. 3 do art. 665° do Código de Processo Civil, causadora de nulidade como decorre do disposto no art. 195° do Código de Processo Civil e art. 3º, n° 3 do Código do Processo Civil, nulidade que se argui no presente recurso, com as legais consequências.

LL. A recorrente foi ainda condenada por ter praticado assédio moral na recorrida, e a pagar-lhe € 20.000,00, a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data de prolação do acórdão, tendo para tanto o tribunal a quo feito errada interpretação e aplicação do art. 29° do Código do Trabalho.

MM. Contudo, o conceito de assédio em parte definido pelo artigo 29° do Código do Trabalho, tendo em conta a factualidade assente é insusceptível de configurar uma situação de mobbing, mesmo após a infundada ampliação efectuada, sendo a subsunção dos factos provados à previsão do instituto, reveladora de erro na interpretação e aplicação deste normativo.

NM.A recorrente não agiu movida por qualquer objectivo final ilícito ou eticamente reprovável, nomeadamente, que tivesse o propósito de hostilizar a recorrida ou de a levar a demitir-se, nem com as férias que aquela gozou em Março e Abril, nem com a iniciativa de fazer extinguir o posto de trabalho desta, nem quando alterando o local de trabalho lhe altera o horário de trabalho para o horário de funcionamento, nem quando decorridos mais de dois meses da trabalhadora a fazer horário com entrada às 17 horas, dá cumprimento ao disposto no artigo 256°, n° 3, alínea a) do Código do Trabalho, recusando a prestação por considerar que as faltas eram injustificadas.

OO. Havia que se ter contextualizando os contornos da imputada actuação da recorrida supostamente reconduzidos pelo Douto acórdão a mobbing, o que não foi valorado e não se mostram preenchidos os requisitos correspondentes ao conceito de assédio, pelo que existe violação na interpretação e aplicação do art. 29° n° 1 do Código do Trabalho, impondo-se a repristinação do decidido neste âmbito peia primeira instância.

PP. Em consequência de ter julgado verificada a prática de assédio moral, o Tribunal a quo, entende ainda serem ressarcíveis os danos não patrimoniais, presumindo culposo o incumprimento contratual da recorrente e tendo ficado provado (após ter alterado a matéria factual do modo já analisado constante da alínea BS -1).

QQ. No entanto, não estão verificados os requisitos da obrigação de indemnizar previstos no art. 483° do Código Civil e inexistem quaisquer danos com gravidade, que mereça a tutela do direito e que como tal devam ser indemnizáveis.

RR. Ainda que os supostos danos merecessem a tutela do direito, o que não se aceita, a propósito do quantum indemnizatório - que se fixou em 20.000 euros, temos tal valor como manifestamente desajustado, por exagerado, em face dos critérios estabelecidos no art. 496° n°4 do Código Civil e ao que foi os factos dados como provados, ainda considerando o nível salarial da trabalhadora e os comportamentos posteriores e anteriores da recorrente, pelo que deverá de igual forma ser o acórdão revogado, sendo a final o despedimento julgado lícito, com as devidas consequências, confirmando-se o contrato cessado na data da notificação do despedimento à recorrida, e a recorrente absolvida do pagamento de qualquer crédito ou indemnização.

           A recorrida contra-alegou, pugnando pela manutenção do decidido.

           Subidos os autos e admitida a revista, emitiu o Senhor Procurador-Geral Adjunto parecer no sentido da concessão parcial da revista na parte respeitante à condenação na indemnização pela prática de assédio moral, que sustenta não existir, mantendo-se quanto ao mais.

            Notificadas as partes deste parecer nada vieram dizer.

2----

           E sendo altura de decidir, temos de considerar para tanto a seguinte matéria de facto fixada pela Relação:

A) – Por despacho proferido em 16/11/2015, que consta do termo de abertura do processo disciplinar apenso e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, a empregadora nomeou instrutora a Sr.ª Dr.ª CC do processo prévio de inquérito, bem como do processo disciplinar a ser instaurado à trabalhadora.

B) – Em 01/12/2015, foi elaborado o relatório do procedimento prévio, que consta de fls. 59 a 67 do processo disciplinar apenso e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

C) – Em 01/12/2015, foi proferida a decisão do procedimento prévio de inquérito, que consta de fls. 68 do processo disciplinar apenso e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, que decidiu a instauração de processo disciplinar contra a trabalhadora.

D) – Em 02/12/2015, foi elaborada a nota de culpa de fls. 70 a 80 do processo disciplinar apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

E) - Por carta cuja cópia consta de fls. 81 do processo disciplinar apenso e que aqui se dá por integralmente reproduzida, datada de 03/12/2015, a trabalhadora foi notificada da nota de culpa, referida em D).

F) – A carta, referida em E), foi recebida pela trabalhadora em 04/12/2015, conforme aviso de recepção de fls. 99 do processo disciplinar apenso e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

G) - A trabalhadora respondeu à nota de culpa, referida em D), nos termos expressos no articulado que consta de fls. 155 a 173 do processo disciplinar apenso e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

G-1) A resposta à nota de culpa foi enviada por correio electrónico à Sra. Instrutora do procedimento disciplinar em 21 de Dezembro de 2015 e por carta registada com aviso de recepção recebida pela recorrida e pela mesma Sra. Instrutora em 21 de Dezembro de 2015.

G-2) Em 13 de Janeiro de 2016 a Sra. Instrutora juntou ao procedimento disciplinar a cópia da declaração da universidade internacional de 28 de Janeiro de 2003 constante de fls. 280 do mesmo, a qual estava na posse da entidade empregadora desde 2003.

H) – Em 28/01/2016, foi elaborado o relatório final e proposta de decisão de fls. 303 a 344 do processo disciplinar apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

I) - Em 01/02/2016, foi proferida a decisão final, que consta de fls. 345 do processo disciplinar apenso e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, que aplicou à trabalhadora a sanção disciplinar de despedimento, alegando justa causa.

J) – Por carta cuja cópia consta de fls. 346 do processo disciplinar apenso e que aqui se dá por integralmente reproduzida, datada de 01/02/2016, a trabalhadora foi notificada do relatório e decisão final, referidos em H) e I).

K) – A carta, referida em J), foi recebida pela trabalhadora em 04/02/2016, conforme aviso de recepção de fls. 395 do processo disciplinar apenso e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

L) - A trabalhadora foi contratada por contrato de trabalho a termo certo, cuja cópia consta de fls. 2 a 5 do processo disciplinar apenso e que aqui se dá por integralmente reproduzida, celebrado em 17 de Abril de 1995, para com carácter transitório, exercer as funções inerentes à categoria profissional de caixeira, até 3 anos.

M) - Do contrato de trabalho, referido em L), resulta que a sua contratação ocorreu para substituição da trabalhadora DD que se encontrava em licença sem vencimento.

N) - No contrato de trabalho, referido em L), consta como local de trabalho da trabalhadora, a loja do Centro Comercial das ..., em Lisboa, podendo contudo ser transferida para outra loja.

O) - O horário de trabalho acordado inicialmente era o seguinte: 35 horas semanais, distribuídas de Segunda-feira a Domingo, das 10 horas às 23 horas, com intervalo para refeição, indicando semanalmente a entidade patronal à trabalhadora as horas de trabalho de cada dia e folgando um dia e meio por semana.

P) - Em 28/11/1995, o contrato de trabalho da trabalhadora, foi objecto de aditamento/alterações, com efeitos reportados a 01 de Novembro de 1995, através do qual, além do aumento da retribuição, o horário de trabalho passou a ser o seguinte: de segunda a domingo, das 17 às 24 horas, com intervalo para refeição, folgando um dia e meio por semana, contrato que assim se efectivou, conforme documento cuja cópia consta de fls. 6 e 7 do processo disciplinar apenso e que aqui se dá por integralmente reproduzida.

P-1) Em Novembro de 1995 a A. não frequentava qualquer tipo de estudos.

Q) - A empregadora é uma sociedade comercial por quotas constituída em 1986 que ao longo dos anos vem prosseguindo a actividade de comercialização de têxteis para o lar e de artigos de artesanato, incluindo a sua importação e exportação, tendo actualmente três lojas abertas ao público, que explora directamente sob a marca BB.

R) - São gerentes da empregadora, mãe e filha, ambas com o nome de EE.

S) - Até ao final do ano de 2015, a empregadora empregava pelo menos, vinte pessoas.

T) - As lojas exploradas pela empregadora situam-se todas em Lisboa, respectivamente:

a) No Shopping Center das ..., loja número 1116 – loja das ...;

b) Na Rua …, número 76-78 – loja do ...;

c) Na Avenida …, número 6-B – loja da Avenida ...

U) - A loja das ... é a única que está inserida em Centro Comercial, e há vários anos com um horário de funcionamento e de abertura ao público das 10h às 23 horas.

V) - À data da contratação da trabalhadora, o horário de fecho ao público da loja das ..., ocorria pelas 24 horas.

W) - A loja do ... tem um horário de abertura e de funcionamento ao público das 10 h às 19 horas de Segunda-feira a sábado.

X) - A loja da Avenida …, tem o horário de abertura e de funcionamento ao público das 10h às 19 horas e ao sábado das 10h às 13 horas.

Y) - Na loja das ..., prestam trabalho como caixeiras de loja, desde pelo menos o início de Setembro de 2015 e que ainda se verificava em 01 de Novembro de 2015, as seguintes: a) FF – encarregada da loja; b) GG; c) HH; d) II; e) JJ; f) KK.

Z) - O local de trabalho habitual da trabalhadora até Setembro de 2015 era na loja das ....

AA) - O horário de trabalho da trabalhadora até ao dia 03 de Setembro de 2015, era o seguinte: entrada às 17 horas e saída às 24 horas, com uma hora de pausa para refeição, folgando às terças-feiras, e em regra, aos Domingos.

AB) - No passado dia 03 de Setembro de 2015, a co-gerente da empregadora EE (filha) comunicou verbalmente às caixeiras que habitualmente prestam trabalho na loja das ..., e respectiva encarregada, que aquela loja das ... ia encerrar para obras, previsivelmente até ao final desse mês, para reabrir no dia 30 de Setembro.

AC) - A loja das ... estava para entrar em obras, há pelo menos um ano, para se modernizar, tal como já havia acontecido com as demais.

AD) - Foi comunicado igualmente às trabalhadoras que prestam trabalho na loja das ..., quais as lojas respectivas onde deviam prestar trabalho durante o encerramento da loja das ....

AE) – No dia 03 de Setembro de 2015, a gerente da empregadora comunicou à trabalhadora, que no dia 10 de Setembro de 2015, se devia apresentar para prestar trabalho na Rua …, nº. …, com o seguinte horário: Das 10h às 19h, com uma hora de intervalo de refeição das 14h às 15h.

