Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
1691/07.7TTLSB.1.L1.S1
Nº Convencional: 4ª SECÇÃO
Relator: ANTÓNIO LEONES DANTAS
Descritores: RETRIBUIÇÃO
LIQUIDAÇÃO
EQUIDADE
Data do Acordão: 01/09/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA REVISTA
Área Temática:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL – PROCESSO EM GERAL / INCIDENTES DA INSTÂNCIA / LIQUIDAÇÃO / PROCEDIMENTOS CAUTELARES / PROCEDIMENTOS CAUTELARES ESPECIFICADOS / SUSPENSÃO DE DELIBERAÇÕES SOCIAIS.
DIREITO CIVIL – DIREITO DAS OBRIGAÇÕES / MODALIDADES DAS OBRIGAÇÕES / OBRIGAÇÃO DE INDEMNIZAÇÃO / INDEMNIZAÇÃO EM DINHEIRO.
Doutrina:
- JACINTO RODRIGUES BASTOS, Das Leis, Sua Interpretação e Aplicação, 2.ª edição, 1978, p.30;
- LEBRE DE FREITAS e ISABEL ALEXANDRE, Código de Processo Civil Anotado, Volume I, 3.ª Edição, Coimbra Editora, 2014, p. 701 e 702;
- PIRES DE LIMA E ANTUNES VARELA, Código Civil anotado, Volume I, Coimbra Editora, 4.ª Edição, 1987, p. 54 e 55;
- TERESA TEIXEIRA DA MOTA, Comentário do Código Civil, Universidade Católica Editora, 2014, p. 32.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGO 360.º, N.º 4 E 380.º, N.º 4.
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGO 566.º, N.º 3.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:


- DE 05-11-2009, PROCESSO N.º 381/2002.S1;
- DE 28-10-2010, PROCESSO N.º 272/06.7TBMTR.P1.S1;
- DE 29-05-2014, PROCESSO N.º 130/09.3TBCBC.G1.S1, TODOS IN WWW.DGSI.PT;
Sumário :

I – No incidente de liquidação, o requerente não está onerado com qualquer ónus de prova, embora lhe incumba levar ao processo todos os elementos relevantes na quantificação dos danos, e, sendo insuficientes as provas oferecidas pelos litigantes, incumbe ao juiz, oficiosamente, completá-las (artigo 360.º, n.º 4, do CPC), não devendo ainda descartar-se o recurso à equidade.

II - Quando o cálculo do montante a liquidar alcançado haja assentado decisivamente em juízos de equidade, ao Supremo Tribunal de Justiça não compete a determinação exata do valor pecuniário a arbitrar em função da ponderação das circunstâncias concretas do caso - já que a aplicação de puros juízos de equidade não traduz, em bom rigor, a resolução de uma «questão de direito» - mas tão somente a verificação acerca dos limites e pressupostos dentro dos quais se situou o referido juízo equitativo, formulado pelas instâncias face à ponderação da individualidade do caso concreto «sub juditio».

Decisão Texto Integral:

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:


I

AA deduziu o presente incidente de liquidação de sentença contra BB, S.A. e CC, Ld.ª, pedindo que se liquide o valor a ser pago pela Rés, requeridas, na quantia de € 184.683,00 euros, valor acrescido de € 51.306,00, a título de juros vencidos, contados desde a data da citação para a ação até à data de entrada do requerimento inicial de incidente, e vincendos, contados sobre essa quantia desde a referida data e até integral pagamento, nos termos e fundamentos que constam desse requerimento inicial.

Invocou como fundamento da sua pretensão, em síntese, que:

- No âmbito da ação principal, as requeridas foram condenadas a pagar ao Autor a título de retribuição variável uma quantia correspondente as retribuições devidas a título de comissão pelo negócio de exportação, quantia essa acrescida de juros à taxa legal atual de 4% ao ano até integral pagamento, tendo sido condenadas nesses termos em montante a liquidar em incidente de liquidação;

- O contrato de trabalho do Autor/requerente com as Rés cessou em 09.02.2007;

- É devido pelas Rés/requeridas, a título de retribuições resultantes de comissão do negócio de exportação, 1/3 do lucro total gerado por esse negócio no período decorrente nos anos de 2000 - exceto primeiro trimestre - a 2006 inclusive.

- O valor decorrente de 1/3 de lucro acumulado do negócio de exportação é de € 210.433,00;

- As Rés/requeridas desse valor, apenas pagaram ao Autor/requerente faseadamente no período compreendido entre 2000 a 2006 a quantia de € 25.750,00, pelo que permanece ainda em dívida ainda todo o restante a esse título, ou seja, € 184.683,00.

As requeridas deduziram oposição, concluindo pela improcedência do pedido de liquidação.

Terminaram referindo que «as decisões proferidas nos presentes autos condenaram a pagar ao Autor/requerente a quantia que se viesse a fixar neste incidente, relativa às comissões (de 0% a 3%) das vendas realizadas pelo mesmo no negócio exportação (comercialização de produtos ...), e o Autor/requerente, não identifica tais vendas, nem alega, nem demonstra qual o valor da percentagem a que teria direito – entre 0% a 3%. Logo, e porque não foram alegados os factos respetivos os mesmos também não se mostram demonstrados, devendo o incidente de liquidação ser julgado improcedente, por não provado e as Rés/Requeridas absolvidas do pedido formulado».

O incidente instaurado prosseguiu seus termos, vindo a ser decidido por sentença de 26 de abril de 2017, que integrou o seguinte dispositivo:

«Face a tudo o acima exposto, factos dados como provados, disposições legais citadas e considerações expendidas decide-se liquidar o Acórdão proferido no Tribunal da Relação de Lisboa, no âmbito destes autos, transitado em julgado, nos moldes requeridos, e assim em consequência fixa-se a quantia total a pagar pelas Rés/requeridas ao Autor/requerente, nos moldes expostos, a título de retribuição variável correspondente às retribuições devidas a título de comissão pelo negócio de exportação, na quantia de 184,683,00 euros (cento e oitenta e quatro mil seiscentos e oitenta e três euros), valor que nos termos da mesma decisão condenatória será acrescido de juros de mora à taxa legal, atualmente de 4%, contados desde a data da citação para a ação até integral pagamento, sendo os vencidos até à data de entrada em juízo deste incidente de liquidação no valor de 51,306,00 (cinquenta e um mil e trezentos e seis euros).»

Inconformadas com esta decisão, dela apelaram as requeridas para o Tribunal da Relação de Lisboa que veio a conhecer do recurso por acórdão de  23 de maio de 2018, nos seguintes termos:

«Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar a apelação parcialmente procedente e, em consequência, alterando a sentença recorrida, liquida-se o valor global devido ao autor a título de comissões pelo negócio de exportação referente aos anos 2000 a 2006, no montante de € 35.287,60 (Trinta e Cinco Mil, Duzentos e Oitenta e Sete Euros e Sessenta Cêntimos), acrescida de juros de mora à taxa legal, vencidos e vincendos, desde a data da citação até integral pagamento.

Custas: liquidação em 1ª instância e da apelação, na proporção de 4/5 pelo autor e de 1/5 pelas rés.»

Irresignado com o assim decidido, veio o requerente recorrer de revista para este Supremo Tribunal, integrando nas alegações apresentadas as seguintes conclusões:

«1. O presente recurso tem por objeto o Acórdão proferido aos 23/05/2018, nos autos de apelação acima identificados, que, revogando parcialmente a sentença proferida em 1.ª instância, liquidou o julgado, devido ao ora recorrente pelas recorridas, na quantia total de apenas € 35.287,60;

2. Salvo o devido respeito, não assiste razão aos Senhores Juízes Desembargadores;

3. Por um lado, porque a quantia liquidada em 1.ª instância foi corretamente apurada, face a todos os elementos constantes dos autos e à luz do disposto no artigo 566.°/3 do Código Civil ("CC"), conjugado com o disposto no artigo 607.° do CPC;

4. Por outro lado, porque o Tribunal da Relação extravasou os limites do que lhe era legalmente permitido, violando o disposto nos artigos 619.° e 609.° do CPC e também do artigo 74.° do CPT, ao deduzir à quantia final apurada uma quantia - € 25.750,00 - que, para além de não integrar a sentença a liquidar, não resulta de nenhum ponto da matéria de facto considerada provada nos autos de liquidação, razão pela qual claramente não relevava, nem podia relevar, a título nenhum, para a liquidação a efetuar, fosse ela qual fosse;

5. Entende, pois, o recorrente que o Acórdão recorrido violou os artigos 566.°/3 do CC, os artigos 607.°, 609.° e 619.° do CPC e o artigo 74.° do CPT.

6. Ao contrário do entendido no Acórdão recorrido, nos autos de liquidação em que sobe o presente recurso o que está em causa é - apenas e somente - apurar a quantia que, a titulo de retribuição correspondente às comissões devidas pelo negócio de exportação, é devida ao A., ora recorrente;

7. Na sentença de 13/09/2017 - a liquidar nos presentes autos - o Tribunal condenou as RR., aqui recorridas, "a pagar ao autor AA a quantia que se vier a liquidar em execução de sentença a título de retribuição correspondente às comissões devidas pelo negócio de exportação acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4% até integral e efetivo pagamento.";

8. Este é o único ponto que importa "liquidar" no presente incidente, concorrendo para a fixação dessa liquidação não apenas a matéria de facto provada nos autos principais - e transitada em julgado com a decisão a liquidar, i.e. a tida por assente na decisão de 13/09/213 -, mas também aquela que, em função da prova produzida nos próprios autos de liquidação, tiver sido possível apurar.

