Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
762/19.1GBAGD.P1.S1
Nº Convencional: 5.ª SECÇÃO
Relator: MARGARIDA BLASCO
Descritores: RECURSO PER SALTUM
ROUBO
ROUBO QUALIFICADO
PENA ÚNICA
MEDIDA DA PENA
PENA DE PRISÃO
PENA SUSPENSA
Data do Acordão: 02/11/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: JULGADOS OS RECURSOS, PROCEDENTE O DO ARGUIDO BB E PARCIALMENTE PROCEDENTE O DO ARGUIDO AA.
Indicações Eventuais: TRANSITADO EM JULGADO
Sumário :
I - Nos termos do art. 40.º do CP, que dispõe sobre as finalidades das penas, “a aplicação de penas e de medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade” e “em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa”, devendo a sua determinação ser feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, de acordo com o disposto no art. 71.º, do mesmo diploma. Como se tem reiteradamente afirmado, encontra este regime os seus fundamentos no art. 18.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa (CRP), segundo o qual “a lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos”. A restrição do direito à liberdade, por aplicação de uma pena (art. 27.º, n.º 2, da CRP), submete-se, assim, tal como a sua previsão legal, ao princípio da proporcionalidade ou da proibição do excesso, que se desdobra nos subprincípios da necessidade ou indispensabilidade – segundo o qual a pena privativa da liberdade se há-de revelar necessária aos fins visados, que não podem ser realizados por outros meios menos onerosos – adequação – que implica que a pena deva ser o meio idóneo e adequado para a obtenção desses fins – e da proporcionalidade em sentido estrito – de acordo com o qual a pena deve ser encontrada na “justa medida”, impedindo-se, deste modo, que possa ser desproporcionada ou excessiva.
II - A projecção destes princípios no modelo de determinação da pena justifica-se pelas necessidades de protecção dos bens jurídicos tutelados pelas normas incriminadoras violadas (finalidade de prevenção geral) e de ressocialização (finalidade de prevenção especial), em conformidade com um critério de proporcionalidade entre a gravidade da pena e a gravidade do facto praticado, avaliada, em concreto, por factores ou circunstâncias relacionadas com este e com a personalidade do agente, relevantes para avaliar da medida da pena da culpa e da medida da pena preventiva que, não fazendo parte do tipo de crime (proibição da dupla valoração), deponham a favor do agente ou contra ele (arts. 40.º e 71.º, n.º 1, do CP). Como se tem reafirmado, para a medida da gravidade da culpa há que, de acordo com o citado art. 71.º, n.º 2, considerar os factores reveladores da censurabilidade manifestada no facto, nomeadamente, os factores capazes de fornecer a medida da gravidade do tipo de ilícito objectivo e subjectivo – indicados na alínea a), primeira parte (grau de ilicitude do facto, modo de execução e gravidade das suas consequências), e na alínea b) (intensidade do dolo ou da negligência) –, os factores a que se referem a alínea c) (sentimentos manifestados no cometimento do crime e fins ou motivos que o determinaram) e a alínea a), parte final (grau de violação dos deveres impostos ao agente), bem como os factores atinentes ao agente, que têm que ver com a sua personalidade – factores indicados na alínea d) (condições pessoais e situação económica do agente), na alínea e) (conduta anterior e posterior ao facto) e na alínea f) (falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto). Na consideração das exigências de prevenção, destacam-se as circunstâncias relevantes por via da prevenção geral, traduzida na necessidade de protecção do bem jurídico ofendido mediante a aplicação de uma pena proporcional à gravidade dos factos, reafirmando a manutenção da confiança da comunidade na norma violada, e de prevenção especial, que permitam fundamentar um juízo de prognose sobre o cometimento de novos crimes no futuro e, assim, avaliar das necessidades de socialização. Incluem-se aqui o comportamento anterior e posterior ao crime [alínea e)], com destaque para os antecedentes criminais) e a falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto [alínea f)]. O comportamento do agente, a que se referem as circunstâncias das alíneas e) e f), adquire particular relevo para determinação da medida da pena em vista das exigências de prevenção especial (sobre estes pontos, para melhor aproximação metodológica na determinação do sentido e alcance da previsão do art. 71.º do CP, cfr. ANABELA MIRANDA RODRIGUES, A Determinação da Medida da Pena Privativa da Liberdade, Os Critérios da Culpa e da Prevenção, Coimbra Editora, 2014, em particular pp. 475, 481, 547, 563, 566 e 574, e FIGUEIREDO DIAS, Direito Penal Português - As Consequências Jurídicas do Crime, Coimbra Editora, 3.ª reimp., 2011, pp. 232-357). Há que, como se acentuou, ponderar as exigências antinómicas de prevenção geral e de prevenção especial, em particular as necessidades de prevenção especial de socialização “que vão determinar, em último termo, a medida da pena”, seu “critério decisivo”, com referência à data da sua aplicação (assim, acentuando estes pontos, FIGUEIREDO DIAS, ob. cit., §309, p. 231, §334, p. 244, §344, p. 249), tendo em conta as circunstâncias a que se refere o art. 71.º, do CP, nomeadamente, as condições pessoais do agente e a sua situação económica e a conduta anterior e posterior ao facto, especialmente quando esta tenha em vista a reparação das consequências do crime, que relevam por esta via. Em síntese: A determinação da pena, realizada em função da culpa e das exigências de prevenção geral de integração e da prevenção especial de socialização, de harmonia com o disposto com os artigos citados - 40.º e 71.º - , deve, no caso concreto, corresponder às necessidades de tutela do bem jurídico em causa e às exigências sociais decorrentes daquela lesão, sem esquecer que deve ser preservada a dignidade humana do delinquente.
III - Na moldura abstracta unitária, definida no n.º 2, do art. 77.º, do CP, ressalta o seguinte:Ao arguido X é aplicável a pena entre 3 anos e 9 meses de prisão (correspondente à mais elevada das penas parcelares) a 11 anos e 9 meses de prisão (correspondente à soma material de todas as penas parcelares). Foi condenado na pena única de 6 anos de prisão. Ao arguido Y é aplicável a pena entre 3 anos e 9 meses de prisão (correspondente à mais elevada das penas parcelares) a 11anos de prisão (correspondente à soma material de todas as penas parcelares). Foi condenado na pena única de 5 anos e 9 meses de prisão. O art. 77.º, n.º 1, do CP, estabelece que o critério específico a usar na fixação da medida da pena única é o da consideração em conjunto dos factos e da personalidade do agente. Não tendo o legislador nacional optado pelo sistema de acumulação material (soma das penas com mera limitação do limite máximo), nem pelo da exasperação ou agravação da pena mais grave (elevação da pena mais grave, através da avaliação conjunta da pessoa do agente e dos singulares factos puníveis, elevação que não pode atingir a soma das penas singulares, nem o limite absoluto legalmente fixado), é forçoso concluir que, com a fixação da pena conjunta, se pretende sancionar o agente, não só pelos factos individualmente considerados, mas também e, especialmente, pelo respectivo conjunto, e não como mero somatório de factos criminosos, mas enquanto revelador da dimensão e gravidade global do comportamento delituoso do agente, visto que a lei manda se considere e pondere, em conjunto (e não unitariamente), os factos e a personalidade do agente - Professor Jorge de Figueiredo Dias, em “Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime”, Aequitas, 1993, pp. 290-292, como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado. O todo não equivale à mera soma das partes e, além disso, os mesmos tipos legais de crime são passíveis de relações existenciais diversíssimas, a reclamar uma valoração que não se repete, de caso para caso.
