Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
214/17.4T8MNC.G1.S1
Nº Convencional: 2.ª SECÇÃO (CÍVEL)
Relator: MARIA DA GRAÇA TRIGO
Descritores: RECURSO DE REVISTA
FUNDAMENTOS
REFORMA DA DECISÃO
ADMISSIBILIDADE DE RECURSO
OFENSA DO CASO JULGADO
AUTORIDADE DO CASO JULGADO
REJEIÇÃO
ERRO DE JULGAMENTO
Data do Acordão: 01/28/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: INDEFERIDA A RECLAMAÇÃO
Indicações Eventuais: TRANSITADO EM JULGADO
Sumário : I. De acordo com o entendimento consolidado da doutrina e da jurisprudência, a reforma de decisão judicial, prevista no art. 616.º, n.º 2, do CPC, apenas é possível caso se verifique lapso manifesto que se revele por elementos exteriores à decisão, não podendo reconduzir-se a uma mera discordância quanto ao sentido da mesma.
II. Tal como se afirmou no acórdão ora reclamado não pode confundir-se a apreciação do fundamento de recorribilidade (ofensa de caso julgado ou da autoridade de caso julgado formado em acção anterior) com a apreciação do eventual erro de julgamento quanto ao sentido e alcance da decisão proferida nessa acção, questão que apenas poderia ser apreciada caso o recurso fosse admissível.

III. Tampouco pode uma divergência de fundo quanto aos pressupostos e contornos da figura da autoridade de caso julgado servir de fundamento à pretensão de reforma do acórdão que decidiu a revista.

Decisão Texto Integral:

Acordam em conferência no Supremo Tribunal de Justiça



1. Notificado do acórdão proferido em 11 de Novembro de 2020, veio o Recorrente requerer a sua rectificação/reforma, invocando que o acórdão seja substituído por outro que admita a ofensa do caso julgado ou, pelo menos, da autoridade do caso julgado formado com a decisão proferida no Processo n.º 70/88, e que, em consequência, absolva os RR. de todos os pedidos. Para o efeito, invoca os seguintes fundamentos:

a) Necessidade de rectificar as referências do acórdão quanto ao momento da alegação pelos RR. da ofensa de caso julgado formado com a decisão proferida no processo n.º 70/88;

b) Verificação da identidade subjectiva entre a presente acção e o Processo n.º 70/88, uma vez que os autores nesta última acção correspondem aos antepossuidores do aqui R. AA.;

c) Verificação da ofensa da autoridade do caso julgado, uma vez que o alcance da identidade subjectiva foi erroneamente estabelecido no acórdão ora reclamado.

Os Recorridos não se pronunciaram.

Cumpre apreciar e decidir.


2. Antes de mais, convém ter presente que, de acordo com o entendimento consolidado da doutrina e da jurisprudência, a reforma de decisão judicial, prevista no art. 616.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, aplicável ex vi arts. 679.º e 666.º do mesmo Código, a acórdão que aprecia e decide o recurso de revista, apenas é possível caso se verifique lapso manifesto que se revele por elementos exteriores à decisão, não podendo reconduzir-se a uma mera discordância quanto ao sentido da decisão.

Vejamos.


3. Quanto à rectificação das referências ao momento em que os RR. alegaram a ofensa de caso julgado formado com a decisão proferida no Processo n.º 70/88, compulsada de novo a contestação, verifica-se que, ainda que nessa sede apenas tenha sido invocada excepção do caso julgado formado com a decisão proferida no Processo n.º 60/85, foi efectivamente invocado que as pretensões dos AA. colidiam com a autoridade do caso julgado formado no dito Processo n.º 70/88. Tal imprecisão do acórdão, porém, não assume qualquer relevância, uma vez que, no mesmo, se considerou explicitamente o seguinte:

«Tratando-se, porém, de matéria de conhecimento oficioso e constando dos autos as certidões dos articulados e decisões proferidas em ambas as acções acima indicadas, com nota do respectivo trânsito em julgado, importa proceder à sua apreciação tanto em relação ao Processo n.º 60/85 como ao Processo n.º 70/88

Improcede, assim, este fundamento da presente reclamação.