AF) - Respondeu a trabalhadora que ainda tinha dias de férias para gozar.

AG) - A gerente chamou então JJ, e na presença desta, confirmou todos os elementos que lhe havia dito anteriormente comunicou que a entidade patronal dava dois dias de compensação às trabalhadoras que haviam colaborado para o empacotamento da mercadoria que estava no piso de acesso ao público da loja e transportado o mesmo para o andar de cima, ou seja para o armazém de modo a que a loja ficasse livre para as obras.

AH) - E disse ainda que a trabalhadora iria gozar esses dois dias de descanso na segunda-feira e quarta-feira seguintes, visto que na terça-feira era o dia que folgava.

AI) - Prontamente a trabalhadora disse que ainda tinha mais um dia de férias para gozar.

AJ) - Pela gerente foi respondido para se apresentar na loja do ..., então somente na sexta-feira, ou seja dia 11 de Setembro de 2015, gozando assim o dia de férias que dizia estar em falta.

AK) - Respondeu a trabalhadora que queria ser informada por escrito, com vista a informar o seu advogado do assunto.

AL) - Até ao dia 07 de Setembro de 2015 a trabalhadora não recebeu comunicação escrita sobre a alteração do seu local de trabalho, tendo enviado uma carta à empregadora, cuja cópia consta de fls. 134 do processo disciplinar apenso e que aqui se dá por integralmente reproduzida, por esta recebida no dia 09 de Setembro, onde pede que seja enviado “...por escrito o horário onde devo prestar funções, seu dia de início e ainda o dia em que terminam as obras”.

AL-1) Uma vez que até ao dia 07 de Setembro de 2015 a A. não recebeu qualquer comunicação escrita sobre a alteração do seu local de trabalho, dirigiu-se nesse dia ao seu local de trabalho habitual, a loja das ..., constatando que a mesma se encontrava em obras.

AL-2) Uma vez que até ao dia 11 de Setembro de 2015 a A. não recebeu qualquer comunicação escrita sobre a alteração do seu local de trabalho, apresentou-se nesse dia na loja das ... para trabalhar, estando a loja encerrada, em obras.

AM) - No dia 11 de Setembro de 2015 a trabalhadora não se apresentou a trabalhar na loja do ....

AN) - Em 21/09/2015, a empregadora recebeu uma comunicação escrita, que consta de fls. 19 do processo disciplinar apenso e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, datada de 18/09/2015, do ilustre mandatário da trabalhadora, com o seguinte teor:

“(…)

A minha constituinte dá-me conta que a loja que constitui o seu local - a loja com o n°. … do Centro Comercial das ..., em Lisboa, se encontra encerrada desde o dia 7 deste mês sem que V. Exas. tenham dado cumprimento ao disposto no artigo 196º. do Código do Trabalho, que regula o procedimento a seguir pela entidade empregadora em caso de transferência do local de trabalho, (que se Supõe ser o caso).

Assim - e considerando que as cartas datadas de dia 7 e de dia 8 deste mês endereçadas pela minha constituinte a V. Exas. não obtiveram qualquer resposta - sirvo-me desta carta para solicitar a amabilidade de, no decurso da próxima semana, comunicarem por escrito à trabalhadora a transferência do seu local de trabalho, nos termos previstos no artº. 196°, do Código do Trabalho.

A persistirem na V. conduta de não darem cumprimento à referida disposição legal a minha representada ver-se-á forçada a recorrer às entidades que tiver por convenientes, sem qualquer outro aviso, chamando-se a especial atenção que estamos perante a violação pela entidade empregadora do dever de ocupação efectiva duma sua trabalhadora.

(…)”.

AO) - Em 24/09/2015, a empregadora enviou uma comunicação escrita à trabalhadora, cuja cópia consta de fls. 138 do processo disciplinar apenso e que aqui se dá por integralmente reproduzida, com a mesma data, da qual consta, além do mais, o seguinte:

“Nos termos previstos na cláusula 3ª do seu contrato individual de trabalho e nos termos previstos no art. 194º,nº. 1, al. b) e 196º ambos do Código do Trabalho, vimos por esta via comunicar-lhe que por interesse da empresa em praticar na loja integrada no Centro Comercial das ... somente organização rotativa de trabalhadores por turnos, e que o seu horário se mantém fixo, por decisão da gerência, passará no prazo de 8 dias a contar da recepção desta carta, a prestar trabalho na loja do ..., situada na Rua …, …, em Lisboa, visto que tal alteração não lhe traz prejuízo.

Tendo em conta o período de funcionamento da loja do ..., o horário de trabalho será o seguinte:

De segunda a sábado: das 10h às 18 h

Com uma hora de intervalo para almoço - das 14 h às 15 h.

Folgas: terça-feira e domingo”.

AP) - Na mesma data, 24/09/2015, a empregadora enviou uma comunicação escrita ao ilustre mandatário da trabalhadora, cuja cópia consta de fls. 139 e 140 do processo disciplinar apenso e que aqui se dá por integralmente reproduzida, da qual consta, além do mais, o seguinte:

“Às questões da carta datada de dia 07 foi confirmada pela D.ª LL telefonicamente, sendo que não entendemos a prestação do trabalho na loja do ... enquanto a loja das ... está em obras como uma transferência do local de trabalho que de resto foi comunicada de forma clara e esclarecedora, sem que para a Sra. AA advenha qualquer prejuízo”.

AQ) – A trabalhadora enviou à empregadora, e esta recebeu, a carta que consta de fls 26 do processo disciplinar apenso e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, datada de 29/09/2015, na qual, além do mais, referia:

“Tendo em conta que da Vossa carta de 24/09/2015 para o Dr. MM, meu advogado, resulta que a alteração do local de trabalho das ... para o ... será provisória; e que da carta que me enviaram com a mesma data, parece resultar que a alteração do local de trabalho é definitiva, agradeço que explicitem se a mudança é provisória ou definitiva.

Quanto ao horário de trabalho, o mesmo não pode ser unilateralmente alterado por V. Exas., nos termos do nº. 4 do artigo 217 do código do trabalho. Assim, sirvo-me desta carta para comunicar que não aceito a alteração do meu horário de trabalho”.

AR) – No dia 01/10/2015, a trabalhadora não se apresentou para trabalhar na loja do ....

AS) - No dia 02/10/2015, a trabalhadora apresentou-se para trabalhar na loja do ..., às 17 horas saindo pelas 19 horas.

AT) - A empregadora entregou à trabalhadora a carta que consta de fls. 28 e 29 do processo disciplinar apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, datada de 07/10/2015 e recebida na mesma data, na qual, além do mais, referia:

“Com respeito à sua última carta datada de 29/09/2015, onde mais uma vez vem questionar por escrito os procedimentos desta empresa, esclarecemos o seguinte:

1) A nossa carta enviada ao seu advogado Sr. Dr. MM e recebida a 25/09 é clara ao dizer que a sua prestação de trabalho na loja do ... ocorria enquanto a loja das ... estava em obras, que como sempre soube abriria em 30/09/2015 para a festa de aniversário do ...;

2) A carta que lhe foi dirigida a si e recebida na mesma data com o assunto “Transferência para a loja do ...” destinava-se a proceder à transferência temporária para aquela loja, em virtude da sua recusa em prestar trabalho na loja das ... em regime de turnos e em passar a fazer folgas de Colegas quando tal seja necessário por conveniência da empresa e da boa organização do trabalho, impedindo assim que todas as colegas possam fazer o regime nocturno;

3) Tal transferência, por ora, é temporária para durar seis meses;

O seu local de trabalho passou a ser na loja do ..., onde deverá cumprir o horário que lhe foi devidamente comunicado, com respeito pelas 35 horas de trabalho que tem contratadas, visto que o horário de funcionamento da loja é das 10h às 19h.”.

AU) - Nos dias 03, 05, 07 a 10, 12, 14 a 17, 19, 21 a 24, 26 e de 28 a 31 de Outubro de 2015, a trabalhadora apresentou-se a trabalhar às 17 horas saindo pelas 19 horas, e os demais dias do mês de Outubro, corresponderam a dias de folga da trabalhadora, o que foi considerado pela empregadora faltas injustificadas com perda de retribuição.

AV) - No mês de Novembro de 2015, nos dias 02, 04 a 07, 09, 11 a 14, 16, 18 a 21, 23, 25 a 28 e 30, a trabalhadora apresentou-se a trabalhar às 17 horas saindo pelas 19 horas, o que foi considerado pela empregadora faltas injustificadas com perda de retribuição.

AV-1) A A. deixou de comparecer na loja do ... pelas 17 horas, para trabalhar, após 30 de Dezembro de 2015, por a sua entidade empregadora lhe ter comunicado que não aceitava a sua prestação de trabalho com início às 17 horas.

AW) - O ilustre mandatário da trabalhadora enviou à empregadora a carta que consta de fls. 30 a 32 do processo disciplinar apenso e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, datada de 15/10/2015, com o seguinte teor:

“(…)

Começo por fazer referência a dois documentos:

i) à V. carta, datada de 07.10.2015 e endereçada à minha representada referida em epígrafe, segundo a qual o seu local de trabalho foi transferido da loja das ... para a loja do ..., por dois motivos: até 30 de Setembro, devido às obras nas ...; após 30 de Setembro, devido à alegada recusa da minha cliente em alterar o horário de trabalho;

ii) ao recibo de remunerações de 30.09.2015, segundo o qual a minha representada terá faltado injustificadamente durante 15 dias no decurso do mês de Setembro, não tendo a retribuição correspondente sido paga.

Em face desses documentos, venho transmitir o seguinte:

1 - A Sra. Dª. AA tem o horário das 17 h. às 24 h., conforme documento particular que titula o seu contrato de trabalho.

2 - Segundo o nº. 4 do artº. 217º • do Código do Trabalho, a alteração do horário de trabalho da minha constituinte só pode ser feita com o seu acordo, constituindo a violação desta disposição legal uma contra-ordenação grave.

3 - A alteração do local de trabalho da minha cliente com o novo fundamento de que a mesma terá recusado ver alterado o seu horário convencionado com a entidade empregadora é, por consequência, ilegal, constituindo também uma infracção grave, de acordo com o disposto no artº. 194º. do Código do Trabalho.

4 - A alteração do local de trabalho e a pretensa alteração de horário levadas a cabo por essa empresa constituem, nestas circunstâncias, uma evidente forma de retaliação e de assédio por parte de V. Exas., a todos os títulos deplorável e inaceitável.

5 - A este assédio acresce, (ou faz parte do mesmo ...), a falta de pagamento da retribuição devida, por alegadas faltas injustificadas, sendo certo que a minha cliente não tem que comparecer num alegado local de trabalho que não lhe foi comunicado nos termos legais, nem de acordo com um horário de trabalho que não é o que foi individualmente estipulado entre as partes.

