Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
06B733
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: PEREIRA DA SILVA
Descritores: RECURSO DE AGRAVO
RECURSO PARA O SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Nº do Documento: SJ200604270007332
Data do Acordão: 04/27/2006
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA.
Decisão: NEGADA A REVISTA.
Sumário : Se em recurso de revista o recorrente pode impugnar o acórdão recorrido, não só com fundamento em violação da lei substantiva, como também com base em infracção à lei de processo (art. 722º nº 1 do CPC), o STJ só deve conhecer da matéria atinente à sustentada violação da lei adjectiva, a desta ser admissível recurso, nos termos plasmados no art. 754º nº 2 do CPC.
Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:


I. a) A "Empresa-A. intentou acção declarativa, com processo comum, ordinário, acção de impugnação pauliana, contra AA, BB, CC e DD, impetrando, nos termos e com os fundamentos que ressumam de fls. 2 a 8, que:

1. Seja ordenada a restituição do bem doado pelos dois primeiros demandados aos réus CC e DD - o prédio urbano, com tudo o que o compõe, sito na Rua Presa da Cavada, 269 a 271, freguesia de Fanzeres, concelho de Gondomar, inscrito na matriz sob o artigo 2786º e descrito na CRP de Gondomar sob o nº 00255/301086 - "na medida do crédito da autora."

2. Seja reconhecida à autora a possibilidade de esta executar o mesmo bem no património dos réus CC e DD e de praticar, relativamente ao predito prédio urbano, os actos de conservação patrimonial autorizados por lei.

b) Contestaram BB, por si e em representação de sua filha menor, DD, e CC, consoante flui de fls. 55 a 63.

c) Replicou a "Empresa-A.", batendo-se pela justeza da improcedência da defesa exceptiva, concluindo, no mais, como na petição inicial.

d) Após vicissitudes várias, cujo relato é de nulo relevo para o julgamento da revista instalada, foi proferido despacho. saneador em que, "inter alia", se julgou improcedente a invocada excepção de prescrição.

e) Seleccionada a matéria de facto considerada como assente e organizada a base instrutória, apelou a ré da decisão que decretou a improcedência da supracitada excepção, recurso esse que foi recebido para subir a final.

f) Alegada e contra-alegada a apelação, à audiência de discussão e julgamento que teve início a 17-03-04 e foi suspensa por despacho que designou o dia 04-04-22, pelas 09H30, para a sua continuação, "com a leitura das respostas à base instrutória".

g) A 30 de Março de 2004, pelo requerimento que constitui fls. 330, BB arguiu nulidade processual, aduzindo, em síntese:

Ter sido referido, no dia 17-03-04, pela "secretaria" do 2º Juízo Cível do Tribunal Judicial da Comarca de Gondomar, e ainda pelo Sr. Juiz que presidiu à audiência de discussão e julgamento, "no seu gabinete, que as testemunhas não tinham sido notificadas pelo Tribunal e que não poderiam ser ouvidas em audiência por falta do pagamento da taxa de justiça subsequente."

"Posteriormente a esse dia da audiência veio a verificar-se que tinha existido um lapso dessa secretaria que equivocou V.ª Exª e que consequentemente por virtude desse lapso levou V.ª Exª a induzir em erro os mandatários presentes, ficando todos convencidos que assim era.

A verdade é que a ré tinha pago essa taxa, no dia 22-04-2003, através do multibanco, entidade 29527, referência 702601230, montante 89,78, a guia de liquidação: 29527.02.601230.03, conforme consta dos autos e se junta novamente documento comprovativo, e a secretaria deveria ter notificado as testemunhas para o dia da audiência e estas deveriam e devem ser ouvidas uma vez que esta falha da secretaria influi e muito no exame e na decisão da presente causa.

Ora, apercebendo-nos agora todos nós de que houve um lapso da secretaria que a todos nos induziu em erro, e que esse lapso influi e muito no exame e na decisão da presente causa, deve V. Exª e requer-se a Vª Exª o conhecimento desta nulidade processual, nos termos do artigo 20lº e seguintes do C.P.C., devendo determinar-se a notificação das testemunhas da ré para serem ouvidas em audiência de julgamento dando sem efeito o dia da resposta aos quesitos, o que se requer.

Decisão que se justifica ainda, em obediência nomeadamente ao disposto nos, artigos 3º, 3º-A, 265º, 266º e 266º-A, todos do Código de Processo Civil.

Bem como, ao disposto nos artigos 202º, nº 2, 203º e 204º da Constituição da República Portuguesa.