4. Como fundamento do pedido de reforma do acórdão ora reclamado, invoca o Recorrente a verificação da identidade subjectiva entre a presente acção e o Processo n.º 70/88, uma vez que os autores nesta última acção correspondem aos antepossuidores do aqui R. AA..

Opta-se por transcrever, por inteiro, a argumentação do reclamante

«Outro dos equívocos notados que importa que seja corrigido é o facto de se dizer que o R. AA. não tenha demostrado ter adquirido “a parcela de terreno correspondente e a ¼ do prédio do artigo matricial n.º 111, pelo que os Autores no processo n.º 70/88 corresponderiam aos antepossuidores do aqui R. AA. para quem se teria transmitido a posição jurídica daqueles”.

Note-se antes demais que o facto  do Réu AA. se referira ¼ do artigo 111 não significa que o mesmo ainda exista, optando-se por se referir a 1/4 apenas para melhor localizar a área/parcela física em causa. Nem, sabemo-lo, doutra forma poderia ser pois que ¼ de um dado artigo predial não é ¼ de uma parte física, mas sim como ¼ de um direito sobre tal prédio, apenas fazendo sentido a referência precisamente como forma de localização.

Julgamos que tal ponto não tenha merecido qualquer dúvida.

De outro lado, a verdade é que o Réu AA. efectivamente viu provado que adquiriu a parcela de terreno outrora correspondente a “¼”, “físico”, do artigo 111, tornando-se necessário corrigir, no acórdão, tal passagem e suas conclusões no que diz respeito à efectiva existência de caso julgado.

Ou então, pelo menos, será mister que se esclareça qual, afinal, o limite do prédio de que o Réu AA. é único proprietário.

Quanto ao primeiro ponto, não deixaremos de evocar o que ficou demonstrado como factos provados n.ºs 7 e 8:

“7. Até o dia 29 de Setembro de 2011, também era propriedade dos herdeiros de BB. e CC., o seguinte prédio urbano: prédio composto de casa com dois pavimentos e rossios, sito no Lugar …, Freguesia de …, concelho de …, com a área de 325m2, confrontando do  norte com DD. e  caminho  de servidão,  do sul com EE., nascente com FF.(1.º Autor) e caminho de servidão e poente com AA.(1.º Réu) e GG., anteriormente inscrito na matriz predial urbana sob artigo 400 e que, ulteriormente, por via da recente reorganização administrativa, com a união das freguesias de …. e …., passou a estar inscrito sob o artigo 2830; estando actualmente descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob nº 654, tendo a predita aquisição sido inscrita pela apresentação nº 1132 de 29.09.2011”;

8. Nesse dia 29 de Setembro de 2011, por título de compra e venda, os herdeiros de BB. e de CC. venderam ao 1.º Réu, AA., o prédio identificado no artigo antecedente, pelo preço de € 30.000,00 (trinta mil euros);

Nota-se desde logo que neste facto, ao contrário do que sucede com o facto provado 1), não se deu apenas como provada uma mera e frágil inscrição registral. Foi-se mais além: pelos factos 7 e 8, fixou-se que o artigo 400 “era até 2011 propriedade dos herdeiros de BB. e CC.” e com a configuração que aí consta, incluindo 2 dados importantes que o tribunal recorrido certamente ignorou: a) – a área de 325m2; b) – a confrontação nascente do prédio 400.

Tal facto 7º ficou demonstrado por documentos – registo predial, mas ainda pela planta topográfica junta como documento 23 da contestação de onde o julgador retirou a conclusão de que a área do falado prédio com o artigo 400 é efectivamente de 325m2, constatando-se assim qual a localização e delimitação física com mesmo, dando-se a mesma como definitivamente provada e não apenas presumida.

Ora, sucede que essa área de 325m2 inclui a “casa do meio” e respectivo quintal a norte, sobre a qual versa a presente lide. Ora, se os 325 m2 incluem tal área – aquela onde se localizaram as obras de demolição inacabadas – então é evidente que as obras decorreram dentro do prédio com o artigo 400 e não no artigo 111.

