Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
134/15.7YFLSB
Nº Convencional: SECÇÃO DO CONTENCIOSO
Relator: JOÃO TRINDADE
Descritores: PRINCÍPIO DO ACUSATÓRIO
PROCESSO DISCIPLINAR
REENVIO PREJUDICIAL
LIBERDADE DE EXPRESSÃO
DEVER DE CORRECÇÃO
SUBSIDIARIEDADE
UNIÃO EUROPEIA
DIREITO COMUNITÁRIO
INEXIGIBILIDADE
PARTICIPAÇÃO
SEGREDO DE JUSTIÇA
REAPRECIAÇÃO DA PROVA
PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
JUIZ PRESIDENTE
JUIZ
DELIBERAÇÃO DO CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA
INCONSTITUCIONALIDADE
USURPAÇÃO DE PODER
AUDIÊNCIA PRÉVIA
INFRACÇÃO DISCIPLINAR
PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE
MEDIDA DA PENA
DISCRICIONARIEDADE TÉCNICA
APOSENTAÇÃO COMPULSIVA
Data do Acordão: 06/23/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO CONTENCIOSO
Decisão: JULGADO IMPROCEDENTE O RECURSO
Área Temática:
DIREITO ADMINISTRATIVO - ACTO ADMINISTRATIVO ( ATO ADMINISTRATIVO ) - PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO / INVALIDADE DO ACTO ADMINISTRATIVO ( INVALIDADE DO ATO ADMINISTRATIVO ) - PROCESSO ADMINISTRATIVO / RECURSOS JURISDICONAIS.
DIREITO CONSTITUCIONAL - DIREITOS E DEVERES FUNDAMENTAIS / DIREITOS, LIBERDADES E GARANTIAS PESSOAIS - ORGANIZAÇÃO DO PODER POLÍTICO / PRINCÍPIO DE SEPARAÇÃO DE PODERES.
ORGANIZAÇÃO JUDICIÁRIA - ESTAUTOS PROFISSIONAIS - MAGISTRADOS JUDICIAIS.
Doutrina:
- Ettore Morone, "Impiego Publico", Novissimo Digesto Italiano, III, Unione Tipografico, Editore Torinense, 275.
- Freitas do Amaral, Direito Administrativo, III Vol., 295.
- Marcelo Caetano, Manual de Direito Administrativo.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO NOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS (CPTA): – ARTIGOS 150.º, N.º4, 192.º.
CÓDIGO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO (CPA): - ARTIGO 133.º, N.º 1 E 2, AL. A).
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA (CRP): -ARTIGOS 32.º, N.º1, 37.º,111.º.
ESTATUTO DOS MAGISTRADOS JUDICIAIS (EMJ): - ARTIGOS 82.º, 85.º, N.º1, 90.º, 95.º, N.º1, 96.º, 117.º, 122.º, 131.º.
LEI DA ORGANIZAÇÃO DO SISTEMA JUDICIÁRIO (LOSJ): - ARTIGO 94.º, N.º8.
LEI GERAL DO TRABALHO EM FUNÇÕES PÚBLICAS (LGTFP): - ARTIGO 206.º, N.º1.
Legislação Comunitária:
TRATADO DA UNIÃO EUROPEIA: - ARTIGO 6.º, N.º1.
Referências Internacionais:
CONVENÇÃO EUROPEIA DOS DIREITOS DO HOMEM (CEDH): - ARTIGO 10.º.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃO DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL:
-N.º 33/2002, DE 21-1-2002, EM WWW.TRIBUNALCONSTITUCIONAL.PT .
Sumário :

I -    A estrutura acusatória do processo penal (art. 32.º, n.º1 da CRP) não tem aplicação no domínio do processo disciplinar, no qual garantido aos arguidos o direito de defesa e o direito de audiência prévia, não padecendo, por isso, de inconstitucionalidade o disposto nos arts. 117.º e 122.º, ambos do EMJ.

II - O vício da usurpação de poderes consiste na prática por um órgão administrativo de um acto incluído nas atribuições de um outro poder (respeita, portanto, à lógica da separação de poderes).

III - A recolha, por parte do juiz presidente, de elementos (o que compreende o acesso aos processos e a obtenção de dados informatizados a eles relativos) destinados a comprovar as condutas do recorrente insere-se no âmbito do acompanhamento da actividade do tribunal que àquele compete (n.º 8 do art. 94.º da LOSJ), sendo que é irrelevante a forma pela qual o CSM (a quem aquele está vinculado a participar comportamentos com relevância disciplinar – art. 206.º da LGTFP) toma conhecimento dos factos.

IV -      Ainda que os processos penais em que o recorrente adoptou os comportamentos em causa estivessem sujeitos a segredo de justiça (o que não se comprovou), os elementos aí recolhidos continuariam a beneficiar da correspondente tutela apesar da sua integração em processo de outra natureza e de este estar ou não sujeito à existência daquele segredo.

V - Os poderes do STJ, enquanto tribunal de revista, estão limitados ao conhecimento da matéria de direito, só devendo intervir no conhecimento da matéria de facto quando constate a ocorrência de erros manifestos e grosseiros que inviabilizem a decisão correcta e rigorosa do aspecto jurídico da causa ou se depare com uma das situações previstas no n.º 4 do art. 150.º do CPTA (ex vi art. 192.º do mesmo diploma), não lhe cabendo reapreciar a matéria de facto e reavaliar a prova produzida.

VI -      A inexigibilidade de conduta diversa supõe a ocorrência de circunstâncias externas que impedem o agente de se comportar de modo diverso. Para que se pudesse afirmar que o estado clínico e anímico em que o recorrente se encontrava o impossibilitava, de forma insuperável, de cumprir o dever de justificar a falta ao serviço nos 5 dias subsequentes àquele em que ela ocorreu.

VII - A utilização de linguagem que patenteia falta de correcção, urbanidade, desmesura e desrespeito pela dignidade dos arguidos não é justificável com o recurso à liberdade de expressão e não é compaginável com o dever de correcção (que abrange as ofensas à honra e o emprego de expressões desnecessárias e não relacionadas com a finalidade subjacente), o qual postula um comportamento conforme à dignidade das funções.

VIII - O STJ só deve intervir na fixação da medida da sanção disciplinar quando detecte que, nessa tarefa, se incorreu em erro grosseiro ou se adoptaram critérios ostensivamente desajustados ou violadores de princípios gerais (como seja o princípio da proporcionalidade), posto que o juízo formulado pelo CSM se insere na margem de apreciação de que este ente dispõe, sendo os seus elementos incontroláveis.   

IX - Induzindo-se, pela gravidade da violação dos deveres funcionais e pela reiteração das condutas, que não se tratou de uma situação episódica mas de uma maneira de ser e de estar e de uma incapacidade para alterar o seu comportamento, inexistem elementos que levem a considerar que, na eleição da sanção de aposentação compulsiva, se inobservou o princípio da proporcionalidade.

X - A vinculação dos Estados Membros da União Europeia à Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia obedece ao princípio da subsidiariedade, o que significa que estes se encontram primeiramente sujeitos aos direitos fundamentais previstos nas respectivas constituições nacionais e que, quando aplicam direito da União, devem também respeitar as normas e princípios comunitários.

XI - A Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia não substitui os sistemas de protecção dos direitos fundamentais nem confere uma competência geral de intervenção nesse domínio, sendo, pois, desnecessária a pretendida suscitação do reenvio prejudicial quanto ao teor dos arts. 82.º e 96.º, ambos do EMJ.

Decisão Texto Integral:

Acordam os Juízes que integram a Secção de Contencioso do Supremo Tribunal de Justiça

1- AA, Juiz ..., imputou-se a prática, em concurso efectivo, das seguintes dez infracções disciplinares resultantes da violação dos deveres de:

a) - assiduidade, previsto no artigo 73.º, n.º 1, 2, i) e 11, da Lei 35/2014, de 20 de Junho (falta ao serviço no dia 25 de Novembro de 2014), que determinou o adiamento do debate instrutório agendado nos autos de instrução n.º 218/13.6TAARC, que correm os seus termos pela 3.ª secção de instrução criminal (...) da instância central da comarca de ...;

b) - correcção, previsto no artigo 73.º, n.º 1, 2, h) e 10.º da Lei 35/2014, de 20 de Junho, e bem assim os deveres deontológicos (impostos pela função de juiz) de respeito, consideração pela pessoa do arguido e de urbanidade, violação ocorrida no interrogatório judicial de arguido detido, que teve lugar  em 28-11-2014 no processo 396/14.7GAVLC;

c) - prossecução do interesse público e imparcialidade, previstos no artigo 73.º, n.º 1, 2, a), c), 3 e 5, da Lei 35/2014, de 20 de Junho, violação ocorrida no interrogatório judicial de arguido detido, que teve lugar  em 28-11-2014 no processo 396/14.7GAVLC;

d) - prossecução do interesse público e imparcialidade, previstos no artigo 73.º, n.º 1, 2, a), c) 3 e 5 da Lei 35/2014, de 20 de Junho, e deontológicos ligados à imparcialidade e ao respeito pelas funções da defesa e pelas competências do Ministério Público, violação ocorrida no interrogatório judicial de arguido detido, que teve lugar em 28-11-2014 no processo 396/14.7GAVLC;

e) - lealdade, previsto no artigo 73.º, n.º 1, 2, g) e 9, da Lei n.º 35/2014, de 20 de Junho, e , deontológicos de reserva e bem assim, como vertente do aludido dever de lealdade, dos ligados à consideração e promoção das funções de juiz, violação ocorrida no interrogatório judicial de arguido detido, que teve lugar  em 28-11-2014 no processo 396/14.7GAVLC;

f) - prossecução do interesse público e imparcialidade, previstos nos artigo 73.º, n.º 1, 2, a) c) 3 e 5, da Lei 35/2014, de 20 de Junho, e deontológicos de prudência, de sentido de responsabilidade e de reserva impostos ao juiz, violação ocorrida no interrogatório judicial de arguido detido, que teve lugar em 21-11-2014 no processo 389/14.4GAVLC;

g) - correcção, previsto no artigo 73.º, n.º 1, 2, h) e 10, da Lei 35/2014, de 20 de Junho, e deontológicos de respeito e de urbanidade, violação ocorrida no interrogatório judicial de arguido detido, que teve lugar em 21-11-2014 no processo 389/14.4GAVLC;

h) - prossecução do interesse público e imparcialidade, previstos nos artigo 73.º, n.º 1, 2, a), c), 3 e 5, da Lei 35/2014, de 20 de Junho, violação ocorrida no interrogatório judicial de arguido detido, que teve lugar em 21-11-2014 no processo 389/14.4GAVLC;

i) - correcção, previsto no artigo 73.º, n.º 1 e 2, h) e 10, da Lei n.º 35/2014, de 20 de Junho, e os deontológicos de respeito e urbanidade que se lhe impunham enquanto magistrado judicial, violação ocorrida na diligência de inquirição de testemunhas, realizada em 23-10-2014 no processo 1662/13.4TAVFR;

j) - prossecução do interesse público e imparcialidade, previstos nos artigo 73.º, n.º 1, 2, a), c), 3 e 5, da Lei 35/2014, de 20 de Junho, violação ocorrida na diligência de inquirição de testemunhas, realizada em 23-10-2014 no processo 1662/13.4TAVFR e através da emissão do despacho referido em 24 do enunciado dos  factos.

Infracções puníveis,

a primeira delas, com multa e

as demais com aposentação compulsiva, e, em cúmulo, com a sanção de aposentação compulsiva [artigos 81.º, 82.º, 85.º, n.º 1, b) e f), 87.º, 90.º, n.º 1, 96.º d), 96.º e 99.º do EMJ, e 73.º, 183.º e 189.º da Lei 35/2014, de 20 de Junho] (fls. 213 a 247).

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2-Notificado da deliberação do Conselho Plenário do Conselho Superior da Magistratura (CSM), de 6 de Outubro de 2015, que decidiu aplicar-lhe a pena disciplinar aposentação compulsiva ([1]), veio dela interpor recurso contencioso .
3 - Para tanto e em síntese invocou
- Inconstitucionalidade dos artigos 117º e 122º EMJ na interpretação acolhida na deliberação recorrida no sentido de ser admissível que o mesmo Senhor Inspector que deduz a acusação em processo disciplinar pode intervir no processo disciplinar na fase de defesa e elaboração de relatório final, como sucedeu nos autos, por violação do artº 32º, n.s 1, 2 e 5 CRP.
- Nulidade da participação disciplinar já que a mesma foi elaborada pelo Presidente da Comarca de .... Para efeito dessa participação disciplinar foram consultados os autos de processo penal respectivos, incluindo a audição de diligências realizadas no âmbito desses autos, pelo Exmo Senhor Juiz Presidente da Comarca de ... e/ou pelo Exmo Senhor Juiz Coordenador das Secções da Comarca de ... sitas no Município de .... Ora, a consulta dos referidos autos e audição dos registos magnetofónicos de diligências realizadas no âmbito desses autos, não é da competência legal atribuída a esses Exmos Senhores Magistrados. como bem se alcança dos arts. 94º e 95º LOS]. Por outro lado, a consulta desses mesmos autos e audição de registos áudio de diligêncías processuais ofendeu o disposto nos citados arts. 88º e 89º CPP.
-Violação do direito à liberdade de expressão
- Reenvio Prejudicial -Considerando que o STJ é a única e a mais alta instância que pode apreciar o caso dos autos é obrigatório reenvio prejudicial com vista a apreciar a conformidade  dos artigos 82º e 96º do EMJ  com o Direito Comunitário – artº 267º, al. b) TUE.

