Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
104/07.9JBLSB.C1.S1
Nº Convencional: 3.ª SECÇÃO
Relator: MAIA COSTA
Descritores: RECURSO PENAL
BURLA QUALIFICADA
EXTORSÃO
BRANQUEAMENTO
ADMISSIBILIDADE DE RECURSO
COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
ACORDÃO DA RELAÇÃO
DUPLA CONFORME
MATÉRIA DE FACTO
ÓNUS DE IMPUGNAÇÃO ESPECIFICADA
MEDIDA CONCRETA DA PENA
CONCURSO DE INFRACÇÕES
CÚMULO JURÍDICO
PENA PARCELAR
PENA ÚNICA
IMAGEM GLOBAL DO FACTO
PREVENÇÃO GERAL
PREVENÇÃO ESPECIAL
ILICITUDE
COMPRESSÃO
Data do Acordão: 01/08/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO DO ARGUIDO A E PROVIDO EM PARTE O DO ARGUIDO B
Área Temática:
DIREITO PENAL - CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS DO FACTO - ESCOLHA E MEDIDA DA PENA / PUNIÇÃO DO CONCURSO DE CRIMES.
DIREITO PROCESSUAL PENAL - RECURSOS.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO PENAL (CPP): - ARTIGOS 400.º, N.º1, AL. F), 410.º, N.º2, 412.º, N.ºS 3 E 4.
CÓDIGO PENAL (CP): - ARTIGO 77.º, N.º 1.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃO DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL:
- N.º 186/2013.
-*-

ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:
-DE 20.10.2010 (PROC. Nº 1099/06.1TAPTM.E1.S1), E DE 11.1.2012 (PROC. Nº 158/08.0SVLSB.L1.S1).
Sumário : I  -   Conforme jurisprudência largamente maioritária do STJ, e uniforme nesta 3.ª Secção, por força da al. f) do n.º 1 do art. 400.º do CPP, que impede a impugnação das decisões das Relações que confirmem decisão da 1.ª instância («dupla conforme») e apliquem pena não superior a 8 anos de prisão, no caso de haver uma pena conjunta superior a essa medida, não pode ser objeto de recurso para o STJ a matéria referente às penas parcelares que não a ultrapassem.

II -  Da mesma forma, excede a matéria do recurso a apreciação realizada pela Relação, no âmbito da impugnação de facto. Na verdade, ao STJ caberá indagar se a Relação procedeu ou não à análise da impugnação da matéria de facto, quando ela exista, e cumpra os requisitos indicados no art. 412.º, n.ºs 3 e 4, do CPP. Mas já não avaliar como a Relação procedeu a essa análise, pois doutra forma se imiscuiria na sua função, exclusiva, de fiscalização da matéria de facto.

III - A impugnação de facto deve incidir sobre pontos precisos, com indicação das provas concretas que impõem decisão diversa. Ou seja, há que individualizar os factos contestados, e indicar, para cada um, as provas que impõem a fixação de um facto diferente. Sem essa individualização de factos e provas a Relação não poderá realizar um juízo próprio e autónomo sobre os factos impugnados.

IV - O arguido A foi condenado, por 10 crimes de burla qualificada, em penas que variaram entre 5 anos e 3 anos e 6 meses de prisão; por 17 crimes de extorsão, em penas de 6 anos a 2 anos e 6 meses de prisão; e por 1 crime de branqueamento, na pena de 5 anos de prisão.

V - A verdadeira dimensão da ilicitude e da culpa é revelada pela conceção e preparação por este arguido do projeto criminoso, altamente engenhoso e sofisticado, que lhe permitiu, a partir de Portugal, iniciar uma série de atos que incidiram sobre instituições financeiras dos EUA e levaram à obtenção ilícita de proventos muito elevados, quer enganando os funcionários das agências, quer coagindo-os através de ameaças aparentemente idóneas a provocar-lhes perigo de morte. O engenho demonstrado apoiou-se nos conhecimentos e informações adquiridos naquele país, e revelam um propósito criminoso muito intenso, e uma audácia absolutamente invulgar. A preparação da «rede» em Portugal e o seu funcionamento mostram igualmente uma excecional capacidade de organização e chefia na prática de atos criminosos.

VI - De realçar ainda a intensidade da prática criminosa, que durou alguns meses e só terminou com a intervenção policial. Na realidade, o plano idealizado pelo arguido e por ele dirigido na sua execução constitui um caso raro no nosso País, revelador de uma excecional perigosidade criminosa, quer pela capacidade de conceção de um plano criminoso, quer pela capacidade de o pôr em prática. As exigências de prevenção especial são, pois, excecionalmente fortes, reforçadas aliás com o vasto passado criminal do arguido nos EUA, e também, em menor medida, em Portugal. E também evidentemente as necessidades de salvaguarda da prevenção geral se mostram intensíssimas, dada a necessidade de garantir a fiabilidade e segurança das relações e transferências financeiras, e a própria tranquilidade e segurança das pessoas.

VII - Neste quadro, tendo em conta os critérios da fixação da pena conjunta, que atendem à conjugação dos factos com a personalidade do agente (art. 77.º, n.º 1, do CP), há que concluir, sem quaisquer dúvidas, que os factos praticados se ajustam completamente à personalidade do arguido, compondo uma imagem global da situação intensamente negativa. Assim, sendo embora a pena parcelar mais elevada de 6 anos de prisão, a conjugação global de factos e personalidade impede qualquer redução da pena fixada [17 anos de prisão], pois só ela poderá satisfazer, ainda que porventura apenas pelo mínimo, as exigências da prevenção, não excedendo de forma alguma a medida da culpa.

VIII - O arguido J arguido funcionou como o «braço direito» do anterior na prática criminosa. Foi ele que «recrutou» os outros membros do grupo que executou as sucessivas ações criminosas. Foi ele que coadjuvou, do princípio ao fim, a atuação do arguido A. Se não concebeu o plano, nem para isso tinha capacidade nem conhecimentos técnicos, executou-o lado a lado com este último, como «sócio».
IX - Este arguido levou uma vida socialmente inserida e sem motivos de censura até à chegada a Portugal do coarguido A, seu sobrinho. Inclusivamente, foi presidente da Junta de Freguesia de … em alguns mandatos e tem integrado os órgãos diretivos de várias associações locais. Terá sido a ganância e a avidez do lucro, despoletadas pela proposta do coarguido, que o atraíram para o projeto criminoso. O que não deixa de ser muito censurável, mas a censurabilidade da sua conduta é incomparavelmente inferior à do arguido A.
X -  Sendo embora muito intensas as necessidades de prevenção geral, considera-se adequado, tendo em conta a personalidade não desviante revelada pelo arguido J, reduzir-lhe a pena conjunta de 12 para 10 anos de prisão.

Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

I. Relatório

            Por acórdão de 27.8.2010 do tribunal coletivo do 2º Juízo do Tribunal Judicial de Mangualde, foram condenados os arguidos:

            AA, com os sinais dos autos, pela prática de:

- dez crimes de burla qualificada, p. e p. pelos arts. 217º, nº 1 e 218º, nº 2, a) e b), do Código Penal (CP), nas seguintes penas: um crime com a pena de 5 anos de prisão; um crime com a pena de 4 anos e 8 meses de prisão; um crime com a pena de 4 anos e 6 meses de prisão; um crime com a pena de 4 anos e 4 meses de prisão; três crimes com a pena de 4 anos de prisão, por cada um; um crime com a pena de 3 anos e 8 meses de prisão; e dois crimes com a pena de 3 anos e 6 meses de prisão, por cada um;

- dezassete crimes de extorsão, p. e p. pelos arts. 223º, nºs 1 e 3, a), e 204º, nº 2, g), do CP, nas seguintes penas: um crime punido com a pena de 6 anos de prisão; três crimes com a pena de 5 anos e 6 meses de prisão, por cada um; cinco crimes com a pena de 5 anos de prisão, por cada um; quatro crimes tentados com a pena de 3 anos de prisão, por cada um; quatro crimes tentados com a pena de 2 anos e 6 meses de prisão, por cada um;

- um crime de branqueamento, p. e p. pelo art. 368º-A, nºs 1 a 3, do CP, com a pena de 5 anos de prisão.

Em cúmulo, foi condenado na pena conjunta de 17 anos de prisão.

BB, com os sinais dos autos, pela prática de:

- oito crimes de burla qualificada, p. e p. pelas disposições citadas, nas seguintes penas: um crime com a pena de 4 anos de prisão; um crime com a pena de 3 anos e 8 meses de prisão; dois crimes com a pena de 3 anos de prisão, por cada um; três crimes com a pena de 1 anos e 6 meses de prisão, por cada um; um crime com a pena de 1 ano de prisão;

- quinze crimes de extorsão, p e p. pelas disposições citadas, nas seguintes penas: um crime com a pena de 5 anos e 2 meses de prisão; três crimes com a pena de 5 anos de prisão, por cada um; cinco crimes com a pena de 4 anos e 6 meses de prisão, por cada um; três crimes tentados com a pena de 2 anos e 6 meses de prisão, por cada um; três crimes tentados com a pena de 2 anos de prisão, por cada um;

- um crime de branqueamento, p. e p pela disposição citada, na pena de 4 anos e 6 meses de prisão.

Em cúmulo, foi condenado na pena conjunta de 12 anos de prisão.[1]

Desse acórdão interpuseram os arguidos recurso para o Tribunal da Relação de Coimbra, que, por acórdão de 22.5.2013, confirmou integralmente a decisão recorrida.[2]

Do acórdão da Relação recorreram os arguidos para este Supremo Tribunal.

Conclui assim a sua motivação o arguido AA:

DA ADMISSIBILIDADE DAS DECLARAÇÕES PARA MEMÓRIA FUTURA - VIOLAÇÃO DO PRINCIPIO DO CONTRADITÓRIO E DIREITOS DE DEFESA DO ARGUIDO

A - O art. 271 do CPP tem carácter excecional sob pena de colisão com princípios base da fase de julgamento, tais como o princípio da oralidade e da imediação.

B - No caso dos presentes autos as inquirições para memória futura foram feitas de forma ilegal e inconstitucional, uma vez que não estavam preenchidos nenhum dos requisitos constantes do art.º 271.° do CPP, bem como não foi assegurado o contraditório ao ora recorrente, tendo em conta que o processo se encontrava em segredo de justiça, pelo que o ora recorrente não tinha conhecimento de todas as provas que nele constavam para as puder contraditar.

C - As testemunhas facilmente seriam ouvidas pelo sistema de videoconferência, pelo que, jamais o fundamento da grande dificuldade na deslocação das testemunhas a Portugal, para a audiência de discussão e julgamento poderia valer para justificar a realização de mais de três dezenas de inquirições para memória futura, estavam devidamente identificadas e localizadas, não existindo razões para presumir que não seria possível a sua audição em sede de audiência de julgamento.

D - Jamais se justificava, no caso dos autos que se colocassem em causa princípios fundamentais da audiência, como sejam o princípio da concentração, imediação, oralidade e contraditório (uma vez que quando estas declarações foram tomadas o processo encontrava-se em segredo de justiça, pelo que, os sujeitos processuais, nomeadamente o arguido, não tinham conhecimento do que constava nos autos, vedado estava por completo o exercício do contraditório) apenas para se ouvir, antecipadamente, estes depoimentos, quando os mesmos poderiam perfeitamente ser prestados em audiência.

E - Face ao exposto, por flagrante violação, além dos princípios indicados no número anterior, a tomada de declarações para memória futura realizada nos autos viola, de forma flagrante, o disposto no art.° 271° do CPP. Mais, precisamente porque o objetivo da diligência de tomada de declarações para memória futura se dirige, fundamentalmente à possibilidade de o depoimento vir a ser usado como meio de prova em sede de julgamento, é indispensável que seja respeitado o princípio do contraditório, principio esse consagrado no art.° 32° n.° 5 da CRP e do qual é corolário o art.° 327° do CPP, assim, não tendo sido respeitado esse preceito, violou-se dessa forma o disposto no art.° 32.° n° 5 da CRP, inconstitucionalidade que desde já se argui para todos os efeitos legais.

F - Olhando especificamente para a produção das provas, o princípio exige que toda a prova deva ser, por regra, produzida em audiência pública, sendo que as respectivas excepções a esta regra não poderão, no entanto, afectar os direitos de defesa, exigindo o art. 6.°, n.° 3.°, ai. b), da Convenção Europeia dos Direitos do Homem que seja dada ao acusado uma efectiva possibilidade de confrontar e questionar directamente as testemunhas de acusação, quando estas prestem declarações em audiência ou em momento anterior do processo (cf., v.g., entre muitas referências, o acórdão Vissier c. Países Baixos, de 14-02-2002).

G - No dia 30 de Setembro de 2008 ordenada a realização das aludidas inquirições. Assim, no dia 24 de Outubro de 2008, foram os arguidos notificados das datas e das respectivas horas a que se iriam realizar as respectivas tomadas de declarações para memória futura.

H - Desde logo ressalta que nem com esta notificação, nem em momento anterior, seguiu quer a promoção para a realização da diligência, nem o despacho que a ordena. Pelo que, nem sequer aos arguidos foi dada a possibilidade de se pronunciarem acerca da admissibilidade legal ou da oportunidade da realização das mesmas.

I - Ou seja, quando foram ordenada por Douto Despacho as referidas inquirições para memória futura, os arguidos não foram notificados do referido Despacho, desta forma, não poderiam (tratando-se de mera irregularidade como refere o Douto Acórdão de que ora se recorre) nessa altura arguir em três dias alguma suposta irregularidade.

J - Só no dia agendado para as inquirições é que o arguido, ora recorrente teve conhecimento das referidas inquirições e nessa altura ditou para ata o seu desacordo, conforme consta da ata da diligência do dia 3 de Novembro de 2008, para a qual expressamente se remete.

H - Mais, conforme decorre da própria ata do dia 3 de Novembro de 2008, só após a realização das três inquirições agendadas para aquele dia é que aos mandatários dos arguidos foram notificados do teor do Douto Despacho que ordenou as aludidas inquirições, o qual remete e dá por reproduzida a promoção para a realização das mesmas, mas sem que esta promoção tenha sido notificada.

I - Em suma, nada de concreto foi notificado aos arguidos, uma vez que os fundamentos apenas constavam da promoção para onde se remeteu, ou seja, continuavam os arguidos sem serem devidamente notificados dos fundamentos da diligência que se realizara.

J - Perante tal notificação todos os arguidos, inclusive o ora recorrente, se insurgiram e invocaram a respectiva nulidade das diligências que estavam a ser levadas a cabo, designadamente pelo facto de as testemunhas invariavelmente se referirem a documentos (sabemos nós agora que se tratavam dos comprovativos das transferências realizadas, com os respectivos MTCN, montantes, beneficiários e remetentes, bem como as datas e as agências visadas) e que os arguidos, todos sem exceção, não dispunham desses mesmos documentos para poderem exercer o contraditório relativamente a esses depoimentos - o que viola o disposto no art.° 32° n.° 5 da CRP, bem como os art.ºs 327° e 348° n° 4 do CPP.

K - A todas estas invocações, foi totalmente indiferente o Tribunal, tendo indeferido, uma vez mais, o requerido pelos arguidos.

L - Posto isto, é manifesta a violação do princípio do contraditório em todo o processo que conduziu à realização da tomada de declarações para memória futura.

M - Mais, é inconstitucional a interpretação que considere que a tomada de declarações para memória futura realizada nos termos supra expostos está de acordo com o preceituado no art.° 271° do CPP, por violação dos ditames previstos no art.° 32° n°5 da CRP.

N - Pelo que, não se consegue perceber como foi possível o Douto Acórdão da Relação de Coimbra fazer tábua rasa desta questão, tendo referido que tratava-se de uma mera irregularidade, que deveria ter sido arguida pelo recorrente em 3 dias, o que não aconteceu. Obviamente que sucedeu como supra demonstrámos.

O - Assim, no nosso modesto entendimento, e salvo melhor e mais douta opinião, a realização destas diligências (audição de 33 testemunhas), inquinou todo o processo, ferindo-o desde o seu núcleo de grave nulidade, ilegalidade e inconstitucionalidade. E serviram-se destas diligências para condenar um indivíduo a 17 anos de prisão.

P - Este entendimento é uma afronta aos direitos de defesa do arguido, que viu vedado por completo o seu direito ao contraditório, contemplado no art.° 32° n° 5 da CRP.

NÃO CUMPRIMENTO DO DISPOSTO NO ART.° 358.° DO CPP - VIOLAÇÃO DO PRINCIPIO DO CONTRADITÓRIO

Q - É do nosso conhecimento que este Venerando Tribunal não conhece de matéria de facto, mas não é esta a questão que se colocará. O que sucedeu, foi uma violação grosseira do disposto no art.° 358° do CPP e consequente princípio do contraditório, bem como, uma falta de pronúncia quanto a esse aspeto por parte do Tribunal da Relação de Coimbra. O Tribunal a quo fez uma alteração substancial dos factos sem que para isso tenha comunicado ao ora recorrente. O Tribunal da Relação de Coimbra, apenas se pronunciou quanto a uma das alterações, e fez tábua rasa (terá sido esquecimento) a cerca de outra alteração, alteração essa que como infra exporemos tem influência direta na qualificação do crime. Se não vejamos,

R - O Douto Tribunal dá como provado que o arguido AA formulou repetidamente a intenção de, a partir do nosso país, passar a captar fraudulenta e ilicitamente valores monetários através do sistema utilizado pelas referidas instituições financeiras. Na pronúncia não constava a palavra repetidamente.

S - Apesar de aparentemente se tratar de uma palavra perfeitamente inócua, esta inovação relativamente à pronúncia, que não foi comunicada ao arguido, assume particular importância no que refere à posterior qualificação jurídica dos crimes pelos quais vem condenado o arguido, ora recorrente.

T - Não podem restar dúvidas de que constitui uma alteração dos factos descritos na acusação, o facto de, ao invés de, se considerar que o arguido AA formulou a intenção de, a partir do nosso país, passar a captar fraudulenta e ilicitamente valores..., ter considerado que formulou repetidamente a intenção de....

U - Tal expressão parece-nos, salvo o devido respeito, extremamente relevante, designadamente no que respeita à questão da pluralidade de crimes, por oposição à unidade de crimes, como abaixo melhor nos pronunciaremos. Mas não só,

V - Essa alteração tinha de ser comunicada ao arguido, coisa que não aconteceu, existindo aqui uma errada interpretação do art.° 358.° do CPP, interpretação essa violadora do princípio do contraditório, plasmado no art.° 32° nº 5 da CRP.

W - Uma coisa é o arguido ter formulado uma vez a intenção de, de forma sucessiva tentar obter de forma fraudulenta e ilícita valores monetários e outra bem diferente, é ter formulado, de forma sucessiva e repetida, varias intenções ou vários desígnios criminosos. Neste concreto ponto, pode estar a diferença entre se estar perante um só crime, ainda que na forma continuada, ou em alternativa, como considerou o Tribunal, diversos crimes, em função de cada uma das iniciativas para captar dinheiro de forma ilícita, tal como prevê o art.° 30 do Código Penal.

X - Nestes termos encontra-se subjacente o princípio do contraditório, o qual, encarado sob o ponto de vista do arguido, pretende assegurar os seus direitos de defesa, com a abrangência imposta pelo art. 32°, n° 1 e n° 5 da C.R.P., no sentido de que nenhuma prova deve ser aceite em audiência, nem nenhuma decisão deve ser proferida, sem que previamente tenha sido precedida de ampla e efectiva possibilidade de ser contestada ou valorada pelo sujeito processual contra o qual aquelas são dirigidas [Parecer da Comissão Constitucional n.° 18/81, Vol. XVI, p. 147]

Y - Dúvidas não restam que a referida alteração devia ter sido comunicada ao arguido, para que, mediante tal comunicação, o mesmo pudesse, se assim o entendesse, preparar a respetiva defesa. O que não sucedeu, existindo neste caso uma violação do disposto no art.0 358.° do CPP, fazendo o Douto Tribunal uma errada interpretação do referido preceito, interpretação essa inconstitucional por violação no disposto no art.º 32.° n° 5 da Constituição da República Portuguesa.

DA PRATICA DE UM CRIME DE BURLA E DE EXTORSÃO NA FORMA CONTINUADA

Z - No nosso entendimento e salvo o devido respeito, o arguido não praticou 10 crimes de burla nem 9 crimes de extorsão consumados e 8 na forma tentada, mas sim um crime de burla e de extorsão na forma continuada. Se não vejamos,

AA - São requisitos da verificação do crime continuado, tal como prevê o art.º 30º n.° 2 do CP, a realização plural do mesmo tipo de crime que fundamentalmente protejam o mesmo bem jurídico, executada de forma essencialmente homogénea e no quadro da solicitação de uma mesma situações exterior que diminua consideravelmente a culpa do agente.

AB - Quanto à realização plural do mesmo crime, esta é evidente, seja no caso das burlas, seja no caso das extorsões, estando este requisito claramente preenchido.

AC - No que concerne ao bem jurídico protegido, este é precisamente o mesmo em todas as situações constantes dos autos, ou seja, o património.

AD - Tanto os crimes de burla como os de extorsão são realizados de forma essencialmente homogénea.

AE - Nos crimes de burla, impreterivelmente o arguido se faz passar por um funcionário da W... U... e aproveitando as falhas de segurança do sistema e falta de cumprimento das orientações de segurança por parte dos funcionários consegue obter as transferências.

AF - E não se diga que é por de umas vezes o arguido ou o seu comparsa dizerem que se chama Tom ou qualquer outro nome, dizer para o funcionário premir o zero ou marcar VOID no final de cada transacção, que faz com que a forma de actuação deixe de ser homogénea. Pois, no essencial, estes, fazendo-se passar por funcionários da WU e fazendo referência, em todos os casos, a problemas técnicos com os terminais, sempre conseguem que os funcionários, desrespeitando as normas de segurança, procedam às transferências. Dúvidas não restam que a forma de atuação é essencialmente homogénea.

AG - O último requisito é a existência de um mesmo quadro de solicitação exterior que diminua de forma considerável a culpa do agente.

AH - Por um lado, o Douto Acórdão proferido pelo Tribunal a quo refere expressamente que em toda a matéria de facto dada como provada não encontrou nenhuma situação externa que de alguma forma tivesse facilitado a conduta do arguido e nesse seguimento contribuído para que o mesmo se sentisse tentado a continuar com a atividade criminosa. Por outro lado, o Venerando Tribunal da Relação de Coimbra, no que concerne à solicitação exterior que possa diminuir a culpa do agente, refere que "afinal radicou no crescente à-vontade e ousadia decorrente da eficaz arquitectura e boa execução do próprio projecto defraudatório e extorsionário no significativo sucesso obtido com alguns dos progressivos ardis e intimidações às múltiplas vítimas, e, naturalmente, na sua má-formação e incivilidade..."

AI - Ora, analisando todas as situações por esta óptica então nunca teríamos este requisito preenchido, nem seria nunca, no ordenamento jurídico português aplicado o instituto do crime continuado. Não tem sido este o entendimento de V. Exas, no que concerne ao crime continuado. Mais,

AJ - Não podemos, de todo perfilhar esta tese na medida em que a mesma não encontra qualquer correspondência com os factos apurados nos autos.

AK - Resulta do próprio texto do Acórdão que o arguido, ora recorrente, em função do incumprimento generalizado das regras de segurança impostas pela WU, este encontrou grandes facilidade na execução das burlas.

AL - O arguido conhecendo o sistema de funcionamento da WU, ligando para a primeira das agências, desde logo e sem qualquer dificuldade obtém diversas transferências monetárias. Ora, perante tal facilidade, seria exigível ao arguido que não se sentisse tentado a repetir tais procedimentos. Isto sempre como é óbvio já numa óptica de actividade criminosa. Pois não serve de fundamento que nunca deveria passar pela cabeça de um homem médio e de família, pois que, na cabeça desse, nunca passaria pela cabeça sequer praticar um crime, muito menos repetir a sua actuação diversas vezes.

AM - Por outro lado, a considerar-se que o arguido teve intervenção nos crimes de extorsão, o mesmo entendimento lhe deve ser aplicado, uma vez que o circunstancialismo é essencialmente o mesmo.

AN - Na verdade, também aqui o tipo de crime é o mesmo, cometido de forma essencialmente homogénea, ou seja, sempre com recurso à ameaça da existência de uma bomba no estabelecimento, sempre num curto espaço de tempo e sempre contra o mesmo bem jurídico, o património.

AO - Uma vez mais, o quadro de solicitação exterior advêm da manifesta negligência que todos os funcionários denotam nas interpelações. Muitos deles, nem dão grande credibilidade às interpelações, mas no entanto, realizam sempre as transferências.

AP - Por tudo isto, perguntar-se-á, perante este quadro de solicitação, tamanha facilidade e sem esquemas muito elaborados, com simples telefonemas, conseguiam obter quantias de dinheiro, e sempre da mesma forma, era exigível que o ora recorrente actuasse de outra forma. Efectivamente parece-nos que estes facilmente eram tentados a repetir o crime, de forma sucessiva e enquanto não encontrasse barreiras.

AQ - Parece-nos, salvo mais douto e melhor entendimento, que se encontram totalmente preenchidos os requisitos previstos no n.° 2 do art.° 30° do CP, pelo que deve o arguido ser punido por um só crime de burla qualificada e extorsão, mas na forma continuada.

AR - Em suma, as facilidades encontradas pelo arguido, resultantes da negligência geral dos funcionários da WU, foi o factor que o levou, após a realização das primeiras burlas, a persistir na sua atuação, o que de outra forma não teria feito.

AS - Este facto diminui de forma considerável a culpa do arguido, sendo-lhe mesmo, inexigível que, depois da primeira atuação, mudasse de atitude. Razão pelo qual, estamos perante um só crime na forma continuada.

DA MEDIDA DA PENA

AT - O ora recorrente foi condenado pelo Tribunal de 1.a Instância na pena de 17 (dezassete) anos de prisão pela prática de 10 crimes de burla qualificada, 9 crimes de extorsão, 8 crimes de extorsão na forma tentada e um crime de branqueamento de capitais.