IV - A este novo ilícito corresponderá uma nova culpa (que continuará a ser culpa pelo facto) mas, agora, culpa pelos factos em relação – afinal, a valoração conjunta dos factos e da personalidade, de que fala o Código Penal. Na avaliação da personalidade– unitária – do agente relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência ou, eventualmente, mesmo a uma “carreira” criminosa, ou tão-só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade: só no primeiro caso, não já no segundo, será cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta. Acresce que importará relevar o efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização). Realce-se ainda que, na determinação da medida das penas parcelar e única não é admissível uma dupla valoração do mesmo factor com o mesmo sentido: assim, se a decisão faz apelo à gravidade objectiva dos crimes está a referir-se a factores de medida da pena que já foram devidamente equacionados na formação das penas parcelares. Será, assim, o conjunto dos factos que fornece a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique. Um dos critérios fundamentais em sede daquele sentido de culpa, numa perspectiva global dos factos, é o da determinação da intensidade da ofensa e dimensão do bem jurídico ofendido, sendo certo que assume significado profundamente diferente a violação repetida de bens jurídicos ligados à dimensão pessoal, em relação a bens patrimoniais. Por outro lado, importa determinar os motivos e objectivos do agente, no denominador comum dos actos ilícitos praticados e, eventualmente, dos estados de dependência, bem como a tendência para a actividade criminosa expressa pelo número de infracções, pela sua permanência no tempo, pela dependência de vida em relação àquela actividade. Na avaliação da personalidade expressa nos factos é todo um processo de socialização e de inserção, ou de repúdio pelas normas de identificação social e de vivência em comunidade, que deve ser ponderado. O art. 77.º, n.º 2, do CP, por seu turno, estabelece que pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 25 anos, tratando-se de pena de prisão, e 900 dias tratando-se de pena de multa; e, como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes. Será, assim, o conjunto dos factos que fornece a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação, a conexão e o tipo de conexão, que se verifique entre os factos concorrentes. O concurso de crimes tanto pode decorrer de factos praticados na mesma ocasião, como de factos perpetrados em momentos distintos, temporalmente próximos ou distantes. Por outro lado, o concurso tanto pode ser constituído pela repetição do mesmo crime, como pelo cometimento de crimes da mais diversa natureza. Por outro lado, ainda, o concurso tanto pode ser formado por um número reduzido de crimes, como pode englobar inúmeros crimes.
V - No caso, ponderou o acórdão recorrido as exigências de prevenção geral muito intensas relativamente ao crime de roubo, atento o número dos crimes patrimoniais praticados e com utilização de violência, suscitando generalizada convicção comunitária de insegurança e impondo fortes e injustos constrangimentos (limitações da liberdade) no quotidiano da maior parte dos cidadãos; a concreta ilicitude dos factos em causa, não acentuada, quando consideradas as condutas potencialmente abrangidas pela incriminação e atentos os concretos meios empregues, ofensas pessoais (mais precisamente, violência moral) e danos patrimoniais; e, ainda, as circunstâncias relevantes na valoração da objectiva gravidade das condutas, repercutindo-se, ainda, no juízo de censura que o comportamento dos arguidos justifica, tal como releva na determinação da intensidade do juízo de censura (culpa) que as demonstradas acções merecem, e a intensidade do dolo, em qualquer dos casos, directo. Entendemos que, do conjunto de imposições exigíveis, quer de prevenção geral, quer de prevenção especial, de onde relevam a intensidade do dolo (directo e persistente), a culpa mediana, a primariedade dos arguidos, o facto de ambos terem experienciado a situação de reclusão, o que pode constituir um marco determinante para inflexão num percurso disruptivo face às normas que vigoram na ordem jurídica, o apoio familiar que podem ter, uma vez em liberdade, encontramos fundamento bastante que justifica a redução das penas aplicadas, o que permite que a pena se fixe em patamar situado junto do limite mínimo da moldura penal. Ponderando tudo o exposto, concluímos que, como impõem os arts. 40.º, 71.º e 77.º, do CP, a pena adequada, proporcional e justa, no caso em concreto, se fixa em: - Quanto ao recorrente X, 5 (cinco) anos de prisão; e, - Quanto ao recorrente Y 4 (quatro) anos e 9 (nove) meses de prisão.
VI - Estas penas admitem a suspensão da execução, por força do artigo 50.º, nº 1, do CP, medida expressamente solicitada pelos arguidos e que sempre teria de ser ponderada, por força da mesma disposição legal. Condição formal da suspensão da pena de prisão é esta não ser superior a 5 anos, o que é o caso, encontrando-se a mesma preenchida. Vejamos, agora, se estão reunidos os elementos necessários ao preenchimento da condição material, ou seja, se podemos concluir, no caso dos recorrentes, que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam as finalidades das penas. Como é sabido, à opção pela suspensão da execução da pena de prisão, enquanto medida de reacção criminal autónoma, são alheias considerações relativas à culpa do agente, valendo exclusivamente as exigências postas pelas finalidades preventivas da punição, sejam as de prevenção geral positiva ou de integração, sejam as de prevenção especial de socialização (art. 40.º, n. º1 do CP). De molde que a opção por esta pena deverá assentar, em primeira linha, na formulação de um juízo positivo ou favorável à recuperação comunitária do agente através da censura do facto e da ameaça da prisão, sem a efectiva execução desta prisão, que ficaria suspensa, mas desde que esta opção não prejudique ou contrarie a necessidade de reafirmar a validade das normas comunitárias, ou seja, desde que o sentimento comunitário de crença na validade das normas infringidas não seja contrariado ou posto em causa com tal suspensão. Ora, como atrás se disse a favor dos arguidos regista-se o facto de serem primários, terem confessado os factos que lhe eram imputados, mostrarem-se arrependidos, e estarem de certa forma inseridos familiarmente. O que entendemos ser de relevar. Deve, ainda, ter-se em linha de conta a intensidade do dolo e o apontado grau de ilicitude do facto, tendo-se a culpa como mediana, razão que levou a fixar a pena em patamar situado junto do limite mínimo da moldura penal. Ambos os arguidos sofreram já cerca de 16 meses de prisão preventiva. O descrito circunstancialismo permite formular um juízo positivo quanto ao comportamento futuro dos arguidos pelo que será de criar as condições para que o seu processo de ressocialização possa decorrer em liberdade. Suspende-se, por isso, a execução da pena pelo período correspondente à medida da condenação, suspensão esta, sujeita a regime de prova a definir pela Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais (DGRSP).
VII - Do perdimento da viatura automóvel. Ora, no caso em apreço, consta amplamente da decisão recorrida que veículo, propriedade do recorrente X, foi por si utilizado para a prática de todos os crimes de roubo pelos quais foi condenado. Razão pela qual foi decretada a sua apreensão. E, posteriormente, o seu perdimento. Não estão, no entanto, preenchidos os pressupostos enunciados no art. 109.º, n. º 1, do CP. O fundamento da perda de “instrumentos e produtos” regulada neste preceito radica nas exigências, individuais e colectivas, de segurança e na perigosidade dos bens apreendidos, ou seja, nos riscos específicos e perigosidade do próprio objecto e não na perigosidade do agente do facto ilícito (daí que não possa ser considerada uma medida de segurança), ou na culpa deste ou de terceiro (daí que não possa ser vista como uma pena acessória).A perda de objectos a favor do Estado regulada no Código Penal (dotada de eficácia real, já que se opera a transferência da propriedade do objecto a favor daquele), apresenta-se como uma providência sancionatória de natureza análoga à medida de segurança, não sendo um efeito da pena ou da condenação, visto poder ter lugar sem elas, como se infere do art. 109.º, n.º 2. Constitui pressuposto formal da perda de instrumentos e produtos prevista no artigo 109.º, que os mesmos tenham sido ou estivessem destinados a ser utilizados numa actividade criminosa, ou que, por esta tenham sido produzidos. Assim, só podem ser declarados perdidos a favor do Estado os objectos que tenham servido ou estivessem destinados a servir para a prática de um facto ilícito típico e seja possível prognosticar que esses objectos podem colocar em perigo a segurança das pessoas, a moral ou a ordem públicas, ou que oferecem sério risco de serem utilizados para o cometimento de novos factos ilícitos típicos. Dizendo de outro modo, a declaração de perda está agora condicionada à perigosidade ou risco de poderem ser utilizados para a prática de novos crimes. Neste caso, pela sua natureza, o automóvel só poderia ter sido declarado perdido se houvesse "sério risco de ser utilizado para o cometimento de novos factos ilícitos típicos". O que não se pode afirmar, perante o juízo de prognose favorável elaborado sobre o comportamento futuro dos arguidos.
Decisão Texto Integral:

Proc.º n.º 762/19.1GBAGD.P1. S1

Recurso Penal

(arguidos presos)

Acordam, precedendo conferência, na 5.ª Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça

I.

1. Por acórdão de 22 de Julho de 2020, proferido no Proc. Comum, com intervenção do Tribunal Colectivo, no âmbito do Proc. n.º 762/19…., do Juízo Central Criminal …. - Juiz …., da Comarca ….., foi decidido condenar[1]:
1. O arguido AA pela prática, em co-autoria de:

- Um crime de roubo agravado (dia 09.09.2019), previsto e punido (p. e p.) pelo artigo 210.º, n.ºs 1, e 2, al. b), do Código Penal (CP) (por referência ao artigo 204.º, n.º 2, al. f), do CP), na pena de 3 (três) anos e 9 (nove) meses de prisão;

- Um crime de roubo agravado (dia 15.09.2019), p. e p. pelo artigo 210.º, n.ºs 1 e 2, al. b), do CP (por referência ao artigo 204.º, n.º 2, al. f), do CP), na pena de 3 (três) anos e 9 (nove) meses de prisão;

- Um crime de roubo (dia 17.09.2019), p. e p. pelo artigo 210.º, n.º 1, do CP, na pena de 1 (um) ano e 9 (nove) meses de prisão;

- Um crime de roubo (dia 17.09.2019) p. e p. pelo artigo 210.º, n.º 1, do CP, na pena de 1 (um) ano e 9 (nove) meses de prisão;

- Um crime de roubo em autoria singular na forma tentada (dia 22.09.2019), p. e p. pelos artigos 210.º, n.º 1, 22.º, 23.º, n.ºs 1, e 2, 73.º, n.º 1, als. a) e b), todos do CP, na pena 9 (nove) meses de prisão;

- Operando o respectivo cúmulo jurídico foi o arguido condenado na pena única de 6 (seis) anos de prisão.
2. O arguido BB pela prática, em co-autoria de:

- Um crime de roubo agravado (dia 09.09.2019) p. e p. pelo artigo 210.º, n.ºs 1, e 2, al. b), do CP (por referência ao artigo 204.º, n.º 2, al. f), do CP), na pena de 3 (três) anos e 9 (nove) meses de prisão;

- Um crime de roubo agravado (dia 15.09.2019) p. e p. pelo artigo 210.º, nº s 1, e 2, al. b), do CP (por referência ao artigo 204.º, n.º 2, al. f), do CP), na pena de 3 (três) anos e 9 (nove) meses de prisão;

- Um crime de roubo (dia 17.09.2019) p. e p. pelo artigo 210.º, nº 1, do CP, na pena de 1 (um) ano e 9 (nove) meses de prisão;

- Um crime de roubo (dia 17.09.2019) p. e p. pelo artigo 210.º, n.º 1, do CP, na pena de 1 (um) ano e 9 (nove) meses de prisão;

- Operando o respectivo cúmulo jurídico foi o arguido condenado na pena única de 5 (cinco) anos e 9 (nove) meses de prisão.

Mais foi decidido declarar perdidos a favor do Estado os seguintes bens, apreendidos no decurso do processo: a quantia de €105,00; o automóvel “….” de matrícula ….-HS; a faca e a navalha; os dois telemóveis; as peças ou partes de peças de vestuário, saco e luvas; as duas “pen” e os dois CD/DVD contendo registos de videovigilância.

2.Vieram os arguidos recorrer deste acórdão para o Tribunal da Relação …. (TR…), onde por despacho de 21.10.2020, foi determinada a sua remessa a este Supremo Tribunal de Justiça, por ter sido entendido que os recursos interpostos apenas visam o reexame de matéria de direito, e por terem sido aplicadas penas superiores a 5 anos de prisão.

3. Discordam os arguidos da escolha e medida única da pena de prisão que lhes foi aplicada pugnando pela sua redução, a qual não deverá ultrapassar os 4 (quatro) anos e 9 (nove) meses de prisão, a qual deverá ser suspensa na sua execução.

Diz o arguido AA nas suas conclusões que aqui se transcrevem:

(…)

A) O arguido sente-se profundamente violentado na decisão da primeira instância, nomeadamente na exagerada medida da pena.

B) No caso em apreço, considerando a factualidade dada como provada no douto acórdão recorrido, terão V. Exas que ter sempre em conta, salvo douta e melhor opinião, as circunstâncias em que se verificaram as condutas imputadas ao arguido, que surgiriam num contexto de consumo de haxixe pelo arguido, o que é facto notório de conhecimento geral, que amolece significativamente a culpa e a capacidade de determinação.

C) As penas parcelares impostas ao ora recorrente são excessivas e devem ser reduzidas para as medidas que se aproximem dos respectivos limites mínimos.

D) A pena única do cúmulo jurídico deverá consequentemente ser reformulada e substancialmente reduzida.

E) Pois entende o recorrente que a pena única deverá ser reduzida para 4 anos e nove meses, pelos fundamentos aqui explanados e a sua execução suspensa, nos termos do artigo 50º do Código penal, ainda que sujeita a regime de prova, pois o Tribunal a quo ao não ter decidido dessa forma, violou o disposto nos artigos 50º e 53º do Código Penal.

F) O douto acórdão deverá ser revogado na parte em que declarou a perda do veículo de matrícula ….-HS a favor do Estado, decidindo-se pela restituição do mesmo ao seu proprietário.

G) Assim não pode o recorrente aceitar a pena que lhe foi concretamente aplicada no acórdão.

H) Deveria ainda ter em conta o tribunal a quo o facto de o arguido na presente data não ter antecedentes criminais, ou seja, ter pautado a sua vida por princípios que o afastaram das lides dos presentes autos.

I) A pena para o ilícitos imputados ao recorrente –“atingem a severidade máxima compatível com uma intervenção penal norteada pelos princípios político-criminais exagerados no art. 40º- seja pelo da prevenção especial positiva ou de ressocialização, seja complexamente pelo da humanidade – e com a escala de penas adoptadas pelo CP. Sobretudo tendo em atenção que a tipicidade não supõe o uso de meios violentos ou análogos “ – cfr. Figueiredo Dias , in Comentário Conimbricense do C P , Tomo I – 553.

J) Nestas circunstâncias, atenta a considerável (se não excessiva) severidade das penas cominadas para o crime imputado ao arguido, ainda que porventura não se altere a factualidade dada como provada, não há razões para que a pena a aplicar se afaste dos mínimos legais.

K) Na dosimetria das penas não pode olvidar-se que estamos perante um arguido de 31 anos, bastante sofrido e amargurado pelo decorrer de uma vida inundada de dissabores e flagelos, relativamente aos quais se fazem sentir mais especialmente necessidades de reintegração social.

L) Em suma, o Tribunal a quo não valorou devidamente a favor do arguido, ora recorrente as invocadas circunstâncias que depõem a favor dele, e que oferecem verdadeiro peso atenuativo, devendo assim reputar-se como violados os critérios dosimétricos do art.º 71º do Código Penal.

M) Conquanto o máximo respeito que sempre tem por douta opinião em contrário, entende o recorrente que o Douto Acórdão, ora impugnado, na medida da pena em que condena o arguido, é violador na sua integração jurídico-penal e um tanto frio quanto às consequências nefastas do mesmo na vida do recorrente,

N) Foram, pois, violados os artigos 50º, 53º,71º, 72º e 77º nº 1 e 2 todos do Código Penal e 34º, 35º ambos do DL nº 15/93 de 22 de Janeiro, assim como desrespeitado o disposto no artigo 30º da CRP.

(…)

E o arguido BB:

(…)

A) O objecto do presente recurso restringe-se à medida da pena única, por se mostrar excessiva, pelo que, como infra se especificará deverá ser reduzida para 4 anos e 9 meses, e suspensa a sua execução, nos termos do disposto no artigo 50º do Código Penal, ainda que acompanhada de regime de prova, cfr. artigo 53º do mesmo diploma legal.

B) Começaremos por dizer que o arguido BB apenas foi condenado pela prática dos crimes cujos factos reconheceu, já que confirmou os factos que correspondiam à verdade, negando os que não correspondiam, e o certo é que as condenações, tanto do ora recorrente, como do co-autor, resultaram dos factos confessados pelos arguidos.