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4- Cumprido o art. 174º do EMJ, na resposta o CSM pugnou pela improcedência do recurso interposto, nos seguintes termos em síntese:
Quanto á questão da inconstitucionalidade das normas estatutárias que concedem que o mesmo instrutor deduza a acusação em processo disciplinar e assuma a direcção da defesa e a elaboração do relatório final.
O artigo 32º, 1, 2 e 5, da Constituição da República Portuguesa, que condensa os mais importantes princípios do processo penal, designadamente a estrutura acusatória do processo criminal, não estende seu âmbito de aplicação a todo e qualquer processo sancionatório.
Por isso, a propósito dos procedimentos disciplinares, a jurisprudência constitucional tem unanimemente defendido que os direitos de audiência e defesa previstos naquela norma constitucional não atraem o regime do processo criminal para todos os demais ramos do direito sancionatório e, em particular, para o processo disciplinar([2]). Embora a estrutura acusatória do processo penal vise garantir a isenção, independência e imparcialidade da decisão judicial, pressupondo que o julgador não tenha funções de investigação e de acusação, essa exigência constitucional não tem aplicação ao processo disciplinar e nem sequer ao processo contraordenacional.
A Constituição da República Portuguesa (CRP), nesses tipos de processos, tem somente em vista assegurar os direitos de audiência e de defesa do arguido[3]. E só poderá haver um juízo negativo de constitucionalidade quando qualquer tipo de sanção, contraordenacional, administrativa, fiscal, laboral, disciplinar ou qualquer outra, é aplicada sem prévia audição do arguido (direito de audição) e sem lhe conferir condições para se defender das imputações que lhe são feitas (direito de defesa), apresentando meios de prova e requerendo a realização de diligências tendentes a apurar a verdade([4]).
Ainda assim, na estrutura do procedimento disciplinar dos magistrados judiciais verifica-se um corte autêntico entre a entidade que acusa e a que decide. O instrutor deduz acusação (artigo 117.º do EMJ), dirige a fase da defesa e, após a sua finalização, elabora o relatório em que propõe ao CSM a sanção que reputa adequada aos factos que tem por apurados (artigo 122.º do EMJ).
Nesse relatório, o instrutor exara os factos que considera provados, a sua qualificação e a sanção aplicável, mas a sua estrutura não tem natureza decisória. Constitui somente uma proposta que serve de base à decisão do CSM, único órgão a quem compete proferir a decisão final, emitindo a pertinente deliberação sancionatória ou de arquivamento (artigo 123.º do EMJ).
Vale por dizer que a proposta do instrutor, ínsita ao relatório final, não constitui o ato administrativo, a decisão; é apenas a proposta submetida à apreciação do órgão decisor, que poderá aceitar ou rejeitar o conteúdo explanativo ou conclusivo do relatório, pois a ele se não encontra vinculado.
Não se antevê qualquer válida razão para duvidar da imparcialidade da decisão deliberativa, proferida pelo plenário do CSM, única entidade com competência para decidir o resultado final do procedimento disciplinar – o arquivamento ou o sancionamento. O instrutor não tem capacidade decisória autónoma, limitando-se a emitir parecer/proposta que o órgão decisor aceita, rejeita, arquiva ou aplica diversa sanção disciplinar, sem sustentabilidade do apontado juízo negativo de constitucionalidade.
No que concerne à nulidade da participação disciplinar considera o recorrente que é nula porque o Senhor Presidente do Tribunal Judicial da Comarca de ... e o Senhor Juiz Coordenador das secções da comarca sedeadas no município de ... consultaram os processos penais sem que estivessem legitimados a fazê-lo. Tratando-se de actos submetidos ao regime de publicidade previsto nos artigos 88º e 89º do CPP, não houve participação disciplinar de qualquer dos intervenientes nos actos.
Não é seguro, por não resultar dos autos, que o Senhor Juiz Presidente do Tribunal Judicial da Comarca de ... e o Senhor Juiz Coordenador das secções sedeadas no município da ... tenham acedido aos inquéritos em causa para obter as informações e os elementos ínsitos ao processo disciplinar. Aceita-se, contudo, que o eventual acesso aos processos para documentar a participação disciplinar não está expressamente previsto nas competências do juiz presidente da comarca e do magistrado judicial coordenador, mas é inquestionável que o Ex.mo Senhor Juiz Presidente do Tribunal Judicial da Comarca de ..., ao tomar conhecimento das condutas do Senhor Juiz, ficou vinculado a participar ao CSM os factos com relevância disciplinar (artigo 206.º, 1, da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LGTFP)[5] ex vi artigo 131.º do EMJ).
Como se aceita que, documentando as participações, foram apresentadas peças processuais extraídas dos identificados inquéritos em curso, incluindo gravações de diligências presididas pelo Senhor Juiz. Embora esteja excluída ao juiz presidente do tribunal de comarca qualquer intervenção de natureza jurisdicional, cabe-lhe o acompanhamento da actividade do tribunal e dos juízes (n.º 8 do citado artigo 94.ºda Lei da Organização do Sistema Judiciário[6]).
Actividade de acompanhamento que pressupõe, necessariamente, o acesso aos processos da comarca e à recolha dos respectivos dados informatizados, o que repele a convocação do regime dos artigos 86.º a 90.º do Código de Processo Penal (CPP), que disciplina o acesso aos processos de pessoas “alheias” ao sistema judicial. Ora, os magistrados em causa não são estranhos à actividade de consulta e exame de qualquer processo judicial da sua comarca.
Outrossim, admitindo que os processos referidos estivessem submetidos ao regime de segredo de justiça, todos os que se relacionaram com qualquer elemento do processo ficaram sujeitos às prescrições correspondentes. De facto, os elementos recolhidos no processo penal e que beneficiem do regime de segredo de justiça continuam a beneficiar da tutela inerente a esse regime, apesar da sua integração em qualquer outro processo, ainda que de diversa natureza, independentemente de o mesmo estar ou não sujeito à existência de segredo de justiça[7]. Tudo a rebater a sinalizada invalidade da participação disciplinar.
No que diz respeito à errónea apreciação da matéria de facto   o impugnante atribui à deliberação impugnada errónea apreciação da matéria de facto, defendendo que a matéria de facto apurada sob os n.ºs 25, 45, 67, 68 e 69 a 84º deve ser dada por não provada, por contrariar as regras da experiência comum. Sustenta que a alteração de humor é provocada pelos medicamentos e a linguagem usada é simples com o fito de ser entendida por pessoas simples, correspondendo ao estilo adoptado por muitos outros magistrados.
A impugnação contenciosa do ato administrativo em causa, consubstanciado na sanção disciplinar aplicada ao Senhor Juiz, está circunscrita à sua anulação, declaração de nulidade ou de inexistência, sendo vedado reapreciar o seu mérito para o substituir por outra decisão [artigo 50.º, n.º 1, do Código de Processo dos Tribunais Administrativos (CPTA)][8], apenas legitimando indagar se a deliberação impugnada obedeceu às exigências externas da ordem jurídica ou se afronta alguns dos princípios de direito administrativo, sem imisção na conveniência ou oportunidade da actuação do órgão administrativo.
O regime de recurso das deliberações deste CSM (artigos 168º a 178º do EMJ) tem de conjugar-se com a previsão do CPTA, que exclui dos poderes de apreciação dos tribunais administrativos, no respeito pelo princípio da separação e interdependência de poderes, a conveniência ou oportunidade da atuação da administração, permitindo-lhes apenas julgar do cumprimento das normas e princípios jurídicos que a vinculam (artigo 3º, 1).  
Asserção decorrente da jurisprudência do STJ, que vem decidindo no sentido de que essa norma «restringe a atuação dos tribunais administrativos à apreciação do cumprimento das normas e princípios jurídicos que vinculam a administração, e não da conveniência ou oportunidade da sua atuação», preservando dos poderes de condenação dos tribunais administrativos os «espaços de valoração próprios do exercício da função administrativa», de forma a que a «impugnação de um ato administrativo tem por objecto a anulação ou a declaração de nulidade ou inexistência desse ato»[9].
Em função do estatuído no artigo 192.º do CPTA, o recurso das deliberações do CSM, sendo actos formalmente administrativos, é regulado pelas normas que disciplinam o recurso de revista para o STA e, supletivamente, pelo disposto no Código de Processo Civil, regime que restringe o conhecimento dos tribunais de revista, como é o caso do STJ, ao conhecimento da matéria de direito e só admite reapreciação da matéria de facto quando a entidade administrativa tenha dado como provado um facto para o qual não tenha produzido a prova legalmente indispensável para o efeito ou tenha desrespeitado normas que fixem a força probatória dos meios de prova (artigo 150.º, 4, in fine, do CPTA).
Tem sido esse o sentido uniforme da jurisprudência do STJ ao decidir que, enquanto tribunal de revista, tem, por via de regra, os seus poderes de cognição limitados a matéria de direito, só se podendo imiscuir no conhecimento de matéria de facto quando ocorram erros manifestos e grosseiros que impossibilitem uma decisão correta e rigorosa do aspeto jurídico da causa. Deste modo, com excepção de erros patentes, manifestos ou grosseiros, não compete ao STJ proceder à reapreciação da matéria de facto que o órgão administrativo deu por provada, seja no sentido da exclusão de factos que, de acordo com uma diferente leitura ou valoração da prova produzida, foram incorrecta ou indevidamente considerados como provados, seja no sentido inverso, isto é, na não inclusão de matéria de facto alegada pelo arguido[10].
Parece, pois, dever assentar-se que «a suficiência da prova e da matéria de facto em que se fundamenta a decisão punitiva em processo disciplinar pode ser objecto de recurso contencioso, baseando-se a apreciação da suficiência na prova disponível no processo disciplinar, tanto na fase de instrução como na fase de defesa. No entanto, o controlo da suficiência probatória não deverá, como objecto de recurso contencioso, consistir na reapreciação e em nova e diferente convicção perante os elementos de prova constantes do processo, mas antes na apreciação da razoabilidade e coerência da relação entre os factos que a entidade recorrida considerou provados e os elementos de prova que lhe serviram de fonte de convicção, no que respeite aos factos delimitados pela acusação disciplinar ou incluídos no modelo pertinente de defesa»[11].
Jurisprudência que converge com o decidido pelo Pleno do Supremo Tribunal Administrativo (STA), quando decide: «O recurso contencioso não constitui uma renovação ou revisão do processo disciplinar, pelo que é pela prova neste produzida que deverá conhecer-se da sua regularidade, da prática das faltas imputadas ao arguido e da qualificação jurídica das apuradas»[12].
Portanto, nesta sede de impugnação contenciosa da deliberação do CSM não caberá ao STJ reapreciar a factualidade nela fixada, salvo para corrigir contradições ou suprir insuficiências que inviabilizem a rigorosa decisão do aspeto jurídico da causa [artigo 682.º do novo Código de Processo Civil (NCPC)], o que, antecipando, não se verifica. O impugnante contesta o juízo formulado sobre as provas e esse juízo está excluído à sindicabilidade do STJ.
Não são apontadas contradições ou incoerências nos factos fixados ou insuficiência das provas, mas apenas uma evidente discordância quanto à valoração que é feita dos factos apurados, à não valoração que outros amparariam e ao desmerecimento de alguma matéria da defesa. Em suma, insurge-se contra o juízo valorativo formulado na deliberação, juízo que, itera-se, não é sindicável.
A prova produzida foi apreciada à luz do princípio da livre apreciação da prova, numa apreciação crítica suportada pelas regras da experiência comum. A experiência quotidiana surge da observação empírica de determinados fenómenos ou práticas, a respeito das quais se vão gerando consenso, a tal ponto que a máxima da experiência corresponde a uma regra extraída de casos semelhantes. É a experiência que permite formular um juízo de relação entre factos, uma inferência que permite afirmar que uma determinada categoria de casos é normalmente acompanhada de uma outra categoria de factos.
Parte-se do pressuposto de que, em casos semelhantes, existe um idêntico comportamento humano que permite afirmar um determinado facto histórico não com plena certeza, mas como uma ampla possibilidade. Referências que, transponíveis para a hipótese de indagação da vontade subjacente à culpa, têm implícitas a afirmação de que, face às concretas circunstâncias, a experiência comum, ou a experiência de vida do cidadão normal, se infere, sem dúvida, a consciência da omissão do cumprimento de um dever[13].
Daí que a contextualização da crueza dos factos com um conjunto de valorações que preenchem e enquadram a imprescindível densificação disciplinar do quadro factual apurado leva a ajuizar pela culpa do Senhor Juiz na assunção de condutas que minam a  confiança dos cidadãos no sistema de justiça, sustentada pela conduta ética dos juízes, a quem se exigem determinados standards de comportamento, tanto dentro como fora do tribunal, «manifestando sentimentos de honra que imponham ao público sentimento de respeito pela sua profissão»[14].
Reconhecendo que recai sobre a administração o ónus de reunir, no processo disciplinar, as provas indispensáveis para a decisão a proferir, ao invés do que afirma o impugnante, também não foi desrespeitado o princípio in dubio por reo, válido em matéria probatória, do qual decorre que a decisão deve ser favorável ao arguido sempre que se não puder formular um juízo de certeza sobre a prática dos factos imputados.
Só que, em face da prova coligida no processo disciplinar, não houve dúvidas quanto à realidade dos factos nem qualquer situação de incerteza que convocasse tal princípio. Respeitadas as garantias de audiência e defesa e o princípio de presunção de inocência, o instrutor do processo disciplinar e o decisor gozam de ampla margem de liberdade na apreciação da prova, decidindo em função da sua livre convicção. E, na valoração das diversas provas produzidas, concatenadas com as regras da experiência comum, a administração concluiu no sentido exposto na deliberação, numa visão e avaliação das provas que não corresponde à do impugnante, nomeadamente quanto à compatibilidade dos seus comportamentos com o estado de alcoolemia[15]. Ademais, as considerações tecidas pelo impugnante traduzem meras conjecturas e apreciações subjectivas.
Pelo menos quanto aos factos essenciais, normativamente relevantes, é patente a suficiência da prova e da matéria de facto em que se fundamenta a decisão punitiva. Ainda que assim se não entendesse, o controlo da suficiência probatória pelo STJ não pode consistir na reapreciação da prova nem na formulação de nova e diferente convicção perante os elementos de prova constantes do processo. Só pode remeter-se à apreciação da razoabilidade e coerência da relação entre os factos considerados provados e os elementos de prova que lhe serviram de fonte de convicção, no que respeite aos factos relevantes delimitados pela acusação disciplinar ou incluídos no modelo pertinente de defesa.[16].
Vale por dizer que ao STJ é vedado sindicar a apreciação e a valoração da prova produzida, mas apenas, num juízo de legalidade, averiguar se o “órgão da administração, na apreciação que realizou e na factualidade que fixou, teve por base elementos probatórios que, conjugados entre si e à luz do princípio da livre apreciação da prova, são suscetíveis de conduzir a tal fixação, nos precisos termos em que o foi[17]. Em suma, o STJ só pode aferir do cumprimento dos princípios e regras que presidem à apreciação da prova e ponderar da razoabilidade do veredicto factual, ficando afastada a possibilidade de efetuar uma reapreciação dos elementos de prova que constam do processo para fundar e dar por demonstrada uma nova versão.
Tal como tem sido reafirmado pela jurisprudência do STJ, o mesmo “não pode substituir-se ao Órgão Administrativo competente na aquisição dos factos – material probatório -, a considerar no acto impugnado; apenas tem competência para anular a decisão recorrida, a fim de que a autoridade recorrida efectue algum ato de instrução do procedimento administrativo e, a seguir, reaprecie o caso[18].
Também em sentido similar, foi confirmado que o “STJ, enquanto tribunal de revista, tem, por via de regra, os seus poderes de cognição limitados a matéria de direito, só se podendo imiscuir no conhecimento de matéria de facto quando ocorram erros manifestos e grosseiros que impossibilitem uma decisão correcta e rigorosa do aspecto jurídico da causa. Deste modo, com exceção de erros patentes, manifestos ou grosseiros, não compete ao STJ proceder à reapreciação da matéria de facto que o órgão administrativo teve por provada, seja no sentido da exclusão de factos que, de acordo com uma diferente leitura ou valoração da prova produzida, foram incorrecta ou indevidamente considerados como provados, seja no sentido inverso, isto é, no da inclusão de matéria de facto que acabou por não ficar vertida na decisão da autoridade administrativa[19].
No que respeita á inexigibilidade entende o impugnante que não praticou infracção disciplinar decorrente da falta ao serviço, porque foi a sua doença que o impediu de comparecer ao serviço e de justificar a falta. Estranha-se tal afirmação, porque se excluiu o imprescindível nexo de imputação da falta dada ao serviço no dia 25-11-2014, que deu causa ao adiamento do debate instrutório agendado para as 11:00 horas desse dia, nos autos de instrução 218/13.6TAARC, da 3.ª secção de instrução criminal, sedeada em ..., da instância central da comarca de ....
Quanto à violação da materialidade do dever de assiduidade, a deliberação impugnada considerou verificada a circunstância dirimente da responsabilidade disciplinar de não exigibilidade de conduta diversa (artigo 190.º, 1, e), da LGTFP). Vale por dizer que, factualmente demonstrado que foi o estado de doença e debilidade física do Senhor Juiz que o impossibilitou de presidir à diligência designada, ficou excluída a sua culpa.
Considerou, no entanto, que impendia sobre o Senhor Juiz o dever funcional de comunicação da ocorrência da falta injustificada ao CSM ou ao Tribunal da Relação do ..., para sujeição às consequências legais, pois inexistem mecanismos de controlo directo da assiduidade dos juízes. Ao invés, remeteu-se ao silêncio e ocultou o facto, livrando-se das inerentes consequências, designadamente remuneratórias.
Não podia o Senhor Juiz deixar de estar ciente das suas responsabilidades e fidelidade para com a administração da justiça e das consequências para si advenientes da ausência injustificada ao serviço, pelo que a sua conduta que preenche a violação do dever de lealdade e dos deveres de zelo e de prossecução do interesse público.
Igualmente se enjeita que o estado clínico e anímico em que actuou integra a causa de exculpação de  inexigibilidade de outra conduta. A exigência ética e funcional da judicatura não se compadece com condutas como as descritas, com reflexos negativos no decurso das diligências e nos direitos e garantias processuais conferidos aos arguidos.
Não obstante a comprovação da sua submissão a tratamento com fármacos do foro psiquiátrico, não ocorre qualquer circunstância dirimente da sua responsabilidade disciplinar. A inexigibilidade de conduta diversa supõe a presença de circunstâncias externas que não deixam ao agente a possibilidade de se comportar de modo diverso[20]. Ora, as suas atitudes e ditos não são compatíveis com a mera ingestão de medicamentos e, ainda menos, a ponto de repelir a sua culpa.
Quanto ao erro de direito e violação do direito à liberdade de expressão não se questiona que o Senhor Juiz, enquanto cidadão, goza dos direitos correspondentes e, portanto, ao direito de liberdade de expressão. Na verdade, a este respeito dispõe o artigo 37.º da CRP, n.º 1, que «todos têm o direito de exprimir e divulgar livremente o seu pensamento pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, bem como o direito de informar, de se informar e de ser informados, sem impedimentos nem discriminações».
Reconhecimento que também tem assento no ordenamento jurídico internacional, como no artigo 10.°, n.° 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH), segundo o qual «Qualquer pessoa tem direito à liberdade de expressão. Este direito compreende a liberdade de opinião e a liberdade de receber ou de transmitir informações ou ideias sem que possa haver ingerência de quaisquer autoridades públicas e sem considerações de fronteiras (…)».
Mais entende o Senhor Juiz que a linguagem usada na conversação com os arguidos se reveste da simplicidade necessária às pessoas simples, num estilo comum a muitos outros magistrados. Posição surpreendente, porque as expressões exaradas nos factos provados estão muito distanciadas de uma linguagem simples; antes revelam uma linguagem que, podendo ser inaceitável a um cidadão comum, encerra uma patente falta de correção, urbanidade e desrespeito pela dignidade dos arguidos, cujos direitos processuais inobservou.
O bem jurídico da personalidade humana encontra-se, juscivilisticamente, tutelado como um direito autónomo. O  artigo 70.º, n.º 1, do Código Civil, dispõe que «a lei protege os indivíduos contra qualquer ofensa ilícita ou ameaça de ofensa à sua personalidade física ou moral ».
Ora, o exercício da liberdade de expressão do Senhor Juiz não pode deixar de estar limitado pelos direitos de personalidade dos arguidos e pelos direitos processuais que lhes são conferidos em processo criminal, mormente quando viola os deveres funcionais que lhe estão acometidos, designadamente o da imparcialidade, colocando em causa a dignidade da função e o interesse público que lhe subjaz.
As afirmações do Senhor Juiz são nitidamente lesivas da dignidade dos arguidos e não servem o seu direito à liberdade de expressão, sempre comprimível pelos deveres funcionais que resultam do estatuto de juiz, nomeadamente a obediência à CRP e à lei. Colocou em causa os direitos fundamentais daqueles que recorrem à justiça e olvidou que a justiça é uma instituição fulcral para qualquer sociedade democrática, degradando a imagem do juiz e deslegitimando a sua actuação.
É a violação de deveres que dá forma à infracção disciplinar e não há quaisquer dúvidas quanto ao dano que o Senhor Juiz causou na capacidade funcional da administração da justiça. Embora vigorando no exercício do direito disciplinar o princípio da oportunidade, que traduz a discricionariedade da acção administrativa, não se olvida que a discricionariedade não é indiferença normativa e à ordem jurídica interessa o efectivo e correto exercício dos seus poderes sancionatórios. E o espaço de conformação administrativa não encontra aqui cabimento. A expressividade da sua conduta e seus efeitos danosos, a gravidade da sua actuação, a ostensiva violação dos seus deveres funcionais corporizam a infracção disciplinar.
No que diz respeito á violação do princípio da proporcionalidade considera o recorrente que houve violação do princípio da proporcionalidade, de assento constitucional (artigos 266.°, 2, da CRP), segundo o qual a actividade da administração pública, no exercício dos seus poderes discricionários, deve prosseguir os seus fins legais justificadores da concessão destes poderes, os interesses públicos, primários e secundários, segundo o princípio da justa medida, adoptando, dentre as medidas necessárias e adequadas para atingir esses fins e prosseguir esses interesses, aquelas que impliquem menos gravames, sacrifícios ou perturbações à posição jurídica dos administrados[21].
No campo do direito administrativo sancionatório, em concreto no âmbito do procedimento disciplinar, a sindicância da proporcionalidade em sede contenciosa confina-se à apreciação da factualidade fixada para indagar se lhe foi dado um relevo ostensivamente desadequado, traduzido na punição, na escolha e medida da sanção aplicada.
E essa desadequação é manifesta quando a administração se socorre de critérios estranhamente exigentes, em violação grosseira dos princípios que regem a actividade administrativa em matéria disciplinar. Aplicando estes conceitos ao caso em apreço, crê-se que nenhuma censura há a fazer à deliberação impugnada, nem na punição nem na medida da sanção[22].
Também neste âmbito tem a jurisprudência do STJ tem balizado a sua intervenção só aos casos de erro manifesto, crasso ou grosseiro ou de adopção de critérios ostensivamente desajustados ou violadores de princípios, posto que o juízo emitido pelo CSM a esse respeito se insere na ampla margem de apreciação e avaliação que lhe cabe enquanto órgão administrativo[23].
A doutrina e a jurisprudência constitucional consideram que o princípio da proporcionalidade se desdobra em três subprincípios: princípio da adequação (as medidas restritivas de direitos, liberdades e garantias devem revelar-se como um meio para a prossecução dos fins visados, com salvaguarda de outros direitos ou bens constitucionalmente protegidos); princípio da exigibilidade (essas medidas restritivas têm de ser exigidas para alcançar os fins em vista, por o legislador não dispor de outros meios menos restritivos para alcançar o mesmo desiderato); princípio da justa medida, ou proporcionalidade em sentido estrito (não poderão adotar-se medidas excessivas, desproporcionadas para alcançar os fins pretendidos)[24].
O passado disciplinar do Senhor Juiz e a gravidade os factos apurados nestes autos de processo disciplinar revelam, segundo os objetivos finalistas veiculados pelo artigo 96º do EMJ, uma definitiva incapacidade de adaptação às exigências da função. E não ocorrendo um manifesto juízo de desadequação do sancionamento, deve considerar-se que o juízo emitido pelo CSM se insere na ampla margem de liberdade de apreciação e avaliação do órgão administrativo, na chamada discricionariedade técnica ou administrativa[25].
Na ponderação da concreta sanção foram tidos em consideração o significado e a gravidade dos factos provados, o respectivo contexto, os antecedentes disciplinares, as suas condições profissionais e os efeitos nefastos que as suas condutas têm repercutido na imagem do sistema de justiça e na deslegitimação dos juízes. Tudo a justificar o produzido juízo de inadaptação funcional, na fixação de uma medida sancionatória fundada no interesse público da administração da justiça e proporcionada à gravidade dos factos.
Por fim e no que respeita ao reenvio prejudicial considera o recorrente que a infracção disciplinar em causa contende com a dignidade da função e com aspectos de ordem ética e moral, o que não obstou a que o Senhor Juiz requeresse o reenvio prejudicial quanto à interpretação dada aos artigos 82º e 96º do EMJ, por violadora dos Tratados e cartas do ordenamento jurídico comunitário, bem como quanto ao segmento relativo ao direito à liberdade de expressão e ao direito a um processo justo e equitativo.
O artigo 6.º, n.º 1, do Tratado da União Europeia, alterado pelo Tratado de Lisboa, estabelece que a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia é juridicamente vinculativa para os Estados-Membros na observância do princípio da subsidiariedade, a significar que estes se encontram vinculados aos direitos fundamentais garantidos pelas respetivas constituições nacionais e, quando aplicam o direito da União, devem também respeitar as normas e princípios comunitários.
Destarte, a Carta não confere uma competência geral de intervenção em matéria de direitos fundamentais. Os Estados-Membros têm os seus próprios sistemas de protecção dos direitos fundamentais e a Carta não os substitui. São os tribunais nacionais que devem assegurar o respeito pelos direitos fundamentais, sem necessidade de qualquer reenvio prejudicial quanto às questões de direito suscitadas. Medida em que falece a pretensão do impugnante.