Ainda que se dispensasse, o facto provado n.º 7, quanto à sua área e confrontação, resultou ainda da exibição da planta de fls. 9 do doc. 6 da Petição inicial. Esta planta, junta pelos próprios AA., esclarece, para além de qualquer dúvida, qual a delimitação dos prédios e de quais os seus proprietários e pelo menos desde a década de 80! Trata-se de uma planta junta nos autos que decorreram sob o n.º 70/88 e que retrata a existência de 3 casas e respectivos rossios/quintais a norte, onde se identifica claramente qual a casa, individualizada, exclusivamente de HH. (agora dos AA.), e quais as 2 casas, a poente, também individualizadas, exclusivamente pertencentes a BB. (agora do Réu AA.).

 Sendo que o conjunto de tais 2 casas (a do meio e a mais a poente) exibido em tal outra planta, coligida com a planta de doc. 23 da contestação, têm a mesma delimitação e somam precisamente os 325m2 que o facto 7 deu como provados pertencerem ao aqui Reu AA. de acordo com a admitida planta junta como documento 23 da contestação.

Em conclusão: tais factos provados n.º 7 e 8 demonstram que o Réu AA. efectivamente adquiriu o artigo 400 caracterizado com a área de 325m2 e com os limites alegados e provados e melhor retratados no documento 23 da Contestação – planta topográfica.

Porque tal área, como denotam tais plantas e os factos provados, inclui a parcela outrora conhecida como ¼ do artº 111, demonstrada está a aquisição  derivada e, assim, a identidade de sujeitos entre a acção 70/88 e a presente acção pois que, afinal, o Réu AA. é de facto o “sucessor” do direito/posição jurídica anteriormente ocupada pelos herdeiros de BB. e mulher (Autores dessoutra acção 70/88) quanto à parcela em discussão, não existindo assim qualquer objecção (sem prejuízo do que adiante se dirá) a que seja feita a análise sob o prisma do caso julgado, o que se impõe realizar.

(Julgamos que tal axial ponto apenas não tenha sido compreensivelmente constatado em virtude da decisão de se restringir o presente recurso de revista à questão do caso julgado ou se sua autoridade. Porém, como vimos, tais factos provados 7 e 8 têm indelével importância para esta questão.)

A não ser deste modo, então forçosamente haveremos que concluir que o Réu AA. é efectivamente exclusivo dono de outro prédio – o do artigo 400 – e que esse tem a configuração, área e limites dados como provados no facto 7.

Por outras palavras, se fosse essa a conclusão a que as instâncias chegaram, torna-se necessário que se esclareça e se defina tal facto pois que o Réu AA. não se acha, de facto, dono de mais do que os 325m2 que vêm dados como provados no facto 7.

“Confusão” essa que até se admite que possa existir atendendo ao facto dos AA. da presente acção não terem chegado a alegar ou a provar a configuração, área e limites do que seja o prédio de que (erradamente) alegam ser comproprietários...

E isto sem olvidar que enquanto que o aqui Réu comprovou a área do seu prédio (facto 7 provado), os AA apenas usufruíram – erradamente – da presunção de registo conferida pelo artº 7º do Código de Registo Predial que, como bem sabemos, não abrange a área ou delimitação de um prédio.

Urge assim corrigir tal lapso, alterando-se a premissa de que o Réu AA. não tenha a mesma qualidade que os outrora AA da acção n.º 70/88 (como na verdade ocorre) para daqui se extrair a consequência de existência de caso julgado.» [negritos nossos]

Diversamente do alegado pelo Recorrente, ora reclamante, os factos provados 7 e 8 reportam-se ao prédio identificado com o artigo 400 e não ao prédio identificado com o artigo 111.

Distinta seria a questão de saber se existe erro da decisão de facto, a qual, porém, apenas poderia ser apreciada caso o recurso de revista fosse admissível. Como o próprio reclamante reconhece ao afirmar «Julgamos que tal axial ponto apenas não tenha sido compreensivelmente constatado em virtude da decisão de se restringir o presente recurso de revista à questão do caso julgado ou se sua autoridade. Porém, como vimos, tais factos provados 7 e 8 têm indelével importância para esta questão», a apreciação de um eventual erro de julgamento apenas poderia ser feita se, ocorrendo ofensa de caso julgado ou da autoridade de caso julgado formado com a decisão proferida no Processo n.º 70/88, o recurso fosse admissível.

