Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
761/16.5T8PVZ.P1.S2
Nº Convencional: 7.ª SECÇÃO
Relator: NUNO PINTO OLIVEIRA
Descritores: RESPONSABILIDADE CONTRATUAL
RESPONSABILIDADE BANCÁRIA
INTERMEDIAÇÃO FINANCEIRA
DEVER DE INFORMAÇÃO
NEXO DE CAUSALIDADE
ACÓRDÃO UNIFORMIZADOR DE JURISPRUDÊNCIA
ILICITUDE
PRESUNÇÃO DE CULPA
DANO
VALORES MOBILIÁRIOS
OBRIGAÇÃO DE INDEMNIZAR
PRESSUPOSTOS
Data do Acordão: 01/10/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA
Sumário :
Estando provado que o cliente-investidor tinha uma ampla experiência de aplicação de dinheiro em produtos distintos de depósitos a prazo, com uma rendibilidade e um risco superiores aos dos depósitos a prazo, a violação de deveres deveres pré-contratuais de esclarecimento e de informação e a conexão causal entre a violação de deveres pré-contratuais de esclarecimento e de informação e o dano não pode deduzir-se exclusivamente da circunstância de o intermediário financeiro ter prestado a informação / explicação de que o reembolso do capital era garantido, em termos semelhantes aos de um depósito a prazo.
Decisão Texto Integral:

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA



I. — RELATÓRIO


1. AA, residente na Rua ..., ..., ..., instaurou a presente acção sob a forma de processo comum contra:

I. — Banco BIC Português, S.A.;

II. — BB, gerente do BPN, com domicílio profissional na Rua ..., ...;

III. — Estado Português;

IV. — Direcção Geral do Tesouro e Finanças, com sede na Rua da Alfandega, 5, Lisboa;

V. — Ministério das Finanças, com sede na Praça do Comércio, Lisboa;

VI. — Banco de Portugal, com sede na Rua do Comércio, 148, Lisboa;

VII. — Caixa Geral de Depósitos, S.A., com sede na Avenida João XXI, 63, Lisboa;

VIII. —Comissão de Mercado dos Valores Mobiliários, com sede na Rua Laura Alves, n.° 4, Lisboa,

ainda que tenha subsequentemente desistido dos pedidos deduzidos contra o 2.º a 8.º Réus.


2. O Autor pediu que o 1.º Réu fosse condenado no pagamento do montante de € 50.000,00, acrescido de juros vencidos desde 25 de Outubro de 2014 até integral reembolso do capital, e ainda a compensá-lo por danos não patrimoniais em valor não inferior a € 30.000,00.


3. O Tribunal de 1.ª instância julgou a acção parcialmente procedente, condenando o Réu a pagar ao A., a título de danos patrimoniais, a quantia de € 50.000,00, acrescida de juros de mora à taxa de 4% ao ano sobre aquela importância desde 25/10/1014 até integral pagamento, e, a título de danos não patrimoniais, a quantia de € 2.500,00, acrescida de juros à taxa de 4% ao ano contados da citação até integral pagamento.


4. O Tribunal da Relação julgou improcedente o recurso, confirmando a sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª instância.


5. O dispositivo do acórdão recorrido é do seguinte teor:

Nos termos supra expostos, acordamos neste Tribunal da Relação do Porto, em julgar improcedente o recurso, confirmando a decisão recorrida.


6. Inconformado, o Réu Banco BIC Português, S.A., interpôs recurso de revista excepcional.


7. Finalizou a sua alegação com as seguintes conclusões:

1. As Obrigações não têm cotação oficial e, no essencial, quem nelas investe sabe que, aquando do seu vencimento, o capital investido é devido pela entidade que as emitiu .

2. São, por isso mesmo, produtos que constituem o oposto das Acções, sujeitas sempre à valorização ou desvalorização da situação económico-financeira da entidade delas emitente, e que, portanto, nenhuma garantia contém do reembolso do capital investido

3. A garantia do reembolso das Obrigações é sempre o conjunto de activos da sociedade emitente, e o risco da sua insolvência é um risco geral do comércio jurídico, que não tem que ser objecto de qualquer dever de informação por parte do intermediário financeiro .

4. Por isso mesmo, a disposição do art. 312º nº 1 al e) do CVM refere como sendo objecto do dever de informação do intermediário financeiro os riscos especiais das operações a efectuar, e não já os riscos que são comuns a todos os produtos e a todos os mercados .

5. As Obrigações são, por tudo o acima exposto nesta alegação, produtos muito semelhantes aos depósitos a prazo, sendo relevante a seu propósito, que a informação recaia sobre o prazo e a rentabilidade respectiva .

6. Em parte alguma do douto acórdão recorrido vem afirmado, e muito menos resultou provado nos autos, que o autor fosse pessoa de todo ignorante dos mercados e produtos financeiros, incapaz de entender aquilo em que, de essencial, consiste uma Obrigação .

Pelo contrário,

7. Da matéria de facto dada por provada nestes autos conclui-se que o autor, ao mesmo tempo que não deixou nunca de aplicar poupanças em depósitos a prazo, investiu na mesma data do investimento em causa nestes autos, em produtos variados, designadamente em papel comercial e em Obrigações, sempre auferindo uma rentabilidade superior aos depósitos a prazo .

8. E que teve acesso á informação contida no prospecto respectivo, bem sabendo qual a respectiva rentabilidade e prazo de vigência, e colhendo das ditas Obrigações rendimentos superiores aos proporcionados pelos depósitos a prazo.

9. A qualidade e quantidade de informação devida da parte do intermediário financeiro haverá que tomar em conta “ um destinatário com o cuidado, zelo e atenção médios colocado na situação do destinatário concreto, nomeadamente no que toca às capacidades, conhecimentos, experiência, etc, deste “, contrariamente ao afirmado no douto acórdão recorrido, que tem injustificadamente por medida e critério um investidor ignorante e sem qualquer noção do que seja uma simples Obrigação .

10. À data da aquisição por parte do autor das Obrigações SLN Rendimento Mais 2004 que aqui estão em causa, nada fazia prever a degradação dos mercados financeiros ocorrida a partir de finais de 2007 e 2008, e que esteve na base do incumprimento por parte da entidade emitente das ditas Obrigações do dever de reembolso do capital nelas investido .

11. Daí não ser exigível ao banco, nem a nenhum dos sues colaboradores, que tivesse tal degradação como possível e que a informação a prestar a descrevesse como risco inerente ao produto que estão aqui em causa .