Na defluência destes considerandos, sempre salvaguardando a melhor apreciação dos Venerandos Juízes Conselheiros desse Supremo Tribunal de Justiça, o Conselho Superior da Magistratura conclui pela improcedência da impugnação.

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5- Cumprido o art. 176º do EMJ  a Digna Magistrada do Ministério Público, junto deste Tribunal, emitiu parecer no sentido de ser mantida a deliberação recorrida e, consequentemente, improcedente o recurso. 

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6- Fundamentação de facto:
- Factos provados:
1. O Senhor Dr. AA, após ter frequentado o ... Curso do CEJ, por decisão do CSM de ...-1994, foi nomeado juiz ... em regime de estágio e colocado no Tribunal Judicial da Comarca do ...;
2. Por decisão do CSM de ...-1995 foi nomeado juiz ... e colocado no ... juízo do Tribunal Judicial da Comarca do ... (auxiliar);
3. Por decisão do CSM de ...-1995 foi colocado no Tribunal Judicial da Comarca de ... (efetivo);
4. Por decisão do CSM de ...-1995 foi colocado no Tribunal Judicial da Comarca de ... (efetivo);
5. Por decisão do CSM de ...-1996 foi colocado no ... juízo do Tribunal Judicial da Comarca de ... (efetivo);
6. Por decisão do CSM de ...-1998 foi colocado no ... juízo do Tribunal Judicial da Comarca de ... (efetivo);
7. Por decisão do CSM de ...-2001 foi colocado no círculo judicial de ... (interino);
8. Por decisão do CSM de ...-2002 foi colocado no círculo judicial de ... (efetivo);
9. Por decisão do CSM de ...-2004 foi colocado na ... vara ... (efetivo);
10.  Por decisão do CSM de ...-2006 foi colocado no círculo judicial de ... (efetivo);
11.  Por decisão do CSM de ...-2014 foi colocado (Juiz ...) na ... Secção de Instrução Criminal (...) da Instância Central da Comarca de ..., onde exerce funções no presente.
12. O Senhor Juiz AA, após uma primeira notação de “Bom” (serviço prestado no Tribunal Judicial da Comarca de ...), foi sucessivamente notado de Bom com Distinção (Tribunal Judicial da Comarca de ...) e Bom com Distinção (círculo judicial de ...), encontrando-se presentemente classificado com a notação de Muito Bom (Deliberação do Conselho Permanente de ...-2009 relativa à inspeção ao serviço efetuado no círculo judicial de ..., ... vara... e círculo judicial de ...).
13. Por deliberação do CSM de ...-2015, foi aplicada ao Senhor Juiz a sanção de 100 dias de suspensão de exercício para os factos provados no processo 2012-104/PD e a sanção de 130 dias de suspensão de exercício de funções, no que respeita à infração disciplinar decorrente do processo 2014-121/PD e, em cúmulo jurídico, a sanção única de 180 (cento e oitenta) dias de suspensão de exercício de funções, pela prática, em concurso, de duas infrações ao dever de prossecução do interesse público na administração da justiça e adoção de comportamentos compatíveis com a dignidade exigível ao exercício da judicatura, previstas e punidas pelos artigos 82.º, 94.º e 104.º do EMJ.
14. No processo 2012-104/PD a sanção adveio da prática de agressões no dia 27-03-2010, pelas 20:30 horas, em ..., na sequência de acidente de viação em que interveio.
15. No processo 2014-121/PD o seu sancionamento resultou de diversificadas atitudes assumidas publicamente entre 2010 e Fevereiro de 2014, devido ao consumo excessivo de bebidas alcoólicas, facto conhecido da generalidade das pessoas da zona.
13. A deliberação foi judicialmente impugnada.
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14. Nos autos de instrução 218/13.6TAARC que correm os seus termos pela ... secção de instrução criminal (...) da instância central da Comarca de ..., afetos ao Senhor Juiz, este agendou o debate instrutório para o dia 25-11-2014, às 11:00 horas.
15. O Senhor Juiz faltou a essa diligência processual, tendo nesse dia contactado telefonicamente a secretaria da ... secção de instrução criminal e informado que “padeceu de doença súbita”, tendo dado a diligência sem efeito e procedido ao seu adiamento sine die.
16. O Senhor Juiz não apresentou justificação nem requereu a justificação da falta relativa ao dia 25-11-2014 (para todo o dia ou parte dele).
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17. Correm os seus termos pela ... secção de instrução ...(...) da instância central da Comarca de Aveiro os autos de instrução sob o n.º 1662/13.4TAVFR, afetos ao Senhor Juiz, no qual o M.P., por despacho de 30.04.2014 (cuja cópia figura a fls. 103 a 108 e que aqui se dá por integralmente reproduzida) havia determinado o arquivamento do processo, tendo a assistente requerido a abertura de instrução nos termos que figuram a fls. 109 a 119.
18. Nesses autos de instrução, em diligência realizada a partir das 15:00 horas do dia 23-10-2014, o Senhor Juiz arguido presidiu ao ato e procedeu, entre o demais, à inquirição da testemunha BB.
19. Essa inquirição decorreu nos termos que constam da ata respetiva, cuja cópia certificada figura a fls. 54 a 56 destes autos e da gravação digital então efetuada na aplicação digital em uso na 3.ª secção de instrução criminal da instância central sedeada em ..., cuja cópia certificada figura a fls. 58.
21. De entre o demais, a determinada altura (a partir de 04´20´´, ficheiro 2014023164110), o diálogo entre o Senhor Juiz e a testemunha decorreu da seguinte forma:
Juiz - O que é que fazia lá? (referindo-se à profissão exercida pela testemunha)
Testemunha – Era comercial.
Juiz – Eu não sei o que é um comercial, companheiro.
Testemunha – Era o responsável…
Juiz – Meu caro amigo, estamos aqui dois comandos dentro desta sala, eu fui oficial comando, e depois sou juiz. Não sei o que é comercial. Explique-me, explique-me, como se eu fosse um miúdo de 6 anos.
20. Alguns minutos depois (a partir de 01´12´´do ficheiro 20141023164720), após a testemunha ter declarado que se havia deslocado à ... numa missão empresarial (de ...) e aí se ter encontrado, entre o demais, com o Embaixador, representante de Portugal na ..., o diálogo travado decorreu da seguinte forma:
Juiz (interrompendo o advogado que, na altura, inquiria a testemunha) – Explique-me lá isso, o Senhor esteve com o Senhor Embaixador, foi numa, isso foi uma questão política então?   
Testemunha – Não, na altura, alguém sugeriu dentro desta missão …
Juiz – Alguém, quem?
Testemunha – … (impercetível)
Juiz – Oh Senhor BB, aqui nesta sala que aqui estamos, não há alguém, não há ninguém, não há isto ou disso. Nomes!
Testemunha – Não me pareceu relevante. Não posso dizer quem era.
Juiz – Nomes! Senhor BB, Nomes!
Testemunha – Eu não posso dizer…
Juiz – Nomes!
Testemunha – nomes … nomes, nomes, eu não sei.
Juiz (em tom de irritação/amedrontador, elevando cada vez mais o volume da voz) – Nomes! Nomes! Nomes!
21.   Nessa altura (01´50´´), ante a postura do Senhor Juiz, o Senhor advogado, Dr. CC, interrompeu o Senhor Juiz, tendo o diálogo entre ambos decorrido da seguinte forma:
Advogado - Oh Senhor Dr., eu peço desculpa, mas eu acho que o Senhor Dr. está, e se não eu dito para a ata, está a pressionar a testemunha.
Juiz – Claro que eu quero nomes.
Advogado – Mas a testemunha já disse que não sabe.
Juiz – Oh Senhor Dr. mas a testemunha é sua.
Advogado – Claro. Diz não sei o nome. Então não sabe o nome, e o Senhor Dr. continua nomes…nomes. A testemunha fica … daqui a pouco está aí (impercetível)
Juiz – Oh Senhor Dr., o Senhor é que requereu a abertura de instrução, o Senhor Dr. é que requereu a abertura de instrução.
Advogado – Naturalmente, eu nunca vi…
Juiz – Ele diz que esteve com o Embaixador.
Advogado – Senhor Dr., se não sabe o nome. Ele diz ”eu não sei o nome”. Primeiro tem que saber o nome. (…) Se não a testemunha daqui a pouco está cheia de medo e o tribunal não é um local de medo.
Juiz – Medo? Por amor de Deus!, Oh Senhor Dr. …
Advogado – Um Comando a berrar dessa forma, ainda pode ficar cheia de medo.
Juiz – Eu não estou a berrar, quem berra é o gado. Eu falo em voz alta, nomes Senhor Dr., para mim quando alguém me diz “eu falei com”, tem que me dizer o nome, não sabe o nome …
Advogado – Senhor Dr. Juiz, a pessoa que promoveu o encontro, que lhe deu a ideia “não sei o nome”, não estou a ver… (impercetível)
Juiz – Pronto, vamos à frente para o Senhor Dr. não ficar ferido nas suscetibilidades.
Advogado – Posso lhe dar o nome de duas outras pessoas que para mim foram representantes comerciais … (impercetível)
Juiz – Então, diga, diga, diga que eu vou meter a Polícia Judiciária ao barulho, diga.
22.  Após a inquirição dessa testemunha, o Senhor Juiz proferiu o seguinte despacho:
“Do depoimento da testemunha BB indicia-se que nestes autos para além daquilo que parecia um simples contrato de compra e venda, que teria sido incumprido, terá fortes indícios de tráfico de influências e crimes contra a economia.
Nesse sentido, e ao abrigo do artigo 290.º do C.P.Penal, determino que a polícia judiciária, sob expressas instruções do juiz de instrução criminal, averigue os contornos expressos em que se desenvolveram as transações objeto desta instrução.
Prazo 15 dias.
Adverte-se expressamente o OPC que a testemunha se referiu a um Embaixador do Estado Português”.
23. Nesses autos, que lhe foram conclusos, por ordem verbal, a 27-10-2014, o Senhor Juiz proferiu, nos termos que constam da cópia certificada de fls. 57, o seguinte despacho:
“Compulsados exaustivamente os autos, constata-se que se revelam anódinas as diligências que se entenderam por bem afetar à polícia judiciária.
Por conseguinte, dá-se sem efeito tal determinação.
Não existindo quaisquer outras diligências instrutórias a realizar, designo para debate instrutório o dia 18-11-2014, pelas 15h00m”.
*
24. Correm os seus termos pela secção única do DIAP de ... os autos de inquérito n.º 396/14.7GAVLC.
25. Nesse processo procedeu-se, no dia 28-11-2014, a partir das 17:00 horas, a interrogatório judicial de arguido detido, ato jurisdicional esse presidido e levado a efeito pelo Senhor Juiz Dr. AA e no qual o mesmo aparentou, face a todo o contexto em que se desenvolveu, encontrar-se sob influência de medicamentos ou de consumo excessivo de bebidas alcoólicas.
26. Esse ato processual decorreu nos termos que constam da ata respetiva, cuja cópia certificada figura a fls. 79 a 86 destes autos e da gravação digital efetuada na aplicação digital em uso na 3.ª secção de instrução criminal da instância central sedeada em ...., cuja cópia certificada figura a fls. 87.
27. A determinada altura (a partir de 01´53´´do ficheiro 20141128171447), o interrogatório decorreu da seguinte forma:
Juiz – Diga-me só uma coisa, isto tudo que eu disse é verdade ou é mentira?
Arguido – Tudo, é assim, o que eu fiz, este último processo é verdade.
Juiz – Diga-me uma coisa, tudo o que eu disse é verdade ou é mentira? Vamos começar a começar assim, a sério, que eu não estou para perder tempo, que eu fui juiz durante 8 anos em ....
Arguido – Tudo, é mentira…
Juiz – Eu conheço ... como as palmas das minhas mãos. O Senhor não me faça perder tempo, que eu não estou para perder tempo. Isto é verdade ou é mentira?
Arguido – Tudo é mentira, não é tudo verdade…
Juiz – Tudo é mentira, o Senhor não fez nada disto?
Arguido – Fiz o da agressão e de hoje, desta noite, fui eu, da agressão.
Juiz – E o resto que está aqui?
Arguido – O resto, estão-me a meter o meu nome, esse DD foi apanhado e está a meter o meu nome, e não fui eu.
Juiz – Então mandamos prender o DD. Amanhã prendo o DD. Amanhã é sábado, mas eu prendo o DD, que eu não me importo de trabalhar ao sábado, ao domingo, à segunda, à terça, à quarta, à quinta. Não faz mal, eu trabalho a qualquer hora. Diga lá, mandamos já prender o DD? Vai já de seguida. É o DD que o está a incriminar? Se é o DD que o está a incriminar, mandamos prender o DD. Não tem problema nenhum.
Arguido – Senhor Dr., Senhor Juiz, nos outros processos é, Senhor Dr. Juiz.
Juiz – O Senhor não me minta. O Senhor se começa a querer dar-me a volta, é a pior coisa que pode fazer.
Arguido – Não estou a mentir, eu não estou a mentir, Senhor Juiz.
Juiz (em voz muito alta) – Então diga, é verdade ou é mentira?  
Arguido – É mentira, os outros processos.
Juiz – Que outros processos? Mas quais outros?
Arguido – Eu não tenho conhecimento de nenhum, só tenho conhecimento do da agressão.
Juiz – Eu acabei de lhe dar conhecimento de tudo. Estive aqui a ler-lhe. Fiz por ler devagar que eu até costumo ler um bocado mais depressa, mas fiz por ler devagar. O Senhor ouviu tudo, se não percebeu, quer que lhe leia outra vez? Vai-me dar trabalho mas eu leio-lhe outra vez. O Senhor está aqui para se defender, não está aqui para ser acusado. O Senhor está aqui para se defender. Quer que eu lhe leia outra vez? Quer sentar-se aqui ao meu lado para eu lhe ler outra vez?
Arguido – Não senhora, Senhor Juiz.
Juiz – Então pronto, veja lá, não brinque comigo, não quero é que brinque comigo, que eu não tenho paciência para brincadeiras.
Arguido – Sim, senhor.
Juiz – Explique-se!
28. Alguns minutos depois (a partir de 05´02´´):
Juiz – Diga-me uma coisa, oh Senhor EE, o Senhor é de ..., não é?
Arguido – Sou de ....
Juiz – ..., e onde é que ia comprar a droga?
Arguido – Quando tenho dinheiro vou a ..., ou ao ....
Juiz – O Senhor partiu uma montra em ....
Arguido – ....
Juiz – Para ver se arranjava dinheiro para ia comprar droga a?
Arguido – Em ....
Juiz – A quem?
Arguido – Tem lá alguns que vendem.
Juiz – Em ...? Prendi lá tanta gente que andava a vender droga e ainda há lá gente a vender a droga? Sou mesmo ineficaz no meu trabalho. Mas pronto, a gente tenta. E às 4 da manhã o Senhor partia uma montra. Tirava de lá uma dúzia de tostões e àquela hora ia logo comprar droga a ..., olhe bem para mim, acha que eu acredito nisso?
Arguido – Se desse dinheiro íamos de autocarro, de manhã às 6 e tal.
Juiz – Ah, está bem, está bem, já começa a fazer mais lógica, está bem. Então conte lá mais. 
Arguido – E da agressão também fui eu. Desse senhor. Estávamos num café e estávamos num café e eu de vez em quando peço tabaco ou dinheiro ou quê a pessoas que conheço, derivado à minha situação e coiso.
Juiz – Derivado a qual situação? Não me fale por meias palavras.
Arguido – De andar agarrado.
Juiz – Oh Senhor EE, olhe bem para mim. Eu fui juiz de círculo durante 14 anos, aqui na ... e em ..., eu conheço isto tudo como a palma das minhas mãos, não me fale por meias palavras. Derivado à minha situação, derivado à minha situação e coiso… Isto está a ser gravado tudo. Não quero o que digo, quero o que o Senhor diz. Derivado da minha situação e coiso não é nada. Qual situação?
Arguido – Quando quero consumir tenho que pedir e ando a…, desenrascando-me.
Juiz – Quando o Senhor tem que consumir, rouba!
Arguido – Não, nem sempre.
Juiz (em voz progressivamente mais alta) – Quando o Senhor tem que consumir, rouba! 
Arguido – Não, que eu pego metadona agora. Estou no CAT.
Juiz – Quando o Senhor tem que consumir rouba! Não no sentido técnico-jurídico da palavra. A palavra roubo tem um sentido técnico jurídico. Eu estou a usá-la no sentido vulgar da palavra. Quando o Senhor tem que consumir, rouba! Que é o grande problema do consumo da droga. É o grande problema do consumo da droga.
29. Logo após (a partir de 08´37´´):
Juiz (em voz muito alta) – O Senhor foi ou não foi a estes sítios? Foi ou não a estes sítios? 
Arguido – Não senhora, Senhor Juiz, não fui eu, não foi a esses sítios. O da agressão e o desta noite fui eu, os outros não fui eu.
Juiz – Não foi à biblioteca? A biblioteca é ao lado do tribunal, que eu trabalhei lá 8 anos. É que o Senhor tem azar, os arguidos desta zona têm um azar tremendo. É que eu conheço esta zona como a palma das minhas mãos. Compreende? Eu conheço esta zona como a palma das minhas mãos. Compreende? Eu conheço esta zona como a palma das minhas mãos.
Arguido – Sim senhor.
Juiz – Eu conheço 99,9 % dos arguidos desta zona. Arguidos e suspeitos. Azar, a vida é assim. A vida é assim. A biblioteca é ao lado do tribunal, ..., é ou não é? 
Arguido – É sim senhor.
Juiz – Ah pronto, parece que eu estou aqui para andar, só para dizer que sou perigoso. Não sou nada perigoso. Estou velho, estou cansado. Agora não venho fazer interrogatórios à sexta-feira à tarde e não quero grupos à minha frente. O Senhor já sabe para onde é que vai, não sabe? O Senhor e aquela equipa toda de .... ... é uma zona que precisa ser moralizada. Mais alguma coisa a dizer? 
Arguido – Posso só dizer uma coisa?
Juiz – Diga.
Arguido – Eu estou para ir para tratamento, Senhor Dr. Juiz, dê-me uma oportunidade, por favor.
Juiz – Dou, há uma zona em Custóias para tratamento das pessoas que se quiserem recuperar da droga. É a chamada zona livre de drogas. Ou unidade livre de drogas. É uma zona espetacular e o Senhor lá fica espetacular. Livra-se de tudo o que for droga.
30. Posteriormente (a partir de 15´20´´), quando o interrogatório estava a ser efetuado pelo Senhor Procurador, Dr. FF:
Procurador – Senhor EE, o Senhor consome heroína, não trabalha, não é? Quanto…
Arguido – Sim, de momento estou inscrito no Centro de Emprego e recebo RSI.
Juiz (interrompendo o interrogatório) – Ai o Senhor recebe o Rendimento Social de Inserção? Ótimo, ótimo, gosto de saber essas coisas.
Arguido – Mas estou a cumprir … cursos
Juiz (em voz alta) – Quer dizer, o Senhor é toxicodependente, recebe o rendimento social de inserção, pratica furtos, agride cidadãos e anda por aí… 
Arguido – Comecei a receber agora e ando em cursos.
Juiz – E acho muito bem, nós devemos ajudar os excluídos, acho muito bem, nós devemos ajudar os excluídos. Então porque não?
Procurador – Então quanto é que o Senhor recebe por mês?
Juiz – Sabe quem é que lhe paga essa parte do rendimento social de inserção? Quanto é que o Senhor recebe? 
Arguido – 170.
Juiz – É do meu IRS que ele vai, direitinho. O IRS que eu pago todos os meses. Uma parte do meu IRS é para lhe dar de comer de beber, a si, é, é, mesmo (em voz muito alta), uma parte do meu IRS é para lhe pagar a si. Faz favor de continuar Senhor Procurador.
31.   Um pouco adiante (a partir de 17´15´´), quando o interrogatório ainda estava a ser conduzido pelo Senhor Procurador:
Procurador – Então e os 170 euros do RSI não lhe dão para a droga? Não é que seja …
Arguido – É para pagar a estadia.
Procurador – E quando não há, o Senhor pratica furtos, é? 
Juiz (interrompendo) – Claro! Senhor Procurador essa pergunta é anódina. Salvo o devido respeito, é anódina. É anódina.
Arguido – Esta noite tentei praticar.
Procurador – Mas foi a primeira vez, não é?
Arguido – Diga, senhor…
Procurador –Foi a primeira vez? 
Arguido – Não, não foi a primeira vez.
Procurador – Pronto, é só, Senhor Dr. Juiz. Ah, só mais uma questão.
Juiz – Faz favor, Senhor Dr.
Procurador – Se eventualmente o tribunal considerar que o Senhor …
Juiz (interrompendo) – Oh Senhor Dr. ele vai em prisão preventiva, já lhe adianto. Este arguido vai em prisão preventiva. Acabou. Não lhe dou chance nenhuma. 
Procurador – Se o tribunal considerar que o Senhor tem que se tratar, o Senhor consente? tratar ao vício… 
Juiz (interrompendo) – Não se trata nada, vai direitinho em prisão preventiva, este.
Procurador – Se o Sr. …
Juiz – Oh Senhor Dr. não perca tempo com a promoção, que ele vai em prisão preventiva. Eu vou decretar.
32.   Um pouco mais adiante (a partir de 19´02”):
Juiz – Sabe que o Senhor tem algumas parecenças comigo. Eu, que tenho 52 anos de idade, sou daqueles que têm um grande futuro atrás de mim. Não é à minha frente. Sou daqueles que têm um grande futuro atrás de mim. Toda a gente dizia que eu ia ser filho de um grande empresário e eu acabei nesta profissão, que é esta cova que está aqui. É um jazigo. Isto é como um jazigo. Nem tem janelas. Eu também tinha um grande futuro atrás de mim. É vida. “Q´est que tu penses”, é a vida, meu caro, é a vida.
33.   Posteriormente (a partir de 19´45”), quando o interrogatório estava a ser efetuado pela defensora do arguido, Dra. GG:
Defensora – Oh Senhor EE, é EE, não é?
Arguido – Sim senhora.
Defensora – Oh Senhor EE, o Senhor tem família, vive com alguém? 
Arguido – Não, não tenho família.
Defensora – Não tem família? Não tem pai, não tem mãe? Que é que aconteceu? 
Arguido – Perdi a minha mãe aos 9 anos, quer dizer, os meus pais. A minha mãe…
Juiz (interrompendo) – Mas morreu ou quê? Que é que lhe aconteceu?
Arguido – Foi o meu pai que matou a minha mãe.
Juiz – O seu pai matou a sua mãe?
Arguido – Sim.
Juiz – E está documentado nalgum sítio, ou é filme?
Arguido – Não percebi, peço desculpa.
Juiz – Se isso tem documentos para provar ou é filme.
Arguido – Na altura saiu no jornal, em 89.
Defensora – O Senhor tinha 9 anos então na altura.
Arguido – Sim.
Juiz – Porque é que o seu pai matou a sua mãe?
Arguido – Como?
Juiz – Porque é que matou a sua mãe?
Arguido – Não sei ao certo, ciúmes, não sei, ele era, ele depois foi dado, ele apanhou 24 anos de cadeia, foi para Custóias.
Juiz – Nesse tempo, é mentira que ele tenha apanhado 24 anos de cadeia e eu vou-lhe explicar porquê. Por que em 89 o máximo de prisão era 20 anos.
Arguido – Ele apanhou 12 a 24.
Juiz – Naquele tempo o máximo era 20 anos. Eu já era juiz nesse tempo.
Arguido – Ele depois foi dado como inimputável.
Juiz – É que vocês têm o problema. Mentem muito, sabe, e depois a gente não sabe o que é que se há-de acreditar. 
Arguido – O julgamento foi passado um ano e tal, foi o que o meu avô me disse, que ele apanhou, de 12 a 24.
Juiz – 18 a 24?
Arguido – De 12 a 24.
Juiz – Grande (impercetível). É só desgraças, vamos em frente, diga
Defensora – Olhe e então o seu pai foi preso na sequência disso e o senhor ficou com quem? 
Juiz (interrompendo) – Mas já saiu da cadeia o seu pai?
Arguido – Ele ficou, só ficou 2 anos.
Juiz – Já saiu da cadeia?
Arguido – Há muitos anos.
Juiz – Que é que ele faz agora? 
Arguido – Eu não tenho contacto com ele.
Juiz – Porquê?
Arguido – Porque ele matou a minha mãe.
Juiz – Está bem, mas não interessa nada, e o Senhor não tem contacto com o seu pai porquê? 
Arguido – Porque ele matou a minha mãe à minha frente à machadada.
Juiz – À machadada, Eh santo nome de Jesus. A Sério? A sério que foi assim? À machadada à sua frente? Aonde?
Arguido – Em ..., em frente à Praça.
Juiz – À machadada? Por ciúmes? 
Arguido – Eu não sei ao certo. Eu era pequenino, ouvia discussões em casa. Ele batia na minha mãe muitas vezes e um dia fez-lhe isso.
Juiz – Olhe, digo-lhe uma coisa, eu tenho aqui o nome do seu pai e da sua mãe, amanhã, amanhã não, segunda-feira, vou pedir extratos das decisões a ver se foi mesmo assim. Se foi, foi. A vida é assim, meu caro amigo. A vida é assim. A vida é assim.
Defensora – E foi viver com quem então nessa altura?
Arguido – Depois fui para casa do meu avô que era o único avô que eu tinha, que eu não conheci os outros.
Defensora – Era o pai da sua mãe ou o pai do seu pai? 
Arguido – Era o pai da minha mãe.
Defensora – O pai da sua mãe?
Arguido – Sim, lá em ....
Defensora – E ficou com ele até que idade?
Arguido – Até aos 13.
Defensora – Depois o que é que aconteceu?
Arguido – Depois ele faleceu de doença também, não tinha uma perna e passou por…, pronto faleceu de doença. Depois eu desde os 13 anos fui para uma Cruz Vermelha lá em ..., fui para uma Cruz Vermelha lá para ... e pronto, desde aí …
Defensora – Andou na escola? 
Arguido – Andei.
Defensora – Até que ano?
Arguido – Até aos 14 anos, 6.º ano de escolaridade e depois tirei, andei até aos 15, só que não tenho…
Defensora – E enquanto andou na escola, onde é que estava a viver?
Arguido – Depois dos 13 estive um ano e tal numa Cruz Vermelha. Depois do meu avô ter morrido fui para a Cruz Vermelha que tem lá em ..., que é para menores até aos 18 anos.
Defensora – E depois disso? 
Arguido – Depois um tio meu veio-me buscar, um irmão da minha mãe veio-me buscar do ... e levou-me para o .... Eu ainda estudei lá mais um anito, só que depois vim para cá. Passado um ano e tal vim para cá. Não correu lá bem no Luxemburgo com os meus tios.
Juiz – Oh Sra. Dra. Não quero aqui choradinhos, porque isso não me interessa. Não quero aqui choradinhos que isso não me interessa. Pergunte o que tiver a perguntar, mas não quero choradinhos. Isso é tudo mentira! Isso é tudo mentira! Eu conheço essa gente, fui juiz 18 anos de círculo. Isto não tem comprovativo nenhum. Cruz Vermelha em ... não existe.
Arguido – Existe sim senhor.
Juiz – Fui lá juiz durante 18 anos. Não existe.
Arguido – Existe sim senhor, peço desculpas.
Defensora – Ou seria alguma instituição e o senhor pode a estar confuso, Senhor Dr.
Juiz – Eu não posso estar aqui a fazer de contas que o mundo é uma maravilha. Não existe. Nem sequer existe Cruz Vermelha em .... Eu não me posso sentar nesta cadeira a fazer de conta que cada um que se senta aí à minha frente diz o que lhe apetece. 
Arguido – Dá-me licença Senhor Dr. posso dizer uma coisa?
Juiz – Ãhh!
Arguido – O Senhor conheceu o Dr. ...? Que era Delegado de Menores de lá?
Juiz – Fale aí com esse senhor, que ele é que sabe disso. Não sei de nada. 
Arguido – Dr. ..., que era…
Juiz – Fale ali para o Senhor Procurador que não conheço. 
Arguido – Dr. ... que era na altura o Delegado de Menores, que era o que mandava em mim.
Juiz – Viveste em casa dele, foi? 
Arguido – Não, era o que mandava em nós quando a gente estava lá na Cruz Vermelha. Era ele o Delegado que mandava em nós dos menores.
Juiz – Isso é com o Senhor Procurador. Não é comigo. Na Cruz Vermelha em ....? Nem sequer existe Cruz Vermelha em .... 
Arguido – Existe, existe.
Juiz – Cruz Vermelha?
Arguido – Sim, Cruz Vermelha, em .... Existe sim senhor, à beira do mercado.
Juiz – A Cruz Vermelha dá assistência a feridos e não sei quê, mas não acolhe menores em lado nenhum.
Arguido – Ali acolhe até aos 18 anos, crianças e tem em .... até aos … dos…
Juiz – É que tu atiras para os sítios onde estive. Ainda por cima. 
Arguido – Mas eu tenho a certeza do que estou a dizer. Senhor Dr., peço desculpa. Pode-se informar. 
Juiz – Não tens que pedir desculpa nenhuma, só que eu não gosto de ouvir mentiras à minha frente e fazer de conta que não as estou a ouvir. 
Arguido – Eu não estou a mentir, Senhor Juiz, existe a Cruz Vermelha.
Juiz – Eu sei que existe a Cruz Vermelha. Eu sou sócio da Cruz Vermelha.
Arguido – Em ... existe a Cruz Vermelha e acolhe até aos 18 anos crianças que não têm família.
Juiz –Oh Sra. Dra., faça perguntas, faça perguntas, eu não estou aqui para conversa da treta. 
Defensora – Atualmente onde é que vive?
Arguido – Diga.
Defensora – Onde é que vive atualmente?
Arguido – Vivo em casa, é assim, tava num quarto, tou no RSI, tava num quarto numa pensão.
Defensora – Vive sozinho, é isso?
Arguido – Sim.
Juiz – Mas onde era a pensão? 
Arguido – ..., Pensão ..., por cima da ....
Juiz – Aonde? 
Arguido – ..., centro de ..., por cima da Pastelaria ..., à beira do tribunal, em frente à rotunda de St.º António. O RSI deram-me exatamente para isso, que é pagar o quarto.
Juiz – Exatamente, que é para a malta ter um sítio onde se possa instalar e depois fazer as suas brincadeiras. Como uma base estratégica. O Senhor foi militar? 
Arguido – Não senhor.
Juiz – Pois, não se lembrou de ir para a tropa. Se fosse para a tropa, tinha de comer, de beber e farda gratuita. Não se lembrou disso, pois não? Lembrou-se foi de pedir o Regimento, lá o Rendimento Mínimo Garantido. Não se lembrou se havia pátria. O Senhor ia para a tropa, estava lá 6 anos, ganhava 700 euros por mês, comia, bebia. Só que aquilo tem uma chatice. É preciso cumprir regras. É que ninguém se lembra disso, sabe. No meu tempo era obrigatório ir para lá, e eu fui. Mas agora a malta que precisa de alguma coisa não se lembra de se enfiar lá. Lembra-se é de pedir o RSI, o RGI e o RITITI e mais alguma coisa que ia quase dizendo um palavrão, mas isto está a ser gravado e depois vêm-me para aqui consumir à sexta-feira ao fim da tarde. Sra. Dra. faça perguntas.
Defensora – Não pretendo mais nada.
*
34.   Correm os seus termos pela secção única do DIAP de Vale de Cambra os autos de inquérito n.º 389/14.4GAVLC.
35.   Nesse processo realizou-se a 21-11-2014, a partir das 15:30 horas, a interrogatório judicial de arguido detido, ato jurisdicional presidido e levado a efeito pelo Senhor Juiz Dr. AA.
36.   Esse ato processual decorreu nos termos que constam da ata respetiva, cuja cópia certificada figura a fls. 89 a 94 destes autos e da gravação digital então efetuada na aplicação digital em uso na 3.ª secção de instrução criminal da instância central do município de ..., cuja cópia certificada figura a fls. 95.
37.   De entre o demais, a determinada altura (a partir de 15´36´´, ficheiro 20141121170501) o interrogatório decorreu da seguinte forma:
Juiz – O que é que é verdade disto tudo que eu lhe li?
Arguido – De pedir, de pedir, por exemplo, de pedir tenho aqui.
Juiz – Diga, diga.
Arguido – De pedir pá, para ela me dizer … para a minha mulher me dizer.
Juiz – Olhe, tire lá o pá. Eu tenho muito respeito pela malta do 25 de Abril, mas tire lá o pá da conversa. Isso era o Otelo Saraiva de Carvalho é que gostava muito do pá. Ó pá…
38.   Mais adiante (a partir de 01´ 26´´, ficheiro 20141121172512):
Juiz – Ainda tem sogra, o Senhor ainda tem sogra?
Arguido – Pois, infelizmente, não é, tá a ver (risos), sabe porquê? porque eu casei mais velho, tá a perceber, casei com a filha dela, que é mais nova 9 anos, percebeu?
 Juiz – Sabe que eu comecei a minha vida…, isto não é, os meus interrogatórios, quem me conheceu como juiz de instrução há … em 1996 quando eu comecei a minha carreira nos criminais, sou juiz quase há 25 anos, faço este ano, este ano judicial, 25 anos. Os meus interrogatórios são assim, são uma conversa, não é uma inquirição da PIDE, luz na cara dos arguidos e ou confessas ou vais para a cadeia. É uma conversa. Eu comecei a minha vida profissional muito cedo, eu sou filho e neto de sucateiros, eu sou filho e neto de sucateiros, comecei a trabalhar aos 18 anos de idade a ajudar em casa e os motoristas da minha família, da nossa empresa, traziam assim escrito atrás nos camiões ”feliz era Adão que nem tinha sogra nem camião” (gargalhada), “feliz era Adão, que nem tinha sogra nem camião”.
39. Após, (a partir de 03´15´´, mesmo ficheiro):
Arguido – Oh Senhor Dr. Juiz, deixe-me contar isto tudo como dever ser.
Juiz – Deixo, tempo tenho eu. Há uma canção dos Rolling Stones que diz assim “time is on my side” (cantarolando). O tempo está a meu lado (…)
40. Um pouco adiante, (a partir de 05´57´´, mesmo ficheiro):
Arguido – Está a ouvir?
Juiz – Está a ouvir não, Senhor Dr. Juiz faz favor, ou até me pode tratar por Brigadeiro, que é o meu posto militar. Que eu cheguei a esse posto na tropa
Arguido – De quê?
Juiz – Brigadeiro.
Arguido – De brigadeiro?
Juiz – Por incrível que lhe possa parecer, por incrível que lhe possa parecer, eu tenho honras de brigadeiro. 
Arguido – Se fosse militar era a capitão, só.
Juiz – Quem é que lhe disse isso? 
Arguido – Eu, eu, eu é que…
Juiz – Ah, o senhor era a capitão, mas eu tenho honras de brigadeiro. 
Arguido – Senhor Dr. …
Juiz – Teve azar com o juiz, isto estava para ser feito, olhe, eu vou-lhe explicar, isto estava para ser feito por uma senhora juiz, que são pessoas com muita paciência, com boa educação, deu comigo, que sou assim um truculento e meio passado dos carretos. O senhor está metido num aperto tremendo.
Arguido – Senhor Dr. Juiz, para mim já me é difícil o Senhor Dr. ler isso tudo.
Juiz – Ah, mas não fui eu que escrevi isto, ouça, eu cheguei aqui em mangas de camisa, foram-me chamar onde eu estava, foram-me chamar onde eu estava, eu vim, ó mangas de camisa, desarmado. Só venho eu e a minha alma. 
Arguido – Senhor Dr. eu estou assim porque fui operado aos pulmões.
Juiz – E o Senhor foi preso…
Arguido – aos pulmões e ao coração, em Coimbra.
Juiz – Eu já combinei com o padre da minha terra. O meu epitáfio no meu mausoléu, depois de queimado, vai ser o meu coração de tanto bater, parou, o meu coração de tanto bater, parou.
Arguido – Oh Senhor Dr., mas deixe-me continuar.
Juiz – Eu deixo, mas quero que o Senhor me diga a verdade, o Sr. está-me a contar filmes.
Arguido – Senhor Dr. desculpe-me mas não estou a contar filmes, se entender que eu estou, eu estou a falar de pedir o papel. Tenho aqui que mostra.
Juiz – Às seis menos um quarto este interrogatório termina, que eu não trabalho fora de horas que ninguém me paga.
Arguido – Oh Senhor Dr. …
Juiz – Diga.
Arguido – Posso mostrar o papel?
Juiz – Pode, venha cá à minha beira até…
Arguido – A minha mulher escreveu, porque achou que eu que tinha razão, está a perceber?
Juiz – O senhor tem que falar perto do microfone, que isto está gravado. Que é que diz o papel?
Arguido – Diz aí, o horário pá que ela tinha
Juiz –Se o senhor me tornar a tratar por pá eu acuso-o de desrespeito ao tribunal.
Arguido – Não percebi.  
 Juiz – Não me trate mais nenhuma vez por pá.
Arguido – Peço desculpa, peço desculpa, não é. 
Juiz – Não me toque. Não me toque por uma razão muito simples, não é porque, eu não sou homofóbico, não se toca numa farda de um oficial.
Arguido – Peço desculpa.
Juiz – Olhe, segunda-feira, às 18:00 horas reunião na casa do professor, quinta-feira às 20:30 horas, Santuário. Onde é que é o Santuário?
Arguido – É lá em ... pá.
Juiz – Sei lá onde é que é isso. Deixe lá o pá. O Senhor tem um problema com o pá. O Senhor é comunista? Não é que isso tenha a ver aqui com o interrogatório. Só pergunto isto porque os comunistas têm muito a tendência para dizer pá. Ensaio? Às 20:30 horas Santuário ensaio. Há aqui 2 letras diferentes.
Arguido – Pois, ela…(impercetível)
Juiz – Quinta-feira às 15h culinária, quarta-feira às 10h30 Inglês. Eu estou a dizer isto que é para ficar na gravação. Eu estou a dizer isto que é para ficar na gravação. O documento não é … (impercetível). Quarta-feira às 10:30 horas inglês, quarta feira 17/18 inglês ponto de interrogação. Sábado 14:30 horas orfeão, terça-feira ginástica. Depois há aqui 12-11-2014 às 20:00 horas. Que é que isto quer dizer?
Arguido – Isto foi quando ela fez, quando ela fez isto que aqui está. 
Juiz – 12-11-2014? Que é que isto quer dizer? 12-11-2014, às 10:00 horas.
Arguido – Foi quando ela escreveu, pá, isto aqui…
Juiz – Ai quando ela escreveu isto tudo? Oh pá, pronto, sente-se lá pá. Raios partam a minha sorte. Oh pá, sente-se aí.
41. Prossegue depois (a partir de 13´46´´, mesmo ficheiro):
Arguido – Disse isso em tom de brincadeira pá, aliás ela sabe disso, conte quando ela vier aqui, isso foi em tom de piada, ó pá, acho que é demais, é demais, é demais.
Juiz – Demais como?
Arguido – Ó pá.
Juiz – Ó pá não, se o Senhor me tornar a chamar ó pá, o Senhor vai preso hoje. Garanto-lhe que vai preso, mas não é por violência doméstica, é por falta de respeito ao tribunal.
Arguido – Peço desculpa outra vez, peço desculpa.
Juiz – Ouça, é o último aviso. O Senhor deve estar a confundir o à vontade com o à vontadinha. O à vontade com o à vontadinha e se o Senhor se torna a dirigir a mim por ó pá, o Senhor fica preso, mas não é por violência doméstica, é por falta de respeito ao tribunal.
Arguido – Peço desculpa.
Juiz – Não o torno a advertir. Da próxima vez que o Senhor se dirigir a mim por ó pá, terminado este interrogatório o Senhor fica detido por desrespeito ao tribunal e não o torno, eu não o torno a avisar.
Arguido – Não sei então como é que hei-de falar, estou habituado…
Juiz – O Senhor deve dirigir-se a mim como quiser. A melhor maneira para me tratar em funções é Senhor Juiz. A melhor maneira para me tratar em funções é Senhor Juiz. E não é de perna cruzada é os dois pés no chão e posição correta, certo?
Arguido – É a primeira vez.
Juiz – Senhor AA, certo? Quero lá saber se é a primeira se é a segunda vez, certo? A boa educação cabe em todo o lado. Olhe, diga-me outra coisa Senhor AA, então isso do estar a namorar era brincadeira, não é? O Senhor já me disse que era brincadeira.
Arguido – Era, Senhor Dr.
Juiz – Pronto. Não, é Senhor Dr., é Senhor Juiz.
42. E, a partir de 15´50´´(mesmo ficheiro):
Arguido – Quando havia zangas, pronto
Juiz – Deixe lá o pá, homem! (grito) O Senhor não consegue esquecer o pá?
Arguido – Eu disse pá agora? Desculpe lá. Outra vez, eu…
Juiz – É que eu, ouça, daqui a bocado começo a achar que é gozo. E se eu me entrar pelo raio desta cabeça que aqui está que é gozo, ó homem, nós vamo-nos mesmo zangar, nós vamo-nos mesmo zangar, nós vamo-nos mesmo zangar.
*
43. Correm termos pela secção criminal da instância local sedeada em ... os autos de processo comum singular n.º 61/15.8PASJM.
44. Nesses autos, então ainda na fase de inquérito, enquanto juiz titular da 3.ª secção de instrução criminal da instância central sedeada em ..., estando-lhe afeto esse processo para realização dos atos jurisdicionais respetivos, no dia 16-02-2015, a partir das 16:00 horas, o Senhor Juiz presidiu e levou a efeito o interrogatório judicial do arguido detido, HH.
45.   Nessa diligência, o Senhor Juiz aparentou, face a todo o contexto em que esse ato se desenvolveu e por ostentar voz pastosa e entaramelada, encontrar-se sob influência de medicamentos e/ou de consumo excessivo de bebidas alcoólicas.
46. Esse ato processual decorreu nos termos que constam da ata respetiva, cuja cópia certificada figura a fls. 469 a 474 destes autos e da gravação digital então efetuada na aplicação digital em uso na ... secção de instrução criminal da instância central sedeada em ..., cuja cópia certificada figura a fls. 475.
47. Completado o interrogatório, tendo o arguido optado por não prestar declarações, a partir de 04´05´´ (ficheiro 20150216161617), encontrando-se a ilustre magistrada do M. P., Senhora Dra. II, a emitir o seu parecer quanto à medida de coação a fixar, o diálogo decorreu da seguinte forma:
Juiz (dirigindo-se ao arguido) – Não estou a gostar do seu gesto de estar, não estou a gostar do seu gesto, não estou a gostar do seu gesto, o Senhor não brinque comigo, a Sra. Procuradora é a representante do Estado Português e eu não estou a gostar do seu gesto.
Arguido – Eu estou a gostar de ouvir a Sra. Procuradora.
Juiz – Não estou a gostar do seu gesto. Sra. Procuradora, o arguido estava a rir-se, a dar ar de gozo.
Arguido – Não estava a rir, não estava a gozar ninguém, eu não fiz mal a ninguém.
Procuradora – Com certeza, Senhor Dr., as alegações não são para o arguido, são para V. Exa.
Juiz – É, mas eu gosto de ver a expressão.
Arguido – Ela é que me chamou aqui, Senhor Dr. e agora é que estou a levar as culpas em cima, mas tudo bem.
Juiz – E o Senhor já fica a saber para onde é que vai a seguir, o Senhor fica já a saber para onde é que vai a seguir.
Arguido – Eu não fiz mal a ninguém, Senhor Dr.
Juiz – Eu também não fiz mal a ninguém e ando aqui com 52 anos. Sra. Procuradora, peço desculpa, só que eu não gostei do gesto do arguido a rir-se.
Arguido – Eu não me estava a rir, Senhor Dr.
Juiz - Enquanto estava a proferir a sua promoção, ele a rir-se, com aquele ar de desdém e eu tenho que dirigir a diligência. Não gostei, pelo desculpa Sra. Dra., não gostei, não gostei, não gostei.
Arguido – Sinto-me triste.
Juiz – O Senhor faz favor de se calar.
48. Alguns minutos depois (a partir de 10´45´´, mesmo ficheiro), ainda quando a Senhora Procuradora emitia o aludido parecer:
Procuradora – Contudo, como a implementação destas medidas…
Juiz (interrompendo a promoção da Senhora Procuradora) – Não, vai dentro, não se preocupe.
Procuradora – Mas já agora, Senhor Dr.
Juiz (rindo) – Só para lhe poupar trabalho, só para lhe poupar trabalho.
*
49. Correm os seus termos pela secção do DIAP de ... os autos de inquérito com o n.º 16/14.0GEVFR.
50. Nesse processo realizou-se a 26-02-2015, a partir das 17:19 horas, o interrogatório judicial de arguidos detidos, ato jurisdicional presidido pelo Senhor Juiz Dr. AA.