Nestes termos e nos melhores de direito, constatando-se o equívoco, deve Vª Exª, após se aperceber do lapso, declarar nulo e de nenhum efeito o encerramento da audiência de julgamento bem como a marcação do dia para a resposta aos quesitos e determinar que a secretaria notifique as testemunhas da ré por forma a poderem ainda ser ouvidas em audiência de julgamento, em obediência a todos os normativos supra referidos e outros que se apliquem ao presente caso, como acto que se julga de inteira e sã justiça."

h) Foi proferido despacho julgando improcedente a arguição da nulidade aludida, a bondade da decisão tendo o Sr. Juiz feito repousar no que fls. 333 e 334 revelam.

i) Do despacho referido em h) agravou BB.

j) Sentenciada a procedência da acção, apelaram CC, BB e DD.

Por falta de alegações, foi julgada deserta apelação interposta por CC.

k) O TRP, por acórdão de 05-07-11, julgou improcedentes as apelações e o agravo, confirmando, consequentemente, todas as decisões recorridas (cfr. fls. 481 a 491).

1) BB e CC, pelo requerimento junto a fls. 511, vieram recorrer de revista do acórdão de 05-07-11 "e concomitantemente agravar, para o Supremo Tribunal de Justiça.

m) O Sr. desembargador relator ordenou a notificação dos recorrentes para esclarecerem "quais as decisões contidas no acórdão de fls. 481 e seguintes que são objecto dos recursos interpostos no requerimento de fls. 511 (relativamente a cada um dos recursos aí mencionados), em ordem a poder tomar-se posição quanto à sua admissibilidade)."

n) BB veio esclarecer "que o recurso abrange todo o acórdão de fls. 481, a fim de o mesmo ser apreciado em revista nos limites estabelecidos nos art.s 721º e 722º do Código de Processo Civil."

o) A 31-10-05, 0 Sr. Desembargador relator preferiu despacho admitindo o recurso interposto a fls. 511, "na parte referente às decisões de improcedência das apelações, que é de revista e tem efeito devolutivo...não admitindo "o recurso de agravo interposto pelo mesmo requerimento " e relativo" à decisão contida no acórdão sobre o agravo aí aprecidado."-cfr. fls. 518.

p) Na alegação da revista, tirou BB as seguintes conclusões:

"1ª. A falta de pagamento da taxa de justiça subsequente não é impeditiva de serem ouvidas as testemunhas presentes na sala de audiências.

2ª. Isso fere o art. 266º e os princípios dos art 265º e 265-A do C.P. Civil e o art. 20º da Constituição e os art.s 70 e seguintes da Lei do Tribunal Constitucional.

3ª. As testemunhas deviam ter sido ouvidas.

4ª. A Empresa-A., como sucessora dos direitos do Banco Nacional Ultramarino nela integrado é autora na Acção de Processo Ordinário 468/99 do 2º Juízo do Tribunal de Gondomar e com a Apelação nº 1172/05.3 da 3ª Secção do Tribunal da Relação do Porto.

5ª. Também a Empresa-A é autora na Acção nº415/2000 do mesmo 2º Juízo do Tribunal de Gondomar, com o Recurso de Apelação 3403/05.5 da 5ª Secção do Tribunal da Relação do Porto.

6ª. Em ambas as acções as partes são as mesmas, os pedidos são os mesmos e a causa de pedir também é a mesma impugnação pauliana, embora fundamentada em créditos de montantes diferentes, sendo menor o segundo.

7ª. Existe, neste momento, em nosso entender, a litispendência do art. 498º do C.P. Civil, dedutível na presente acção nos termos do art 499º.

8ª. Na primeira acção, com o nº 468/99 foi proferido o acórdão de 12 de Maio de 2005, ainda não transitado em julgado, juntando - se fotocópia legalizada do mesmo e dando-se aqui como reproduzido.

9ª. Se não existir litispendência, o que se admite por mera hipótese, verificar-se e pode confirmar-se a existência de casos julgados contraditórios previstos no art. 675º do C.P. Civil.

10ª. Parece-nos muito mais válida toda a argumentação do acórdão de 12 de Maio de 2005 do que do acórdão em recurso.

11ª. Através dele e da sua argumentação, verifica-se a existência da verificação dos requisitos do art. 611º do C. Civil, tendo os recorrentes feito a prova de que a devedora principal Empresa-B possuía bens penhoráveis de igual ou maior valor ao do crédito da Caixa ao tempo do seu vencimento.

12ª. O acórdão recorrido violou toda a legislação citada nestas alegações e suas conclusões.

