Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
290/13.9TMSTB-A.E1.S1
Nº Convencional: 7ª SECÇÃO
Relator: ANTÓNIO JOAQUIM PIÇARRA
Descritores: ALIMENTOS DEVIDOS A MENORES
FUNDO DE GARANTIA DE ALIMENTOS
PRESTAÇÃO
DETERMINAÇÃO DO VALOR
ALTERAÇÃO
INCUMPRIMENTO
RECURSO DE REVISTA
ADMISSIBILIDADE DE RECURSO
UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Nº do Documento: SJ
Data do Acordão: 10/19/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDAS AS REVISTAS
Área Temática:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL – PROCESSO DE DECLARAÇÃO / RECURSOS / RECURSO DE REVISTA.
DIREITO CIVIL – DIREITO DA FAMÍLIA / ALIMENTOS.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 629.º, N.º 2, ALÍNEA C), 635.º, N.º 4, 639º E 671.º, N.º 2, ALÍNEA A).
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 2003.º, N.ºS 1 E 2 E 2004.º, N.º 1.
REGIME GERAL DO PROCESSO TUTELAR CÍVEL, APROVADA PELA LEI N.º 141/2015, DE 08 DE SETEMBRO (RGPTC): - ARTIGO 42.º E SS.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:


- DE 07-07-2009, PROCESSO N.º 682/09, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 19-03-2015, PROCESSO N.º 252/08.8 TBSRP-A-A.E1.S1-A), IN DR, 1ª SÉRIE, N.º 85, DE 4 DE MAIO DE 2015, E WWW.DGSI.PT.
Sumário :
I - Alicerçando-se ambos os recursos de revista em ofensa a jurisprudência uniformizada do STJ, encontram arrimo nos art.ºs 671º, n.º 2, alínea a), e 629º, n.º 2, alínea c), do Cód. Proc. Civil, e são admissíveis, independentemente do valor da causa e da sucumbência.

II – Os montantes das prestações alimentícias devidas pelos progenitores por cada um dos menores, devem ser fixadas individualizadamente, tendo em conta as respectivas necessidades com o sustento, habitação, vestuário instrução e educação (art.ºs 2003º, n.ºs 1 e 2, e 2004º, n.º 1, do Cód. Civil).

III – Sendo três os menores e tendo a sentença fixado, global e conjuntamente, os alimentos em €200,00 mensais, sem nenhuma diferenciação quanto às necessidades deles, a pensão alimentar de cada um corresponderão a um terço dessa quantia, ou seja, €66,67 mensais.

IV - Será este (e não o global) o valor e tecto a atender na determinação da prestação subsidiária a suportar pelo FGADM.

V – A sua elevação, no seio do incidente de incumprimento, na medida em que não deixa de envolver um montante superior ao da prestação de alimentos a que está vinculado o devedor originário (€100,00 versus €66,67), contraria a jurisprudência uniformizada pelo acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19 de março de 2015 (processo nº 252/08.8 TBSRP-A-A.E1.S1-A).

VI - A elevação da prestação terá de passar previamente pela sua alteração, no âmbito do procedimento previsto nos art.ºs 42º e ss. do RGPTC, e só depois imposta ao FGADM.

VII - Nada autoriza saltar essa etapa e, no próprio incidente de incumprimento, proceder à elevação da prestação e, de imediato, impô-la ao FGADM.

Decisão Texto Integral:
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:



Relatório


I – Por apenso à respectiva acção de regulação do exercício de responsabilidades parentais, na qual fora fixada a pensão global de €200,00 mensais, a favor dos menores AA, BB e CC, a suportar pelo progenitor, deduziu a progenitora, DD, incidente de incumprimento contra EE, alegando que este não tem pago a pensão alimentar, nem tem condições para o fazer, desse modo, culminando por pedir que tal encargo seja imposto ao Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores.

Por decisão, datada de 18.09.2015, reconheceu-se, quer o incumprimento do progenitor, quer a impossibilidade de cobrança dos montantes já devidos e vincendos, e consequentemente condenou-se o Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores a pagar, a favor dos 2 filhos ainda menores da requerente e do requerido, a prestação mensal de €200,00.

Inconformado com essa decisão, apelou o Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, com parcial êxito, tendo o Tribunal da Relação de Évora, por maioria, fixado a prestação devida pelo referido Fundo de Garantia em €100,00 mensais a favor apenas da ainda menor CC.