51. Esse ato processual decorreu nos termos que constam da ata respetiva, cuja cópia certificada figura a fls. 452 a 466 destes autos e da gravação digital então efetuada na aplicação digital em uso na 3.ª secção de instrução criminal da instância central sedeada em ..., cuja cópia certificada figura a fls. 466.
52. De entre o demais, a determinada altura (a partir de 00´02´´, ficheiro 20150226172103), quando o arguido JJ se identificava, o diálogo decorreu da seguinte forma:
Arguido – JJ.
Juiz – Tire as mãos dos bolsos, se faz favor, ou o Senhor foi militar de cavalaria?
Arguido – Diga?
Juiz – O Senhor foi militar de cavalaria?
Arguido – Não.
Juiz – É que se fosse militar de cavalaria podia ter os pés nos estribos; se não foi militar de cavalaria tire os pés dos estribos.
53. Mais adiante (a partir de 01´ 10´´, ficheiro 20150226175813), quando o arguido JJ prestava declarações, os diálogos decorreram da forma seguinte:
Juiz – Onde é que se fazem essas provas (a propósito de provas de velocidade de veículos a que o arguido se acabara de referir como sendo participante)?
Arguido – Agora, dia 1, vamos fazer, agora em ....
Juiz – E isso é legal?
Arguido – É legal porque é dentro de um estabelecimento.
Juiz – Dentro de um estabelecimento?
Arguido – Dentro de um aeródromo, aeródromo de ... .
Juiz – Em ... há algum aeródromo. Nunca vi lá nenhum aeródromo. Aterram lá aviões?
Arguido – Há e vamos lá este domingo.
Juiz – É, ainda lá vou ver isso.
Arguido – Se o Senhor for lá vai ver-me.
Juiz – Se o Senhor não estiver em Custóias. O Senhor está em Custóias, mas em princípio eu vou lá ver isso.
Arguido – Em princípio acho que não, porque não, porque não faz sentido.
Juiz – Eu acho que sim.
54. Após, (a partir de 04´00´´, mesmo ficheiro):
         Juiz – O Senhor está igual, foi lá comprar uma placa de 99 grs., 100 era demais, uma grama a mais podia-lhe fazer mal, o Senhor ainda se intoxicava e andava intoxicado para aí 15 dias. Os Srs. começam-me a cansar, mas, adiante.
55. Um pouco à frente (a partir de 07´35´´, mesmo ficheiro):
Arguido – … respeitar as pessoas e fumar só no meu quarto. Foi uma coisa que eu tomei de…
Juiz – E só à noite?
Arguido – Só à noite, porque também não posso andar assim nos clientes e a visitar pessoas, então só à noite no meu quarto.
Juiz – Não te vais safar assim,
56. Prossegue depois (a partir de 14´25´´, mesmo ficheiro):
Procurador – O Senhor e o Senhor LL trocaram aqui umas mensagens,
Arguido – Diga-me, já agora.
Juiz (interrompendo a instância que estava a ser assumida pelo Senhor Procurador) – O problema é que há aqui gente que ouve o que a gente fala. Desculpando a redundância da gente, mas fui eu que foi autorizando o vosso namoro.
Arguido – Mas isso não tem nada de mal, Senhor Juiz.
Juiz – Isso é o que o Senhor pensa.
Arguido – Mas é essa a realidade.
Juiz (referindo-se à prisão preventiva do ex-primeiro-ministro ..., decretada em processo ainda pendente) – O “44” também achava que não havia nada de mal e olhe onde é que ele está. Ele também achava que não havia nada de mal e olhe onde é que ele está. Sabe como é que dizia o outro ”you know what i mean”.
Arguido – A falar a sério, Senhor Juiz.
Juiz – Eu sei que está a falar a sério. O Senhor Procurador está a confrontá-lo com conversas telefónicas que o Senhor teve com o Senhor LL e o Senhor não pode chegar a este tribunal e dizer que quer prestar declarações e depois fazer de conta que só bota bombas de nitrogénio em carros A3 e estão aqui conversas plasmadas nos autos, escutas telefónicas com conversas em que o Senhor compra droga ao Senhor LL.
Arguido – É mentira Sr., juro-lhe.
Juiz – Senhor não, Senhor Dr. Juiz, que eu, quando me sento nesta cadeira, sou Dr. Juiz e quando me levantar desta cadeira sou brigadeiro do exército português, que é o meu estatuto.
57. E, a partir de 15´57´´(mesmo ficheiro):
Procurador – … onde é que é esse clube “Why not”?
Arguido – É videoclube, é uma coisa que aluga filmes, DVD´s, VHS´s.
Juiz (interrompendo a instância do Senhor Procurador) – Se é um videoclube que aluga filmes eu sou capaz de, pensando um bocadinho, chegar lá. Se um videoclube aluga filmes, pensando um bocadinho sou capaz de chegar lá. Mas onde, é o que o Senhor Procurador lhe perguntou, homem?
Arguido – É em ....
Juiz – Mas em que sítio, rua, número, local?
Arguido – Não sei, na rua perto do hospital
Juiz – É tudo assim, não é? Tudo perto do hospital.
Arguido – Não sei a rua Senhor Dr., não sei a rua do clube de vídeo
Juiz – Mas em que sítio, homem?
Arguido – Em ..., à beira do hospital, a 500 m. do hospital
Juiz – Para que lado, para baixo ou para cima?
Arguido – Para o lado de cima.
Juiz – E o lado de cima qual é?
Arguido – É o lado que está mais alto.
Juiz – É o lado que está mais alto… o Senhor é um tanguista e vai acabar em Custóias só por estar a brincar com a tropa. Eu trabalhei 8 anos em ..., a fazer julgamentos todas as quartas-feiras e às vezes à sexta-feira e o Senhor vem-me dizer que o lado de cima é o lado que está mais alto? Olhe bem para a minha cara, olhe bem para a minha cara e se o Senhor acha que pode brincar comigo?
Arguido – Não.
Juiz – Não se esqueça de quem é que está aqui sentado nesta cadeira e que vai decidir ao fim, não se esqueça.
58. E, a partir de 10´42´´(ficheiro 20150226182727) quando o arguido MM prestava declarações:
Arguido – Gostava que o Senhor me desse uma segunda oportunidade.
Juiz – Vamos lá a ver, a segunda oportunidade é o Senhor ir ali para ... e fica lá, que é ao lado de Custóias. Há 2 portas para lá entrar, uma é a de Custóias e a outra é a de Santa Cruz do Bispo e o Senhor vai para lá e acabou. Há uma coisa que eu assumi quando vim para a ..., isto tem que ser limpo, percebeu?
59. E, a partir de 11´59´´(mesmo ficheiro):
         Juiz – Comigo não passa nada, quem me conhece já sabe como é que eu sou. Li o livro de S. Cipriano quando tinha 17 anos de trás para a frente e da parte da frente para trás, não acredito em Deus nem no diabo. Quero lá saber. Quem tiver medo não pode vir para estas artes.
60. E, a partir de 13´12´´do mesmo ficheiro:
Juiz – E o Senhor ia aonde?
Arguido – Diga?
Juiz – Faz favor!
Arguido – Se faz favor.
Juiz – Não lhe torno a dizer a quarta vez “faz favor”. Da próxima vez que eu tiver que lhe dizer “faz favor” o Senhor vai para a cela e fica detido por desrespeito ao tribunal.
Arguido – Desculpe, Senhor Dr. Juiz.
Juiz – Certo?
Arguido – Certo.
Juiz – É que já não sai daqui hoje. Não é por causa de coisas, de problemas de droga, é por desrespeito ao tribunal, porque comigo quem falar fala com respeito.
*
61. O Senhor Juiz sabia estar obrigado a comparecer à diligência referida em 15.
64. No dia 25-11-2014 o Senhor Juiz encontrava-se doente, apresentando sintomatologia de vómitos, diarreia e dores abdominais, situação impeditiva da atividade laboral, designadamente da realização da diligência referida em 15, estado causado, aparentemente, por gastroenterite.
65. O arguido deslocou-se nesse dia ao consultório privado do Senhor Dr. NN, tendo sido por ele examinado e medicado.
66. O arguido não se deslocou ao Centro de Saúde da sua área de residência ou instituição hospitalar pública para efeitos de obter o atestado médico necessário à justificação da falta, nem requereu a justificação da falta ao serviço relativa ao dia 25-11-2014.
67. O arguido sabia estar obrigado a comunicar a falta dada ao serviço no dia 25-11-2014, o que não fez, de forma deliberada, livre e consciente.
68. O arguido sabia que a omissão desse dever constituía infração disciplinar suscetível de ser sancionada enquanto tal.
*
69. Na inquirição referida em 18 o Senhor Juiz, ao tratar a testemunha por “companheiro”, ao fazer referência à existência da sala de “comandos” e ao elevar a voz para com ele, da forma como o fez, atuou de forma livre e consciente, bem sabendo que constituía infração disciplinar suscetível de ser sancionada enquanto tal, aparentando encontrar-se sob influência de medicamentos e/ou de consumo excessivo de bebidas alcoólicas.
70. Nessa inquirição, o Senhor Juiz, ao insistir com a testemunha, nos termos em que essa insistência foi feita, apesar da mesma dizer que não sabia os nomes das pessoas, para que dissesse o nome das pessoas presentes na reunião a que essa testemunha aludiu e, ao proferir o despacho referido em 22, ordenando, sob as suas expressas instruções, a intervenção da polícia judiciária na realização de atos que não eram admissíveis, por excederem o objeto da instrução, atuou de forma livre e consciente, bem sabendo que, face às finalidades que se pretendiam alcançar, constituíam infração disciplinar. Despacho que foi proferido como retaliação por a testemunha ter declarado que não sabia o nome das pessoas que se encontravam na reunião e em face do posicionamento assumido pelo advogado Senhor Dr. CC no contexto da inquirição.
*
71. No interrogatório referido em 25, aparentando encontrar-se sob influência de medicamentos e/ou de consumo excessivo de bebidas alcoólicas, no contexto e forma das declarações aí produzidas, o Senhor Juiz, designadamente:
- ao dizer ao arguido para não lhe fazer perder tempo;
- ao dizer para não brincar com ele, para não lhe mentir, que era a pior coisa que podia fazer;
- ao afirmar que o arguido roubava (genericamente) quando queria consumir droga;
- ao referir que parte do IRS por si (Senhor Juiz) suportado se destinava a suportar o Rendimento Social de Inserção Social recebido pelo arguido;
- ao perguntar ao arguido se a morte da sua mãe pelo seu pai estava documentada ou se era “filme”;
- ao afirmar que o arguido mentia,
- ao afirmar que o arguido praticava furtos, agredia cidadãos (genericamente) e “anda
por aí”;
- ao referir que o vinham “consumir” (a incluir o arguido) para ali sexta-feira ao fim da tarde;
- ao associar de forma irónica o arguido a “excluídos” que deviam ser ajudados;
- ao dizer que não queria ali choradinhos e que era tudo “conversa da treta”
- ao tratar o arguido por “tu”
- ao menosprezar e criticar a atribuição do RSI ao arguido,
atuou de forma livre e consciente, bem sabendo que constituía infração disciplinar, suscetível de ser sancionada enquanto tal.
72. Ainda no mesmo interrogatório, ao afirmar que iria mandar prender o DD (a propósito da pretensa incriminação do arguido e referindo-se a DD), o Senhor Juiz arrogou-se titular de uma autoridade que, no caso, não detinha, tão só com o propósito de confrontar o arguido e fazer com que o mesmo confessasse a prática dos factos imputados.
73. Afirmações que proferiu de forma livre e consciente, bem sabendo que, face às finalidades que pretendia alcançar, essa intimidação, através da ameaça de decretar a prisão de outra pessoa, sem estarem reunidas as condições legais para tanto, constituía infração disciplinar.
74. Também nesse mesmo interrogatório referido em 25, o Senhor Juiz
- ao verbalizar, no seu decurso, ainda antes auscultar o Ministério Público e a defesa relativamente às medidas de coação a aplicar, a decisão que iria tomar no sentido de decretar a prisão preventiva do arguido (“O Senhor já sabe, para onde é que vai, não já? – referindo-se à prisão);
- ao comunicar ao magistrado do Ministério Público (quando o mesmo procedia a interrogatório do arguido), ainda antes de proceder à sua auscultação e da defesa quanto às medidas de coação a aplicar, que o arguido iria para a prisão (“ele vai para em prisão preventiva, já lhe adianto, este arguido vai em prisão preventiva, acabou, não lhe dou chance nenhuma”) e ao asseverar a esse mesmo magistrado para dispensar outro tipo de promoção que não fosse no sentido da prisão preventiva (Dr. não perca tempo com a promoção que ele vai em prisão preventiva)
atuou de forma livre e consciente, sabendo que tal constituía infração disciplinar, suscetível de ser sancionada enquanto tal.
75. Ainda nesse interrogatório referido em 25, o Senhor Juiz ao tecer, ante o arguido, respetiva defensora e o magistrado do Ministério Público, considerações sobre a profissão de juiz, classificando-a como “uma cova” e um jazigo”, atuou de forma livre e consciente, sabendo que tal constituía infração disciplinar, suscetível de ser sancionada enquanto tal.
*
76. O Senhor Juiz, ao conduzir o interrogatório referido em 35, aparentando encontrar-se sob influência de medicamentos e/ou de consumo excessivo de bebidas alcoólicas, nos termos em que o fez, 
- tecendo, na presença do arguido, da sua defensora e da magistrada do Ministério Público, considerações sobre o “25 de Abril”, Otelo Saraiva de Carvalho e “comunistas” (a propósito da utilização da expressão “pá”);
- narrando factos da sua vida pessoal, militar e profissional e ao caracterizar-se a si próprio como truculento e “meio passado dos carretos”;
- cantarolando uma frase de uma música;
- afirmando “raios partam a minha sorte”
atuou de forma livre e consciente, sabendo que tal constituía infração disciplinar, suscetível de ser sancionada enquanto tal.
77. Nesse mesmo interrogatório, referido em 37, o Senhor Juiz, ao afirmar que o arguido lhe estava a contar “filmes”, ao tratá-lo por “pá”, ao elevar a voz para com ele da forma como o fez, atuou de forma livre e consciente, sabendo que tal constituía infração disciplinar, suscetível de ser sancionada enquanto tal.
78. Também nesse mesmo interrogatório, o Senhor Juiz, ante o tratamento por “pá”, ao ameaçar sucessivamente o arguido com a imposição de prisão, arrogou-se a uma autoridade que, no caso, não detinha (não consentindo a lei a prisão em tais circunstâncias, posto que esse tratamento decorria apenas do estado de nervosismo do arguido e dos seus hábitos de linguagem e não com o sentido de ofender ao Senhor Juiz ou o órgão de soberania Tribunal).
79. Ameaças que fez com o propósito de impedir que o arguido o tratasse, nesse ato processual, por “pá”, tratamento por si considerado inapropriado e admitindo o tratamento de “Senhor Juiz ou brigadeiro”, nas quais atuou de forma livre e consciente, bem sabendo que, face às finalidades que pretendia alcançar, essa intimidação com a ameaça de prisão, constituía infração disciplinar, suscetível de ser sancionada enquanto tal.
80. Na diligência processual referida em 44 a 48, o Senhor Juiz, ao verbalizar, ainda antes de terminada a auscultação do Ministério Público e da defesa quanto às medidas de coação a aplicar, a decisão que iria tomar no sentido de decretar a prisão preventiva do arguido - “e o Senhor já fica a saber para onde é que vai a seguir” e “vai dentro” -, atuou de forma livre e consciente, sabendo que tal constituía infração disciplinar, suscetível de ser sancionada enquanto tal.
81. Na diligência processual referida em 50 a 60, o Senhor Juiz, no decurso do interrogatório judicial dos arguidos JJ e MM, quando ainda não havia terminado os respetivos interrogatórios, nem auscultado o Ministério Público e a defesa quanto às medidas de coação a aplicar, ao anunciar a decisão que iria tomar no sentido de decretar a prisão preventiva dos arguidos - “O Senhor está em Custóias”, “vai acabar em Custóias”, “vai para lá e acabou” -, atuou de forma livre e consciente, sabendo que tal constituía infração disciplinar, suscetível de ser sancionada enquanto tal.
82. Nessa mesma diligência referida em 50 a 60, ao dirigir-se arguido JJ nos termos em que o fez, tratando-o por “tanguista” e dizendo-lhe “tire os pés dos estribos”, “os Srs. começam a cansar-me” e “não te vais safar assim”, o Senhor Juiz atuou de forma livre e consciente, sabendo que tal constituía infração disciplinar, suscetível de ser sancionada enquanto tal.
83. Também nessa mesma diligência processual, o Senhor Juiz, ao ameaçar com prisão imediata o arguido MM – ante a não menção “faz favor” quando lhe dirigisse alguma pergunta – e ao afirmar ante o arguido JJ “não se esqueça de quem é que está aqui sentado nesta cadeira e que vai decidir no fim”, no contexto e forma como produziu essas declarações, arrogou-se, no que respeita à ameaça de prisão, de uma autoridade que, relativamente àquela situação não detinha, e, em ambos os casos, com o propósito de exibir o poder constitucionalmente confiado de, enquanto juiz, poder decretar a prisão de pessoas. O senhor Juiz atuou de forma livre e consciente, sabendo que tal constituía infração disciplinar, suscetível de ser sancionada enquanto tal.
84. Identicamente, na mesma diligência processual, referida em 50 a 60, ao fazer menções jocosas alusivas ao Senhor Eng. ... quanto ao decretar da sua prisão preventiva, o Senhor Juiz atuou de forma livre e consciente, sabendo que tal constituía infração disciplinar, suscetível de ser sancionada enquanto tal.
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85. Aquando da ocorrência dos factos referidos em 15 a 62 encontravam-se pendentes os processos disciplinares 104-2012/PD e 121-2014/PD, designadamente com a realização de diligências de prova no Tribunal de ..., onde o arguido exercia funções, o que causou ao Senhor Juiz transtorno e inquietação.
86. Antes de ingressar na magistratura judicial o Senhor Juiz prestou serviço no Exército Português.
87. O Senhor Juiz é reputado como um bom profissional, brioso, muito preocupado e esforçado no trabalho, sem incorrer em atrasos processuais, sendo que teve a seu cargo alguns processos de elevada complexidade técnica, no âmbito dos quais se discutiam interesses com elevada expressão patrimonial e/ou a liberdade das pessoas.
88. Antes dos factos ocorridos em 27-03-2010, o Senhor Juiz era respeitado e respeitador, cordato e simpático com quem se cruzava no seu dia-a-dia, desde arguidos, a testemunhas, público em geral, advogados, funcionários judiciais, magistrados do M. P. e colegas juízes.
89. Encontra-se sujeito a stress e a tensão psíquica e emocional próprios da função de juiz.
90. Pelo menos desde meados/fins de 2013, por então apresentar um quadro depressivo, o Senhor Juiz passou a ser seguido pelo psiquiatra Dr. OO e medicado com antidepressivo (Anafranil 25mg), um ansiolítico (Alprazolan) e um estabilizador de humor (Topiramato), medicação que passou a tomar diariamente.
91. Em Outubro/Novembro de 2014 o arguido agravou a sintomatologia, com humor mais depressivo, maior ansiedade, angústia e dificuldade em adormecer, também devido à pendência e evolução dos processos disciplinares que corriam contra si.
92. O Senhor Juiz requereu a justificação das faltas por si dadas ao  serviço  nos  dias 12 e 13-11-2014 e de 01 a 30-12-2014.
93. O magistrado do M. P. presente na diligência referida em 25 alega não se ter apercebido que o Senhor Juiz estivesse embriagado quando presidiu à diligência e que, se o tivesse percecionado, teria tomado as medidas destinadas a evitar que a mesma se realizasse em tais circunstâncias, o mesmo sucedendo com a defensora do arguido.
94. Diligência em que não foram feitos requerimentos para obstar à continuação do descrito comportamento do Senhor Juiz.
95. Nos interrogatórios judiciais referidos em 25 e 35 o Senhor Juiz aplicou aos arguidos a medida de coação proposta pelo Ministério Público.
96. O Senhor Juiz tem personalidade extrovertida, falando habitualmente num tom de voz alto – até porque ouve mal – e expressa-se em linguagem simples e popular na presença de pessoas simples e pouco instruídas, recorrendo a linguagem mais simples ou mais elaborada consoante o destinatário das suas alocuções.
97. Os arguidos alvo dos interrogatórios judiciais referidos em 25 e 35 eram pessoas simples.
98. O Senhor Juiz foi uma pessoa de fino trato com juízes, magistrados do M. P., advogados e demais intervenientes processuais.
99. Nasceu e cresceu numa freguesia de ..., conhecendo muito bem geográfica e socialmente a zona.
100. Não foi interposto recurso da decisão proferida pelo Senhor Juiz quanto à medida de coação aplicada no processo 396/14.7GAVLC.