12. Ainda que assim não fosse, sempre seria de concluir pela inexistência de responsabilidade civil do banco recorrente, dado que o autor não provou, e nem sequer alegou, a existência de qualquer nexo de causalidade adequada entre a pretensa violação do dever de informação da parte do banco recorrente e o dano por ele sofrido

13. O douto acórdão recorrido violou, por errada interpretação e aplicação, as disposições dos arts. 483.º n.º 1, 486.º, 563.º e 798.º, todos do CCivil, e o art. 312.º n.º 1 al. e) do CVM .

Nos termos expostos, e nos mais de direito que V. Exªs doutamente suprirão, deverá o presente recurso de revista ser julgado provado e procedente e, por via dele, ser revogado o douto acórdão recorrido .


8. O Autor contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso.


9. A Formação prevista no art. 672.º, n.º 3, do Código de Processo Civil admitiu o recurso de revista excepcional.


10. O anterior relator proferiu o despacho seguinte:

Tal como resulta do acórdão que admitiu a presente revista excecional, encontram-se pendentes de decisão neste Supremo Tribunal de Justiça diversos recursos extraordinários para uniformização de jurisprudência em torno da responsabilização do Recorrente BANCO BIC PORTUGUÊS, S.A. em decorrência de situações jurídicas similares àquela que se discute no presente recurso.

A fim de prevenir a indesejável possibilidade de interposição de novo recurso para uniformização de jurisprudência e a fim de propiciar a desejável aplicação ao caso vertente da orientação jurídica que resultar da jurisprudência pendente de uniformização, justifica-se que se suspendam os termos do presente recurso até que a uniformização ocorra e seja publicitada no Diário da República.

Pelo exposto:

Determino a suspensão dos termos do recurso até que a uniformização ocorra e seja publicitada no Diário da República.


11. Em 6 de Dezembro de 2021, foi proferido acórdão de uniformização de jurisprudência no processo n.º 1479/16.4T8LRA.C2.S1-A — e, tendo transitado em julgado o acórdão de uniformização de jurisprudência n.º 8/2022, proferido no processo n.º 1479/16.4T8LRA.C2.S1-A, foram os presentes autos conclusos ao actual relator.


12. Como o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões do Recorrente (cf. arts. 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cf. art. 608.º, n.º 2, por remissão do art. 663.º, n.º 2, do Código de Processo Civil), as questões a decidir, in casu, são as seguintes:

I. — se a Ré violou ilicitamente deveres de esclarecimento e/ou de informação;

II. — se a violação ilícita e culposa de deveres de esclarecimento e de informação foi condição sine qua non da conclusão do contrato;

III. — se a conclusão do contrato foi causa de danos, no montante correspondente ao valor investido pelos Autores.



II. — FUNDAMENTAÇÃO


OS FACTOS


13. O acórdão recorrido deu como provados os factos seguintes:

1. No dia 30.03.2012, foi assinado o contrato de compra e venda do BPN entre o Estado Português e o Banco BIC.

2. Em 20.10.2004, o aqui A., subscreveu obrigações no montante de 50.000,00 € correspondentes ao montante que detinha em aplicação de BPN Tesouraria.

3. Até ao dia 20 de Novembro de 2014, sempre lhe foram pagos os juros do capital investido na aludida aplicação financeira.

4. O Autor detinha à data de Outubro de 2004, uma aplicação "BPN Tesouraria" no valor de 50.0006, (cinquenta mil euros), no BPN (actual Banco Bic, S.A.), agência (ou balcão) da ....

5. Tal aplicação financeira, estava a essa data a atingir a sua data de vencimento, pelo que poderia ser resgatado ou manter-se por iguais períodos.

6. Sabendo disso, o segundo Réu, gerente do BPN na agência da ..., contactou o Autor pedindo-lhe que se dirigisse ao Balcão do Banco, pois queria falar com ele porque tinha uma proposta interessante para lhe fazer.

7. Em dia que não pode precisar mas no mês de Setembro de 2004, o Autor, dirigiu-se à referida agência com vista a informar-se da proposta que o referido gerente do Banco tinha para lhe fazer, tendo-lhe sido comunicado que poderia proceder ao resgate daquela sua aplicação financeira para aplicar num outro programa de aplicação financeira que lhe traria uma maior rentabilidade e detinha a mesma segurança que um depósito a prazo, com garantia de capital a 100% (cem por cento), tal como o depósito a prazo.

8. Foi informado de que tal aplicação seria feita pelo prazo de dez anos, mas poderia eventualmente proceder ao seu resgate antecipado ao fim de cinco anos.

9. E de que a aplicação em causa e que lhe estava a propor tinha o reembolso do capital investido garantido a 100% (cem por cento) e lhe daria uma maior rentabilidade ao dinheiro que ele detinha em depósito a prazo.

10. O A., enquanto cliente do BPN, conhecia já há vários anos o gerente da respectiva agência/Balcão ..., em quem depositava confiança, enquanto responsável pelo acompanhamento da sua conta de depósitos a prazo, e demais contas e operações financeiras no Banco em causa e respectiva agência/Balcão ..., o que foi determinante para decidir resgatar a aplicação financeira BPN Tesouraria e proceder à sua aplicação na aplicação financeira que se traduzia na subscrição de obrigações denominadas "SLN Rendimento Mais 2004”.

11. Em 20 de Outubro de 2004, o aqui Autor, subscreveu tais obrigações no montante de € 50.000,00 (cinquenta mil euros), correspondentes ao montante que detinha em aplicação de BPN Tesouraria, tendo para o efeito procedido ao resgate de tal aplicação.

12. Até ao dia 20 de Novembro de 2014, sempre lhe foram pagos os juros do capital investido na aludida aplicação financeira.

13. Pagamentos esses que lhe foram feitos pelo BPN até 25 de Outubro de 2012, e pelo primeiro Réu BANCO BIC PORTUGUÊS, S.A., a partir dessa data e, como já se disse até 20 de Novembro de 2014, data do último pagamento dos juros reportados à aplicação financeira em causa.

14. O aqui Autor em Outubro de 2009, deslocou-se ao Banco BPN, com vista a proceder ao resgate do capital investido.

15. E nessa data foi informado que só ao fim de 10 anos poderia proceder a tal resgate, ou seja, só no fim do prazo contratual e não antes.

16. Começaram nessa data a gerar-se no aqui Autor, angústias e receios.

17. O capital investido havia sido angariado após anos de trabalho e era resultante da sua actividade profissional.

18. Porque os juros sempre lhe estavam a ser pagos, manteve a esperança na recuperação do capital que tinha investido, para o que contribuiu a nacionalização do BPN pelo Estado Português.