AU - Atendendo que a pena deve ter sempre uma finalidade de ressocialização, e não apenas uma finalidade repressiva, a pena de prisão aplicada ao ora recorrente é completamente destituída de sentido, violando assim os artigos 70° e 40° do C P. Pois, nem sequer foi devidamente ponderada a confissão do arguido. E não se contraponha dizendo que o mesmo só o fez depois de já ter sido produzida toda a prova, independentemente disso, tinha sempre o direito a não se pronunciar, sem que isso o pudesse prejudicar. Mas não, o arguido, confessou os factos que lhe eram imputados, de forma verdadeira e sincera, e esse comportamento não foi valorado pelo Tribunal na escolha da medida da pena.

AV - Tendo o Tribunal considerado as exigências de prevenção, e ainda todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, todavia deponham a seu favor ou contra o arguido, na esteira do disposto no art.° 71° do CP., não se percebe como foi possível condenar o arguido a uma pena única de 17 (dezassete) anos de prisão.

AW - Parece que a pena efetiva de prisão aplicada ao arguido, injusta e desproporcional, tendo o Tribunal decidido em desconformidade com o disposto no art.° 32.° n° 2, da C.R.P. e art.ºs 40.°, 50.° n° 1, 71°, 374 n° 2 e 379,  al. a), 410°, n° 2, alíneas a) b) e c) todos do C.P.P..

AX - Estamos a falar de um jovem de 34 anos, que já se encontra preso há 5 anos, e que se tiver de cumprir pena tão severa como a que lhe foi aplicada, quando sair em liberdade terá cerca de 50 anos, e aí sim, já não conseguirá reformular a sua vida nem familiar, nem profissional. Terá sérias dificuldades na sua ressocialização e em conseguir tornar-se um indivíduo válido para a sociedade. Pergunta-se: onde estão as políticas de ressocialização e recuperação do indivíduo? Parece-nos que V. Exas., Juízes Conselheiros deverão olhar para esta situação e não deixar de considerar tão severa pena desajustada e desproporcional.

AY - Pelo que, deverá o presente recurso merecer provimento e em consequência ser o arguido condenado por um só crime na forma continuada, sendo substancialmente atenuada a pena que lhe foi aplicada.

Por sua vez, o arguido BB concluiu desta forma as suas alegações:

A) Existe controvérsia jurisprudencial quanto à questão de se saber se o recurso para o STJ pode abranger a matéria decisória referente aos crimes e penas parcelares inferiores a 8 anos de prisão ou se, pelo contrário, perante crimes e penas parcelares inferiores a 8 anos de prisão, só pode apreciar a pena única aplicada em cúmulo jurídico.

B) Ainda recentemente, o Tribunal Constitucional apreciou a questão sob o ângulo da constitucionalidade, tendo lavrado acórdãos com posições contraditórias, o que levou à prolação de um acórdão pelo respectivo Plenário (acórdão n° 186/2013, tirado por maioria), que não julgou inconstitucional a norma em apreço na interpretação de que, havendo uma pena única superior a 8 anos, não pode ser objecto de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça a matéria decisória referente aos crimes e penas parcelares inferiores a 8 anos de prisão.

C) De qualquer forma – e para além da questão da violação ou não do princípio da legalidade, óptica pela qual foi analisada a questão do âmbito daquele acórdão do Plenário do Tribunal Constitucional -, o Recorrente entende que a inconstitucionalidade do entendimento normativo em pauta – pelo qual, havendo urna pena única superior a 8 anos, se restringe a competência do STJ à pena única resultante do cúmulo, não a admitindo em relação aos crimes e penas parcelares inferiores a 8 anos – resulta ainda de uma restrição irrazoável e desproporcionada do direito ao recurso consagrado no art. 32º da CRP.

D) De todo o modo, previamente ao problema da inconstitucionalidade, deve colocar-se a questão da interpretação da norma em pauta.

E) E, nesse domínio, apesar de uma corrente jurisprudencial que vai no sentido restritivo – considerando que, havendo condenação em pena superior a 8 anos, relativamente a crimes e penas parcelares inferiores a 8 anos, o Supremo Tribunal apenas aprecia a pena única aplicada em cúmulo -, existe igualmente outra orientação jurisprudencial que entende que o Supremo Tribunal – quando está em causa uma competência definida por uma pena superior a um certo número de anos – também deve sindicar os crimes e as penas abaixo desse limiar, as quais, afinal, são decisivas para a pena única aplicada (cfr. acórdão do STJ de 14/03/2013, proc. nº 149/10.1TAFND.C1.S1, Relator Souto de Moura).

F) O Recorrente louva-se nessa jurisprudência menos restritiva, razão pela qual neste recurso não se limitará a discutir a pena única aplicada de 12 anos de prisão, mas igualmente os crimes e penas parcelares que contribuíram para aquela pena única.

G) A parte mais relevante do recurso interposto para a Relação de Coimbra tem a ver com a reavaliação da prova em que se baseou a condenação do arguido relativamente aos crimes de burla, extorsão e branqueamento de capitais.

H) Ao longo dessa parte do recurso, fez-se uma reavaliação da prova em que se sustentou o juízo da 1ª instancia quanto ao envolvimento do Recorrente no ardil criminoso montado e executado por AA, concluindo que – da prova testemunhal, da prova documental e das ilações que dessa prova a experiencia comum retira – não se poderia chegar ao juízo de que o Recorrente aderiu, participou ou sequer sabia que as transferências financeiras em pauta eram obtidas através dos esquemas fraudulentos organizados e executados por AA.

I) Estamos, pois, no domínio da impugnação da matéria de facto, em que se sustentou a condenação do Recorrente.

J) Caso fosse entendido que não se encontravam devidamente efectuadas as especificações previstas no art. 412° nºs 2 a 4 do C.P.P., impunha-se que o Relator convidasse o Recorrente a apresentar, completar ou esclarecer as conclusões formuladas.

K) Porém, a Relação de Coimbra não efectuou uma verdadeira reapreciação da matéria de facto, tal como lhe tinha sido pedido pelo recurso interposto da sentença da 1ª instância, tendo antes adoptado o entendimento – extraído dos arts. 412º nº 3, art. 431º e demais disposições aplicáveis do C.P.P. – de que apenas lhe cabia verificar se existia ou não uma objectiva irrazoabilidade jurídico-processual do juízo formulado pela 1ª instância ou a valoração de prova proibida, o que julgou não ocorrer.

L) Segundo o acórdão recorrido, não caberia à Relação substituir-se ao Tribunal de 1ª instância em nova ponderação do sentido do acervo probatório recolhido.

M) Contudo, não é assim. Na impugnação da matéria de facto, o tribunal de recurso não se pode limitar à verificação de saber se a convicção do tribunal de julgamento tem suporte razoável na prova produzida, porque tal tese corresponde à frustração de um efectivo segundo grau de jurisdição em matéria de facto.

N) Pelo contrário, no recurso sobre a matéria de facto, impõe-se que as relações efectuem um exercício crítico substitutivo da convicção da 1ª instância, como tem julgado a orientação maioritária do Supremo Tribunal de Justiça.

O) Ademais, o entendimento normativo do acórdão recorrido – segundo o qual os arts. 412° n° 3 e 431º do C.P.P., devidamente conjugados com as demais regras legais aplicáveis, devem ser interpretados no sentido de que as relações não devem efectuar um juízo crítico substitutivo da convicção da 1ª instancia, devendo limitar-se à verificação da razoabilidade do juízo jurídico-processual aí formulado (e à verificação da legalidade da prova obtida) – é inconstitucional, por violação do direito constitucional ao recurso, tal como se encontra consagrado no art. 32° nº 1 da CRP.

P) Pelo exposto, por não ter efectuado uma verdadeira reapreciação da matéria de facto impugnada no recurso do acórdão da 1ª instância, o acórdão da Relação de Coimbra está ferido de nulidade nos termos do art. 379º nº l-c) do C.P.P..

Q) Outro dos segmentos relevantes do recurso interposto tinha a ver com a arguição da nulidade do acórdão da 1ª instância, por falta de indicação e exame crítico da prova, nos termos dos arts. 374° n° 2 e 379° n° 1-a) do C.P.P..

R) Na óptica do Recorrente, a 1ª instância limitara-se a uma indicação genérica dos meios da prova, com reiterado recurso às regras da experiência, mas sem fazer uma ponderada apreciação da prova recolhida em relação a cada núcleo factual considerado como assente, de forma a permitir conhecer o processo de formação da convicção do tribunal em relação a cada um dos grandes temas probatórios em pauta (cft. arts. 60° a 103° da motivação do recurso, bem como conclusões XXVIII) e LIX).

S) O Recorrente confessa que tem alguma dificuldade em compreender a argumentação do acórdão ora recorrido, muito particularmente quando se invoca que uma maior explicitação da valoração dos meios de prova em relação aos factos provados poderia estar vedada ao Relator “por efeito da proibição da revelação do secretismo deliberativo estabelecido no art. 377º do C.P.P.” (!)

T) De qualquer forma, parece claro que o Tribunal da Relação de Coimbra entende que só ocorre a nulidade do art. 374° n° 2 do C.P.P. – no que respeita à indicação e exame crítico das provas – quando houver uma “absoluta omissão da exigência de concisa e compreensível explicação da razão-de-ser lógico-jurídica da assertividade do juízo fáctico que houver resultado do pertinente julgamento”.

U) Ora, ressalvado o devido respeito, não é isso que se retira do comando da lei e da jurisprudência pertinente (cfr., por todos, a anotação de PINTO DE ALBUQUERQUE ao art. 374° do C.P.P. in “Comentário do Código de Processo Penal”, 4ª ed., pág. 966 e ss.), donde resulta que, sem ser exigível uma individualização dos meios de prova relativamente a cada elemento de facto dado como provado, também não se aceita que a nulidade só ocorre quando houver uma absoluta omissão da explicitação do processo de formação da convicção do tribunal.

V) Assim sendo, o acórdão recorrido interpretou erroneamente o art. 374º n° 2 do C.P.P., restringindo excessivamente o âmbito das especificações aí previstas, em termos que afectam o princípio constitucional do dever de fundamentação das decisões judiciais, razão pela qual tal entendimento normativo é ainda inconstitucional por violação do dever de fundamentação previsto no art. 205° da CRP.

W) Mesmo que se mantivessem incólumes os acórdãos das instâncias quanto aos factos assentes e quanto a respectiva qualificação jurídica, julga-se que deverá ter lugar uma relevante atenuação das penas aplicadas, por duas principais ordens de razões:

Por um lado, por ter sido erroneamente julgado que os crimes de extorsão deveriam ser punidos com o quadro agravante previsto no art. 223° n° 3-a) do C.P., com referência ao art. 204° n°2-g), considerando por isso que a acção do Recorrente e de AA integra o conceito de “bando”;

Por outro lado, por não ter sido devidamente ponderada a excelente inserção familiar, profissional e social do Recorrente, bem como o comportamento socialmente ajustado que tem revelado ao longo da vida, que se retira dos factos assentes sob os n°s 310 a 356 (quer os que lhe dizem a si respeito, quer os que se reportam aos seus filhos por referência ao respectivo enquadramento familiar)

X) Quanto à agravante do “bando”, não se vislumbra, na factualidade assente, que sejam revelados os elementos necessários à identificação de uma “coesão grupal” – utilizando os termos do “Comentário Conimbricense do Código Penal”, tomo II, pág. 84 – que haveria de permitir elevar a situação dos autos do âmbito de uma comparticipação ao quadro de um “bando”; por outro lado, porque entendemos que o conceito de “bando’’ impõe pelo menos três elementos, devendo ter-se em conta que, com referência ao elemento gramatical “bando”, ninguém se lhe refere perante apenas duas pessoas.

Y) Quanto à medida da pena propriamente dita, o tribunal não valorou devidamente as circunstâncias familiares, sociais e profissionais do Recorrente, bem como o comportamento socialmente ajustado que tem revelado ao longo da vida, como exige o art. 71° n° 2 do C.P.; ademais, o Tribunal de Mangualde – como a Relação de Coimbra – não valorou a diferenciação que estabeleceu entre AA e os demais arguidos, incluindo o Recorrente, reconhecendo que a “actuação violenta e repetida de AA pressupõe uma acentuada energia criminosa, vontade fria e racional, que os dados indiciários, na sua inferência lógica e baseada nas regras da experiência, não se revê no comportamento e atitude dos demais arguidos”.

Z) Pelo exposto, as medidas das penas parcelares e da pena única sempre deverão aproximar-se dos seus limiares inferiores, não excedendo a pena única uma pena de 5 anos de prisão, como permite o art. 77° n° 2 do C.P., a qual deve ser suspensa, porque se encontram preenchidos os requisitos previstos no art. 50° do C.P., mesmo que tenha de subordinar tal suspensão ao cumprimento de deveres adicionais.

Respondeu a sra. Procuradora-Geral Adjunta na Relação nos seguintes termos:

Vejamos em questão prévia as seguinte questões:

1 - Da alegada violação do exercício do contraditório e direitos de defesa do arguido, pela admissibilidade da produção antecipada de prova - declarações para memória futura - nos termos dos arts° 271°, 327°, 348° - n° 4, do CPP e 32°, n°5 da CRP, por banda de AA:

Nos termos do art° 432°, n° 1, alínea b), do CCP, recorre-se para o Supremo Tribunal de Justiça de decisões que não sejam irrecorríveis proferidas pelas relações, em recurso, nos termos do art° 400°, do mesmo diploma legal.

Por sua vez, na alínea c) do seu n° 1, este preceito, decreta a irrecorribilidade dos acórdãos proferidos, em recurso, pelas relações, que não conheçam, a final, do objecto do processo.

No caso em apreço o recurso interposto pelo arguido para este Tribunal da Relação de Coimbra, do acórdão da 1ª instância, tinha por objecto, além de outras questões, a impugnação dos actos processuais de natureza diferente do acórdão, ou seja, a questão antecedentemente mencionada que se prende com diligências probatórias, oportunamente contestadas e que foram objecto de indeferimento através de despacho judicial, não acatado pelos seus co-arguidos, que dele recorreram em recurso autónomo.

O Tribunal da Relação conheceu de todos eles no acórdão agora em recurso.

Todavia, não nos parece que esta questão possa ser novamente tratada a nível de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça.

Com efeito, importa considerar que a tal obsta a conjugação do art° 97°, n° 1, do CPP com o art° 400°, n° 1, alínea c) do mesmo diploma legal, pois deles resulta serem irrecorríveis os acórdãos das relações que recaiam sobre despachos - por definição legal, actos decisórios que não conhecem, a final, do objecto do processo, embora lhe possam pôr termo.

Por outro lado, como vem sendo entendido pelo Supremo Tribunal de Justiça, mesmo no domínio da anterior versão da alínea c) do n° 1 do art° 400°, "a inadmissibilidade de recurso relativamente a acórdãos proferidos, em recurso, pelas relações, que não conheçam, a final, do objecto do processo, ou seja, que não julguem o mérito da causa, abrange todas as decisões interlocutórias, independentemente da forma como o respectivo recurso é processado e julgado na relação, isto é, quer se trate de um recurso autónomo quer se trate de impugnação inserida no recurso da decisão final que conheça do objecto do processo.

A circunstância de a decisão sobre determinada questão interlocutória não ter sido objecto de recurso autónomo mas, antes, englobada no recurso interposto da sentença/acórdão não lhe confere recorribilidade a reboque das restantes, ou algumas das restantes, poderem ser objecto de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça.

Em suma, tal circunstância não tem a virtualidade de alterar o regime daquela alínea c), já que a lei não estabelece aí qualquer distinção, determinando a irrecorribilidade, tout court, de todas as decisões proferidas em recurso, pelas relações, que não conheçam, a final, do objecto do processo".

Este entendimento, além de respeitar a garantia constitucional do duplo grau de jurisdição - como no caso foi efectivamente respeitada, porque exercida -, está em perfeita consonância com o regime traçado pela Reforma de 1998 e prosseguido pela de 2007 para os recursos para o Supremo Tribunal de Justiça que quiseram obstar, de forma clara, ao segundo grau de recurso, terceiro grau de jurisdição, relativo a questões interlocutórias ou que não tenham conhecido, a final, do objecto do processo, sendo certo, por outro lado, que a situação não tem qualquer paralelo com a prevista na alínea e) do art° 432° do CPP - solução diversa, esta sim, imposta indiscutivelmente pela referida imposição constitucional".

Neste sentido, decidiram, entre outros, os Acórdãos de 20.12.06, P° 3043/06-3ª (com o mesmo relator deste), de 14.11.2007, P° 3750/07-3ª, de 10.07.2008, P° 2142/08-3ª, de 10.09.2008, P° 1959/08-3ª, de 25.09.2008, P° 809/08-5ª; de 13.10.2010, P° n° 200/06.0JAAVR.C1.S1-3ª; cfr. também o Acórdão de 09.06.2011; P° n° 4095/07.8TPPRT.P1.S1.

Pelo que, nesta parte, estamos em crer que o recurso deve ser rejeitado, por inadmissível, nos termos das disposições conjugadas dos arts° 420°, n° 1, alínea b), 414°, n° 2, 432°, n° 1, alínea b) e 400°, n° 1, alínea c), todos do CPP.

2- BB

Invoca o recorrente, como questão prévia para delimitar o âmbito do recurso, que o entendimento dado ao art° 400°, n° 1, al. f), do CPP, no sentido de que, havendo uma pena única superior a 8 anos, não há recurso para o Supremo Tribunal de Justiça relativamente à matéria decisória dos crimes e penas parcelares inferiores a 8 anos, é inconstitucional - não só pela violação do princípio da legalidade - como ainda pela ofensa do direito ao recurso, consagrado no art° 32°, n° 1 da CRP, que é restringido em termos desproporcionados, irrazoáveis e iníquos.

Pelo que, sabendo não ser consensual aquela corrente jurisprudencial, louvando-se na corrente minoritária não se limita a discutir a pena única aplicada - 12 anos de prisão - mas, igualmente, os crimes e penas parcelares que contribuíram para aquela pena única.

Pensamos não lhe assistir razão.

Com efeito, é vasta a jurisprudência do STJ no sentido de serem irrecorríveis os acórdãos condenatórios proferidos, em recurso, pelas Relações, que confirmem decisão de primeira instância e apliquem pena de prisão não superior a 8 anos.

No caso em apreço, acontece que o acórdão desta Relação confirmou integralmente o acórdão da 1ª instância quanto à condenação do recorrente pelos crimes imputados, julgando improcedentes todas as questões que suscitou quer de facto, quer de direito.

O recorrente foi condenado na pena única de 12 (doze anos de prisão) resultante do cúmulo jurídico efectuado às penas parcelares impostas pela prática, em co-autoria e em concurso efectivo, de 8 (oito) crimes de burla qualificada, 15 (quinze) de extorsão e um de branqueamento de capital.

As penas unitárias fixadas são todas inferiores a 8 anos de prisão.

Ora, o que diz a jurisprudência que perfilhamos e citamos é que:

"No caso de concurso de crimes e verificada a "dupla conforme", sendo aplicadas ao arguido várias penas pelos crimes em concurso, penas que, seguidamente, por força do disposto no art. 77.° do C.P., são unificadas numa pena única conjunta, haverá que verificar quais as penas superiores a 8 anos e só quanto aos crimes punidos com tais penas e/ou quanto à pena única superior a 8 anos é admissível o recurso para o STJ. Na verdade, a al. f) do n° 1 do art° 400° não comporta o entendimento de que a circunstância de o arguido ser condenado numa pena (parcelar ou única) superior a 8 anos de prisão assegura a recorribilidade de toda a decisão, compreendendo-se, portanto, todas as condenações ainda que inferiores a 8 anos de prisão."

Pelo que, nesta parte, o recurso do arguido BB deve, igualmente, ser rejeitado, em obediência à norma citada que, em suma, determina a incompetência do STJ, para o efeito.

II. Quanto às restantes questões suscitadas pelos recorrentes, importará referir que o recurso interposto para o Supremo Tribunal de Justiça visa exclusivamente o reexame da matéria de direito (artigo 434.° do CPP) e que, as questões de facto, estão excluídas dos poderes de cognição do Supremo Tribunal de Justiça (sem prejuízo do poder deste Tribunal verificar oficiosamente os vícios elencados no n.° 2 do artigo 410.° do CPP).

A - Neste contexto, vejamos as restantes dissonâncias apontadas por AA:

1 - Da violação do princípio do contraditório - art° 32°, n° 5 da CRP, por incumprimento do disposto no art° 358°, do CPP ao introduzir-se no Acórdão da 1ª Instância a expressão repetidamente;

Na nossa perspectiva, e de acordo com a jurisprudência firmada pelos nossos Tribunais Superiores, o aspecto indicado não tem a relevância pretendida.

Com efeito, assim se sumariou o ac. TRL proferido em 31.01.2012, no proc. n° 947/10.06PEAMD.L1-5 - Relator Luís Gominho -

- Não é qualquer modificação da factualidade provada, em relação ao que se mostre vertido na redacção da respectiva acusação ou pronúncia, que é merecedora de ser qualificada como alteração não substancial dos factos;

- A prova de aspectos circunstanciais da conduta do agente, que conduzem a precisões ou concretizações dos factos imputados, que em nada alteram o objecto do processo, no sentido de constituírem uma surpresa relevante para a defesa ou de tornarem diferente os eventos fenomenológicos que são objecto da acusação, não constituem alteração que mereça o enquadramento justificativo do art° 358°, n° 1, do Código de Processo Penal.

No que concerne à alteração não substancial invocada, segundo o recorrente, violadora do princípio do contraditório, por omissão do ritualismo contido no art. 358.°, n° 1, do Cód. Proc. Penal, importa se refira ainda o que continuamos a citar:

Como se retira por antinomia da definição legal constante da al. f) do n° 1 do artº 1° do Cód. Proc. Penal, a alteração não substancial dos factos é "aquela que não tem por efeito a imputação de um crime diversos ou a agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis".

Em todo o caso, não se conclua sem mais discussão, que qualquer modificação da factualidade provada em relação ao que se mostre exactamente vertido na redacção da respectiva acusação ou pronúncia, seja merecedora desse qualificativo.

Como se deixou afirmado no acórdão do STJ de 24/01/2002, no processo n° 1298/99 da 5ª Secção (SASTJ, n.° 57, pág. 93), a alteração não substancial "pressupõe uma modificação com relevância para a decisão da causa, não bastando para tal que matéria de facto provada não seja inteiramente coincidente com a vertida na acusação".

Ora no caso concreto, não se nos afigura, que a expressão mencionada tenha capacidade para ser considerada como uma alteração factual.

No contexto geral da factualidade provada, antes nos parece que a mesma mais não é do que uma conclusão a que chegou o douto tribunal colectivo, após o julgamento e que bem resulta de toda a matéria de facto dada como provada.

Donde, colhendo nós os ensinamentos jurisprudenciais e doutrinais citados no acórdão já referenciado, temos a considerar que, basicamente estão presentes nesta matéria duas distintas ordens de preocupações que correspondem a outros tantos princípios de processo penal: o princípio acusatório e o da total garantia de defesa do arguido. De permeio fica a questão do objecto do processo, conceito nuclear no funcionamento de diversos institutos adjectivos v.g. os poderes de cognição do tribunal, a extensão do caso julgado, ou avaliar a excepção da litispendência, mas que não tem, nem pode ter, uma delimitação conformativa absolutamente milimétrica.

Haja-se em vista desde logo, que sobre o Tribunal recai um princípio de investigação (cfr. nomeadamente art. 340.°, n° 1, do Cód. Proc. Penal), e por isso, como o ensina Castanheira Neves, a identidade do objecto do processo ainda que não deva "ter limites tão largos ou tão indeterminados que anule a garantia implicada pelo princípio acusatório e que a definição do objecto do processo se propõe justamente realizar", não poderá "definir-se tão rígida e estreitamente que impeça o esclarecimento suficientemente amplo e adequado da infracção imputada e da correlativa responsabilidade".

Note-se, que nem mesmo o princípio da identidade que o conforma, postula uma sua igualdade "euclidiana", para usar a afirmação sugestiva de Simas Santos Leal-Henriques [Código de Processo Penal Anotado - Editora Rei dos Livros, 2.° Ed., II Vol., pág. 413].

O que é necessário, é que estejamos perante uma alteração que efectivamente "mexa" com os direitos do arguido (como se refere no acórdão desta Relação de 29/11/2007, no Processo n.° 7223/07- 9ª, consultável no endereço electrónico www.dgsi.pt/jtrl),  que postule essa necessidade de defesa.

Assim não acontece, "quando aos factos da acusação se retiram algum ou alguns, isto é se reduz o objecto do processo já que aqueles direitos permanecem intocáveis" (acórdão da Relação de Lisboa já indicado e Ac. do STJ de 08/11/2007, no processo 07P3164, consultável em www.dgsi.pt/jstj), ou "quando os factos são meramente concretizadores ou esclarecedores dos constantes primitivamente da acusação e pronúncia "(v. g. acórdão da Relação do Porto de 19/01/2008, no processo 0815244,consuitável em www.dgsi.pt/jtrp).

Acresce, que o recurso para o STJ, agora puramente de revista, pressupõe a prévia fixação da matéria de facto e o recorrente já não pode voltar a invocar questões «de facto», ainda que sob a capa dos vícios da sentença (art.° 434.° do CPP) e a referência que nesta última norma é feita ao art.° 410.°, n° 2 do CPP, é a possibilidade reservada ao STJ de poder reenviar o processo para novo julgamento da matéria de facto, quando entenda que não pode decidir de direito mais não é do que uma válvula de escape do sistema, pois há casos em que a matéria de facto é de tal modo obscura, contraditória, ou omissa, que não é possível decidir.