9. Todos os números fornecidos pelo recorrente foram objeto de análise detalhada pelos Senhores Peritos, cujo relatório foi submetido e valorado pela Senhora Juiz a quo de forma livre e nos exatos termos permitidos por lei;

10. A este propósito, refere-se na sentença proferida em 1.ª instância o seguinte: “No que se reporta ao relatório pericial relativo à perícia efetuada no âmbito destes autos como acima já referido o seu conteúdo foi tomado em conta em termos de convicção por inexistir qualquer fundamento para deste discordar podendo salientar-se do teor do mesmo que a maioria das conclusões em falta assentam também sobre a falta de elementos documentais de suporte existentes nas empresas rés/requeridas para tal efeito." (cfr. sentença recorrida, pág. 22)

11. Em nenhum local da matéria de facto considerada nos autos ficou adquirido ou demonstrado que a retribuição do A. devida pelo negócio de exportação - que é diversa da retribuição provada no facto 10 supra - se continha dentro dos limites de 0% e 3%;

12. O objeto da liquidação também não foi fixado da forma restritiva que se refere no Acórdão recorrido;

13. A condenação, transitada em julgado, objeto da presente liquidação e constante da sentença de 13/09/2013, ordena a liquidação de algo bem mais abrangente, ou seja, exatamente o que se encontra reproduzido a fls. 21 do Acórdão recorrido: "Condenar as rés "BB, S.A." e CC, Lda." a pagar ao autor AA a quantia que se vier a liquidar em execução de sentença a título de retribuição correspondente às comissões devidas pelo negócio de exportação acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% até integral e efetivo pagamento."

14. Estas sim são as questões a apreciar nos presentes autos,

15. Ou seja, tal como referido na sentença proferida em 1.ª instância, as questões a decidir no incidente são: - Quantia líquida devida ao autor/requerente pelas requeridas nos termos da sentença/Acórdão condenatória dos autos a título de retribuição correspondente às comissões devidas ao mesmo pelo negócio de exportação; - Dos juros relativos à quantia em causa.» (cfr. págs. 4 e 5 da sentença)

16. Aquilo que resulta da sentença a liquidar, proferida nos autos em 13/09/2013, maxime do ponto 10) da matéria de facto provada, é que a percentagem de entre 0% e 3% respeita a vendas totais que nada têm a ver com o negócio de exportação, do qual são independentes e, aliás, anteriores ao início deste;

16. O que ficou provado e resulta da sentença a liquidar já transitada - e é isso que agora importa – é que a retribuição do negócio de exportação acrescia à acima referida e apenas surgiu mais tarde, a partir do segundo trimestre do ano 2000, altura em que o recorrente passou a desempenhar funções também para a requerida CC (cfr. pontos 2.1.3. e 2.1.15. da sentença a liquidar, reproduzidos nos pontos 10 e 24 da sentença de 26/04/2017, proferida no incidente de liquidação);

17. Como alegado no requerimento inicial do incidente de liquidação, tal valor corresponde a 1/3 do lucro total do negócio de exportação entre 2000 e 2006, e não a comissões fixadas entre 0% e 3% sobre o volume das vendas;

18. A diferença existe porque em cada um de tais pontos da matéria de facto se trata de factualidade diversa;

• no ponto 10 refere-se uma percentagem entre 0% e 3% sobre vendas totais a acrescer à retribuição fixa paga desde 1998;

• no ponto 24 refere-se uma retribuição variável correspondente a uma percentagem não concretamente apurada sobre as vendas geradas pelo negócio de exportação.

19. A Senhora Juíza a quo explicitou devidamente na sentença proferida em 1.ª instância, e nos termos previstos e permitidos pelo disposto no artigo 607.° do CPC [aplicável aos autos ex vi do disposto no artigo 1.°/2, al. a)] as razões que a levaram a decidir nos termos em que o fez; e foram razões de direito, mas também de experiência comum.

20. Daí também a Senhora Juíza a quo ter esclarecido na sentença parcialmente revogada pelo Acórdão recorrido que "(...) no caso concreto há que considerar desde logo que ambas as partes foram ouvidas sendo que o autor foi muito credível nos factos que relatou no âmbito destas declarações tendo relatado de forma precisa e detalhada os factos (que foram confirmados no essencial pelas testemunhas ouvidas e que não foram contrariados peias declarações de parte da ré conforme melhor consta. Assim tais declarações de parte foram meio de prova tomado em consideração peio tribunal e que alicerçaram a convicção positiva." (cfr. sentença, pág. 19 e 20; sublinhado nosso).

21. E, logo de seguida, refere a Senhora Juíza a quo: "Deste modo pelo autor foi explicado que começou a trabalhar nas datas que indica quase exclusivamente para a ré/requerida CC, e que era a única pessoa, o único trabalhador, o que foi acordado com esta que fazia negócios no exterior. No que a esse aspeto se reporta referiu que tinha sido acompanhado apenas uma vez, nas viagens ao exterior por DD (facto por este confirmado), mas que era a única pessoa que tratava de tais negócios, tendo-lhe, nessa altura sido proposto o pagamento de 1/3 desses negócios, sendo a margem bruta a dividir por três. Na quantia em causa seriam descontados os custos explicitando esse o acordo como o que foi feito, e tendo confirmado os valores que dos autos como sendo os faturados, e os que ficaram em divida. Foi dito de forma simples, precisa e credível que existia o valor total do negócio sendo a sua divisão de valor nos termos proposto e aceites, e como já tinha recebido uma parte (25.000.00 euros) desse valor ficou em divida o restante. Explicou com coerência como obteve o valor que peticiona, esclarecendo que as contas da exportação integravam-se em conta corrente, tendo explicitado o documento de [pag.] 1100 dos autos com o qual foi confrontado." (cfr. sentença recorrida, págs. 19 e 20);

22. A Senhora Juíza a quo, na ausência de elementos de facto que lhe permitissem uma decisão conscienciosa e segura sobre a questão em apreço, mas baseando-se em toda a prova produzida e postura pouco credível, senão mesmo inverosímil, das recorridas ao longo do processo, optou - e muito bem! - por decidir os presentes autos com recurso à equidade e nos termos em que o fez;

23. Resulta da sentença proferida nos autos em 26/04/2017, parcialmente revogada pelo Acórdão recorrido, que, para a formação da sua convicção, concorreu tudo quanto foi adquirido no processo, designadamente a prova anterior, os depoimentos prestados pelas partes e pelas testemunhas, a prova pericial e os documentos juntos aos autos;

24. Pelo contrário: a Senhora Juíza a quo decidiu - e bem - com base em critérios de justiça e razoabilidade e em total consonância com os elementos de que dispunha;

25. Como se afirma na sentença recorrida "a convicção do Tribunal no que se reporta à matéria de facto dada acima como provada considerou-se, e baseou-se no essencial nos factos já dados como provados constantes da sentença que ora se visa liquidar proferida na ação declarativa do Tribunal de Trabalho de Lisboa confirmada pelo Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, e ainda do anterior Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa que anulou o primeiro julgamento efetuado em primeira instancia, e constantes do teor dos documentos dos autos - em concreto - factos provados constantes da sentença condenatória proferida em primeira instância nestes autos, e factos provados do mesmo modo constantes do teor do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa." (cfr. sentença proferida em 1.ª instância, pág. 18);

26. A factualidade assente e os elementos trazidos aos autos pelas partes, são mais do que suficientes para fundar a decisão do Senhor Juiz a quo, levando-a a decidir, como o fez, segundo juízos de equidade, dentro dos poderes que a lei lhe confere, maxime o disposto no artigo 607./4 e 5 do CPC e à luz do disposto no artigo 566./3 do Código Civil;

27. Salvo o devido respeito, também não faz qualquer sentido a afirmação no Acórdão recorrido de que deve ser deduzida ao pedido formulado pelo A., aqui recorrente, a quantia de € 25.750,00 que o mesmo reconhece já lhe ter sido paga;

28. É por demais evidente que essa quantia está ab initio adquirida como paga, nunca tendo integrado o valor final peticionado pelo recorrente a nenhum título, nem, por conseguinte, podendo concorrer para o respetivo apuramento em sede de liquidação, sob pena de violação do disposto nos artigos 609.° e 619.° do CPC e o artigo 74.° do CPT;

29. A quantia peticionada ab initio pelo recorrente é líquida de todos os pagamentos anteriores e, portanto, nada haverá a deduzir ao valor apurado em sede de liquidação;

30. É precisamente, por isso, que tal valor não integra a quantia a liquidar, nem, obviamente, tem de ser considerado, a título nenhum, na presente liquidação do julgado;

31. Resulta evidente dos autos que o A., ora recorrente, só indicou esse valor ao Tribunal - tanto na ação principal, como na liquidação - para plena demonstração do modo como apurou a quantia que efetivamente lhe é devida pelas RR., ora recorridas;

32. Aproveitar esse facto para reduzir (ainda) mais o valor a que o A., ora recorrente, tem direito é injusto, iníquo e, entre o mais, violador da sentença de 13/09/2013, já transitada em julgado;

33. Efetivamente, a sentença de 13/09/2013 foi proferida tendo em conta o alegado pelo A, ora recorrente, embora concluindo pela impossibilidade de se apurar o valor exato devido àquele;

34. Tanto mais que resulta da matéria de facto provada que as RR., ora recorridas, não pagaram ao A., ora recorrente, qualquer quantia, a título de retribuição devida pelo negócio de exportação entre os anos de 2000 e 2006 (cfr. pontos 80, 81, 83, 84, 85, 86, 87, 93 e 94 dos factos provados);

35. O Acórdão recorrido ao deduzir à quantia final apurada - e concorde-se ou não com o respetivo valor - € 25.750,00, contrariou a decisão objeto de liquidação, já transitada em julgado e, bem assim, a prova produzida em sede de liquidação;

36. Por todo o exposto, é forçoso concluir que o Acórdão recorrido violou o disposto nos artigos 609.°, 619.° do CPC e 74.° do CPT;

 37. Bem andou, pois, a Senhor Juíza a quo ao decidir nos termos em que o fez, condenando as recorrentes a pagarem ao recorrido, solidariamente entre si, a quantia de € 184.683,00 a título de comissões sobre as vendas geradas pelo negócio de exportação, acrescida de juros de mora à taxa legal, atualmente de 4%, contados desde a data da citação para a ação até integral pagamento, sendo os vencidos até à data de entrada em juízo deste incidente de liquidação no valor de € 51.306,00.»

 

Termina referindo que se impõe «o inteiro provimento do presente recurso de revista, a revogação do Acórdão recorrido e, consequentemente, a manutenção da sentença recorrida, tal como proferida em 1.ª instância, ASSIM SE FAZENDO JUSTIÇA!»