Discordando do decidido na 2ª instância, interpuseram o Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social e o Ministério Público recursos de revista, finalizando o primeiro a sua alegação, com as conclusões que se transcrevem:

1 - Do douto acórdão recorrido é admissível recurso, independentemente do valor da causa e da sucumbência, nos termos das disposições conjugadas dos art.s 629º, n.º 2, alínea c), e 671º, n.º 1, do CPC, dado que tendo sido proferido no âmbito da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, se encontra em contradição com jurisprudência uniformizada do Supremo Tribunal de Justiça.

2 - No douto acórdão de 09 de Fevereiro de 2017 proferido nos autos à margem indicados, julgou-se parcialmente procedente a apelação e decidiu-se"... fixar a prestação social a cargo do Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores, referente à menor CC, em 100,00 mensais, quantia essa superior ao montante de €66,67 que se encontrava fixado para o progenitor devedor de alimentos.

3 - Diz-se na síntese do douto acórdão ora recorrido que "... em princípio, nada impede que, perante uma prestação alimentícia fixada judicialmente, em determinado valor mensal, referente a três menores, se estabeleça, em caso de incumprimento do devedor e face à impossibilidade de cumprimento coercivo, uma "prestação social" substitutiva a cargo do Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores, no mesmo valor ainda que respeitante apenas a um, por os outros dois terem, entretanto, atingido a maioridade, uma vez que tudo depende das necessidades atuais daquele; para efeitos de conformidade ou não com o acórdão uniformizador do Supremo Tribunal de Justiça de 19 de março de 2015, o que releva é o valor, em si, da prestação alimentícia decretada pelo Tribunal e não o artificial quantitativo decorrente da sua divisão pelo número de menores; admitir esta operação implicaria correr o risco de desconsiderar gritantes e atuais necessidades de um menor, potencial credor do Estado.".

4 - No entanto, como bem refere o Venerando Desembargador FF no seu voto de vencido, que aqui damos por reproduzido e ao qual incondicionalmente aderimos, "O montante da prestação a que o progenitor estava adstrito era no montante mensal de € 66,67 (sessenta e seis euros e sessenta e sete cêntimos) para esta menor.

5 - Refere-se, ainda, no mesmo voto, que dos autos resulta que "... não tendo sido apuradas, quer em sede de regulação das responsabilidades parentais, quer em sede da decisão recorrida necessidades diversas por parte de cada um dos menores e sendo o rendimento global do agregado onde os mesmos estão integrados o apurado, sempre se deverá entender que o julgador a quo, no âmbito da regulação das responsabilidades parentais, quis fixar para cada um valor igual dos três menores, ou seja, o valor de € 66,67.".

6 - A prestação de alimentos a assegurar pelo FGADM em substituição do obrigado incumpridor, nos termos em que está legalmente configurada, não pode ser de valor superior ao fixado judicialmente para este, tal como foi decidido no Acórdão Uniformizador de Jurisprudência de 19.03.2015, proferido no âmbito do proc. 252/08.8TBSRP-B.E1.S1-A, - Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 5/2015, publicado no Diário da República, 1ª Série — N.º 85 — 4 de Maio de 2015 - 2015 - onde se decidiu uniformizar jurisprudência nos termos seguintes: "Nos termos do disposto no artigo 2º da Lei n. 75/98, de 19 de Novembro, e no artigo 3º, nº 3, do DL n.º 164/99, de 13 de Maio, a prestação a suportar pelo Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores não pode ser fixada em montante superior ao da prestação de alimentos a que está vinculado o devedor originário."

7 - O qual, como os restantes Acórdãos de Uniformização de Jurisprudência, não obstante não ser vinculativo, não deixa de merecer uma maior ponderação, por contribuir para a unidade da ordem jurídica, não se encontrando no acórdão recorrido a verificação de fortes razões ou outras especiais circunstâncias que, porventura ainda não tenham sido ponderadas para que aquele Acórdão seja contrariado.

8 - Constata-se, assim, que o douto acórdão ora recorrido, tendo sido proferido no âmbito da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, encontra-se em contradição com jurisprudência uniformizada do Supremo Tribunal de Justiça.

9 – Violou também o disposto no nº 2 do art. 2º, no nº 5 do art. 3º, e no nº 1 do art. 5º do DL 164/99, de 13 de Maio, todos com a redacção dada pela Lei 64/2012, de 20 de Dezembro de 2012.

