Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
2054/18.4T8PVZ.P1.S1
Nº Convencional: 7.ª SECÇÃO
Relator: MANUEL CAPELO
Descritores: RESPONSABILIDADE BANCÁRIA
INTERMEDIAÇÃO FINANCEIRA
DEVER DE INFORMAÇÃO
NEXO DE CAUSALIDADE
ACÓRDÃO UNIFORMIZADOR DE JURISPRUDÊNCIA
ILICITUDE
PRESUNÇÃO DE CULPA
DANO
VALORES MOBILIÁRIOS
OBRIGAÇÃO DE INDEMNIZAR
PRESSUPOSTOS
Data do Acordão: 10/27/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA
Sumário :
I - Para que se verifiquem os pressupostos da responsabilidade civil contratual, do intermediário financeiro, é necessário demonstrar o facto ilícito (traduzido na prestação de informação errónea, no quadro de relação negocial bancária e intermediação financeira); a culpa (que se presume); o dano (correspondente à perda do capital entregue para subscrição do ajuizado produto financeiro); importando também apreciar o nexo de causalidade entre o facto e o dano (reconhecendo-se que, a quem alega o direito, cabe demonstrar a existência do nexo causal entre a ilicitude e o dano, não se presumindo, quer o nexo de causalidade quer o dano, donde, para que se possa afirmar que o intermediário financeiro é responsável pelo dano sofrido pelos investidores, necessário se torna que estes demonstrem o nexo de causalidade entre a violação do dever de informação e o dano, devendo o nexo causal ser analisado através da demonstração, que decorre da matéria de facto).

II - Conforme jurisprudência uniformizada do STJ de 06-12-2021 no processo 1479/16.4T8LRA.C2.S1-A, “1. No âmbito da responsabilidade civil pré-contratual ou contratual do intermediário financeiro, nos termos dos arts. 7.º, n.º 1, 312.º, n.º 1, al. a), e 314.º do CVM, na redação anterior à introduzida pelo DL n.º 357-A/07, de 31-10, e 342.º, n.º 1, do CC, incumbe ao investidor, mesmo quando seja não qualificado, o ónus de provar a violação pelo intermediário financeiro dos deveres de informação que a este são legalmente impostos e o nexo de causalidade entre a violação do dever de informação e o dano. 2. Se o banco, intermediário financeiro - que sugeriu a subscrição de obrigações subordinadas pelo prazo de maturidade de 10 anos a um cliente que não tinha conhecimentos para avaliar o risco daquele produto financeiro nem pretendia aplicar o seu dinheiro em “produtos de risco” - informou apenas o cliente, relativamente ao risco do produto, que o “reembolso do capital era garantido (porquanto não era “produto de risco”, sem outras explicações, nomeadamente, o que eram obrigações subordinadas), não cumpre o dever de informação aludido no art. 7.º, n.º 1, do CVM. 3. O nexo de causalidade deve ser determinado com base na falta ou inexatidão, imputável ao intermediário financeiro, da informação necessária para a decisão de investir. 4 - Para estabelecer o nexo de causalidade entre a violação dos deveres de informação, por parte do intermediário financeiro, e o dano decorrente da decisão de investir, incumbe ao investidor provar que a prestação da informação devida o levaria a não tomar a decisão de investir.”

Decisão Texto Integral:
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça



Relatório

AA instaurou a presente ação declarativa sob a forma de processo comum contra “Banco BIC Português, S.A.”, peticionando que pela procedência da ação seja:

“A) (…) o Réu condenado a pagar ao A. o capital e juros vencidos que, nesta data, perfazem a quantia de € 58.164,38, sendo € 50.000,00 de capital e € 8.164,38 de juros civis, calculados à taxa de 4%, desde 28/10/2014 (dia seguinte àquele em que o capital deveria ter sido restituído) até à presente, bem como os juros vincendos, à mesma taxa, até efetivo e integral pagamento;

Sem prescindir, e caso assim não se entenda,

B) (…) declarado nulo qualquer eventual contrato de adesão que o R. invoque para ter aplicado os € 50.000,00 que o A. entregou ao R. em obrigações subordinadas SLN Rendimento Mais 2004;

C) (…) declarada ineficaz em relação ao A. a aplicação que o Réu tenha feito desses montantes;

D) Condenar-se o R. a restituir ao A. € 50.000,00 que ainda não recebeu dos montantes que entregou ao R., acrescidos dos juros legais vencidos, bem como dos vincendos, desde a data da citação até efetivo e integral cumprimento;

E, sempre,

E) (…) o R. condenado a pagar ao A. a quantia de € 1.800,00 a título de dano não patrimonial;”

Para tanto alegou ser à data de 2004 cliente do banco R.; em outubro de 2004 o gestor da agência disse ao A. marido, que tinha uma aplicação em tudo idêntica a um depósito a prazo, com capital garantido pelo BPN e rentabilidade assegurada – obrigações SLN Rendimento Mais 2004; o A. autorizou a colocação de € 50.000,00 em tais obrigações por lhe ter sido dito e assegurado pelo referido funcionário do banco R. que o capital era garantido pelo Banco Réu, com juros semestrais e que poderia levantar o capital e respetivos juros quando assim o entendesse, bastando avisar a agência com a antecedência de três dias; e estava convicto de que colocava o seu dinheiro numa aplicação segura e com as características de um depósito a prazo, ou seja num produto com risco exclusivamente Banco. O R. não restituiu ao A. o montante investido nem tem pago os juros acordados.

O banco réu contestou impugnando o alegado pelos AA., contrapondo que o investimento efetuado era seguro e não um investimento em qualquer “produto de risco”; que não estava obrigado a advertir o investidor sobre a hipótese de insolvência do emitente, tal como não estava obrigado a advertir o depositante sobre o risco da sua insolvência quando recebe um DP; que atuou de acordo com a vontade do subscritor e com as instruções pelo mesmo recebidas.

Instruídos os autos foi proferida sentença que julgou a ação parcialmente procedente e, em consequência, condenou o réu a restituir ao autor a quantia de 50.000,00 €, acrescida de juros de mora contabilizados à taxa legal de juro civil desde 28.10.2014 até integral e efetiva restituição”


Inconformada com esta decisão dela interpôs recurso o réu e o Tribunal da Relação veio a julgar a apelação improcedente conformando a decisão recorrida.

A recorrente interpôs revista excecional que foi admitida pela Formação a que alude o nº3 do art. 672 do CPC, concluindo que:

“1. A sentença recorrida conclui erradamente que o Banco-R. prestou informação falsa e omissa ao marida da A. a propósito da venda de Obrigações SLN 2004, por este instrumento financeiro não ser isento de risco – não ser tão seguro quanto um Depósito a Prazo - e por não ter capital garantido!

Todavia,

2. O único risco que percebemos existir na emissão obrigacionista em causa é o relativo ao cumprimento da obrigação de reembolso por não ser um instrumento sujeito a negociação em mercado regulamentado, não estaria sujeito à volatilidade dos mercados ou a diferenças de cotação resultantes do valor das diferentes ordens para aquisição e venda dos títulos, e por não ser previsível qualquer risco de liquidez porquanto a procura superava em muito a oferta destes produtos – note-se que esta era a segunda emissão da SLN (depois da emissão de 2004) e à data já haveria outras duas emissões do próprio Banco, e em todas elas a procura superou, por muito a oferta – o que se manteve sempre mesmo depois do período de subscrição no chamado mercado de balcão!

3. Resta, pois, o chamado risco de remuneração e de crédito correspondente à possibilidade de incumprimento da prestação principal da entidade emitente! Ou seja, corresponde ao chamado RISCO GERAL DE INCUMPRIMENTO!

4. A possibilidade deste incumprimento não corresponde a qualquer especial risco inerente ao modo de funcionamento endógeno do instrumento financeiro... antes corresponde ao normal e universal risco comum a todos, repete-se... a todos, os contratos!

5. E este não é objecto de qualquer tipo de obrigatoriedade de advertência ou informação especial. Impor a advertência de um tal risco geral importaria necessariamente o reconhecimento de uma capitis diminutio dos clientes, uma quase inimputabilidade ou incapacidade, impondo ao intermediário financeiro a obrigação de informação de uma evidência.

Por outro lado,

6. Do incumprimento da obrigação de reembolso da entidade emitente, em 2016, não podemos, sem mais, retirar que esse o risco dessa eventualidade fosse relevante – sequer concebível, à exceção de ser uma mera hipótese académica -, em 2004, dez anos antes! Ou seja, o juízo de avaliação do risco, da sua existência e relevância, tem ele próprio de ser um juízo de prognose póstuma!

7. A verificação do evento em 2016 não pode conduzir por si só à sua previsibilidade ou probabilidade, ou sequer possibilidade efetiva, em 2004! Pelo contrário,

8. Em 2004, a SLN era titular de 100% do capital social do Banco-R., como era dona de várias outras dezenas de empresas nas mais diversificadas áreas de negócio!

9. O risco associado ao reembolso das Obrigações correspondia, então ao risco de solvabilidade da SLN, e sendo esta totalmente dominante do Banco-R., então este risco de solvência, corresponderia ao risco de solvabilidade do próprio Banco – risco de reembolso de um Depósito a Prazo!

10. Em suma, a segurança da subscrição de Obrigações emitidas pela SLN seria correspondente à segurança de um Depósito a Prazo no BPN.