Contudo, um poder oficioso, da iniciativa exclusiva do tribunal e não de um direito que assista ao recorrente de obrigar o STJ a rever a matéria de facto, pois, as questões de facto, como objecto do recurso, ficaram definitivamente encerradas com a decisão proferida na relação.

Donde, não só por tal circunstância, mas essencialmente, por considerarmos que a referida expressão introduzida pelo douto Tribunal Colectivo que julgou o arguido em 1ª Instância, tem apenas em vista e, em conformidade com a prova produzida a concretização do que era dito de forma de forma diferente, por outras palavras, entendemos e que, em nada alterou o objecto do processo, nomeadamente, no sentido de constituírem uma surpresa relevante para a defesa ou de tornarem diferente os eventos fenomenológicos que são objecto da acusação (cfr. Acs. STJ, XVIII, 1, 190), entendemos que o recurso, nesta parte, deve considerar-se manifestamente improcedente e, como tal, rejeitado (artigo 420°, n.° 1, alínea a), do CPP).

2 - Da violação do art° 30°, n° 2 do C.P.

Insiste o recorrente na tese de que os requisitos formais da continuação criminosa, relativamente aos crimes de burla e extorsão, se mostram preenchidos. Porém, a motivação de que tal tese não pode colher está cabalmente esclarecida na decisão proferida.

Note-se, além do mais, como já se disse na resposta apresentada pelo MP ao recurso, interposto pelo arguido da decisão da 1ª Instância que, "aquela disposição exige que se verifique a existência de uma relação específica: que a diminuição considerável da culpa - não uma qualquer diminuição da culpa, mas que esta seja importante, relevante, especial - tem que advir do quadro da solicitação da mesma situação exterior. É, pois, necessário que esse juízo se opere por referência a um quadro externo ao agente, o que não se verifica se este procura, ainda que beneficiando de um certo estado de coisas exterior geral, que estejam reunidas as condições concretas para a consumação dos crimes, designadamente, vendendo as dificuldades que, em cada uma, se lhe depararam.

Reconhece-se que o arguido beneficiou de específicas condições que lhe são alheias, como a credulidade demonstrada pelos trabalhadores das agências contactadas, muitas vezes violando elementares regras de segurança (não é verdade, como se afirma na motivação, que todos os trabalhadores das agências contactadas desprezaram a regra de exigir ao interlocutor no contacto um telefone para se assegurarem tratar-se de sujeito habilitado, pois existem indicações feitas pelas testemunhas, também plasmadas nas froud files, de o mesmo o haver fornecido; e também não vemos que a circunstância de algumas das testemunhas/trabalhadores das agências que efectuaram indevidamente transferências haverem sido despedidas na sequência do conhecimento dos factos traga à discussão qualquer relevo).

E também beneficiou, certamente, embora isso não haja sido objecto de especial indagação por parte do Tribunal - nem, porventura, isso estaria ao seu alcance - de um especial ambiente decorrente de um acontecimento que traumatizou os EUA (por isso se não poderá propriamente falar de negligência dos trabalhadores das agências contactadas, por exemplo, exigindo-se-lhes procederem de forma diversa quanto foi usada violência).

Mas, como facilmente se intui, esse circunstancialismo, a existir, como de facto se verificou, é, por si, insusceptível de produzir qualquer efeito pernicioso se não for aproveitado por quem procure dele se prevalecer ou aproveitar para praticar crimes, e também se não afigura assumir tal natureza ou virtualidade capaz de levar quem dele tenha conhecimento a cometer tais infracções.

O que sucede é que o recorrente AA procura prevalecer-se, para além do conhecimento efectivo, integral, do modo de funcionamento do sistema de transferências monetárias da WU e MG, daquelas circunstâncias, aperfeiçoando o seu modo de proceder - é perceptível um cuidado em não o vulgarizar com a constante indicação dos mesmos elementos -, vencendo as naturais dificuldades colocadas pela circunstância de ser atendido por diversas pessoas, com diferente formação e modos de proceder, visando a obtenção, para si e para seu tio, de proveitos destinados a satisfazer um trem de vida manifestamente desfasado das suas possibilidades".

Donde, manifestamente, não há lugar à punição na forma de crime continuado já que não se verificam os seus pressupostos.

3 - Da medida da pena

Quanto a esta matéria resta-nos aditar que avaliado o conjunto dos factos perpetrados pelo arguido, não podemos deixar de concluir que os mesmos são reconduzíveis e, permitem a lícita conclusão, de estarmos em presença de uma personalidade com tendência criminógena acentuada e, por isso, não poderá descurar-se que à pluralidade de crimes, se terá de atribuir um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta e, bem assim, concretizar uma pena que cuide do cumprimento das exigências de prevenção geral e especial de socialização do arguido.

Pensamos que esse quantum se mostra bem fixado.

Pelo que, nenhuma censura nos merece o acórdão impugnado.

B - BB

1. Da nulidade do Acórdão recorrido, nos termos do art° 379°, n° 1, al. c) do CCP - quanto à não valoração do erro de julgamento, relativamente aos crimes de burla, extorsão e branqueamento de capitais;

Salvo o devido respeito, que é muito, não estamos de acordo com a tese do recorrente.

Com efeito, se nos debruçarmos sobre o texto do Acórdão impugnado, nomeadamente na parte que consta de fls. 12147/12173, que nos obstemos de reproduzir, por inútil, temos que ali se procedeu à análise global da factualidade controvertida e se especificaram as concretas razões que levaram à sua manutenção integral.

O que acontece é que a justificada decisão não vai de encontro à pretensão do recorrente.

Pelo que, estamos em crer, ser inexistente a invocada nulidade.

2 - Da errónea interpretação do art° 374°, n°2 do CPP ao restringir excessivamente o âmbito das especificações aí previstas ao analisar a nulidade, invocada no recurso do acórdão da 1ª instância, relativamente ao exame crítico da prova, o que é inconstitucional por violar o dever de fundamentação, previsto no art° 205° da CRP;

Quanto a esta censura pensamos que a questão se mostra equacionada, e bem, quando se manifestou, na 1ª Instância, o entendimento que acompanhamos e citamos no sentido de que "a exigência legal relativa à fundamentação deve, por um lado, entender-se como um sentido de proporcionalidade e necessidade em vista de um objectivo preciso ou concreto, a da sua sindicância pelo tribunal superior, e não como, por outro lado, uma obrigação maximalista que concentre e paralise toda a actividade do Tribunal. Isto é, o tribunal deve elaborar uma "exposição tanto quanto possível completa, mas concisa, dos motivos de facto e com a indicação das provas que serviram para formar a convicção do tribunal sem necessidade de esgotar todas as induções ou critérios de valoração das provas e contraprovas, mas de forma a permitir verificar que a decisão seguiu um processo lógico e racional na apreciação da prova, não sendo ilógica, arbitrária, contraditória ou violadora das regras da experiência comum" (ac. do STJ de 17/11/1999, na CJ, T3, pág. 200).

Ora, por aqui se vê que as regras da experiência, cuja utilização se critica amiúde nas motivações apresentadas, são elas próprias objecto de sindicância, não apenas na aferição da matéria sujeita a julgamento como a sua própria utilização, isto é, se concretamente invocadas, sujeitas à determinação da validade das conclusões a que conduzem (daqui que se deva recusar frontalmente que as invocadas regras constituam uma espécie de pré-juízo que dispense a produção da prova da forma legalmente exigida, isto é, no julgamento, ou que consistam em meras convicções pessoais insusceptíveis de sindicância; diga-se, aliás, que as motivações, no que a esta questão se refere, são, elas próprias, contraditórias, operando-se, algumas vezes, alguma confusão entre convicções pessoais - de todo o modo, nunca recusáveis no processo intelectivo subjacente à decisão - com factos instrumentais os quais correspondem, aliás, a elementos de valia no processo de fixação dos factos provados, directa ou indirectamente).

Deve atentar-se, na nossa óptica, que o entendimento do que se convencionou apelidar regras da experiência é susceptível de abarcar vários sentidos, também operativos, na medida em que podem constituir também o suporte para a leitura das outras fontes de prova. Com efeito, não raro acontece que de um documento acabe por retirar-se coisa diferente da que poderia conduzir numa análise mais superficial, o que só se alcança a partir de um conjunto de operações intelectuais, as quais são influenciadas ou condicionadas pelas tão faladas regras da experiência. E deve ainda admitir-se, pois, que, relativamente a um conjunto mais ou menos importante da prova - especialmente a pré-constituída, como os documentos, perícias, relatórios - o Tribunal se considere dispensado de uma explanação analítica exaustiva, podendo antes adoptar uma formulação compreensiva sobre o resultado da sua análise, principalmente quanto à que não tenha sido posta em equação ou sobre a qual não exista contestação ou controvérsia".

Donde, não nos parece correcto, afirmar-se que o Acórdão não analisa, crítica e suficientemente, a decisão no que concerne à omissão do exame crítico da prova, que vem suscitada.

3. Da medida da pena:

Deve ter lugar uma relevante atenuação das penas aplicadas (parcelares e única), não devendo fixar-se a pena única para além de 5 anos de prisão e declarar-se a suspensão da sua execução, mesmo que tenha de ser subordinada ao cumprimento de deveres, nos termos dos arts° 77°, n°2 e 50°, ambos do C.P., essencialmente pelo seguinte:

c) -Ter sido erroneamente julgado e condenado pelos crimes de extorsão, ao fazer-se uso do quadro agravante previsto no art° 223°, n°3, al. a), do C.P., com referência ao art° 204°, n° 2, al. g), do C.P., ao considerar-se que a acção do recorrente e de AA integra o conceito de bando, pois não se verifica factualidade assente susceptível de integrar tal conceito;

d)- Na concretização das penas não se ter ponderado, devidamente, as circunstâncias familiares, sociais, profissionais nem o comportamento socialmente ajustado que, o recorrente tem revelado, ao longo da vida, como exige o art° 71°, n° 2, do C.P.;

Com efeito, a pretensão do recorrente, no que concerne à avaliação das penas impostas singularmente, está afastada do conhecimento do Supremo Tribunal de Justiça, pelas razões que aduzimos em questão prévia.

A materialidade fáctica provada e não provada está, definitivamente fixada e, na nossa óptica, correctamente subsumida aos preceitos legais, por que foi julgado e condenado o arguido.

Ao Supremo Tribunal de Justiça cumprirá, neste contexto, analisar apenas da justeza da concreta pena unitária fixada ao recorrente.

Ora, no que concerne à determinação da pena única, deve ter-se em consideração a existência de um critério especial na determinação concreta da pena do concurso, segundo o qual serão considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente, o que obriga a que do teor da sentença conste uma especial fundamentação da medida da pena do concurso.

"A pena conjunta do concurso será encontrada em função das exigências gerais de culpa e de prevenção, fornecendo a lei, para além dos critérios gerais de medida da pena contidos no art°. 72° -1 (actual 71°-1), um critério especial: o do artigo 77°, n° 1, 2° parte, segundo o qual serão considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente, o que obriga a que do teor da sentença conste uma especial fundamentação da medida da pena do concurso".

Por outro lado, importa ter em conta que na consideração dos factos (do conjunto dos factos que integram os crimes em concurso) está ínsita uma avaliação da gravidade da ilicitude global, como se o conjunto de crimes em concurso se ficcionasse como um todo único, globalizado, que deve ter em conta a existência ou não de ligações ou conexões e o tipo de ligação ou conexão que se verifique entre os factos em concurso.

Como refere Cristina Líbano Monteiro, o nosso Código Penal rejeita uma visão atomística da pluralidade de crimes e obriga a olhar para o conjunto - para a possível conexão dos factos entre si e para a necessária relação de todo esse bocado de vida criminosa com a personalidade do seu agente, estando em causa a avaliação de uma «unidade relacional de ilícito», portadora de um significado global próprio, a censurar de uma vez só a um mesmo agente.

A pena conjunta tenderá a ser uma pena voltada para ajustar a sanção - dentro da moldura formada a partir de concretas penas singulares - à unidade relacional de ilícito e de culpa, fundada na conexão auctoris causa própria do concurso de crimes.

Por outro lado, na confecção da pena conjunta, há que ter presentes os princípios da proporcionalidade, da adequação e proibição do excesso.

Cremos, pois que, neste caso foram tidos em conta todos os critérios da medida da pena as exigências gerais de culpa e prevenção, atenta a necessidade de tutela dos bens jurídicos ofendidos e das finalidades das penas, incluída a conjunta, aqui acrescendo o critério especial fornecido pelo artigo 77°, n° 1, do Código Penal.

Donde, também aqui o Acórdão impugnado não nos merece censura.

C - Face ao exposto, em laia de Conclusão diremos:

Rejeitados os recursos no que concerne às questões prévias suscitadas, propugnamos pela manutenção integral do Acórdão condenatório, por se nos afigurar, serem inexistentes quaisquer nulidades ou violações dos normativos de processado penal (substantivo ou adjectivo) e das normas ínsitas na Constituição da República Portuguesa, apontadas pelos recorrentes.

Neste Supremo Tribunal, a sra. Procuradora-Geral Adjunta emitiu o seguinte parecer:

                O arguido BB interpõe recurso do Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra requerendo a realização de audiência, embora os pontos que especifica na motivação, segundo nos parece, serão de rejeitar previamente.

É que o acórdão recorrido do tribunal da relação é irrecorrível por terem sido mantidos os crimes e as penas de prisão parcelares todas inferiores a 8 anos de prisão tal como iremos defender relativamente ao arguido AA.

        O arguido BB havia sido condenado na 1ª instância por co-autoria dos seguintes crimes:

Burla qualificada dos artºs 217º nº 1 e 218º, nº 2 a) e b):

1 crime  com a pena de 4 anos de prisão;

1 crime com a pena de 3 anos e 8 meses de prisão;

2 crimes com a pena de 3 anos de prisão por cada um;

3 crimes com a pena de 1 anos e 6 meses de prisão por cada um;

1 crime com a pena de 1 ano de prisão.

Extorsão dos artºs 223º nº 1 e 3, a), 204º nº 2 al, g) 22º, 23º e 73º do CP:    

1 crime  com a pena de 5 anos e 2 meses de prisão;

3 crimes com a pena de 5 anos de prisão por cada um;

5 crimes com a pena de 4 anos e 6 meses de prisão por cada um;

3 tentados  a  2 anos e 6 meses de prisão por cada um;

3 tentados a 2 anos de prisão por cada um.

Branqueamento de capital dos artºs 368-A, nº 1, 2 e 3 do CP:

1 crime com a pena de 4 anos e 6 meses de prisão.

O cúmulo resultante do concurso é de 12 anos de prisão.       

                O arguido AA vem interpor recurso para o Supremo Tribunal de Justiça do douto acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra proferido em 22/5/2013, que negou provimento ao recurso que havia interposto do acórdão condenatório proferido no 2º Juízo do Tribunal Judicial de Mangualde, Círculo Judicial de Viseu, mantendo as condenações por todos os crimes e medidas das penas de prisão aplicadas, parcelares e única.

                1-O arguido AA havia sido condenado na 1ª instância por co-autoria e autoria dos seguintes crimes:

Burla qualificada dos artºs 217 nº 1 e 218º nº 2, a) e b).

1 crime  com a pena de 5 anos de prisão;

1 crime com a pena de 4 anos e 8 meses de prisão;

1 crime com a pena de 4 anos e 6 meses de prisão;

1 crime com a pena de 4 anos e 4 meses de prisão;

3 crimes com a pena de 4 anos de prisão por cada um;

1 crime  com a pena de 3 anos e 8 meses de prisão e

2 crimes  com as penas de 3 anos e 6 meses de prisão, por cada um.

Extorsão dos artºs 223º nº 1 e 3, a), 204º nº 2 al, g) 22º,23º e 73º do CP:    

1 crime punido com a pena de 6 anos de prisão;

3 crimes com a pena de 5 anos e 6 meses de prisão por cada um;

5 crimes com a pena de 5 anos de prisão por cada um;

4 crimes tentados com a pena de 3 anos de prisão por cada um; 

4 crimes  tentados com a pena de 2 anos e 6 meses de prisão, por cada um.

Branqueamento de Capital dos artºs 368-A, nº 1, 2 e 3 do CP:

1 crime punido com a pena de 5 anos de prisão.

                O cúmulo resultante do concurso de todas estas penas aplicadas ao arguido AA foi a pena única de 17 anos de prisão.

                2- Nas conclusões que delimita o conhecimento do recurso o arguido AA volta a impugnar as declarações para memória futura, o não cumprimento do disposto no artº 358º do CPP, o crime continuado de burla e extorsão, ainda o crime continuado e por fim as medidas das penas por cada um dos 10 crimes de burla, 9 de extorsão, 8 de extorsão na forma tentada, do crime de branqueamento de capitais e só no ponto AX das conclusões é que impugna sinteticamente a medida da pena única.

                2.1 Respondeu o Ministério Público através da sra. Procuradora Geral Adjunta que além de suscitar questões prévias rebate muito fundamentadamente as pretensões do arguido/recorrente.

                3- Parece-nos também e desde já que o acórdão proferido no Tribunal da Relação de Coimbra que manteve integralmente a(s) condenação(s) do arguido(s) nomeadamente do arguido AA não é susceptível de recurso e que por isso a sua rejeição deverá abranger quase a totalidade das questões suscitadas, como iremos tentar defender.

                  3.1 O arguido AA no recurso interposto para o Tribunal da Relação de Coimbra não obteve provimento relativamente não só a todas as questões intercalares que havia impugnado, mas também quanto às questões sobre a matéria de facto ou de direito levantadas sobre o crime de burla qualificada, extorsão e branqueamento de capitais, e consequentemente mantida a medida das penas parcelares.

                As penas parcelares são todas inferiores a 8 anos de prisão, sendo a mais baixa de 2 anos e 6 meses de prisão e a mais elevada 6 anos de prisão.

                3.2 Os recursos dos acórdãos das relações interpostos para o Supremo Tribunal de Justiça só podem ter por finalidade o reexame da matéria de direito sobre decisões recorríveis (artºs 432º, nº 1 b) e 434º do CPP).

                O artº 400º, nº 1, f) estabelece que não é admissível recurso de acórdãos condenatórios proferidos, em recurso, pelas relações, que confirmou decisão da primeira instância e apliquem pena de prisão não superior a 8 anos.

                  3.2.1 Havendo dupla conforme, por ter havido duplo grau de jurisdição ao terem sido apreciadas, decididas e mantidas todas as questões de facto e de direito sobre os crimes e medida das penas aplicadas não é reconhecido um segundo grau de recurso, não sendo por isso admissível devido à medida de cada uma das penas, conforme dispõem as disposições já acima referidas - artº 400º, nº 1, f) e 432º nº 1 b) do mesmo CPP (neste sentido a jurisprudência do STJ, designadamente os Acs. de 16/6/2011, p. 1010/09.8 e de 30/10/2013, p. 22/11.6PEFAR.E1.S1.).

3.2.2 Ao arguido/recorrente com Acórdão da Relação já havia sido garantido o seu direito de defesa, sem haver violação de qualquer dos direitos constitucionais consagrados nos artºs 20º nº 1 e 32º, nºs 1 a 3 da Constituição e 2º Protocolo e 7º da Convenção para Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais (Ac. do STJ de 21.05.09, p. 17/07.4SFPRT.S1, entre outros).

De qualquer modo uma jurisprudência firme e reiterada do Tribunal Constitucional é no sentido de não considerar ser inconstitucional a circunstância de haver dupla conforme mesmo depois de ter havido redução da pena num acórdão da relação nos termos do art.º 400º nº 1, al. f) do CPP e por isso não poder haver recurso para o STJ em terceiro grau de jurisdição em matéria penal (Acs do Tribunal Constitucional nº 2/06 de 13/1/2001, Ac. nº 20/07 de 17/01/2007, o Ac. nº 645/2009 de 15/12/2009).

                3.3 Segundo nos parece só podemos concluir que será irrecorrível o acórdão da Relação de Coimbra sobre todas as questões de facto e de direito colocadas relativamente a todos os crimes a que foi condenado e medida das penas que lhe foram aplicadas, com exceção da pena única.

4- Legal e jurisprudencialmente só é recorrível o acórdão da Relação de Coimbra quanto à medida da pena única que havia sido aplicada e foi mantida em recurso – 17 anos de prisão, por ser superior a 8 anos de prisão (artº 400º nº 1 al. f) à contrário) e (Ac. do STJ de 24/1/2013, p. 184/03.6TASTB.EL.S1).

                4.1 O arguido/recorrente só impugna medida da pena muito genericamente, considerando-a severa.

                A sua defesa limita-se a invocar a sua idade de 34 anos e as consequências que se lhe irão repercutir, quando sair em liberdade, nomeadamente as dificuldades na sua ressocialização para se tornar um “indivíduo válido para a sociedade”. 

Mas para colocar estas dúvidas será necessário que o arguido/recorrente fundamente e indique quais as circunstâncias atenuantes que as demonstrem e que resultem dos factos provados.

4.2 A fixação da pena do concurso depende da consideração do conjunto dos factos e da personalidade do agente nos termos dos nºs 1 e 2 do artº 77º, pois o critério para a pena unitária dele resultante tem de assumir-se como um critério especial.

A pena única, tem de socorrer-se dos parâmetros da fixação das penas parcelares, podendo funcionar como “guias” na fixação da medida da pena do concurso (As Consequências Jurídicas do Crime, Figueiredo Dias, fls. 420).

A sua fixação, tal como resulta da lei, não se determina com a soma dos crimes cometidos e das penas respectivas, mas da dimensão e gravidade global do comportamento delituoso do arguido, pois tem de ser considerado e ponderado o conjunto dos factos e a sua personalidade “como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado” (Figueiredo Dias, cit. pag. 290, 292).

A pena de prisão aplicada ao arguido/recorrente teve/tem como limite máximo 25 anos (a soma de todas as penas é de 118 anos e 8 meses) e limite mínimo 6 anos de prisão (artº 77º nº 2 do CP).

O acórdão recorrido não se pronunciou sobre a medida da pena única porque o arguido AA, apesar das extensíssimas conclusões, nem sequer a impugnou como última hipótese.

No entanto, ao serem considerados em conjunto os factos dados como provados e a personalidade demonstrada pelo arguido AA, conjuntamente com a idade por ele invocada, não nos parece que a punição que o mesmo sofreu possa ser alterada.

 É que também tendo em conta “a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão, e o tipo de conexão, que entre os factos concorrentes se verifique” conforme ensina Figueiredo Dias, ficará sustentada a medida da pena aplicada até porque os anos em que ocorreram, o conjunto dos factos, antecedidos de outros idênticos ocorridos nos EUA, não são no sentido da personalidade do arguido se ter traduzido numa pluriocasionalidade, mas antes uma tendência que só poderá ter efeitos agravantes e não atenuantes.

Não haverá, pois, segundo nos parece, fundamentos, circunstâncias favoráveis que possam levar a alterar a medida da pena aplicada – 17 anos de prisão, quando o limite máximo é de 25 anos, apesar da soma de todas as penas ser de 118 anos e 8 meses (artº 77º nº 2 do CP).

Assim e por tudo isto parece-nos que o recurso do arguido AA poderá/deverá ser rejeitado por ser irrecorrível quanto a todas as questões suscitadas (de facto, de direitos e medida das penas parcelares) com uma única exceção em relação a qual é manifesta a sua improcedência - medida da pena única aplicada (artºs 400º nº 1, f), 420º nº 1, a) e b), 432º nº 1, b) e c) e 434º, do C.P.).   

Cumprido o disposto no art. 417º, nº 2, do CPP, o arguido AA respondeu o seguinte:

1 – O Douto Parecer do Ministério Público vem pugnar pela rejeição do recurso, por o mesmo ser irrecorrível quanto a todas as questões suscitadas (de facto, de direitos e medida das penas parcelares), com excepção da medida da pena única aplicada, em relação à qual é manifesta a sua improcedência.

2 – Salvo o devido respeito, que é muito, não podemos deixar de discordar com a posição assumida pelo Ministério Público no seu parecer, desde logo por se tratar de urna restrição irrazoável e desproporcional do direito ao recurso consagrado no artigo 32º n° 1 da CRP.

3 – Neste âmbito, que sentido é que faz — entre os condenados com pena superior a 8 anos de prisão — distinguir a situação daqueles que o foram por causa de um único crime daqueles outros que o foram por força do cúmulo derivado da prática de uma pluralidade de crimes? No nosso modesto entendimento, tal distinção não faz sentido.

4 – Se o critério é a gravidade da pena (isto é, o castigo infligido), parece ser indiferente se isso é o resultado de urna pena única ou do cúmulo de penas parcelares.

5 – Quando a pena superior a 8 anos de prisão é o resultado do cúmulo de penas parcelares de montante inferior, não é razoável que o arguido só tenha acesso ao Supremo Tribunal para discutir o cúmulo e já não as matérias decisórias referentes aos crimes e as penas parcelares, que são, afinal, e por regra, na substância da condenação, o mais relevante, condicionando os termos da pena única aplicada.

6 – Assim, entendemos que o recurso deve ser admitido na sua totalidade, e não apenas no respeitante ao cúmulo jurídico, sob pena de uma interpretação inconstitucional do artigo 400º, n.° 1, alínea f), do Código de Processo Penal, na versão da lei n.º 48/2007, de 29 de Agosto, quando entendido no sentido de, no caso de concurso de infracções, não ser recorrível, para o Supremo Tribunal de Jusiça a parte da decisão da Relação que confirme decisão da 1ª instancia que aplique pena de prisão parcelar não superior a 8 anos, sem prejuízo de ser recorrível qualquer outra parte dessa decisão, relativa a pena parcelar ou mesmo só à operação de formação da pena única que tenha excedido aqueles limites, por violação dos artigos 29.° n.° 1 e 32°, n.° 1, da Constituição da República Portuguesa.