6 - O referido assédio com a falta de pagamento da retribuição devida constituem infracções muito graves, de acordo com o disposto no nº. 4 do artº. 29°.; nas alíneas a), b), d) e f) do nº. 1 e nº. 2 do artº. 129º, do Código do Trabalho.

7 - A Sra. Dª. AA precisa e pretende continuar a trabalhar nos moldes contratuais em vigor com essa empresa.

B - Perante a extrema gravidade do que essa sociedade está a fazer à minha constituinte, sirvo-me desta carta para conceder 8 dias seguidos a Vª. Exas., (contados a partir da data da recepção desta carta), para procederem nos seguintes termos: a) recolocarem a trabalhadora no seu local de trabalho - a loja das ... - e aí aceitarem a prestação do trabalho de acordo com o horário individualmente contratado; b) pagarem à trabalhadora o valor da retribuição em dívida, acrescido à taxa de juro legal de 4% ao ano, desde a data do vencimento e até integral pagamento; c) terminarem em definitivo com qualquer forma de assédio.

(…)”.

AX) - A empregadora enviou ao ilustre mandatário da trabalhadora uma comunicação escrita, cuja cópia consta de fls. 152 e 153 do processo disciplinar apenso e que aqui se dá por integralmente reproduzida, datada de 27/10/2015, na qual, além do mais, referia:

“Inexiste pois qualquer atitude de retaliação ou assédio por esta empresa – a transferência não tem qualquer motivo pessoal mas funcional e é efectuada ao abrigo do disposto no art. 194°, nº 1, al. b) do Código do Trabalho, havendo sim por parte da trabalhadora a desobediência a uma ordem legítima da sua entidade patronal que será devidamente apreciada e sancionada.”.

AY) - Todas as trabalhadoras com funções de caixeiras de loja, a prestar trabalho na loja das ..., com excepção da trabalhadora e de JJ, cumpriam em Setembro de 2015, o horário por turnos rotativos.

AZ) - Várias trabalhadoras da loja das ..., quando necessário, faziam folgas das colegas de outras lojas.

BA) - Os turnos são elaborados conforme os mapas de gestão dos mesmos e que são previamente ajustados com as trabalhadoras e responsáveis das lojas, havendo flexibilidade na troca de turnos entre as trabalhadoras e todas, com excepção da trabalhadora, fazem habitualmente trocas e trabalham quando há faltas de colegas ou necessidades de trocas.

BB) - À empregadora interessa-lhe e convém ter a organização do tempo de trabalho da Loja das ... com a rotatividade de horários de trabalhadoras e flexibilidade.

BC) -Eliminado

BD) – Ao serviço da empregadora a trabalhadora auferia o vencimento base mensal de € 711,00.

BE) – A trabalhadora recebia mensalmente a título de subsidio de alimentação o valor de € 115,00 €, através de crédito em cartão “...”.

BF) – A trabalhadora costuma folgar todas as Terças-Feiras; e Domingo sim, Domingo não, alternadamente.

BG) - Aos Domingos em que trabalha, a trabalhadora costuma trabalhar num Domingo das 10:00h às 17:00h (com uma hora de intervalo para refeição), e noutro Domingo das 17:00 h às 00:00 h (com uma hora de intervalo para refeição), alternadamente.

BG-1) AA aufere mensalmente, em média, ainda, os seguintes valores:

i.        82,04 €, correspondente a 4 horas de trabalho nocturno (em dia de semana) x 5 dias de semana (2.Fª e 4.Fª a Sábado) x 4 semanas (por mês) à razão de 1,0255 / hora;

ii.         16,41 €, correspondente a 8 horas de trabalho diurno (em Domingo) à razão de 2,051 € / hora;

iii.        12,31 €, correspondente a 4 horas de trabalho nocturno (em Domingo) à razão de 3,0765 / hora.”

BH) – A trabalhadora é mãe de NN, com 37 anos.

BI) - Em Novembro de 2014, foi diagnosticado a NN um carcinoma na mama direita.

BJ) - Em Dezembro de 2014, NN foi submetida a uma intervenção cirúrgica para remoção do tumor.

BK) – NN fez tratamentos de quimioterapia, entre Fevereiro e Maio de 2015, e de radioterapia, entre Junho e Agosto de 2015.

BL) – NN esteve incapacitada de trabalhar entre 15/12/2015 e 20/06/2015.

BM) - Em Março de 2015, a trabalhadora esteve reunida com uns consultores da empresa “...”.

BN) – Nessa reunião, foi comunicado à trabalhadora que seria conveniente que gozasse férias ainda em Março.

BO) – A empregadora enviou à trabalhadora a carta cuja cópia consta de fls. 114 dos autos e que aqui se dá por integralmente reproduzida, datada de 19/03/2015, com o seguinte teor:

 “(…)

Vimos por este meio comunicar, nos termos do artigo o 241º do Código do Trabalho, que, por razões de natureza operacional e optimização do funcionamento da empresa, a funcionária AA deve gozar o seu período de férias a partir do dia 20 de Março de 2015.

Mais se informa que a presente comunicação, por escrito, traduz as instruções que a Gerência da empresa transmitiu à referida funcionária no dia 13 de Março de 2015, na presença de testemunhas.

Neste sentido, a Gerência da BB, Lda., entende reproduzir por escrito a instrução sobre a marcação do período de férias, no uso do poder de direcção e coordenação que lhe compete, e no que respeita à funcionária AA, determinando-se o início de um período de férias de 15 (quinze) dias, a partir do dia 20 de Março de 2015.

(…)”.

BP) - A empregadora enviou à trabalhadora a carta cuja cópia consta de fls. 115 dos autos e que aqui se dá por integralmente reproduzida, datada de 21/04/2015, com o seguinte teor:

“(…)

Vimos por este meio comunicar, nos termos do artigo 241º do Código do Trabalho, que, por razões de natureza operacional e optimização do funcionamento da empresa, a funcionária AA deve gozar o seu período de férias a partir do dia 22 de Abril de 2015.

Mais se informa que a presente comunicação, por escrito, traduz as instruções que a Gerência da empresa transmitiu à referida funcionária no dia 20 de Abril de 2015, na presença de testemunhas.

Neste sentido, a Gerência da BB, Lda., entende reproduzir por escrito a instrução sobre a marcação do período de férias, no uso do poder de direcção e coordenação que lhe compete, e no que respeita à funcionária AA, determinando-se o início de um período de férias de 8 (oito) dias, a partir do dia 22 de Abril de 2015.

 (…)”.

BQ) - A empregadora enviou à trabalhadora a carta cuja cópia consta de fls. 127 do processo disciplinar apenso e que aqui se dá por integralmente reproduzida, datada de 20/04/2015, acompanhada dos anexos cujas cópias constam de fls. 128 a 130 do mesmo processo disciplinar e que aqui se dão, igualmente, por integralmente reproduzidas, através da qual lhe comunicava a intenção de extinguir o seu posto de trabalho.

BR) – Em resposta à carta referida em BQ), a trabalhadora, por intermédio do seu ilustre mandatário, enviou à empregadora a carta cuja cópia consta de fls. 131 e 132 do processo disciplinar apenso e que aqui se dá por integralmente reproduzida, datada de 29/04/2015.

BR-1) A R. não entregou à A. trabalhadora uma comunicação contendo uma decisão final fundamentada relativa ao processo de extinção do posto de trabalho.

BS) – Após gozar férias entre Março e Abril de 2015, a trabalhadora não só não recuperou energias físicas e psíquicas como se sentiu ainda mais fragilizada física e psicologicamente.

BS-1) A A. sentiu-se humilhada e vexada com a conduta da R. levada a cabo entre Setembro de 2015 e Janeiro de 2016.

BT) – A trabalhadora passou a ter insónias, falta de apetite, sentimentos depressivos e falta de vontade em conviver com amigos.

BU) – Em Setembro e Outubro de 2015, a empregadora abonou e descontou à trabalhadora as verbas discriminadas nos recibos de remunerações que constam de fls. 8 e 9 do processo disciplinar apenso e cujos teores aqui se dão por integralmente reproduzidos.

BV) – A trabalhadora teve que recorrer à ajuda de familiares para fazer face às suas necessidades mais básicas.

BW) – A trabalhadora sentiu-se desesperada, pois não sabia quando nem se voltaria a ter sustento para viver.

BX) – A trabalhadora sentiu-se pressionada a abandonar o seu emprego, por parte da empregadora.

BY – A trabalhadora sentiu a sua auto-estima em baixo.

BZ) – A trabalhadora sentiu a sua dignidade maltratada.

CA) – As gerentes da empregadora tiveram conhecimento em meados de Dezembro de 2014, que à filha da trabalhadora fora diagnosticado um carcinoma.

CB) - Nunca se aperceberam porém, que a trabalhadora estivesse especialmente vulnerável, para além do que é habitual quando se tem algum filho com uma doença grave.

CC) - Já há alguns anos, que se instituiu o procedimento na empregadora Alecrim, de no início de Março de cada ano, após o encerramento das contas anuais do exercício económico, haver lugar a uma apresentação a todos os trabalhadores, dos ditos resultados do exercício.

CD) – A empregadora, no exercício de 2014 teve um resultado líquido negativo de € 61.503,21.

CE) - A empregadora, no exercício de 2013 teve um resultado líquido positivo de € 17.836,50.

CF) A A. não tem antecedentes disciplinares.

3----

           Sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões da recorrente, conforme resulta dos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, aplicável por força do artigo 87.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho, constatamos que a recorrente suscita as seguintes questões:-

Nulidades do acórdão;

A Relação errou na alteração da matéria de facto;

Não se verifica a caducidade do direito de aplicação da sanção de despedimento;

O despedimento da trabalhadora é lícito;

A Relação não poderia ter decidido acerca das consequências da ilicitude do despedimento sem antes ouvir as partes, nos termos do art.º 665.º, n.º 3, do Código de Processo Civil;

Não se verifica nenhuma situação de assédio moral;

Não se verificam os requisitos da obrigação de indemnizar e, mesmo que assim se não entenda, se a indemnização por danos patrimoniais fixada é desproporcionada.

Assim sendo, e elencadas as questões a apreciar, cumpre decidir.

3.1---

Quanto às nulidades do acórdão:

Invoca a recorrente que o acórdão sujeito padece de várias nulidades, conforme se colhe das suas conclusões B), FF), GG) e KK).

Dispõe o artigo 637º, nº 1, do CPC que os recursos interpõem-se por meio de requerimento dirigido ao tribunal que proferiu a decisão recorrida, no qual se indica a espécie, o efeito e o seu modo de subida.