10 - Deve o douto acórdão recorrido ser revogado e substituído por outro, que, seguindo o entendimento do Acórdão Uniformizador de Jurisprudência, revogue igualmente a decisão proferida em primeira instância, fixando a prestação a pagar pelo FGADM em montante não superior ao que se encontrava fixado para o progenitor devedor, ou seja, no caso dos autos, € 66,67 (sessenta e seis euros e sessenta e sete cêntimos).

Por seu turno, o Ministério Público concluiu, assim, a sua alegação:

1 - Tendo, no caso dos autos, sido fixada na sentença proferida em 1ª instância uma prestação alimentar conjunta e global de 200 euros para os três menores, tem de considerar-se que a pensão de cada um deles corresponde a um terço da referida quantia, ou seja, 66,67 euros.

2 - Mostrando-se reunidas as condições previstas no art° 1º, n° 1 da Lei n° 75/98, de 19/11, deverá a prestação a cargo do FGADM, quanto à ainda menor Raissa, ser fixada em valor não superior ao referido montante de 66,67 euros, em obediência à jurisprudência fixada pelo AUJ n° 5/2015, proferido em 19/3/2015 no Proc n° 252/08.8TBSRP-A.E1.S1-A., atentos os fundamentos no mesmo constantes e que não se mostram afastados pelo douto acórdão recorrido.

3 - Não pode considerar-se "vigente" o valor global de 200 euros, inicialmente fixado para três menores, mas sim o valor correspondente a cada um deles, no montante de 66,67 euros mensais, pelo que, tendo dois deles atingido a maioridade, apenas a prestação da menor CC se encontra em dívida por parte do progenitor incumpridor.

4 - Não pode considerar-se correcta a premissa de que " o montante da prestação é o mesmo", por caber dentro dos 200 euros inicialmente fixados, dado que o montante da prestação devida é de 66,67 euros por cada menor, pelo que a fixação a cargo do FGADM de uma prestação superior, nomeadamente de 100 euros, implica que o Fundo não possa exercer a sub-rogação da totalidade desse montante de 100 euros, mas unicamente dos 66,67 euros que se encontravam fixados para a filha ainda menor.

5 - Assim, o douto acórdão recorrido deveria ter julgado o recurso do FGADM inteiramente procedente, em obediência ao AUJ n° 5/2015, fixando a prestação a pagar pelo Fundo à menor CC em montante não superior ao fixado ao progenitor incumpridor, de um terço da prestação global - 66,67 euros mensais.

6 - Não tendo assim decidido violou o douto acórdão recorrido o disposto nos artigos 2.° da Lei n.° 75/98, de 19 de Novembro, e no artigo 3.° n.° 3 do DL n.° 164/99, de 13 de Maio, devendo ter interpretado os mesmos no sentido defendido nas conclusões supra enunciadas e fixado no AUJ n° 5/2015, publicado do DR de 4/5/2015.

7 - Deverá o douto acórdão recorrido ser revogado e substituído por outro, que fixe a pensão de alimentos devida pelo FGADM à menor CC no montante de 66,67 euros mensais, como se encontrava anteriormente fixada a cargo do progenitor devedor.

A progenitora ofereceu contra-alegação a pugnar pela bondade e manutenção do decidido pela Relação e, colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

II – Fundamentação de facto

As instâncias consideraram provados os factos seguintes:

1 - BB, AA e CC nasceram, respetivamente, a 10 de setembro de 1995, 25 de abril de 1998 e 22 de novembro de 2007, e são filhos da requerente DD e do requerido EE;

2- Por acordo homologado por sentença de 6 de junho de 2013, transitada em julgado, foi regulado o exercício das responsabilidades parentais, quanto à BB, ao AA e à CC tendo estas ficado a residir com a mãe e tendo sido fixada uma pensão de alimentos a favor dos filhos, a suportar pelo pai, no valor global mensal de €200,00;

3 - O requerido não paga a pensão de alimentos aos filhos desde julho de 2013;

4 - A BB, o AA e a CC vivem com a mãe, em habitação social, de tipologia T2, que reúne condições de habitabilidade, pela qual paga aquela a renda mensal de €13,54;

5 - A requerente encontra-se desempregada, beneficiando de uma prestação de RSI, no valor de €283,67 mensais;

6 - Recebe, para além disso, as prestações familiares dos filhos, no valor global de €84,46 mensais, e conta com apoio económico de sua mãe;

7 - O AA e a CC frequentam a escola e são beneficiários de SASE;

8 - A requerente tem uma dívida à Câmara Municipal de …, relativa à renda da casa, no valor de €125,00, e tem os serviços de eletricidade e água suspensos, por falta de pagamento;

9 - O requerido não é proprietário de imóveis ou de móveis registáveis e não lhe são conhecidos rendimentos.