11. E não se invoque à discussão o Fundo de Garantia de Depósitos (FGD)como critério de atribuição de segurança aos ditos depósitos a prazo.

12. É que se por um lado, à data, aquele FGD apenas cobria 25.000,00€ por conta,

13. Por outro, nenhum cliente, e o A. certamente, efectuava os seus depósitos fiado na garantia do FGD - ou seja, em termos causais a existência do dito FGD seria irrelevante na cadeia de decisões do falecido marido da A. para a contratação do investimento que decidiu fazer.

14. Ou seja, a segurança que o A., e todos os clientes, associavam a um DP resumia-se à confiança exatamente na solvabilidade do Banco, e nada mais!

15. Era este mesmo pressuposto que assegurava o bom reembolso das Obrigações – razão por que dizer que o produto não tinha risco naturalmente não pode senão ser entendido como a atribuição de um risco mínimo, equivalente ao de um DP.

16. A afirmação de que a aplicação era isenta de risco, se levada literalmente, apenas poderia prevalecer no já referido caso de se resumir o declaratário não a uma pessoa financeiramente inapta, mas juridicamente incapaz! É que essa afirmação implicaria que alguém acreditasse – como se fosse possível! – que seria possível estabelecer uma qualquer relação jurídica sem risco.

17. O risco BPN ou risco SLN, da perspetiva da insolvência era também equivalente! Tanto assim que os pressupostos de nacionalização do Banco, no Dec. Lei 62-A/2008 d e11 de novembro são exatamente os previstos para insolvência do Banco - a SLN insolveu, é certo... mas o Banco também! E antes, muito antes!

18. A menção do dito risco praticamente inexistente, como de resto do capital garantido, não pode senão ser entendida no contexto da atribuição de uma segurança acima da média ao produto, de confiança no normal cumprimento de todas as obrigações da emitente, sustentada em factos e juízo objetivamente razoáveis e previsíveis – neste sentido vejam-se os dois acórdãos do STJ já citados, de 6 de Junho de 2013 e de 12 de Janeiro de 2017,

19. No caso, inclusivamente, reforçada pelo facto de a sociedade emitente ser a sociedade-mãe do Banco.

20. A expressão capital garantido mais não é do que a descrição de uma característica técnica do produto – corresponde à garantia de que o valor de reembolso, no vencimento, é feito pelo valor nominal do título e correspondente ao respetivo valor de subscrição! Ou seja, o valor do capital investido é garantido - veja-se a este propósito o Plano de Formação Financeira em site do Conselho de Supervisores Portugueses.

21. Vale isto por dizer que, ainda que se entenda que esta expressão mereceria uma densificação ou explicação aos clientes, a fim de evitar qualquer confusão, o certo é que, transmitindo uma característica técnica, não se poderá firmar que o banco, ou os seus colaboradores agiram com culpa, e muito menos grave.

Acresce que,

22. Se é verdade que a informação tem que ser completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita (art. 7º CdVM), não é menos verdade que o cumprimento desse dever de transmissão da informação não se compadece com qualquer conceptologia idílica e de delimitação difusa quanto ao seu inadimplemento, sendo que o CdVM estabelece objetiva e precisamente qual a informação que tem de ser prestada quanto a cada um dos contratos de intermediação financeira e até – em alguns casos –, quanto aos instrumentos financeiros objeto dessa intermediação.

23. A menção do artº 312 nº 1 al. e) do CdVM aos “riscos especiais envolvidos nas operações a realizar” refere-se claramente ao negócio de intermediação, ao dito negócio de cobertura, sob pena de redundância da al. d) da mesma disposição – essa sim referente aos instrumentos financeiros envolvidos nos serviços de intermediação.

24. A alusão que a lei faz quanto ao risco de perda da totalidade do investimento está afirmada em função das características do investimento. Aliás como também o denota a necessidade de informação acerca da volatilidade do preço do instrumento financeiro, igualmente prescrita na alínea b) deste preceito e com a qual este risco de perda está umbilicalmente ligado. Trata-se, portanto, de um risco que tem que ser endógeno e próprio do mecanismo do instrumento financeiro e não motivado por qualquer fator extrínseco ao mesmo.

25. Ora, o investimento efetuado foi feito em Obrigações, não sujeitas a qualquer volatilidade, sendo o respetivo retorno do investimento certo no final do prazo, por reembolso do capital investido ao valor nominal do título (de “capital garantido”), acrescido da respetiva rentabilidade. Logo, não há necessidade de que a advertência do risco de perda da totalidade do investimento seja feita, porque a mesma não é aplicável ao caso!

26. Todo e qualquer investimento em todo e qualquer instrumento financeiro acarreta a possibilidade inerente de perda de total de capital… basta verificar-se, com neste caso, um incumprimento! Aliás, qualquer contrato, seja qual for a sua natureza, apenas um de dois destinos: o cumprimento ou incumprimento.

27. O risco de incumprimento não constitui qualquer risco especial da operação!

28. A ser alguma coisa, o risco de incumprimento de uma obrigação de compra é um RISCO GERAL de qualquer obrigação!

29. Não se pode confundir a advertência sobre o risco de perda do investimento com a análise de qualquer qualidade e robustez (ou falta dela) do emitente do título!

30. É que a este respeito, impõem-se clarificar que, em lado algum da lei resulta estar o intermediário financeiro obrigado a analisar ou avaliar a robustez financeira do emitente na atividade de intermediação financeira de receção e transmissão de ordens.

31. E também em lado nenhum da lei resulta a obrigação de prevenir o investidor acerca das hipóteses de incumprimento das obrigações assumidas pelo emitente do instrumento financeiro ou até da probabilidade de insolvência do mesmo!

32. O Banco-R. forneceu ao A. todas as informações adequadas e necessárias à compreensão do produto financeiro em causa.

33. O risco de insolvência da entidade emitente é sempre e invariavelmente inerente a qualquer instrumento financeiro e a qualquer contrato.

34. Não existia, no caso, qualquer especial risco de incumprimento de que o Banco-R. devesse ter advertido o A.

35. A douta decisão recorrida violou, por errónea interpretação o disposto no artº 314º e 312º do CdVM.

Por outro lado,

36. O nexo causal sujeito a prova será necessariamente entre um concreto ilícito - uma concreta omissão ou falta de explicação de uma determinada informação - e o dano!

37. Todavia, além da demonstração da causalidade “mecânica” entre o imputado facto ilícito e o dano, importaria a demonstração de que aquele mesmo ilícito é, em geral, adequado à produção daquele dano - o que, neste caso ficou por demonstrar!

38. Pelo contrário, dos factos provados, e concretamente das relações de domínio entre a SLN e o Réu, resulta uma segurança, uma garantia de natureza patrimonial àquele bom reembolso.

39. No caso, o Banco terá prestado um serviço de receção e transmissão de ordens por conta de terceiros, pelo qual terá recebido ordem de subscrição de Obrigações e a terá encaminhado por forma a garantir a efetiva titularidade pretendida pelos seus clientes. O Banco Recorrido nada tem que ver com a emissão de títulos propriamente dita, mas apenas com a intermediação financeira que permitiu a respetiva subscrição! Já o dano dos Recorrentes corresponde à falta de reembolso, na respetiva data de vencimento, daquela emissão de obrigações, por parte da SLN.

40. Estamos, portanto, perante duas relações contratuais distintas - uma em que o Banco teria praticado o suposto ilícito, e outra onde o A. sofreu o seu dano!

41. A formulação negativa da teoria da causalidade adequada faz sentido apenas e só para o incumprimento da prestação principal de um contrato - em que a causalidade entre o ilícito e o dano resulta da identidade entre o dano e a prestação incumprida. Neste cenário percebe-se que se diga que apenas a verificação de uma circunstância excecional afastaria a relação causal. Todavia, o mesmo não se diga no caso do incumprimento de uma prestação acessória, como é o dever de informação num serviço de intermediação financeira de receção de ordens, e muito menos no âmbito de uma relação contratual complexa em que o incumprimento de uma obrigação acessória de um contrato (de intermediação financeira) pode implicar um dano no âmbito de outro contrato (da emissão obrigacionista).

42. Ou seja, a determinação de causalidade adequada depende, outrossim, da verificação de um nexo causal mecânico concreto entre o facto ilícito e o dano, por um lado, mas simultaneamente, de um nexo de adequação abstrato entre os mesmos eventos.

43. Não se vislumbram no elenco de factos provados, quaisquer factos capazes de determinar qualquer adequação à produção do dano pela conduta do R. - ao invés, genericamente, sempre se dir-se-á que as relações de domínio societárias entre a SLN e o R. eram, efetivamente, de molde a criar uma fundada e acrescida confiança na segurança das obrigações, e que por isso mesmo um normal investidor não teria problemas em subscrever as mesmas.

Acresce que,

44. Não resulta, pois, dos factos provados qualquer base factual que sustente a verificação de um nexo causal!

Por fim, e em bom rigor,

45. A origem do dano do A reside na incapacidade da SLN em solver as suas obrigações, circunstância a que o Banco Recorrente é alheio!

46. Não podemos, por tudo o que vimos de expor, deixar de concluir que não apenas o Banco-R. não praticou qualquer ato ilícito, como mesmo que o houvesse praticado, tal qual identificado pelas instâncias, e ele nunca seria causal relativamente ao dano alegado.

47. Além das normas já referenciadas, incorreu a decisão recorrida em violação do disposto no art.º 563º do Código Civil.