Por seu turno, o artigo 81º, nº 1 do CPT determina que o requerimento de interposição de recurso deve conter a alegação do recorrente, além da identificação da decisão recorrida, especificando, se for caso disso, a parte dela a que o recurso se restringe.

E especificamente quanto à arguição das nulidades da sentença, estabelece o artigo 77º, nº 1 do mesmo compêndio legal que sua a arguição é feita expressa e separadamente no requerimento de interposição de recurso.

Efectivamente, o requerimento de interposição de recurso e as alegações constituem peças processuais diferentes, bastando lembrar que no regime vigente em processo civil até às alterações introduzidas pelo DL 303/2007 de 24/08, o requerimento de interposição de recurso e as alegações eram apresentados em momentos processuais diferenciados.

Não há pois dúvidas que é no requerimento de interposição de recurso e não no corpo das alegações que a arguição das nulidades da sentença deve ser feita, conforme resulta claramente do transcrito artigo 77º, nº 1 do CPT, prendendo-se a ratio desta imposição legal com a possibilidade do juiz que proferiu a decisão poder suprir a nulidade antes da subida do recurso, conforme advém do nº 3 do supracitado artigo 77º.

Por isso a arguição destas nulidades deve constar do requerimento de interposição do recurso, que é dirigido ao juiz que proferiu a decisão, enquanto as alegações são dirigidas ao tribunal superior.

Nesta linha, e sendo o requerimento omisso quanto a essa arguição, a sua exclusiva inclusão nas alegações não será atendível, conforme é jurisprudência corrente e uniforme desta Secção Social.

Neste sentido decidiu o acórdão de 12-03-2008, com o seguinte sumário:

“I -Por força do estatuído no art. 77.º do Código de Processo de Trabalho, aprovado pelo DL n.º 480/99, de 9 de Novembro, a arguição de nulidades da sentença deve ser feita expressa e separadamente no requerimento de interposição do recurso, sob pena de delas se não conhecer.

II - Tal normativo legal pressupõe que o anúncio da arguição e a correspondente motivação das nulidades devem constar do requerimento de interposição do recurso – que é dirigido ao órgão judicial “a quo”, permitindo ao juiz recorrido aperceber-se, de forma mais rápida e clara, da censura produzida, permitindo-lhe o eventual suprimento das nulidades invocadas.”

No mesmo sentido, o acórdão de 29-09-2016 – Proc. 291/12.4TTLRA.C1.S2, consultável em www.dgsi.pt:

“1 – Sendo o requerimento de interposição do recurso de apelação omisso quanto às nulidades da sentença, constando apenas a sua invocação e fundamentação na atinente alegação de recurso, ainda que como questão prévia, a arguição não é atendível, por incumprimento do disposto no artigo 77.º, n.º 1, do CPT.”

Esta doutrina é também aplicável à arguição de nulidades de acórdãos da Relação, conforme é jurisprudência corrente desta Secção Social, vendo-se nomeadamente o acórdão de 17-12-2009 – Proc. 343/05.7TTCSC (www.dgsi.pt), cujo sumário é o seguinte:

Nos termos o artigo 77º, nº 1 do CPT, a arguição de nulidade da sentença, em contencioso laboral, deve ser feita, expressa e separadamente, no requerimento de interposição de recurso – assim se permitindo que o tribunal recorrido se pronuncie e, eventualmente, supra os vícios convocados – sendo entendimento jurisprudencial pacífico que a sobredita norma é aplicável à arguição de nulidade apontadas ao Acórdão da Relação (arts. 1.º, n.º 2, alínea a), do CPT, e 716.º, n.º 1, do CPC) e sendo, também, entendimento pacífico deste Supremo Tribunal que a arguição de nulidades, circunscrita ao texto alegatório, é inatendível por intempestividade.

Concluímos assim que a arguição das nulidades imputados ao acórdão da Relação deve constar do requerimento de interposição da revista, pois só desta forma esta matéria será do conhecimento do Supremo Tribunal de Justiça.

No caso presente, o requerimento de interposição do recurso, dirigido ao tribunal que proferiu o acórdão recorrido, é totalmente omisso quanto às nulidades de que o mesmo padece, pois a sua invocação apenas surge no corpo das alegações dirigidas a este Supremo Tribunal e não àquele que proferiu o acórdão.

Por isso, sendo tal requerimento omisso quanto à questão das arguidas nulidades, mostra-se incumprido o estabelecido do artigo 77º, nº 1 do CPT, circunstância que, no seguimento da jurisprudência desta secção, impede o seu conhecimento por este tribunal de recurso.

Pelo exposto, não se conhece das invocadas nulidades.

3.2----

Quanto à matéria de facto:

Conforme se prescreve no artigo 682.º, nºs 1 e 2, do Novo Código de Processo Civil, aos factos materiais fixados pelo Tribunal recorrido, o Supremo aplica definitivamente o regime jurídico que julgue adequado, não podendo alterar a decisão proferida pelo Tribunal recorrido quanto à matéria de facto, salvo no caso excepcional previsto no n.º 3 do artigo 674.º do mesmo compêndio legal.

Deste modo, e nos termos desta disposição legal, o erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa só pode ser objecto de recurso de revista quando haja ofensa de disposição expressa da lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força probatória de determinado meio de prova.

O que quer dizer que o Supremo Tribunal de Justiça, enquanto Tribunal de revista e no âmbito deste recurso, apenas conhece de matéria de direito, pelo que só pode sindicar a matéria de facto fixada pelas instâncias quando ocorra ofensa do direito probatório material.

Acresce que, por força do disposto no n.º 3 do artigo 682.º do CPC, o processo só volta ao Tribunal recorrido quando o Supremo entenda que a decisão de facto pode e deve ser ampliada, em ordem a constituir base suficiente para a decisão de direito, ou quando ocorram contradições na decisão sobre a matéria de facto que inviabilizam a decisão jurídica do pleito.

Donde é de concluir que, no domínio da matéria de facto, impera a regra de que a sua fixação é da competência exclusiva das instâncias, conforme determina o nº 4 do artigo 662º CPC, constituindo as situações integráveis no nº 3 do artigo 674º, no nº 3 do artigo 682º, ambos do mesmo compêndio legal, as excepções àquele princípio, tendo o legislador entendido que, em tais circunstâncias, o Supremo não deveria ficar indiferente a erros de apreciação da prova resultantes da violação de direito probatório material, quando o fundamento de revista consista na violação de disposição legal expressa que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a respectiva força probatória de determinado meio de prova.[1]

A recorrente insurge-se contra:

- a eliminação do facto constante da alínea BC) dos factos provados;

- o aditamento do facto provado sob a alínea P-1);

- o aditamento do facto provado sob a alínea BR-1);

- o aditamento do facto provado sob a alínea G-1).

Ora, tendo em conta a natureza dos factos em causa e, bem assim, a fundamentação e os meios de prova usados pela Relação para proceder à alteração da matéria de facto contra a qual a recorrente se insurge, temos de concluir que o acórdão recorrido não incorreu em violação do direito probatório material, pelo que deverá prevalecer a apreciação e modificação da matéria de facto efectuada pelo Tribunal da Relação no uso do princípio da livre apreciação da prova, plasmado no nº 5, do artigo 607.º, do CPC, e dos amplos poderes que lhe são conferidos pelo artigo 662.º do mesmo código.

Quanto ao aditamento dos factos que consignou sob a alínea BR-1) - A R. não entregou à A. trabalhadora uma comunicação contendo uma decisão final fundamentada relativa ao processo de extinção do posto de trabalho, sustenta a recorrente que se violou o caso julgado formado com a decisão proferido no início da audiência do dia 03/10/2016, cujo despacho foi do seguinte teor: " Uma vez que neste processo não está em causa aferir do preenchimento dos requisitos legais para o despedimento por extinção do posto de trabalho, o qual como resulta dos autos, nem chegou a concretizar-se, julgo desnecessária a junção aos autos dos elementos referidos pela trabalhadora no requerimento assinado referido e na parte final do articulado da contestação, indicados para prova do alegado no artigo 102° do mesmo articulado."

Estamos porém, perante situações distintas, pois este despacho surge na sequência de requerimento da trabalhadora, onde se solicitava ao tribunal que a entidade empregadora juntasse aos autos os documentos descritos no 2.º parágrafo do seu requerimento probatório constante da parte final da contestação, o que foi indeferido por se considerar irrelevante para a decisão da causa.

Já o facto aditado é diverso do que se decidiu, limitando-se a referir que a R. não entregou à A. trabalhadora uma comunicação contendo uma decisão final fundamentada relativa ao processo de extinção do posto de trabalho.

E quanto aos factos aditados G-1) e P-1) trata-se de matéria que a Relação considerou relevante acrescentar à factualidade provada atentos os poderes amplos poderes que lhe são conferidos pelo artigo 662.º do CPC.

 

Improcede assim a questão da recorrente no que se refere à matéria de facto apurada pela Relação.

3.3----

Quanto à caducidade do direito de aplicação da sanção de despedimento:

A 3ª questão suscitada na revista prende-se com a caducidade do direito da empregadora aplicar a sanção de despedimento, com fundamento na ultrapassagem do prazo de 30 dias previsto no art.º 357.º, n.º 1 do Código do Trabalho, normativo que dispõe o seguinte, na parte que aqui releva:

“1. Recebidos os pareceres referidos no n.º 5 do artigo anterior ou decorrido o prazo para o efeito, o empregador dispõe de 30 dias para proferir a decisão de despedimento, sob pena de caducidade do direito de aplicar a sanção;

2. Quando não exista comissão de trabalhadores e o trabalhador não seja representante sindical, o prazo referido no número anterior conta-se a partir da data da conclusão da última diligência de instrução”.

A lei impõe portanto um prazo para se proferir a decisão final do procedimento disciplinar instaurado ao trabalhador, o que constitui uma decorrência do princípio da celeridade, que domina a matéria disciplinar em geral e o processo disciplinar em especial, o que se compreende por concorrerem, neste domínio, ponderosas razões de paz jurídica, de certeza e de estabilidade, que rejeitam a manutenção, temporalmente indefinida, de situações dúbias quanto à efectivação de sanções disciplinares.

 

E esta imposição resulta também do fundamento do próprio despedimento com justa causa, que pressupondo a impossibilidade imediata de subsistência do vínculo laboral, o carácter imediato desta impossibilidade não se compadece com uma excessiva dilação da decisão final de despedimento, conforme advoga Maria do Rosário Palma Ramalho (Tratado de Direito do Trabalho, Parte II – Situações Laborais Individuais, 6.ª edição, Almedina, pág. 839).

A existência de prazo para o empregador proferir decisão de despedimento remonta ao regime introduzido pelo DL nº 64-A/89 de 27/2 (LCCT), pois não constava do DL nº 372-A/75 de 16/7 (seu antecessor nesta matéria) qualquer norma que lhe impusesse um prazo para proferir decisão final no processo disciplinar.