19. Vencido o prazo de dez anos, contratualmente estabelecido, foi o aqui Autor informado de que a aplicação financeira em causa não tinha cobertura de garantia de capital por ser uma subscrição de obrigações da SLN - Sociedade Lusa de Negócios, S.A..

20. Em 19.03.2002 o autor subscreveu 49.999,00 euros de papel comercial da SLN.

21. Em 17.06.2002 subscreveu mais 25.000 euros de um produto denominado e catalogado como PTPCIMONAC6E.

22. Em 01.07.2002 voltou a subscrever 49.999,00 euros de papel comercial SLN.

23. Em 06.09.2002 adquiriu acções da ... no montante de € 10.042,06.

24. Em 16.09.2002 adquiriu títulos emitidos pela ..., no montante de € 25.000,00.

25. Em 16.12.2002 veio a adquirir e subscrever mais € 25.200,07 de papel comercial SLN.

26. Repetindo tais aplicações em 24.03.2003 e em 12.05.2003, nos montantes de 25.404,91 € e 25.050,67 €.

227. E aplicando mais os montantes de 25.104,74 € e 25.499,38 € em 11.06.2003 e 23.06.2003, respectivamente.

28. Em 30.06.2003 o autor voltou a aplicar o montante de 51.256,18 € na subscrição de papel comercial de SLN.

29. E em 23.07.2003 subscreveu mais € 102.116,21 do mesmo produto, ou seja, de papel comercial SLN.

30. Aplicação esta que renovou em 22.08.2003.

31. Após o reembolso desta aplicação em 20.11.2003, o autor, na mesma data, subscreveu € 102.976,68 de Obrigações BPN.

32. Produto este que vendeu em 09.12.2003 para, na mesma data, adquirir € 103.096,49 de papel comercial SLN.

33. Em 09.03.2004 subscreveu 103.694,55 € de papel comercial SLN.

34. Em 12.04.2004 veio a subscrever produto financeiro catalogado como ..., no montante de 124.999,00 €.

35. E reforçou a sua carteira com investimentos de mais 19.999,99 € e 49.999,99 €, em 7.05.2004 e 13.05.2004, respectivamente.

36. Só no dia 08.06.2004 o autor subscreveu papel comercial SLN nos montantes de 65.000,20 €, 10.000.27 €, 9.999,64 € e 10.000,01 €.

37. Todas as aplicações e produtos financeiros adquiridos pelo autor, e acima descritos, tiveram o seu expresso consentimento.

38. E sempre constavam dos extractos que, com regularidade, lhe eram enviados mensalmente para a sua residência.

39. De tais extractos consta também o lançamento a crédito dos dividendos recebidos por força das acções por si detidas.

40. Como o valor dos juros, acrescidos ao valor do capital no momento do reembolso do papel comercial subscrito.

41. Ou creditados de forma isolada e avulsa, quando respeitassem a rendimentos de obrigações.

42. Estes rendimentos auferidos pelo autor ao longo de todos estes anos era superior ao normal e corrente juro proporcionado pelos depósitos a prazo.

43. O autor subscreveu e adquiriu as Obrigações SLN Rendimento Mais 2004, em Outubro de 2004 para obter rendimentos superiores aos proporcionados pelos depósitos a prazo.

44. O impresso destinado a tal aquisição assinado pelo A. identifica a entidade emitente, o prazo da aplicação e a rentabilidade oferecida.

45. Ao autor foi então facultada a leitura do prospecto do produto que iria adquirir.

46. Do canto inferior direito do referido impresso consta a seguinte declaração: "Declaro (declaramos) que tomei (tomámos) conhecimento do prospecto desta emissão e aceito (aceitamos) as respectivas condições”.


            O DIREITO


14. O tema da intermediação financeira [1] e, em particular, da responsabilidade dos intermediários financeiros pela violação de deveres de esclarecimento e de informação dos clientes tem sido objecto de uma apreciável atenção da doutrina [2] e da jurisprudência [3] — fenómeno explicável por uma particular conjuntura económica e social [4].


15. O sistema dos deveres de esclarecimento e de informação dos intermediários financeiros é complexo [5], devendo coordenar-se os princípios gerais do art. 227.º do Código Civil com as regras dos arts. 7.º e 312.º, “enquadrados pelo art. 304.º”, do Código dos Valores Mobiliários, e com as regras dos arts. 73.º e 74.º do Regime Geral das Instituições de Crédito e das Sociedades Financeiras [6].


a) O art. 312.º do Código dos Valores Mobiliários, na sua redacção inicial, era do seguinte teor:

1. — O intermediário financeiro deve prestar, relativamente aos serviços que ofereça, que lhe sejam solicitados ou que efectivamente preste, todas as informações necessárias para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada, incluindo nomeadamente as respeitantes a:

a) Riscos especiais envolvidos pelas operações a realizar;

b) Qualquer interesse que o intermediário financeiro ou as pessoas que em nome dele agem tenham no serviço prestado ou a prestar;

c) Existência ou inexistência de qualquer fundo de garantia ou de protecção equivalente que abranja os serviços a prestar;

d) Custo do serviço a prestar.

2. — A extensão e a profundidade da informação devem ser tanto maiores quanto menor for o grau de conhecimentos e de experiência do cliente.


Em termos semelhantes ao art. 312.º, n.ºs 1 e 2, o art. 75.º, n.º 1, do Regime Geral das Instituições de Crédito e das Sociedades Financeiras, na sua redacção inicial, determinava que “[a]s instituições de crédito devem informar os clientes sobre a remuneração que oferecem pelos fundos recebidos e sobre o preço dos serviços prestados e outros encargos suportados por aqueles”.


O fim dos deveres consignados no art. 312.º do Código dos Valores Mobiliários deve determinar-se através de uma referência aos interesses protegidos:

O art. 304.º, n.º 1, do Código dos Valores Mobiliários, na sua redacção inicial, afirmava que “[o]s intermediários financeiros devem orientar a sua actividade no sentido da protecção dos legítimos interesses dos seus clientes e da eficiência do mercado” e o art. 73.º do Regime Geral das Instituições de Crédito e das Sociedades Financeiras confirmava-o, dizendo que, “[n]as relações com os clientes, os administradores e os empregados das instituições de crédito devem proceder com diligência, neutralidade, lealdade e discrição e respeito consciencioso dos interesses que lhes estão confiados”.