Termos em que se conclui pela procedência do presente recurso, e, em consequência, pela revogação da douta decisão recorrida e sua substituição por outra que absolva o Réu do pedido.”


Recebido o recurso foi a instância suspensa com fundamento em estar pendente uniformização de jurisprudência sobre a responsabilidade dos intermediários financeiros que veio a ser deliberada por acórdão uniformizador transitado em julgado.


Nas contra alegações o recorrido defende a improcedência do recurso e a confirmação da decisão recorrida.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.

… … 

Fundamentação

Está provada a seguinte matéria de facto

“1. O Banco réu resultou da fusão por incorporação das sociedades comerciais anónimas “BPN - Banco Português de Negócios, S.A.” (sociedade incorporante) e “Banco BIC Português, S.A.” (sociedade incorporada), em resultado do que aquele passou a adotar a sua atual denominação social “Banco BIC Português, S.A.”.

2. O autor era cliente do réu (BPN), na sua agência de ..., ..., com a conta à ordem n.º ...04, onde movimentava parte dos seus dinheiros, realizava pagamentos e efetuava poupanças.

3. Em outubro de 2004, o funcionário do Banco réu da agência ..., BB (gestor da sua conta), contactou o autor, dizendo-lhe que tinha uma aplicação idêntica a um depósito a prazo, com capital garantido pelo “BPN” e rentabilidade assegurada.

4. Os funcionários do Banco réu que, na sequência do contacto a que se alude em 3., lhe apresentaram o produto, sabiam que o autor não possuía qualificações ou formação técnica que lhe permitissem, à data, conhecer os concretos riscos inerentes aos diversos produtos financeiros, a não ser que lhos explicassem.

5. O autor tinha um perfil conservador no que respeitava ao investimento do seu dinheiro, sendo que, até essa data, aplicara-o, designadamente, em depósitos a prazo.

6. O dinheiro do autor - € 50.000,00 - viria a ser colocado numa obrigação “SLN Rendimento Mais 2004”, sem que o autor soubesse, em concreto, em que consistia tal produto, desconhecendo inclusivamente quem era a “SLN”.

7. O que motivou a sua autorização para tal foi o facto de lhe ter sido dito e assegurado pelos funcionários do Banco réu que o capital era garantido pelo Banco réu, com juros semestrais.

8. O autor atuou convicto de que estava a colocar o seu dinheiro numa aplicação segura, ou seja, num produto com risco exclusivamente do Banco.

9. Se o autor tivesse percebido que, com a assinatura do “Boletim de Subscrição” a que se alude em 20., o qual lhe foi apresentado pelos funcionários do Banco réu, estava a subscrever um produto em que o capital não era garantido pelo “BPN”, não o teria assinado.

10. Nunca foi intenção do autor investir em produtos de risco, como era do conhecimento do gestor de conta e funcionários do Banco réu.

11. O autor sempre esteve convicto de que o réu lhe restituiria o capital e os juros, quando os solicitasse.

12. O Banco réu, através dos seus funcionários, sempre assegurou que as aplicações em causa eram garantidas pelo Banco.

13. O autor ficou convicto da segurança da aplicação em causa, cujos juros foram sendo semestralmente pagos, o que deu tranquilidade ao autor e nunca o alertou para qualquer irregularidade.

14. Tal segurança manteve-se até ao momento em que o autor tentou resgatar o seu dinheiro, acrescido dos respetivos juros.

15. Aí, o Banco réu atribui a responsabilidade por tal pagamento à “SLN – Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, S.A.” (agora “Galilei, SGPS, S.A.”)

16. O autor não sabia quem era a “SLN – Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, S.A.”.

17. A qualquer conta a prazo é habitual os bancos atribuírem uma denominação técnica.

18. Nunca os funcionários do Banco réu leram ou explicaram ao autor em que consistia adquirir obrigações “SLN Rendimento Mais 2004” e quais as suas implicações.

19. Nem a “SLN” nem o Banco réu restituíram ao autor os 50.000,00 € a que se alude em 3.

20. O autor assinou o documento denominado “SLN RENDIMENTO MAIS 2004 Boletim de Subscrição”, com data de 25.10.2004, junto por cópia a fls. 85, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, do qual consta, sob a menção de “Emissão de Obrigações Subordinadas”:

“NATUREZA DA EMISSÃO

Emissão de até 1.000 obrigações subordinadas, ao portador e sob a forma escritural, com o valor nominal de € 50.000,00 cada uma, oferecidas diretamente ao público, ao preço unitário igual ao valor nominal. A emissão será efetuada por uma ou mais séries de acordo com as necessidades do emitente e a procura dos investidores. Não sendo totalmente subscrita, a presente emissão de obrigações ficará limitada às subscrições recolhidas.

MÍNIMO DE SUBSCRIÇÃO

€ 50.000,00 (1obrigação).

PERÍODO DE SUBSCRIÇÃO

De 11 a 22 de Outubro de 2004.

DATA DE LIQUIDAÇÃO FINANCEIRA

25 de Outubro de 2004.

PRAZO E REEMBOLSO

O prazo de emissão é de 10 anos, sendo o reembolso do capital efetuado em 27 de Outubro de 2014. O reembolso antecipado da emissão só é possível por iniciativa da SLN – Sociedade Lusa de negócios, SGPS, S.A., a partir do 5.º ano e sujeito a acordo prévio do Banco de Portugal.

REMUNERAÇÃO

Juros pagos semestral e postecipadamente, às seguintes taxas:

CUPÕES TAXA ANUAL NOMINAL BRUTA

1.ºs dez semestres 4,5% *

Restantes 10 Semestres Euribor 6 Meses + 1,75%.

* Taxa Anual Efetiva Líquida: 3,632%.”

21. Apesar de o réu ter colhido a assinatura do autor no documento identificado em 20., o qual foi preenchido pelo funcionário do Banco réu, o seu teor não foi lido e explicado ao autor.

22. Foi entregue ao autor cópia do documento identificado em 20.

23. Nunca qualquer contrato foi lido e explicado ao autor, nem lhe foi entregue cópia de qualquer outro documento, para além daquele a que se alude em 20., que contivesse cláusulas sobre obrigações subordinadas SLN ou prazos de resolução unilateral pelo autor.

24. O autor já pretendeu levantar o seu dinheiro, sendo que o réu não lhe disponibilizou tal quantia.

25. O réu também não tem procedido ao pagamento dos juros acordados, o que sucede desde data não concretamente apurada.

26. Na própria documentação interna criada, veiculada e distribuída pelo Banco réu aos seus funcionários, este era apresentado como garante da aplicação financeira em causa.

27. Um dos argumentos repetido pelos funcionários da rede de balcões do Banco réu junto dos seus clientes, como sucedeu com o autor, era o de que se tratava de um investimento seguro e que o réu assegurava o reembolso do capital investido, bem como dos juros.

28. As orientações e comunicações internas existentes no Banco réu, que este transmitia aos seus comerciais nos respetivos balcões, consistiam em afirmar a segurança da aplicação financeira em causa, a sua solidez, a boa rentabilidade e, bem assim, que o Banco garantia o capital investido.

29. O Banco réu pretendia que os seus funcionários se empenhassem na colocação deste produto e transmitissem a ideia de que ao mesmo não estavam associados quaisquer riscos quanto ao reembolso do capital e juros, garantindo ele próprio a satisfação de tais encargos.

30. O autor, atento o que se refere em 24., ficou impedido de usar o seu dinheiro como bem entendesse.

31. O receio de não reaver ou de não saber quando irá reaver o seu dinheiro deixa o autor preocupado, angustiado, ansioso e em estado de “stress”.

32. No mês seguinte ao da subscrição do produto “SLN Rendimento Mais 2004”, o autor recebeu por correio o aviso de débito correspondente à subscrição efetuada, bem como recebeu, depois, os avisos de crédito, a cada seis meses, relativos aos juros.

33. Recebeu também e desde então, os vários extratos periódicos onde lhe apareciam essas obrigações.

34. Uma obrigação era, à data a que se alude em 20., um produto conservador, com um risco normalmente reduzido, indexado à solidez financeira da sociedade emitente.

35. A entidade emitente das obrigações “SLN Rendimento Mais 2004” era “mãe” do Banco réu, sendo este um componente da solvabilidade daquela, por ser um dos principais ativos do seu património.

36. O risco de um depósito a prazo no Banco réu, seria, então, semelhante a uma tal subscrição, por o risco da “SLN” ser indexado ao risco do próprio Banco réu.

37. Enquanto na hipótese de incumprimento pelo Banco réu este responde com todo o seu património, na hipótese de incumprimento da “SLN” esta respondia com todo o seu património, onde se inseria a totalidade do capital social do Banco réu e ainda todo o seu demais património.

38. Na data a que se alude em 20., a probabilidade da entidade emitente não cumprir era muito semelhante à do Banco “BPN” não cumprir, tendo em conta a estrutura acionista existente à data.

39. Nesse momento não havia indicação de que a emissão pudesse vir a não ser paga ou qualquer ideia sobre o risco de insolvência do emitente.

40. Ao longo dos anos e até à data da nacionalização parcelar do grupo, foram emitidos e pagos produtos de dívida de empresas do grupo “SLN”.

41. Não era previsível, e como tal nunca poderia ter sido comunicado ao cliente, era que em 2008 aconteceria uma nacionalização parcelar do grupo que veio a dividir o mesmo entre parte financeira e não financeira.