No entanto, não se estabeleceu qualquer sanção para o seu incumprimento, pelo que se discutia então quais as consequências desta actuação do empregador.

E várias soluções se perfilaram, defendendo uns que se tratava duma mera irregularidade, sem quaisquer consequências para a validade do procedimento disciplinar; outros que se tratava duma nulidade insanável, considerando que se extinguiu o direito de punir por inobservância do artigo 12º, nº 3, alínea c); outros ainda propugnavam que a consequência era a de voltar a correr o prazo de exercício da acção disciplinar e que havia ficado suspenso com a notificação da nota de culpa, conforme preceituava o nº 11 do artigo 10º da LCCT; e por último, também se defendia que o decurso deste prazo apenas relevaria, se ultrapassado, para a ponderação do juízo final sobre a impossibilidade da manutenção da relação laboral, constituindo um indício de que a actuação do trabalhador não fora irremediavelmente comprometedora da sua subsistência.

Nesta linha se inseria a doutrina desta Secção Social que decidiu no Acórdão de 2/5/2007, proc. 06S4717, disponível em www.dgsi.pt, que a sua inobservância não acarretava, nem a caducidade do procedimento disciplinar, nem a nulidade do processo disciplinar, relevando apenas para efeitos de apreciação da justa causa de despedimento, quando a demora do processo fosse injustificada.

Diversamente, no regime jurídico que veio a ser instituído pelo Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto, consagrou-se expressamente no n.º 1 do artigo 415.º que, decorrido o prazo referido no n.º 3 do anterior artigo 414.º – de 30 dias após a ultimação das diligências probatórias ou a emissão de parecer das estruturas representativas do trabalhador, se for esse o caso –, o empregador dispõe de trinta dias para proferir decisão, sob pena de caducidade do direito de aplicar a sanção.

Idêntica doutrina é seguida no Código do Trabalho de 2009, conforme se colhe do nº 1 do artigo 357.º, acima transcrito, e donde resulta que o empregador dispõe de 30 dias para proferir decisão final do procedimento disciplinar, sob pena de caducidade do direito de punir o trabalhador.

Por isso, recebidos os pareceres referidos no n.º 5 do artigo 356º, ou decorrido o prazo para o efeito, o empregador dispõe de 30 dias para proferir a decisão de despedimento.

E quando não exista comissão de trabalhadores e o trabalhador não seja representante sindical, o prazo referido para proferir a decisão final do procedimento conta-se a partir da data da conclusão da última diligência de instrução, conforme estabelece o n.º 2 do artigo 357º do CT.

Diga-se ainda que, e como é doutrina deste Supremo Tribunal, as diligências probatórias a que se reporta o artigo 356º, nº 1 do CT, são não apenas as requeridas na resposta à nota de culpa, mas também as determinadas oficiosamente pelo instrutor do processo, destinadas a esclarecer os factos imputados na nota de culpa ou invocados na resposta a esta, sejam ou não susceptíveis de atenuar a responsabilidade do trabalhador, conforme se colhe do acórdão de 12-01-2017, Proc. n.º 69/13.8TTLRS.L2.S1 (Ribeiro Cardoso), doutrina também seguida nos acórdãos 13-11-2013, processo n.º 196/12.9TTBRR.L1.S1 (Mário Belo Morgado), 30-04-2013, processo n.º 1154/09.6TTLSB.L1.S1 (Maria Clara Sottomayor); e de 07-03-2012, Recurso n.º 17/10.7TTEVR.E1.S1 (Fernandes da Silva), todos disponíveis em www.dgsi.pt.

É assim inequívoco que o termo “Instrução” com que o legislador epigrafa o artigo 356º do CT, e a primeira parte do seu nº 5, “[A]pós a conclusão das diligências probatórias”,  apontam decisivamente no sentido de que a instrução é formada pelo conjunto dos actos necessários à averiguação dos factos alegados na acusação (nota de culpa) e na defesa (resposta à nota de culpa), não se confinando à realização das diligências probatórias requeridas pelo trabalhador.

No caso dos autos, não existia na empresa comissão de trabalhadores, nem a trabalhadora arguida era representante sindical.

Por isso, o prazo de 30 dias para a prolação da decisão de despedimento a ter em conta na situação presente conta-se a partir da data da última diligência instrutória.

Vejamos então os factos que relevam para este efeito.


C) – Em 01/12/2015, foi proferida a decisão do procedimento prévio de inquérito, que consta de fls. 68 do processo disciplinar apenso e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, que decidiu a instauração de processo disciplinar contra a trabalhadora.
D) – Em 02/12/2015, foi elaborada a nota de culpa de fls. 70 a 80 do processo disciplinar apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
E) - Por carta cuja cópia consta de fls. 81 do processo disciplinar apenso e que aqui se dá por integralmente reproduzida, datada de 03/12/2015, a trabalhadora foi notificada da nota de culpa, referida em D).
F) – A carta, referida em E), foi recebida pela trabalhadora em 04/12/2015, conforme aviso de recepção de fls. 99 do processo disciplinar apenso e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
G) - A trabalhadora respondeu à nota de culpa, referida em D), nos termos expressos no articulado que consta de fls. 155 a 173 do processo disciplinar apenso e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

G-1) A resposta à nota de culpa foi enviada por correio electrónico à Sra. Instrutora do procedimento disciplinar em 21 de Dezembro de 2015 e por carta registada com aviso de recepção recebida pela recorrida e pela mesma Sra. Instrutora em 21 de Dezembro de 2015.
G-2) Em 13 de Janeiro de 2016 a Sra. Instrutora juntou ao procedimento disciplinar a cópia da declaração da universidade internacional de 28 de Janeiro de 2003 constante de fls. 280 do mesmo, a qual estava na posse da entidade empregadora desde 2003.
H) – Em 28/01/2016, foi elaborado o relatório final e proposta de decisão de fls. 303 a 344 do processo disciplinar apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
I) - Em 01/02/2016, foi proferida a decisão final, que consta de fls. 345 do processo disciplinar apenso e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, que aplicou à trabalhadora a sanção disciplinar de despedimento, alegando justa causa.
J) – Por carta cuja cópia consta de fls. 346 do processo disciplinar apenso e que aqui se dá por integralmente reproduzida, datada de 01/02/2016, a trabalhadora foi notificada do relatório e decisão final, referidos em H) e I).
K) – A carta, referida em J), foi recebida pela trabalhadora em 04/02/2016, conforme aviso de recepção de fls. 395 do processo disciplinar apenso e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

A Relação concluiu pela verificação da sobredita excepção de caducidade por considerar que a empregadora não demonstrou ter realizado diligências probatórias posteriormente à recepção da resposta à nota de culpa (o que ocorreu em 23.12.2015) com a virtualidade de interromper o prazo de caducidade de 30 dias para proferir a decisão de despedimento (o que ocorreu em 01.02.2016).

Mais concretamente, considerou-se no acórdão recorrido que o documento de fls. 280, emitido em 28.11.2003, junto ao processo disciplinar pela empregadora em 13.01.2016, já depois da resposta à nota de culpa, consubstancia uma diligência probatória desnecessária e inútil e, mesmo que assim se não considerasse, sempre poderia ter sido junto com a nota de culpa pois a empregadora tinha na sua posse aquele documento desde 2003 (facto G-2).

E considerou-se também que a junção ao procedimento disciplinar dos documentos relativos à baixa médica da autora ocorrida em Dezembro de 2015 também constituiu uma diligência desnecessária e inócua, porque fora do objecto do procedimento disciplinar.

Não acompanhamos porém esta posição assumida pela Relação.

Efectivamente, com a resposta à nota de culpa, recebida em 23/12/2015, a trabalhadora requereu a junção de 12 documentos.

E requereu que fosse notificada do teor da decisão final do processo de despedimento por extinção do posto de trabalho e respectivos fundamentos, bem como que se ordenasse a junção de todos os contratos em vigor na empresa, respectivos cargos e funções, tudo conforme se colhe de fls. 172 e 173 do procedimento disciplinar, que foi dado por reproduzido.

A Senhora Instrutora, por despacho de 4 de Janeiro apreciou este requerimento nos termos que constam de fls. 213 a 215, acabando por concluir que não pode proceder à junção da decisão final do procedimento de extinção do posto de trabalho requerida pela trabalhadora, pois tal procedimento “caducou em virtude de falta de tramitação posterior prevista no artigo 371º do CT”, e que não tendo havido qualquer decisão final de despedimento não se justificava efectuar qualquer comunicação à mesma.

E por esta razão indeferiu o requerimento que tinha sido apresentado com a resposta à nota de culpa.

Ora, o despacho que apreciou este requerimento da trabalhadora tem que se considerar instrução do procedimento disciplinar, pois segundo reza o nº 1 do artigo 356º do CT o instrutor, não tendo que realizar as diligências probatórias patentemente impertinentes requeridas pelo trabalhador na resposta à nota de culpa, tem no entanto, que proferir despacho fundamentado para justificar o seu indeferimento.

Adite-se que se o não fizesse, tal poderia acarretar, de imediato, a irregularidade do procedimento disciplinar, com os efeitos previstos no nº 2 do artigo 389º do Código do Trabalho.

Neste sentido é lapidar a doutrina do acórdão deste Supremo Tribunal de 16 de Junho de 2016, processo nº 3008/14.5TTLSB.L1.S1, que concluiu que:

“1 – Integra violação do princípio do contraditório e do direito à defesa no âmbito do procedimento disciplinar consagrados nos artigos 355º, nº 1 e 356º, nº 1 do Código do Trabalho de 2009, acarretando a respectiva invalidade, não se ter a instrutora pronunciado sobre o requerimento de junção duma conta corrente pretensamente existente entre a empresa e o trabalhador, e que este havia apresentado na resposta à nota de culpa.

2 – Embora o empregador disponha da possibilidade de indeferir a realização de diligências de defesa requeridas pelo trabalhador, por as considerar totalmente impertinentes, tem, no entanto, de fundamentar esta recusa, pois só assim é possível ao tribunal ajuizar da bondade da posição do instrutor do procedimento.

3- Não se tendo o instrutor pronunciado sobre tal requerimento, esta postura pode ter inviabilizado a defesa do trabalhador, pois perante o despacho de indeferimento e as razões que fossem apresentadas, sempre poderia este ter adoptado uma diferente estratégia para a sua defesa, e que, nomeadamente, tivesse em consideração as razões invocadas para indeferir a realização da diligência probatória requerida.”