O conteúdo dos deveres consignados no art. 312.º do Código dos Valores Mobiliários, esse, deve determinar-se através de uma referência a duas coisas:— ao standard genérico dos arts. 304.º, n.º 2, do Código dos Valores Mobiliários e do art. 73.º do Regime Geral das Instituições de Crédito e das Sociedades Financeiras; — ao standard específico do art. 7.º, n.º 1, do Código dos Valores Mobiliários, por que se exigem “determinados requisitos, positivos e negativos, a toda a informação prevista noutros preceitos do código” [7].

Ora o art. 304.º, n.º 2, do Código dos Valores Mobiliários, na sua redacção inicial, determinava que “[n]as relações com todos os intervenientes no mercado, os intermediários financeiros devem observar os ditames da boa fé, de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência” e os arts. 73.º e 74.º do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, em termos globalmente consonantes com o art. 304.º, n.º 2, do Código dos Valores Mobiliários, determinavam que “[a]s instituições de crédito […], em todas as actividades que exerçam,” devem proceder com diligência [8]; “devem assegurar aos clientes elevados níveis de competência técnica” [9]; e devem proceder com lealdade e com neutralidade [10] [11].


b) O padrão ou standard genérico decorrente dos arts. 304.º, n.º 2, do Código dos Valores Mobiliários e dos arts. 73.º e 74.º do Regime Geral das Instituições de Crédito e das Sociedades Financeiras deve completar-se com o standard específico sobre a qualidade da informação consignado no art. 7.º do Código dos Valores Mobiliários: a informação respeitante a valores mobiliários, a ofertas públicas, a mercados de valores mobiliários, a actividades de intermediação e a emitentes que seja susceptível de influenciar as decisões dos investidores… deve ser completa, verdadeira, actual, clara, objectiva e lícita [12].

Ora a extensão necessária para que a informação prestada pelo intermediário possa completar-se completa, e a profundidade necessária para que uma informação completa permita ao cliente uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada, dependem de pelo menos quatro elementos: em primeiro lugar, do tipo de contrato de intermediação financeira [13];  em segundo lugar, dos conhecimentos e da experiência dos clientes; em terceiro lugar, da natureza e dos riscos especiais dos instrumentos financeiros negociados; e, em quarto lugar, do perfil e da situação financeira dos clientes. Em relação ao segundo elemento — i.e., aos conhecimentos e à experiência dos clientes —, o art. 314.º, n.º 2, do Código dos Valores Mobiliários consagra a chamada regra da proporcionalidade inversa [14]: “A extensão e a profundidade da informação devem ser tanto maiores quanto menor for o grau de conhecimentos e de experiência do cliente”. Em relação ao terceiro e ao quarto elementos, a relevãncia dos riscos especiais resulta explicitamente do art. 312.º, n.º 1, alínea b), e a relevância da situação financeira, do art. 314.º, n.º 3, do Código dos Valores Mobiliários [15].


16. Entre os corolários dos arts. 312.º e 314.º do Código dos Valores Mobiliários está o de que o conteúdo e a extensão dos deveres dos intermediários financeiros dependem das circunstâncias do caso; têm uma geometria variável [16].

Estando em causa instrumentos financeiros como as obrigações, “conhecidos — ou facilmente apreensíveis — pela generalidade do público”, o conteúdo dos deveres de eslcarecimento do intermediário pode ir de um mínimo a um máximo.  O seu conteúdo mínimo consistirá em “explicar aos clientes que estes receberiam periodicamente de alguém, que não o banco, cupões relativos ao capital investido; explicitar o período de maturidade do investimento e as taxas de juro, cuja aplicação ao montante daquele capital determinará o valor que receberá; e avisar que, em contrapartida, só poderão resgatar o capital investido, em qualquer altura, mediante a cedência da [obrigação] a terceiros”.  O seu conteúdo máximo, esse, consistirá, p. ex., em “mostrar [aos clientes] — mesmo quando negoceiem por conta própria — os factores de cálculo das vantagens e desvantagens de certo produto financeiro, a subscrever por estes; ou [em] indicar o pior cenário relacionado com essa mesma subscrição; ou de apresentar a esse mesmo cliente as alternativas que existem para as suas necessidades (tal como previamente apuradas pelo intermediário financeiro, ou tendo ele mesmo o dever de as perscrutar e avaliar); ou [em] indicar, mesmo, o valor (de mercado, quando exista), sobretudo se negativo, do aludido produto ao tempo da celebração do contrato” [17].

Em abstracto, não pode dizer-se se uma acção ou se uma omissão do intermediário financeiro implica, ou não implica, uma violação de deveres pré-contratuais de esclarecimento e de informação — comportamentos comparáveis do intermediário podem representar uma violação ilícita de deveres de esclarecimento e de informação em relação a produtos financeiros mais complexos e não representar nenhuma violação ilícita em relação a produtos financeiros menos complexos, como uma obrigação; poderão representar uma violação ilícita em relação a produtos financeiros com riscos especiais e não represantar nenhuma violação em relação a produtos sem riscos especiais; poderão representar uma violação ilícita em relação a investidores cujo grau de conhecimentos seja mínimo ou, em todo o caso, mais reduzido e não representar nenhuma violação ilícita em relação a investidores cujo grau de conhecimentos e/ou de experiência seja mais elevado.


17. O acórdão de uniformização de jurisprudência n.º 8/2022, de 6 de Dezembro de 2021, esclarece que:

1. — No âmbito da responsabilidade civil pré-contratual ou contratual do intermediário financeiro, nos termos dos artigos 7.º, n.º 1, 312.º n.º 1, alínea a), e 314.º do Código dos Valores Mobiliários, na redação anterior à introduzida pelo Decreto-Lei n.º 357-A/2007, de 31 de outubro, e 342.º, n.º 1, do Código Civil, incumbe ao investidor, mesmo quando seja não qualificado, o ónus de provar a violação pelo intermediário financeiro dos deveres de informação que a este são legalmente impostos e o nexo de causalidade entre a violação do dever de informação e o dano.

2. — Se o Banco, intermediário financeiro — que sugeriu a subscrição de obrigações subordinadas pelo prazo de maturidade de 10 anos a um cliente que não tinha conhecimentos para avaliar o risco daquele produto financeiro nem pretendia aplicar o seu dinheiro em "produtos de risco" — informou apenas o cliente, relativamente ao risco do produto, que o "reembolso do capital era garantido (porquanto não era produto de risco"), sem outras explicações, nomeadamente, o que eram obrigações subordinadas, não cumpre o dever de informação aludido no artigo 7.º, n.º 1, do CVM.