42. O autor sempre foi pessoa cuidadosa e preocupada com o investimento do seu património.

43. O autor já antes havia investido em produtos diferentes dos depósitos a prazo, como é o caso das unidades de participação em fundos de investimentos (em 06.05.2003, 12.12.2003, 16.12.2003, 20.02.2004, 04.08.2004, 20.06.2003, 16.12.2003, em 04.11.2003, 15.12.2003, 16.03.2004, 13.05.2004) e das obrigações “BPN” (em 21.06.2004).

44. No momento da subscrição da obrigação “SLN Rendimento Mais 2004”, o autor foi informado de que a única forma do investidor liquidar este produto de forma unilateral seria transmitindo as suas obrigações a um terceiro interessado, mediante endosso.

45. O que se refere em 1.44. na altura era possível, comum e rápido, uma vez que o produto tinha procura, atenta a sua rentabilidade.”

… …

O tribunal a quo julgou ainda como não provada a seguinte factualidade

1. O que motivou a autorização do autor foi, para além do que se refere em 1.7., o facto de ter sido dito e assegurado pelos funcionários do Banco réu que poderia levantar o capital e respetivos juros quando assim o entendesse, bastando avisar a agência com a antecedência de três dias.

2. O autor julgava que a “SLN” era uma mera denominação de conta a prazo que o Banco réu utilizava para identificação interna.

3. O autor desconhecia (e nem podia conhecer) que tinha adquirido uma aplicação diferente de um depósito a prazo.

4. O dinheiro do autor deveria ter sido aplicado em depósitos a prazo, com capital e juros disponíveis de 6 em 6 meses.

5. As obrigações “SLN Rendimento Mais 2004” tiveram o único propósito de aumento do capital do Banco Réu.

6. A garantia proveniente do Fundo de Garantia de Depósitos era, à data a que se alude em 20., de apenas € 25.000,00.

7. O produto “SLN Rendimento Mais 2004” foi sempre apresentado com a obrigação de entrega do capital e dos juros ser da única e exclusiva responsabilidade da entidade emitente e não da entidade colocadora Banco.

8. No momento da subscrição da obrigação “SLN Rendimento Mais 2004”, o autor foi informado de que as obrigações em causa eram emitidas pela sociedade que detinha o Banco réu, a “SLN - Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, S.A.”, e de que o reembolso antecipado da emissão só era possível por iniciativa da SLN - Sociedade Lusa de Negócios, S.A.” a partir do 5º ano e sujeito a acordo prévio do Banco de Portugal.

9. O réu informou o autor sobre todos os elementos que constavam da “Nota Informativa” do produto “SLN Rendimento Mais 2004”, junta aos autos por cópia a fls. 49 a 65 verso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, a qual se encontrava disponível para consulta pelo mesmo.”

… …

O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das recorrentes, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso, conforme prevenido nos arts. 635º n.º 4 e 639º n.º 1, ex vi, art.º 679º, todos do Código de Processo Civil.

O conhecimento das questões a resolver na presente revista, delimitadas pelas conclusões, remete para decidir se deve ser revogada a decisão recorrida e julgada improcedente a ação, com incidência na inexistência de ilicitude e nexo de causalidade que permita o reconhecimento do direito invocado pelo autor em sede de responsabilidade civil.

… …

Os tribunais foram confrontados com diversas ações semelhantes à presente como efeito colateral da crise financeira que ocorreu em finais de 2007 e que, entre outras consequências, desvendou problemas de solvabilidade de certos grupos empresariais entre os quais se incluiu a instituição financeira ré que acabou por desempenhar também a função de intermediário na colocação dos produtos financeiros discutidos nos autos.

Dessa função de intermediário emergiram diversos litígios que, como o presente, têm num dos polos investidores não qualificados, surgindo na posição de sujeito passivo o R.

Um aspeto a reter é a legislação sobre os valores mobiliários e designadamente sobre a atividade e os deveres dos intermediários financeiros ter sofrido uma importante modificação na sequência da crise financeira de 2007, tendo sido desde logo alteradas as normas legais e os regulamentos (soft law) relacionados com a atividade de intermediação financeira, com especial destaque para o dever de informação perante cada cliente ou investidor.

Ora, na medida em que aquelas alterações legais contenham elementos substancialmente inovadores, designadamente no que se refere ao reforço do dever de informação imposto a intermediários financeiros, apenas podem ser aplicadas a factos posteriores à sua entrada em vigor, atentas as regras gerais sobre a aplicação da lei no tempo.

Na definição do contrato celebrado cumpre identificar o réu como uma instituição de crédito (art.º 3º, al. a) do DL n.º 298/92, de 31 de dezembro - Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, abreviadamente designado por RGICSF) sendo que, nos termos do art.º 4º do RGICSF cabe nas suas atribuições a possibilidade de realizar as seguintes atividades:

“1 - e) Transações, por conta própria ou da clientela, sobre instrumentos do mercado monetário e cambial, instrumentos financeiros a prazo, opções e operações sobre divisas, taxas de juro, mercadorias e valores mobiliários;

f) Participações em emissões e colocações de valores mobiliários e prestação de serviços correlativos;”

Do conjunto destas atividades e no que interessa ao caso dos autos o R. pode fazer transações, por conta própria de valores mobiliários, ou seja pode vender valores mobiliários que lhe pertençam ou de que seja proprietário, mas, também, pode fazer idênticas transações por conta de outrem ou agir apenas como mero intermediário na colocação no mercado de valores mobiliários emitidos por outrem e prestando os correlativos serviços. Para distinguir se a transação, designadamente a venda de valores mobiliários, é feita em nome próprio ou se age apenas como intermediário na colocação desses valores junto do público é necessário que se apure a titularidade dos valores objeto da transação.

O autor subscreveu, junto da agência onde tinha conta, uma obrigação SLN no valor de €50.000,00, porque foi contactado por um funcionário, seu gestor de conta, que lhe apresentou o produto como semelhante a um depósito a prazo com capital garantido pelo “BPN” e rentabilidade assegurada.

O funcionário do banco sabendo que o autor tinha um perfil conservador e que  não possuía qualificações ou formação técnica que lhe permitissem, à data, conhecer os concretos riscos inerentes aos diversos produtos financeiros, a não ser que lhos explicassem obteve a subscrição na obrigação “SLN Rendimento Mais 2004”, sem que o autor soubesse, em concreto, em que consistia tal produto, desconhecendo inclusivamente quem era a SLN, sendo que, se tivesse percebido que, com a assinatura do “Boletim de Subscrição” a que se alude em 20., o qual lhe foi apresentado pelos funcionários do Banco réu, estava a subscrever um produto em que o capital não era garantido pelo “BPN”, não o teria assinado.

Deste resumo da matéria provada resulta sem dúvida que a intervenção do R. na “venda” das obrigações, não foi realizada em nome próprio, enquanto titular das mesmas, mas sim como intermediário financeiro entre o emitente e o destinatário final o “público”, numa operação enquadrada na previsão da al. f) do art.º 4 do RGICSF. Nos termos do disposto no artigo 293º do Código de Valores Mobiliários (CVM), aprovado pelo Decreto-Lei nº 486/99, de 13 de novembro, a qualificação de intermediários financeiros é atribuída a um conjunto de entidades que estejam autorizadas a exercer as atividades de intermediação financeira, sendo uma dessas entidades os Bancos (instituições de créditos) - alínea a) do nº 1.

Essas atividades de intermediação financeira estão reguladas em especial nos artigos 289° e ss. do CVM, onde são classificadas em serviços de investimento em valores mobiliários; serviços auxiliares de investimento e gestão de instituições de investimento coletivo e exercício das funções de depositário dos valores mobiliários sendo que no caso o que releva são os serviços de investimento previstos no artigo 290º do CVM. A intervenção da ré consistiu na aquisição de obrigação na sequência da ordem por parte do autor pelo que dúvidas não subsistem de estarmos perante uma atividade de intermediação de receção e de transmissão de ordens por conta de outrem, prevista expressamente na citada alínea a) do nº 1 do artigo 290° do CVM. Como assim, é forçoso concluir que estamos perante um contrato de intermediação financeira e não perante um contrato de compra e venda, isto sem prejuízo de se reconhecer que numa operação de colocação de obrigações junto de instituições de crédito, a intermediação financeira, tem normalmente como objeto uma compra e venda. Só que essa compra e venda tem como sujeitos o investidor e o emitente e não o banco que faz a intermediação - Engrácia Antunes, in “Direito dos Contratos Comerciais”, Almedina, págs. 572/573, afirma: “Designamos genericamente por contratos financeiros os negócios jurídicos relativos ao mercado de capitais: entre eles, destacam-se os contratos de intermediação financeira e os contratos derivados…Denominam-se contratos de intermediação financeira os negócios jurídicos celebrados entre um intermediário financeiro e um cliente (investidor) relativos à prestação de atividades de intermediação financeira”.

Assente que o contrato celebrado entre o autor e o R. é um contrato de intermediação financeira, importa averiguar se a atuação do R., espelhada na factualidade provada, violou as regras legais aplicáveis e se incorre em responsabilidade civil.