Assim, a prolação do despacho de indeferimento da diligência requerida era fundamental para a instrutora apresentar as razões do seu indeferimento, pelo que o prazo de 30 dias para a prolação da decisão final só pode contar-se a partir da data em que tal despacho é proferido, tanto mais que este foi notificado à trabalhadora e a que esta respondeu com uma comunicação datada de 7/1/2016 (fls. 282 a 284 do procedimento disciplinar).

Por isso, e independentemente da relevância das diligências posteriores da instrutora, nomeadamente a junção do documento de fls. 280 do apenso 1, emitido pela Universidade Internacional, em 28.01.2003, temos de concluir que a decisão final foi proferida dentro do prazo de 30 dias previstos no nº 1 do artigo 357º do CT, pois estando esta datada de 1/2/2016, e sendo o despacho da instrutora de 4/1/16, tal prazo ainda se não havia consumado.

Em face do exposto, temos de concluir que a decisão final do procedimento foi proferida dentro do prazo de 30 dias impostos pelo mencionado dispositivo legal, pelo que temos de revogar o acórdão recorrido na parte em que considerou que já havia caducado o direito de aplicar a sanção disciplinar de despedimento da trabalhadora.


3.4—

Apesar de ter considerado o despedimento ilícito por julgar verificada a caducidade do direito de aplicar a sanção disciplinar, o acórdão recorrido apreciou a questão da justa causa por entender que existia interesse na sua apreciação, atenta a relevância desta matéria para se fixar o quantitativo da indemnização de antiguidade, caso a trabalhadora por ela optasse, e para fixar o montante da indemnização por danos não patrimoniais derivados de conduta alegadamente assediante da recorrida.

As instâncias divergiram na solução desta questão, pois enquanto a 1ª instância concluiu pela existência de justa causa, já a Relação concluiu que não pode imputar-se à trabalhadora a prática de qualquer infracção disciplinar, pois sendo ilegal a alteração do horário de trabalho que lhe foi imposto, é de considerar que, ao passar a apresentar-se no local de trabalho para que fora transferida dentro do seu horário de trabalho, ou seja, a partir das 17 horas, a recorrente não incorreu em infracção disciplinar.

É contra tal juízo que reage a recorrente, pugnando pela sua licitude face à gravidade da conduta do trabalhador.

Vejamos então se tem razão.


3.4.1---


Apesar da nossa lei fundamental consagrar a proibição dos despedimentos sem justa causa, conforme resulta do artigo 53º da CRP, o que constitui o corolário do princípio constitucional da “segurança no emprego”, daqui não advém uma proibição absoluta do despedimento do trabalhador, dado que perante situações de crise contratual resultantes duma actuação deste, a lei admite que a empresa o possa despedir com justa causa.

No entanto, este despedimento tem que fundar-se num comportamento culposo do trabalhador, que pela sua gravidade e consequências torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho, conforme resulta do nº 1 do artigo 351º
do Código do Trabalho/2009, constando do seu número 2, de forma exemplificativa, várias situações que poderão preencher aquele conceito.

Trata-se duma noção que já vem das leis laborais anteriores, conforme se colhia do artigo 9º do DL nº 64-A/89 de 27/2, conceito que transitou, sem alterações significativas, para o artigo 396º do CT/2003.

Assim sendo, continua válida a doutrina que se foi firmando ao abrigo desta legislação, e donde resulta que para a existência de justa causa de despedimento dum trabalhador impõe-se que este viole culposamente os seus deveres contratuais; que esta violação seja grave em si mesma e nas suas consequências; e que por via dessa gravidade seja imediata e praticamente impossível manter-se o contrato.

Por outro lado, esta impossibilidade deverá apreciar-se através do recurso à inexigibilidade, a determinar através do balanço dos interesses em presença, por forma a que a subsistência do contrato represente uma insuportável e injusta imposição ao empregador, conforme é orientação corrente deste Supremo Tribunal, vendo-se neste sentido, e dentre muitos outros, os acórdãos de 22/2/95, CJS, 279/1; de 30/9/2009, recurso nº 623/09-4ª secção, e mais recentemente o aresto de 15 de Outubro de 2014, Processo nº 1547/10.6TTLSB.L3.S1, estes últimos disponíveis em www.dgsi.pt.

Por isso podemos afirmar que para a verificação da justa causa não basta a mera existência dum dos comportamentos tipificados no nº 2 do referido artigo 351º, pois será sempre necessário que, para além disso, se possa concluir que a conduta do trabalhador provocou a ruptura do contrato por se ter tornado impossível manter a relação laboral, impondo-se que a ruptura seja irremediável em virtude de não haver outra sanção susceptível de sanar a crise contratual aberta com a conduta do trabalhador.

Postas estas considerações, vejamos o caso concreto.

A recorrida foi despedida em virtude da recorrente ter entendido que a trabalhadora violou, com a sua conduta, os deveres previstos nas alíneas b) e e) do nº 1 do artigo 128º do CT, sustentando esta última que esta violação integra uma gravidade tal que se impõe a justa causa do seu despedimento, nos termos do nº 1 e do nº 2, alínea g), do artigo 351º, do mesmo diploma legal.

Trata-se, em suma, de saber se a A devia obediência à ordem de se apresentar para trabalhar na loja do ..., e se a prestação de trabalho nesta loja nos meses de Outubro e Novembro de 2015, apenas das 17 às 19 horas, depois de ter sido emitida uma ordem escrita de transferência de local de trabalho e de lhe ter sido fixado um horário das 10h às 19 horas, constitui violação dos deveres de obediência, assiduidade e pontualidade previstos nos sobreditos preceitos, por a trabalhadora ter incorrido numa situação reiterada de faltas injustificadas.

Efectivamente resulta dos factos provados que no contrato de trabalho celebrado em 1995 (fls. 2-5 do procedimento disciplinar apenso) consta como local de trabalho da trabalhadora, “a loja do Centro Comercial das ..., em Lisboa, podendo contudo ser transferida para outra loja” [alínea N)] e que o local de trabalho habitual da trabalhadora até Setembro de 2015 foi nesta loja [alínea Z)].

Por outro lado, por documento escrito constante de fls. 6-7 do procedimento disciplinar apenso, denominado “Alteração a Contrato de Trabalho a Termo Certo”, com efeitos reportados a 01 de Novembro de 1995, ambas as partes convencionaram, além do aumento da retribuição, que o horário de trabalho de trabalho era de segunda a domingo, das 17 às 24 horas, com intervalo para refeição, folgando um dia e meio por semana” [facto P)].

Foi neste horário que a recorrida exerceu as suas funções até ao dia 03 de Setembro de 2015, com entrada às 17 horas e saída às 24 horas, com uma hora de pausa para refeição, folgando às terças-feiras, e em regra, aos domingos, conforme consta do facto AA.

Não obstante, no dia 03 de Setembro de 2015, a gerente da empregadora comunicou à trabalhadora, que no dia 11 deste mês se deveria apresentar para prestar trabalho na Rua …, n.º …, com o horário das 10h às 18h, com uma hora de intervalo de refeição das 14h às 15h., horário que coincidia com o horário de funcionamento do estabelecimento [factos AB) a AE), W) e AJ)].

Para o efeito, a recorrente enviou em 24 de Setembro de 2015, uma comunicação escrita à trabalhadora, constante a fls. 138 do processo disciplinar apenso, da qual consta que:

“Nos termos previstos na cláusula 3ª do seu contrato individual de trabalho e nos termos previstos no art. 194º, nº. 1, al. b) e 196º ambos do Código do Trabalho, vimos por esta via comunicar-lhe que por interesse da empresa em praticar na loja integrada no Centro Comercial das ... somente organização rotativa de trabalhadores por turnos, e que o seu horário se mantém fixo, por decisão da gerência, passará no prazo de 8 dias a contar da recepção desta carta, a prestar trabalho na loja do ..., situada na Rua …, …, em Lisboa, visto que tal alteração não lhe traz prejuízo.
Tendo em conta o período de funcionamento da loja do ..., o horário de trabalho será o seguinte:

De segunda a sábado: das 10h às 18 h

Com uma hora de intervalo para almoço - das 14 h às 15 h.

Folgas: terça-feira e domingo”. [facto AO)].
Perante esta ordem, a trabalhadora nos meses de Outubro e Novembro de 2015, compareceu para trabalhar na loja do ..., mas fê-lo apenas no horário das 17 às 19 horas, por discordar da alteração unilateral do seu horário de trabalho.

Assim, no dia 01/10/2015, a trabalhadora não se apresentou para trabalhar na loja do ....

No dia 02/10/2015, a trabalhadora apresentou-se para trabalhar na loja do ... às 17 horas saindo pelas 19 horas.

E nos dias 03, 05, 07 a 10, 12, 14 a 17, 19, 21 a 24, 26 e de 28 a 31 de Outubro de 2015, a trabalhadora apresentou-se para trabalhar às 17 horas saindo pelas 19 horas, o que foi considerado pela empregadora como faltas injustificadas com perda de retribuição.

E no mês de Novembro de 2015, nos dias 02, 04 a 07, 09, 11 a 14, 16, 18 a 21, 23, 25 a 28 e 30, a trabalhadora apresentou-se para trabalhar às 17 horas saindo pelas 19 horas, o que foi considerado pela empregadora faltas injustificadas com perda de retribuição.

Sendo estes os factos de que foi acusada, o que se discute é a questão de saber se a autora devia obediência à ordem de se apresentar para trabalhar na loja do ... nos mencionados meses de Outubro e Novembro de 2015, com o horário das 10h às 18 h, com uma hora de intervalo para almoço das 14 h às 15 h, ou se lhe era legítimo aparecer para trabalhar apenas das 17 às 19 horas, por a loja do ... não estar aberta até às 24 horas.

No que diz respeito à ordem da emitida pela ré no sentido da mudança do local de trabalho, conforme lhe fora comunicado através da carta de 24 de Setembro de 2015, temos de concluir que a autora cumpriu-a, pois apresentou-se para trabalhar na loja do ... a partir de 2 de Outubro, o que fez tendo em conta a antecedência de 8 dias prescrita no artigo 196.º, n.º 1 do Código do Trabalho e que a própria ré lhe concedeu na carta que remeteu à autora para se apresentar no novo local de trabalho.

Ora, como se refere no acórdão recorrido, ainda que se considerasse que não seria necessária a emissão de uma ordem escrita para a ré transferir a autora para outra loja de Lisboa, o facto de a ré lhe ter expressamente concedido, na carta de 24 de Setembro, o prazo de 8 dias para se apresentar na loja do ..., concluímos que cumpriu a ordem, e retira relevo disciplinar ao facto de não ter cumprido a anterior ordem verbal com efeitos a 11 de Setembro.