C) Assim, o Ministério Público, com a confissão dos factos praticados pelos arguidos, viu a sua missão, prova da acusação, facilitada, caso contrário, entende a defesa que, se os arguidos tivessem negado, pelo menos, no que aos ilícitos de 09/09/2019 e 15/09/2019 diz respeito seriam absolvidos, tal como sucedeu com a tentativa de roubo, no que tange ao BB, e coação agravada.

D) Pelo que, no nosso modesto entendimento, peca por excesso a pena de prisão única aplicada ao arguido BB de 5 anos e 9 meses de prisão, isto porque o Recorrente tem como atenuantes a confissão dos factos por si perpetrados; o arrependimento; o abandono da prática de ilícitos criminais desde a data em que foi “ameaçado” com a interceção pela entidade policial no dia 17 de Setembro de 2019 até 2/10/2019 e mediaram 15 dias.

E) E o facto de atualmente, no Estabelecimento Prisional ……, estar a em beneficiar de acompanhamento terapêutico para o consumo de estupefacientes (ponto 55 dos factos assentes),

F) Está a frequentar, com empenho e dedicação, um curso de Técnico de Instalação e Gestão de Redes. E desde Janeiro de 2020 iniciou funções laborais de ............ da zona prisional. Mantendo um comportamento adequado (ponto 56 dos factos assentes).

G) O Recorrente BB não foi apanhado em flagrante; do visionamento dos vídeos e da extração dos fotogramas, juntos aos autos, não se consegue identificar o Recorrente BB.

H) Mas, porque se arrependeu, o que referiu, por diversas vezes em sede de audiência e discussão de julgamento, decidiu colaborar com a justiça, confessando a práticas dos factos ilícitos que, efetivamente cometeu, o que não foi valorado pelo Tribunal a quo.

I) Por outro lado, o Tribunal a quo não teve em consideração a semelhança das condutas do Recorrente BB e a sua proximidade temporal, veja-se o hiato de tempo, muito curto, entre o dia 9 e o dia 17 de Setembro, medeiam 8 dias, e não teve em conta, para a fixação das penas parcelares e depois da pena única, a circunstância de que se tratou de comportamentos de toxicodependente, ou seja a obtenção de valores monetários para o consumo, in casu de ambos os arguidos, a cocaína.

J) Ora, se quanto à prática de cada um dos dois crimes de roubo agravado o Tribunal a quo condenou o arguido BB numa pena de 3 anos e 9 meses de prisão, penas que se encontram próximas do mínimo- 3 anos a 15 anos- e os dois crimes de roubo simples 1 ano e 9 meses, cada- com penas de 1 a 8 anos-, o mesmo não se verificou com a pena única aplicada nos termos do disposto no artigo 77º, nºs 1 e 2 do Cód. Penal, sendo que a moldura resultou compreendida entre 3 anos e 9 meses e 11 de prisão.

K) O Tribunal a quo decidiu aplicar a pena única de 5 anos e 9 meses, ou seja bastante acima da pena de 3 anos e 9 meses não tendo feito uma aplicação rigorosa e fundamentada do critério legal de tal pena, isto com referência às circunstâncias dos crimes praticados pelo Recorrente no seu relacionamento com a personalidade deste e considerando o fim da pena.

L) O Tribunal a quo tinha de ter em consideração que não é tanto o número de crimes que importa ter em atenção para determinar a gravidade do comportamento do Recorrente, mas sim o tipo de criminalidade levado a cabo por este, não sendo a repetição que pode agravar a tipologia criminosa.

M) Tendo em conta as circunstâncias atenuantes do Recorrente BB”, a concreta ilicitude dos factos em causa, não acentuada quando consideradas as condutas potencialmente abrangidas pela incriminação e atentos os concretos meios empregues…”;

N) A ausência de anteriores condenações e as “exigências de prevenção especial, não especialmente acentuadas”, entende o Recorrente BB que o Tribunal a quo, operando o cúmulo deveria ter aplicado a pena única de 4 anos e 9 meses, tendo em consideração o disposto nos artigos 77º, nº 1 e 2, 71º e 72º, todos do Código Penal, pois teria de atenuar especialmente as penas.

O) Assim impunha-se a suspensão da execução da pena por constituir princípio fundamental do sistema punitivo do Código Penal - artigo 40º- o da preferência estribada pela aplicação das penas não privativas da liberdade, consideradas mais eficazes para promover a integração do delinquente na sociedade e dar resposta às necessidades de prevenção geral e especial.

P) O artigo 50.º do Código Penal institui um poder-dever, ou seja um poder vinculado do julgador, que terá que decretar a suspensão da execução da pena, na modalidade que se afigurar mais conveniente para a realização daquelas finalidades, sempre que se verifiquem os pressupostos.

Q) Sendo uma medida penal de conteúdo reeducativo e pedagógico - Maia Gonçalves (Código Penal Português, 18.ª Edição, pág. 215 -, cujo pressuposto material consiste, na “… adequação da mera censura do facto e da ameaça da prisão às necessidades preventivas do caso, sejam elas de prevenção geral, sejam de prevenção especial…não pode o tribunal afastar a suspensão da execução da pena de prisão com base em considerações assentes na culpa grave do arguido - Paulo Pinto de Albuquerque (Comentário do Cód. Penal., Univ. Católica Editora, 2008,pág.195.)

R) “Para esse efeito, é necessário que o julgador, reportando-se ao momento da decisão e não ao da prática do crime, possa fazer um juízo de prognose favorável relativamente ao comportamento do arguido, no sentido de que a ameaça da pena seja adequada e suficiente para realizar as finalidades da punição; este juízo de prognose favorável ao comportamento futuro do arguido pode assentar numa expectativa razoável de que a simples ameaça da pena de prisão será suficiente para realizar as finalidades da punição e, consequentemente, a ressocialização (em liberdade) do arguido” – Ac do STJ de 27/01/2009.

S) E a ponderação das condições pessoais do arguido, da sua personalidade e conduta anterior e posterior aos factos, bem como as circunstâncias em que estes foram praticados, estão directamente associadas a finalidades de prevenção especial e não a quaisquer factores relacionados com o grau de culpa do agente, cuja sede própria de apreciação é a escolha e determinação concreta da pena, constituindo o limite máximo e inultrapassável desta.

T) O Tribunal deverá correr um “risco prudente”, uma vez que, como já há muito defendem Leal Henriques e Simas Santos, em anotação ao artigo 50.º do CP, “…esperança não é seguramente certeza…”, e como tal deve ser dada a possibilidade de perceber a oportunidade de ressocialização que lhe é oferecida.

U) Ora, a condenação do arguido BB não pode funcionar como exemplo para toda a sociedade em geral, antes, ponderado o facto de ter confessado os factos por si praticados, não ter antecedentes criminais, estar arrependido, e só ameaça da detenção cumpriu a sua funcionalidade, deverá ser dada a oportunidade ao arguido de interiorizar a pena de prisão, o que só por si já é mais que suficiente para o afastar da eventual prática futura de qualquer tipo de crime.

V) Assim, estende o recorrente que a pena única deverá ser reduzida para 4 anos e 9 meses, e pelos fundamentos acima elencados deve ser suspensa a sua execução, nos termos do disposto no artigo 50º do Código Penal, ainda que acompanhada de regime de prova, conforme artigo 53º do mesmo diploma legal.

W) O Tribunal a quo, ao não ter decidido neste sentido violou o disposto nos artigos 50º, 53º, 71º, 72º e 77º, nº 1 e 2 todos do Código Penal.

TERMOS EM QUE E NOS DEMAIS DE DIREITO

Deve ser dado provimento ao presente recurso, substituindo-se a decisão recorrida por outra que fixe a pena única em 4 anos e 9 meses e suspensa na sua execução, por se verificarem os pressupostos para o efeito, como melhor resulta das conclusões, ainda que sujeita a prova (…).