A prova fornece como vimos certificado que  um funcionário da ré, gestor de conta do autor, propôs a este a aquisição de uma Obrigação Rendimento Mais - SLN 2004, com a informação de que tal lhe traria uma maior rentabilidade com a mesma segurança que um depósito a prazo, com igual garantia de capital e reembolso garantido pelo banco. Perante o que lhe estava a ser proposto (maior rendimento na aplicação do seu dinheiro) e dadas as garantias que lhe estavam a ser dadas (segurança do produto como se fosse um depósito a prazo), a autor anuiu e aceitou adquirir tal produto sabendo-se que se tivesse percebido que, com a assinatura do “Boletim de Subscrição” estava a subscrever um produto em que o capital não era garantido pelo “BPN”, não o teria assinado.

As questões a abordar são as de saber se o pressuposto da ilicitude se encontra demonstrado por referência aos factos enunciados, por incumprimento do dever de informação, assim como se o nexo de causalidade entre a atuação do BPN, SA, e o evento traduzido na subscrição da obrigação não subordinada cujo capital não foi devolvido pela SLN.

A base jurídica essencial para a resolução do presente caso é integrada pelas normas do Cód. de Valores Mobiliários em vigor na data em que a operação financeira foi realizada e desse regime sobressai o que então preceituava o art. 314º do CVM que, em termos autónomos relativamente ao que consta das regras gerais do Código Civil, prescrevia para os intermediários financeiros a obrigação de indemnizar os danos causados a qualquer pessoa em consequência da violação de deveres respeitantes ao exercício da sua atividade impostos por lei ou por regulamento emanado de autoridade pública, nele se enunciando ainda a presunção de culpa quando o dano fosse causado no âmbito de relações contratuais, designadamente quando fosse originado pela violação de deveres de informação.

A exigência da informação no negócio e no contrato é comum aos regimes jurídicos do erro, do dolo, da usura e da boa-fé pré-contratual (artigos 227º, 247º a 254º e 282º e 485º do Código Civil) e o pilar do regime do dever de informação está estabelecido no artigo 227º que obriga as partes a agirem de acordo com a boa-fé, tanto nos preliminares como na formação do contrato.

A responsabilidade civil do intermediário financeiro, por violação de deveres respeitantes ao exercício da sua atividade, impostos por lei ou regulamento emanado de autoridade pública, está especificamente prevista no do Código dos Valores Mobiliários (acentuamos a aplicabilidade ao caso em juízo do Decreto-Lei n.º 486/99, de 13 de novembro, com sucessivas alterações até ao Decreto-Lei nº 52/2006, de 15 de março, atenta a data da subscrição do produto financeiro ajuizado.

De acordo com a disciplina consagrada no Código dos Valores Mobiliários os intermediários financeiros devem orientar a sua atividade no sentido da proteção dos legítimos interesses dos seus clientes e da eficiência do mercado e, nesse relacionamento, devem observar os ditames da boa-fé, de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência. A obrigação de informação está inscrita no Código dos Valores Mobiliários e o intermediário financeiro deve prestar, relativamente aos serviços que ofereça, que lhe sejam solicitados ou que efetivamente preste, todas as informações necessárias para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada. E é indiscutível que a qualidade da informação deve ser completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita (art. art. 7º, nº 1).

O critério da diligência é acolhido no artigo 75º do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeira e nesta dimensão, confrontando a evolução legislativa, a alteração normativa não incorpora matéria inovatória que não estivesse provisionada na esfera de proteção das regras atinentes à responsabilidade contratual e dos princípios gerais do direito positivo no domínio do cumprimento obrigacional. Estamos num território em que as declarações negociais não podem ser desviadas do sentido da ordem jurídica na sua globalidade, isto é, apesar da legislação específica a que estão sujeitas as operações e os sujeitos bancários, as instituições financeiras e de crédito, estão vinculadas às regras de direito positivo relativas à boa-fé e à lealdade e transparência contratuais sediadas no Código Civil. E, por isso, também no domínio da legislação do pretérito, os funcionários bancários dotados de poderes de direção e representativos estavam vinculados a agir com a diligência de um gestor criterioso e ordenado, de acordo com o princípio da repartição de riscos e da segurança das aplicações e ter em conta o interesse dos depositantes, dos investidores, dos demais credores e de todos os clientes em geral art.º 75º do RGICSF. “Efetivamente, apesar da alteração legislativa entretanto ocorrida, como resulta da comparação entre o regime inicial e a disciplina agora vigente, por força dos princípios gerais conformadores do cumprimento obrigacional e da cláusula geral da boa-fé, torna-se imperioso concluir que, desde sempre, a lisura contratual e as regras hermenêuticas no domínio da responsabilidade contratual impunham – e impõem – que o intermediário financeiro seja diligente na prestação de informações que permitam ao cliente ficar consciente dos riscos envolvidos em qualquer operação financeira realizada.” Ac. STJ de 25-10-2018 no proc. 2581/16.8T8LRA.C2.S1, in dgsi.pt.

Neste contexto obrigacional não tem sentido de ponderação pretender configurar qualquer tensão de interesses antagónicos no âmbito da qual se pretenda configurar de um lado a entidade bancária movida pelo desígnio de convencimento dos particulares no sentido de a todo o custo obter destes a subscrição e, do lado oposto, os subscritores com um dever de cuidado de não se deixarem convencer das investidas de sugestão por parte do banco. Ainda que, os desenvolvimentos de futuro possam ter criado, a posteriori, uma possibilidade interpretativa que faça resvalar o momento fundador da subscrição para uma figuração de enredo de enganos, impõe-se preservar o equilíbrio da análise, dento dos exatos limites da axiologia normativa servida pela subsunção dos factos fixados como provados. E com esta advertência, certificamos que a existência de deveres informativos visa essencialmente proteger os investidores tendo este princípio nuclear subjacente a defesa do interesse público, a segurança nos mercados e a igualdade entre os vários agentes de mercado - cfr. Sofia Nascimento Rodrigues, A proteção dos investidores em Valores Mobiliários, Almedina, Coimbra 2001, pág. 23 e seguintes - razão para que toda e qualquer avaliação da responsabilidade contratual não possa ser apartada desta ideia.

Como já se decidiu em matéria igual, “no domínio do direito bancário, a relação entre o Banco e o cliente é uma relação particular, em que as partes são levadas a confiar uma na outra. Sobretudo, o sujeito que se encontra na posição de cliente não profissional, e que não tem formação nem experiência na área financeira, baixa as suas defesas naturais por conferir à instituição bancária uma total competência para cuidar dos seus investimentos, depositando nela uma especial confiança, tornando-se, por isso, ainda mais vulnerável, sobretudo, se as primeiras aplicações produziram rendimentos e ele é assim induzido a confiar ainda mais no produto. Gera-se assim uma situação em que os envolvidos descuram a preocupação de obter informações, pelos seus próprios meios. Esta realidade humana deve ser tutelada pelo Direito e, por isso, se cria uma situação que dá azo a obrigações específicas de informar a cargo do Banco, fruto de responsabilidade obrigacional, no caso de inobservância. É uma relação de clientela” – vd. ac. STJ de 17/0372016, in www.dgsi.pt. Também Calvão da Silva sublinha que “a relação de clientela é uma relação obrigacional complexa e duradoura, iniciada nas negociações de um primeiro contrato e desenvolvida continuamente por subsequentes e repetidas ou renovadas operações de negócios firmadas pelas partes, muitas das quais novos contratos, em que, a par de prestações primárias (ou secundárias) surgirão obrigações acessórias de cuidado ou deveres de proteção cominados por acordo dos contraentes, pela lei ou pela boa-fé, para satisfação do interesse do credor. A relação de clientela não é um (único) contrato geral, mas uma relação contínua e duradouro de negócios assentem ligações especiais de confiança e lealdade mútua das partes, cuja violação na negociação conclusão, execução ou pós-extinção de uma operação financeira acarreta responsabilidade contratual”in Direito Bancário, Almedina, Coimbra 2002, pág. 335. E em igual abono Paulo Câmara refere igualmente que “neste domínio é essencial garantir a emissão de uma declaração negocial especialmente qualificada, porque devidamente esclarecida e fundamentada, sendo ainda instrumental do (também) dever do intermediário de adequação do produto ou do serviço de investimento ao concreto perfil do cliente.”  - in Manual de Direito dos Valores Mobiliários, Almedina, 2ª edição, Coimbra 2011, pág. 691/3.

Esta exposição de geral princípio necessita, no entanto, ser temperada pelo cuidado que deve merecer o contexto próprio, a natureza antes indicada das operações em questão e, sobretudo, percebendo o momento fundador dessas mesmas operações. Em formulação simples, não pode ter-se como certo por presumido que a atividade bancária é complexa e portadora de circunvalações técnicas e semânticas de difícil compreensão, para criar, a partir de uma tal presunção tornada absoluta, um único padrão de dever de informação segundo o qual em qualquer circunstância e a qualquer pessoa, tudo deverá ser explicado, antecipando o agente bancário todas as questões que em seu entender e critério não são facilmente compreensíveis pelo cliente mesmo que em concreto o estejam a ser, antecipando uma literacia bancária que o transforme a ele, funcionário, num verdadeiro mandatário do cliente. Em verdade, a razoabilidade em que se move a boa-fé nas relações contratuais é moldada pela natureza das operações e dos comportamentos, e desta ideia decorre, no caso da atividade bancária, que se tenha por avisado definir e perceber se as informações foram, no caso concreto, “recomendação de investimento, conselho ou sugestão, elementos fundamentais para a criação de uma base de confiança do cliente que justifique a responsabilidade do intermediário financeiro nos termos em que a mesma veio decidida” Vd. ac. STJ de 11-7-2019 no proc. 901/17.7T8VRL.G2.S1, in dgsi.pt.