Já no que diz respeito à alteração do horário de trabalho, a Relação concluiu que a ré violou o disposto no art.º 217.º, do Código do Trabalho, na medida em que alterou unilateralmente o horário de trabalho que havia expressamente acordado com a trabalhadora, e sem previamente ter obtido o seu acordo, desta forma violando o disposto nos n.ºs 2 e 4 do citado preceito legal.

Também concordamos com este entendimento da Relação.

Efectivamente, e conforme decidiu este Supremo Tribunal no acórdão de 15.10.2014, proc. 1037/12.2TTLSB.L1.S1, é ao empregador que cabe estabelecer o horário de trabalho, inscrevendo-se a atribuição deste direito no quadro dos poderes de direcção e organização do trabalho que a lei lhe reconhece no artigo 97.º, do Código do Trabalho. Por outro lado, continua o aresto citado, a lei reconhece ao empregador o poder de alterar, unilateralmente, o horário de trabalho dum seu trabalhador por necessidades organizativas da empresa, conforme decorre do n.º 1 do artigo 217.º do Código do Trabalho.

Mas não o pode fazer se este tiver resultado de acordo expresso em sede do contrato individual de trabalho, conforme prescreve o n.º 4.

Identicamente se decidiu no acórdão desta Secção Social de 16-06-2015, Recurso n.º 363/05.1TTCSC.L1.S2- 4.ª Secção (Fernandes da Silva), donde se conclui que, competindo ao empregador definir, no âmbito do seu poder de direcção, os horários de trabalho dos trabalhadores ao seu serviço, dentro dos condicionalismos legais, a sua alteração só não pode ser unilateralmente determinada nos casos em que os horários tenham sido individualmente acordados.

E ainda no mesmo sentido decidiu o acórdão 29-09-2016, proc. n.º 291/12.4TTLRA.C1.S2 desta Secção Social (Ribeiro Cardoso), donde se colhe que se insere nos poderes de direcção e organização do trabalho da entidade empregadora a faculdade de alterar unilateralmente e mesmo sem a anuência do trabalhador, o respectivo horário de trabalho.

No entanto, não o pode fazer se o horário tiver sido expressamente acordado com o trabalhador.

Na doutrina escreve António Monteiro Fernandes (DIREITO DO TRABALHO, 17ª edição, pág. 314), «alterar o horário de trabalho é, afinal, fixar um novo horário. Nesta situação, o trabalhador pode ser forçado a ajustamentos na sua organização de vida – como o terá sido relativamente ao horário inicial… A alterabilidade dos horários de trabalho, por decisão unilateral da entidade empregadora… só está afastada nos casos em que o horário de trabalho conste (expressamente) do contrato individual, ou tenha sido posteriormente acordado entre as partes (art. 217º/4), e ainda naqueles em que haja regra da convenção colectiva aplicável, no sentido de que a alteração de horário só pode operar-se por acordo».

No caso presente é inequívoco que as partes acordaram individualmente no horário de trabalho, acordo que ficou plasmado no escrito de fls. 6-7 do procedimento disciplinar apenso, denominado “Alteração a Contrato de Trabalho a Termo Certo” com efeitos reportados a 01 de Novembro de 1995, constando de tal documento, subscrito por ambas as partes, que o horário de trabalho de trabalho era o seguinte: “de segunda a domingo, das 17 às 24 horas, com intervalo para refeição, folgando um dia e meio por semana” [facto P)].
Foi este horário que vigorou até ao dia 03 de Setembro de 2015, com entrada da trabalhadora às 17 horas e saída às 24 horas, com uma hora de pausa para refeição, com folga às terças-feiras, e em regra, aos domingos [facto AA)].

Assim, a empregadora não o podia alterar unilateralmente, conforme resulta do disposto no citado artigo 217.º, n.º 4 do Código do Trabalho.

Por isso, e se é certo podia alterar o seu local de trabalho, para alterar o respectivo horário de trabalho tinha sempre que se munir previamente do consentimento da trabalhadora.

Donde termos de concluir que, se a empresa queria que a trabalhadora fizesse na loja do ... o horário das 10h às 18 h, de segunda a sábado, com uma hora de intervalo para almoço (das 14 h às 15 h), tinha que previamente negociar com esta a alteração do horário que queria que esta cumprisse a partir de Setembro de 2015.

E nesta conformidade, ao apresentar-se no novo local de trabalho no horário das 17 às 19 horas, temos de concluir, como fez a Relação, que a recorrida não incorreu em infracção disciplinar, pois não tendo dado o seu acordo à alteração de horário de trabalho que lhe fora imposto pela R, e sempre se tendo disponibilizado para cumprir o horário que estava acordado, a mais não estava obrigada.

E não podendo imputar-se à trabalhadora a prática de qualquer ilícito disciplinar, tanto basta para que se considere que a conduta descrita na nota de culpa não configura justa causa de despedimento disciplinar, conforme decidiu a Relação.

Improcedem assim as razões invocadas pela recorrente nas suas conclusões, não tendo havido qualquer violação do disposto no artigo 194°, n° 1 alínea b) do Código do Trabalho, pois mesmo havendo interesse da empresa na mudança de local de trabalho é incontornável que, previamente, esta deveria munir-se da necessária aquiescência da trabalhadora para alterar o seu horário de trabalho, conforme exige expressamente o nº 4 do artigo 217º do Código do Trabalho.

E a circunstância de a ré pretender passar a praticar nesta loja uma organização rotativa de trabalhadores por turnos (factos provados AN) e AT) também não justifica a alteração unilateral do horário de trabalho da autora em violação do disposto no mencionado preceito, que sempre impunha à empregadora que obtivesse o acordo da trabalhadora.

Face ao exposto, temos de concluir que esta foi despedida sem justa causa, sendo esse despedimento ilícito, com as consequências fixadas pela Relação.

E embora a recorrente alegue que o acórdão não podia ter decidido acerca destas consequências sem antes ouvir as partes, conforme impõe o art.º 665.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, imputando assim uma nulidade ao acórdão, já dissemos que não tendo esta situação sido arguida nos termos do nº 1 do artigo 77º, não pode o Supremo apreciar a questão.


3.5---- 

            Quanto ao assédio:

            Só com o Código do Trabalho de 2003, que entrou em vigor em 1/12/2003, foi consagrada a figura do “mobbing”, que no seu artigo 24º, nº 2 definia o assédio moral como “todo o comportamento indesejado relacionado com um dos factores indicados no nº 1 do artigo anterior, praticado aquando do acesso ao emprego ou no próprio emprego, trabalho ou formação profissional, com o objectivo ou o efeito de afectar a dignidade da pessoa ou criar um ambiente intimidativo, hostil, degradante, humilhante ou desestabilizador”.

            Estes factores são, nomeadamente, a ascendência, idade, sexo, orientação sexual, estado civil, situação familiar, património genético, capacidade de trabalho reduzida, deficiência ou doença crónica, nacionalidade, origem étnica, religião, convicções políticas ou ideológicas e filiação sindical, conforme advém do nº 1 do artigo 23º, indicação que sendo meramente exemplificativa permite que possa haver outros factores relacionados com o assédio.
           
            Como explica Júlio Gomes[2], “o mobbing ou assédio moral ou ainda, como por vezes se designa, terrorismo psicológico, caracteriza-se por três facetas: a prática de determinados comportamentos, a sua duração e as consequências destes”, sendo usual associar-se à figura a intencionalidade da conduta persecutória, o seu carácter repetitivo e a verificação de consequências na saúde física e psíquica do trabalhador e no próprio emprego, que se pode manifestar numa baixa de produtividade e, quiçá, no abandono.

            E continuando a seguir este autor, quanto aos comportamentos em causa, para Leymann tratar-se-ia de qualquer comportamento hostil. Para Hirigoyen, por seu turno, tratava-se de qualquer conduta abusiva manifestada por palavras (designadamente graçolas), gestos ou escritos e muitos outros comportamentos humilhantes ou vexatórios. Daí a referência a uma polimorfia do assédio e, por vezes, a dificuldade em distingui-lo dos conflitos normais em qualquer relação de trabalho. Tais comportamentos são, frequentemente, ilícitos, mesmo quando isoladamente considerados; mas sucede frequentemente que a sua ilicitude só se compreende, ou só se compreende na sua plena dimensão atendendo ao seu carácter repetitivo. E esta é a segunda faceta que tradicionalmente se aponta no mobbing… é normalmente o carácter repetitivo dos comportamentos, a permanência de uma hostilidade, que transforma um mero conflito pontual num assédio moral. A terceira nota característica do assédio, pelo menos para um sector da doutrina, consiste nas consequências deste designadamente sobre a saúde física e psíquica da vítima e sobre o seu emprego. O assédio pode produzir um amplo leque de efeitos negativos sobre a vítima que é lesada na sua dignidade e personalidade, mas que pode também ser objecto de um processo de exclusão profissional, destruindo-se a sua carreira e mesmo acabando por pôr-se em causa o seu emprego…

            Trata-se de um conceito que não sendo de natureza jurídica, mas sociológica, permite “apreender como comportamentos que isoladamente seriam lícitos e poderiam até parecer insignificantes, podem ganhar relevo muito distinto quando inseridos num determinado procedimento e reiterados ao longo do tempo. (…) O principal mérito da figura consiste em que ela permite ampliar a tutela da vítima, ligando entre si factos e circunstâncias que, isoladamente considerados pareceriam de pouca monta, mas que devem ser reconduzidos a uma unidade, a um projecto ou procedimento …”[3].

            Assim, a qualificação da situação como assédio moral dependia da existência dum ilícito contratual dado que foi violado o dever de respeitar a integridade psíquica e moral do trabalhador, direito de personalidade consagrado no mencionado art. 18º do CT/2003, dando causa a um dano moral merecedor da tutela do direito.

           O Código do Trabalho de 2009 manteve a figura do assédio estabelecendo o seu artigo 29.º, n.º 1 que:

           “Entende-se por assédio o comportamento indesejado, nomeadamente o baseado em factor de discriminação, praticado aquando do acesso ao emprego ou no próprio emprego, trabalho ou formação profissional, com o objectivo ou o efeito de perturbar ou constranger a pessoa, afectar a sua dignidade, ou de lhe criar um ambiente intimidativo, hostil, degradante, humilhante ou desestabilizador.”

           Como realça a doutrina, uma abordagem ao preceito assente apenas no seu elemento literal revela-se demasiado abrangente, pelo que se impõe um esforço para delimitar a sua esfera de protecção.
           
           Com efeito, e como enfatiza Monteiro Fernandes, (Direito do Trabalho, 17ª edição, 2014, pgª 173) “a definição do art. 29º não parece constituir o instrumento de diferenciação que é necessário”, uma vez que “nela cabem, praticamente, todas as situações que o mau relacionamento entre chefes e empregados pode gerar”.