7 – Aliás o mesmo entendimento é perfilhado pelo Tribunal Constitucional que, em 5 de Dezembro de 2012, pelo Acórdão n.° 590/2012, proferido pela 1.ª Secção, decidiu-se «julgar inconstitucional o artigo 400.°, n.° 1, alínea f), do Código de Processo Penal (CPP), na interpretação de que havendo uma pena única superior a 8 anos, não pode ser objeto do recurso para o Supremo Tribunal de Justiça a matéria decisória referente aos crimes e penas parcelares inferiores a 8 anos de prisão, por violação do princípio da legalidade em matéria criminal (artigos 29 °, n.° 1 e 32.°, n.° 1, da Constituição da República Portuguesa».

8 – E é reforço deste entendimento, que ora explanamos, o artigo 32.°, n.° 1, da Constituição, nos termos do qual o processo penal assegura todas as garantias de defesa, incluindo o recurso. Poder-se-á mesmo dizer que “perturbações essenciais do direito de defesa permitem, em última análise, uma frustração do próprio nullum crimen sine lege. Esta exigência da lei incriminadora concretiza-se no Processo Penal pela possibilidade de o agente demonstrar que não praticou o crime que lhe é imputado. Se o não puder fazer devidamente, o nullum crimen sine lege será um artefacto que permitirá atribuir responsabilidade onde em concreto possa não ter existido qualquer crime” (Fernanda Palma, “Linhas estruturais da reforma penal — Problemas de aplicação da lei processual penal no tempo”, O Direito, 2008, 1, p. 20 e s.).

9 – O processo penal só assegurará plenamente as garantias de defesa através de lei estrita que conforme a posição processual do arguido e os seus direitos processuais, nomeadamente o direito ao recurso. As garantias de defesa só estarão plenamente asseguradas se, no momento relevante para o exercício do direito ao recurso, o destinatário da norma conhecer as condições do respetivo exercício com a segurança que o garanta contra a imprevisibilidade. Esta exigência impõe-se necessariamente quando o que está em causa é o acesso a um segundo grau de recurso, num ordenamento processual penal onde a irrecorribilidade das decisões constituí uma excepção (artigos 399.° e 400.° do CPP) e que dá ao recorrente a possibilidade de aceder diretamente ao Supremo Tribunal de Justiça, quando pena de prisão aplicada em Acórdãos finais proferidos pelo Tribunal do Júri ou pelo Tribunal Coletivo seja superior a cinco anos (artigo 432.°, n.° 1, alínea c), do CPP).

10 – Assim, e pelo supra exposto, entendemos que V. Exas., Colendos Conselheiros, deverão apreciar a totalidade do recurso interposto pelo arguido, ora recorrente, sob pena de violação da CRP, conforme supra referimos.

11 – Mas mesmo que assim não se entenda, e por mera cautela e dever de patrocínio, sempre se dirá, no que concerne à pena única de 17 anos de prisão que a mesma é desajustada, excessiva e contraria todas as políticas de ressocialização do indivíduo.

12 – Das penas parcelares aplicadas ao arguido, o limite mínimo do cúmulo seria 6 anos e o máximo 25 anos. O Tribunal entendeu aplicar 17 anos de prisão a um jovem de 30 anos, que na altura não tinha no seu CRC registo de condenações por crimes similares. Ou seja, entendeu o Douto Tribunal como justo e adequado uma pena de 17 anos, próximo do limite máximo!

13 – Mas não, o arguido, confessou os factos que lhe eram imputados, de forma verdadeira e sincera, e esse comportamento não foi valorado pelo Tribunal na escolha da medida da pena.

14 – Deverá contribuir a favor do arguido a sua idade, o facto de ter confessado os factos e demonstrar com isso uma reflexão verdadeira e sincera sobre o mal das suas condutas e não poderão V. Exas. deixar de considerar, e com base nos elementos constantes do processo, a pena de 17 anos desproporcional e excessiva.

15 – Face ao supra exposto, requer-se que seja dado total provimento ao recurso apresentado pelo arguido.

Por sua vez, o arguido BB respondeu:

a) Ao contrário do que se sustenta no parecer em apreço, a decisão recorrida é recorrível em todos os incisos abrangidos pela motivação do recurso do arguido, nos termos já expostos nos n°s 9 a 21 e conclusões A) a F) dessa peça processual, que ora se dá por reproduzida nesse segmento;

b) Por outro lado, há uma parte que sempre seria recorrível – mesmo ponderando a interpretação adoptada pelo Ministério Público -, a qual tem a ver com a medida da pena única aplicada, tal como consta dos nºs 39 e 40 e da conclusão Z) da motivação do recurso do arguido.

Foi realizada audiência de julgamento quanto ao recurso do arguido BB, conforme por ele peticionado.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.

II. Fundamentação

O arguido AA coloca as seguintes questões:

- inadmissibilidade das declarações para memória futura, por violação do princípio do contraditório;

- não cumprimento do disposto no art. 358º do CPP, com violação do princípio do contraditório;

- continuação criminosa na prática de um crime de extorsão e de burla;

- medida da pena.

Por sua vez, o arguido BB submete a apreciação estas questões:

- nulidade do acórdão recorrido quanto à análise da impugnação da matéria de facto;

- nulidade do acórdão da 1ª instância quanto ao exame crítico da prova;

- erro na qualificação dos crimes de extorsão, por ter sido considerado integrado o conceito de “bando”;

- medida das penas parcelares e da pena única.

Há que começar por delimitar o âmbito de conhecimento dos recursos, atentas as regras processuais vigentes.

Com efeito, conforme jurisprudência largamente maioritária deste Supremo Tribunal, e uniforme nesta 3ª secção[3], por força da al. f) do nº 1 do art. 400º do CPP, que impede a impugnação das decisões das Relações que confirmem decisão da 1ª instância (“dupla conforme”) e apliquem pena não superior a 8 anos de prisão, no caso de haver uma pena conjunta superior a essa medida, não pode ser objeto de recurso para este Supremo Tribunal a matéria referente às penas parcelares que não a ultrapassem.

Esta posição maioritária assenta basicamente no pressuposto de que não há que distinguir entre as situações de dupla conforme verificadas em condenação singular e as que sucedam quando exista pluralidade de crimes a determinar uma pena conjunta superior a 8 anos de prisão. Ou seja, seria materialmente injusto, e contrário ao espírito da lei, que pretende que somente as penas superiores a 8 anos de prisão escapem ao obstáculo da dupla conforme, admitir a impugnação de penas inferiores a esse limite por “arrastamento” provocado simplesmente (e aleatoriamente) pela sua inclusão num cúmulo de medida superior. A recorribilidade das decisões deve resultar de critérios objetivos e abstratamente fixados, não de fatores aleatórios ou circunstanciais.

Este entendimento jurisprudencial foi analisado, sob a perspetiva da constitucionalidade, pelo Tribunal Constitucional, tendo este, em plenário recente, decidido não julgar inconstitucional tal interpretação da norma.[4]

Não há, portanto, qualquer motivo para alterar a jurisprudência que se vem seguindo unanimemente nesta secção.

Assim, já que nenhuma das penas parcelares ultrapassa 8 anos de prisão, as questões colocadas pelos recorrentes quanto à sua medida e todas as imputadas a circunstâncias integradas na sua própria génese não constituirão objeto de análise neste acórdão.

Da mesma forma, considera-se exceder a matéria do recurso a apreciação realizada pela Relação, no âmbito da impugnação de facto. Na verdade, a este Supremo Tribunal caberá indagar se a Relação procedeu ou não à análise da impugnação da matéria de facto, quando ela exista, e cumpra os requisitos indicados no art. 412º, nºs 3 e 4, do CPP. Mas já não avaliar como a Relação procedeu a essa análise, pois doutra forma se imiscuiria na sua função, exclusiva, de fiscalização da matéria de facto.

Acrescente-se que a impugnação de facto deve incidir sobre pontos precisos, com indicação das provas concretas que impõem decisão diversa. Ou seja, há que individualizar os factos contestados, e indicar, para cada um, as provas que impõem a fixação de um facto diferente. Sem essa individualização de factos e provas a Relação não poderá realizar um juízo próprio e autónomo sobre os factos impugnados.

Ora, a impugnação apresentada pelo recorrente BB para a Relação (conclusões cxi a clxxxix, fls. 10444-10447), embora citando depoimentos e contestando factos, não opera a exigível impugnação individualizada, centrando-se em considerações sobre a errada utilização das regras de experiência comum por parte do tribunal da 1ª instância e na alegação de considerações opostas, que mais não traduzem do que a apreciação pessoal do recorrente sobre as provas produzidas.

A Relação assinalou tal deficiência da impugnação, mas não deixou de efetuar uma ponderação global das provas e argumentos apresentados pelos recorrentes, fundamentando a sua rejeição (capítulo 6º do acórdão recorrido, em especial fls. 199-‑200).

A valoração e a credibilidade das provas integra o objeto de recurso em matéria de facto. O exercício do contraditório em tal matéria foi acautelado com o recurso interposto para a Relação, não existindo um segundo grau de recurso em matéria de facto.

Não houve omissão de pronúncia pela Relação sobre as questões postas, nem a Relação se fundamentou em meios de obtenção de prova ou provas legalmente proibidos, pelo que não existem nulidades, nem houve ofensa de normas constitucionais.

Nenhuma censura há, pois, a fazer ao acórdão recorrido nesta parte.

Restam, pois, para análise, as questões que se referem à medida das penas conjuntas.

Para a sua apreciação, há que conhecer a matéria de facto pertinente, que é a seguinte:

1. O arguido AA é cidadão luso-americano, tendo nascido em Nova Iorque, Estados Unidos da América do Norte (EUA) em 26/06/1979.

2. Na sequência de factos ilícitos praticados naquele país, em 2003 o mesmo pôs-se em fuga, dali se ausentando com destino a Portugal para evitar ser capturado pelas autoridades norte-americanas e cumprir pena criminal.

3. Por força da prática desses actos, o mesmo conhecia o sistema de processamento de transferências monetárias realizado por empresas como a W... U... (WU) e a M…G… (MG), ambas companhias de serviços financeiros e comunicações baseadas nos Estados Unidos da América do Norte, as quais oferecem além do mais serviços de transferências monetárias através de uma rede de agentes e instituições financeiras disseminadas por aquele continente mas também na Europa e noutras partes do Mundo.

4. Para as transferências monetárias o procedimento corrente consiste na aquisição do serviço de envio de dinheiro para qualquer parte do mundo onde exista uma agência de qualquer das instituições, entregando, pelas formas admitidas, o montante a transferir, bem como o pagamento do serviço propriamente dito, procedendo a empresa à entrega do montante contratado numa qualquer agência com quem tenha acordo para isso a quem se apresente a recebê-la.

5. Para controlo e segurança da operação, no local de pagamento, este só será feito ao beneficiário, o qual deve preencher um formulário com os seus dados pessoais e outros elementos, como um telefone de contacto, aqueles primeiros comprovados através da exibição de um documento de identificação com assinatura legível e fotografia, sendo obrigatoriamente indicados o seu nome e o do remetente, o montante esperado e o Money Transfer Control Number (MTCN), número de controlo de transferência (número de referência no caso da M... G...) composto por 10 dígitos – 8 nas transferências feitas através da MG - gerado automaticamente pelo sistema informático, o qual é fornecido ao remetente que, por sua vez, para o efeito de levantamento, o facultará ao beneficiário.

6. Por seu turno, o funcionário da agência pagadora encarregado de processar a operação com entrega do montante ao beneficiário, anotará os elementos referentes ao documento de identificação por ele exibido, obrigatoriamente o seu número, data de emissão e validade.

7. As transferências são efectuadas de forma individual e automática e imediatamente, embora podendo manter-se activas no sistema, acessíveis a pagamento, durante cerca de 1 (um) ano.

8. Após a sua chegada ao nosso país, o referido AA passou a relacionar-se com os familiares da linha materna aqui existentes, os arguidos BB e filhos deste, EE, CC, FF e DD, bem como com o marido da primeira, GG, e ainda com HH, amigo da família, que o receberam e auxiliaram, integrando-o inicialmente em empresas que gerem, embora sem funções específicas uma vez que o mesmo não dispunha de qualquer formação, especialmente nas áreas que constituem o objecto social das mesmas.

9. Porque tal ocupação não lhe proporcionasse, todavia, o estilo de vida e os meios materiais que para si ambicionava e a que estava habituado, embora advindos à sua esfera jurídica de forma ilegítima, a partir de certa altura da sua permanência em Portugal, em data não apurada, mas sempre anterior a finais de 2006, o arguido AA formulou repetidamente a intenção de, a partir do nosso país, passar a captar fraudulenta e ilicitamente valores monetários através do sistema utilizado pelas referidas instituições financeiras, quer directamente quer de empresas constituídas agentes das mesmas, conseguindo também desse modo prover ao seu faustoso sustento.

10. Os procedimentos por si concebidos para alcançar tal propósito consistiam em entrar em contacto telefónico, a partir de Portugal, utilizando telefones da rede móvel nacional ou em VOIP - abreviatura de sistema de comunicação telefónica através da World Wide Web, mediante um protocolo designado Voice Over Internet Protocol, com estabelecimentos constituídos agências WU ou MG em qualquer parte do mundo, designadamente nos Estados Unidos da América do Norte (EUA), Canadá e países europeus.

11. A fim de alcançar o seu objectivo, o arguido AA:

ora dirigia ameaças consistentes na alegada colocação de engenhos explosivos nas instalações aptos a deflagrar e/ou na existência de atiradores furtivos nas suas imediações (snipers) que disparariam, por forma a levar os funcionários a acreditar nas afirmações que lhes dirigia, convencendo-os de que tinha condições para visionar o que ocorria no interior, dirigindo-lhes exigências destinadas a comprová-lo;

ora construindo realidades inexistentes, convencendo-os da ocorrência de anomalias no sistema informático de transferências ou afirmando-se possuir qualidades que não detinha nem detém, nomeadamente a de funcionário do serviço de suporte técnico da mesma instituição financeira.

12. Quando se tornava necessário, o arguido AA contactava telefonicamente previamente o serviço de apoio ao cliente da WU –  através dos n.os (XXX) XXX-XXXX (XXX) XXX-XXXX - a fim de obter códigos de transacção que posteriormente indicaria à agência.

13. Os códigos de transacção são um conjunto de algarismos necessários à transferência monetária em agências que não possuem um terminal completo, para cuja obtenção é necessário informar o nome do remetente, quantia a transferir, nome do beneficiário e o país de levantamento.

14. De tal propósito e processo destinado a alcançá-lo deu o mesmo AA pormenorizado conhecimento ao arguido BB que a eles aderiu sem reservas, visando obter também para si os proveitos ilicitamente decorrentes das condutas planeadas entre ambos, assegurando o auxílio que fosse necessário da sua parte na execução dos actos destinados a alcançar tal objectivo, por si, ou por intermédio de terceiros.

15. A fim de assegurar o efectivo recebimento dos valores ilicitamente captados, os mesmos necessitavam de se socorrer de terceiros no sentido de, em acto seguido à realização da transferência monetária, e a fim de evitar o seu cancelamento, caso fosse detectada a ilegitimidade do meio utilizado, se organizarem e se deslocarem às diversas agências das aludidas WU e MG existentes no nosso país, ou mesmo na zona fronteiriça de Espanha, para recolherem os valores transferidos, para o efeito habilitando quem ali comparecesse, em regra por via telefónica, com os elementos imprescindíveis à entrega dos valores transferidos e obtidos de forma ilícita, bem como a posterior dissimulação da sua origem.

16. Na coadjuvação de tal tarefa, careciam, pois, da colaboração de pessoas em quem depositassem inteira confiança, por forma a manter o sigilo exigido pela natureza censurável e ilícita dos actos projectados e resultados materiais obtidos, o que naturalmente acontecia com os arguidos GG, EE, CC, FF e DD, familiares de ambos, e com o arguido HH, pessoa das relações dos demais e com disponibilidade de tempo, sobre quem o arguido BB exercia ascendente, a quem os arguidos AA e BB deram conhecimento dos propósitos de os alcançarem através do processo fraudulento referido em 11b), a eles igualmente aderindo.

17. Após o recebimento das quantias assim fraudulentamente captadas em moeda local, em especial dólares americanos (USD), depois convertidos, no momento do pagamento, em euros no caso de países não integrados na União Monetária, esse dinheiro era entregue ao arguido AA e, com mais frequência, ao arguido BB, ou creditado em contas bancárias por ambos indicadas.

1º)

18. Em data não apurada de Agosto de 2007, mas não posterior ao dia 7, a partir de Portugal, o arguido AA contactou telefonicamente a “S… O… C…”, agência WU com o Account Number XXXXX, sita em 500 South Challis Street, Salmon, estado de Idaho, EUA, com os telefones n.os (XXX) XXX-XXXX e (xxx) xxx-xxxx, tendo entabulado conversação com a funcionária da caixa II, identificada a fls. 4940.

19. Identificando-se como Tom, do suporte técnico da WU, e alegando que o sistema informático daquela Agência se encontrava com problemas, inactivo, devido a uma red flag, expressão com a qual pretendia dar credibilidade à sua actuação como alegado técnico demonstrando conhecimentos específicos, referiu-lhe que iria proceder a uma intervenção no mesmo.

20. Solicitou então à mesma trabalhadora que, para o efeito, ligasse e desligasse o sistema, informando-a que por essa via iria entrar no modo de teste, pelo que qualquer transferência seria automaticamente cancelada, factos que não correspondiam à realidade, devendo, por isso, informar os clientes da Agência para se dirigirem a outra para utilizar os serviços disponibilizados pela WU, e ainda que não deveria falar com quem porventura pudesse vir a telefonar da parte da empresa e que, no final de cada dia, fosse desligado o terminal informático e só voltasse a ser ligado até ser efectuado novo contacto da sua parte, desligando em seguida.

21. No dia 7 de Agosto de 2007, cerca das 08H30, fuso horário do Idaho (menos 7 horas segundo o Coordinated Universal Time conhecido pelo acrónimo UTC-7), 15H30 em Portugal, o mesmo arguido, sempre identificando-se como sendo o Tom da assistência técnica, encetou novo contacto telefónico com a referida agência WU, tendo conversado com a funcionária da caixa, D… W…, identificada a fls. 4940, a quem alegou testar o sistema informático da agência, informando-a de que iriam ser por ela realizadas transferências de teste a partir da agência, para o que lhe forneceria as indicações necessárias, nomeadamente os remetentes e os destinatários, bem como o montante a inscrever para transferir, guiando-a na sua execução, e solicitando-lhe que indicasse nos recibos a imprimir a expressão “VOID”, que significa NULO ou ANULADO, para mais facilmente fazê-la crer estar perante uma intervenção legítima, gerando transferências fictícias, o que não correspondia à realidade.

22. Na execução do propósito assumido, de obter o máximo de valores fraudulentamente captados, o arguido AA passou a contactar telefonicamente para aquele fim a referida agência WU enquanto não fosse descoberta a ilegitimidade do procedimento adoptado.

23. Assim, no período que mediou entre os dias 7 e 11 de Agosto de 2007, em sucessivos contactos telefónicos utilizando os cartões da rede móvel nacional referidos no quadro a seguir exposto, mantendo as aludidas funcionárias no erro que lhes havia provocado da forma descrita em todos esses contactos, o arguido conseguiu que as mesmas realizassem 21 transferências monetárias, para o efeito fornecendo-lhe 21 (vinte e um) códigos de transacção previamente obtidos.

24. Após a realização de cada uma das transferências monetárias, solicitou-lhes os MTCN correspondentes, alegando que os mesmos eram necessários para proceder à respectiva anulação, o que por elas lhe foi comunicado.

25. Com os elementos indicados e os MTCN correspondentes a cada transferência, todas as transferências assim geradas foram levantadas nos locais e termos mencionados no quadro seguinte pelos arguidos AA, BB e GG, sendo uma delas creditada na conta do M…B… de JJ, identificada a fls. 1991:

[...]

26. No período considerado, o arguido AA esteve em contacto directo com o arguido BB quer para o efeito deste se deslocar às diversas agências WU em Portugal para recolher os valores sucessivamente captados quer para determinar o arguido GG a fazê-lo, o que veio a acontecer no dia 8 de Agosto de 2007.

27. Ao arrogar-se, de forma séria e convincente, de uma qualidade que efectivamente não possuía – a de funcionário do serviço técnico competente da WU habilitado para intervir daquela forma – e criando a aparência de uma realidade de facto inexistente – a de que o sistema informático existente no terminal instalado na aludida agência apresentava problemas de funcionamento –, assim induzindo em erro as referidas funcionárias, pretendia o arguido AA, em comunhão de esforços e intenções com o arguido BB, com o conhecimento e vontade de ambos, levá-las a executar sucessivas transferências monetárias a favor destes arguidos, nessa medida enriquecendo; actos esses susceptíveis de causar, como causaram, prejuízo patrimonial no valor global de 36.359.64€, visto não terem dado entrada na disponibilidade da(s) entidade(s) lesada(s) os valores correspondentes.

28º Os arguidos AA e BB mais actuaram em comunhão de esforços e intenções com o arguido GG, bem sabendo e querendo este último conseguir, da forma sobredita, a execução e o valor das transferências monetárias a cujo levantamento procedeu, no total de 2.579,08 €, a favor de todos eles, actos esses susceptíveis de causar nessa medida, como causaram, o correspondente prejuízo patrimonial.

2º)

29. No período que mediou entre as 17H27 e as 18H47, em Portugal, do dia 13/08/2007, utilizando o telefone da rede móvel nacional n.º (+XXX) XXX XXX XXX, o arguido AA contactou telefonicamente a “K… XXXX”, sita em 3180 US Highway 2 West, Havre, no Estado de Montana, EUA, com o telefone n.º XXX-XXX-XXX, agência WU com o Account Number XXXXX, sendo atendido pelo funcionário G… G….

30. Afirmando pertencer ao departamento competente da empresa, e alegando que havia recebido uma chamada telefónica da administração daquela agência, solicitou contacto com o respectivo contabilista, passando então a falar com J… L…, ali com aquelas funções.

31. Identificando-se da mesma forma perante esta, o AA informou-a então que necessitava de realizar diversos testes informáticos em virtude da existência de uma alegada anomalia com o número “0”.

32. Crendo na veracidade de tais informações e que realizaria apenas operações experimentais, a referida J… L… passou então a executar transferências monetárias sob orientação daquele, que lhe foi fornecendo os diversos elementos necessários à sua realização, nomeadamente o remetente – J… S… -, o destinatário – HH e BB – e os valores a transferir, por forma a proceder à resolução dos supostos problemas.

33. Após a realização de 3 transferências monetárias, o arguido solicitou os MTCN’s àquela funcionária, tendo-lhe a mesma indicado os números XXXXXXXX, XXXXXXXX, XXXXXXXX, efectuando ela a impressão dos respectivos recibos.

34. Para melhor credibilizar a sua acção, o arguido forneceu como contacto o telefone n.º (XXX) XXX-XXXX.

35. Contactados os arguidos BB e HH, o arguido AA organizou com aqueles a forma de serem recolhidas as quantias assim fraudulentamente captadas.

36. Os valores transferidos, num total de 8.450,00USD, correspondentes a 5.945,35€, vieram a ser entregues aos arguidos HH, a pedido concertado de AA e de BB, e bem assim a este último, que se apresentaram para o efeito ao balcão dos CTT de Viseu, habilitados com os elementos necessários a tanto, transmitidos pelo arguido AA, em especial os referidos MTCN, conforme se sintetiza no quadro seguinte:

[...]

37. Ao se arrogar, de forma séria e convincente, de uma qualidade que efectivamente não possuía – a de funcionário do serviço técnico competente da empresa habilitado para intervir daquela forma – e criando a aparência de uma realidade de facto inexistente – a de que o sistema informático existente no terminal instalado na aludida agência apresentava problemas de funcionamento –, assim induzindo em erro a referida trabalhadora, pretendia o arguido AA, em comunhão de esforços e intenções com o arguido BB, com o conhecimento e vontade de ambos, levá-la a executar sucessivas transferências monetárias a favor destes arguidos, nessa medida enriquecendo; actos esses susceptíveis de causar, como causaram, prejuízo patrimonial no valor global de 5.945,35€, visto não terem dado entrada na disponibilidade da(s) entidade(s) lesada(s) os valores correspondentes.

38. Os arguidos AA e BB mais actuaram em comunhão de esforços e intenções com o arguido HH, bem sabendo e querendo este último conseguir, da forma sobredita, a execução e o valor das transferências monetárias a cujo levantamento procedeu, no total de 3.938,63€, a favor dos primeiros; actos esses susceptíveis de causar nessa medida, como causaram, o correspondente prejuízo patrimonial.

3º)

39. Entre os dias 14/08/2007 e 16/08/2007, utilizando os telefones da rede móvel nacional referidos no quadro adiante descrito, o arguido AA contactou telefonicamente a agência #239 da empresa “W… G…S…”, com o Account Number XXXXXX, sita no Estado do HAVAI – EUA, em 4405 Lower Honoapiilani Road, Lahaina, com o telefone número XXX-XXX-XXXX.

40. Na execução do propósito assumido, de obter o máximo de valores fraudulentamente captados, o mesmo arguido passou a contactar telefonicamente a referida agência WU enquanto não fosse descoberta a ilegitimidade do procedimento adoptado.

41. Naquele primeiro dia 14 de Agosto de 2007, entre as 06h10 e as 06h30, fuso do Havai – UTC-10 -, identificando-se perante a sub-gerente, N… L…, melhor identificada a fls. 5124, que o atendeu, como sendo um funcionário do apoio técnico da WU, começou por afirmar-lhe que o terminal de processamento de transferências não se encontrava a funcionar correctamente, necessitando ser reconfigurado, o que não correspondia à verdade, passando então a instruí-la para processar aquilo que lhe referiu serem transferências de teste, a que não corresponderiam efectivos envios de dinheiro, o que também não correspondia à realidade pois que, devido ao seu conhecimento do sistema utilizado por aquela empresa, as instruções que lhe forneceu correspondiam a verdadeiras transferências monetárias.