As requeridas responderam ao recurso interposto integrando nas alegações apresentadas as seguintes conclusões:

«A) Esteve bem o Tribunal da Relação de Lisboa ao decidir como decidiu.

B) Não assiste razão ao Recorrente no presente recurso

C) Os presentes autos são de liquidação (execução de sentença).

D) A liquidação de sentença está circunscrita ao objeto definido na decisão declarativa condenatória (transitada em julgado).

E) No caso sub judice, o Tribunal do Trabalho de Lisboa fixou o objeto da liquidação da seguinte forma: - qual o volume de vendas (no negócio exportação) realizadas pelo A.?  - qual  a  percentagem  das  comissões,  entre  0% e  3%, acordada entre A. e RR. em cada uma das vendas?

 F) O Acórdão recorrido limitou-se, e bem, a fixar o volume de vendas e a percentagem da comissão a que o A. teria direito e que constituía a sua remuneração variável.

G) No requerimento inicial relativo a este incidente, o A. formulou o seu pedido, não nas comissões a que teria direito, mas numa parte do lucro (1/3) do negócio.

 H) Este pedido formulado pelo A. extravasa o objeto da sentença declarativa condenatória, que constitui os limites da liquidação de sentença.

I) Em relação ao volume de vendas, sendo os valores apresentados por A. e RR aproximados, esteve bem o Tribunal da Relação de Lisboa em fixar, por equidade, o valor em € 4.069.173,14.

J) O valor do volume de vendas fixado pelo Tribunal a quo é, até, superior ao indicado pelo A. no seu requerimento inicial (€ 3.959.000,00).

K) Quanto ao volume de vendas fixado pelo Tribunal a quo, o valor fixado, é vantajoso  para  o A., face ao fixado  na sentença condenatória.

l) O A. nunca apresentou qualquer elemento relativamente às comissões acordadas, preferindo continuar a reclamar 1/3 do lucro, pretensão que não lhe foi reconhecida na sentença condenatória.

M) A sentença condenatória, que agora se liquida, fixava que a remuneração variável correspondia a uma comissão, entre 0% e 3%, sobre as vendas do negócio exportação.

N) O legal representante das RR. afirmou que as comissões acordadas seriam de 1% até um milhão de euros, 2% entre um e dois milhões de euros e 3% acima de dois milhões.

O) Salvo melhor opinião, ao fixar a comissão em 1,5% (média entre o limite mínimo e máximo fixado pela sentença condenatória), com recurso à equidade, a decisão do Tribunal da Relação de Lisboa é correcta e inatacável.

P) O A. confessou já ter recebido, a título de comissões, a quantia de € 25.750,00.

Q) Esteve bem o Tribunal da Relação de Lisboa ao proceder à compensação do valor que o A. confessou já ter recebido.

R) Não podia o Tribunal da Relação de Lisboa abstrair-se desta confissão e condenar as RR. a liquidar uma quantia que já se encontra liquidada por estas, não sendo, pois, devida ao A..

S) O Tribunal da Relação de Lisboa apurou a quantia a liquidar - € 61.307,60.

T) A esta quantia deduziu o valor que o A. confessou já ter recebido a título de comissões - € 25.750,00.

U) Em nada fica prejudicado o direito do A., conforme resulta da sentença condenatória preferida em primeira instância e transitada em julgado.

 V) As decisões segundo a equidade são decisões tomadas à luz do Direito.

W) O Tribunal a quo esteve bem ao conformar a sua decisão com a decisão condenatória.

X) Termos em que deve ser mantido o douto Acórdão recorrido.»

 

Neste Tribunal o Exm.º Procurador-Geral Adjunto proferiu parecer, nos termos do n.º 3 do artigo 87.º do Código de Processo do Trabalho, pronunciando-se no sentido da negação da revista.

Sabido que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente, nos termos do disposto nos artigos 635.º, n.º 3, e 639.º do Código de Processo Civil, ressalvadas as questões de conhecimento oficioso, está em causa na presente revista saber se a decisão recorrida respeitou os parâmetros legais, nomeadamente, no julgamento segundo a equidade que integra.


II

As instâncias fixaram a seguinte matéria de facto:

«1) Por sentença proferida em 13/09/2013, as requeridas foram condenadas a pagar ao autor AA a quantia de € 3.508,89 (três mil quinhentos e oito euros e oitenta e nove cêntimos) a título de indemnização acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% desde a data da citação até integral e efetivo pagamento.

2) E foram ainda nos termos da mesma sentença condenadas as rés/ requeridas “BB, SA” e “CC, Lda” a pagar ao autor AA a quantia que se vier a liquidar em execução de sentença a título de retribuição correspondente às comissões (.) devidas pelo negócio de exportação acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% até integral e efetivo pagamento.

3) E foram ainda nos termos da mesma sentença condenadas as rés/ requeridas “BB, SA” e “CC, Lda” a pagar ao autor AA a quantia de € 205,84 (duzentos e cinco euros e oitenta e quatro cêntimos) a título de remanescente das retribuições de Janeiro e oito dias de Fevereiro de 2008 das retribuições acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% desde a data da citação até integral e efetivo pagamento.

4) A sentença referida nos pontos 1) a 3) veio em sede de recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa a ser confirmada por Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, proferido em 15/01/2014, que se mostra transitado em julgado.

5) Por Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, - Acórdão esse proferido anteriormente, com a data de 20/02/2013 -, havia sido decidido em síntese; “ a) anular a sentença recorrida e o julgamento; b) determinar a repetição do julgamento com vista a julgar a matéria de facto que não está viciada; podendo, no entanto, o tribunal ampliar o julgamento de modo a apreciar outros pontos da matéria de facto, com o fim exclusivo de eBBr contradições na decisão.”

6) No sumário do referido Acórdão constante do facto 5), constava: “A decisão da primeira instância enferma de obscuridade e deficiência sobre a matéria de facto, quando, de um lado, não clarifica a percentagem de 3% sobre as vendas é igual a 3% ou pode ir até 3% e, de outro, não apura qual o volume de vendas que o autor realizou por conta das rés durante os anos de 2000 a 2006”.

7) No caso o primeiro julgamento foi repetido por determinação do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa datado de 20/02/2013 para fixar também duas questões a saber: 1ª) – qual a percentagem a que o Autor/requerente - tinha direito nas vendas por si realizadas; 2ª – qual o volume de vendas realizado pelo autor/ requerente.

8) Da sentença referida em 1) a 3) proferida pelo Tribunal do Trabalho de Lisboa confirmada pelo Tribunal da Relação de Lisboa no Acórdão constante do ponto 4) apurou-se nomeadamente o seguinte; “o primeiro contacto entre o autor e a 1.ª ré aconteceu no final do ano de 1997, através do Sr. DD (administrador da 1.ª ré e sócio e gerente da 2ª ré) momento em que se estabeleceram as condições contratuais do autor nomeadamente as relativas à sua remuneração, tendo ainda aquele referido ao autor que a sua colaboração ficava dependente da concretização de um contrato de compra e venda da empresa EE (empresa Alemã), pela FF (empresa Turca), na altura representada pela empresa Competivídeo (anterior denominação social da 2ª ré, hoje CC, Lda.).

9) No início do ano de 1998, foi o autor novamente contactado pelo Sr. DD, tendo o autor entrado ao serviço da 1.ª ré para exercer as funções de Responsável do Departamento de Vendas, em abril de 1998, por conta e sob a autoridade, direção e fiscalização da mesma 1.ª ré, através da celebração de um contrato de trabalho sem termo e verbal.

10) O autor auferia uma remuneração de 80.000$00 por mês (€ 400,00, que se manteve até à cessação do contrato de trabalho do autor), acrescida de um montante de até 3% das vendas, ou seja, um montante variável entre 0% (zero por cento) a 3% (três por cento) do valor das vendas calculado em função das vendas totais, e dos objetivos atingidos, bem como viatura para uso total, telemóvel, bem como 20.000$00 a título de subsídio de alimentação, sendo igualmente as refeições e outras despesas de representação pagas pela 1.ª ré mediante a apresentação das respetivas faturas.

 11) Por razões meramente contabilísticas e fiscais apenas era declarado no seu recibo de vencimento o montante de 80.000$00, bem como o montante do subsídio de alimentação.

 12) O pagamento dos montantes relativos às comissões sobre as vendas seria pago através de transferência bancária efetuada através de uma empresa sediada na Inglaterra, com periodicidade variável, bem como através de transferência bancária diretamente de uma conta bancária em Portugal em nome do Sr. DD.

13) Por transferência bancária diretamente de uma conta bancária em Portugal em nome do Sr. DD, o autor recebeu as seguintes quantias relativas a comissões sobre as vendas: 88.046$00 em 26.12.1999; 90.636$00 em 30.03.1999; 181.954$00 em 31.03.1999; 90.636$00 em 25.02.2000; 179.364$00 em 28.02.2000; 71.200$00 em 29.03.2001; 198.800$00 em 30.03.2001; 71.200$00 em 13.12.2001; 198.800$00 em 18.12.2001; 71.200$00 em 28.12.2001; 198.800$00 em 2.01.2002; 71.200$00 em 27.09.2001, 468.800$00 em 28.09.2001; 71.200$00 em 29.08.2001; 198.800$00 em 31.08.2001, 198.800$00 em 10.07.2001; 37.269$50 em 26.07.2001; 236.069$50 em 27.07.2001, 178.165$00 em 29.12.2000; 91.835$00 em 2.01.2001; 71.200$00 em 14.12.2000; 198.800$00, em 14.12.2000; 178.165$00 em 29.11.2000; 91.835$00 em 29.11.2000; 397.602$00 em 28.07.2000; 142.398$00 em 28.07.2000; 90.636$00 em 16.12.1999; 90.636$00 em 26.11.1999; 125.636$00 em 30.08.1999.