Tal como se afirmou no acórdão ora reclamado não pode confundir-se a apreciação da do fundamento de recorribilidade com a apreciação do eventual erro de julgamento quanto ao sentido e alcance da sentença proferida no referido Processo n.º 70/88:

«O que se verifica é que os Recorrentes, não se conformando com a decisão das instâncias, vêm impugnar a interpretação que estas fizeram quanto ao sentido e alcance da decisão da sentença (transitada em julgado) proferida no Processo n.º 70/88, fundando tal impugnação na alegada ofensa do caso julgado ou da autoridade do caso julgado material aí formado.

Ocorre aqui um equívoco que importa esclarecer.

Um eventual erro na interpretação do sentido e alcance da decisão proferida na sentença do Processo n.º 70/88, a existir, corresponderá a um erro de julgamento que apenas poderá ser reapreciado se, previamente, se constatar a existência de ofensa do caso julgado ou da autoridade do caso julgado, o que, por sua vez, implica conhecer do preenchimento dos respectivos pressupostos.

Posto por outras palavras, o conhecimento do invocado erro de julgamento na interpretação do sentido e alcance da decisão proferida no Processo n.º 70/88 não se confunde com a apreciação da alegada ofensa de caso julgado ou da autoridade de caso julgado. Encontra-se este Supremo Tribunal impedido de conhecer daquela primeira questão recursória, se acaso não se verificarem os pressupostos de que depende a efectiva verificação do fundamento especial que justificou a admissibilidade do recurso

Improcede assim também a pretensão de reforma do acórdão por este motivo.


5. Por fim, invoca o Recorrente, ora reclamante, que o acórdão deve ser reformado de forma a dar como verificada a ofensa da autoridade do caso julgado formado no Processo n.º 70/88, uma vez que o alcance da identidade subjectiva foi erroneamente estabelecido. Alega, no essencial, o seguinte:

«E isso tem toda a importância pois que a invocação feita, de existência de caso julgado ou de autoridade de caso julgado (a qual, recordemos, é de conhecimento oficioso de tão vital que tal instituto jurídico processual é) foi precisamente alegada contra aqueles AA. (e não contra o aqui Réu) que, por serem os mesmos, é-lhes oponível a decisão emitida no processo 70/88.»

Para, em seguida, invocar posição doutrinal no sentido pretendido:

«Nas palavras do professor Rui Pinto (in revista “Julgar” de 25.5.2020, disponível online):

“(...)

(...) se as partes da causa julgada não podem opor a terceiro a sentença, pergunta-se, porém, se um terceiro pode opor a uma dessas partes aquela mesma decisão. A ser assim, então a autoridade de caso julgado não operaria apenas e somente entre sujeitos idênticos aos da acção decidida.

A resposta é positiva graças a mecanismos de extensão do caso julgado a terceiros, por força da lei ou pela sua vontade”, “havendo ainda quem defenda a existência de um princípio de aproveitamento por terceiros do caso julgado secundum eventum litis”.

(...)

Ora, se é o próprio a querer “usar” da decisão, parece ser de defender a existência de um princípio de adesão ao caso julgado alheio. O único limite será, naturalmente, a indisponibilidade substantiva dos respectivos direitos, limitação que, no caso, não ocorre.»

O acórdão reclamado pronunciou-se nos seguintes termos:

«Quanto à alegada ofensa da autoridade do caso julgado formado no Processo n.º 70/88, importa ter presente que a jurisprudência deste Supremo Tribunal vem admitindo – em linha com a doutrina tradicional (cfr. Castro Mendes, Limites Objectivos do Caso Julgado em Processo Civil, Edições Ática, s/l, 1968, págs. 38 e segs., Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora, Coimbra, 1976, págs. 304 e segs., Teixeira de Sousa, Estudos sobre o novo Processo Civil, Lex, Lisboa, 1997, págs. 572 e segs.) – que a autoridade do caso julgado dispensa a verificação da tríplice identidade requerida para a procedência da exceção dilatória, sem dispensar, porém, a identidade subjectiva. Significando que tal dispensa se reporta apenas à identidade objectiva, a qual é substituída pela exigência de que exista uma relação de prejudicialidade entre o objecto da segunda acção e o objecto da primeira. Ver, entre outros, os acórdãos de 19/06/2018 (proc. n.º 3527/12.8TBSTS.P1.S2), cujo sumário está disponível em www.stj.pt, de 13/09/2018 (proc. n.º 687/17.5T8PNF.S1), de 06/11/2018 (proc. n.º 1/16.7T8ESP.P1.S1), de 28/03/2019 (proc. n.º 6659/08.3TBCSC.L1.S1) e de 30/04/2020 (proc. n.º 257/17.8T8MNC.G1.S1), consultáveis em www.dgsi.pt.