III – Fundamentação de direito

A apreciação e decisão dos dois recursos, que frise-se têm idêntico objecto, delimitado pelas conclusões dos recorrentes (art.ºs 635º, n.º 4 , e 639º, n.º 1, do Cód. de Proc. Civil), resumem-se à análise e dilucidação da única questão jurídica por eles colocada a este tribunal e que consiste em determinar se, tal como decidiu o acórdão recorrido, a pensão de €100,00 mensais a suportar pelo FGADM, a favor da ainda menor CC, contraria o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19 de março de 2015 (processo nº 252/08.8 TBSRP-A-A.E1.S1-A), publicado no DR, 1ª Série, n.º 85, de 4 de Maio de 2015, e também acessível em www.dgsi.pt. que uniformizou jurisprudência nos moldes seguintes: “Nos termos do disposto no artigo 2° da Lei n. 75/98, de 19 de Novembro, e no artigo 3° n° 3 do DL n.º 164/99, de 13 de Maio, a prestação a suportar pelo Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores não pode ser fixada em montante superior ao da prestação de alimentos a que está vinculado o devedor originário”.

Antes de entrar na abordagem dessa questão, convém sublinhar que os recursos apenas são admissíveis por se alicerçarem em ofensa a jurisprudência uniformizada do STJ, encontrando, assim, arrimo nos art.ºs 671º, n.º 2, alínea a), e 629º, n.º 2, alínea c), do Cód. Proc. Civil, que, independentemente do valor da causa e da sucumbência, abrem a porta recursória de acesso ao Mais Alto Tribunal.

Definida a recorribilidade do acórdão impugnado e avançando para a questão fulcral dos recursos – ofensa do aludido acórdão uniformizador de jurisprudência – importa reter que o ponto de partida da divergência que conduziu à interposição dos sucessivos recursos pelo FGADM e, agora, também pelo Ministério Público na 2ª instância foi a fixação de uma pensão alimentar global para os então três menores, no montante de €200,00, em vez de, como se impunha e aconselhava, subdividir aquele montante e fixar individualizadamente o montante devido pelo progenitor para cada um dos menores, tendo em conta as respectivas necessidades com o sustento, habitação, vestuário instrução e educação (art.ºs 2003º, n.ºs 1 e 2, e 2004º, n.º 1, do Cód. Civil).

Tivesse a 1ª instância observado tais ditames, ter-se-iam evitado os sucessivos recursos interpostos e a inerente sobrecarga do aparelho judiciário, sem qualquer benefício para os menores, na medida em que atingida a maioridade de qualquer um deles, sempre se conheceria o montante prestacional a cargo do FGADM para cada um dos restantes, sem risco ou vislumbre de eventual ofensa do referido acórdão uniformizador de jurisprudência.

Contudo, tendo-se cometido esse «pecado» original e não se tendo remediado ou sequer tentado ultrapassar a situação através da subsequente alteração da pensão alimentícia dos ainda menores, nos termos do art.º 42º do RGPTC, nem constando da sentença que fixou, global e conjuntamente, os alimentos nenhuma diferenciação quanto às necessidades deles, temos de reconhecer que a pensão de cada um corresponderá a um terço da quantia inicialmente fixada, ou seja, €66,67 mensais, valor que, ao invés do que se diz no acórdão recorrido, nada tem de «artificial».

Pelo contrário, corresponde ao resultado real de operação aritmética assente em pura e patente lógica discursiva e matemática que se considera intocável. Qualquer outra diferente ilação ou conclusão, além de carecer dessa lógica, não é comportada sequer pelo teor do que consta e se expendeu, a esse propósito, na decisão da 1ª instância que fixou a pensão global em €200,00 mensais, nem pela melhor via interpretativa se logra ali obter âncora no sentido de se poder considerar que a prestação individual de qualquer dos menores excedia ou era inferior a tal valor (€66,67 mensais).    

Será, pois, este (e não o global) o valor e tecto a atender na determinação da prestação subsidiária a suportar pelo FGADM.