14) Através de transferência bancária efetuada através de uma empresa sediada na Inglaterra, o autor recebeu as seguintes quantias relativas a comissões sobre as vendas: 1.500.000$00 em 21.08.1998; 747.524$00 em 28.01.1999; 748.959$00 em 15.03.1999; 741.224$00 em 5.04.1999; 749.999$00 em 3.09.1999; 748.959$00 em 2.11.1999; 1.500.000$00 em 28.03.2000; 740.623$00 em 10.08.2000; 749.999$00 em 12.10.2000, 1.500.000$00 em 6.12.2000; 1.500.006$00 em 22.03.2002; 7.434,91 € em 26.08.2002, 7.482,00 € em 5.09.2002; 7.430,81 € em 4.02.2003; 7.500,00 € em 9.04.2003; 7.500,00 € em 18.07.2003; 7.500,00 € em 24.11.2003; 7.457,81 € em 8.04.2004; 7.457,55 € em 30.06.2004; 7.500,00 € em 1.09.2004; 2.500,00 € em 23.12.2004; 15.000,00 € em 29.03.2005; 5.000,00 € em 25.08.2005; 5.000,00 € em 2.03.2006.

15) A partir de Outubro de 2003 e até Dezembro de 2004 o autor também recebeu parte dos montantes relativos a comissões sobre vendas através de depósitos em numerário na respetiva conta bancária e a partir de Janeiro de 2005 também mediante dinheiro entregue em mão, em envelope fechado e diretamente ao próprio autor.

16) A 1.ª ré tinha como atividade a comercialização de produtos na área da bricolagem (caixas de ferramentas e mais tarde armários e estantes plásticas), constando no objeto do contrato social “comércio e aluguer de videocassetes, equipamentos e produtos audiovisuais e informáticos”.

17) Hoje em dia, a 1.ª e a 2.ª ré têm uma gama muito diversificada de produtos para vender, que vão desde caixas de ferramentas, caixas para DVD, caixas herméticas para alimentos, grelhadores, cadeados com alarme, máquinas para cozer massa, sumos, lavadores de saladas, entre outros, tendo a 2.ª R como objeto social “comércio, distribuição, importação e exportação de produtos informáticos, eletrónicos, elétricos e artigos afins ou complementares”.

18) Em Abril de 1998 a Competivideo, hoje 2.ª ré, era fabricante de caixas para cassetes de vídeo -VHSE- sob licença da ....

19) O autor, como responsável pela equipa de vendas desenvolvia a atividade comercial fundamentalmente com as grandes superfícies, tinha a seu cargo também a venda de produtos na área do audiovisual, nomeadamente cassetes de vídeo e respetivas caixas, sendo que relativamente a outros clientes era o Sr. DD, administrador da 1.ª R., que tratava diretamente com os mesmos.

20) Entretanto, no ano de 1999, surgiu um novo suporte audiovisual, o designado DVD, que possuía uma qualidade de imagem e de som muito superiores aos do VHS, e que, segundo os especialistas, iria redinamizar um mercado estagnado criando uma nova oportunidade de negócio.

21) Quando no ano de 2000, o DVD passou a ser uma realidade no centro da Europa, a Competivídeo estabeleceu um acordo com a ..., passando a ser a sua representante em alguns países do sul da Europa, como Espanha, Itália, Grécia e Turquia.

22) No âmbito deste projeto da Competivídeo (hoje, 2.ª ré) foi comunicado ao

23) Autor (pelo administrador da 1.ª ré e sócio/gerente da 2.ª ré, DD, e pelo sócio deste na 2.ª ré, GG) que teria sido escolhido, pela sua experiência, caso aceitasse, para, em nome e por conta da referida Competivídeo e sob autoridade e direção desta, comercializar os produtos ... em alguns do países do sul da Europa, implicando ter que se deslocar ao estrangeiro para efetuar visitas a clientes e potenciais clientes, devendo igualmente efetuar o seguimento desses mercados, tendo o A. aceitado a referida proposta.

24) A partir do segundo trimestre de 2000, em data que já não sabe precisar, o autor – apesar de continuar a trabalhar para à 1.ª ré e de esta continuar a pagar-lhe a parte declarada da sua retribuição – passou também a trabalhar para a 2.ª ré, auferindo, em contrapartida da atividade prestada a esta última, a retribuição acordada de uma percentagem não concretamente apurada sobre as vendas geradas pelo negócio de exportação, que seria paga com periodicidade variável, através de transferência bancária efetuada através de uma empresa sediada no estrangeiro.

25) As sociedades rés faziam e fazem parte do designado “Grupo CC”, sendo 26) Qualquer delas gerida por DD a quem cabia a decisão final em qualquer assunto, coadjuvado pelo seu sócio, GG, nos vários negócios e atividades empresariais que têm em comum.

27) O Grupo CC, apesar de constituído por, pelo menos, nove sociedades distintas, tem, em todas elas, como legais representantes e/ou sócios principais, direta ou indiretamente, o Sr. DD e/ou o Sr. GG.

28) A estrutura administrativa e logística é partilhada pelas várias empresas do “Grupo CC” de forma a rentabilizar e racionalizar os custos.

29) Apesar de possuírem sedes estatutárias diferentes, as empresas do Grupo CC – entre elas, as ora rés – funcionavam ou eram geridas a partir de um único local: o ..., sito na Rua ..., ..., em Lisboa, local de trabalho do ora A. e dos demais trabalhadores das rés.

30) As funções desempenhadas pelo autor incluíam o cálculo de custos e de preços, a gestão da força de vendas, bem como participação na definição, coordenação e controlo das políticas comerciais e estratégia a adotar, e ainda negociação com alguns clientes e o lançamento e apresentação de novos produtos.

31) A partir de 2002 os contratos comerciais da 1.ª ré passaram para a 2.ª ré, tendo esta passado a ser a única cliente daquela.

32) O Autor continuou a prestar trabalho a ambas as rés, embora fosse a 1.ª R. a emitir o seu recibo de vencimento mensal.

33) Entretanto, com o passar do tempo, o pagamento da retribuição correspondente às comissões (percentagem das vendas) relativas ao “negócio de exportação” não era efetuado ou era pago parcialmente.

34) E cada vez que o autor reclamava o respetivo pagamento era-lhe dada uma explicação relacionada com os restantes negócios do Grupo CC, assegurando-lhe, no entanto, o representante legal das rés, DD e o sócio deste, GG, que sabiam que a dívida se estava a acumular, mas que ficasse tranquilo que iriam saldar a mesma.

35) Em meados do mês de Julho de 2006 o autor reclamou o pagamento imediato e total do montante da retribuição em dívida correspondente às comissões (percentagem das vendas) relativas ao negócio de exportação e que à data, ascendia a cerca de € 184.000,00.

36) Tendo-lhe o representante legal das rés, DD, dito que tinha em mente um dia propor-lhe uma eventual sociedade numa das empresas que detêm, argumentando ser uma ótima oportunidade para ambas as partes, proposta que o autor nem sequer considerou.

37) Em Setembro de 2006 e depois de várias reuniões efetuadas entre o autor e os Srs. DD (representante legal das rés) e GG, as rés colocaram o Sr. HH, que já colaborava com aqueles em alguns projetos da 2ª ré, a desempenhar as funções exercidas para a 2.ª ré pelo autor, que, a pedido das rés, prestou colaboração àquele.

38) Foi o autor que apresentou o Sr. HH aos clientes mais importantes da divisão de distribuição, representações, importação e vendas do Grupo CC – i.e. aos clientes II (II), JJ (JJ e JJ), KK, LL, MM, NN e OO –, na medida em que, até então, os mesmos lidavam diretamente com o A. inicialmente por serem clientes da 1.ª ré, e, a partir de 2002, por serem clientes da 2.ª R.

39) Em Outubro de 2006 em reunião havida entre o autor e o Sr. DD para tentar solucionar as contas respeitantes à retribuição em dívida correspondente às comissões sobre as vendas ainda não pagas pelas rés ao autor, aquele levantou a hipótese de que parte da dívida fosse saldada através de um bem móvel (automóvel ...).

40) Nos meses de Novembro e Dezembro de 2006 o autor não recebeu a sua retribuição.

41) No dia 19 de Janeiro de 2007 foi emitida pela 1ª ré e entregue ao autor a respetiva declaração de rendimentos, relativa ao ano de 2006, onde não consta o valor das retribuições dos meses de Novembro e Dezembro de 2006 que eram declaradas.

42) No dia 24 de Janeiro de 2007, verificou o autor que havia sido efetuada uma transferência bancária no valor de € 1.068, e dias depois uma outra no valor de € 358.67, relativas às retribuições declaradas.

43) O autor possuía cartões profissionais (em inglês e português) nos quais figurava como Diretor Comercial da 2.ª ré.

44) O nome de domínio do endereço profissional de e-mail do autor era constituído pelas iniciais da firma da 2.ª ré, CC.

45) O autor, a partir de 2002, contactou, foi contactado, negociou e concluiu transações com os clientes da 2.ª ré, assumindo-se como Diretor Comercial da mesma, tendo concluído, nessa qualidade, diversos contratos comerciais celebrados com a 2.ª ré.

46) Tal como anteriormente o fazia para a 1.ª ré, bem como continuou a coordenar e a chefiar a mesma equipa de trabalho, a qual desde sempre foi composta por trabalhadores da 2.ª ré ou por prestadores de serviços contratados por esta como vendedores, exercendo as funções no mesmo local de trabalho, ou seja, na morada “operacional” das rés, sita no ..., sito na Rua ..., ..., em Lisboa, e com o mesmo número de telefone, com o mesmo número de telemóvel e até com o mesmo endereço eletrónico.

47) Em 9 de Fevereiro de 2007, o autor enviou à ré BB, para as respetivas instalações sitas Rua ..., …, ..., … Lisboa, mediante carta registada com aviso de receção, uma comunicação do seguinte teor: “Lisboa, 8 de Fevereiro de 2007, Exmos. Senhores, Depois de várias tentativas da minha parte no sentido de V. Exas. me pagarem o montante que se encontra em dívida para comigo correspondente ao "Acordo de Exportação", por nós firmado no ano de 2000, bem como o pagamento da minha retribuição, na parte que não figura no respetivo recibo de retribuição (por imposição de V. Exas.), e tendo em conta que o montante é muito elevado já que ascende presentemente a um valor superior a € 184.000,00, não pode esta situação continuar a prolongar-se no tempo, tanto mais que V.Exas. não demonstram qualquer intensão de procederem ao pagamento desta dívida. Ora, tal atitude põe irremediavelmente em causa o contrato de trabalho existente entre mim e a "BB", configurando justa causa de rescisão do aludido contrato. A existência desta dívida e a pretensão de V. Exas. em não pagarem a mesma, traduz uma lesão culposa dos meus interesses patrimoniais, e que nos termos da Lei, justifica a presente rescisão do Contrato de Trabalho por justa causa, que dará lugar também às consequentes indemnizações legais. Nesta conformidade, e cessando imediatamente o contrato de trabalho nos termos da Lei, aguardo contacto de V. Exas. no prazo de 8 dias úteis, após o recebimento da presente carta, para regularização desta situação. Sem outro assunto, apresento os meus melhores cumprimentos. Atentamente”.