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2. Factos não provados
Da instrução dos autos não resultam apurados os seguintes factos:
2.1. O Senhor Juiz, de forma livre e consciente, tivesse faltado à diligência agendada para o dia 25-11-2014;
2.2. Não se tivesse deslocado ao Centro de Saúde da sua área de residência devido ao estado físico debilitado em que se encontrava [2, c), iii. da defesa];
2.3. Em 21 anos de serviço efetivo como magistrado nunca tenha faltado injustificadamente ao serviço [2, c), xiv. da defesa];
2.4. Tenha agendado consulta médica da especialidade para aquela data e não tenha sido imediatamente atendido [2, c), xxvii. da defesa];
2.5. A não obtenção do documento com vista à justificação da falta ao serviço no dia 25-11-2014 se ficasse a dever à sua situação de depressão e tratamento;
2.6. Na diligência referida em 25 estivesse sóbrio e sem estar sob efeito de medicamentos.
2.7. A medicação tomada lhe provocasse alterações de humor [d), vi da defesa];
2.8. O estilo usado pelo Senhor Juiz na direção dos atos processuais seja seguido por muitos outros ilustres magistrados, alguns dos quais com funções de Inspector Judicial [d), xvi da defesa)];
2.9. Com as atitudes descritas não quisesse desrespeitar qualquer dos intervenientes processuais, sem que nenhum deles se tenha sentido afetado ou melindrado [d) xxii e xxiii da defesa];
2.10. Nas diligências referidas em 25 e 35 tenha atuado do modo descrito apenas para ser entendido pelos destinatários, tendo em conta a situação social dos arguidos e testemunha e realizar a tarefa que lhe estava acometida da melhor forma possível [d) xxiv e xxv da defesa];
2.11. Os seus deveres funcionais lhe impusessem que contraditasse o arguido e a testemunha, nos processos referidos em 18, 25 e 35, nos termos apurados;
2.12. Os comportamentos assumidos nas diligências realizadas nos processos 18, 25 e 35 derivassem do quadro clínico e anímico de que padecia;
2.13. A linguagem usada tivesse em vista a simplicidade e a fácil perceção dos destinatários;
2.14. O tom de voz alto se devesse a défice de audição.
Motivação
Os factos dados por provados dimanam da apreciação crítica e global de toda a prova produzida no seu conjunto, avaliada à luz das regras da experiência e da lógica, sempre filtrada pelos conhecimentos de vida. Prova que, para além do circunstancialismo que envolveu as condutas do Senhor Juiz, latamente aportado pela defesa, sustenta a versão da acusação, inicial e complementar, na crueza da transposição das gravações das diligências em causa. Tal como, judiciosamente, regista o Ex.mo Instrutor, ainda que algumas passagens da sua atuação na direção daquelas diligências possam favorecer um ambiente menos penoso aos interrogatórios judiciais de arguidos detidos, a verdade é que os comentários e estados de alma manifestados pelo Senhor Juiz excedem as imprescindíveis serenidade, contenção e sobriedade de linguagem dos atos processuais, mormente se potenciadas pelo juiz. Excessividade denotativa de um desequilíbrio e descontrolo incompatíveis com a necessária regularidade dos atos, geradores da particular preocupação dos Ex.mos Procuradores Susana Saavedra, Rui Botelho e Ana Cláudia Nogueira, que o confirmaram nos seus depoimentos. Comportamentos que aparentam ter sido induzidos pela ingestão de bebidas alcoólicas e/ou de medicamentos, sem que do facto se tenha alcançado qualquer juízo científico que dê disso prova bastante para o atestar como causa dessas condutas. Compreensivelmente, as testemunhas não afirmaram que as atitudes do Senhor Juiz, embora anómalas e estranhas, tivessem conexão com embriaguez, embora referissem a aparência de atuar sob influência de álcool e/ou medicação, o que acabou por conduzir à prova da aparência criada nos interlocutores de que tais atitudes se deviam ao consumo de álcool e/ou medicação. Na diligência referida em 44, a afirmada descoordenação da voz, “pastosa” e “entaramelada”, a exaltação, as flutuações de humor, a linguagem inadequada, e, por vezes, grosseira, inculca, de forma mais expressiva, a provada aparência de atuar funcionalmente sob a influência de tais produtos. Em suma, embora as testemunhas se tenham inibido de asseverar que o Senhor Juiz esteve em pleno exercício de funções jurisdicionais sob influência de álcool e/ou medicamentos, é seguro que aparentava encontrar-se em tal estado, designadamente com voz pastosa e entaramelada na diligência referida em 44, o que, de algum modo, é por si confirmado quando alega estar submetido a medicação receitada pelo médico psiquiatra (Anaframil e Topiramato) e quando assume perante os colegas que, ao almoço, ingere uísque e outras bebidas brancas. A testemunha PP, juíza ..., narrou duas situações em que viu o Senhor Juiz, em serviço, com a aparência de embriagado ou sob o efeito de qualquer outra substância, pois apresentava a voz arrastada, hálito a álcool, excessiva afetuosidade e um discurso incoerente.
São estas dificuldades probatórias que determinam à inserção das transcrições das declarações e dos diálogos mais relevantes travados no decurso das diligências, para melhor permitir a objetiva valoração da gravidade da sua conduta.
Quanto à ausência na diligência do dia 25-11-2014, releva a declaração médica de fls. 338, onde se declara que, nesse dia, esteve doente com uma gastroenterite.
Para a apreciação global dos factos apurados foram ainda valorados os seguintes elementos probatórios:
- o registo biográfico do Senhor Juiz junto a fls. 18 a 24;
- as informações prestadas pelo Tribunal da Relação relativas a faltas comunicadas pelo Senhor Juiz/requerimentos relativos à justificação de faltas de fls. 25 e 98;
- a certidão extraída do processo 218/13.6TAARC, junta a fls. 39 a 49;
- a certidão extraída do processo 1662/13.4TAVFR, a incluir a gravação digital do depoimento prestado nesse processo na diligência ocorrida em 23-10-2014, junta a fl. 53 a 58 e 103 a 135;
- a certidão extraída do processo 396/14.7GAVLC, a incluir a gravação digital das declarações prestadas nesse processo na diligência ocorrida em 28-11-2014, de fls. 78 a 87;
- a certidão extraída do processo 389/14.4GAVLC, a incluir a gravação digital das declarações prestadas nesse processo na diligência ocorrida em 21-11-2014, de fls. 88 a 95;
- a certidão extraída do processo 16/14.0GEVFR, a incluir a gravação digital das declarações prestadas nesse processo na diligência ocorrida em 26-02-2015, de fls. 450 a 466;
- a certidão extraída do processo 61/15.8PASJM, a incluir a gravação digital das declarações prestadas nesse processo na diligência ocorrida em 16-02-2015, de fls. 467 a 475;
- a declaração médica junta a fls. 338, passada pelo Senhor Dr. NN;
- as declarações prestadas pelo arguido na parte em que admitiu não ter requerido qualquer justificação da falta ao serviço dada em 25-11-2014, estar sujeito a tratamento clínico e medicamentoso (este com Anaframil e Topiramato);
- a transcrição de despacho proferido no processo 396/14.7GAVLC no qual o Senhor Juiz arguido decretou a prisão preventiva de EE, junta a fls. 385 e 386;
- os depoimentos das testemunhas:
· QQ, escrivã adjunta, e RR, escrivã auxiliar, que confirmaram o estilo usado pelo Senhor Juiz na condução das diligências, particularmente falando alto e adaptando a linguagem à condição social dos intervenientes (fls. 315 a 317; fls. 322 a 324);
· SS, escrivão de direito, realçou as qualidades funcionais, de respeito, bom trato e correção (fls. 325 a 327);
· II, Procuradora da República, que conhece o Senhor Juiz desde 2000, interveio no interrogatório judicial de arguido detido no processo 389/14.4GAVLC. Descreveu as condições em que decorreu aquele interrogatório, narrando que chegou a temer que o Senhor Juiz concretizasse a manifestada intenção sujeitar o arguido a prisão devido ao tratamento por “pá”. Mais clarificou que tinha acordado previamente com o Senhor Procurador Dr. FF provocada interrupção das diligências caso a postura do Senhor Juiz o justificasse. Confirmou o seu estilo próprio de condução das diligências, de modo informal e próximo, com adaptação da linguagem à condição das pessoas, em tom de voz alto e exaltado, mas definiu-o como pessoa habitualmente cordata e respeitadora, bem preparado e com especiais qualidades na análise da prova – fls. 318 a 321;
· FF, Procurador da República, que interveio no interrogatório judicial de arguido detido, realizado no processo 396/14.7GAVLC, que manifestou as suas preocupações pelo modo como o Senhor Juiz conduziu esse interrogatório, revelando hostilidade relativamente o arguido, dando palmadas violentas na mesa, a ponto de assustar a funcionária. Disse que não reagiu, mas aconselhou-se junto dos seus superiores, designadamente quanto à forma como o Senhor Juiz conduzia o interrogatório dos arguidos e quanto ao acerto da distribuição de serviço (fls. 332 a 335 e 339 a 343);
· PP, juíza ..., que conversou com o Senhor Procurador Dr. FF imediatamente após a realização de uma das diligências em causa e observou a sua séria preocupação quanto à medida de coação fixada pelo Senhor Juiz aos arguidos e quanto ao estado em que o mesmo se encontrava, referindo que “não estava bem”. Ainda narrou duas situações em que viu o Senhor Juiz, em serviço, com a aparência de embriagado ou sob o efeito de qualquer outra substância, pois apresentava a voz arrastada, hálito a álcool, excessiva afetuosidade e um discurso incoerente. Em conversa com o Senhor Juiz, ele admitiu que, após o almoço, ingeria um uísque ou outra bebida branca, o que a levou a pensar que o estado em que se encontrava derivasse da mistura do álcool com a medicação. Realçou as qualidades do Senhor Juiz, como pessoa, inteligente e com especial aptidão para apreciar a prova e o perfil das pessoas (fls. 328 a 331);
· TT, advogado e amigo do Senhor Juiz, que assegurou as suas habituais qualidades de correção, respeito, frontalidade e consideração no meio prisional (fls. 344 a 346);
· UU, advogada, que enalteceu as qualidades funcionais do Senhor Juiz, designadamente a adaptação da linguagem usada nos atos processuais à situação social dos intervenientes (fls. 347 a 349);
· NN, médico, que confirmou a consulta e a medicação receitada ao Senhor Juiz arguido no dia 25-11-2014 e referiu o seu estado de saúde nesse dia (fls. 350 a 352);
· OO, médico psiquiatra que faz o acompanhamento médico do Senhor Juiz e que relatou as características da patologia, a medicação prescrita e os seus efeitos (fls. 353 a 355);
· VV, Juiz Presidente do Tribunal Judicial da Comarca de ..., que falou da comunicação feita pelo Ministério Público e da perturbação gerada face às intercorrências nos interrogatórios judiciais presididos pelo Senhor Juiz, mas enaltecendo as suas qualidades profissionais e elevados conhecimentos, qualificando-o como “um magistrado de primeira água” (fls. 356 a 359);
· XX e YY, juízas de ... e amigas do Senhor Juiz, atestaram as suas qualidades profissionais e humanas e afirmaram tratar-se de um juiz competente, organizado, trabalhador e inteligente, reputado como juiz respeitador e atencioso. Referiram a perturbação que lhe causou um processo criminal em que foi arguido (fls. 360 a 367);
· ZZ, Juiz ..., referiu que, enquanto Inspetor Judicial, inspecionou o serviço do Senhor Juiz, podendo asseverar tratar-se de um magistrado com boa preparação humana e intelectual, pontual, dedicado ao serviço, brioso, acessível ao contacto humano, extrovertido, cordial, embora falando num tom de voz alto, na sua ótica, denunciativo de défice de audição (fls. 372).