A importância da identificação naturalística (através da análise dos factos concretos) do processo de criação da decisão de realizar a subscrição, no quadro dos deveres de informação, é evidenciada por Gonçalo André Castilho dos Santos, quando adverte para que “são precisamente as avaliações e recomendações prestadas pelos intermediários financeiros que habitualmente motivam os investidores a fundamentar a sua decisão inicial de investimento ou a modificar uma decisão anterior. (…) A crescente complexidade dos serviços e dos produtos financeiros não só justifica uma gradual sofisticação da informação que tenha de vir a ser recolhida e tratada para efeitos de formulação de juízos sobre a qualidade e quantidade dos investimentos em mercado, como também implica, em termos exponenciais, que os custos e riscos envolvidos nessa operação sejam proibitivos para a esmagadora maioria dos investidores, em geral, e dos clientes, em particular. Esta envolvente repercute-se numa especial posição de confiança e dependência do cliente face ao profissional do mercado que, enquanto intermediário financeiro, assume funções significativas na gestão do património daquele” - in A Responsabilidade Civil do Intermediário Financeiro Perante o Cliente, Almedina, 2008, pág. 135. Neste expresso sentido, a informação a prestar por um intermediário financeiro a um seu cliente tem “patamares de intensidade, dependentes do tipo de serviço prestado pelo intermediário: se é este intermediário quem recomenda um investimento, os deveres de informação são especialmente intensos; se o intermediário presta um serviço de “balcão” do tipo de recolha de subscrições de produtos financeiros, abertura de conta de valores mobiliários ou sua movimentação, a intensidade é outra. Em qualquer caso, no entanto, variando a intensidade e o tipo de detalhe informativo, não varia a veracidade da informação e demais características que lhe estão associadas.” Vd. ac. STJ de 11-7-2019 no proc. 901/17.7T8VRL.G2.S1, in dgsi.pt.

É esta a ideia comum a toda a realidade dos valores mobiliários regulada pelo CVM (que resulta do seu art. 7º, nº 1), a necessidade de ser fornecida em todas as fases informação que, sendo suscetível de influenciar as decisões dos investidores, seja completa, verdadeira, atual, clara objetiva e lícita, devendo os intermediários financeiros agir de acordo com os princípios orientadores dessa atividade que, na ocasião, estavam enunciados no art. 304. Já então se estabelecia uma divisão entre investidores qualificados (art. 30º) e não qualificados, com reflexos designadamente no nível da informação que deveria ser prestada (arts. 321º e 323º). Sobrelevando a “proteção dos legítimos interesses dos seus clientes e da eficiência do mercado”, previa-se ainda a necessidade de serem observadas as regras da boa-fé e de serem adotados elevados padrões de diligência, lealdade e transparência (art. 304º, nº 2), devendo ser evitados ou reduzidos ao mínimo os conflitos de interesses (art. 309º, nº 1) e devendo ser assegurado aos clientes um tratamento transparente e equitativo (nº 2).

Do campo regulamentar ressaltava o que constava do art. 39º do Reg. CMVM nº 12/2000 que: “1. Antes de iniciar a prestação de um serviço, o intermediário financeiro:

a) Fornece ao investidor informação adequada sobre a natureza, os riscos e as implicações da operação ou do serviço em causa, cujo conhecimento seja necessário para a tomada de decisão de investimento ou de desinvestimento, tendo em conta a natureza do serviço prestado e o conhecimento e a experiência do investidor em causa;

b) Entrega ao investidor documento sobre os riscos gerais do investimento em valores mobiliários ou noutros instrumentos financeiros;

c) Fornece ao investidor informação específica e detalhada sobre o risco envolvido, quando os produtos ou serviços envolvam risco de liquidez, risco de crédito ou risco de mercado; …”.

Ademais, sendo o BPN uma instituição financeira, o art. 77º, nº 1, do RGICSF, aprovado pelo DL nº 298/92, de 31-12, na vertente da intermediação financeira, dispunha ainda que “devem informar com clareza os clientes sobre … os elementos caracterizadores dos produtos oferecidos …”.

Como refere Castilho dos Santos, no cumprimento dos deveres que recaem sobre o intermediário financeiro estes devem ter em consideração a proteção dos interesses legítimos dos clientes, indagando sobre a sua situação financeira e experiência no que respeita ao tipo específico de instrumento financeiro ou serviço oferecido ou procurado, com observância dos ditames da boa-fé, de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência – op. cit p. 76. Ou como defende Sofia Nascimento Rodrigues “a inversão da proporcionalidade entre a informação a prestar e o grau de conhecimento do investidor cria, na esfera do intermediário financeiro, um dever de conhecimento do cliente (know your client rule) e traduz, uma vez mais, a necessidade de tratamento diferenciado entre investidores” - op. cit. p. 46.

A respeito dos níveis de informação, é insofismável que o facto de a instituição bancária exercer também a atividade de intermediação financeira lhe impunha um elevado grau de empenhamento que pudesse compensar o menor grau de experiência de investidores não profissionais, como era o autor. Ainda assim, não seria razoável pensar que por essa via se eliminaria por completo a assimetria informativa (de que trata Margarida de Almeida Azevedo, em A Responsabilidade Civil por Prospeto no Direito dos Valores Mobiliários, p. 137), tanto mais que o BPN era substancialmente um canal através do qual o “Grupo SLN” desenvolvia a sua estratégia de angariação de fundos para as diversas empresas que o integravam. Para que a R. possa ser responsabilizada pelos prejuízos que advieram para a autora, necessário é que, atento o disposto no art. 314º do CVM, esteja provada a violação de deveres respeitantes ao exercício da sua atividade impostos pela lei ou por regulamento.

Prescrevendo o art. 304º do CVM que os intermediários financeiros deveriam orientar a sua atividade no sentido da proteção dos legítimos interesses dos seus clientes, devendo observar os ditames da boa-fé com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência e posto que se presuma a culpa no âmbito das relações contratuais, tal não afasta o pressuposto prévio da demonstração da ilicitude que recai sobre aquele que invoca o direito de indemnização e que, em concreto, se poderia traduzir na violação daqueles deveres, máxime do dever de informação, com função causal relativamente aos prejuízos.

No caso em decisão não podendo ser descurado o dever de diligência de cada indivíduo na procura da informação que permita tomar uma decisão conscienciosa (em vez de se ater apenas em alguns dos elementos, orientado unicamente pela perspetiva de obtenção dos lucros, sem atenção aos riscos), sobressai o facto de o autor ter sido interpelado por um funcionário do BPN que lhe sugeriu a aquisição de um produto diferente e, mais do que isso, um produto que o autor desconhecia, sem que o mesmo funcionário lhe tivesse prestado a informação básica associada à natureza do produto e aos riscos que envolvia, por comparação com a natureza e o risco de um produto tradicional como é o depósito a prazo, iludindo até que aquele produto era do banco quando o não era. A matéria de facto revela a apontada iliteracia financeira do autor, no entanto, não teria efeitos negativos se não tivesse sido conduzido a subscrever um investimento diverso daqueles sobre os quais tinha conhecimentos consolidados (depósito de poupanças na instituição financeira BPN) bem diferente de uma aplicação num produto emitido por uma outra entidade. Neste contexto, o autor era merecedor de esclarecimentos que estabelecessem a diferença entre um depósito a prazo e um empréstimo obrigacionista, seja quanto à identificação do devedor da obrigação de reembolso, seja quanto ao prazo de reembolso, seja ainda quanto à inexistência de qualquer garantia concedida pelo Fundo de Garantia de Depósitos e que naturalmente apenas abarcava os titulares de depósitos bancários e não outros investidores designadamente titulares de obrigações lançadas no âmbito de um empréstimo obrigacionista.

Querendo argumentar-se que a declaração do produto oferecido para subscrição ter características semelhantes a um depósito a prazo, mas com melhor remuneração que os depósitos a prazo, não deixava se ser, à data, uma informação completa e verdadeira e que essa expressão seria a corrente e adequada para explicar ao cliente que se tratava de um produto seguro e que os riscos não divergiam, sobremaneira, dos riscos de um depósito a prazo, não cremos que tal possa sustentar-se. O significado útil da expressão “capital seguro ou garantido” quando referido a uma garantia de depósito, em termos de experiência comum, traduz a ideia de o dinheiro investido ficar seguro, ou melhor, que existe uma garantia que serve para assegurar o reembolso do capital investido. Ora, em termos técnicos e de rigor não se trata de uma expressão avulsa que possa reportar à casuística da saúde do sistema bancário em cada distinto momento permitindo dizer que é de todo improvável, atendendo ao histórico da banca, que possa haver qualquer problema cogitável, por exemplo o de falência da entidade bancária.