3. — O nexo de causalidade deve ser determinado com base na falta ou inexatidão, imputável ao intermediário financeiro, da informação necessária para a decisão de investir.

4. — Para estabelecer o nexo de causalidade entre a violação dos deveres de informação, por parte do intermediário financeiro, e o dano decorrente da decisão de investir, incumbe ao investidor provar que a prestação da informação devida o levaria a não tomar a decisão de investir.


Os factores referidos no n.º 2 do acórdão de uniformização de jurisprudência n.º 8/2022 correspondem à descrição de um caso exemplar de violação de deveres pré-contratuais de esclarecimento e de informação — em lugar de requisitos cumulativos, de cujo preenchimento depende a conclusão de que foi infringido ou violado um dever pré-contratual, devem interpretar-se como factores relevantes para a decisão.

O intermediário financeiro tem o dever de informar “com clareza, lealdade e transparência os clientes acerca dos elementos caracterizadores dos produtos financeiros propostos para que os investidores possam tomar uma decisão de investimento esclarecida (artigo 7.º do CVM), sendo que a informação deve ser mais aprofundada quanto menor for o conhecimento do investidor […]”. Entre os corolários do dever de informar estão os de que o intermediário financeiro deve comunicar ao cliente-investidor as características das obrigações e, em particular, as características das obrigações subordinadas [18] e os riscos da sua subscrição [19]; deve dar-lhe conta de que a remuneração e a restituição do capital investido depende sempre da solidez financeira da entidade emitente [20]; de que o banco não está obrigado a remunerar ou a restituir o capital investido, “com capitais próprios” [21]; de que não há nem fundo de garantia nem “mecanismos [alternativos] de proteção contra eventos imprevisíveis”; de que o cliente-investidor não poderá levantar o capital quando quiser [22]; e de que tem uma relação de dependência com a entidade emitente, “na medida em que possa estar em causa um potencial conflito de interesses”.


18. Face aos arts. 7.º e 312.º, “enquadrados pelo art. 304.º”, do Código dos Valores Mobiliários, e aos arts. 73.º e 74.º do Regime Geral das Instituições de Crédito e das Sociedades Financeiras, como interpretados no acórdão de uniformização de jurisprudência n.º 8/2022, de 6 de Dezembro de 2021, entendemos:

I. — que os factos dados como provados não são suficientes para que se conclua que houve uma violação de deveres pré-contratuais de esclarecimento e de informação imputável ao Réu, agora Recorrente;

II. — que, ainda que os factos dados como provados fossem suficientes para que se concluísse que houve uma violação de deveres pré-contratuais de esclarecimento e de informação, nunca seriam suficientes para que se concluísse que a violação dos deveres pré-contratuais foi condição sine que non da decisão de investir.


Os factos dados como provados sob os n.ºs 20 a 42 são do seguinte teor:

20. Em 19.03.2002 o autor subscreveu 49.999,00 euros de papel comercial da SLN.

21. Em 17.06.2002 subscreveu mais 25.000 euros de um produto denominado e catalogado como PTPCIMONAC6E.

22. Em 01.07.2002 voltou a subscrever 49.999,00 euros de papel comercial SLN.

23. Em 06.09.2002 adquiriu acções da ... no montante de € 10.042,06.

24. Em 16.09.2002 adquiriu títulos emitidos pela ..., no montante de € 25.000,00.

25. Em 16.12.2002 veio a adquirir e subscrever mais € 25.200,07 de papel comercial SLN.

26. Repetindo tais aplicações em 24.03.2003 e em 12.05.2003, nos montantes de 25.404,91 € e 25.050,67 €.

227. E aplicando mais os montantes de 25.104,74 € e 25.499,38 € em 11.06.2003 e 23.06.2003, respectivamente.

28. Em 30.06.2003 o autor voltou a aplicar o montante de 51.256,18 € na subscrição de papel comercial de SLN.

29. E em 23.07.2003 subscreveu mais € 102.116,21 do mesmo produto, ou seja, de papel comercial SLN.

30. Aplicação esta que renovou em 22.08.2003.

31. Após o reembolso desta aplicação em 20.11.2003, o autor, na mesma data, subscreveu € 102.976,68 de Obrigações BPN.

32. Produto este que vendeu em 09.12.2003 para, na mesma data, adquirir € 103.096,49 de papel comercial SLN.

33. Em 09.03.2004 subscreveu 103.694,55 € de papel comercial SLN.

34. Em 12.04.2004 veio a subscrever produto financeiro catalogado como ..., no montante de 124.999,00 €.

35. E reforçou a sua carteira com investimentos de mais 19.999,99 € e 49.999,99 €, em 7.05.2004 e 13.05.2004, respectivamente.

36. Só no dia 08.06.2004 o autor subscreveu papel comercial SLN nos montantes de 65.000,20 €, 10.000.27 €, 9.999,64 € e 10.000,01 €.

37. Todas as aplicações e produtos financeiros adquiridos pelo autor, e acima descritos, tiveram o seu expresso consentimento.

38. E sempre constavam dos extractos que, com regularidade, lhe eram enviados mensalmente para a sua residência.

39. De tais extractos consta também o lançamento a crédito dos dividendos recebidos por força das acções por si detidas.

40. Como o valor dos juros, acrescidos ao valor do capital no momento do reembolso do papel comercial subscrito.

41. Ou creditados de forma isolada e avulsa, quando respeitassem a rendimentos de obrigações.

42. Estes rendimentos auferidos pelo autor ao longo de todos estes anos era superior ao normal e corrente juro proporcionado pelos depósitos a prazo.


Em primeiro lugar, entendemos que os factos dados como provados sob os n.ºs 6 a 9, desde que colocados no contexto do conjunto dos factos dados como provados e, em particular, no contexto dos factos dados como provados sob os n.ºs 20 a 42, não são suficientes para que se conclua que houve uma violação de deveres pré-contratuais de esclarecimento e de informação imputável ao Réu, agora Recorrente.

Embora a subscrição de obrigações subordinadas tenha sido sugerida pelo intermediário financeiro, como decorre dos factos dados como provados sob os n.ºs 6 e 7 [23], com a informação / explicação de que o reembolso do capital era garantido [24], em termos semelhantes aos de um depósito a prazo [25], não está provado que o Autor, agora Recorrido, não tivesse os conhecimentos ou a experiência necessários para avaliar o risco daquele produto financeiro — obrigações subordinadas — e, sobretudo, não está provado que o Autor, agora Recorrido, não tivesse a intenção de aplicar o seu dinheiro em produtos de risco.