Os factos que se reputaram de não provados foram infirmados pelos elementos recolhidos dos documentos juntos aos autos ou pelos depoimentos das testemunhas ou não alcançaram prova persuasiva bastante. A falta de prova do nexo de imputação da ausência à diligência agendada para o dia 25-11-2014 resultou da prova de que, nesse dia, o Senhor Juiz se apresentava fisicamente debilitado, sem condições físicas para assegurar o serviço.

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7-Fundamentação de direito :

As questões a resolver são as seguintes:

A. Inconstitucionalidade dos artigos 117º e 122º EMJ.

B. Nulidade da participação disciplinar.

C. Errónea apreciação da matéria de facto.

D. Inexigibilidade

E. Violação do direito à liberdade de expressão.

F. Sanções aplicadas.

G. Reenvio prejudicial.

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A- Inconstitucionalidade dos artigos 117º e 122º EMJ

Considera o recorrente que para assegurar a garantia constitucional de imparcialidade, o legislador ordinário no âmbito criminal prescreveu no artº 40º do CPP, que o juiz que intervém activamente em fase de inquérito, instrução ou noutro julgamento, não pode intervir na fase de julgamento.

O Tribunal Constitucional, em várias decisões (v.g., acs. nº29/99, de 13-01-99, DR, II Série, de 13-03-99 e nº297/03, de 12-06-03, DR, II Série de 3-10-03), considerou que não afecta os princípios do acusatório e do contraditório (arts. 32º nºs 1, 2 e 5 da CRP) que estão constitucionalmente associados ao sentido e função das garantias de imparcialidade e isenção do juiz, e intervenção, pontual e não intensa, no inquérito ou instrução, do juiz que posteriormente venha a integrar a formação de julgamento

  Sucede que, no caso de processo disciplinar como o ora em apreciação, a intervenção do instrutor até à fase de acusação é essencial, sendo ele que instrui e profere decisão, o mesmo sucedendo na fase de produção e apreciação da prova oferecida pela defesa.

Ora, o art,º 112º EMJ estatui que são aplicáveis ao processo disciplinar os impedimentos e suspeições vigentes em processo penal.

Por tal razão, terá de julgar-se violado o aludido normativo ao permitir que o MMº Juiz Desembargador Instrutor de Processo Disciplinar tenha deduzido acusação e proferido relatório final no Processo n.º 2012-104jPD.

A interpretação do art.º 112º EMJ, no sentido de ser válida a intervenção do mesmo instrutor de processo disciplinar em sede de recolha, apreciação de prova e dedução de acusação em processo disciplinar e de produção de prova em fase de defesa, apreciação de prova e elaboração de relatório final, acolhida pelo CSM no acta recorrido, viola os princípios do acusatório e do contraditório (arts.      32º nºs 1,2 e 5 da CRP).        

Vejamos:                         

 Estabelece o  artigo 117.º do EMJ(Acusação)

1 - Concluída a instrução e junto o registo disciplinar do arguido, o instrutor deduz acusação no prazo de dez dias, articulando discriminadamente os factos constitutivos da infracção disciplinar e os que integram circunstâncias agravantes ou atenuantes, que repute indiciados, indicando os preceitos legais no caso aplicáveis.

2 - Se não se indiciarem suficientemente factos constitutivos da infracção ou da responsabilidade do arguido, ou o procedimento disciplinar se encontrar extinto, o instrutor elabora em dez dias o seu relatório, seguindo-se os demais termos aplicáveis.

  E o artigo 122.º do EMJ (Relatório) estabelece que terminada a produção da prova, o instrutor elabora, no prazo de quinze dias, um relatório, do qual devem constar os factos cuja existência considere provada, a sua qualificação e a pena aplicável.

O CSM defende, e bem, que o artigo 32º, 1, 2 e 5, da Constituição da República Portuguesa, que condensa os mais importantes princípios do processo penal, designadamente a estrutura acusatória do processo criminal, não estende seu âmbito de aplicação a todo e qualquer processo sancionatório.

Por isso, a propósito dos procedimentos disciplinares, a jurisprudência constitucional tem unanimemente defendido que os direitos de audiência e defesa previstos naquela norma constitucional não atraem o regime do processo criminal para todos os demais ramos do direito sancionatório e, em particular, para o processo disciplinar . Embora a estrutura acusatória do processo penal vise garantir a isenção, independência e imparcialidade da decisão judicial, pressupondo que o julgador não tenha funções de investigação e de acusação, essa exigência constitucional não tem aplicação ao processo disciplinar e nem sequer ao processo contraordenacional.

A Constituição da República Portuguesa (CRP), nesse tipo de processos, tem somente em vista assegurar os direitos de audiência e de defesa do arguido. E só poderá haver um juízo negativo de constitucionalidade quando qualquer tipo de sanção, contraordenacional, administrativa, fiscal, laboral, disciplinar ou qualquer outra, é aplicada sem prévia audição do arguido (direito de audição) e sem lhe conferir condições para se defender das imputações que lhe são feitas (direito de defesa), apresentando meios de prova e requerendo a realização de diligências tendentes a apurar a verdade.

Esta tese, que subscrevemos, encontra eco na jurisprudência constitucional, nomeadamente, no Acórdão do TC nº 33/2002 de 21-1-2002,onde duma forma inequívoca se refere que o requerente, como se viu, invoca que se do regime constitucional respeitante do processo criminal, bem como do Código de Processo Penal, resulta que diferentes hão-de ser os juízes da pronúncia e do julgamento, o que é estabelecido tendo em vista a garantia da imparcialidade do julgamento, igualmente em processo administrativo sancionatório não deverá coincidir na mesma pessoa a competência para instruir e aplicar a sanção.

Sem que seja necessário discutir agora em que medida é que o diploma básico impõe, perante o gizar do processo criminal como devendo obedecer a uma estrutura acusatória, a cisão entre o juiz da instrução ou da pronúncia e o juiz do julgamento (e sobre esse ponto já este Tribunal teve ocasião de discretear - cf. Acórdãos n.os 13/83 e 219/89, nos Acórdãos do Tribunal Constitucional, 1.º vol., pp. 151 e segs., e 19.º vol., t. 2, pp. 717 e segs.), o que é certo é que a assimilação do processo criminal ao processo disciplinar tem limites derivados da natureza de um e de outro, e dos objectivos, necessariamente distintos, que um e outro visam prosseguir. Aliás, seria desde logo questionável em que medida é imposta a estrutura acusatória do processo disciplinar atenta a sua específica natureza.

Efectivamente, a responsabilidade disciplinar visa assegurar o complexo de deveres a cuja observância é obrigado quem pertence a dada instituição ou corpo social dotado de organização com carácter de estabilidade e de permanência, sujeição essa que, correlativamente, implica que haja, nessa instituição ou corpo social, órgãos dirigentes aos quais é atribuída competência para reprimir, mediante a aplicação de sanções, a violação daqueles deveres, aplicação que, obviamente, atinge o prevaricador enquanto membro da instituição ou corpo social e não enquanto cidadão.

O poder punitivo disciplinar não se identifica, assim, com aquele poder punitivo do Estado - exercido sobre todo o território do Estado e sobre quem nele se encontre - exercido no âmbito criminal. O poder punitivo disciplinar é, antes, um poder de "supremacia especial", que apenas pode ser exercido relativamente a quem pertence à instituição ou corpo social.

Como tal consideramos que não se verifica a invocada inconstitucionalidade.

B- Nulidade da participação disciplinar

Defende o recorrente que a participação disciplinar remetida ao CSM tem de ter-se por inválida, sendo nula ou se assim se não entender, anulável - arts 133 nºs 1 e 2 ,al. a),134º,135º e 136 do CPA, invalidade que inquina todo o processado ulterior, uma vez que para efeito dessa participação disciplinar tiveram necessariamente que ser consultados os autos de processo penal respectivos, incluindo a audição de diligências realizadas no âmbito desses autos, pelo Exmo Senhor Juiz Presidente da Comarca de ... e/ou pelo Exmo Senhor Juiz Coordenador das Secções da Comarca de ... sitas no Município de ....

A consulta dos referidos autos e audição dos registos magnetofónicos de diligências realizadas no âmbito desses autos, não é da competência legal atribuída a esses Exmos Senhores Magistrados, como bem se alcança dos arts. 94º e 95º LOS].

Por outro lado, a consulta desses mesmos autos e audição de registos áudio de diligências processuais ofendeu o disposto nos citados arts. 88º e 89º CPP.

Decidindo:

Estabelece o 133,nº 1 e 2 a) do CPA:

1-São nulos os actos a que falte qualquer dos elementos essenciais ou para os quais a lei comine expressamente essa forma de invalidade.

2- São, designadamente, actos nulos:

a)Os actos viciados de usurpação de poder.

As ilegalidades do acto administrativo podem assumir várias formas. Essas formas são apelidadas de “vícios do acto administrativo” e esses mesmos vícios representam as formas específicas que a ilegalidade do acto administrativo pode revestir. Esses vícios são a usurpação de poder e incompetência que se enquadram na ideia de ilegalidade orgânica. O vicio de forma que se enquadra numa ilegalidade formal, e a violação de lei e desvio de poder que se ligam à ideia de ilegalidade material.

Em relação à usurpação de poder devemos começar por referir que a mesma é o vício que consiste na prática por um órgão administrativo de um acto incluído nas atribuições do poder legislativo, do poder moderador ou do poder judicial, tratando-se portanto de um vício que assenta na violação do princípio de separação de poderes contemplada no artigo 111º da CRP.

 Para o Prof. Marcelo Caetano([26]) o vício de usurpação de poderes estava incluído na prática pela administração de um acto incluído nas atribuições do poder judicial. Contudo, o Prof. Freitas do Amaral([27]) tem uma perspectiva diferente, para ele, o mesmo contempla três modalidades, sendo elas a usurpação do poder legislativo onde podemos dar como exemplo a criação de um imposto por acto administrativo. A usurpação do poder moderador, onde temos como situação que serve de exemplo, o Primeiro-Ministro demitir um funcionário da Presidência da Republica. E, em terceiro e último lugar, uma deliberação de uma câmara Municipal que declare a nulidade de um contrato civil.

Daqui decorre que a usurpação parece fazer apenas sentido dentro da lógica de separação de poderes abstractamente concebida ou um exercício abusivo de um poder ilicitamente adquirido .

Ora tal situação não se verifica no caso em apreço, já que como bem nota o recorrido CSM, o Juiz Presidente do Tribunal Judicial da Comarca de ..., ao tomar conhecimento das condutas do Senhor Juiz, ficou vinculado a participar ao CSM os factos com relevância disciplinar (artigo 206.º, 1, da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LGTFP)  ex vi artigo 131.º do EMJ).

Com vem notado pelo recorrido  qualquer consulta dos autos que possa ter sido efectuada para recolha de elementos documentadores dos comportamentos do Senhor Juiz nesses processos é alheia ao exercício da função jurisdicional ,mas  insere-se no âmbito do acompanhamento da actividade do tribunal e dos juízes, prosseguido à luz do preceituado no n.º 8 do predito artigo 94.º, que pressupõe, necessariamente, o acesso aos processos da comarca e a recolha dos respectivos dados informatizados, incluindo, como bem refere o Ex.mo Instrutor, aos dados de conteúdo, essenciais para garantir um acompanhamento eficaz da actividade do tribunal.

Por outro lado como nota o Mº P segundo a jurisprudência do STJ a notícia dos factos pode obter-se por apreensão directa da parte, da entidade competente para  a instauração do procedimento disciplinar, ou através de documentos que lhe são remetidos, ou ainda através de participação ou queixa, sendo que a forma de aquisição do conhecimento dos factos pela entidade competente não releva, desde que esta considere fundadamente perante uma factualidade que pode preencher os requisitos da responsabilidade disciplinar([28]) ,o que afasta a relevância de aquisição do conhecimento dos factos e consequentemente, qualquer forma de invalidade da participação disciplinar.

O segredo de justiça significa que o conteúdo dos actos do processo não pode ser divulgado nem o público pode assistir aos actos processuais. Não existem elementos que nos permitam concluir que o processo donde foram retirados os factos disciplinares estivesse sujeito a segredo de justiça.

E ainda que os processos referidos possam estar submetidos ao regime de segredo de justiça, todos os que se relacionarem com qualquer elemento do processo ficam sujeitos às prescrições correspondentes. Com efeito, os elementos recolhidos no processo penal que estejam enquadrados por um específico regime de segredo continuam a beneficiar da tutela inerente a esse regime, apesar da sua integração em qualquer outro processo, ainda que de diversa natureza, independentemente de o mesmo estar ou não sujeito à existência de segredo de justiça([29]).

Como tal consideramos não se verificar esta nulidade.

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C- Errónea apreciação da matéria de facto

O recorrente atribui à deliberação impugnada errónea apreciação da matéria de facto, defendendo que a matéria de facto apurada sob os n.ºs 25, 45, 67, 68 e 69 a 84º deve ser dada por não provada, por contrariar as regras da experiência comum. Sustenta que a alteração de humor é provocada pelos medicamentos e a linguagem usada é simples com o fito de ser entendida por pessoas simples, correspondendo ao estilo adoptado por muitos outros magistrados.