Não obstante esta radicar em preocupações de cariz social e ser autónoma da do devedor originário (cfr., neste sentido, o acórdão uniformizador de jurisprudência de 07.07.2009, proferido no Agravo ampliado n.º 682/09, acessível em www.dgsi.pt), nada permite que, no âmbito do incidente de incumprimento, com apelo a preocupações sociais e a necessidades actuais da menor CC, nem sequer comprovadas por novos factos, essa prestação seja elevada para €100,00 mensais.

Sem pôr em causa a valia desses argumentos e se reconhecer que conduziriam a uma solução socialmente mais generosa e até mais justa, porque conferidora de maior protecção a menores que dela manifestamente carecem, a sua elevação, no seio do incidente de incumprimento, contraria a jurisprudência uniformizada pelo citado acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19 de março de 2015 (processo nº 252/08.8 TBSRP-A-A.E1.S1-A), na medida em que não deixa de envolver um montante superior ao da prestação de alimentos a que está vinculado o devedor originário (€100,00 versus €66,67).

A elevação da prestação terá de passar previamente pela sua alteração, no âmbito do procedimento previsto nos art.ºs 42º e ss. do RGPTC, e só depois imposta ao FGADM.

Nada autoriza saltar essa etapa e, no próprio incidente de incumprimento, proceder à elevação da prestação e, de imediato, impô-la ao FGADM que, como o nome indica, é, tão só, um garante da obrigação de alimentos a cargo do progenitor incumpridor, substituindo este e assegurando, desse modo, que nenhuma criança fique privada da prestação de alimentos a que tem direito.

No caso, sendo a prestação alimentar fixada a favor de cada menor, no montante de €66,67 mensais, só esse valor poderá ser exigido do FGADM, enquanto não ocorrer subsequente alteração da prestação a cargo do progenitor.

Nesta conformidade, procedem as conclusões dos recorrentes, a quem assiste razão em insurgir-se contra o decidido pelas instâncias que, sem quebra do devido respeito, não equacionaram devidamente a situação em apreço e não fizeram correcta leitura, interpretação e aplicação das citadas disposições legais e acórdão uniformizador, não podendo, por isso, subsistir.


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Pode, assim, concluir-se, em síntese, que:

1 - Alicerçando-se ambos os recursos de revista em ofensa a jurisprudência uniformizada do STJ, encontram arrimo nos art.ºs 671º, n.º 2, alínea a), e 629º, n.º 2, alínea c), do Cód. Proc. Civil, e são admissíveis, independentemente do valor da causa e da sucumbência.

2 – Os montantes das prestações alimentícias devidas pelos progenitores por cada um dos menores, devem ser fixadas individualizadamente, tendo em conta as respectivas necessidades com o sustento, habitação, vestuário instrução e educação (art.ºs 2003º, n.ºs 1 e 2, e 2004º, n.º 1, do Cód. Civil).

3 – Sendo três os menores e tendo a sentença fixado, global e conjuntamente, os alimentos em €200,00 mensais, sem nenhuma diferenciação quanto às necessidades deles, a pensão alimentar de cada um corresponderão a um terço dessa quantia, ou seja, €66,67 mensais.

4 - Será este (e não o global) o valor e tecto a atender na determinação da prestação subsidiária a suportar pelo FGADM.

5 – A sua elevação, no seio do incidente de incumprimento, na medida em que não deixa de envolver um montante superior ao da prestação de alimentos a que está vinculado o devedor originário (€100,00 versus €66,67), contraria a jurisprudência uniformizada pelo acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19 de março de 2015 (processo nº 252/08.8 TBSRP-A-A.E1.S1-A).

6 - A elevação da prestação terá de passar previamente pela sua alteração, no âmbito do procedimento previsto nos art.ºs 42º e ss. do RGPTC, e só depois imposta ao FGADM.

7 - Nada autoriza saltar essa etapa e, no próprio incidente de incumprimento, proceder à elevação da prestação e, de imediato, impô-la ao FGADM.


IV – Decisão

Nos termos expostos e na procedência de ambos os recursos, decide-se conceder a revista e revogar o acórdão recorrido bem como a decisão da 1ª instância, determinando-se que o FGADM pague, por cada menor, a quantia de €66,67 (sessenta e seis euros e sessenta e sete cêntimos) mensais.

Custas pela progenitora.


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Anexa-se sumário do acórdão (art.ºs 663º, n.º 7, e 679º, ambos do CPC).

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Lisboa, 19 de Outubro de 2017


António Piçarra (relator)

Fernanda Isabel Pereira

Olindo Geraldes