42. Logrando convencer a referida gerente dessa construção errónea da realidade, em sucessivos contactos telefónicos naquele dia, passou então a fornecer-lhe todas as indicações necessárias ao processamento de transferências monetárias, nomeadamente o remetente, o destinatário e país de destino e o valor, solicitando que lhe fosse transmitido, após a realização de cada uma, o MTCN, e referindo-lhe, a final, de modo a conferir maior credibilidade à sua actuação, que imprimisse os respectivos recibos em papel vulgar a que aporia a expressão Testing Transaction (Transacção de teste).

43. Desta forma, conseguiu o arguido com que a referida N… L… realizasse 2 transferências.

44. Em novo contacto com a mesma agência nesse dia e outros nos dias 15 e 16 seguintes, nas circunstâncias temporais a seguir indicadas, através do mesmo expediente, isto é, enganando acerca da situação do terminal da WU, conseguiu que outras funcionárias, que apenas se sabe tratarem-se de A…, H… e S…, realizassem outras transferências monetárias, a primeira uma e as demais duas cada uma.

45. Na sequência da obtenção dos elementos necessários à entrega, em Portugal, dos valores transferidos, o arguido AA contactou o arguido BB a fim de se organizarem quanto ao levantamento das transferências realizadas, tendo para o efeito contactado os arguidos HH e DD, por forma a estes dois últimos se apresentarem aos balcões de agências WU em Portugal a fim de obterem tais montantes, num total de 19.400,00 dólares americanos, correspondentes a 13.738,12€ (treze mil setecentos trinta e oito euros e doze cêntimos), o que veio a acontecer nos termos seguintes:

[...]

46. Logrando convencer as aludidas funcionárias da errónea construção da realidade forjada de forma séria e convincente, atentos os conhecimentos que lhes evidenciou, consubstanciada na ostentação de uma qualidade que efectivamente não possuía – a de funcionário do serviço técnico competente da empresa habilitado para intervir daquela forma – e criando a aparência de uma realidade de facto inexistente – a de que o sistema informático existente no terminal instalado na aludida agência apresentava problemas de funcionamento –, assim induzindo em erro as aludidas funcionárias, pretendia o arguido AA, em comunhão de esforços e intenções com o arguido BB, com o conhecimento e vontade de ambos, levá-la a executar sucessivas transferências monetárias a favor destes arguidos, nessa medida enriquecendo; actos esses susceptíveis de causar, como causaram, prejuízo patrimonial no valor global de 13.738,12€, visto não terem dado entrada na disponibilidade da(s) entidade(s) lesada(s) os valores correspondentes.

47. Os arguidos AA e BB mais actuaram em comunhão de esforços e intenções com os arguidos HH e DD, bem sabendo e querendo estes últimos conseguir, da forma sobredita, a execução e o valor das transferências monetárias a cujo levantamento procederam, o primeiro no total de 5.955,08 € e o segundo no total de 7.783,04€, a favor dos dois primeiros; actos esses susceptíveis de causar nessa medida, como causaram, o correspondente prejuízo patrimonial.

4º)

48. No dia 17/08/2007, entre as 15H24 e as 19H57, utilizando o telefone da rede móvel nacional n.º (+351) XXX XXX XXX, o arguido AA contactou a empresa “J… F…”, igualmente uma agência WU com o Account Number XXXXXX, com estabelecimento em 10 Buffalo Street, Gowanda, estado de Nova Iorque, EUA, com o telefone número (XXX) XXX-XXXX, sendo atendido pela gerente de loja K… T…, melhor identificada a fls. 4934.

49. Mantendo o procedimento anteriormente descrito, de se identificar como sendo Tom, agora com o apelido Sanders, funcionário da WU, o mesmo referiu à aludida funcionária que a máquina da W... U... não se encontrava a funcionar correctamente, o que, como nas situações anteriormente descritas, correspondia a uma forma de enganar a sua interlocutora, pelo que iria fornecer-lhe indicações para a colocar em estado de regular funcionamento, necessitando para tanto que efectuasse algumas transferências monetárias de teste para confirmar o envio correcto da informação necessária, solicitando-lhe, assim, que acedesse ao sistema e seguisse todas as instruções que lhe iria fornecer, o que esta fez.

50. De imediato passou a transmitir à mesma funcionária todos os procedimentos a realizar, dando-lhe indicação para que usasse o seu nome – dela - como remetente das transferências monetárias e como destinatários os indivíduos indicados na tabela a seguir descrita, devendo indicar-lhe, após cada transferência, o MTCN correspondente.

51. Para conseguir que a referida K…T… continuasse a efectuar outras transferências monetárias, após cada transferência por ela realizada, o arguido informava-a, contra a verdade, que os montantes não haviam sido transferidos e que apenas parte da informação havia sido enviada, pelo que se tornava necessário realizar outra operação semelhante, o que fez sucessivamente.

52. Na execução do propósito assumido, de obter o máximo de valores captados da forma fraudulenta descrita, o arguido continuou a contactar telefonicamente a referida agência WU enquanto não fosse descoberta a ilegitimidade do procedimento adoptado.

53. Assim, em sucessivos contactos naquele dia 17/08/2007, da forma descrita, segundo instruções inteiramente fornecidas pelo arguido AA, nomeadamente quanto ao remetente, destinatário e valor, a aludida funcionária realizou 7 transferências monetárias a que o sistema fez corresponder os MTCN XXXXXXX, XXXXXXXXX, XXXXXXX, XXXXXX, XXXXXXX, XXXXXX, XXXXXXXX, que forneceu ao arguido a pedido deste.

54. Alegando persistirem os problemas informáticos, que não existiam mas que fez crer continuarem a afectar o sistema daquela agência, nos dias 18/08/2007, utilizando os telefones da rede móvel nacional com os números (+351) XXXXXXXX e (+351) XXXXXXX, e, após o domingo, 20/08/2007, usando o telefone da rede móvel portuguesa n.º (+351) XXXXXXX, o arguido AA repetiu todos os procedimentos já levados a cabo, mantendo a aludida funcionária no erro que lhe havia provocado no dia 17 de Agosto anterior, determinando-a a realizar novas transferências monetárias nos precisos termos das anteriormente referidas.

55. Assim, no dia 18/08/2007, de igual forma, vieram a ser realizadas 2 (duas) transferências monetárias, a que corresponderam os MTCN XXXXXXX, XXXXXXX, e no dia 20/08/2007 outras 7 (sete), com os MTCN XXXXXXX, XXXXXXX, XXXXXXX, XXXXXXX, XXXXXXX, XXXXXXX, XXXXXXX.

56. Contactados os arguidos BB, HH e DD, o arguido AA organizou com aqueles a forma de serem recolhidas as quantias fraudulentamente captadas.

57. Assim, os montantes referidos nas aludidas transferências vieram a ser recolhidos em Portugal por BB, DD, este a pedido de seu pai, e por HH, a solicitação concertada de BB e AA, num total de 31.566,65€, nos termos seguintes:

[...]

58. A referida funcionária só acedeu a realizar as aludidas transferências monetárias porque acreditou que, de facto, o sistema poderia estar afectado de alguma anomalia, tal como já acontecera efectivamente noutras circunstâncias, em função do comportamento adoptado pelo arguido AA e os conhecimentos por ele demonstrados relativos ao funcionamento do sistema informático utilizado pela WU.

59. Ao se arrogar, de forma séria e convincente, de uma qualidade que efectivamente não possuía – a de funcionário do serviço técnico competente da empresa habilitado para intervir daquela forma – e criando a aparência de uma realidade de facto inexistente – a de que o sistema informático existente no terminal instalado na aludida agência apresentava problemas de funcionamento –, assim induzindo em erro a referida funcionária, pretendia o arguido AA, em comunhão de esforços e intenções com o arguido BB, com o conhecimento e vontade de ambos, levá-la a executar sucessivas transferências monetárias a favor destes arguidos, nessa medida enriquecendo; actos esses susceptíveis de causar, como causaram, prejuízo patrimonial no valor global de 31.566,65€, visto não terem dado entrada na disponibilidade da(s) entidade(s) lesada(s) os valores correspondentes.

60. Os arguidos AA e BB mais actuaram em comunhão de esforços e intenções com os arguidos HH e DD, bem sabendo e querendo estes últimos conseguir, da forma sobredita, a execução e o valor das transferências monetárias a cujo levantamento procederam, o primeiro no total de 21.992,51€ e o segundo no total de 7.683,32€, a favor dos dois primeiros; actos esses susceptíveis de causar nessa medida, como causaram, o correspondente prejuízo patrimonial.

5º)

61. No dia 21/08/2007, entre as 11H39 e as 16H05 (hora local – Portugal), encontrando-se acompanhado do arguido BB, a partir do nosso país, utilizando o telefone móvel com n.º (+351) XXXXXXX, o arguido AA contactou o posto de abastecimento de combustíveis “S… B…”, em Jefferson City, Missouri, EUA (UTC-5), com o Account Number XXXXXXX, para o telefone n.º (xxx) xxx-xxx, sendo atendido pelo funcionário W… T… Z… J…, abreviadamente designado por B… Z…, melhor identificado a fls. 5040.

62. Identificando-se como funcionário do Departamento de Fraudes da WU, o mesmo referiu àquele funcionário que a W... U... havia detectado várias tentativas fraudulentas de utilização do seu sistema de transferências monetárias, a que estavam a procurar obviar, após o que aquele funcionário passou a chamada telefónica para a gerente S… G…, melhor identificada a fls. 5041.

63. Logrando convencê-lo da sua qualidade, de novo em contacto com o referido W… Z…, este, a partir do terminal WU e mediante instruções circunstanciadas fornecidas pelo arguido, desde o modo de operar com o terminal até à efectiva realização de operações, sempre afirmando que dessa forma se iria fazer cessar as fraudes, o que reforçou o convencimento daquele de que se tratava efectivamente de um técnico habilitado e credenciado da aludida instituição financeira, realizou sete transferências monetárias a partir de indicações exclusivamente fornecidas pelo arguido, nomeadamente o remetente, o destinatário e o respectivo valor, transmitindo ao arguido, no final, e a solicitação deste, o respectivo MTCN.

64. Já em conversa telefónica com a referida S… G…, a quem o arguido convenceu da sua errónea qualidade, este logrou determiná-la, pelo mesmo processo enganoso, a efectuar uma transferência monetária nos precisos termos em que o aludido W… tinha executado as demais sete, transferência esta, a que o sistema fez corresponder o MTCN XXXXXXX, que, todavia, foi possível cancelar em tempo, impedindo-se o seu pagamento.

65. Em ordem a tornar mais credível a sua actuação, o arguido referiu à gerente que deveria imprimir e guardar os recibos das transferências monetárias executadas que iriam, tal como o terminal WU, ser recolhidos pelo FBI.

66. De posse dos MTCN, o arguido AA apresentou-se no balcão de Viseu do B… a fim de obter a quantia monetária referente ao n.º XXXXXXX enquanto que, quanto aos demais, os arguidos AA e BB organizaram-se com o arguido HH, a quem aqueles pediram, para se apresentar nos locais referidos no quadro seguinte, o que fez, para o efeito lhe fornecendo os necessários elementos, logrando assim obter as diversas quantias transferidas e ilegitimamente captadas da forma descrita, num total de 14.058,36€:

[...]

67. Ao se arrogar, de forma séria e convincente, de uma qualidade que efectivamente não possuía – a de funcionário do serviço técnico competente da empresa habilitado para intervir daquela forma – e criando a aparência de uma realidade de facto fantasiosa – da ocorrência de transferências monetárias fraudulentas via WU –, assim induzindo em erro os referidos trabalhadores, pretendia o arguido AA, em comunhão de esforços e intenções com o arguido BB, com o conhecimento e vontade de ambos, levá-los a executar sucessivas transferências monetárias a favor destes arguidos, nessa medida enriquecendo; actos esses susceptíveis de causar, como causaram, prejuízo patrimonial no valor global de 14.058,36 €, visto não terem dado entrada na disponibilidade da(s) entidade(s) lesada(s) os valores correspondentes.

68. Os arguidos AA e BB mais actuaram em comunhão de esforços e intenções com o arguido HH, bem sabendo e querendo este último conseguir, da forma sobredita, a execução e o valor das transferências monetárias a cujo levantamento procedeu, no total de 12.046,87 €, a favor dos dois primeiros; actos esses susceptíveis de causar nessa medida, como causaram, o correspondente prejuízo patrimonial.

6º)

69. Cerca das 06h05, fuso horário de Alcoa (UTC-5), no estado norte-americano do Tennesse, do dia 22/08/2007, o mesmo AA contactou o estabelecimento comercial designado “I… M…”, com o Account Number da WU XXXXXXX, sito em 1354 North Wright Road, naquela cidade, com o telefone número (xxx) xxx-xxxx.

70. Referindo tratar-se de um técnico da WU, informou a sua interlocutora, a funcionária A… (E…) H…, de que iriam ser executados testes à máquina da aludida instituição financeira ali colocada, uma vez que a mesma não estaria a funcionar bem, o que não correspondia à realidade.

71. Solicitou então o arguido à mesma trabalhadora que se deslocasse ao respectivo terminal a fim executar algumas operações, guiando-a na execução de transferências monetárias, indicando-lhe todos os elementos que deveria introduzir nas diversas etapas que se foram sucedendo naquele processo.

72. Após a realização de cada transferência, e para mais facilmente fazer crer que se tratava de uma intervenção legítima, o arguido desligava afirmando que iria verificar se a máquina já se encontrava operacional, para encetar novo contacto telefónico pouco depois.

73. Sob a alegação séria e convincente de que o terminal não se encontrava em funcionamento adequado, e demonstrando um conhecimento profundo do funcionamento interno do sistema informático usado pela WU, o arguido AA logrou convencer a referida funcionária daquela errónea realidade e, assim, determiná-la a realizar onze transferências monetárias, para o que lhe forneceu todos os elementos necessários a tanto, designadamente o remetente, o destinatário, o valor e o país de destino, solicitando-lhe, no final de cada uma, o respectivo MTCN, o que a mesma forneceu.

74. De posse destes elementos, o arguido AA encetou contacto com o arguido BB a fim de, por si ou socorrendo-se dos arguidos seus familiares, indicados a seguir, e do arguido HH, se organizassem no sentido de qualquer deles se deslocasse a agência WU a operar em Portugal para obterem os valores captados da forma ilícita descrita, o que veio a acontecer efectivamente, tendo os arguidos EE e GG, estes a pedido do arguido BB, bem assim o arguido HH, este a solicitação concertada de BB e AA, procedido aos levantamentos adiante referidos.

75. Para o mesmo efeito, o arguido AA deslocou-se ao balcão do B… de Celorico da Beira, habilitado com os elementos necessários a tanto, sendo-lhe entregue a quantia de 2.037,25€, tudo nos termos seguintes:

[...]

76. Uma outra transferência, a que o sistema atribuiu o MTCN n.º XXXXXXX, foi atempadamente cancelada e não paga.

77. Arrogando-se perante a trabalhadora do “I… M…”, de forma séria e convincente, de uma qualidade que efectivamente não possuía – a de funcionário do serviço técnico competente da empresa habilitado para intervir daquela forma – e criando a aparência de uma realidade de facto fantasiosa – de que o terminal WU ali instalado carecia de intervenção –, assim a enganando, pretendia o arguido AA, em comunhão de esforços e intenções com o arguido BB, com o conhecimento e vontade de ambos, levá-la a executar sucessivas transferências monetárias a favor destes arguidos, nessa medida enriquecendo; actos esses susceptíveis de causar, como causaram, prejuízo patrimonial no valor global de 20.102,99€, visto não terem dado entrada na disponibilidade da(s) entidade(s) lesada(s) os valores correspondentes.

78. Os arguidos AA e BB mais actuaram em comunhão de esforços e intenções com os arguidos EE, GG e HH, bem sabendo e querendo estes últimos conseguir, da forma sobredita, a execução e o valor das transferências monetárias a cujo levantamento procederam, o primeiro (HH) no total de 4.004,81€, a segunda (EE) no total de 8.030,96€, o terceiro (GG) no valor de 6.029,97€, a favor dos quatro primeiros; actos esses susceptíveis de causar nessa medida, como causaram, o correspondente prejuízo patrimonial.

7º)

79. No dia 23 de Agosto de 2007, cerca das 17H27 em Portugal, com o telefone da rede móvel nacional n.º (+351) XXXXXXX, encontrando-se acompanhado do arguido BB, o arguido AA contactou a loja n.º 782 da “S…”, sita em 37601 Highway 26, Sandy, Oregon, EUA (UTC-8), com o telefone n.º XXX-XXX-XXXX.

80. Tendo sido atendido pela contabilista, e também gerente da loja, B… B…, o arguido, de forma séria e convincente, passou logo a dizer-lhe que existia no edifício onde se encontra instalada a loja uma bomba apta a explodir e homens armados que a poderiam matar.

81. De seguida, mantendo a ameaça de que os seus movimentos estavam a ser observados, determinou a referida trabalhadora a iniciar sessão no sistema do terminal WU ali instalado a fim de realizar transferências monetárias com destino a Portugal, para o efeito lhe fornecendo todas as informações necessárias, nomeadamente as referentes ao destinatário – CC – bem como ao montante, num total de 5.636,00 USD.

82. Todavia, alegando dificuldades em aceder ao terminal, a contabilista executou as duas transferências iniciadas, uma no valor de 2.820,00 USD e outra no de 2.816,00 USD, de forma a permitir o cancelamento dos MTCN gerados – XXXXXXXe XXXXXXXXXX, respectivamente – pelo sistema informático.

83. Com efeito, durante o contacto telefónico com o arguido, foi possível estabelecer igualmente contacto com os serviços da WU que passaram a monitorizar a realização das aludidas transferências, impedindo que os valores fossem, de facto, transferidos, conforme quadro seguinte:

[...]

84. Em toda a sua relatada actuação, o arguido AA actuou em comunhão de esforços e intentos com o arguido BB, com o conhecimento e vontade de ambos, pretendendo constranger a referida trabalhadora, fazendo-lhe crer que existia uma ameaça real e efectiva à sua vida e dos demais circunstantes, dessa forma a levando a executar transferências monetárias a favor de ambos, em prejuízo da(s) entidade(s) lesada(s), nos valores referidos, a que não tinham direito, o que só não lograram alcançar devido a circunstâncias independentes da sua vontade.

8º)

85. No dia 24 de Agosto de 2007, cerca das 10H10, hora em Portugal, 22h00 em Lahaina, Havai, EUA, utilizando o cartão telefónico da rede móvel nacional n.º (+351)XXXXXXXXX, o arguido AA estabeleceu contacto telefónico com a “S… M….”, com estabelecimento em 3350 Lower Honoapiilani Road, naquela localidade, com o telefone n.º (XXX)XXX-XXX, agência W... U... n.º XXXXXXXXX, sendo atendido por A… J…B….

86. De imediato o arguido passou a referir àquela funcionária que se encontrava no estabelecimento comercial um engenho explosivo bem como uma pessoa que podia disparar sobre si caso não satisfizesse a pretensão que passaria a transmitir-lhe, de que lhe fosse enviado dinheiro através do sistema de transferências monetárias da WU.

87. A trabalhadora, receosa que, de facto, ocorressem aquelas situações de perigo iminente, iniciou os procedimentos adequados a satisfazer a aludida exigência, integrando na transferência monetária que passou a executar todos os elementos fornecidos pelo arguido, designadamente o valor – 2.800,00 USD – e o beneficiário – HH –, fornecendo ao arguido, a final, por sua exigência, o respectivo MTCN - n.º XXXXXXXXX.

88. Contactados os arguidos BB e HH, o arguido AA com aqueles se organizou a fim de proceder ao levantamento do valor captado da forma descrita, acabando o arguido HH, a pedido concertado dos dois outros e  habilitado com todos os elementos necessários a tanto, por se apresentar no balcão de Mangualde do banco M…B…, onde lhe veio a ser entregue a quantia de 1.978,85€.

89. Foi apenas por crer na seriedade da ameaça que lhe foi dirigida, que o arguido reiterou em várias ocasiões durante o contacto telefónico, que a referida operadora acedeu a efectuar a transferência monetária, conforme quadro seguinte:

[...]

90. Em toda a sua relatada actuação o arguido AA actuou em comunhão de esforços e intentos com o arguido BB, com o conhecimento e vontade de ambos, pretendendo constranger a referida A… B…, fazendo-lhe crer que existia uma ameaça real e efectiva à sua vida e dos demais circunstantes, dessa forma a levando a executar transferência monetária a favor de ambos, em prejuízo da(s) entidade(s) lesada(s), no valor referido, a que não tinham direito.

9º)

91. No mesmo dia 24 de Agosto de 2007, entre as 15H24 e as 16H24 em Portugal, utilizando o telefone da rede móvel nacional n.º (+351) XXXXXXXXX, a partir do nosso país, o mesmo AA estabeleceu sucessivamente contacto telefónico para os n.os (XXX) XXX-XXXX e (XXX) XXX-XXXX, atribuído ao “N… V… B…”, sito na 402 S 71 Highway, em Savannah, Montana, EUA, igualmente agência WU, entabulando conversação com T. U…, assistente de apoio ao cliente.

92. O arguido, de forma séria e de modo a convencer a sua interlocutora, que, entretanto havia colocado a comunicação no sistema conhecido por “alta-voz”, referiu-lhe que se encontrava nas instalações do banco um engenho explosivo, pelo que deveria fazer o que lhe passaria a transmitir, nomeadamente que iniciasse uma sessão no sistema informático a fim de realizar transferências monetárias.

93. O arguido mais lhe ordenou que colocasse dinheiro num saco no exterior.

94. Em seguida, determinou à mesma T…U… que pedisse a outro funcionário que entrasse no sistema informático para realizar as pretendidas transferências, indicando um número de telefone para o efeito de ser contactado.

95. Pouco depois, contactado pela operadora de caixa R… M… M…, a quem o arguido, de forma séria e convincente, reafirmou a existência do engenho explosivo nas instalações do banco, levando-a a crer na veracidade daquela afirmação, a mesma iniciou o procedimento destinado a realizar as transferências monetárias mediante instruções que integralmente lhe foram transmitidas pelo arguido AA, uma no valor de 2.850,00 USD – 2.011,30 euros - e outra de 2.810,00 USD – 1.983,07 euros -, ambas com os mesmos remetente – R… S… - e destinatário – HH -, que lhe solicitou, a final, que lhe indicasse os MTCN respectivos, o que aquela fez, fornecendo-lhe os n.os XXXXXXXXX e XXXXXXXXX.

96. Contactados os arguidos BB e HH, o arguido AA com aqueles se organizou a fim de proceder ao levantamento do valor captado da forma descrita, acabando o arguido HH, a pedido concertado dos dois outros e habilitado com todos os elementos necessários a tanto, por se apresentar no balcão de Mangualde do banco M…B…, onde lhe veio a ser entregue a quantia de 2.011,30€.

97. Com efeito, apenas esta primeira transferência lhe veio a ser paga, tendo a outra transferência no valor de 2.810,00 USD sido rejeitada pelo Office of Foreign Assets Control (Departamento de Controlo de Activos Estrangeiros), conforme quadro seguinte:

[...]

98. Em toda a sua relatada actuação o arguido AA actuou em comunhão de esforços e intentos com o arguido BB, com o conhecimento e vontade de ambos, pretendendo constranger as referidas funcionárias, fazendo-lhes crer que existia uma ameaça real e efectiva às suas vidas e dos demais circunstantes, dessa forma as levando a executar transferências monetárias a favor de ambos, em prejuízo da(s) entidade(s) lesada(s), no valor referido, e a que não tinham direito.

10º)

99. Ainda no mesmo dia 24 de Agosto de 2007, entre as 14h52 e as 15H18 locais, o arguido AA contactou telefonicamente, a partir do nosso país, utilizando o cartão telefónico de uma das redes móveis a operar em Portugal com o n.º +351 XXXXXXXXX, a agência n.º XXX da empresa “S…”, com instalações em 190 John Hunn Brown Road, Dover, Delaware, EUA (UTC-5), com o telefone n.º (.XXX) XXX-XXX, encetando conversação com a representante do serviço de apoio ao cliente M… S….

100. O arguido passou de imediato a dizer que se encontrava uma bomba no estabelecimento, que detonaria se ele não executasse tudo o que lhe passaria a indicar, e ainda que existia uma pessoa a observá-la.

101. Assim, começou por afirmar à aludida funcionária que pretendia que enviasse valores monetários em euros por transferência para Espanha e Portugal através da WU.

102. Receando tratar-se de uma ameaça para a sua vida e de quem ali se encontrasse, a referida M… S…passou a realizar todos os procedimentos destinados a efectuar sucessivamente duas transferências monetárias segundo instruções que o arguido lhe transmitiu, colocando no remetente o nome de R… S… e como beneficiário HH, cada uma no valor de 2.837,50 USD – correspondente a 2.005,35 euros ao câmbio do dia -, num total de 5.650,00 USD – ou 4.010,70 euros -, disponibilizando-lhe, no final de cada uma, a pedido do mesmo, o respectivo MTCN – n.os XXXXXXXXX e XXXXXXXXX.

103. As transferências inseridas no sistema acabaram por não ser integralmente concretizadas porque, durante a sua execução, o gerente da agência, entretanto, logrou entrar em contacto com a WU, que procedeu ao seu cancelamento, dessa forma impedindo que fossem pagas, conforme quadro seguinte:

[...]104. Em toda a sua relatada actuação o arguido AA actuou em comunhão de esforços e intentos com o arguido BB, com o conhecimento e vontade de ambos, pretendendo constranger a referida funcionária, fazendo-lhe crer que existia uma ameaça real e efectiva à sua vida e dos demais circunstantes, dessa forma a levando a executar transferências monetárias a favor de ambos, em prejuízo da(s) entidade(s) lesada(s), nos valores referidos, e a que não tinham direito, o que só não lograram alcançar devido a circunstâncias independentes da sua vontade.