Decidindo:

Alinhamos pela posição do recorrido CSM, que subscrevemos e que reflecte a quase unânime orientação jurisprudencial deste tribunal . Tem sido esse o sentido uniforme da jurisprudência do STJ ao decidir que, enquanto tribunal de revista, tem, por via de regra, os seus poderes de cognição limitados a matéria de direito, só se podendo imiscuir no conhecimento de matéria de facto quando ocorram erros manifestos e grosseiros que impossibilitem uma decisão correta e rigorosa do aspecto jurídico da causa. Deste modo, com excepção de erros patentes, manifestos ou grosseiros, não compete ao STJ proceder à reapreciação da matéria de facto que o órgão administrativo deu por provada, seja no sentido da exclusão de factos que, de acordo com uma diferente leitura ou valoração da prova produzida, foram incorrecta ou indevidamente considerados como provados, seja no sentido inverso, isto é, na não inclusão de matéria de facto alegada pelo arguido.

Em função do estatuído no artigo 192.º do CPTA, o recurso das deliberações do CSM, sendo actos formalmente administrativos, é regulado pelas normas que disciplinam o recurso de revista para o STA e, supletivamente, pelo disposto no Código de Processo Civil, regime que restringe o conhecimento dos tribunais de revista, como é o caso do STJ, ao conhecimento da matéria de direito e só admite reapreciação da matéria de facto quando a entidade administrativa tenha dado como provado um facto para o qual não tenha produzido a prova legalmente indispensável para o efeito ou tenha desrespeitado normas que fixem a força probatória dos meios de prova (artigo 150.º, 4, in fine, do CPTA).([30])

Diremos, por último, que a argumentação e pretensão do recorrente, neste ponto, converge para a questão da inexigibilidade que apreciaremos infra.

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D- Inexigibilidade

Entende o recorrente que não praticou infracção disciplinar decorrente da falta ao serviço, porque foi a sua doença que o impediu de comparecer ao serviço e de justificar a falta pelo que se encontra verificada a circunstância dirimente da responsabilidade disciplinar de não exigibilidade de conduta diversa (artigo 190.º, 1, e), da LGTFP).

O recorrido CSM estranha tal afirmação, porque se excluiu o imprescindível nexo de imputação da falta dada ao serviço no dia 25-11-2014, que deu causa ao adiamento do debate instrutório agendado para as 11:00 horas desse dia, nos autos de instrução 218/13.6TAARC, da 3.ª secção de instrução criminal, sedeada em ..., da instância central da comarca de ....

Acresce que se enjeita que o estado clínico e anímico em que actuou integra a causa de exculpação de  inexigibilidade de outra conduta. A exigência ética e funcional da judicatura não se compadece com condutas como as descritas, com reflexos negativos no decurso das diligências e nos direitos e garantias processuais conferidos aos arguidos.

Não obstante a comprovação da sua submissão a tratamento com fármacos do foro psiquiátrico, não ocorre qualquer circunstância dirimente da sua responsabilidade disciplinar. A inexigibilidade de conduta diversa supõe a presença de circunstâncias externas que não deixam ao agente a possibilidade de se comportar de modo diverso. Ora, as suas atitudes e ditos não são compatíveis com a mera ingestão de medicamentos e, ainda menos, a ponto de repelir a sua culpa.

Vejamos:

Resulta da factualidade apurada que o estado clínico e anímico em que se encontrava o recorrente não é suficiente para sem mais “desculpar” a sua conduta.

Para que tal acontecesse era imperioso que se desse como demonstrado que ele se encontrava impossibilitado de cumprir o mais elementar dever de,  em 5 dias, justificar a falta. Razões reconhecidamente insuperáveis como refere o Mº Pº alicerçando-se no acórdão deste Tribunal de  5.7.12 Processo 129/11.0YFLSB. ([31])

E- Violação do direito à liberdade de expressão

Considera o recorrente que se encontra em sede de liberdade de expressão, pelo que que não violou direitos de personalidade alheios, tendo respeitado obrigações de urbanidade e de probidade.

As expressões em questão encontram-se descontextualizadas, truncadas, tendo-lhes sido atribuída uma conotação diversa da pretendida pelo Recorrente. As expressões usadas ponderadas e contextualizadas nunca poderão ser reputadas de ilícitas e dolosas, tanto mais quando foi expressa oralmente, não foi ponderado o uso das expressões, antes surgindo as mesmas num contextos dialéctico de diálogo com arguidos e testemunha.

 Aliás, o modo como se expressa e expressou, sempre terá que ficar a coberto da liberdade de expressão, direito legal e constitucionalmente garantido, sendo igualmente reconhecido pela Convenção dos Direitos do Homem - arts.º 37º CRP e 10º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.

A  liberdade de expressão e de informação, que tem a sua consagração no artigo 37.Q da Constituição, ao referir que "Todos têm o direito de exprimir e divulgar livremente o seu pensamento pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, bem como o direito de informar, de se informar e de ser informados, sem impedimentos nem discriminações" (n.º 1), acrescentando que

"O exercício destes direitos não pode ser impedido ou limitado por qualquer tipo ou forma de censura" (n.º 2).

Decidindo:

Sempre com o devido respeito, parece-nos manifestamente despropositado o recurso à liberdade de expressão para justificar uma conduta que nada tem a ver com um direito que assiste a todos os cidadãos, e muito menos com o comportamento minimamente exigível a qualquer magistrado mesmo que não no exercício das suas funções.

A linguagem utilizada encerra uma patente falta de correcção, urbanidade e desrespeito pela dignidade dos arguidos, cujos direitos processuais inobservou. Temos como certo que o dever de correcção não é só compaginável quando existe um carácter ofensivo da honra ou dignidade. Consideramos também que a utilização de afirmações, desnecessárias e injustificadas que nada têm a ver com a finalidade subjacente, como é o caso, só por si, podem não consubstanciar a violação deste dever. Não temos dúvidas, também, que estamos perante a utilização de uma linguagem, de um estilo, que se deve evitar, indesejável. Mas também não temos dúvidas que foi violado o dever de correcção, na medida em que este tem que ser aferido como um dever objectivo correlacionado com a necessidade e proporcionalidade.

Com o estilo e temas que impôs, desmesurados, desnecessários e que nada têm a ver com a finalidade visada com as diligências em curso, o recorrente desrespeitando obrigações de urbanidade probidade, violou o dever de correcção.

Além do mais o dever de correcção postula também “comportamento conforme á dignidade das próprias funções “ ou actividade funcional do trabalhador e o seu posicionamento na organização (Ettore Morone,  Impiego Publico,Novissimo Digesto Italiano, III,Unione Tipografico, Editore Torinense ,pag. 275).

F- Sanções aplicadas

Considera o recorrente que existe desproporcionalidade da pena sustentando que lhe são imputadas faltas alegadamente cometidas durante um período de 4 meses, e que este período numa carreira de 21 anos de serviço, não se pode reconduzir à pena de afastamento da função, mais defendendo que sempre se deveria considerar que se verificam circunstâncias que impõem a atenuação especial da pena, nos termos do disposto no artº 87º do EMJ.

Vejamos:

O STJ só poderá intervir na fixação da medida disciplinar aplicada quando detecte que ocorreu um evidente erro manifesto, crasso ou grosseiro ou que a essa fixação decorreu da adopção de critérios ostensivamente desajustados ou violadores de princípios - como seja o da proporcionalidade -, posto que o juízo emitido pelo CSM a esse respeito se insere na ampla margem de apreciação e avaliação de que, enquanto órgão administrativo, dispõe, sendo os seus elementos incontroláveis pelos órgãos jurisdicionais.

Fora destes casos, deve entender-se que o juízo emitido pelo CSM se insere na ampla margem de liberdade de apreciação e avaliação de que, como órgão administrativo, goza, sendo, por isso, os respectivos elementos incontroláveis pelos órgãos jurisdicionais([32]).

É precisamente nesse circunscrito contexto que o recorrente desenha e enquadra o seu recurso, invocando ser “a medida disciplinar de aposentação compulsiva que lhe foi aplicada desproporcionada ao fim que se pretende atingir, sobretudo quando existe um leque de penas menos gravosas que poderiam haver sido mobilizadas e aplicadas ante a infracção descrita.

Não tem razão.

Inexistem elementos que legitimem a conclusão de que a pena aplicada esteja em desconformidade patente com a infracção disciplinar sancionada, que de entre as possíveis de serem aplicadas à luz do enquadramento legal sancionatório (cfr. arts. 85.°, nº 1, 90.º e 95.º, nº 1 do EMJ) seja desproporcionada aos fins visados pela lei, ou traduza a imposição de um sacrifício excessivo e desproporcionado para a posição jurídica do arguido.

Ao invés o comportamento do recorrente sobretudo depois dos ocorrências disciplinares em que foi condenado e que se protelaram ao longo de 4 anos , não auguram um futuro consentâneo  com o mínimo que se exige  a um magistrado.  A gravidade da violação dos deveres funcionais do recorrente, atenta, nomeadamente, a reiteração ou a natureza de execução  continuada da conduta do recorrente, faz-nos facilmente concluir que não se trata de um episódio esporádico, mas de uma maneira de ser e de estar que denota incapacidade para alterar o seu comportamento.

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G- Reenvio Prejudicial

Diz o recorrente que s direitos à liberdade de expressão, e o direito a um processo disciplinar justo fundamental e equitativo, para além estarem consagrados na CRP, são protegidos pelo ordenamento jurídico comunitário sendo assegurados a todos os cidadãos europeus, e estão consagrados nos arts.º 3º} § 3} TUE} 1º, n.º 1 e 112, da Carta dos Direitos Fundamentais da E. art.º 62, 102 e 13º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.

Estes direitos fundamentais admitem restrições excepcionais e limitadas, designadamente por força das actividades profissionais concretas ou o contexto em que as mesmas são exercidas, desde que os objectivos a atingir com a restrição sejam legítimos e proporcionais.

No caso, nenhuma limitação existe passível de justificar a restrição dos apontados direitos do recorrente, razão pela qual a interpretação dos arts. 82º e 96º e ss EMJ operada pela decisão recorrida é violadora dos apontados Tratados e Cartas.

Considerando que o ST] é a única e a mais alta instância que pode apreciar o caso dos autos, afigura-se a como obrigatório reenvio prejudicial com vista a apreciar a conformidade das apontadas normas EM] com o Direito Comunitário - art.º 267º, al. bJ TUE.

Decidindo:

Mais uma vez não lhe assiste razão já que como defende o  recorrido CSM o artigo 6.º, n.º 1, do Tratado da União Europeia, alterado pelo Tratado de Lisboa, estabelece que a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia é juridicamente vinculativa para os Estados-Membros na observância do princípio da subsidiariedade, a significar que estes se encontram vinculados aos direitos fundamentais garantidos pelas respectivas constituições nacionais e, quando aplicam o direito da União, devem também respeitar as normas e princípios comunitários.

Destarte, a Carta não confere uma competência geral de intervenção em matéria de direitos fundamentais. Os Estados-Membros têm os seus próprios sistemas de protecção dos direitos fundamentais e a Carta não os substitui. São os tribunais nacionais que devem assegurar o respeito pelos direitos fundamentais, sem necessidade de qualquer reenvio prejudicial quanto às questões de direito suscitadas. Medida em que falece a pretensão do impugnante.([33])

                                                        #

Caixa de texto: 11-DECISÃO:
Nesta conformidade, acorda-se em julgar improcedente o recurso interposto.
Custas a cargo do recorrente, conforme art. 527.º, nº 1, do Novo Código de Processo Civil, com taxa de justiça que se fixa em 6 Ucs, nos termos do disposto na Tabela l-A, anexa ao Regulamento das Custas Processuais, e art. 7.º, nº 1 deste mesmo diploma, sendo o valor da presente acção de 30.000,01€, atento o disposto no art. 34.º, nº 2 do CPTA.
Notifique.
João Trindade (relator)
Martins de Sousa
Oliveira Mendes
Ana Luísa Geraldes
Isabel Pais Martins
Pinto de Almeida
Silva Gonçalves
Sebastião Póvoas (Presidente da Secção)                                                                                                                                     

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[1] «- Dez dias de multa pela infração consubstanciada na violação dos deveres de zelo, prossecução do interesse público e lealdade [artigos 73.º, n.º 1, 2, e) e 7 da LGTFP, 82.º, 85.º, n.º1, a) e 86.º do EMJ];
- aposentação compulsiva pela prática de uma infração aos deveres de correção, prossecução do interesse público, imparcialidade, lealdade e dos deveres deontológicos, impostos pela função de juiz, respeito, urbanidade, consideração pela pessoa do arguido, imparcialidade, respeito pelas competências da defesa e do Ministério Público, reserva, sentido de responsabilidade e dos ligados à consideração e promoção das funções de juiz [artigos 73.º, n.º 1, 2, a), c), g) h), 3, 5, 9 e 10 da LGTFP, 82.º, , 85.º, n.º 1, f), 95.º, 1, a) e c) do EMJ];
- sanção única de aposentação compulsiva, na operatividade do cúmulo jurídico daquelas sanções com a sanção de 100 dias de suspensão de exercício de funções decorrente do processo 2012-104/PD e a sanção de 130 dias de suspensão de exercício de funções relativa ao processo 2014-121/PD;
2. determinar a assunção dos procedimentos administrativos relativos à aplicação das consequências da falta injustificada, dada ao serviço no dia 25-11-2014.».
[2] In www.tribunalconstitucional.pt: Ac. do TC n.º 33/2002, de 22-01-2002.
[3] In www.tribunalconstitucional.pt: Ac. do TC n.º 33/2002, de 22-01-2002.
[4] Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, tomo I, Coimbra, 2005, p. 363.
[5] Aprovada pela Lei n.º 35/2014, de 20 de Junho.
[6] Aprovada pela Lei 62/2013, de 26 de Agosto.
[7] Parecer do Conselho Consultivo da PGR nº 25/2009 , in diário da república, 2ª Série, de 17-11-2009.
[8] Aprovado pela Lei nº 15/2002, de 22 de Fevereiro.
[9] In www.dgsi.pt: Ac. do STJ de 22-01-2015, processo 53/14.4YFLSB.
[10] In www.dgsi.pt: Acs. do STJ de 9-07-2015, processo 52/14.6YFLSB; 22-01-2015, processo 53/14.4YFLSB; 16-12-2014, processo 24/14.0YFLSB.

[11] In www.dgsi.pt: Ac. do STJ de 14-12-2004, processo 4436/2003; entendimento ulteriormente reiterado nos Acs. de 25-11-2008, processo 2444/2007 e de 12-02-2009, processo 4485/2007.

[12] In www. dgsi.pt: Ac. do pleno do STA de 1-01-2006, processo 0733/2004; em igual sentido: Ac. do STA de 23-10-2008, processo 0561/2007; Ac. do STJ de 05-07-2012, processo  69/11.2YFLSB.

[13] In www.dgsi.pt: Ac. do STJ de 16-12-2014, processo 49/14.6YFLSB.
[14] Álvaro Reis Figueira, ibidem, pág. 18.
[15] Paulo Veiga e Moura, “Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores da Administração Pública”, 2.ª ed., pág. 257.

[16] In www.dgsi.pt:  Acs. do STJ de 14-12-2004, processo 4436/03; 21-03-2013, processo 15/12.6YFLSB.

[17] In www.dgsi.pt:  Acs. do STJ de 05-06-2012, processo118/11.4YFLSB; 11-12-2012, processo 22/12.9YFLSB.

[18] In www.dgsi.pt: Ac. do STJ de 21-11-2012, processo 66/12.0YFLSB.
[19] In www.dgsi.pt: Acs. do STJ de 20-03-2014, processo 96/13.5YFLSB; 16-12-2014, processo 24/14.0YFLSB.
[20] Paulo Veiga e Moura, ibidem, pág. 172.

[21] In www.dgsi.pt. Ac. do STJ de 25-09-2014, processo 21/14.6YFLSB.

[22] In www.dgsi.pt: Ac. do STJ de 18-10-2012, processo 58/12.0YFLSB.

[23] In www.dgsi.pt: Ac. do STJ de 25-09-2014, processo 21/14.6YFLSB.

[24] In www.tribunalconstitucional.pt: Acs. TC n.ºs 145/2014, de 13-02-2014; 509/2015, de 13-10-2015; 517/2015, de 14-10-2015.

[25] In www.dgsi.pt: Acs. do STJ de 12-02-2009, processo 4485/2007; 16-11-2010, processo n.º 451/09.5YFLSB; 21-03-2013, processo 15/12.6YFLSB.


[26] A “usurpação de poderes” é uma figura tratada pelo professor Marcelo Caetano (Manual de Administrativo) como “a prática, por um órgão administrativo, de um ato incluído nas atribuições dos tribunais judiciais. Qualificando esta figura como “uma forma agravada de carência de competência do autor do ato, este professor, em nota de pé de pagina que a usurpação pode ser também, eventualmente, em relação ao poder administrativo mas sem uma convicção forte nesse sentido devido à falta de jurisprudência sobre
[27] O Professor Freitas do Amaral vai estender o conceito não só ao poder legislativo como ao poder moderador, com base no princípio da separação de poderes, fundamental no estado de Direito e consagrado no 2º e 111º da CRP (Curso de Direito Administrativo).
Existe usurpação de poder quando um órgão da Administração pratica um acto incluído nas atribuições do poder legislativo ou do poder judicial (cfr FREITAS DO AMARAL in “Direito Administrativo” III VOL, pag 295).
[28] -Ac. STJ de 16.11.2010,Processo nº 451/09.5YFLSB,ibidem p. 946
[29] Parecer do Conselho Consultivo da PGR nº25/2009 , in diário da república, 2ª Série, de 17-11-2009.
[30] -O STJ mesmo em processo contencioso só conhece de matéria de direito (Prº 87361-21-3).
A inexistência de um 2º grau de jurisdição  no que toca ao recurso da deliberação do CSM não viola o princípio da tutela jurisdicional efectiva(Prº 811/07 – 12.7.07).
[31] - Neste sentido também os Acórdãos  de 5.6.12,Processo 127/11.3YFLSB e de 16.12.2014,Processo nº 49/14.6YFLSB
[32] Cfr. Acs. do STJ de 5/07/12, Proc. nº 128/11.1YFLSB, citado pelo recorrente, 19/09/12, Proc. nº 10/12.5YFLSB, e 18/10/12, Procs. nºs 24/12.5YFLSB, já citado, e  58/12.0YFLSB, no IGFEJ.
[33] -Neste sentido entre outros Ac. STJ  20-6.13- Procº 149/11