4.Neste Supremo Tribunal de Justiça, a Sra. Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer, nos termos do disposto no artigo 416.º, n.º 1, do CPP, entendendo que deve:

         -  Ser concedido provimento parcial ao recurso interposto pelo recorrente AA, reduzindo-se a pena única em que o mesmo foi condenado para 5 (cinco) anos de prisão, suspensa por igual período na sua execução, e sujeita a regime de prova; e,

         - Ser de concedido provimento total ao recurso interposto pelo recorrente BB, reduzindo-se a pena única em que o mesmo foi condenado para 4 (quatro) anos e 9 (nove) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 5 (cinco) anos e sujeita a regime de prova.

No que toca à restituição do veículo automóvel, requerido pelo arguido AA, entende não ser de deferir.

5. Cumprido o disposto no n.º 2, do artigo 417.º, do CPP, vieram os arguidos concordar com este Parecer, exceptuando, por banda do recorrente AA, no respeitante ao veículo automóvel, por entender que o mesmo lhe deve ser entregue.

6. Colhidos os vistos, de acordo com o exame preliminar, foram os autos presentes a conferência.

II.

7. O objecto do recurso cinge-se unicamente à discordância dos recorrentes da medida da pena que lhes foi aplicada:

 - o arguido AA, por entender que as penas parcelares são excessivas e devem ser reduzidas para medida próxima dos seus limites mínimos (conclusão C.); e, consequentemente, a pena única do cúmulo jurídico deverá ser reformulada e substancialmente reduzida (conclusão D.).

- o arguido BB restringe o seu recurso à determinação da pena única (conclusão A.)

O ora recorrente AA pretende, ainda, que seja revertida a decisão na parte em que declarou a perda do veículo de matrícula ….-HS a favor do Estado, decidindo-se pela restituição do mesmo ao seu proprietário.

8. São os seguintes, os factos provados na 1.ª Instância (no que interessa aos recursos interpostos), que assim se mostram estabelecidos:

(…)

Factos provados:

1. No início do mês de setembro de 2019, o arguido AA, porque precisava de dinheiro para os seus gastos, designadamente com aquisição de cocaína, delineou um plano para o obter dinheiro em postos de abastecimento de combustível, por ter concluído que nesses locais, atendendo ao elevado número de clientes, estariam disponíveis quantias elevadas.

2. Assim, no dia 09 de Setembro de 2019, AA abordou o arguido BB e transmitiu-lhe o plano, que consistia em atuarem em conjugação de vontades, meios e esforços, para obtenção das quantias monetárias em postos de abastecimento de combustível, através da utilização de objectos como os adiante referidos, para conseguirem que os empregados dos postos lhes entregassem o dinheiro pretendido, e, após dividirem o dinheiro entre si.

3. O arguido BB aderiu de imediato ao plano do arguido AA, para concretização do qual os arguidos contactavam entre si, quer presencialmente, quer por contato telefónico usando os telemóveis que possuíam.

I

4. Cerca das 22:30 horas do dia 09 de Setembro de 2019, os arguidos dirigiram-se ao posto de abastecimento de combustíveis da “…..”, localizado na Avenida …., em …, …, deslocando-se no veículo automóvel, de marca e modelo “…..”, com a matrícula …..-HS, propriedade do arguido AA e por este conduzido, seguindo o arguido BB no lugar ao lado do condutor.

5. O arguido AA parou o automóvel próximo do posto de combustível e permaneceu ao volante, enquanto o arguido BB saiu do automóvel e dirigiu-se ao mencionado posto, com um boné na cabeça, um …… a tapar a cara, umas luvas de borracha e uma faca nas mãos.

6. No interior daquele estabelecimento, o arguido BB abordou CC, que ali fazia atendimento, exibiu-lhe a faca, que empunhava na mão, e disse-lhe que se tratava de um assalto.

7. Mais disse o arguido BB a CC “pões o dinheiro na minha saca”, “pões a porra do dinheiro na minha saca”; CC, temendo pela sua própria vida, disse ao arguido “não me mate que eu tenho um filho pequenino, eu dou-lhe o dinheiro todo”, ao que o arguido lhe respondeu “não te vou matar, põe a porra do dinheiro na minha saca”, “põe todas as notas”.

8. No interior do estabelecimento encontrava-se também DD, a quem o arguido BB disse, ao entrar, que se afastasse e não saísse.

9. DD permaneceu quieto.

10. CC, perante a agressividade manifestada e exibição da faca pelo arguido BB, receou pela sua vida e pela sua integridade física e viu-se assim forçada a entregar ao arguido quantia não exactamente apurada, com o valor aproximado de €800,00 (oitocentos euros) e seguramente superior a €720,00 (setecentos e vinte euros), em notas do Banco Central Europeu, que retirou da caixa registadora.

11. Já na posse do dinheiro, o arguido BB abandonou o posto de abastecimento de combustíveis, correndo para o automóvel, referido em 4. e 5., que se encontrava parado na proximidade do local, estando o arguido AA ao volante, pondo-se ambos em fuga, dirigindo-se para …...

II

12. Pelas 18:30 horas do dia 15 de Setembro de 2019, o arguido BB, conduzido no mesmo veículo pelo arguido AA, dirigiu-se ao posto de abastecimento de combustíveis “…..”, situado em ….., na Rua da ….

13. Aí chegados, o arguido AA permaneceu no interior do automóvel e o arguido BB saiu, usando um boné na cabeça, um lenço para tapar o rosto, luvas de borracha nas mãos, uma saca de plástico e, empunhando uma tesoura, entrou naquele estabelecimento.

14. No interior do estabelecimento, o arguido BB, em viva voz, disse “isto é um assalto, não estou brincando” e, de seguida, apontou a tesoura na direção do local onde se encontrava uma criança, filha de cliente do posto que ali se encontrava, EE, e dizendo ao gerente do estabelecimento, FF, que lhe desse o dinheiro ou faria mal à criança.

15. O referido FF, por recear pela sua vida e integridade física e pela vida e integridade física de EE e do filho desta, entregou ao arguido BB a quantia de €430,00 (quatrocentos e trinta euros), em notas do Banco Central Europeu, que se encontravam na caixa registadora.

16. Já na posse do dinheiro, o arguido BB abandonou o posto de abastecimento de combustíveis, correndo em direção do automóvel onde se encontrava o arguido AA ao volante, pondo-se ambos em fuga, dirigindo-se para …..

III

17. Cerca das 13:35 horas do dia 17 de setembro de 2019, o arguido BB, usando um boné na cabeça, o rosto tapado com um lenço, e munido de uma faca, dirigiu-se ao posto de abastecimento de combustíveis da “…..”, localizado na Rua …, …., em .., local para onde foi conduzido pelo arguido AA.

18. O arguido BB assim que entrou, empunhando a faca, em viva voz disse à empregada do estabelecimento que ali se encontrava “isto é um assalto, põe tudo na saca”.

19. A referida empregada, porque receou pela sua integridade física e pela sua vida, entregou de imediato ao arguido quantia monetária não concretamente apurada, mas que se situa entre €15,00 a €20,00 (quinze a vinte euros), em notas do Banco Central Europeu.

20. Porque nesse momento se aproximaram clientes, o arguido BB pôs-se de imediato em fuga, levando consigo a referida quantia monetária, dirigiu-se ao automóvel onde o esperava o arguido AA, ao volante, pondo-se ambos em fuga, na direcção de .., em …, onde chegaram cerca de uma hora depois.

IV

21. Nesse mesmo dia 17 de setembro de 2019, cerca das 14:35 horas, os arguidos dirigiram-se ao posto de abastecimento de combustíveis da “……”, sito na Estrada …, em …, ….

22. O arguido BB, assim que entrou no estabelecimento, com a cara tapada e empunhando a faca, em viva voz disse ao empregado do posto que ali se encontrava que se tratava de um assalto e que queria rapidamente que lhe entregasse o dinheiro.

23. O aludido empregado, porque receou pela sua integridade física e pela sua vida, entregou de imediato ao arguido a cerca de €100,00 (cem euros), em notas do Banco Central Europeu.

24. Porque nesse momento se aproximaram clientes, o arguido BB abandonou o posto de abastecimento de combustíveis, levando consigo a referida quantia, dirigiu-se ao automóvel onde se encontrava o arguido AA ao volante, pondo-se ambos em fuga, dirigindo-se para …….