Os factos dados como provados sob os n.ºs 20 a 42 são suficientes para que se conclua que o Autor, agora Recorrido, tinha uma ampla experiência de aplicação de dinheiro em produtos distintos de depósitos a prazo, com uma rendibilidade e um risco superiores aos dos depósitos a prazo — e, face à regra da proporcionalidade inversa, consagrada no art. 314.º, n.º 2, do Código dos Valores Mobiliários, a informação a prestar a um cliente com o perfil do Autor, agora Recorrido, poderia ser menos ampla e menos profunda que a informação a prestar a um cliente com um perfil conservador, que não tivesse de todo em todo a consciência ou a intenção de aplicar o seu dinheiro em produtos de risco.

Em segundo lugar, entendemos que, ainda que os factos dados como provados fossem suficientes para que se concluísse que houve uma violação de deveres pré-contratuais de esclarecimento e de informação, nunca seriam suficientes para que se concluísse que a violação dos deveres pré-contratuais foi condição sine que non da decisão de investir.

O acórdão de uniformização de jurisprudência n.º 8/2022, de 6 de Dezembro de 2021, esclarece que:

3. — O nexo de causalidade deve ser determinado com base na falta ou inexatidão, imputável ao intermediário financeiro, da informação necessária para a decisão de investir.

4. — Para estabelecer o nexo de causalidade entre a violação dos deveres de informação, por parte do intermediário financeiro, e o dano decorrente da decisão de investir, incumbe ao investidor provar que a prestação da informação devida o levaria a não tomar a decisão de investir.


Os factos dados como provados não são suficientes para que se conclua que a prestação da informação devida determinaria que o Autor, agora Recorrido, não tomasse a decisão de investir — em nenhum dos factos dados como provados se sustenta que, desde que o Autor, agora Recorrido, conhecesse a diferença entre depósitos e obrigações e / ou o risco implicado na subscrição de obrigações não teria tomado a decisão de investir.

Em vez de se sustentar que, desde que o Autor, agora Recorrido, conhecesse a diferença entre depósitos e obrigações e / ou o risco implicado na subscrição de obrigações não teria tomado a decisão de investir, sugere-se que, ainda que o Autor, agora Recorrido, conhecesse a diferença ou o risco, teria subscrito as Obrigações SLN Rendimento Mais 2004.

O facto dado como provado sob o n.º 43 diz-nos que “[o] autor subscreveu e adquiriu as Obrigações SLN Rendimento Mais 2004, em Outubro de 2004 para obter rendimentos superiores aos proporcionados pelos depósitos a prazo” e os factos dados como provados sob os n.ºs 20 a 43, que o Autor, agora Recorrido, tinha subscrito diversos produtos financeiros, com diversos perfis de risco, para obter “rendimentos […] superior[es] ao normal e corrente juro proporcionado pelos depósitos a prazo” [26]. — atendendo ao contexto dos factos dados como provados sob os n.ºs 20 a 42, a informação sobre a diferença entre depósitos e obrigações, ainda que porventura necessária, seria com toda a probabilidade indiferente para a decisão de investir em Obrigações SLN Rendimento Mais 2004.


III. — DECISÃO

Face ao exposto, concede-se provimento ao recurso e revoga-se o acórdão recorrido, absolvendo o Réu Banco BIC Português, S.A., dos pedidos contra si deduzidos.

Custas pelo Autor AA.


Lisboa, 10 de Janeiro de 2023


Nuno Manuel Pinto Oliveira (Relator)

José Maria Ferreira Lopes

Manuel Pires Capelo

______

[1] Sobre o conceito e o regime da intermediação financeira em geral, vide António Pereira de Almeida, Sociedades comerciais, valores mobiliários e mercados, 6.ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, 2011, págs. 729-737; A. Barreto Menezes Cordeiro, Manual de direito dos valores mobiliários, Livraria Almedina, Coimbra, 2016, págs. 245-327; Paulo Câmara, Manual de direito dos valores mobiliários, 4.ª ed., Livraria Almedina, Coimbra, 2018, págs. 271-273 e 381-528; José Augusto Engrácia Antunes, Direito dos contratos comerciais, Livraria Almedina, Coimbra, 2009, págs. 573-615; Rui Pinto Duarte, “Contratos de intermediação no Código dos Valores Mobiliários”, in: Cadernos do mercado de valores mobiliários, n.º 7 — 2000, págs. 353-373 = in: Escritos jurídicos vários 2000-2015, Livraria Almedina, Coimbra, 2015, págs. 7-26; Fátima Gomes, “Contratos de intermediação financeira: sumário alargado”, in: Estudos dedicados ao Professor Doutor Mário Júlio de Almeida Costa, Universidade Católica Editora, Lisboa, 2002, págs. 565-599; José Augusto Engrácia Antunes, “Os contratos de intermediação financeira”, in: Boletim da Faculdade de Direito [da Universidade de Coimbra], vol. 85.º (2009), págs. 277-319; José Augusto Engrácia Antunes, “Deveres e responsabilidade do intermediário financeiro. Alguns aspectos”; in: Cadernos do mercado de valores mobiliários, n.º 56 — Abril de 2017, págs. 31-52; Assunção Cristas, Transmissão contratual do direito de crédito. Do carácter real do direito de crédito, Livraria Almedina, Coimbra, 2005, pág. 423 (nota n.º 1114); José Pedro Fazenda Martins, “Deveres dos intermediários financeiros, em especial os deveres para com os clientes e o mercado”, in: Cadernos do mercado de valores mobiliários, n.º 7 — 2000, págs. 331-350; ou José Queirós de Almeida, “Contratos de intermediação financeira enquanto categoria jurídica”, in: Cadernos do mercado de valores mobiliários, n.º 24 — 2006, págs. 291-303.