Termos em que se deve conceder provimento ao recurso, decidir-se pela litispendência do presente processo e, se eventualmente isso não for decidido, julgar-se o recurso provado e procedente, fazendo-se conformidade com o acórdão da 3ª Secção da Relação do Porto proferido em 12 de Maio de 2005 no Recurso nº 1172/05.3, nº 468/99 do 2º Juízo do Tribunal de Gondomar."

q) Contra-apelou a autora a revista, propugnando o demérito da pretensão recursória.

r) Colhidos que foram os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

II. Não se estando ante qualquer das hipóteses contempladas nos art.s 722º nº 2 e 729º nº 3 do CPC, remete-se para a matéria de facto apurada, descrita no acórdão impugnado, tal justo arrimo encontrando no art. 713º nº 6, aplicável por força do art. 726º, normativos estes também integrantes do apontado Corpo de Leis, como provado mais se tendo que:

a) No Tribunal de Círculo Judicial de Gondomar, registada sob o nº468/99, correu seus termos acção declarativa, com processo comum, ordinário (acção de impugnação pauliana), intentada pelo BNU contra AA, BB, ambos por si e na qualidade de legais representantes de seus filhos CC e DD, por mor do que fls.562 e segs. evidenciam, sentenciada tendo sido a, "in totum", procedência da acção.

b) O TRP, por acórdão de 05-05-12, proferido nos autos de apelação registados sob o nº 1172/05-3, o qual se não mostra transitado em julgado, concedeu provimento ao recurso instalado da sentença citada em a) que antecede, revogando, consequentemente, a decisão impugnada, os demandados do pedido absolvendo.

III. Considerado o que delimita o âmbito do recurso (art.s 684º nº3 e 690º nº 1 do CPC), temos:

a) Conclusões lª a 3ª da alegação de BB:

Não sofrendo dúvida que, se em recurso de revista, como consentido pelo art 722º nº 1 do CPC, o recorrente pode impugnar o acórdão recorrido, não só com fundamento e violação da lei substantiva, como também com base em infracção à lei de processo, como menos apodíctico, outrossim, se antolha que o STJ só deve conhecer da matéria atinente à invocada violação da lei adjectiva, a desta ser admissível recurso, nos termos do art. 754º nº 2 do CPC.

Tal admissibilidade não é realidade.

Como, patentemente, sublinhado no despacho referido em I. o), contra o qual, note-se, não se insurgiu, sequer, BB, nos termos permitidos pela lei de processo (art. 688º do CPC).

Logo, como serôdia se tem a reincidência na invocação do plasmado nas conclusões lª a 3ª!...

Que assim não fosse, sempre se dirá que pelos fundamentos explanados no acórdão sob recurso, que, em absoluto, se acolhem, por via da não inquirição das testemunhas arroladas por BB, provimento não mereceria o recurso (art.s 713º nº 5 e 726º do CPC).

Prosseguindo:

b) É flagrante não colher a, nas conclusões 4ª a 7ª, invocada excepção dilatória de litispendência (art. 494º i) do CPC).

Que ocorresse tal excepção, anote-se, tal jamais deveria desaguar na absolvição dos réus do pedido do (art. 493º nºs 1 e 2 do CPC)!...

E não colhe já que:

Como manifesta se tem a inexistência de identidade de causa de pedir e pedido (art. 498º nºs 1 a 3 do CPC) nesta causa e na chamada à colação nas conclusões da alegação ora em apreço, para a tal conclusão chegar bastando atentar na circunstância de os créditos em causa, em cada uma das acções, serem díspares, mais urgindo não olvidar, também disposto no art.616º nº 1 do CC.

c) Conclusões 8ª a 11ª:

A inocorrência da invocada repetição de causa, por força do já elencado, também afastaria a excepção de caso julgado, a qual, tal como a litispendência, visa prevenir o consignado no art. 498º nº 2 do CPC, a hipótese contemplada no art. 675º nº 1 do CPC jamais podendo vir a ser realidade.

Há que ter presente o disposto nos art.s 671º nº1 e 673º do CPC !...

Nesta acção não tinha,"fatalmente", que dar-se como provado o que se deu, com o aplauso de BB, na outra causa !...

A liberdade de julgamento é princípio (art. 655º nº 1 do CPC) com valimento, também nesta acção que a recorrente não logrou provar, desde logo, o levado aos nºs 10 e 11 da base instrutória, ao arrepio do vazado na conclusão 11ª da sua alegação!...

d) Pelo dilucidado, não constituindo o acórdão recorrido paradigma de violação da legislação dita na conclusão l2ª, pelos fundamentos constantes da decisão em crise, para os quais remetemos, tão líquida é a questão, como permitido pelo art. 7I3º nº 5 do CPC, também aplicável no caso vertente (art. 726º do CPC), provimento não merece o recurso ordinário em causa.

IV. CONCLUSÃO:

Termos em que se nega a revista, confirmando-se o acórdão sob recurso.

Custas pela recorrente (art. 446º nºs 1 e 2 do CPC).

Lisboa, 27 de Abril de 2006

Pereira da Silva

Rodrigues dos Santos

Noronha do Nascimento.