Nas palavras do indicado de 28/03/2019 [[1] Relatado pelo Cons. Tomé Gomes e votado nesta 2.ª Secção do STJ]:

“(…) [A] autoridade do caso julgado não depende da verificação integral ou completa da tríplice identidade prescrita no artigo 581.º do CPC, mormente no plano do pedido e da causa de pedir. Já no respeitante à identidade de sujeitos, esse efeito de caso julgado só vinculará quem tenha sido parte na respetiva ação ou quem, não sendo parte, se encontre legalmente abrangido por via da sua eficácia direta ou reflexa, consoante os casos.

Assim, quem não for parte na ação poderá, todavia, beneficiar do efeito favorável daquele caso julgado em conformidade com a lei, como sucede nas situação de solidariedade entre devedores, de solidariedade entre credores e de pluralidade de credores de prestação indivisível, respetivamente nos termos dos artigo 522.º, 2.ª parte, 531.º, 2.ª parte, e 538.º, n.º 2, do CC.

Com efeito, ao devedor solidário aproveitará o caso julgado favorável constituído em relação a um seu condevedor com fundamento não respeitante pessoalmente a este (art.º 522.º, 2.ª parte, do CC), como também aproveitará ao credor solidário o caso julgado favorável a um seu co-credor, sem prejuízo das exceções pessoais que o devedor tenha o direito de invocar em relação a cada um deles (art.º 531.º, 2.ª parte, do CC). E no âmbito de pluralidade de credores de prestação indivisível, o caso julgado favorável a um dos credores aproveita aos demais co-credores, se o devedor não tiver, contra estes, meios específicos de defesa (art.º 538.º, n.º 2, do CC).” [negritos nossos]

No caso dos autos em que, como se viu, os aqui réus não são parte no Processo nº 70/88, nem por si nem pela qualidade, alegada mas não provada, de sucessores na posse dos ali autores, nem tampouco se encontram abrangidos por qualquer norma legal que permita que beneficiem do caso julgado formado naquele processo, forçoso é considerar-se que não se encontram reunidos os pressupostos da ofensa da autoridade do caso julgado. Com efeito – e aplicando-se o critério definido pelo n.º 2 do art. 580.º do CPC – a diversidade de sujeitos perante os quais são vinculativas as decisões leva a concluir que o conhecimento do mérito da presente acção realizado pelo acórdão recorrido não colocou o tribunal na alternativa de contradizer ou de reproduzir a decisão anterior.

Conclui-se assim pela não verificação da alegada ofensa do caso julgado ou autoridade do caso julgado formado com a decisão proferida no Processo n.º 70/88.»

Da simples leitura do teor da fundamentação do acórdão, torna-se evidente não estar em causa qualquer lapso manifesto, mas antes uma divergência de fundo quanto aos pressupostos e contornos da figura da autoridade de caso julgado, não podendo tal divergência, como se assinalou supra, servir de fundamento à pretensão de reforma do acórdão que decidiu a revista.

Improcede também este fundamento da reclamação.


6. Pelo exposto, indefere-se a reclamação.

Custas pelo reclamante.


Lisboa, 28 de Janeiro de 2021


Nos termos do art. 15º-A do Decreto-Lei nº 10-A/2020, de 13 de Março, aditado pelo Decreto-Lei nº 20/2020, de 1 de Maio, declaro que o presente acórdão tem o voto de conformidade das Exmas. Senhoras Conselheiras Maria Rosa Tching e Catarina Serra que compõem este colectivo.

Maria da Graça Trigo (Relator)