[2] Como demonstram, p. ex., António Menezes Cordeiro, “Responsabilidade bancária, deveres acessórios e nexo de causalidade”, in: António Menezes Cordeiro / Manuel Januário da Costa Gomes / Miguel Brito Bastos / Ana Alves Leal (coord.), Estudos de direito bancário I, Livraria Almedina, Coimbra, 2018, págs. 9-46; Luís Menezes Leitão, “Actividades de intermediação e responsabilidade dos intermediários financeiros”, in: Direito dos valores mobiliários, vol. II, Coimbra Editora, Coimbra, 2000, págs. 129-156; Luís Menezes Leitão, “Informação bancária e responsabilidade”, in: Estudos em homenagem ao Professor Doutor Inocêncio Galvão Telles, vol. II — Direito bancário, Livraria Almedina, Coimbra 2002, págs. 225-244; Agostinho Cardoso Guedes, “A responsabilidade do banco por informações à luz do artigo 485.º do Código Civil”, in: Revista de direito e economia, ano 14.º (1988), págs. 135-165; Carlos Ferreira de Almeida, “Normas de imputação e normas de protecção no regime da responsabilidade civil extracontratual pela informação nos mercados financeiros”, in: Direito das sociedades em revista, vol. 16 — 2016, págs. 15-31; Manuel Carneiro da Frada, “A responsabilidade dos intermediários financeiros por informação deficitária ou falta de adequação dos instrumentos financeiros”, in: Paulo Câmara (coord.), O novo direito dos valores mobiliários. I Congresso sobre valores mobiliários e mercados financeiros, Livraria Almedina, Coimbra, 2017, págs. 401-410; Margarida Azevedo de Almeida, “A responsabilidade civil de intermediários financeiros por informação deficitária e falta de adequação dos instrumentos financeiros”, in: Paulo Câmara (coord.), O novo direito dos valores mobiliários. I Congresso sobre valores mobiliários e mercados financeiros, Livraria Almedina, Coimbra, 2017, págs. 411-424; Manuel Carneiro da Frada, “A responsabilidade dos intermediários financeiros por informação deficitária ou falta de adequação dos instrumentos financeiros”, in: Revista de direito comercial, ano 2.º (2018), págs. 1225-1240, disponível in: WWW: < https://www.revistadedireitocomercial.com >; Margarida Azevedo de Almeida. A responsabilidade civil por prospecto no direito dos valores mobiliários. O bem jurídico protegido, Livraria Almedina, Coimbra, 2018, esp. nas págs. 222-227; Ana Afonso, “O contrato de gestão de carteira. Deveres e responsabilidade do intermediário financeiro”,  in: Maria de Fátima Ribeiro (coord.), Jornadas — Sociedades abertas, valores mobiliários e intermediação financeira, Livraria Almedina, Coimbra, 2007, págs.  55-86; Catarina Monteiro Pires, “Entre um modelo correctivo e um modelo informacional em direito bancário e financeiro”, in: Cadernos de direito privado, n.º 44 — Outubro / Dezembro de 2013, págs. 3-22; Sofia Nascimento Rodrigues, A protecção dos investidores em valores mobiliários, Livraria Almedina, Coimbra, 2001; Gonçalo André Castilho dos Santos, A responsabilidade civil do intermediário financeiro perante o cliente, Livraria Almedina, Coimbra, 2008; Fernando Canabarro Teixeira, “Os deveres de informação dos intermediários financeiros em relação a seus clientes e sua responsabilidade civil”, in: Cadernos do Mercado de Valores Mobiliários, n.º 31 — 2008, págs. 50-87; Pedro Miguel Rodrigues, A intermediação financeira. Em especial, os deveres de informação do intermediário (dissertação de mestrado), Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, Lisboa, 2011; ou Pedro Miguel Rodrigues, “A intermediação financeira. Em especial, os deveres de informação do intermediário”, in: DataVenia. Revista jurídica digital, ano 1.º (2013), págs. 101-131, disponível in: < https://www.datavenia.pt/ficheiros/edicao02/datavenia02_p101-132.pdf >.

[3] Como o demonstram, p. ex., as colectâneas O direito bancário na jurisprudência das Secções Cíveis do Supremo Tribunal de Justiça, disponível in: WWW: < http://www.stj.pt/ficheiros/jurisp-tematica/direitobancario.pdf > ou in: Centro de Estudos Judiciários, Direito bancário, in: WWW: < http://www.cej.mj.pt/cej/recursos/ebooks/civil/Direito_Bancario.pdf >.

[4] Vide designadamente António Menezes Cordeiro, “A tutela do consumidor de serviços financeiros e a crise mundial”, in: Revista da Ordem dos Advogados, ano 69.º (2009), págs. 603-632; ou Paulo Câmara, “Crise financeira e regulação”, in: Revista da Ordem dos Advogados, ano 69.º (2009), págs. 697-728, esp. nas págs. 716-719.

[5] Cf. designadamente Manuel Carneiro da Frada, “A responsabilidade dos intermediários financeiros por informação deficitária ou falta de adequação dos instrumentos financeiros”, in: Paulo Câmara (coord.), O novo direito dos valores mobiliários. I Congresso sobre valores mobiliários e mercados financeiros, cit., pág. 403 = in: Revista de direito comercial, cit., págs. 1229: “… a construção do sistema no âmbito da responsabilidade dos intermediários financeiros [apresenta-se] extremamente complexa”. Entre as razões da sua complexidade estaria a necessidade de “articulação entre o Código dos Valores Mobiliários e o direito privado comum”: “importa sobretudo”, escreve o Professor Carneiro da Frada, “pôr em guarda contra apriorismo simplificadores, que partem com excessiva auto-suficientência do Código dos Valores Mobiliários para resolver os problemas de responsabilidade dos intermediários financeiros e não reconhecem, como é mister, a necessidade e a imprescindível valia, para o efeito, o direito comum dos contratos”.

[6] Salvo indicação em contrário, considerar-se-á o teor das disposições do Código dos Valores mobiliários e do Regime Geral das Instituições de Crédito e das Sociedades Financeiras em vigor em Abril de 2006, ou seja, na data da conclusão do contrato pelos Autores, agora Recorridos.[7] Expressão de Carlos Ferreira de Almeida, “Normas de imputação e normas de protecção no regime da responsabilidade civil extracontratual pela informação nos mercados financeiros”, cit., pág. 30.

[8] Cf. art. 74.º do Regime Geral das Instituições de Crédito e das Sociedades Financeiras, na sua redacção inicial: “Nas relações com os clientes, os administradores e os empregados das instituições de crédito devem proceder com diligência, neutralidade, lealdade e discrição e respeito consciencioso dos interesses que lhes estão confiados”.

[9] Cf. art. 73.º do Regime Geral das Instituições de Crédito e das Sociedades Financeiras, na sua redacção inicial: “As instituições de crédito devem assegurar aos clientes, em todas as actividades que exerçam, elevados níveis de competência técnica, dotando a sua organização empresarial com os meios materiais e humanos necessários para realizar condições apropriadas de qualidade e eficiência”.

[10] Cf. art. 74.º do Regime Geral das Instituições de Crédito e das Sociedades Financeiras, na sua redacção inicial.