48) Esta carta referida não foi recebida, tendo sido devolvida ao autor com indicação de “Recusado pelo destinatário 12/2/2007”.

49) Desde o dia 9 de Fevereiro de 2007, inclusive, o autor deixou de comparecer no seu local de trabalho, as instalações sitas na Rua ... …, em Lisboa.

50) No dia 21 de Fevereiro de 2007, o autor entregou na receção da ré BB S.A. sem efetuar qualquer afirmação quanto à sua ausência e, sem dar qualquer explicação sobre a mesma, os seguintes objetos, pertencentes à ré e que se encontravam na sua posse, para o desempenho das suas funções a saber.

51) Os documentos diversos relativos ao veículo automóvel matrícula: ...-PD, 2 chaves do veículo automóvel matrícula: ...-PD, diversas peças relativas ao veículo automóvel matrícula: ...-PD, 2 cartões de telemóvel ..., cartão gasolina ..., cartão MM, Cartão de crédito ....

52) Nessa altura, encontrava-se presente nas instalações das rés o administrador da 1.ª ré e sócio-gerente da 2.ª ré, DD, que se recusou a receber o autor, bem como se recusou a receber os bens em causa e a assinar o auto de entrega, tendo os mesmos sido recebidos por um empregado das rés, PP, e o auto de entrega apenas assinado pelo autor e pela testemunha que o acompanhava, QQ.

53) Em 2 de Março de 2007, a Dra. RR – à data, mandatária do autor – solicitou à 1.ª ré, via fax, o envio do certificado de trabalho e do modelo oficial para entrega na Segurança Social, fazendo seguir com o dito fax cópia da carta enviada pelo autor à 1.ª ré no dia 9 de Fevereiro de 2007, tendo nesse mesmo dia enviado, sob registo e com aviso de receção, uma carta para as instalações das réus e ali recebida, à qual anexou cópia integral do fax referido, incluindo a carta enviada pelo autor à 1.ª ré, no dia 9 de Fevereiro de 2007.

54) A ré BB S.A., enviou ao autor, no dia 1 de Março de 2007, carta registada   

55) com aviso de receção, comunicando-lhe a cessação do seu contrato de trabalho, por abandono do trabalho, nos termos do disposto no artigo 450º do C.T., tendo a mesma sido devolvida com a indicação de não reclamada.

56) No dia 2 de Março 2007, a ré, BB S.A. entregou no Tribunal Judicial de Oeiras, notificação judicial avulsa, com o mesmo conteúdo, para que o autor fosse judicialmente notificado que o contrato de trabalho que mantinha com a referida ré se considerava cessado, por abandono de lugar, nos termos do disposto no artigo 450º do Código do Trabalho.

57) Nessa sequência não foi possível citar o autor, tendo sido lavrada pelo funcionário judicial certidão negativa do seguinte teor: “Certifico que no dia 17 de Abril de 2007, me desloquei à Av. ..., nº…, …., em ... pelas 16 horas. Não se encontrava ninguém na morada, nem foi possível falar com nenhum vizinho, pois ninguém se encontrava em casa. Voltei ao local no dia 19 de Abril do corrente ano, por volta das 18 horas 15 minutos e não foi possível, mais uma vez, efetuar a citação, pois ninguém se encontrava no local”.

58) A ré BB S.A., enviou ao autor, a carta no dia 1 de Março de 2007, bem como no dia 2 de Março 2007, requereu a notificação judicial avulsa para a morada que constava do processo individual do autor.

59) As rés foram citadas no presente processo para comparecer na audiência de partes no dia 11.05.2007, mediante cartas de citação expedidas no dia 7.05.2007, constando da petição inicial que o autor reside na Rua P…, nº 10 - …., ....

60) O Autor gozava de diversos benefícios, entre os quais se incluía a possibilidade de utilização de um cartão de crédito até ao limite de € 2.500, bem como “...” e cartão de combustível “…” e, apesar de tais despesas serem suportadas pelas rés e debitadas em contas bancárias destas, para facilitar o controlo e monitorização das mesmas pelo autor, os respetivos extratos e correspondência às mesmas relativa eram enviados diretamente para a morada do autor sita na Rua …, … Esq., ..., sendo os extratos referidos, após análise e conferência do autor, entregues por este na contabilidade das rés alguns desses extratos, apesar de enviados para a indicada morada do autor, vinham dirigidos à 1.ª ré.

61) Em data que o autor não pode precisar, mas seguramente há mais de 7 anos, o DD, administrador da 1.ª ré e sócio-gerente da 2.ª ré, visitou o autor, pelo menos, duas vezes, na residência deste sita na Rua ..., nº ….

62) No sobrescrito, bem como no aviso de receção, da carta enviada à 1.ª ré no dia 9 de Fevereiro de 2007 para a morada onde funcionam as instalações de ambas as rés, e que foi recusada pelo destinatário, ia indicada a morada do autor como “Rua ..., nº …., ...”.

63) Por sua vez do relatório pericial elaborado na sequência de perícia colegial determinada no âmbito deste incidente com data de 09 de Fevereiro de 2017 consta os seguintes factos com relevo:” Quanto a quesito nº 1 - Qual o volume de vendas do negócio de exportação – vendas internacionais – da requerida CC entre os anos 2000 e 2006 (ambos incluídos).

64) O volume de vendas do negócio de exportação – vendas internacionais – da requerida CC, traduz-se nos valores apresentados no quadro abaixo: Vendas Internacionais da Requerida CC: Valores em Euros.

65) 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006

66) Vendas de exportação para Mercado Comunitário,

67) 46.591,49, 727.942,54, 1.558.747,03, 671.002,03, 380.617,00 237.121,27, 68) Vendas de exportação para Países Terceiros,

69) 10.033,57 a) 5.371,50 1.169,50 35.149,92 6.774,00 7.840,00

70) Total vendas internacionais da Requerida CC,

71) 56.625,06 a) 733.314,04 1.559.916,53 706.151,95 387.391,00 244.961

72) A informação acima identificada, foi obtida através de: - declaração Anual submetida pela requerida CC à Administração Tributária, para os anos de 2000 e 2005, informação empresarial simplificada submetida pela Requerida CC à Administração Tributária, para o ano de 2006, Balancetes Analíticos da Contabilidade da Requerida CC, para os anos de 2002, 2003 e 2004.

73) Os valores relevados, estão em consonância com os valores que o requerente apresentou ao Tribunal.

74) No que respeita ao ano de 2001, não foi fornecida aos peritos qualquer informação que possibilite responder à questão pois os peritos foram informados, que a gerência da empresa já não dispõe atualmente destes documentos.

75) Quanto ao quesito nº 2 – “Qual o volume de vendas realizadas pelo Requerente, por conta das Requeridas, no âmbito do “negócio exportação” no período compreendido entre os anos de 2000 e 2006”?

76) Tendo em consideração a informação disponibilizada no quesito nº 1 e as fontes de obtenção dos valores mencionados, não é possível a segregação entre o volume de vendas do total das exportações, e os valores a atribuir ao requerente.

77) A única informação que se obtém através da contabilidade, serão as vendas totais de exportação, sem se saber quais as realizadas pelo requerente.

78) Quanto ao quesito nº 3 – “Qual a percentagem acordada entre requerente e requeridas em relação a cada uma das vendas por si realizadas?”

79) Não existe na documentação disponibilizada pelas requeridas qualquer menção à percentagem acordada entre estas e o requerido para as vendas realizadas, e desta forma, não foi possível apurar no relatório pericial qual a percentagem acordada entre as partes.

80) Não existe na informação disponível pelas requeridas qualquer pagamento ao requerente em relação a cada uma das vendas por si realizadas.

81) Quanto ao ano 2000- o anexo J das declarações anuais submetidas pelas Requeridas CC e BB à Administração Tributária, têm identificados os sujeitos passivos que receberam comissões das requeridas e o requerente não está identificado como tendo recebido quaisquer valores de comissões.

82) Quanto ao ano 2001 não existe qualquer informação disponível, que possibilite no relatório pericial responder à questão colocada.

83) Quanto aos anos de 2002 a 2006- através da análise da contabilidade das requeridas CC e BB, desde o ano de 2002 a 2006, e mais concretamente da conta corrente das comissões e detalhe dos respetivos lançamentos, conclui-se que não houve comissões pagas/lançadas para o requerente.

84) Quanto ao quesito nº 4 – “Qual o montante já liquidado ao Requerente pelas requeridas por conta desta remuneração variável?”

85) Para o ano de 2000 apenas se dispõe para efeitos de perícia das declarações anuais submetidas pelas requeridas à Administração Tributária, não existindo pois evidência que foram atribuídas/pagas ao requerente quaisquer valores de remunerações variáveis indexadas às vendas neste ano.

86) No que respeita ao ano de 2001, não foi fornecida aos peritos qualquer informação que possibilite responder à questão em causa no âmbito do relatório pericial tendo sido estes informados, que a gerência da empresa já não dispõe atualmente destes documentos.

87) Entre os anos de 2002 e 2006, a contabilidade das requeridas não espelha quaisquer valores de remunerações variáveis indexadas às vendas e atribuídos/pagos ao requerente.

88) Existem em ambas as empresas aqui requeridas, valores em conta corrente em nome do requerente., a saber:

89) Na empresa BB, o requerente, para além de receber um salário fixo mensal, também apresenta despesas inerentes à utilização de uma viatura do ativo da BB, bem como recebe reembolsos de outras despesas diversas.

90) Na empresa CC, o Requerente não tem salário mensal, nem apresenta despesas de utilização de qualquer viatura apresentando despesas de utilização de um cartão de crédito em nome da CC.