11º)

105. Ainda no dia 24/08/2007, entre as 16h32 e as 16h56, a partir de Portugal, utilizando o cartão telefónico n.º (+351) XXXXXXXXX, o arguido AA contactou telefonicamente a empresa “V…”, com estabelecimento em 940 S. Santa Fe, Vista, Califórnia 92083, EUA (UTC-8), com o telefone n.º (1) XXX-XXX-XXXX, iniciando conversação com o gerente D… T….

106. O arguido referiu-lhe então que deveria seguir as instruções que lhe iria fornecer porque havia uma bomba no estabelecimento e um indivíduo armado também no interior das instalações que vigiava todos os seus movimentos e que o alvejaria caso não cumprisse as suas ordens.

107. De seguida, ordenou-lhe que colocasse dinheiro num saco e o deixasse numa secretária naquela secção.

108. Mais lhe ordenou que realizasse uma transferência monetária via WU, com terminal ali instalado, no valor de 2.850,00 USD – 2.011,30 euros ao câmbio do dia -, para  endereço e destinatário que lhe indicou, após o que solicitou ao aludido gerente o MTCN atribuído – XXXXXXXXX.

109. Durante o contacto telefónico com o gerente David Tollenaar, o arguido forneceu um número de telefone para o qual deviam telefonar imediatamente, sempre sob a ameaça de fazer detonar a bomba ou de o referido atirador disparar contra os funcionários que ali se encontravam, tendo o primeiro entregue a K… K…, a nota onde havia registado tal número.

110. Encetado contacto pela referida K… K…, o arguido ordenou então a esta que realizasse nova transferência monetária para o exterior, no valor de 2.800,00 USD, instruindo-a integralmente sobre os procedimentos a executar, indicando-lhe, para além daquele montante, o nome do destinatário – S… -, e solicitando-lhe a final o MTCN, continuando a anunciar-lhe de que dispararia sobre ela caso a transferência não fosse bem sucedida; conforme quadro seguinte:

[...]

111. Ambas as transferências acabaram por não serem efectivadas porque, por iniciativa dos aludidos funcionários, a WU interveio, impedindo a primeira, sendo a segunda igualmente inviabilizada por a referida funcionária haver colocado o endereço da agência como do remetente, o que sabia ser impeditiva de ser aceite pelo sistema.

112. Os aludidos funcionários só procederam às aludidas operações de transferência monetária porque recearam, de facto, existir no estabelecimento um engenho explosivo e encontrar-se nele alguém que pudesse disparar contra quem ali estivesse, o que motivou até a ordem de evacuar as instalações por parte dos responsáveis da empresa.

113. Em toda a sua relatada actuação o arguido AA actuou em comunhão de esforços e intentos com o arguido BB, com o conhecimento e vontade de ambos, pretendendo constranger os referidos funcionários, fazendo-lhes crer que existia uma ameaça real e efectiva às suas vidas e dos demais circunstantes, dessa forma os levando a executar transferências monetárias a favor de ambos, em prejuízo da(s) entidade(s) lesada(s), nos valores referidos, e a que não tinham direito, o que só não lograram alcançar devido a circunstâncias independentes da sua vontade.

12º)

114. No dia 27 de Agosto de 2007, entre as 11H51 e as 12H10 em Portugal, a partir do nosso país, utilizando o telefone da rede móvel n.º (+351) XXXXXXXXX, o arguido AA contactou telefonicamente a empresa “S…P… & C… A…”, com estabelecimento em Richmond, Virginia, EUA (UCT-5) em 11902 Church Road, com o telefone n.º (1) XXX-XXX-XXX, encetando conversação com M…L… H…, melhor identificada a fls. 5067.

115. Após algumas palavras iniciais, o arguido ordenou-lhe que se deslocasse ao terminal M... G... a funcionar naquele local e realizasse transferências monetárias a seu favor sob pena de, não o fazendo, fazer explodir uma bomba que havia colocado nas instalações.

116. A aludida trabalhadora, crendo no anúncio efectuado e receando que, de facto, pudesse decorrer de uma eventual explosão malefícios para a sua vida e integridade física e contra as instalações da empresa, passou a cumprir aquela exigência, iniciando então os procedimentos destinados a realizar uma transferência monetária sob orientação integral do arguido, que lhe transmitiu todas as instruções necessárias, designadamente o nome do destinatário – HH -, o país de destino – Portugal – e o valor a transferir – 2.800,00 USD. Após, o mesmo arguido solicitou-lhe que lhe indicasse o número de referência gerado pelo sistema – XXXXXXXXX – o que a referida M… H… fez.

117. De seguida, contactados os arguidos BB e HH, o arguido AA organizou-se com aqueles a fim de procederem ao levantamento do valor captado da forma descrita, acabando o arguido HH, a pedido concertado dos dois outros e habilitado com todos os elementos necessários a tanto, por se apresentar para o efeito ao balcão do M… M…, onde lhe veio a ser entregue a quantia de 1.965,20€, conforme quadro seguinte:

[...]

118. Em toda a sua relatada actuação o arguido AA actuou em comunhão de esforços e intentos com o arguido BB, com o conhecimento e vontade de ambos, pretendendo constranger a referida funcionária, fazendo-lhe crer que existia uma ameaça real e efectiva para a sua vida ou integridade física, bem assim danos avultados nas instalações, dessa forma a levando a executar transferências monetárias a favor de ambos, em prejuízo da(s) entidade(s) lesada(s), no valor referido, e a que não tinham direito.

13º)

119. No mesmo dia 27 de Agosto de 2007, entre as 15h16 e as 15h27 em Portugal, utilizando o cartão telefónico da rede móvel a operar no nosso país n.º (+351) XXXXXXXXX, o arguido contactou telefonicamente a agência 908 da empresa "H… S…", sita em 47110 Niles, Buchanan, Minesota, EUA (UTC-6), com o telefone n.º (XXX) XXX-XXXX.

120. Entabulando conversação com a gerente de loja, J… L… H… o arguido, de forma séria e convincente, referiu-lhe que existia uma bomba no estabelecimento e que ali se encontrava também um indivíduo a observar o interior da loja, pelo que devia satisfazer as pretensões que lhe iria transmitir.

121. A gerente de loja transferiu a chamada telefónica ao gerente B… M… A…, a quem o arguido reiterou tais afirmações, de que existia uma bomba no estabelecimento, e de que deveriam fechar as portas, ao mesmo tempo que conseguia levá-lo a crer que observava o que ocorria no interior do estabelecimento.

122. Em seguida, começou por pretender que colocassem dinheiro no interior de um saco, para, depois, passar a exigir que realizassem transferências monetárias com destino a Portugal.

123. De novo em contacto com a aludida J… L… H…, o arguido, mantendo, de forma convincente, a ameaça de fazer deflagrar a bomba que se encontraria no interior e que todos os circunstantes se deveriam manter no local onde se encontravam, continuando a fazer crer que observava o que se passava no interior da loja, exigiu-lhe que realizasse transferências monetárias para Portugal, fornecendo-lhe todas as indicações necessárias a tanto, designadamente a utilização de um cartão de segurança designado bingo card, com o qual a mesma nem sequer sabia operar, logrando que a mesma realizasse as operações sintetizadas no quadro seguinte:

[...]

124. De seguida, contactados os arguidos BB e HH, o arguido AA organizou-se com aqueles a fim de procederem ao levantamento do valor captado da forma descrita, acabando o arguido HH, a pedido concertado dos dois outros e habilitado com todos os elementos necessários a tanto, por se apresentar para o efeito ao balcão dos CTT de Viseu, conseguindo, no entanto, que apenas lhe fosse entregue a quantia em euros de 1.983,44€.

125. A outra transferência executada não foi paga devido a erro de indicação do país de destino por parte da aludida funcionária, que a expediu para o Paraguai.

126. Os funcionários do estabelecimento comercial em causa actuaram da forma descrita apenas por recearem que o arguido desenvolvesse alguma acção contra a vida ou integridade física de quem se encontrasse no interior da loja.

127. Em toda a sua relatada actuação o arguido AA actuou em comunhão de esforços e intentos com o arguido BB, com o conhecimento e vontade de ambos, pretendendo constranger a referida funcionária, fazendo-lhe crer que existia uma ameaça real e efectiva para a sua vida ou integridade física, dessa forma a levando a executar transferências monetárias a favor de ambos, em prejuízo da(s) entidade(s) lesada(s), no valor referido, e a que não tinham direito, só não logrando obter a totalidade dos valores transferidos por circunstâncias independentes da vontade comum.

14º)

128. No dia 28 de Agosto de 2007, cerca das 11H45 em Portugal, 06h45 em Rhode Island, USA (UCT-5), o arguido AA, utilizando o cartão da rede móvel nacional a operar em Portugal n.º (+351) XXXXXXXXX, estabeleceu contacto com a empresa “W…”, sita em 199 Connell Highway, Newport, Rhode Island, EUA, com o telefone da rede fixa americana n.º 1-xxx-xxx-xxx.

129. Atendido pelo sub-gerente D… D…, o arguido AA, por forma a fazer crer da seriedade da ameaça, referiu-lhe que havia colocado uma bomba no interior da loja.

130. Após troca de palavras destinadas a fazer crer da seriedade da ameaça e a estabelecer os termos das exigências que iria dirigir aos funcionários da loja, o arguido forneceu um contacto telefónico para que fosse contactado.

131. O arguido ordenou então que ligassem o terminal M... G... existente na loja a fim de ser processada uma transferência monetária, ao mesmo tempo que afirmava que, caso não recebesse o valor transferido, faria deflagrar o aludido engenho explosivo.

132. Como o referido sub-gerente não tivesse condições para satisfazer tal pretensão, solicitou a um outro funcionário que iniciasse a sessão no sistema de transferências, determinando-o a seguir as instruções que o arguido forneceria.

133. Assim veio a suceder, tendo o referido funcionário processado sucessivamente as três transferências identificadas no quadro seguinte, segundo indicações fornecidas pelo arguido AA:

[...]

134. Obtidos os números de referência referentes às duas primeiras transferências - 51682642 e 49955754 – os arguidos AA, BB e HH contactaram telefonicamente entre si a fim de este último se deslocar a uma agência M... G... em Portugal para recolher os fundos transferidos através daquelas operações, o que veio a acontecer, a pedido concertado daqueles, no balcão de M. do M. onde o mesmo obteve a entrega dos valores referidos no mesmo quadro.

135. Em toda a sua relatada actuação o arguido AA actuou em comunhão de esforços e intentos com o arguido BB, com o conhecimento e vontade de ambos, pretendendo constranger os referidos funcionários, fazendo-lhes crer que existia uma ameaça real e efectiva para as suas vidas ou integridade física, bem como danos avultados nas instalações, dessa forma os levando a executar transferências monetárias a favor de ambos, em prejuízo da(s) entidade(s) lesada(s), no valor referido, e a que não tinham direito, só não logrando obter a totalidade dos valores transferidos por circunstâncias independentes da vontade comum.

15º)

136. Ainda no mesmo dia 28 de Agosto de 2007, o arguido contactou telefonicamente a partir de Portugal a agência n.º 960 do “W…N… B…”, em 1841 W Main (Near Turner), em Salem, Virginia, EUA (UTC-5), com o telefone n.º (1) XXXXXXXXX, tendo sido atendido pela gerente-estagiária S… J….

137. Após o contacto inicial, inteirando-se da qualidade funcional da sua interlocutora, o arguido pretendeu falar com o gerente, pelo que a chamada foi direccionada para o sub-gerente T… B….

138. Identificando-se como “Tom”, o arguido ordenou a este funcionário que colocasse dinheiro num saco sobre o balcão, sob pena de, não o fazendo, fazer explodir uma bomba que se encontrava no edifício onde a agência se encontra instalada.

139. Todavia, nenhum dos funcionários bancários cumpriu tal determinação.

140. Em seguida, o arguido exigiu que o sub-gerente se deslocasse ao terminal da WU a fim de realizar uma transferência bancária com destino a Portugal.

141. Após algumas momentos de discussão com o mesmo sub-gerente, durante a qual renovou o anúncio de que faria detonar a bomba, o referido T…B…, motivado por aquela ameaça, iniciou a pretendida transferência monetária segundo instruções fornecidas pelo arguido, nomeadamente o valor – 2.830,00 USD – o remetente – T… R… –, o beneficiário – HH – e o país de destino – Portugal, solicitando-lhe, a final, o MTCN – XXXXXXXXX -, o que aquele lhe forneceu.

142. Todavia, a fim de permitir uma eventual intervenção visando obstar a que o montante indicado fosse obtido no destino, o sub-gerente T… activou o serviço com deferimento da transferência, designado Next Day Service.

143. O arguido ainda contactou o serviço de atendimento ao cliente da WU, tendo obtido a informação de que o MTCN era inválido, o que motivou ter dirigido ao seu interlocutor, sempre o aludido sub-gerente, nova ameaça, de que tiraria a vida a alguém que se encontrasse na agência caso não fosse intentada nova transferência, que o mesmo funcionário simulou operar, conforme quadro seguinte:

[...]

144. Em toda a sua relatada actuação o arguido AA actuou em comunhão de esforços e intentos com o arguido BB, com o conhecimento e vontade de ambos, pretendendo constranger os referidos funcionários, fazendo-lhes crer que existia uma ameaça real e efectiva para as suas vidas ou integridade física, dessa forma levando o sub-gerente a executar transferências monetárias a favor de ambos, em prejuízo da(s) entidade(s) lesada(s), no valor referido, e a que não tinham direito, só não logrando obter os correspondentes valores por circunstâncias independentes da vontade comum.

16º)

145. Em 28 de Agosto de 2007, entre as 16h58 e as 107h05, hora local, a partir de Portugal, utilizando o cartão telefónico da rede móvel portuguesa com o n.º (+351) XXXXXXXXX, o arguido AA contactou telefonicamente a agência nº 61 da empresa “K…S…”, em 1650 30Th Street, em Boulder, Colorado, EUA (UTC-7), a que estão atribuídos os telefones n.os XXXXXXXXX e XXXXXXXXX.

146. Iniciou o contacto falando com o funcionário do atendimento L… A… H…, a quem, de imediato, passou a dizer que se encontrava colocada uma bomba no estabelecimento, ordenando-lhe que procedesse ao encerramento da loja, mais lhe acrescentando que o estava a observar e ordenando-lhe que não convocasse as autoridades policiais.

147. Como a ligação cessou entretanto, o arguido voltou a entrar em contacto com o mesmo funcionário.

148. Seguidamente, o referido L… H… transferiu a chamada para a sub-gerente da loja Ma… D… D…, a quem o arguido reafirmou tratar-se de uma ameaça de bomba, exigindo-lhe que realizasse transferências monetárias a partir do terminal WU que se encontrava instalado naquele local.

149. Uma vez que a referida sub-gerente não se encontrava perto do local onde o terminal estava instalado, para ali se deslocou, logrando entretanto alertar as autoridades através de outro telefone, e, após iniciar uma sessão no sistema de transferências monetárias da WU com a palavra-passe do referido L… H…, de novo já em contacto com o arguido, este determinou-a a realizar uma transferência monetária para Portugal, no montante de 2.820,00 USD, tendo como beneficiário o arguido HH, exigindo-lhe, a final, que a mesma lhe fornecesse o MTCN gerado pelo sistema – XXXXXXXXX – a fim de verificar junto da prestadora do serviço se a transferência havia sido bem sucedida, o que aquela fez, cessando a comunicação entre ambos.

150. Todavia, o sistema rejeitou a transferência em questão por haver sido excedido o tempo limite para o tipo de operação.

151. Durante o contacto telefónico com a aludida funcionária M… D…, o arguido manteve o anúncio de fazer explodir a bomba que disse encontrar-se no estabelecimento, o que foi determinante para esta processar a aludida operação de transferência monetária, conforme quadro seguinte:

[...]

152. Em toda a sua relatada actuação o arguido AA actuou em comunhão de esforços e intentos com o arguido BB, com o conhecimento e vontade de ambos, pretendendo constranger os referidos funcionários, fazendo-lhes crer que existia uma ameaça real e efectiva para as suas vidas ou integridade física, dessa forma levando a sub-gerente a executar uma transferência monetária a favor de ambos, em prejuízo da(s) entidade(s) lesada(s), no valor referido, e a que não tinham direito, só não logrando obter o correspondente valor por circunstâncias independentes da vontade comum.

17º)

153. Ainda no mesmo dia 28 de Agosto de 2007, cerca das 17h33 locais, o arguido contactou telefonicamente, a partir do nosso país, para o efeito usando o cartão telefónico n.º (+351) XXXXXXXXX, a agência n.º 48 da empresa “D…”, com instalações em 517 E 30Th Street, Hutchinson, Kansas, EUA (UTC-6), e o telefone n.º XXXXXXXXX, sendo atendido pela responsável pelo Serviço ao Cliente J… C….

154. O arguido começou por exigir-lhe que a mesma se mantivesse ao telefone consigo pois aquele telefonema era uma ameaça de bomba, ordenando-lhe que fizesse o que ele lhe passava a transmitir, nomeadamente que encerrasse todas as portas do estabelecimento.

155. A aludida funcionária passou então a chamada telefónica ao sub-gerente M… P… que, entretanto, havia tomado conhecimento do que estava a suceder, a quem o arguido, na sequência de exigências quanto ao comportamento a adoptar pelos circunstantes, passou a exigir que lhe enviasse dinheiro através do sistema WU.

156. Como aquele não estivesse familiarizado com esse tipo de transferências, motivado exclusivamente pelo anúncio do mal dirigido pelo arguido AA, o sub-gerente solicitou à gerente do serviço de atendimento ao cliente, D… R…, que satisfizesse a pretensão do arguido.

157. Assim, esta passou a processar sucessivamente duas transferências monetárias, à semelhança das anteriormente referidas, sob integral orientação do arguido, no valor singular de 2.825,00 USD, num total de 5.650,00 USD, comunicando-lhe, no final, os respectivos MTCN -  com os n.os XXXXXXXXX  e XXXXXXXXX -  conforme suas exigências.

158. Todavia, em ambas as transferências, o tempo para a sua realização foi excedido, pelo que o sistema rejeitou os aludidos códigos.

159. O referido sub-gerente M…P… só ordenou à aludida funcionária D… R… que processasse as transferências monetárias, o que esta fez, por todos eles recearem que, o seu interlocutor pudesse efectivamente atentar contra a sua vida e dos demais circunstantes, fazendo crer que estaria a observar os movimentos de todos, conforme quadro seguinte:

[...]

160. Em toda a sua relatada actuação o arguido AA actuou em comunhão de esforços e intentos com o arguido BB, com o conhecimento e vontade de ambos, pretendendo constranger os referidos funcionários, fazendo-lhes crer que existia uma ameaça real e efectiva para as suas vidas ou integridade física, dessa forma levando-os a executar transferências monetárias a favor de ambos, em prejuízo da(s) entidade(s) lesada(s), nos valores referidos, e a que não tinham direito, só não logrando obter os correspondentes valores por circunstâncias independentes da vontade comum.

18º)

161. No dia seguinte, 29 de Agosto de 2007, cerca das 14H00 em Portugal, utilizando o cartão telefónico da rede móvel portuguesa com o n.º (+351) XXXXXXXXX, encontrando-se acompanhado do arguido BB, o arguido AA contactou telefonicamente a agência n.º 155 do “H… B…S…”, em 843 Central Avenue, Millinocket, Maine, Ohio, EUA (UTC-5), para o telefone n.º (1) XXXXXXXXX, contactando com a Sub-Gerente P… W….

162. De imediato lhe referiu que se encontrava uma bomba na loja e que se alguém dela saísse dispararia.

163. Já em contacto com o gerente da loja, o arguido exigiu que o mesmo mandasse fechar as instalações, reiterando que quem saísse seria alvejado, e, em seguida, que todos os circunstantes colocassem todos os seus haveres e telefone móveis em cima do balcão e que pusesse o conteúdo do cofre num saco.

164. Como o aludido gerente tivesse passado de novo a chamada telefónica para a mesma P… W…, o arguido ordenou à mesma que se deslocasse para um terminal WU a fim de realizar transferências monetárias com destino a Portugal, o que ela fez.

165. Para o efeito, o arguido transmitiu-lhe as instruções necessárias a tanto, indicando-lhe nomeadamente o valor – 2.500,00 USD - e o destinatário – EE - exigindo-lhe, a final, o MTCN gerado pelo sistema – 0893207995.

166. Todavia, o tempo para a realização da referida transferência foi excedido, pelo que o sistema rejeitou a conclusão da mesma.

167. A referida P… W… só realizou as aludidas operações de transferência bancária por recear que, de facto, existisse um engenho explosivo na agência em que se encontrava que poderia ser detonado caso não satisfizesse as exigências que lhe foram dirigidas pelo arguido, conforme quadro seguinte:

[...]

168. Em toda a sua relatada actuação o arguido AA actuou em comunhão de esforços e intentos com o arguido BB, com o conhecimento e vontade de ambos, pretendendo constranger os referidos funcionários, fazendo-lhes crer que existia uma ameaça real e efectiva para as suas vidas ou integridade física, dessa forma levando-os a executar transferência monetária a favor de ambos, em prejuízo da(s) entidade(s) lesada(s), no valor referido, e a que não tinham direito, só não o logrando obter por circunstâncias independentes da vontade comum.

19º)

169. No dia 31 de Agosto de 2007, cerca das 06h00, fuso horário de Ohio (UCT-5), 11h02 locais, a partir de Portugal e usando um telefone da rede nacional com o n.º (+351) XXXXXXX, o arguido AA contactou a agência n.º 196 da “Giant Eagle”, em 7960 Plaza Boulevard, em Mentor, naquela cidade dos EUA, para o telefone n.º (1) XXXXXXX.

170. Logo após entrar em contacto com a assistente da caixa T… S…, o mesmo referiu a esta que se encontrava uma bomba no estabelecimento, dizendo-lhe que queria dinheiro.

171. Seguidamente, ordenou-lhe que chamasse o gerente e que fechasse todas as portas da agência e levasse todos os circunstantes para a entrada, permanecendo junto à janela, e ainda que solicitasse ao gerente da agência que colocasse dinheiro num saco que deveria ser posto à frente da loja, do lado de fora, para que fosse recolhido, pois que se encontrava junto à agência, razão por que, se algo corresse mal, pagariam por isso, querendo com isso dizer que lhes dirigiria represálias.

172. Logo após, referiu à mesma funcionária que pretendia que esta realizasse uma transferência monetária de 3.000,00 USD pela WU.

173. Como a referida T… S… opusesse que não operavam com tal sistema de transferências, o arguido, irado, insistiu que deveria fazê-lo, sob pena de fazer detonar a bomba alegadamente ali colocada, tendo-lhe então aquela indicado que o poderia fazer via M... G..., instruindo-o de que necessitaria contactar esta última.

174. Como a dita funcionária receasse que, de facto, existia uma bomba na agência que, em caso de ser detonada, a poderia atingir e a quem se encontrasse nas imediações, iniciou os procedimentos necessários a realizar a pretendida transferência monetária, recebendo do arguido todas as indicações necessárias, designadamente o remetente – R… L… –, o destinatário – HH -, o valor – 2.999,00 USD - e o país de destino – Portugal -, após o que lhe forneceu o número de referência – XXXXXXX, desligando em seguida.

175. De seguida, contactados os arguidos BB e HH, o arguido AA organizou-se com aqueles a fim de procederem ao levantamento do valor captado da forma descrita, acabando o arguido HH, a pedido concertado daqueles outros e habilitado com todos os elementos necessários a tanto, por se apresentar para o efeito ao balcão dos Mo… G…V.., conseguindo que lhe fosse entregue a quantia em euros de 2.100,00€, conforme quadro seguinte:

[...]

176. Em toda a sua relatada actuação o arguido AA actuou em comunhão de esforços e intentos com o arguido BB, com o conhecimento e vontade de ambos, pretendendo constranger os referidos funcionários, fazendo-lhes crer que existia uma ameaça real e efectiva para as suas vidas ou integridade física, dessa forma os levando a executar transferência monetária a favor de ambos, em prejuízo da(s) entidade(s) lesada(s), no valor referido, e a que não tinham direito.

20º)

177. Ainda no mesmo dia 31 de Agosto de 2007, entre as 09h00 e as 10h00, 14h00 locais, do mesmo modo, a partir de Portugal, usando um cartão telefónico de uma rede móvel nacional com o n.º (+351) XXXXXXX, o arguido AA contactou telefonicamente a agência n.º 9055 do “U. ..”, em 10590 Madeira Road, Loveland, Ohio, EUA, para o telefone n.º (1) XXXXXXX, sendo atendido pela gerente K… H….

178. De imediato lhe referiu que aquele telefonema era uma ameaça de bomba e que deveria fazer o que passava a transmitir-lhe.

179. Após lhe referir que tinha condições de visionar toda a agência, que todos os que ali se encontrassem deviam deitar-se no chão e que alguém deveria fechar a porta, passou a exigir que colocassem dinheiro num saco à porta da agência, o que veio a ser satisfeito.

180. Seguidamente, o arguido determinou à mesma funcionária que realizasse uma operação de transferência de dinheiro, passando a fornecer-lhe todos os elementos a tanto necessários, nomeadamente o remetente – L…N… -, o destinatário – HH –, o pais de destino – Portugal - e o valor – 2.500,00 USD. No final, aquela funcionária forneceu ao arguido, a seu pedido, o número de referência – XXXXXXX.

181. De seguida, contactados os arguidos BB e HH, o arguido AA organizou-se com aqueles a fim de procederem ao levantamento do valor captado da forma descrita, acabando o arguido HH, a pedido concertado daqueles e habilitado com todos os elementos necessários a tanto, por se apresentar para o efeito ao balcão dos M… G… de V…, conseguindo que lhe fosse entregue a quantia em euros de 1.760,43€, conforme quadro seguinte:

[...]

182. Em toda a sua relatada actuação o arguido AA actuou em comunhão de esforços e intentos com o arguido BB, com o conhecimento e vontade de ambos, pretendendo constranger a referida funcionária, fazendo-lhe crer que existia uma ameaça real e efectiva para a sua vida ou integridade física, bem como apta a produzir elevados danos materiais, dessa forma a levando a executar transferência monetária a favor de ambos, em prejuízo da(s) entidade(s) lesada(s), no valor referido, e a que não tinham direito.