[11] Entre os pontos mais ou menos consensuais está o de que o padrão de diligência do art. 304º, n.º 2, do Código dos Valores Mobiliários e nos arts. 73.º e 74.º do Regime Geral das Instituições de Crédito e das Sociedades Financeiras é superior ao padrão do art. 487.º, n.º 2, do Código Civil [vide, na doutrina, p. ex., A. Barreto Menezes Cordeiro, Manual de direito dos valores mobiliários, cit., pág. 258 — dizendo que “[d]o confronto entre os regimes regra com os regimes mobiliários específicos resulta, do ponto de vista da diligência exigida, um plus: aos intermediários financeiros é exigida uma diligência que ultrapassa o conceito de bom pai de família (homem médio) espera-se uma actuação como elevados padrões de diligência” — e, na jurisprudência, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 6 de Novembro de 2018 — processo n.º 2468/16.4T8LSB.L1.S1 — e de de 10 de Abril de 2018 — processo n.º 753/16.4TBLSB.L1.S1 —, considerando que se substitui o bonus paterfamilias do art. 487.º, n.º 2, por um diligentissimus paterfamilias, “não sendo toleráveis procedimentos que possam sequer ser incursos em culpa leve”.

[12] Como se diz no sumário do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de de 5 de Abril de 2016 — processo n.º 127/10.0TBPDL.L1.S1 —, “[a] violação dos deveres de informação do emitente de títulos mobiliários, seja relativamente aos prospectos ou às informações periódicas ou eventuais, tanto inclui a informação desconforme divulgada como a omitida, sob pena de ficar esvaziado o objecto e escopo legal do art. 7.º do Código de Valores Mobiliários”. [13] Cf. designdamente Rui Pinto Duarte, “Contratos de intermediação no Código dos Valores Mobiliários”, in: Escritos jurídicos vários 2000-2015, cit., pág. 17: “… nos preceitos dedicados a cada tipo contratual surgem também regras sobre deveres de informação”.

[14] Expressão usada, p. ex., no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 6 de Novembro de 2018 — processo n.º 2468/16.4T8LSB.L1.S1 —: “O âmbito funcional do dever de informação é determinado por uma regra de proporcionalidade inversa entre a densidade daquele dever por parte do intermediário e o grau de conhecimentos e experiência do cliente”. (

[15] Embora o art. 312.º não refira expressamente a natureza dos instrumentos financeiros negociados, deve concordar-se com as afirmações feitas pelo Professor António Pinto Monteiro, no parecer junto aos autos: “… o grau de conhecimento de uma pessoa em relação a um instrumento como uma obrigação é completamente diverso do conhecimento que o mesmo sujeito possa ter, p. ex., de um swap de taxas de juro” (págs. 15-16); “conceitos como ‘obrigação’ e, no seu âmbito, ‘resgate’, são conhecidos — ou facilmente apreensíveis — pela generalidade do público, contrariamente ao que acontece com produtos de elevada complexidade, como a noção de synthetic collateralized debt obligation, assente em swaps e outros derivados, já que assentarão no pólo oposto do espectro” (pág. 16)

[16] Expressão usada nos acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 4 de Outubro de 2018 — processo n.º 1236/15.5T8PVZ.L1.S1 —e de 11 de Outubro de 2018 — processo n.º 2339/16.4T8LRA.C2.S1.

[17] Cf. Manuel Carneiro da Frada, “A responsabilidade dos intermediários financeiros por informação deficitária ou falta de adequação dos instrumentos financeiros”, in: Paulo Câmara (coord.), O novo direito dos valores mobiliários. I Congresso sobre valores mobiliários e mercados financeiros, cit., pág. 404 = in: Revista de direito comercial, cit., págs. 1231.

[18] A fundamentação do acórdão de uniformização de jurisprudência n.º 8/2022 diz, textualmente, que o intermediário financeiro deve esclarecer o cliente (investidor) no que consistem as "obrigações subordinadas", isto é, informar que, em caso de insolvência do emitente, os obrigacionistas apenas serão reembolsados depois dos demais credores de dívida não subordinada”.

[19] A fundamentação do acórdão de uniformização de jurisprudência n.º 8/2022 diz, textualmente, que “compete ao intermediário financeiro o dever de esclarecer sobre as reais características das obrigações e sobre os riscos que a operação envolve (mesmo sem olvidar que nos depósitos bancários também há o risco de insolvência da entidade depositária, mas esse risco sempre é atenuado pela existência do Fundo de garantia de devolução de depósitos, pelo menos, parcialmente)”.

[20] A fundamentação do acórdão de uniformização de jurisprudência n.º 8/2022 diz, textualmente, que “[se exige] que o intermediário financeiro preste uma informação detalhada e verdadeira sobre o tipo de investimento que propõe ao investidor, designadamente, dando-lhe conta de a restituição, quer do montante investido, quer dos juros contratados depender sempre da solidez financeira da entidade emitente e que não há fundo de garantia nem mecanismos de proteção contra eventos imprevisíveis”.

[21] A fundamentação do acórdão de uniformização de jurisprudência n.º 8/2022 diz, textualmente: “Isto significa que o intermediário financeiro deve informar o investidor que o risco de não retorno do capital investido corre por conta do cliente (investidor), não estando o Banco obrigado a restituir-lhe o valor investido nem a pagar-lhe os juros respetivos, com capitais próprios, tendo sempre em mente que para certo tipo de cliente (investidor) a garantia do reembolso do capital investido é essencial”.

[22] A fundamentação do acórdão de uniformização de jurisprudência n.º 8/2022 diz, textualmente, que o intermediário financeiro deve “informar o cliente que não poderá levantar o capital e respetivos juros quando assim entender, tornando claro o sentido do endosso como mecanismo de transmissão — desmobilização do investimento — do produto”.

[23] Cujo teor é o seguinte: “6. […] o segundo Réu, gerente do BPN na agência da ..., contactou o Autor pedindo-lhe que se dirigisse ao Balcão do Banco, pois queria falar com ele porque tinha uma proposta interessante para lhe fazer. 7. Em dia que não pode precisar mas no mês de Setembro de 2004, o Autor, dirigiu-se à referida agência com vista a informar-se da proposta que o referido gerente do Banco tinha para lhe fazer, tendo-lhe sido comunicado que poderia proceder ao resgate daquela sua aplicação financeira para aplicar num outro programa de aplicação financeira que lhe traria uma maior rentabilidade e detinha a mesma segurança que um depósito a prazo, com garantia de capital a 100% (cem por cento), tal como o depósito a prazo”.

[24] Cf. factos dados como provados sob os n.ºs 7 e 9.

[25] Cf. facto dado como provado sob o n.º 7.

[26] Cf. facto dado como provado sob o n. 42.