25. Ainda nesse dia 17 de setembro de 2019, os arguidos foram interceptados por autoridade policial, tendo então os arguidos na sua posse dinheiro (cento e cinco euros) obtido nos postos de abastecimento de combustíveis, um saco de plástico, um pano, um gorro, um pedaço (“manga”) de uma camisa axadrezada, um par de luvas de cozinha amarelas e azúis, outras peças de vestuário e os telemóveis que utilizavam, designadamente para comunicarem entre si, como referido em 3, tudo sendo apreendido, bem como a faca referida em 17. e em 22.

V

26. Cerca das 23:00 horas do dia 22 de Setembro de 2019, o arguido AA dirigiu-se ao posto de abastecimento de combustíveis da “……”, sito na Rua ….., em …..

27. O arguido AA, assim que entrou no estabelecimento, com a cara destapada, empunhando uma navalha e tirando um saco do bolso, disse, em viva voz, aos dois empregados do estabelecimento que ali se encontravam, “passa para cá a nota” e, porque tais trabalhadores demoravam a entregar-lhe o dinheiro e lhe disseram que estava a chegar a Polícia, o arguido AA optou por fugir do local sem levar qualquer quantia.

28. Os arguidos foram detidos no dia 02 de Outubro de 2019, tendo então o arguido AA na sua posse a navalha referida em 27., a qual tem cerca de dezoito centímetros de comprimento, sendo sete centímetros e meio de lâmina.

29.

29.1. Ao actuarem da forma descrita em 1. a 24., os arguidos BB e AA agiram em comunhão e conjugação de esforços, com o objetivo, alcançado, de se apropriarem de valores monetários, recorrendo à violência mediante o uso de objetos cortantes para, dessa forma, ameaçarem a integridade física e mesmo a vida dos visados, assim os constrangendo a não se oporem à concretização dos seus intentos, bem sabendo que as quantias de que se apropriaram não lhes pertenciam e que causavam prejuízos aos seus legítimos donos.

29.2. Ao actuar como descrito em 26. e 27., o arguido AA agiu com o objetivo de se apropriar de valores monetários, recorrendo à violência mediante o uso da navalha para, dessa forma, ameaçar a integridade física e mesmo a vida dos visados, assim os constrangendo a não se oporem à concretização dos seus intentos, bem sabendo que o dinheiro de que pretendia apropriar-se não lhe pertencia.

30. Os arguidos, ao atuarem da forma descrita, agiram contra a vontade dos donos dos referidos postos de abastecimento de combustíveis.

31. Os arguidos agiram sempre de livre vontade, deliberada e conscientemente, sabendo que as suas descritas condutas eram proibidas e punidas pela lei penal.

32. O arguido AA nasceu em …., sendo o segundo de dois filhos ............ e de ............, tendo o agregado familiar condição sócio-económica modesta, e trabalhando o pai na … (então …..), o que motivou que durante os dois primeiros anos de vida do arguido o agregado tenha residido na …., após o que, devido à ….. que decorreu naquele país, a mãe e os filhos regressaram a …, passando o convívio com o pai a ocorrer apenas um mês por ano, por altura das férias em Portugal, preocupando-se os pais em transmitir ao arguido e irmã valores pró-sociais.

33. O arguido cresceu sem dificuldades de relacionamento com os seus pares, apesar de, desde cedo, sentir necessidade de se isolar sem motivo aparente. Iniciou a escolaridade em idade própria, sendo o seu percurso escolar marcado por baixo aproveitamento e dificuldades de aprendizagem, tendo registado duas reprovações, nos quatro e oitavo ano, tendo sido referenciado, durante o primeiro ciclo de escolaridade, para acompanhamento psicológico.

34. Quando o arguido tinha treze anos de idade, o pai faleceu, em consequência de doença súbita.

35. O arguido concluiu o nono ano de escolaridade com dezasseis anos de idade, e ingressou num curso de educação e formação na ............, promovido pelo Instituto do Emprego e da Formação Profissional …, curso esse que não concluiu, devido a elevado absentismo.

36. O arguido AA iniciou-se na vida ativa trabalhando como ............ em empresas locais, desempenhando tarefas indiferenciadas, de forma temporária e sem vínculo laboral. Em 2012, com a ajuda da sua irmã, iniciou funções numa empresa…….., trabalho que manteve durante três anos.

37. O arguido continuou a viver com a mãe e a irmã até que esta, com vinte e cinco anos de idade, se autonomizou e saiu de casa. Em 2013, os avós maternos do arguido integraram o agregado familiar, ficando o arguido com a incumbência de “olhar por eles”. Nessa altura o arguido acentuou o seu isolamento social e consumiu bebidas alcoólicas em excesso, com episódios de embriaguez, um acidente de viação e problemas com as forças de segurança locais. Neste contexto, reduziu o consumo de bebidas alcoólicas, mas passou a automedicar-se, com prescrições do foro psiquiátrico destinadas à mãe e aos avós. Em 2016, a mãe do arguido foi sujeita a internamento, devido a problemas psiquiátricos, ficando o arguido sozinho com os avós maternos.

38. Durante o ano de 2018 e até Junho de 2019, o arguido teve ocupações laborais precárias e temporárias, como ............ e na ............ e ............, trabalhando algum tempo na … e em ... A situação do agregado familiar, então constituído pelo arguido, mãe e avós maternos, era economicamente difícil e as discussões entre arguido e mãe frequentes.

39. O arguido iniciou o consumo de haxixe com dezasseis nos de idade e, em 2017, passou a consumir também cocaína. Continuava a consumir medicamentos, sem que lhe fossem prescritos.

40. O meio de residência do arguido AA é uma zona urbana, sendo o arguido visto como um individuo indolente e solitário, com estilo de vida ocioso, mas não se conhecendo fenómenos de rejeição.

41. O arguido detém competências primárias ao nível da capacidade de aprendizagem, capacidade de utilização dos conhecimentos e capacidade de lidar com fontes de informação escrita. Igualmente primárias, são as suas capacidades de pensamento e raciocínio crítico. São insipientes as suas competências interpessoais e sociais, designadamente de resolução de conflitos, comunicação, negociação, descentração e autocontrolo. O arguido AA denota fraca responsabilização, embotamento afectivo significativo e pensamento consequencial reduzido.

42. Desde que ingressou no Estabelecimento Prisional …, em 03.10.2019, preso preventivamente à ordem do presente processo, o arguido AA aceitou e vem beneficiando do acompanhamento que então lhe foi proposto, pelo Centro de Respostas Integradas de ….., incluindo acompanhamento psicológico e psiquiátrico e estando medicado para problemas emocionais.

43. Em Outubro de 2019, ingressou em curso……, que frequenta com grande irregularidade e pouco empenho. Em Abril de 2020, iniciou funções laborais como ….. da zona prisional, tarefas que realiza com desempenho sofrível. Em Março de 2020, fora punido com medida disciplinar de permanência obrigatória no alojamento, pelo período de sete dias, suspensa na sua execução, por agressões físicas a outro recluso, em 15.02.2020. Com ressalva deste episódio, de uma forma geral, mantém comportamento correto com a restante população prisional, funcionários e agentes.

44. Recebeu visitas frequentes e regulares da mãe e irmã, até à suspensão de visitas no contexto de emergência de saúde pública ocasionada pela pandemia da Covid-19, mantendo então contacto regular com esses familiares através de chamadas telefonemas e videochamadas. A mãe e a irmã do arguido manifestam disponibilidade para o apoiar durante e após a reclusão, nomeadamente para o acolherem e acompanharem no tratamento dos seus problemas de saúde.

45. Não consta qualquer condenação do certificado de registo criminal do arguido AA emitido em 23.06.2020.

46. O arguido BB nasceu e cresceu em …., filho único de ……. e de ............, sendo modesta a condição sócio-económica do agregado familiar.

47. O pai do arguido faleceu tinha, em consequência de doença….., tinha o arguido cerca de sete anos de idade. A mãe do arguido padece de problemas de saúde mental.