91) Entre os anos 2002 e 2006, existem movimentos na contabilidade das requeridas e em nome do requerente i.e. 22.258,21 € da requerida BB e 18.227,02 € da requerida CC, por conta de despesas de viatura, utilização de cartão de crédito e outras diversas.

92) Durante o mesmo período referido, apresentou documentos relacionados com as despesas à requerida BB, no montante total de 18.099,15 € e à Requerida CC no montante total de 15.822,43 €, existindo saldos devedores em aberto de 4.159,06 € na requerida BB e de 2.404,59 € na requerida CC”.

93) Veio-se a concluir-se no relatório pericial dos autos não existir na informação disponibilizada pelas rés/requeridas, qualquer menção a remunerações variáveis indexadas às vendas (percentagem sobre vendas) atribuídas/pagas ao requerente para os períodos em análise, tudo como consta desse documento/ relatório pericial constante dos autos a fls. 1417 a 1422, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

94) O Autor/ requerente era o único responsável pelas vendas no exterior e pelo negócio de exportação, desde o segundo trimestre de 2000, para as rés, primeiramente para a 1ª) Ré/ requerida e após para a 2ª Ré/ requerida nos termos do acordo celebrado tendo realizado diversas deslocações ao exterior para a referida finalidade.»


III

1 – As instâncias liquidaram o valor das comissões sobre vendas que integravam a retribuição do requerente em quantitativos substancialmente diversos, embora em ambos os casos se tenha recorrido à equidade como forma de encontrar esse valor.

Assim, na decisão proferida na sentença da 1.ª instância fundamentou-se o decidido nos termos seguintes:

«Portanto seguindo o critério referido de julgamento como acima exposto, segundo a equidade nos termos do disposto no n° 3 do artigo 566° do CC (e porque não foi possível apurar o concreto valor devido ao Autor e que corresponde genericamente ao dano por este sofrido do não pagamento da retribuição da quantia devida a título de comissões pelos negócios de exportação) temos que para efeitos de calculo desse valor segundo a equidade que considerar desde logo os factos provados que acima constam.

Verifica-se da matéria factual que acima consta, com relevo que em meados do mês de Julho de 2006 o autor reclamou o pagamento imediato e total do montante da retribuição em dívida correspondente às comissões (percentagem das vendas) relativas ao negócio de exportação e que, à data, ascendia a cerca de € 184.000.00, tendo-lhe o representante legal das rés, DD, dito que tinha em mente um dia propor-lhe uma eventual sociedade numa das empresas que detêm, argumentando ser uma ótima oportunidade para ambas as partes, proposta que o autor nem sequer considerou, mais resultando que este valor que o autor sempre exigiu como sendo o devido pelas rés nunca foi pago, decorrendo também dos factos que as rés admitiram que estava em divida (e logo por isso propuseram uma eventual sociedade que não foi aceite). E resulta também que foi com esse fundamento que o Autor visou pôr termo ao contrato de trabalho em causa, invocando justa causa para tal mais resultando ainda que era o Autor o único responsável pelo negócio de exportação e que este exclusivamente procedia às vendas (e logo aos negócios) nesse âmbito.

Mais ainda resulta - à evidência - que apesar das Rés/requeridas negarem a existência da divida perante o Autor nesse montante, a realidade é que em fase alguma do processo vieram elas próprias impugnar os factos alegados pelo Autor quanto a tal quantia não pondo em causa neste âmbito, nem a dívida, nem o acordo de pagamento de percentagem das comissões) mas dizendo que apenas que essa não era a quantia devida - mas sem indicar outra, e sem indicar que vendas foram realmente feitas pelo Autor, e qual a percentagem acordada quanto a cada um dos negócios pelo Autor celebrados.

Ora assim sendo, ponderando todos estes elementos provados nos autos, bem assim como a posição das Rés/requeridas (impugnando apenas genericamente os factos alegados pelo Autor mas nada apontando em termos de valores que considerassem adequados) resulta desde logo que não se nos afigura que possa existir fundamento sério para não considerar (tanto mais que também o relatório pericial considerou que os elementos apresentados pelo Autor se encontravam conformes à realidade, não sendo possível nada mais neste âmbito concluir por falta de elementos suporte da Ré em termos documentais) que a quantia referida pelo Autor nos termos do seu requerimento inicial deste incidente, segundo critérios de equidade (tendo em conta os factos, e regras de experiência comum) se afigura ajustada, no caso em concreto dos autos devendo assim ser fixada.

Assim sendo pode concluir-se que este incidente de liquidação deverá ser julgado procedente, e segundo regras de equidade deverá liquidar-se a quantia devida pelas Rés/requeridas ao Autor/requerente, a título de retribuição variável correspondente as retribuições - em divida ao mesmo - devidas a título de comissão pelo negócio de exportação, na quantia de 184,683,00 euros - valor que nos termos da decisão condenatória proferida na ação declarativa principal deverá ainda ser acrescida de juros de mora contados desde a data da citação até integral pagamento sendo os vencidos até à data de entrada em juízo deste incidente de liquidação no valor de 51,30600 euros.»

2 - O Tribunal da Relação respondeu às questões que integram o objeto do presente recurso nos seguintes termos:

«A condenação, transitada em julgado, objeto da presente liquidação, foi nos seguintes termos: “Condenar as rés “BB, SA” e “CC, Lda” a pagar ao autor AA a quantia que se vier a liquidar em execução de sentença a título de retribuição correspondente às comissões (.) devidas pelo negócio de exportação acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% até integral e efetivo pagamento.”

Não se tendo conseguido apurar nos autos declarativos, refletido nos factos provados nºs 10 e 24, qual o volume das vendas do negócio de exportação nem a percentagem concreta da comissão a incidir sobre o volume de vendas, que oscilaria entre 0% e 3%, logo no despacho de fls. 1288 se fixou, e bem, que os temas da prova seriam “o volume das vendas realizadas e a percentagem, entre 0% a 3%, concretamente acordada a título de comissões”.

A sentença recorrida considerou que não foi possível determinar em concreto qual a percentagem das comissões acordada e quais as vendas efetivamente realizadas, sobretudo por falta de elementos de suporte documentais.

Face a tal constatação, a Mmª Juíza a quo, verificou, através da peritagem efetuada, que os valores de vendas apurados na peritagem estão em consonância com os valores que o autor apresentou em tribunal e, recorrendo à equidade, no que fez também apelo ao comportamento das rés para com o autor e ao comportamento processual das rés, acabou por fixar o valor das comissões devidas ao autor pelo negócio da exportação, no valor pedido por este na liquidação, ou seja, € 184.683,00.

Dúvidas não existem de que nos autos se chegou a um impasse probatório que não permitiu saber com precisão qual o montante preciso das vendas e a percentagem das comissões a incidir sobre tais vendas.

Daí que, e bem, se tenha recorrido em 1.ª instância, ao apuramento através de critérios de equidade. Como esclarece José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, Vol. 1º, 3ª Ed. Coimbra Editora, pags. 701 e 702, esgotada a prova pericial, “Como último recurso, o juiz fixa equitativamente o montante da indemnização, nos termos do art. 566-3 do CC”.

Porém, não acompanhamos totalmente o raciocínio seguido na sentença recorrida.

Vejamos porquê. 

O problema em aberto decompõe-se em duas vertentes, como se viu: a) Valor das vendas; b) Percentagem das comissões.

Como veremos, para ambos os casos teremos de recorrer a critérios de equidade.

No que toca ao volume das vendas a considerar para os cálculos, importa desde já esclarecer uma imprecisão que as apelantes tentaram introduzir no âmbito deste recurso sustentando que a peritagem efetuada apesar de ter apurado valores totais do negócio de exportação, não conseguiu estabelecer quais os valores concretos das vendas efetuadas pelo autor, pois seria sobre estas últimas que iriam incidira as percentagens das comissões.

Acontece que da matéria de facto provada, quer no âmbito declarativo quer agora em fase de liquidação, resulta, com muita clareza, que as comissões não incidiam sobre as vendas realizadas pelo autor mas sobre o volume global de vendas de exportação do negócio das rés. Tal retira-se dos factos provados nºs 10 (vendas totais) e 24 (vendas geradas pelo negócio de exportação).

Aliás, o autor, ao serviço das rés, nunca teve funções de vendedor mas antes de “Diretor Comercial” (factos nºs 43 e 45); “Responsável do Departamento de Vendas” (facto nº 9); “Responsável pela equipa de vendas” (facto nº 19); incluindo “o cálculo de custos e de preços, a gestão da força de vendas, bem como participação na definição, coordenação e controlo das políticas comerciais e estratégia a adotar, e ainda negociação com alguns clientes e o lançamento e apresentação de novos produtos” (facto nº 30); e de Coordenação e chefia de uma equipa de trabalho, a qual desde sempre foi composta por trabalhadores da 2.ª ré ou por prestadores de serviços contratados por esta como vendedores (facto nº 46).

Era pois, com base no volume total de vendas efetuadas no âmbito das rés no negócio da exportação que as percentagens das comissões tinham de incidir.

Os valores encontrados a propósito na peritagem efetuada nem mereceram discordância das rés, mas não houve elementos quanto ao ano 2001 (factos nºs 64, 65, 66, 67, 68, 69, 70 e 71).

Assim, tem de se dar como assente que, quanto aos anos 2000, 2002, 2003, 2004, 2005 e 2006, houve um valor global de vendas de exportação de € 3.688.359,85.

Porém, como resulta da peritagem efetuada, o valor para o ano 2000 resulta da declaração anual apresentada pela ré CC (facto nº 72) e como o autor só passou a ter estas comissões sobre as vendas de exportação a partir do segundo trimestre de 2000 (facto nº 24) reduzir-se-á em ¼ o valor apurado na peritagem para este ano, ou seja, para 42.468,80 (56.625,06: 4 x 3), pelo que o valor global de vendas de exportação a considerar, relativo aos anos de 2000, 2002, 2003, 2004, 2005 e 2006 e sobre que irá incidir a percentagem das comissões é de € 3.674.203,59.