            E continuando a seguir este autor, (obra citada, pgª 174), conclui que, entrando em conta com o texto da lei e os contributos da jurisprudência, parece possível identificar os seguintes traços estruturais da noção de assédio no trabalho:

           “a) Um comportamento (não um ato isolado) indesejado, por representar incómodo injusto ou mesmo prejuízo para a vítima (…);

            b) Uma intenção imediata de, com esse comportamento, exercer pressão moral sobre o outro (…);

           c) Um objectivo final ilícito ou, no mínimo, eticamente reprovável, consistente na obtenção de um efeito psicológico na vítima, desejado pelo assediante (…).”

            Por outro lado, e voltando ao conceito constante do supracitado artigo 29.º, constatamos que o legislador parece prescindir do elemento intencional que reputamos essencial à diferenciação das situações de assédio face a outros tipos de comportamento incorrecto, abusivo ou prepotente do empregador ou dos superiores hierárquicos do trabalhador.

            A propósito desta dimensão volitiva/final do conceito, e seguindo o acórdão desta Secção Social de 3 de Dezembro de 2014, proferido na revista n.º 712/12.6TTPRT.P1.S1, destaca-se que a doutrina sempre se mostrou dividida, pois “enquanto para alguns o mobbing pressupõe uma intenção persecutória ou de chicana (ainda que não necessariamente a intenção de expulsar a vítima da empresa), para outros, o essencial não são tanto as intenções, mas antes o significado objectivo das práticas reiteradas”.

          E continua o aresto: “Neste âmbito, havendo que reconhecer a necessidade de uma interpretação prudente da sobredita disposição legal, também importa ter presente que não pode ser considerado pelo intérprete um “pensamento legislativo” que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso, devendo ainda presumir-se que o legislador soube expressar o seu pensamento em termos adequados e que consagrou as soluções mais acertadas – art. 9.º, n.ºs 2 e 3, C. Civil.

           Incontornavelmente, a lei estipula que no assédio não tem de estar presente o “objectivo” de afectar a vítima, bastando que este resultado seja “efeito” do comportamento adoptado pelo “assediante”.

            No entanto, quanto aos precisos contornos desta exigência, duas observações se impõem.

            Em primeiro lugar, uma vez que a esfera de protecção da norma se circunscreve, como vimos, a comportamentos que intensa e inequivocamente infrinjam os valores protegidos, não pode deixar de notar-se que é dificilmente configurável a existência de (verdadeiras) situações de assédio moral que - no plano da vontade do agente - não imponham concluir que ele, pelo menos, representou as consequências imediatas da sua conduta, conformando-se com elas.

            Por outro lado, para referir que a circunstância de o legislador ter prescindido de um elemento volitivo dirigido às consequências imediatas de determinado comportamento não obsta à afirmação de que o assédio moral, em qualquer das suas modalidades, tem em regra associado um objectivo final “ilícito ou, no mínimo, eticamente reprovável” (v.g. a discriminação, a marginalização/estigmatização ou neutralização do trabalhador, atingir a sua auto-estima ou, no tocante ao “assédio estratégico”, os objectivos específicos supra expostos).”

           E nesta linha conclui o mesmo acórdão que de acordo com o entendimento perfilhado pela generalidade da doutrina, pode dizer-se, numa formulação sintética, que o assédio moral implica comportamentos (em regra oriundos do empregador ou de superiores hierárquicos do visado) real e manifestamente humilhantes, vexatórios e atentatórios da dignidade do trabalhador, aos quais estão em regra associados mais dois elementos: certa duração; e determinadas consequências.

            Postas estas considerações, vejamos o caso presente.

           A Relação entendeu ser de afirmar que a autora foi vítima de assédio moral por parte da ré por força da alteração do local e do horário de trabalho ilicitamente levadas a cabo, e, bem assim, em virtude da ré ter imposto à autora o gozo de férias, levando a que esta não só não tivesse recuperado energias físicas e psíquicas, como se tivesse sentido ainda mais fragilizada física e psiquicamente.

           Quanto ao gozo de férias, apurou-se que através de comunicação escrita datada de 2015.03.19, a recorrente determinou que a recorrente gozasse 15 dias de férias a partir do dia 20 de Março de 2015 – alínea BO). E ficou ainda provado que através de comunicação escrita de 2015.04.21, a empregadora determinou que a recorrente gozasse mais 8 dias de férias a partir do dia 22 de Abril de 2015 – alínea BP).

           Perante esta factualidade, concluiu a Relação que estas determinações são ilícitas por não se ter observado os n°. 1 e 2 do artigo 241.º do Código do Trabalho.

           Resulta do mencionado preceito que as férias devem ser marcadas por acordo entre o empregador e o trabalhador e só podem ser marcadas unilateralmente pelo empregador quando não ocorrer tal acordo, caso em que as férias podem ser marcadas para serem gozadas entre 1 de Maio e 31 de Outubro (nº 3).

            Ora, apesar da R ter marcado o gozo das férias da trabalhadora fora deste período temporal, não se provou que esta se tenha oposto à sua marcação, ponto que seria fundamental para se concluir pela ilicitude da sua marcação.

           Na verdade, em Março de 2015, a trabalhadora esteve reunida com uns consultores da empresa “...”, tendo sido nessa reunião que lhe foi comunicado que seria conveniente para a empresa que gozasse férias ainda em Março, não se tendo apurado que a trabalhadora tenha oposto qualquer objecção.

            Não podemos por isso, considerar que foi ilegal a marcação das férias da trabalhadora para Março e Abril de 2015, pois para isso era fundamental esta ter alegado e provado que se opôs a tal marcação, prova que não logrou efectuar.
            E por outro lado, também não se pode concluir que ao marcar as férias da trabalhadora nos termos acima referidos a recorrente tivesse a intenção de impedir que o seu gozo prosseguisse os objectivos visados pelo n.° 4 do artigo 237.° do Código do Trabalho, pois se é certo que a A terá regressado de férias mais fragilizada física e psicologicamente, não se apurou contudo que tal se devesse à conduta da R.

           Donde termos de concluir que da marcação das férias da trabalhadora para Março e Abril de 2015 não resulta uma conduta assediante da R em relação à trabalhadora.

            Quanto à alteração do local e do horário de trabalho a partir de Outubro e Novembro de 2015, já decidimos no ponto 3.4) que se tratou duma conduta ilegal da empregadora, pois só podia ter alterado esse horário depois de obter a aquiescência da trabalhadora.

            De qualquer forma, não podemos ver nesta atitude da empresa uma conduta persecutória susceptível de integrar uma situação de assédio.

            Na verdade, a primeira mudança de local de trabalho para a loja do ... foi determinada por razões objectivas – obras na loja das ....

           E mesmo perante este circunstancialismo, a trabalhadora não aceitou o novo horário        que lhe foi determinado.

            E quanto à ordem para trabalhar na loja do ... depois das obras na loja das ..., tal alteração foi determinada por ser do interesse da empregadora implementar nesta última loja um regime de rotatividade e de flexibilidade de horários.

            Por isso, e apesar da alteração do horário da trabalhadora não ter sido obtido com o acordo da trabalhadora, também não podemos ver nesta ordem uma atitude persecutória da empresa susceptível de integrar a situação de assédio, tanto mais que ela nunca chegou a praticar o horário que lhe foi unilateralmente imposto.

            Claro que ao assumir esta conduta de recusa, o conflito entre a trabalhadora e a empresa era inevitável – e daí o procedimento disciplinar que culminou com o seu despedimento.

            De qualquer modo e como escreve Júlio Gomes[4]nem todos os conflitos no local de trabalho são, obviamente, um “mobbing”, sendo, aliás, importante evitar que a expressão assédio se banalize” e “nem sequer todas as modalidades de exercício arbitrário do poder de direcção são necessariamente um “mobbing”, quer porque lhes pode faltar um carácter repetitivo e assediante quer porque não são realizados com tal intenção”.

            Por outro lado, e apesar da alteração do horário da trabalhadora não ter sido legal, importa ter presente que não é toda e qualquer violação dos deveres da entidade empregadora em relação ao trabalhador, mesmo que consubstancie um exercício arbitrário de poder de direcção, que pode ser considerada assédio moral, exigindo-se que se verifique um objectivo final ilícito ou, no mínimo, eticamente reprovável, para que se tenha o mesmo por verificado, conforme realça o acórdão desta Secção Social de 21.04.2016, Recurso n.º 299/14.5T8VLG.P1.S1 (Mário Belo Morgado).

           Como tal intencionalidade não se apurou, nem podemos depreendê-la da factualidade apurada, não podemos concluir que o caso vertente integra uma situação de assédio, conforme decidiu a Relação.

            E embora seja certo que, e no que diz respeito às consequências, tenha ficado provado que a trabalhadora se sentiu humilhada e vexada com a conduta da R. levada a cabo entre Setembro de 2015 e Janeiro de 2016, tal não basta para podermos considerar a situação como assédio, pois não se provou que a R prosseguisse um objectivo persecutório da trabalhadora, ou no mínimo, um objectivo final eticamente reprovável.

            E por outro lado, tratou-se dum acto isolado.

           Por tudo isto não podemos considerar que a conduta da empregadora respeitante à ordem de mudança do local de trabalho para a loja do ... a partir de 30 de Setembro integre uma situação de assédio moral, conforme decidido pela Relação, pelo que se tem que revogar o acórdão recorrido nesta parte.

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Termos em que se acorda nesta Secção Social em conceder parcialmente a revista, pelo que:


a) Altera-se o ponto 5.4.1.do dispositivo do acórdão recorrido, declarando-se ilícito o despedimento de que foi alvo AA por se não verificar a ocorrência de justa causa;


b) Revoga-se o ponto 5.4.5. do mesmo dispositivo, indo a R absolvida do pagamento da quantia de € 20.000, em que fora condenada a título de danos não patrimoniais resultantes de assédio praticado pela empregadora;


c) Mantém-se quanto ao mais o acórdão recorrido.


As custas da revista são na proporção de metade para cada uma das partes.


Nas instâncias, as custas são na proporção do respectivo decaimento.

  Lisboa, 1 de Março de 2018

Gonçalves Rocha (Relator)

Leones Dantas

Júlio Gomes

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[1] Neste sentido António Santos Abrantes Geraldes, em “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 2016, Almedina, 3ª Edição, págs. 367 e segts. E também os Acórdãos desta Secção Social de 30/06/2016 e de 14/Julho/2016, no âmbito dos processos nº 605/11.4TTLRA.C1.S1 e nº 506/12.9TTTMR-A.E1.S1, respectivamente, ambos disponíveis em www.dgsi.pt.
[2] In “Direito do Trabalho”, volume I, 2007, página 428.
[3] Júlio Gomes, obra citada, pag. 426 e 437.
[4] Ob. cit., p. 436.