21º)

183. Ainda no mesmo dia 31 de Agosto de 2007, cerca das 17h35, hora local, e do mesmo modo, a partir de Portugal, utilizando o mesmo cartão telefónico n.º (+351) XXXXXXX da rede móvel nacional, o arguido AA contactou telefonicamente a agência n.º 2341 da “W…D…”, em 2701 Woodland Boulevard, FLorida, EUA (UTC-5), para o telefone n.º (386) XXXXXXX, Account Number XXXXXXX, sendo atendido pela gerente P… W….

184. De imediato o arguido passou a referir-lhe que se encontrava uma bomba no estabelecimento, pelo que deveria mandar fechar todas as portas, não devendo permitir a entrada e saída de ninguém pois que dispararia contra quem saísse.

185. Após, exigiu-lhe que colocasse dinheiro num saco e o deixasse em local determinado, e, em seguida, ordenou-lhe que se dirigisse ao terminal da WU a fim de lhe enviar dinheiro.

186. Tudo sempre sob a ameaça de, não sendo as suas exigências satisfeitas, mandar detonar a alegada bomba, o que foi determinante para a aludida funcionária aceder operar a pretendida transferência.

187. Seguidamente, já com a referida gerente com sessão iniciada no sistema de transferências monetárias da WU ali instalado, passou então a mesma a efectuar sucessivamente duas operações ambas sob integral orientação do arguido, que lhe forneceu todos os elementos necessários, nomeadamente o remetente – P… N… e R.. N… -, o destinatário – HH em ambas –, o país de destino – Portugal - e o valor – 2.850,00 USD e 2.810,00 USD. No final, por exigência do arguido, a funcionária forneceu-lhe o MTCN respeitante a cada uma – XXXXXXX e XXXXXXX, respectivamente.

188. De seguida, contactados os arguidos BB e HH, o arguido AA organizou-se com aqueles a fim de procederem ao levantamento do valor captado da forma descrita, acabando o arguido HH, a pedido concertado daqueles e habilitado com todos os elementos necessários a tanto, por se apresentar para o efeito no balcão dos CTT de Viseu, logrando que lhe fosse entregue a quantia total de 3.972,66 euros, conforme quadro seguinte:

[...]

189. A referida P… W… só procedeu às aludidas transferências bancárias por recear que, de facto, existisse um engenho explosivo na agência em que se encontrava que poderia ser detonado caso não satisfizesse as exigências que lhe foram dirigidas pelo arguido.

190. Em toda a sua relatada actuação o arguido AA actuou em comunhão de esforços e intentos com o arguido BB, com o conhecimento e vontade de ambos, pretendendo constranger a referida funcionária, fazendo-lhe crer que existia uma ameaça real e efectiva para a sua vida ou integridade física, bem como apta a produzir elevados danos materiais, dessa forma a levando a executar transferências monetárias a favor de ambos, em prejuízo da(s) entidade(s) lesada(s), no valor referido, e a que não tinham direito.

22º)

191. No dia 17 de Setembro de 2007, cerca das 10H30 em Portugal, o arguido AA contactou uma loja de conveniência designada “B… B…” n.º 55, situada em 850 W Jackson Street, Jacksonville, no Tenesse, EUA com o Account Number XXXXXXX, com o telefone n.º XXXXXXX, entabulando conversa com o funcionário J… S… S…, cerca das 05h30 fuso horário de Jacksonville (UTC-5).

192. O arguido referiu-lhe então existir uma bomba colocada no estabelecimento e um atirador furtivo – sniper – perto das instalações, de nome “Tom”, e que deveria fazer o que lhe passava a ordenar.

193. Assim, determinou-lhe que se dirigisse ao terminal WU e que passasse a processar uma transferência monetária sob suas indicações, o que aquele fez. O arguido indicou-lhe, designadamente, o nome do destinatário – HH -, o valor transferido – 2.800,00 USD, solicitando-lhe no final que lhe indicasse o MTCN atribuído, n.º XXXXXXX.

194. De seguida, contactados os arguidos BB e HH, o arguido AA organizou-se com aqueles a fim de procederem ao levantamento do valor captado da forma descrita, acabando o arguido HH, a pedido concertado daqueles e habilitado com todos os elementos necessários a tanto, por se apresentar para o efeito no balcão dos CTT de Viseu, logrando que lhe fosse entregue a quantia total de 1.936,95€, conforme quadro seguinte:

[...]

195. O referido J…S… só realizou a transferência monetária porque de facto receou pela sua via, assumindo a seriedade da ameaça feita pelo arguido, de tal forma que veio a demitir-se na sequência deste episódio, dado ser veterano da guerra, o que o fez reviver o trauma decorrente dessa condição.

196. Em toda a sua relatada actuação o arguido AA actuou em comunhão de esforços e intentos com o arguido BB, com o conhecimento e vontade de ambos, pretendendo constranger o referido funcionário, fazendo-lhe crer que existia uma ameaça real e efectiva para a sua vida ou integridade física, dessa forma o levando a executar transferência monetária a favor de ambos, em prejuízo da(s) entidade(s) lesada(s), no valor referido, e a que não tinham direito.

23º)

197. No dia 18 de Setembro de 2007, a hora indeterminada, o arguido contactou telefonicamente, a partir de Portugal, o “W… N… B…” n.º 0823, com estabelecimento em 5070 Fayetteville Road, Lumberton, Carolina do Norte, EUA (UTC-5), tendo conversado com o gerente daquela agência, B… B… J….

198. O arguido passou então a referir-lhe que se encontrava no interior do estabelecimento um atirador, mas que se fizesse o que lhe iria ordenar, ninguém sairia ferido.

199. Seguidamente, determinou-lhe que se dirigisse a um terminal da WU, o que aquele fez, que a agência fosse encerrada e que todos os funcionários se sentassem no chão.

200. No entanto, durante o trajecto para o terminal, o referido B… B… conseguiu accionar o alarme.

201. Uma vez no terminal, o gerente iniciou o procedimento destinado a executar uma transferência monetária sob orientação do arguido, que lhe forneceu todas as instruções necessárias, nomeadamente o valor - 2.900,00 USD - e o beneficiário – HH, solicitando-lhe a final o MTCN atribuído pelo sistema – XXXXXXX -, o que aquele funcionário bancário lhe forneceu.

202. Após, ordenou-lhe que mandasse evacuar o edifício porque a bomba iria explodir, cessando pouco depois a comunicação.

203. A aludida transferência bancária acabou por não ser realizada porque os serviços da WU, alertados, lograram cancelá-la; tudo nos termos do quadro seguinte:

[...]

24º)

205. Nos dias 20/11/2007 e 21/11/2007, em circunstâncias temporais que não foi possível determinar, a partir de Portugal, o arguido AA contactou a empresa “S. S.”, agência da WU com o Account Number XXXXXXX, com estabelecimento em Cromwell Road, 158a, Kensington, Londres, Reino Unido, com o telefone número XXXXXXX, sendo atendido por E… J…, ali trabalhadora.

206. Mantendo o procedimento anteriormente descrito, de se identificar como pertencendo ao departamento técnico da WU, o mesmo referiu à aludida trabalhadora que o terminal instalado na agência, utilizado para processamento de transferências monetárias, apresentava anomalias, o que, como nas situações anteriormente descritas, correspondia a uma forma de enganar a sua interlocutora, afirmando ser necessário à sua reposição em adequado funcionamento a realização de transacções de teste, para o que lhe forneceria os necessários elementos.

207. À anuência da aludida trabalhadora, enganada pela forma como o arguido se apresentou e os conhecimentos manifestados quanto ao funcionamento interno do sistema de transferências, passou o arguido a transmitir-lhe todos os procedimentos e elementos necessários à realização das pretendidas transferências monetárias, designadamente o valor e os nomes dos remetente e destinatário, solicitando-lhe, no final, o respectivo MTCN.

208. Sempre mantendo que o computador funcionava deficientemente de forma séria e convincente, logo após a realização de cada transferência, o arguido AA tornava a telefonar, solicitando a realização de nova transferência, alegadamente, de teste.

209. Nos dois dias em que contactou a aludida agência, a referida E… J… efectuou, em condições em tudo semelhantes, um total de 11 transferências mediante indicações fornecidas integralmente pelo arguido AA, fornecendo-se, após cada uma, o MTCN correspondente.

210. Apenas uma delas, no valor de 1.665,05 libras, tendo como destinatário o arguido DD, veio a ser impedida.

211. Os montantes inscritos nas aludidas transferências vieram a ser pagos em Portugal, num total 24.900€ (vinte e quatro mim e novecentos euros), sendo as destinadas à arguida CC pagas por levantamentos nos CTT de Viseu e depósitos na conta da mesma do M…B…, a pedido do arguido BB, enquanto outra, destinada a este lhe foi paga ao balcão dos CTT de Viseu, tudo nos termos seguintes:

[...]

212. A aludida trabalhadora só acedeu a realizar as aludidas transferências monetárias porque acreditou que, de facto, o computador onde processava as transferências WU poderia estar afectado de alguma anomalia, face ao comportamento convincente do arguido AA.

213. Ao se arrogar, de forma séria e convincente, de uma qualidade que efectivamente não possuía – a de funcionário do serviço técnico competente da empresa habilitado para intervir daquela forma – e criando a aparência de uma realidade de facto inexistente – a de que o computador existente na aludida agência apresentava problemas de funcionamento –, assim induzindo em erro aquela trabalhadora, pretendia o arguido AA, em comunhão de esforços e intenções com o arguido BB, com o conhecimento e vontade de ambos, levá-la a executar sucessivas transferências monetárias a favor destes arguidos, nessa medida enriquecendo; actos esses susceptíveis de causar, como causaram, prejuízo patrimonial no valor global de 22.900€, visto não terem dado entrada na disponibilidade da(s) entidade(s) lesada(s) os valores correspondentes.

214. Os arguidos AA e BB mais actuaram em comunhão de esforços e intenções com a arguida CC, bem sabendo e querendo esta última conseguir, da forma sobredita, a execução e o valor das transferências monetárias a cujo levantamento e crédito em conta procederam, esta no total de 20.900€, a favor de todos eles, actos esses susceptíveis de causar nessa medida, como causaram, o correspondente prejuízo patrimonial.

25º)

215. No dia 30/11/2007, em circunstâncias temporais que não foi possível determinar com rigor, a partir de Portugal, o arguido AA contactou o “G.. B…”, que funciona como agência WU com o Account Number XXXXXXXX, com estabelecimento em Jan Evertsenstraat 125-127A, Amesterdão, Holanda, com o telefone número XXXXXXXX, estabelecendo contacto com C… Y...

216. Começando por se identificar como Tom do designado helpdesk -  ou suporte técnico - da WU, o arguido solicitou a C… Y…, face a anomalias no sistema informático, que procedesse à realização de uma transferência monetária que depois cancelariam; cancelamento que o arguido não tinha intenção de permitir.

217. Anuindo a tal, face aos conhecimentos transmitidos pelo arguido sobre o funcionamento do sistema de transferências da WU, passou o arguido a transmitir a C… Y… os necessários elementos à sobredita transferência.

218. Mantendo a encenação descrita, o arguido AA conseguiu que C… Y… processasse sucessivamente 5 transferências monetárias com destino a Portugal tendo como remetente W… L… e destinatário a arguida FF, solicitando-lhe, a final, que lhe fornecesse os respectivos MTCN.

219. De posse destes números, o arguido AA solicitou ao arguido BB que os transmitisse a quem estivesse em condições de se apresentar a recolher os montantes transferidos, vindo este a pedir à arguida FF para proceder, como o fez, à recolha de um deles na agência “C…” no Porto, facultando a mesma, a pedido de seu pai, o crédito dos restantes valores em conta de que é titular no M…B… através do serviço de homebanking disponível no sítio do banco (www.m.....pt), num total 12.655,00€ (doze mil seiscentos e cinquenta e cinco euros), nos termos seguintes:

[...]

220. A referida trabalhadora só acedeu a realizar as aludidas transferências monetárias porque acreditou que, de facto, o seu interlocutor fosse pessoa habilitada pela WU a fornecer-lhe adequado suporte técnico para ultrapassar as dificuldades experimentadas no acesso ao sistema informático, em que se incluía a realização de transferências monetárias que seriam canceladas.

221. Ao se arrogar, de forma séria e convincente, de uma qualidade que efectivamente não possuía – a de funcionário do serviço técnico competente da empresa habilitado para intervir daquela forma –, assim induzindo em erro a referida trabalhadora, e aproveitando as dificuldades de acesso ao sistema informático por parte dela, pretendia o arguido AA, em comunhão de esforços e intenções com os arguidos BB e FF, com o conhecimento e vontade de todos, levar C.. Y… a executar sucessivas transferências monetárias a favor de todos eles, nessa medida enriquecendo; actos esses susceptíveis de causar, como causaram, prejuízo patrimonial no valor global de 12.655,00€, visto não terem dado entrada na disponibilidade da(s) entidade(s) lesada(s) os valores correspondentes.

26º)

222. No dia 7/12/2007, em circunstâncias que não foi possível determinar, a partir de Portugal, o arguido AA contactou a “L.. B..”, com estabelecimento em Chessington South Station, Chessington, Reino Unido, com o telefone número XXXXXXXX, agência WU com o Account Number XXXXXXXX através de sistema de linha telefónica, sendo atendido pelo seu proprietário S… J… P….

223. Identificando-se como funcionário da WU, o arguido referiu aquele que iria aumentar a velocidade da linha, para o efeito necessitando que digitasse no teclado do telefone uma combinação de números, o que o mesmo fez, desligando em seguida.

224. Através daquele processo, conseguiu o arguido a realização de 3 transferências monetárias, a seguir indicadas, na total ignorância do referido proprietário da “L.. B..”.

225.Os montantes inscritos nas operações destinadas às arguidas CC e FF foram pagos por depósito nas contas pelas mesmas tituladas no M…B..,  as quais facultaram para o efeito, através do serviço de homebanking disponível no sítio do banco na internet, sendo uma terceira paga ao balcão dos CTT de Mangualde à arguida EE a quem foi pedido para se deslocar aquela agência para o efeito, habilitando-a com a necessária informação, tudo nos termos seguintes:

[...]

226. O proprietário da “L… B…” só acedeu a realizar a aludida operação porque acreditou que, de facto, o seu interlocutor, o arguido AA, seria funcionário da WU habilitado a transmitir-lhe as aludidas instruções.

227. Ao se insinuar, de forma séria e convincente, perante o proprietário da “L… B…”, como pessoa legitimada pela WU a intervir, o que não correspondia à realidade, pretendia o arguido AA, levá-lo a permitir a realização de sucessivas transferências monetárias a seu favor, nessa medida enriquecendo; actos esses susceptíveis de causar, como causaram, prejuízo patrimonial no valor global de 5.858,53€, visto não terem dado entrada na disponibilidade da(s) entidade(s) lesada(s) os valores correspondentes.

228. O arguido AA mais actuou em comunhão de esforços e intenções com as arguidas EE, FF e CC, bem sabendo e querendo estas últimas conseguir, da forma sobredita, a execução e o valor das transferências monetárias a cujo levantamento e crédito em conta procederam, a primeira no total de 2.500,00€, a segunda no total de 2.000,00€, e a terceira no valor de 1.358,53€, a favor de todos eles; actos esses susceptíveis de causar nessa medida, como causaram, o correspondente prejuízo patrimonial.

27º)

229. No dia 19/12/2007, em circunstâncias que não foi possível determinar, a partir de Portugal, o arguido AA contactou a empresa “M…E…”, agência WU com o Account Number XXXXXXXX, com estabelecimento em Banegaardscentret, 8000 Aarhus, Dinamarca, com o telefone número XXXXXXXX, sendo atendido por R… R….

230. Mantendo o procedimento anteriormente descrito, de se identificar como pertencendo ao departamento técnico da WU, o mesmo referiu ao aludido funcionário que se verificavam anomalias no sistema informático, o que, como nas situações anteriormente descritas, correspondia a uma forma de enganar o seu interlocutor, pelo que iria fornecer-lhe indicações para o colocar em estado de regular funcionamento, necessitando para tanto que efectuasse algumas transferências monetárias para Portugal.

231. De imediato passou a transmitir àquele trabalhador todos os procedimentos e elementos necessários à realização das pretendidas transferências monetárias, designadamente o beneficiário – CC – e o valor.

232. Reiterando de forma séria e convincente que o computador funcionava deficientemente, o referido Rasour Rasoun efectuou sucessivamente 7 transferências monetárias mediante indicações fornecidas integralmente pelo arguido AA, obtendo daquele, após cada transferência, o MTCN correspondente.

233. Os montantes inscritos nas aludidas transferências vieram a ser pagos por depósito na conta titulada pela arguida CC com o n.º XXXXXXXX, num total 8.350,00€, a qual acordou previamente na disponibilização da conta para o efeito, nos termos seguintes:

[...]

234. O referido trabalhador só acedeu a realizar as aludidas transferências monetárias porque acreditou que, de facto, o computador poderia estar afectado de alguma anomalia, em função do comportamento adoptado pelo arguido AA e os conhecimentos por ele demonstrados relativos ao funcionamento do sistema informático utilizado pela WU.

235. Ao se arrogar, de forma séria e convincente, de uma qualidade que efectivamente não possuía – a de funcionário do serviço técnico competente da empresa habilitado para intervir daquela forma – e criando a aparência de uma realidade de facto inexistente – a de que o computador existente na aludida agência apresentava anomalias no sistema de transferências monetárias –, assim induzindo em erro o referido trabalhador, pretendia o arguido AA, em comunhão de esforços e intenções com a arguida CC, com o conhecimento e vontade de ambos, levar aquele funcionário a executar sucessivas transferências monetárias a favor de ambos, nessa medida enriquecendo; actos esses susceptíveis de causar, como causaram, prejuízo patrimonial no valor global de 8.350,00€, visto não terem dado entrada na disponibilidade da(s) entidade(s) lesada(s) os valores correspondentes.

Do Branqueamento de capitais

236. Com referência aos anos 2005 e 2006, os arguidos AA e BB, declararam os seguintes rendimentos para efeitos de tributação:

[...]

237. Os arguidos apresentaram as seguintes declarações de rendimentos (Apenso A, vol. I, II e III):

[...]

1“A.. P.. & S…, Lda”

2 “I…G…, Lda”

3 “G… S…, Lda”

4 Total de 19.010,12€, sendo 12.456,15€ de trabalho dependente e 6.553,97€ de trabalho independente.

5 FF iniciou actividade apenas em 12/03/2008.

6 “G…, Lda”.

238. Com o objectivo de obstar a que se estabelecesse relação entre os valores captados ilicitamente da forma descrita e as sobreditas condutas praticadas pelos arguidos destinadas a alcançá-los, e bem assim de relacionar a conduta essencial do arguido AA com os proveitos dela decorrentes, os arguidos acordaram em levar a cabo diversos processos destinados a introduzir o produto das acções ilícitas no mercado financeiro e económico legítimo.

239. Assim, os valores provenientes destes actos, ao invés de ingressarem integral e directamente na esfera patrimonial dos arguidos AA e BB, seus principais autores, foram antes dispersos por diversas contas bancárias por eles tituladas e ainda por FF, CC, EE e marido GG, bem como por outras constituídas pelas empresas em que estes últimos têm interesses, a saber, a “I... G..., Lda”, a “G... S..., Lda”, a “G..., Lda” e a “A... P... & S..., Lda”, todas empresas onde o arguido BB detém poderes de gestão.

240. A fim de evitar que o B.. e B…, instituições bancárias onde titulava diversas contas, procedessem à comunicação legal consubstanciada na suspeita da proveniência de valores movimentados a crédito, na sequência da entrega dos valores provenientes dos actos ilícitos descritos, o arguido AA passou a realizar depósitos em numerário de pequeno valor monetário, alguns em dias sucessivos, bem como a proceder a transferências entre contas no mesmo banco também de semelhante valor.

241. Assim, só no período que mediou entre 17/08/2007 e 31/12/2007, a conta por si titulada no B.. com o NIB XXXXXXXXXXX apresenta 19.450.00 euros de movimentos a crédito resultantes de depósitos em numerário:

[...]

242. E a conta à ordem com o NIB XXXXXX no B…, para o período entre 01/08/2007 a 31/12/2007 regista um valor total de 39.455,00€ de depósitos em numerário:

[...]

243. No período que mediou entre 22/06/2007 e 30/06/2008, as contas por si tituladas no Banif (n.º XXXXXX), B.. (NIB XXXXXX), BXX (n.º XXXXXX), C… (n.º XXXXXX), M… (n. XXXXXX) e BZ(n.º XXXXXX) apresentam os seguintes movimentos a crédito resultantes de depósitos em numerário:

[...]

244. Igualmente com semelhante propósito, o arguido AA constituiu 5 contas a prazo no B… onde realizou transferências de valores entre elas e outra no mesmo banco sem motivo justificativo, no próprio dia ou em dias consecutivos ou próximos.

245. Assim, só no mês de Novembro de 2007, o arguido ordenou, só, as seguintes operações:

[...]

246. O pai do arguido AA, D.. S.., reside actualmente na Indonésia.

247. Por diversas vezes o primeiro, por si ou através da então sua companheira, J…S… L…, a seu pedido, enviou ao segundo, a partir de Portugal com destino àquele país asiático, pequenas quantias monetárias através do serviço WU provenientes dos factos ilícitos descritos, pelo menos, as sintetizadas no quadro seguinte:

[...]

248. Deste modo, o arguido AA, por si e socorrendo-se do auxílio da sua companheira, efectuou alguns envios e transferências de pequenas quantias de cada vez para, dessa forma, obviar a que estas fossem detectadas, assim introduzindo no sistema monetário legítimo o dinheiro proveniente dos sobreditos factos ilícitos por si praticados com os demais arguidos.

249. Ainda com o mesmo propósito, de obviar ao estabelecimento de qualquer relação entre o arguido AA e os proventos utilizados para fazer face a encargos assumidos, até por que o mesmo se apresentava como trabalhador não qualificado integrado nas empresas da família com escasso rendimento proveniente de uma actividade profissional desenvolvida designadamente nas suas empresas, o arguido BB, a pedido do primeiro, interveio na celebração com “V… – I… SA” de um contrato de arrendamento de uma fracção sita no F… V…, Torre XX, n.º XX, Xº Esq., cuja cópia se encontra a fls.4163-8, pelo valor da renda mensal de 500€, contrato esse que vigorou entre 7 de Junho de 2007 e 30 de Setembro de 2007.

250. No início de vigência do citado arrendamento foi entregue a quantia de 3.000,00€ correspondente a 2.000,00€ a título de caução e 1.000,00€ de rendas, mediante cheque (fls.4170) assinado pelo seu tio, o arguido BB, sacado sobre conta de A…G…, mulher deste.

251. Em Setembro de 2007, por vontade do arguido AA passar a dispor de condições de habitação ainda melhores, foi celebrado novo contrato de arrendamento, cuja cópia se encontra a fls.4173-6, para uma fracção sita na U… Q… do B…, lote XX, Xº Direito, em V…, correspondente à tipologia T3, nos termos do qual a renda mensal passaria a ser de 900,00€, com inicio de vigência a partir de 1.10.2007.

252. Os valores correspondentes à caução (1.800,00€) e às rendas de Outubro de 2007 a Março de 2008 foram pagos mediante cheques assinados pelo arguido BB sobre contas tituladas pelas suas filhas, as arguidas FF (cópias de cheques de fls.3912 e 3915), e EE (cópia de cheque de fls.3910).

253. Foi o arguido AA quem residiu em ambas as aludidas fracções apenas com Josilene Souza com quem habitava em condições análogas às dos cônjuges.

254. Em data não apurada o arguido AA encetou negociações com a mesma empresa visando a aquisição de uma fracção autónoma tipo T4 Duplex, situada no mesmo local, lote XX, fracção “F”, pelo preço de 325.000,00€, acabando em 12/05/2008 por ser celebrado contrato-promessa de compra e venda no qual figurou como promitente-comprador o seu tio BB, conforme cópia de fls.3905-8, embora jamais tivesse sido assinado por este último.

255. O arguido BB constituiu as seguintes sociedades:

Em 01/01/1983, a “I… G… – D… e T…, Lda”, com sede em T… de T…, V… de T…, que tem por objecto social demolições e terraplanagens;

Em 15/05/2007, a “G... S... – M… de S… Lda”, com sede na E.N. 16, C.. de T.., M…, que se dedica a actividades auxiliares de seguros e fundos de pensões;

A 29/06/2007, a “G... – Co… C…, Lda”, com sede na E.N. 16, C.. de T…, M…, para extracção de granitos ornamental e rochas similares;

256. Para além disso é gerente da “A... P... & S... – S… de P… e O…, Lda”, também com sede em C… de T…, M…, de que são sócios os arguidos EE e GG, constituindo a sede desta a sede social das duas anteriores empresas.

257. Estas empresas apresentaram os seguintes resultados:

[...]

1 G... S... não entregou declarações de rendimentos, o que se justifica face à data de início de actividade 10.10.2007.

2 G... não entregou declarações de rendimentos, o que se justifica face à data de início de actividade 10.10.2007.

258. Em concertação com o arguido AA, o arguido BB passou a usar as contas bancárias tituladas por si, pelos seus filhos e por estas empresas para diluir, com outros rendimentos provenientes da sua actividade comercial lícita, os valores ilicitamente captados da forma anteriormente referida, introduzindo-os no mercado bancário legítimo, ora servindo para, entre outros fins, fazer face às obrigações decorrentes da actividade normal das mesmas, confundindo-se com os proveitos dela emergentes, ora através de transferências bancárias, dessa forma iludindo acerca da sua origem, estas sintetizadas no seguinte quadro:

[...]

259. A “I... G..., Lda” é titular de, pelo menos, duas contas bancárias, uma no M… e outra no BXX, identificadas com os NIB XXXXXX e XXXXXX, respectivamente, as quais apresentam os seguintes movimentos a crédito:

[...]