No que toca ao ano de 2001, à míngua de quaisquer outros elementos probatórios de suporte, ter-se-ão em conta os valores anuais que antecede e segue os anos de 2001, ou seja, 2000 e 2002, e uma vez que tais valores refletem uma notória evolução positiva de vendas, entende-se como adequado atribuir-se ao ano 2001 um valor correspondente à média resultante dos anos 2000 e 2001. Deste modo atribui-se ao ano de 2001 um montante global de vendas de € 394.969,55.

Assim, o valor do volume total de vendas efetuadas no âmbito das rés no negócio da exportação para os anos de 2000, 2001, 2002, 2003, 2004, 2005 e 2006, sobre o qual as percentagens das comissões terão de incidir, é de € 4.069.173,14.

Quanto às percentagens a aplicar sobre aquele valor apurado para efeitos de determinar o montante das comissões devidas, apenas se sabe que variam entre 0% e 3% (facto nº 10).

À falta de melhor critério e quaisquer outros elementos dados como provados, tratando-se de uma percentagem variável, entendemos como equitativo estabelecer o valor da percentagem a aplicar naquilo que corresponde ao meio entre o mínimo e o máximo, ou seja em 1,5%.

Assim, o montante a que o autor teria direito a título de comissões é no valor de € 61.037,60 (4.069.173,14 x 1,5%), referente aos anos 2000, 2001, 2002, 2003, 2004, 2005 e 2006.

Como o autor, logo no art. 5º do seu requerimento inicial de liquidação disse que recebeu, a título de comissões, entre o ano 2000 e 2006, um total de € 25.750,00, este valor terá de ser deduzido àquele outro de € 61.037,60, pelo que a liquidação neste incidente se estabelece pelo valor de € 35.287,60.»

3 - Está em causa no presente processo a liquidação da retribuição variável do requerente que incidia sobre as vendas ao exterior das Rés.

Na fase declarativa do processo foi reconhecido esse direito ao Autor, embora o tribunal tivesse relegado a sua concretização quantitativa para liquidação.

Instaurado o incidente, nos termos do artigo 358.º e ss. do Código de Processo Civil, o Tribunal de 1.ª instância recorreu ao disposto no n.º 4 do artigo 360.º deste código, assumindo a dimensão oficiosa deste incidente que visa a definição do objeto do direito não concretizado na fase declarativa do processo.

Na verdade, nos termos deste dispositivo, «quando a prova produzida pelos litigantes for insuficiente para fixar a quantia devida, incumbe ao juiz completá-la mediante indagação oficiosa, ordenando designadamente a produção de prova pericial».

O Estado assume, assim, como uma função do sistema de Justiça a concretização dos direitos cuja existência se tenha tornado certa, por força do trânsito em julgado da decisão proferida na fase declarativa do processo.

É em nome deste princípio que a jurisprudência deste Tribunal vem afirmando, conforme decorre do acórdão de 29 de maio de 2014, proferido no processo n.º 130/09.3TBCBC.G1.S1[1] que «III - No incidente de liquidação, para lá de não haver qualquer ónus da prova por parte do exequente, a improcedência da liquidação, com o fundamento de que o exequente não fez prova, equivaleria, a um non liquet e violaria o caso julgado formado com a decisão definitiva (exequenda), que reconheceu ao credor um crédito que, afinal, contraditoriamente, lhe seria negado».

É também a dimensão da necessidade de concretização de um direito cuja existência decorre de uma decisão transitada que leva ao recurso à equidade como forma de realização daquele objetivo, sendo assumido pela jurisprudência deste Tribunal, nomeadamente no acórdão acima citado, que «II - Na quantificação dos danos, sendo insuficientes as provas oferecidas pelos litigantes, incumbe ao juiz, oficiosamente, completá-las (art. 380.º, n.º 4, do CPC)[2], não devendo ainda descartar-se o recurso à equidade.»

Na mesma linha de orientação caminha a Doutrina, referindo LEBRE DE FREITAS e ISABEL ALEXANDRE que «Sendo a prova produzida pelas partes insuficiente para a fixação da quantia devida, deve o Juiz completá-la oficiosamente, nos termos do art. 411, ordenando designadamente a produção de prova pericial, nos termos do art. 477. Como último recurso, o juiz fixa equitativamente o montante da indemnização, nos termos do art. 566-3 CC)»[3].

O apelo à equidade como forma de concretização de um direito judicialmente declarado, cujo conteúdo efetivo não resulta dessa declaração, impõe-se como recurso de última instância de forma a dar conteúdo útil à decisão judicial que declarou, mas não precisou, a dimensão efetiva do direito em causa.

A equidade, nos casos em que a lei expressamente prevê o seu uso, articula-se com a oficiosidade que caracteriza intervenção do Juiz nesta forma de realização da Justiça, mas implica um conjunto de tarefas para o julgador na resolução do caso, que não estão presentes, na mesma dimensão, de uma forma expressa, num normal processo de aplicação do Direito e na resolução de um litígio.

A equidade deixa um espaço aberto ao Juiz na realização do Direito do caso, exigindo-lhe que projete nas particularidades deste os princípios que caracterizam o sistema jurídico, fora de um quadro normativamente vinculado.

Deste modo, julgando com recurso à equidade, o Juiz realiza a Justiça do caso, sem estar sujeito a critérios juridicamente objetivados, mas não se afastando nunca dos princípios que enformam o sistema jurídico, globalmente considerado.

Conforme referiam PIRES DE LIMA E ANTUNES VARELA, a propósito do artigo 4.º do Código Civil, «o que passa a ter força especial, são as razões de conveniência, de oportunidade e principalmente de justiça concreta em que a equidade se funda. E o que fundamentalmente interessa é a ideia de que o julgador não está nestes casos subordinado aos critérios normativos fixados na lei»[4].

Por outro lado, há muito que a Doutrina afirmou que o julgamento com recurso à equidade não poderá conduzir a decisões arbitrárias.

Assim, JACINTO RODRIGUES BASTOS, referindo-se ao artigo 4.º do Código Civil, afirmava que «a palavra “equidade” é tomada aqui na aceção de realização da justiça abstrata no caso concreto, o que em regra, envolve uma atenuação do rigor da norma legal, por virtude da apreciação subjetiva do julgador. Mas se o juiz de equidade decide, não pelo ajuste do preceito legal às particularidades do caso, mas arbitrariamente, há violação da lei, que é sempre o comando, a ter, primeiramente, em conta»[5].

O julgamento com base na equidade vai impor ao juiz que procure os elementos relevantes em termos de caracterização do caso a decidir, suprindo, quando necessário as insuficiências da intervenção das partes, de forma a encontrar a solução para o litígio que exprima os mencionados princípios gerais.

As dimensões de Justiça, de equilíbrio, nomeadamente, dos interesses afetados pelo litígio, de proporcionalidade, são assim indissociáveis do julgamento com base na equidade e permitirão aferir se a decisão proferida respeitou esses princípios, ou se se pode considerar arbitrária.

Conforme refere TERESA TEIXEIRA DA MOTA, «o julgamento segundo a equidade confere ao tribunal a possibilidade de dar uma resolução ao litígio fundada em critérios de justiça, ao invés de recorrer às normas legais aplicáveis. Não obstante, a decisão de julgar segundo a equidade não só não impõe, como tão pouco acarreta necessariamente, o afastamento do enquadramento legal e a sua total substituição por critérios equitativos, naquilo que se designa por equidade substitutiva. As mais das vezes há apenas lugar a uma equidade corretiva, segundo a qual o tribunal socorrendo-se das normas legais aplicáveis, usa a equidade para as adaptar ao caso concreto, dando ao mesmo a solução que considera mais justa»[6].

4 - O julgamento com base na equidade coloca particulares problemas em termos de definição dos poderes de intervenção deste Tribunal na reapreciação, em sede de revista, dos acórdãos proferidos pelo Tribunal da Relação com recurso a essa forma de decidir.

A jurisprudência deste Tribunal tem-se debruçado sobre esta questão, no âmbito da responsabilidade civil, nomeadamente, em sede de liquidação de danos derivados de facto ilícito.

As considerações aí tecidas e as razões que fundamentam a linha de orientação estabelecida são igualmente válidas no âmbito do presente litígio.

Referiu-se, com efeito, sobre essa questão, no acórdão 28 de outubro de 2010, proferido no processo n.º 272/06.7TBMTR.P1.S1[7], o seguinte:

«Temos entendido que – quando o cálculo da indemnização haja assentado decisivamente em juízos de equidade, - ao Supremo não compete a determinação exata do valor pecuniário a arbitrar, já que a aplicação de puros juízos de equidade não traduz, em bom rigor, a resolução de uma «questão de direito», mas tão somente a verificação acerca dos limites e pressupostos dentro dos quais se situou o referido juízo equitativo, formulado pelas instâncias face à ponderação casuística da individualidade do caso concreto «sub juditio».

Como se afirma, por ex., no ac. de 5/11/09, proferido no p. 381-2002.S1[8]:

Finalmente – e no nosso entendimento – não poderá deixar de ter-se em consideração que tal «juízo de equidade» das instâncias, alicerçado, não na aplicação de um critério normativo, mas na ponderação das particularidades e especificidades do caso concreto, não integra, em bom rigor, a resolução de uma «questão de direito», pelo que tal juízo prudencial e casuístico das instâncias deverá, em princípio, ser mantido, salvo se o julgador se não tiver contido dentro da margem de discricionariedade consentida pela norma que legitima o recurso à equidade – muito em particular, se o critério adotado se afastar, de modo substancial, dos critérios que generalizadamente vêm sendo adotados, abalando, em consequência, a segurança na aplicação do direito, decorrente da adoção de critérios jurisprudenciais minimamente uniformizados, e , em última análise, o princípio da igualdade.

Na verdade, a substância do juízo de equidade, formulado pelas instâncias para obter o valor indemnizatório arbitrado ao lesado - podendo, porventura, revelar-se injusto ou inadequado às particularidades do caso concreto - não é, nem pode ser, quando considerado em si mesmo, «ilegal» ou violador do ordenamento jurídico objetivo, já que o apelo à equidade traduz precisamente a realização pelo julgador de juízos assentes em critérios não normativos, de modo a possibilitar ou corrigir uma rígida e estrita aplicação do direito às concretas e particulares situações da vida…

Já haverá, porém, «ilegalidade» ou violação de lei quando o juiz haja apelado indevidamente à equidade, formulando um juízo equitativo para solucionar determinado litígio, numa hipótese – ou num âmbito - em que a lei lhe vedava precisamente o recurso à equidade, impondo-lhe que o dirimisse antes segundo estritos critérios de índole normativa, extraídos da interpretação dos preceitos aplicáveis.»