48. O arguido BB iniciou o percurso escolar em idade própria, fê-lo com aproveitamento, com ressalva de uma reprovação, no oitavo ano. Concluiu o décimo segundo ano de escolaridade com dezanove anos de idade e ingressou no ensino superior, matriculando-se no curso de…… da Universidade …. Neste período da sua vida iniciou o consumo esporádico de estupefacientes e de bebidas alcoólicas, em excesso, no contexto de convívio com grupos de amigos, com desinvestimento nos hábitos de estudo e na prática de desporto a que até então se dedicara (chegando a praticar desportos de combate de forma federada).

49. Abandonou o curso de ….. e ingressou num curso de especialização tecnológica, em….., ministrado num polo da Universidade ….. em …., que lhe permitiria a obtenção do grau de bacharel, todavia, por absentismo, desmotivação, ausência de hábitos de estudo e primazia dada ao convívio com amigos, acabou por desistir e matricular-se num curso de …….., em …, também sem sucesso, devido aos mesmos hábitos.

50. Quando tinha cerca de vinte e um anos de idade, o arguido BB desistiu dos estudos e regressou a … para trabalhar na área da ............, com um tio. Pouco depois, celebrou contrato com o ……., onde permaneceu dois anos até passar à disponibilidade territorial, regressando a …. e passando a residir com a mãe e com a avó materna, trabalhando ocasionalmente como……., em empresas da região, e em……, em ….., para empresas de trabalho temporário.

51. Em 2015 o arguido decidiu ingerir medicação psiquiátrica da mãe, mantendo em simultâneo o consumo excessivo de bebidas alcoólicas, contexto em que ocorreu conflito com a avó que motivou a prisão preventiva do arguido desde Junho de 2015 até Agosto do mesmo ano, no âmbito de processo de inquérito (n.º 260/15…., do DIAP de …) que foi suspenso provisoriamente e, após, arquivado.

52. No contexto de tal processo, o arguido BB compareceu às entrevistas com o técnico de reinserção social e procurou manter-se activo profissionalmente (trabalhando como ….. e……, através de uma empresa de trabalho temporário), bem como frequentou uma consulta de psiquiatria no Centro Hospitalar…., faltando às seguintes, sendo-lhe diagnosticado “distúrbio de personalidade e debilidade mental ligeira”.

53. Em Setembro de 2019, o arguido BB residia com a mãe, em …, na casa desta. A relação com a mãe era distante e pontuada por conflitos e discussões, com episódios recorrentes de insultos. O arguido encontrava-se desempregado e ocupava o seu tempo livre vendo filmes e lendo livros, em casa, no contexto de algum isolamento social. O agregado subsistia sem dificuldades assinaláveis, graças à pensão da mãe e à ajuda de uma tia do arguido. O meio de residência é uma zona urbana, sem conotação com problemáticas sociais, sendo o arguido percepcionado como consumidor de estupefacientes, associado a pequena delinquência e sem ocupação laboral.

54. O arguido consumia haxixe e cocaína, com regularidade, tomava medicação psiquiátrica sem prescrição médica e utilizava bebidas alcoólicas em excesso, menorizando a necessidade de tratamento clínico destas problemáticas.

55. Desde que ingressou no Estabelecimento Prisional …, em 03.10.2019, preso preventivamente à ordem do presente processo, o arguido vem beneficiando de acompanhamento terapêutico para o consumo de estupefacientes, pelo Centro de Respostas Integradas …., incluindo acompanhamento psicológico. Beneficia ainda de acompanhamento regular em consulta de psiquiatria.

56.Em Outubro de 2019, o arguido BB ingressou em curso de Técnico….., que vem frequentando com empenho e dedicação. Em Janeiro de 2020, iniciou funções laborais como ............ da zona prisional, posto de trabalho que ocupa com bom desempenho e correção. Em meio prisional, mantém comportamento adequado, não registando infrações disciplinares. Adere a atividades socioculturais e ocupacionais dinamizadas no âmbito da escola e dos serviços técnicos. Recebe visitas de amigos com regularidade ocasional.

57.Actualmente, a mãe do arguido BB está internada em Unidade de Cuidados Continuados, não tendo o arguido outras referências familiares.

58. Não consta qualquer condenação do certificado de registo criminal do arguido BB emitido em 23.06.2020.

(…).

9.  O objecto dos presentes recursos visa a redução da medida da pena que foi imposta aos arguidos AA e BB, nos termos expendidos em supra 7. deste acórdão: o AA relativamente ao quantum das penas parcelares e, em consequência, da medida da pena única, e o BB da pena única.

Para tal, os arguidos alegam que o tribunal recorrido errou numa dupla vertente: na determinação das penas, parcelares (AA) e única (AA e BB), violando os critérios previstos nos artigos 40.º, 71.º, n.º 1 e 77.º, todos do CP, e por ter olvidado os factores pessoais de cada um deles, nomeadamente, o facto de não terem antecedentes criminais, terem confessado e mostrado o seu arrependimento, terem vivido em ambientes pouco estruturados e não lhes ter sido dada a oportunidade de interiorizar a pena de prisão, sendo que a situação de prisão preventiva em que se mantêm desde  03.10.2019, é só por si mais que suficiente para os afastar da eventual prática futura de qualquer tipo de crime.

A Sra. Procuradora-Geral Adjunta, junto deste Supremo Tribunal de Justiça, no seu Parecer, entende que deve:

-  Ser concedido provimento parcial ao recurso interposto pelo recorrente AA, reduzindo-se a pena única em que o mesmo foi condenado, para 5 anos de prisão, suspensa por igual período na sua execução, e sujeita a regime de prova; e,

- Ser de concedido provimento total ao recurso interposto pelo recorrente BB, reduzindo-se a pena única em que o mesmo foi condenado para 4 anos e 9 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 5 anos e sujeita a regime de prova.

10. Apreciemos.

11. Nos termos do artigo 40.º do CP, que dispõe sobre as finalidades das penas, “a aplicação de penas e de medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade” e “em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa”, devendo a sua determinação ser feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, de acordo com o disposto no artigo 71.º, do mesmo diploma.

Como se tem reiteradamente afirmado, encontra este regime os seus fundamentos no artigo 18.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa (CRP), segundo o qual “a lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos”. A restrição do direito à liberdade, por aplicação de uma pena (artigo 27.º, n.º 2, da CRP), submete-se, assim, tal como a sua previsão legal, ao princípio da proporcionalidade ou da proibição do excesso, que se desdobra nos subprincípios da necessidade ou indispensabilidade – segundo o qual a pena privativa da liberdade se há-de revelar necessária aos fins visados, que não podem ser realizados por outros meios menos onerosos – adequação – que implica que a pena deva ser o meio idóneo e adequado para a obtenção desses fins – e da proporcionalidade em sentido estrito – de acordo com o qual a pena deve ser encontrada na “justa medida”, impedindo-se, deste modo, que possa ser desproporcionada ou excessiva[2].

12. A projecção destes princípios no modelo de determinação da pena justifica-se pelas necessidades de protecção dos bens jurídicos tutelados pelas normas incriminadoras violadas (finalidade de prevenção geral) e de ressocialização (finalidade de prevenção especial), em conformidade com um critério de proporcionalidade entre a gravidade da pena e a gravidade do facto praticado, avaliada, em concreto, por factores ou circunstâncias relacionadas com este e com a personalidade do agente, relevantes para avaliar da medida da pena da culpa e da medida da pena preventiva que, não fazendo parte do tipo de crime (proibição da dupla valoração), deponham a favor do agente ou contra ele (artigos 40.º e 71.º, n.º 1, do CP).