260. O arguido BB titula diversas contas, entre as quais uma no M…, identificada pelo NIB XXXXXX, e outra no BXX, com o NIB XXXXXX, esta juntamente com a sua mulher, que igualmente utilizou para nela disseminar os valores obtidos ilicitamente, determinando movimentos quer para outras contas tituladas pelas sociedades que controla quer para outros arguidos.

261. No período entre 01/07/2007 a 30/06/2008, as aludidas contas apresentam os seguintes movimentos a crédito, em numerário e valores:

[...]

262. Os valores indicados, sendo incompatíveis com os rendimentos declarados fiscalmente, resultam da actividade ilícita descrita, tendo sido assim introduzidos no mercado financeiro e monetário legítimo.

263. Por outro lado, esta conta no BXX, no período entre 01/08/2007 e 31/12/2007, regista transferências das contas tituladas por suas filhas, as arguidas CC e FF, no montante global de 6.000€, valores estes igualmente provenientes dos actos ilícitos descritos.

264. A arguida EE é titular da conta à ordem no BXXX identificada pelo NIB XXXXXX, e outra da mesma natureza no M…, com o NIB XXXXXX.

265. Por seu turno, o seu marido, o arguido GG, titula uma conta no mesmo banco BXX, com o NIB XXXXXX, e outra na C… identificada pelo NIB XXXXXX.

266. O casal fez movimentar nessas contas os seguintes valores no período entre 01/01/2007 e 30/06/2008:

[...]

267. Os valores indicados, sendo incompatíveis com os rendimentos declarados fiscalmente, resultam da actividade ilícita descrita, tendo, não obstante, sido facilmente introduzidos desta forma no tráfego legítimo.

268. A “A... P... & S..., Lda” constituiu no BXX uma conta à ordem (NIB XXXXXX) e outra na C…(NIB XXXXXX).

269. No período entre 01/08/2007 a 31/12/2008, a primeira regista o recebimento de diversas transferências bancárias:

- no valor total de 6.038,00€, provenientes da conta bancária titulada pela arguida EE no mesmo banco;

- no valor total de 20.000,00€, provenientes da conta bancária da empresa “I... G..., Lda, ” no mesmo banco.

270. As aludidas contas bancárias registam ainda os seguintes depósitos:

[...]

271. Bem como levantamentos, em 2007, num valor total de 73.101,09€.

272. Parte não determinada de tais valores são provenientes dos actos ilícitos supra descritos, que, por esta forma, foram confundidos com valores resultantes da actividade comercial da empresa.

273. Por acordo e comunhão de intenções com os arguidos AA e BB, as arguidas CC e FF constituíram contas de depósito à ordem no M…B… em Outubro e Novembro de 2007, respectivamente, para o efeito de aí serem depositadas as quantias provenientes dos actos ilícitos descritos, sabendo as duas últimas pelo menos que tais quantias provinham dos processos fraudulentos (burlas) imputados.

274. No período entre 17/10/2007 e 31/12/2007, a conta do M… B… titulada pela primeira, com o NIB XXXXXX, além das diversas transferências directas efectuadas pela WU, num montante total de 41.367,25€, regista transferências bancárias para as contas pessoais dos seus familiares das empresas familiares, acima referidas, num total de 20.350,00€, a saber:

- A… S… G… (mãe) - 1.000,00€ (mil euros);

- BB (pai) – 2.500,00€ (dois mil e quinhentos euros);

- FF (irmã) – 6.000,00€ (seis mil euros);

- DD (irmão) – 2.500,00€ (dois mil e quinhentos euros);

- CC – 2.000,00€ (dois mil euros);

- “G... S..., Lda.” – 2.350,00€ (dois mil trezentos e cinquenta euros);

- I... G..., Lda. – transferência de 4.000,00€ (quatro mil euros),

bem como pagamentos por cheque, num montante global de 13.950,00€.

275. Já da conta do M… B.. identificada pelo NIB XXXXXX, constituída pela arguida FF, dos 17.161,59€ creditados directamente por ordem da WU, foram transferidos os seguintes valores:

- A… S… G… (mãe) – 5.000,00€ (cinco mil euros);

- CC (irmã) – 1.800,00€ (mil e oitocentos euros);

- FF – 1.500,00€ (mil e quinhentos euros).

276. A mesma arguida, FF, é ainda titular de contas bancárias no BXX– NIB XXXXXX 89, na C… - NIB XXXXXX, e no M…– NIB XXXXXX, que apresentaram os seguintes movimentos nos anos 2007 e 2008, não obstante a mesma só haver iniciado a actividade de dentista em 12/03/2008:

[...]

277. Em 29.12.2006 os arguidos AA e BB realizaram na “F…-M… S.. SA” aplicações financeiras consistentes em Planos de Poupança-Reforma, o primeiro no valor de 1.958,34€, resgatada em 09/07/2007, o segundo no valor de 10.186,58€, constituindo este último semelhantes aplicações a favor dos seus filhos, os arguidos DD, EE, CC e FF, no valor de 2.032,27€ cada, bem como a favor de sua mulher, A…de J… S. S. Guedes, no valor de 10.187,10€.

278. Bem sabendo e querendo constituir contas de depósito, nelas ordenando a realização de operações como se de valores licitamente obtidos se tratassem, ou aproveitando contas bancárias já existentes para nelas depositarem aqueles valores, confundindo-os com outros provenientes de actividades licitamente desenvolvidas, subscrevendo aplicações financeiras, utilizando serviços de transferência monetária para a Indonésia de pequenas quantias e por interposta pessoa e ainda adquirindo o arguido AA bens e serviços para além da capacidade normal de consumo :

- queriam e sabiam os arguidos AA, BB, CC, EE, GG e FF, conjunta e concertadamente, introduzir no mercado financeiro e monetário bancário legítimos o produto de transferências fraudulentas resultantes de burlas, por forma a ocultar a verdadeira origem desses montantes, cientes os três primeiros de que o valor de algumas dessas burlas era superior a €19.200 e ainda o arguido AA de prover ao respectivo sustento a partir das mesmas, disso fazendo modo de vida; e

– queriam e sabiam os arguidos AA e BB, conjunta e concertadamente entre si, introduzir no mesmo mercado o produto das sobreditas transferências extorquidas mediante ameaças, por forma a ocultar a verdadeira origem desses montantes.

279. Agiram todos livre e conscientemente nas respectivas condutas imputadas, bem sabendo que praticavam actos proibidos por lei,

Da liquidação de bens

280. Com referência aos anos 2005, 2006 e 2007, únicos períodos de que existe registo de haver exercido actividade laboral lícita remunerada em Portugal, o arguido AA declarou os seguintes rendimentos para efeitos de tributação (Apenso A, vols. I e III):

[...]

281. No período que mediou entre 17/08/2007 e 31/12/2007, a conta titulada pelo arguido AA no BXX, com o NIB XXXXXX 8, apresenta 19.450.00 euros de movimentos a crédito resultantes de depósitos em numerário.

282. E a conta à ordem com o NIB XXXXXX do B.., também pelo mesmo titulada, para o período entre 01/08/2007 a 31/12/2007 regista um valor total de 39.455,00€ de depósitos em numerário.

283. No período que mediou entre 22/06/2007 e 30/06/2008, as contas igualmente por si tituladas no BZZ(n.º XXXXXX), B… (NIB XXXXXX), B.. (n.º XXXXXX), C.. (n.º XXXXXX), M…(n.º XXXXXX) e B..T…(n.º XXXXXX) apresentam os seguintes movimentos a crédito resultantes de depósitos em numerário:

[...]

284. O mesmo arguido, no mês de Novembro de 2007, constituiu 5 contas a prazo no B… com os seguintes valores:

[...]

285. Todos estes depósitos à ordem e a prazo foram creditados pelo arguido AA com valores resultantes das sobreditas transferências ilícitas e outras semelhantes.

286. Com os proveitos assim ilicitamente obtidos, o arguido AA, por si ou através de J.. S.. a seu pedido, enviou ao seu pai, D..S…, a residir na Indonésia, a partir de Portugal e com destino àquele país asiático, pelo menos, as seguintes quantias monetárias através do serviço WU:

[...]

287. Para além disso, na execução do contrato de aluguer de longa duração referente ao veículo automóvel de matrícula xx-xx-xx, o arguido AA despendeu em rendas, entre 30.11.2006 e 27.10.2007, a quantia total de 14.308,12€, obtida com valores resultantes das sobreditas transferências ilícitas e outras semelhantes.

288. Entre Junho e Setembro de 2007, o mesmo arguido residiu numa fracção arrendada para sua habitação a “V… – I… SA”, sita ao F… V…, Torre xx, n.º xx, xxº Esq., sendo a renda mensal de 500€.

289. No início de vigência do citado arrendamento foi entregue a quantia de 3.000,00€ correspondente a 2.000,00€ a título de caução e 1.000,00€ de rendas.

290. Em Setembro de 2007, o arguido transferiu a sua residência para a Urbanização Q…do B…, lote xx, xº Direito, em V…, sendo a renda mensal de 900,00€.

291. No início de vigência do citado arrendamento foi entregue a quantia de 3.600,00€ correspondente a 1.800,00€ a título de caução e 1.800,00€ de rendas.

292. Em 29.12.2006 o arguido AA subscreveu na “F…-M… S… SA” uma aplicação financeira consistente em Plano de Poupança-Reforma, no valor de 1.958,34€, resgatada em 09/07/2007, a qual realizou com valores resultantes das sobreditas transferências ilícitas e outras semelhantes.

293. O arguido AA também adquiriu com os proveitos assim ilicitamente obtidos os seguintes bens móveis:

[...]

294. Aquando da busca na residência da Urbanização da Q… do B…, no dia 18.06.2008, o arguido AA possuía a quantia de 600,00€ constituída por 25 notas de valor facial de €20, 8 notas de valor facial de €10 e 4 notas de valor facial de €5, todas do Banco Central Europeu, dinheiro obtido com os referidos proveitos ilicitamente conseguidos. 

295. Com referência aos anos 2005, 2006, 2007 e 2008, o arguido BB, juntamente com sua mulher, declarou os seguintes rendimentos para efeitos de tributação do rendimento pessoal:

[...]

Entidades pagadoras:

“I... G..., Lda”

“G... S..., Lda”

296. No ano 2007, as empresas familiares do arguido BB apresentaram os seguintes resultados:

[...]

297. Na execução do acordo estabelecido com o arguido AA, o arguido BB passou a usar as contas bancárias por si tituladas e por estas empresas para nelas fazer transitar os valores ilicitamente captados da forma referida, introduzindo-os no mercado bancário legítimo, utilizando-os, entre outros fins, para fazer face às obrigações decorrentes da actividade normal das mesmas.

298. A “I... G..., Lda” é titular de, pelo menos, duas contas bancárias, uma no M…e outra no Bxx, identificadas com os NIB XXXXXX e XXXXXX, respectivamente, as quais apresentaram os seguintes movimentos a crédito em numerário:

[...]

299. Esta conta no Bxx apresenta ainda transferências recebidas da conta pessoal de BB nos valores totais de 37.500,00€ para o ano 2007 e 16.500,00€ para o ano seguinte.

300. O arguido BB titula pessoalmente diversas contas, entre as quais uma no M…, identificada pelo NIB XXXXXX, e outra no Bxx, com o NIB XXXXXX, esta juntamente com sua mulher.

301. Com referência ao período entre 01/07/2007 a 30/06/2008, as aludidas contas apresentam os seguintes movimentos a crédito em numerário:

[...]

302. Por outro lado, esta conta no Bxx, no período entre 01/08/2007 e 31/12/2007, recebeu transferências das contas tituladas por suas filhas, as arguidas CC e FF, no montante global de 6.000€.

303. Todos estes valores, incompatíveis com os rendimentos declarados fiscalmente, foram creditados nas referidas contas bancárias com proveitos resultantes das sobreditas transferências ilícitas e outras semelhantes.

304. Em 29.12.2006, com os valores resultantes das sobreditas transferências ilícitas e outras semelhantes, o arguido BB realizou na “F…-M… S… SA” aplicações financeiras consistentes em Planos de Poupança-Reforma, no valor global de 28.502,76€, a saber:

– uma, no valor de 10.186,58€ em seu nome;

- quatro, a favor dos seus filhos, os arguidos DD, EE, CC e FF, no valor de 2.032,27€ cada;

– outra, a favor de sua mulher, A… de J… S. S. G…, no valor de 10.187,10€.

305. O veículo automóvel de matrícula xx-xx-xx tem uma cotação no mercado de usados de 11.250,00€.

(…)

O arguido BB é o quarto de oito irmãos de uma família de meio rural, embora o pai estivesse ligado à actividade de construção civil.

O meio sócio-cultural em que cresceu acabou por condicionar alguns aspectos da sua vivência, nomeadamente a sua inserção precoce no mundo laboral, no caso em concreto na empresa do pai, tendo concluído a 4ª classe com cerca de dez anos.

Num clima de relacionamento estável o arguido beneficiou do equilibrado crescimento emocional do numeroso grupo de descendentes.

Constituiu família aos 23 anos, mantendo uma relação conjugal que é assumida pelo casal como gratificante, tendo 4 filhos, aqui co-arguidos.

Privilegiando a família, como espaço de partilha e de resolução das dificuldades denotando a mesma grande vivência afectiva.

Tendo sido eleito Presidente da Junta de Freguesia de Várzea de Tavares durante vários mandatos, o arguido tem integrado os órgãos directivos de vários grupos associativos locais.

Reside com a cônjuge e com duas filhas, uma moradia com boas condições da habitabilidade, localizada em meio rural.

Actualmente, BB mantém a actividade de construtor civil, sendo sócio da "I… G…".

Para além disso, é sócio com a sua filha C… P… da firma "G... S...".

Apesar do impacto criado na comunidade local pela pendência dos presentes autos, o arguido continua a beneficiar em geral de uma imagem socialmente positiva.

Nos anos de 2006, 2007 e 2008 o arguido BB auferiu o valor total anual não apurado como presidente da Junta de Freguesia de … de T…, sendo o total fiscalmente declarado no ano de 2006 de €2.400.

No ano de 2007 o arguido BB auferiu um vencimento total anual não apurado da “I… G…, Lda" e como mediador da “G... S..., Lda”, sendo o rendimento total fiscalmente declarado de €8.456,15.

No ano de 2008 o arguido BB auferiu um vencimento total anual não apurado como mediador da “G... S..., Lda”, sendo o rendimento total fiscalmente declarado de €4.200.

O arguido AA nasceu nos Estados Unidos da América (EUA), onde seus pais se encontravam emigrados.

Pai indonésio e mãe portuguesa, esta natural de C… de T…, M…, o arguido é o mais novo de dois irmãos.

O arguido era adolescente (15/16 anos), quando os pais se separaram, ficando aos cuidados da progenitora.

Mantinha contacto regular com o pai, que sempre terá assumido os seus deveres paternais.

Ingressado na escola nos Estados Unidos, a determinada altura veio viver para Portugal, para casa do tio BB, em Chãs de Tavares, completando aqui o segundo ciclo escolar.

Regressou então ao agregado familiar de origem nos EUA dando seguimento à sua formação escolar na área da informática.

Dado o surgimento de uma série de situações em que se viu envolvido, no ano de 2003 decidiu sair dos EUA, regressando a Portugal, onde fixou residência em casa de seu tio materno, o arguido BB, com quem passou a colaborar profissionalmente.

Regista duas sanções disciplinares por violação das regras internas como recluso no Estabelecimento Prisional da Guarda.

À data dos factos mantinha um relacionamento amoroso com J… S… L…, cidadã brasileira com quem vivia em Viseu, tendo um filho em comum de menor idade.

Até à notícia dos factos em apreço, o arguido era uma pessoa socialmente bem integrada no meio residencial de C… de T… -M…, onde viveu na companhia de seu tio até ter iniciado aquela relação marital.

Revela fraca interiorização da gravidade dos crimes pelos quais se encontra indiciado, aparentando não ter uma adequada ressonância sobre o impacto dos mesmos na vida das vítimas.

No período da sua reclusão tem tido visitas frequentes do tio materno, que se constitui como a grande presença positiva de suporte.

Dos antecedentes criminais:

(…)

O arguido BB tem duas condenações em juízo, uma por crime de desobediência praticado em 2.04.97, por sentença de 11.02.99, transitada em julgado, no PCS 61/98, do 2º Jz de Mangualde, outra por crime de falsidade de depoimento, praticado em 22.12.2003, por sentença de 28.02.2005, transitada em julgado, no PCS 1606/03.1TACBR, do 2º Jz de Mangualde.

O arguido AA tem várias condenações em juízo, a saber:

a) em Portugal, uma pela prática em 28.11.2003 de dois crimes de falsificação de documento, na forma continuada, p. p. pelo art.256º, nº3, do C.Penal, por sentença de 4.11.2005, transitada em julgado, no PCS 3199/05.6TBVIS, do 2º Jz Criminal de Viseu, tendo sido condenado em pena de multa que pagou;

b) nos EUA, tem averbados os seguintes antecedentes criminais:

1. 17 de Dezembro de 1996 — Detido pelo Departamento de Polícia de Nassau, condado de Nova Iorque:

Acusações: Falsificação, “segundo grau”, de escritura, testamento, contrato, cartão de crédito, etc.

Decisão: Condenado 45 dias de prisão.

2. 10 de Janeiro de 1997 — Detido pelo Departamento de Polícia de Nova Iorque (NYPD):

Acusações: furto qualificado, “quarto grau”, cartão de crédito; furto qualificado; furto qualificado, “quarto grau” (valor dos bens superior a $ 1.000); furto; usurpação de identidade; furto qualificado na forma tentada, “quarto grau”, cartão de crédito.

Decisão: condenado cinco anos em prisão federal.

3. 16 de Fevereiro de 1997 - Detido pelo Departamento de Polícia de Nassau, condado de Nova Iorque:

Acusações: falsificação, “segundo grau”, de escritura, testamento, contrato, cartão de crédito, etc.

Decisão: Desconhecida

4. 5 de Maio de 1997 - Detido pelo Departamento de Polícia de Nova Iorque (NYPD):

Acusações: Furto qualificado, “terceiro grau” (valor dos bens superior a  $3.000); posse de bens rouba dos, “terceiro grau” (valor dos bens  superior a $3.000); conspiração para cometer fraude, “primeiro grau”

Decisão: condenado (felony); cinco anos em prisão estatal

5. 28 de Maio de 1997 - Detido pelo Departamento de Polícia de Nova Iorque (NYPD):

Acusações: furto qualificado, “quarto grau” (valor dos bens superior a $1.000), furto qualificado, “quarto grau”, burla com cartão de crédito; furto; usurpação de identidade, “segundo grau”.

Decisão: condenado a seis meses em prisão do condado; cinco anos de liberdade sujeita a supervisão.

Revisão da decisão: Após reincidência, a sentença de AA foi revista para um a três anos em prisão estatal.

6. 5 de Dezembro de 1998 - Detido pelo Departamento de Polícia de Nassau, condado de Nova Iorque:

Acusações: posse de instrumento falsificado

Decisão: condenado (misdemeanor); sentença de um ano de prisão.

7. 15 de Janeiro de 1999 - Detido pelo Departamento de Policia de Nova Iorque (NYPD):

Acusações: furto qualificado, “terceiro grau” (valor dos bens superior a
$ 3.000)

Decisão: condenado (misdemeanor): cumpriu pena de prisão

8. 27 de Janeiro de 1999 - Detido pelo Departamento de Polícia de Nova Iorque (NYPD):

Acusações: Furto qualificado na forma tentada, “quarto grau” (valor dos bens superior a $1.000); posse de instrumento falsificado, “segundo grau”; Falsificação, “segundo grau”, de escritura, testamento, contrato, cartão de crédito, etc.; posse de bens roubados, “terceiro grau” (valor dos bens superior a $3.000); e resistência à detenção

Decisão: condenado dois a quatro anos em prisão federal.

9. 19 de Junho de 2001 — detido pelo FBI — Nova Iorque:

Acusações: burla informática e nas comunicações  

Decisão: condenado a 30 meses em prisão federal; três anos de liberdade sujeita a supervisão.

A matéria de facto apurada é definitiva e dela não resultam quaisquer vícios de que cumpra conhecer, nos termos do art. 410º, nº 2, do CPP.

Importa agora analisar os recursos, na parte em que subsistem.

Quanto ao arguido AA:

Invoca fundamentalmente em favor da redução da pena a necessidade de salvaguardar as exigências da ressocialização, e a confissão dos factos, acusando a pena fixada de desproporcional.

Recorde-se que este arguido foi condenado, por dez crimes de burla qualificada, em penas que variaram entre 5 anos e 3 anos e 6 meses de prisão; por dezassete crimes de extorsão, em penas de 6 anos a 2 anos e 6 meses de prisão; e por um crime de branqueamento, na pena de 5 anos de prisão.

O simples enunciado das penas já mostra a gravidade dos factos. Mas a verdadeira dimensão da ilicitude e da culpa é revelada pelos factos enunciados nos nºs 1 a 17 da matéria de facto, onde se descreve a conceção e preparação por este arguido do projeto criminoso, altamente engenhoso e sofisticado, que lhe permitiu, a partir de Portugal, iniciar uma série de atos que incidiram sobre instituições financeiras dos EUA e levaram à obtenção ilícita de proventos muito elevados, quer enganando os funcionários das agências, quer coagindo-os através de ameaças aparentemente idóneas a provocar-lhes perigo de morte.

O engenho demonstrado apoiou-se nos conhecimentos adquiridos naquele país pelo arguido, e revelam um propósito criminoso muito intenso, e uma audácia absolutamente invulgar. A preparação da “rede” em Portugal e o seu funcionamento mostram igualmente uma excecional capacidade de organização e chefia na prática de atos criminosos. De realçar ainda a intensidade da prática criminosa, que durou alguns meses e só terminou com a intervenção policial.

Na realidade, o plano idealizado pelo arguido e por ele dirigido na sua execução constitui um caso raro no nosso País, revelador de uma excecional perigosidade criminosa por parte deste arguido, quer pela capacidade de conceção de um plano criminoso, quer pela capacidade de o pôr em prática.

As exigências de prevenção especial são excecionalmente fortes, reforçadas aliás com o vasto passado criminal do arguido nos EUA, e também, em menor medida, em Portugal.

E também evidentemente as necessidades de salvaguarda da prevenção geral se mostram intensíssimas, dada a necessidade de garantir a fiabilidade e segurança das relações e transferências financeiras, e a própria tranquilidade e segurança das pessoas.

Neste quadro, tendo em conta os critérios da fixação da pena conjunta, que atendem à conjugação dos factos com a personalidade do agente (art. 77º, nº 1, do CP), há que concluir, sem quaisquer dúvidas, que os factos praticados se ajustam completamente à personalidade do arguido, compondo uma imagem global da situação intensamente negativa.

Assim, sendo embora a pena parcelar mais elevada de 6 anos de prisão, a conjugação global de factos e personalidade impede qualquer redução da pena fixada (17 anos de prisão de prisão), pois só ela poderá satisfazer, ainda que porventura apenas pelo mínimo, as exigências da prevenção, não excedendo de forma alguma a medida da culpa.

Quanto ao arguido BB:

Este arguido funcionou como o “braço direito” do anterior na prática criminosa. Foi ele que “recrutou” os outros membros do grupo que executou as sucessivas ações criminosas. Foi ele que coadjuvou, do princípio ao fim, a atuação do arguido AA. Se não concebeu o plano, nem para isso tinha capacidade nem conhecimentos técnicos, executou-o lado a lado com este último, como “sócio”.

Valem, pois, quanto a ele muitas das considerações expendidas anteriormente, com exceção evidentemente quanto à personalidade, cuja perigosidade se mostra evidentemente muito atenuada.

Efetivamente, ele levou uma vida socialmente inserida e sem motivos de censura até à chegada a Portugal do coarguido AA, seu sobrinho. Inclusivamente, foi presidente da Junta de Freguesia de V… de T… em alguns mandatos e tem integrado os órgãos diretivos de várias associações locais. Terá sido a ganância e a avidez do lucro, despoletadas pela proposta do coarguido, que o atraíram para o projeto criminoso. O que não deixa de ser muito censurável. Mas a censurabilidade da sua conduta é incomparavelmente inferior à do arguido AA.

Sendo embora muito intensas as necessidades de prevenção geral, considera-‑se adequado, tendo em conta a personalidade não desviante revelada pelo arguido BB, reduzir-lhe a pena conjunta para 10 anos de prisão.

Improcede, pois, totalmente o recurso do arguido AA, mas procede parcialmente o do arguido BB.

III. Decisão

Com base no exposto, decide-se:

a) Negar provimento ao recurso do arguido AA;

b) Conceder provimento parcial ao recurso do arguido BB, sendo a pena conjunta reduzida para 10 (dez) anos de prisão, no mais se mantendo a decisão recorrida;

c) Condenar o arguido AA em 10 UC de taxa de justiça.

                                   Lisboa, 8 de janeiro de 2014

Maia Costa (relator) **
Pires da Graça                    



[1] Foram igualmente condenados os arguidos CC, na pena conjunta de 3 anos e 8 meses de prisão, suspensa na respectiva execução, pela prática de dois crimes de burla qualificada e um de branqueamento; DD, na pena conjunta de 1 ano e 3meses de prisão, suspensa na respectiva execução, pela prática de dois crimes de burla qualificada; e EE, FF e GG, nas penas de 1 ano e 3 meses de prisão, suspensas na respectiva execução, pela prática de um crime de burla qualificada.
[2] Esse acórdão negou igualmente provimento aos recursos dos restantes coarguidos.
[3] Ver, a título exemplificativo, os acórdãos de 20.10.2010 (proc. nº 1099/06.1TAPTM.E1.S1), e de 11.1.2012 (proc. nº 158/08.0SVLSB.L1.S1), ambos do presente relator.
[4] Acórdão nº 186/2013.