A expressão capital seguro e garantido não cremos que possa ter respaldo no argumento segundo o qual, foi a crise financeira do sub prime que se propagou a todo o sistema financeiro ou a rutura financeira do banco que emitiu as obrigações em que a autora investiu que fez colapsar a fiabilidade da informação e que, se assim não fosse, a autora teria muito provavelmente recebido todos os juros pretendidos no período de duração do investimento e, depois, o respetivo capital. Se é verdade que a causa dos danos correspondentes à desvalorização absoluta dos títulos possa ser atribuída a um fator que era estranho à ré - a crise financeira global que deflagrou em 2007 - sem que se possa exigir que o banco pudesse antecipar e comunicar à autora o risco dessa ocorrência, o que temos por decisivo nesta matéria é que tais argumentos aludem à previsibilidade/imprevisibilidade da denominada saúde financeira e não ao que constitui, quanto a nós, o verdadeiro sentido da informação que se pode conter na declaração de o capital estar garantido. Esta garantia, informada da forma absoluta e vital como o foi, isto é, prevalecente em qualquer circunstância, compagina-se unicamente com o a que decorre do Fundo de Garantia de Depósitos regulado por legislação própria - criado em 1992, pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de Dezembro, que aprovou o Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras.

Quando na subscrição de um depósito a prazo e em linguagem técnica bancária se assegura que o capital investido está garantido isso significa que ele beneficia de uma garantia que não se sustenta na simples segurança que a solidez do sistema bancário forneceu ao longo de diversas décadas, mas sim numa obrigação de certeza, dentro dos limites do Fundo de Garantia, os valores investidos nesses depósitos. Por esta razão não deslocamos o sentido a atribuir à garantia da previsão normativa em que a colocamos para a naturalística da saúde que o sistema financeiro possa ou não ter em determinado momento.

Em resumo, o banco réu através dos seus funcionários, não podia esquecer, em qualquer circunstância, que a informação de o capital estar garantido e ser semelhante a um depósito a prazo, correspondendo a uma exigência de técnica e conhecimento financeiro, não era a que pudesse resultar de uma observação da realidade e conclusão de prognose sobre a fiabilidade do sistema financeiro, mas sim a que decorria da consistência e segurança fundadas no ordenamento jurídico aplicável. A garantia do capital contida na informação prestada, segundo a apreciação de um homem médio normal colocado na situação do concreto implicado e no contexto e natureza da operação realizada, dá indicação da segurança de que, em qualquer caso, o capital estaria sempre garantido. O autor era merecedor de esclarecimentos que estabelecessem a diferença entre um depósito a prazo e um empréstimo obrigacionista, seja quanto à identificação do devedor da obrigação de reembolso, seja quanto ao prazo de reembolso, seja ainda quanto à inexistência de qualquer garantia concedida pelo Fundo de Garantia de Depósitos e que naturalmente apenas abarcava os titulares de depósitos bancários e não outros investidores designadamente titulares de obrigações lançadas no âmbito de um empréstimo obrigacionista

Os acórdãos dos tribunais superiores e designadamente deste Supremo Tribunal de Justiça que se encontram acessíveis revelam a este respeito uma variedade de situações que se evidencia, desde logo, no vetor relacionado com o cumprimento dos deveres e com o nível de conhecimento dos clientes relativamente às características de produtos financeiros como as obrigações SLN.

Existem casos em que este Tribunal tem considerado que não foi incumprido o dever de informação - v.g. o Ac. do STJ de 24-1-19, 2406/16, deste mesmo coletivo, o Ac. do STJ de 28-2-19, 2146/16, o Ac. do STJ de 15-1-19, 3831/15, o Ac. do STJ de 19-12-18, 2382/17 ou o Ac. de 19-12-18, 433/11, todos em www.dgsi.pt. A par destes casos, outros existem em que este mesmo Tribunal se confrontou com práticas agressivas, envolvendo clientes sem quaisquer conhecimentos e que foram motivados a subscrever “obrigações subordinadas” como se fossem verdadeiros depósitos bancários, numa quebra flagrante dos deveres de lealdade e de informação. Certos casos deixam visível uma estratégia delineada no sentido de retirar proveito da boa-fé, da credulidade, da ingenuidade ou mesmo da pura ignorância de pessoas que acabaram por subscrever produtos que nunca pretenderam, iludidos por uma falsa associação entre obrigações e depósitos a prazo, sem verdadeira perceção das consequências adversas que potencialmente estavam contidas nas operações.

Assim ocorreu no Ac. do STJ de 10-4-18 no proc. 753/16, em www.dgsi.pt, em que foi assegurado ao investidor que “o retorno do investimento naquele produto financeiro era garantido como se fosse um produto do banco, o que foi razoavelmente entendido, como tão seguro e garantido como um depósito a prazo” e que “nos casos … em que o cliente é induzido a investir pelo Banco, que toma a iniciativa de o contactar, o que revela confiança … qualquer reticência de informação já é violadora do padrão de exigência informativa cometida ao intermediário financeiro”.  Outro caso semelhante ressalta do Ac. do STJ de 17-3-16 no proc. 70/13, www.dgsi.pt, em que, a respeito de “Obrigações CNE”, também do grupo SLN, se provou que, “aquando da subscrição da aplicação o A. foi informado que se tratava de produto com garantia de reembolso idêntica à do próprio Banco, uma vez que a empresa emitente – a CNE, S.A. – era do mesmo grupo empresarial em que o Banco se achava integrado”; “o A. alertou expressamente a gerente da agência, FF, que só investiria aquele dinheiro se o rendimento e a recuperação dos valores aplicados fossem 100% seguros”; “foi-lhe então assegurado por aquela gerente que a aplicação tinha uma rendibilidade anual garantida de 5,553% e que, sendo uma aplicação de uma empresa do grupo, estava assegurado o reembolso do capital e juros, não comportando qualquer risco”.

Também existem semelhanças com os casos apreciados nos Acs. do STJ de 18-9-18, 20403/16; de 7-2-19, 31/17, e no de 19-3-19, 3922/16, todos em www.dgsi.pt., numa situação em que “os AA. eram clientes do banco há mais de 15 anos e têm a 4ª classe; os funcionários do R. sabiam que os AA. nunca tinham investido em produtos diferentes de depósitos a prazo;  os AA. não tinham a intenção de investir; foram os funcionários do R. que seduziram e convenceram os AA. a investir o valor de € 50.000,00 no produto financeiro, iludindo-os quanto à sua natureza e características”.

O caso presente inscreve-se no bloco dos que revelam práticas agressivas, envolvendo um cliente sem conhecimentos e que foi induzido a subscrever uma “obrigação subordinada” como se fosse um produto com características de verdadeiro depósito bancário, numa quebra flagrante dos deveres de lealdade e de informação.

Não há dúvida de que o R. não cumpriu minimamente o dever de informação que sobre si impendia enquanto intermediário financeiro, assim como o dever de proteção dos clientes que se mostrava imprescindível em face da completa iliteracia financeira do A.

Aliás, sendo o autor cliente da R., enquanto instituição de crédito onde detinha as suas poupanças e onde efetuava as operações financeiras, era dever acrescido desta não o confrontar com investimentos que comportavam uma margem de risco que o mesmo não compreendia, nem o envolver na aquisição de um produto financeiro emitido por outra entidade e sujeito a regras específicas de que ressalta a natureza subordinada do crédito e a falta de qualquer garantia de devolução do capital em caso de insolvência, diversamente do que ocorreria se se tratasse de um depósito bancário.

Repetimos que não pode ceder-se ao facilitismo de interpretar e integrar os deveres que recaíam sobre os intermediários financeiros em 2006 à luz da evolução do mercado financeiro e designadamente do surgimento da crise financeira em finais de 2007 ou da posterior insolvência da emitente das obrigações. Pelo contrário, deve fazer-se um esforço no sentido de colocar cada interveniente na posição relativa em que se encontrava na data em que foi executada a operação financeira, contando exclusivamente com os deveres do intermediário no contexto jurídico e financeiro que rodeava a operação em causa e com as correspondentes necessidades informativas do investidor.

Mas no caso concreto o facto de o BPN informar que garantia o reembolso do capital, apesar de estar a agir como intermediário financeiro, constitui um plus que não pode deixar de ter efeitos ao nível da verificação da ilicitude.

Para o efeito releva especialmente o facto de ter sido proferido AUJ 2021, no qual se uniformizou o entendimento jurisprudencial que, a respeito do pressuposto da ilicitude, assim ficou condensado:

1. No âmbito da responsabilidade civil pré-contratual ou contratual do intermediário financeiro, nos termos dos arts. 7º, nº 1, 312º, nº 1, al. a), e 314º do Código dos Valores Mobiliários, na redação anterior à introduzida pelo DL nº 357-A/07, de 31-10, e 342º, nº 1, do CC, incumbe ao investidor, mesmo quando seja não qualificado, o ónus de provar a violação pelo intermediário financeiro dos deveres de informação que a este são legalmente impostos e o nexo de causalidade entre a violação do dever de informação e o dano;

2. Se o Banco, intermediário financeiro – que sugeriu a subscrição de obrigações subordinadas pelo prazo de maturidade de 10 anos a um cliente que não tinha conhecimentos para avaliar o risco daquele produto financeiro nem pretendia aplicar o seu dinheiro em “produtos de risco” – informou apenas o cliente, relativamente ao risco do produto, que o “reembolso do capital era garantido (porquanto não era produto de risco”, sem outras explicações, nomeadamente, o que era obrigações subordinadas), não cumpre o dever de informação aludido no art. 7º, nº 1, do CVM.

Demonstrada a ilicitude, a procedência da ação depende ainda da verificação do nexo de causalidade entre a atuação do BPN e a subscrição por parte dos AA. do produto financeiro que mais tarde se revelou ruinoso, pelo facto de a entidade emitente não ter procedido ao reembolso do capital.