IV


1 – Na decisão recorrida o Tribunal da Relação fixou num primeiro momento o valor global das vendas relevantes para o efeito do cálculo da retribuição variável do recorrente, o «valor do volume total de vendas efetuadas no âmbito das rés no negócio da exportação», que fixou no período em referência (entre 2000 e 2006) em € 4.069.173,14 e depois fixou a percentagem deste valor que era devida ao requerente, tendo por base os valores decorrentes do ponto n.º 10 da matéria de facto dada como provada, entre 0,% e 3%, em 1,5%.

Foi com base nestes parâmetros que a decisão recorrida alcançou o valor global de € 61.037,60 como valor das comissões nas vendas devidas ao requerente.

Insurge-se o recorrente contra estas operações referindo, em síntese, que em «nenhum local da matéria de facto considerada nos autos ficou adquirido ou demonstrado que a retribuição do A. devida pelo negócio de exportação - que é diversa da retribuição provada no facto 10 supra - se continha dentro dos limites de 0% e 3%», e que «Aquilo que resulta da sentença a liquidar, proferida nos autos em 13/09/2013, maxime do ponto 10) da matéria de facto provada, é que a percentagem de entre 0% e 3% respeita a vendas totais que nada têm a ver com o negócio de exportação, do qual são independentes e, aliás, anteriores ao início deste» e «que ficou provado e resulta da sentença a liquidar já transitada - e é isso que agora importa – é que a retribuição do negócio de exportação acrescia à acima referida e apenas surgiu mais tarde, a partir do segundo trimestre do ano 2000, altura em que o recorrente passou a desempenhar funções também para a requerida CC».

Realça que «Como alegado no requerimento inicial do incidente de liquidação, tal valor corresponde a 1/3 do lucro total do negócio de exportação entre 2000 e 2006, e não a comissões fixadas entre 0% e 3% sobre o volume das vendas;» e que «A diferença existe porque em cada um de tais pontos da matéria de facto se trata de factualidade diversa: • no ponto 10 refere-se uma percentagem entre 0% e 3% sobre vendas totais a acrescer à retribuição fixa paga desde 1998; • no ponto 24 refere-se uma retribuição variável correspondente a uma percentagem não concretamente apurada sobre as vendas geradas pelo negócio de exportação.»

As pretensões do recorrente carecem de fundamento válido.

2 - Na verdade, decorre da matéria de facto dada como provada que o Autor entrou «ao serviço da 1.ª ré para exercer as funções de Responsável do Departamento de Vendas, em Abril de 1998, por conta e sob a autoridade, direção e fiscalização da mesma 1.ª ré, através da celebração de um contrato de trabalho sem termo e verbal» e que, para além do mais, «o autor auferia uma remuneração de 80.000$00 por mês (€ 400,00 que se manteve até à cessação do contrato de trabalho do autor), acrescida de um montante de até 3% das vendas, ou seja, um montante variável entre 0% (zero por cento) a 3% (três por cento) do valor das vendas calculado em função das vendas totais, e dos objetivos atingidos».

 Resulta igualmente que «Por razões meramente contabilísticas e fiscais apenas era declarado no seu recibo de vencimento o montante de 80.000$00, bem como o montante do subsídio de alimentação» e que «O pagamento dos montantes relativos às comissões sobre as vendas seria pago através de transferência bancária efetuada através de uma empresa sediada na Inglaterra, com periodicidade variável, bem como através de transferência bancária diretamente de uma conta bancária em Portugal em nome do Sr. DD».

Mais resulta da matéria de facto dada como provada que o autor «recebeu as seguintes quantias relativas a comissões sobre as vendas» discriminadas nos pontos n.ºs 13 e 14, no primeiro caso pagas nos anos de 1999, 2000 e 2001 e no segundo nos anos de 1998, 1999, 2000,2002, 2003, 2004, 2005 e 2006. 

Por outro lado, decorre ainda da matéria de facto dada como provada que o Autor recebeu relativamente a comissões de vendas outros valores nas circunstâncias referidas no ponto n.º 15.

Resulta também da matéria de facto dada como provada que «A partir do segundo trimestre de 2000, em data que já não sabe precisar, o autor – apesar de continuar a trabalhar para à 1.ª ré e de esta continuar a pagar-lhe a parte declarada da sua retribuição – passou também a trabalhar para a 2.ª ré, auferindo, em contrapartida da atividade prestada a esta última, a retribuição acordada de uma percentagem não concretamente apurada sobre as vendas geradas pelo negócio de exportação, que seria paga com periodicidade variável, através de transferência bancária efetuada através de uma empresa sediada no estrangeiro».

Com interesse, no âmbito da resposta às questões suscitadas, decorre ainda da matéria de facto dada como provada que «A partir de 2002 os contratos comerciais da 1.ª ré passaram para a 2.ª ré, tendo esta passado a ser a única cliente daquela» e que «O Autor continuou a prestar trabalho a ambas as rés, embora fosse a 1.ª R. a emitir o seu recibo de vencimento mensal».

3 - Ponderada globalmente a matéria de facto dada como provada, da mesma resulta que o requerente não fez prova do facto que invoca como fundamento da crítica que dirige à decisão recorrida, nomeadamente, que o valor das comissões sobre vendas que lhe era devido correspondesse a «1/3 do lucro total do negócio de exportação entre 2000 e 2006, e não a comissões fixadas entre 0% e 3% sobre o volume das vendas».

Acresce que a matéria de facto dada como provada não permite estabelecer qualquer diferenciação entre as comissões a que se refere o ponto n.º 10 e as que são referidas no ponto n.º 24 da mesma matéria de facto.

4 - Por outro lado, o recorrente insurge-se igualmente contra o facto de o Tribunal ter descontado no valor alcançado relativo às comissões sobre vendas devidas ao recorrente do quantitativo que o mesmo diz já ter recebido.

A pretensão do recorrente no sentido de que o tribunal não podia fazer uso desse facto por si assumido para determinação do valor global das comissões de vendas que lhe eram devidas carece de qualquer fundamento.

Trata-se efetivamente de um facto assumido pelo próprio requerente, ou seja confessado, que o Tribunal tomou em consideração, uma vez que lhe incumbia decidir (ponto n.º 7 da matéria de facto dada como provada), por um lado, o valor global das vendas em causa e, por outro, a percentagem nessas vendas que ao requerente era devida.

Encontrado o valor global das vendas em causa e assumido de forma relevante que o Autor já tinha recebido um concreto quantitativo relativamente a essas comissões, o tribunal não podia condenar as rés a pagar-lhe o valor global alcançado.

Acresce que, conforme decorre dos pontos n.º 13 e 14 da matéria de facto dada como provada, foram pagos ao autor, entre 2000 e 2006, os valores al discriminados relativos a comissões de vendas.

Por outro lado, não pode olvidar-se, tal como acima se referiu, a dimensão oficiosa que está subjacente à intervenção do tribunal em sede de liquidação, conforme decorre do n.º 4 do artigo 360.º do Código de Processo Civil, e o recurso a critérios de equidade que sempre legitimariam o recurso aos elementos que do processo decorram e que permitam a quantificação do direito em liquidação, numa base de justiça. Seria atentatório dos mais elementares princípios de Justiça condenar as Rés a pagar ao Autor um quantitativo que este reconhece já ter recebido.

Finalmente, importa que se tenha presente que o Tribunal Relação, tal como o da 1.ª instância, julgava nos quadros da equidade, nos termos do n.º 3 do artigo 566.º do Código Civil e que, de acordo com a jurisprudência estabilizada, a intervenção deste Supremo Tribunal nas situações de fixação de indemnização com base em juízos de equidade tem limites derivados da natureza desta forma de julgamento que não insuscetíveis de sindicância no âmbito do recurso de revista.

Com efeito, à luz dos elementos decorrentes da matéria de facto dada como provada, não pode afirmar-se que a decisão proferida pelo Tribunal da Relação, na sua globalidade, se possa considerar arbitrária, bem como proferida à revelia das particulares circunstâncias do caso e desproporcional relativamente à dimensão dos interesses em litígio.

Não se trata, pois, de uma decisão violadora dos corolários do princípio da Justiça que enquadram a intervenção dos tribunais no julgamento de acordo com regras de equidade.

A decisão recorrida não merece, pois, qualquer censura, no que se refere à fixação do valor global das vendas relevantes, bem como por ter aplicado a percentagem referida no ponto n.º 10 da matéria de facto dada como provada ao valor das vendas alcançado, sendo certo que a própria percentagem fixada – 1,5% - a encontrar entre 0.0% e 3%, se mostra equilibrada e respeitadora dos parâmetros a que deve obediência um julgamento realizado com recurso a um juízo de equidade.


V

Em face do exposto, acorda-se em negar a revista e em confirmar a decisão recorrida.

Custas pelo recorrente.

Junta-se sumário do acórdão.

Lisboa, 9 de janeiro de 2019

António Leones Dantas (Relator)

Júlio Gomes

Ribeiro Cardoso

_______________________
[1] Disponível nas Bases de Dados Jurídicas da DGSI.
[2] Cfr. Artigo 360.º, n.º 4 do Código de Processo Civil em vigor.
[3] Código de Processo Civil Anotado, Volume I, 3.ª Edição, Coimbra Editora, 2014, p.p. 701 e 702.
[4] Código Civil anotado, Volume I, Coimbra Editora, 4.ª Edição, 1987, p.p. 54 e 55.
[5] Das Leis, Sua Interpretação e Aplicação, 2.ª edição, 1978, p.30.
[6] Comentário do Código Civil, Universidade Católica Editora, 2014, p. 32.
[7] Disponível nas Bases de Dados Jurídicas da DGSI.
[8] Disponível nas Bases de Dados Jurídicas da DGSI, com o n.º 381-2002.S1.