A demonstração desse nexo de causalidade constitui ónus do investidor, ainda que não qualificado, como resulta do ponto 1 do sumário do AUJ acima referido e foi explicitado nos pontos 3 e 4 com a seguinte redação:

3. O nexo de causalidade deve ser determinado com base na falta ou inexatidão, imputável ao intermediário financeiro, da informação necessária para a decisão de investir.

4. Para estabelecer o nexo de causalidade entre a violação dos deveres de informação, por parte do intermediário financeiro, e o dano decorrente da decisão de investir, incumbe ao investidor provar que a prestação da informação devida o levaria a não tomar a decisão de investir. 

A necessidade de demonstração do nexo de causalidade nestas e noutras ações já fora assinalada na jurisprudência deste Supremo, mantendo-se firme o critério segundo o qual é sobre o interessado que recai o respetivo ónus da prova, embora com variação do grau de probabilidade entre o evento e o resultado.

Assim foi no Ac. do STJ de 24-1-19, 2406/16, www.dgsi.pt, de cujo sumário consta, além do mais que: “Ainda que se apurasse ter existido incumprimento do dever de informação por parte do intermediário financeiro, a sua responsabilidade civil dependeria ainda do estabelecimento de um nexo de causalidade, ou seja, de que foi por causa daquele incumprimento que o investidor realizou o concreto investimento que se revelou prejudicial.

Não se tendo provado que a subscrição da Obrigação SLN 2006 foi decidida em função de alguma confusão relativamente a um depósito a prazo constituído na instituição financeira intermediária da operação ou de algum aspeto conexo com a identidade da emitente das obrigações e do intermediário financeiro, não se considera verificado o nexo de causalidade”.

A mesma linha já fora seguida no Ac. do STJ de 6-6-13, 364/11, em www.dgsi.pt, no qual se afirmou que “a responsabilidade civil assacada ao intermediário financeiro, designadamente no âmbito de contrato de consultadoria para investimento em valores mobiliários, pressupõe a prova da ilicitude resultante do incumprimento de deveres legais ou contratuais, numa relação de causalidade adequada com o sinistro financeiro verificado”.

Foi também na falta de prova de factos reveladores desse pressuposto que o Ac. do STJ de 6-11-18, no proc. 2468/16, em www.dgsi.pt, se fundou para julgar a improcedente a ação que foi instaurada contra um intermediário financeiro. Tratou-se de um caso em que, embora tenha sido afirmado a ilicitude do Banco por inobservância de elevados padrões de diligência, lealdade e transparência que lhe eram exigíveis para a prestação de informações, acabou por concluir que não se verificava o nexo de causalidade por não ter resultado provado que os danos invocados pelos recorrentes devam ser adequadamente imputados à violação do bem tutelado.

O mesmo aconteceu com o Ac. do STJ de 13-9-18, no proc. 13809/16, em www.dgsi.pt. Para além de neste se assentar que “a lei portuguesa não permite que o nexo de causalidade seja retirado ou obtido por via de uma presunção”, ficou expresso que não resultava da “matéria de facto que se os deveres de informação que recaíam sobre o banco intermediário financeiro tivessem sido cumpridos os AA. não teriam investido na aplicação em causa nos autos, mas noutra que lhes garantisse um retorno seguro”. Concluiu que não ficou demonstrado o nexo de causalidade entre o facto ilícito (violação do dever de informação) e o dano (valor da prestação não cumprida pela entidade emitente) e que “para que tal sucedesse era necessário ter-se provado que os AA. não teriam tomado a decisão de subscrever as obrigações em causa se lhes tivesse sido prestada toda a informação relativa ao produto que adquiriram”.

Como ficou clarificado pelo referido AUJ, a respeito do nexo de causalidade, não pode aceitar-se a dispensa da demonstração dos factos integrantes deste pressuposto mediante a adesão a uma tese como aquela que faz presumir a causalidade a partir da verificação da ilicitude. Não cremos, aliás, que alguma especificidade possa encontrar-se nesta área da intermediação financeira que permita associar a um eventual incumprimento do dever de informação a presunção de que aí se encontra a causa adequada do resultado traduzido na subscrição da obrigação subordinada e, depois, na falta de reembolso do respetivo capital. Pelo contrário, parece importante que também nestes casos se demonstre o referido nexo de causalidade adequada, sem que se invertam os termos da equação, atribuindo relevo ao sinistro antes de apreciar os comportamentos dos agentes nas circunstâncias que existiam.

Ora, estando no caso em causa o alegado incumprimento do dever de informação, a matéria de facto apurada que, ademais, não é infirmada pelos factos que foram considerados não provados, permite que se assuma a verificação do nexo de causalidade adequada entre a atuação do banco e o efeito negativo que veio a manifestar-se na esfera patrimonial do A. com a insolvência da GALILEI conexo com a anterior aquisição de um produto financeiro carente de melhor informação.

A este respeito apurou-se de essencial que:

- o autor foi abordado pelo funcionário do banco para subscrever a obrigação com a informação de que tinha uma aplicação idêntica a um depósito a prazo, com capital garantido pelo “BPN” e rentabilidade assegurada.

- O funcionário sabia que o autor não possuía qualificações ou formação técnica que lhe permitissem, à data, conhecer os concretos riscos inerentes aos diversos produtos financeiros, a não ser que lhos explicassem e bem assim que tinha um perfil conservador no que respeitava ao investimento do seu dinheiro, sendo que, até essa data, aplicara-o, designadamente, em depósitos a prazo.

- O que motivou a anuência do autor foi ter-lhe sido dito e assegurado que o capital era garantido pelo Banco réu, com juros semestrais atuando este convicto de que estava a colocar o seu dinheiro numa aplicação segura, ou seja, num produto com risco exclusivamente do Banco.

- Se o autor tivesse percebido que, com a assinatura do “Boletim de Subscrição” estava a subscrever um produto em que o capital não era garantido pelo “BPN”, não o teria assinado.

Para responsabilizar o Banco R. pelo “sinistro” financeiro era necessário que se apurasse que foi na errada, deficitária ou perturbadora informação dada pelo BPN que o A. assentou a sua vontade de aceder à proposta de aquisição do produto financeiro. Ou seja, era necessário que a matéria de facto revelasse que foi por não ter recebido do BPN informação que fosse completa, verdadeira, atual, clara objetiva e lícita que o A. aceitou a proposta de aplicação financeira ou que não contrataria tal obrigação se lhe tivesse sido dada informação completa e verdadeira.

Tal prova foi feita e por isso há que confirmar o acórdão recorrido.

… …

Síntese conclusiva

- Para que se verifiquem os pressupostos da responsabilidade civil contratual, do intermediário financeiro, é necessário demonstrar o facto ilícito (traduzido na prestação de informação errónea, no quadro de relação negocial bancária e intermediação financeira); a culpa (que se presume); o dano (correspondente à perda do capital entregue para subscrição do ajuizado produto financeiro); importando também apreciar o nexo de causalidade entre o facto e o dano (reconhecendo-se que, a quem alega o direito, cabe demonstrar a existência do nexo causal entre a ilicitude e o dano, não se presumindo, quer o nexo de causalidade quer o dano, donde, para que se possa afirmar que o intermediário financeiro é responsável pelo dano sofrido pelos investidores, necessário se torna que estes demonstrem o nexo de causalidade entre a violação do dever de informação e o dano, devendo o nexo causal ser analisado através da demonstração, que decorre da matéria de facto).

Conforme jurisprudência uniformizada do STJ de 6 de dezembro de 2021 no processo 1479/16.4T8LRA.C2.S1-A, “ 1. No âmbito da responsabilidade civil pré-contratual ou contratual do intermediário financeiro, nos termos dos arts. 7º, nº 1, 312º, nº 1, al. a), e 314º do Código dos Valores Mobiliários, na redação anterior à introduzida pelo DL nº 357-A/07, de 31-10, e 342º, nº 1, do CC, incumbe ao investidor, mesmo quando seja não qualificado, o ónus de provar a violação pelo intermediário financeiro dos deveres de informação que a este são legalmente impostos e o nexo de causalidade entre a violação do dever de informação e o dano;

2. Se o Banco, intermediário financeiro – que sugeriu a subscrição de obrigações subordinadas pelo prazo de maturidade de 10 anos a um cliente que não tinha conhecimentos para avaliar o risco daquele produto financeiro nem pretendia aplicar o seu dinheiro em “produtos de risco” – informou apenas o cliente, relativamente ao risco do produto, que o “reembolso do capital era garantido (porquanto não era produto de risco”, sem outras explicações, nomeadamente, o que era obrigações subordinadas), não cumpre o dever de informação aludido no art. 7º, nº 1, do CVM.

3. O nexo de causalidade deve ser determinado com base na falta ou inexatidão, imputável ao intermediário financeiro, da informação necessária para a decisão de investir.

4. Para estabelecer o nexo de causalidade entre a violação dos deveres de informação, por parte do intermediário financeiro, e o dano decorrente da decisão de investir, incumbe ao investidor provar que a prestação da informação devida o levaria a não tomar a decisão de investir. “


Decisão

 Face ao exposto, acorda-se em julgar improcedente a revista, confirmando o acórdão recorrido.

Custas da revista pelo R.

Notifique.


Lisboa, 27 de outubro de 2022


Relator: Cons. Manuel Capelo

1º adjunto: Sr. Juiz Conselheiro Tibério Silva

2º adjunto: Sr. Juiz Conselheiro Nuno Ataíde das Neves