Como se tem reafirmado, para a medida da gravidade da culpa há que, de acordo com o citado artigo 71.º, n.º 2, considerar os factores reveladores da censurabilidade manifestada no facto, nomeadamente, os factores capazes de fornecer a medida da gravidade do tipo de ilícito objectivo e subjectivo – indicados na alínea a), primeira parte (grau de ilicitude do facto, modo de execução e gravidade das suas consequências), e na alínea b) (intensidade do dolo ou da negligência) –, os factores a que se referem a alínea c) (sentimentos manifestados no cometimento do crime e fins ou motivos que o determinaram) e a alínea a), parte final (grau de violação dos deveres impostos ao agente), bem como os factores atinentes ao agente, que têm que ver com a sua personalidade – factores indicados na alínea d) (condições pessoais e situação económica do agente), na alínea e) (conduta anterior e posterior ao facto) e na alínea f) (falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto). Na consideração das exigências de prevenção, destacam-se as circunstâncias relevantes por via da prevenção geral, traduzida na necessidade de protecção do bem jurídico ofendido mediante a aplicação de uma pena proporcional à gravidade dos factos, reafirmando a manutenção da confiança da comunidade na norma violada, e de prevenção especial, que permitam fundamentar um juízo de prognose sobre o cometimento de novos crimes no futuro e, assim, avaliar das necessidades de socialização. Incluem-se aqui o comportamento anterior e posterior ao crime [alínea e)], com destaque para os antecedentes criminais) e a falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto [alínea f)]. O comportamento do agente, a que se referem as circunstâncias das alíneas e) e f), adquire particular relevo para determinação da medida da pena em vista das exigências de prevenção especial (sobre estes pontos, para melhor aproximação metodológica na determinação do sentido e alcance da previsão do artigo 71.º do CP, cfr. Anabela Miranda Rodrigues, A Determinação da Medida da Pena Privativa da Liberdade, Os Critérios da Culpa e da Prevenção, Coimbra Editora, 2014, em particular pp. 475, 481, 547, 563, 566 e 574, e Figueiredo Dias, Direito Penal Português - As Consequências Jurídicas do Crime, Coimbra Editora, 3.ª reimp., 2011, pp. 232-357).

Há que, como se acentuou, ponderar as exigências antinómicas de prevenção geral e de prevenção especial, em particular as necessidades de prevenção especial de socialização “que vão determinar, em último termo, a medida da pena”, seu “critério decisivo”, com referência à data da sua aplicação (assim, acentuando estes pontos, Figueiredo Dias, ob. cit., §309, p. 231, §334, p. 244, §344, p. 249), tendo em conta as circunstâncias a que se refere o artigo 71.º, do CP, nomeadamente, as condições pessoais do agente e a sua situação económica e a conduta anterior e posterior ao facto, especialmente quando esta tenha em vista a reparação das consequências do crime, que relevam por esta via.

Em síntese: A determinação da pena, realizada em função da culpa e das exigências de prevenção geral de integração e da prevenção especial de socialização, de harmonia com o disposto com os artigos citados - 40.º e 71.º - , deve, no caso concreto, corresponder às necessidades de tutela do bem jurídico em causa e às exigências sociais decorrentes daquela lesão, sem esquecer que deve ser preservada a dignidade humana do delinquente.

13. No caso em concreto, os arguidos foram condenados, cada um deles, nas seguintes penas parcelares:
1. O arguido AA pela prática, em co-autoria de:

- Um crime de roubo agravado (dia 09.09.2019), p. e p. pelo artigo 210.º, n.ºs 1, e 2, al. b), do CP (por referência ao artigo 204.º, n.º 2, al. f), do CP), na pena de 3 (três) anos e 9 (nove) meses de prisão;

- Um crime de roubo agravado (dia 15.09.2019), p. e p. pelo artigo 210.º, n.ºs 1 e 2, al. b), do CP (por referência ao artigo 204.º, n.º 2, al. f), do CP), na pena de 3 (três) anos e 9 (nove) meses de prisão;

- Um crime de roubo (dia 17.09.2019), p. e p. pelo artigo 210.º, n.º 1, do CP, na pena de 1 (um) ano e 9 (nove) meses de prisão;

- Um crime de roubo (dia 17.09.2019) p. e p. pelo artigo 210.º, n.º 1, do CP, na pena de 1 (um) ano e 9 (nove) meses de prisão;

- Um crime de roubo em autoria singular na forma tentada (dia 22.09.2019), p. e p. pelos artigos 210.º, n.º 1, 22.º, 23.º, n.ºs 1, e 2, 73.º, n.º 1, als. a) e b), todos do CP, na pena 9 (nove) meses de prisão.

E, em cúmulo jurídico, foi o arguido condenado na pena única de 6 (seis) anos de prisão.
2. O arguido BB pela prática, em co-autoria de:

- Um crime de roubo agravado (dia 09.09.2019) p. e p. pelo artigo 210.º, n.ºs 1, e 2, al. b), do CP (por referência ao artigo 204.º, n.º 2, al. f), do CP), na pena de 3 (três) anos e 9 (nove) meses de prisão;

- Um crime de roubo agravado (dia 15.09.2019) p. e p. pelo artigo 210.º, nº s 1, e 2, al. b), do CP (por referência ao artigo 204.º, n.º 2, al. f), do CP), na pena de 3 (três) anos e 9 (nove) meses de prisão;

- Um crime de roubo (dia 17.09.2019) p. e p. pelo artigo 210.º, nº 1, do CP, na pena de 1 (um) ano e 9 (nove) meses de prisão;

- Um crime de roubo (dia 17.09.2019) p. e p. pelo artigo 210.º, n.º 1, do CP, na pena de 1 (um) ano e 9 (nove) meses de prisão;

E, em cúmulo jurídico, foi o arguido condenado na pena única de 5 (cinco) anos e 9 (nove) meses de prisão.

14. Entende o arguido AA que as penas parcelares são excessivas, devendo ser reduzidas a uma medida muito próxima do seu limite mínimo.

Vejamos.

O acórdão recorrido fundamenta a sua decisão, no que respeita à determinação e medida das penas aplicadas, no seguinte:

(…) No caso em julgamento:

Demonstrou-se que os arguidos AA e BB, de comum acordo (factos enunciados em 1. a 3., 29.1.) e conjugando esforços (4. a 11., 12. a 16., 17. a 20. e 21. a 24.), usando de atitude intimidatória (potenciada pela ocultação do rosto do arguido BB e pela exibição de objectos cortantes aptos a serem usados como meios de agressão, acompanhada de expressões sugestivas da disposição para os usar), fizeram com que em diversas datas e postos de abastecimento de combustíveis lhes fossem entregues as quantias referidas em 10. (não menos de €720,00, em 09.09.2019), 15. (€430,00, em 15.09.2019), 19. (€15,00 a €20,00, em 17.09.2019) e 23. (€100,00, em momento posterior desse mesmo dia 17.09.2019), quantias essas de que os arguidos se apoderaram.

Os factos enunciados em 29.1., 30. e 31., consubstanciam, relativamente a ambos os arguidos e aos factos acabados de mencionar, os pressupostos da afirmação de actuação culposa, mais precisamente dolosa, pressuposto da punição por roubo (artigo 13º do Código Penal) e que, como decorre do previsto nos artigos 14º e 17º, n.º 1, do Código Penal, podem sistematizar-se em elemento intelectual (representação de facto que preenche um tipo de crime – factos enunciados em 29.1. e 30.), elemento volitivo (vontade, necessariamente livre, para o ser, mas que poderá ser mais ou menos intensa, de praticar os factos delituosos, a determinar diversas gradações do dolo, que poderá ser directo, necessário ou meramente eventual – artigo 14º do Código Penal –, sendo que no caso assumiu aquela primeira gradação: factos indicados em 29.1. e em 31.) e elemento emocional (consciência do desvalor e proibição legal da conduta – 31.) – cfr. FIGUEIREDO DIAS, “Temas Básicos da Doutrina Penal”, 2001, pág.s 243 e seg.s.

Concorrem, portanto, nas demonstradas condutas de ambos os arguidos, relativamente às ocasiões descritas em I (09.09.2019, “….”, …, ….., não menos de €720,00), em II (15.09.2019, “……”, …, €430,00), em III (17.09.2019, “……..”, …, …, €15,00 a €20,00) e IV (17.09.2019, “…….”, …, …., €100,00), todos os pressupostos da punição pelo crime por que vinham acusados.

Todavia, como resulta do já exposto, apenas relativamente aos crimes praticados em 09.09.2019 (“…..”, …, ….., não menos de €720,00) e em 15.09.2019 (“……”, …., €430,00) se verificam os pressupostos da agravação prevista na citada disposição do n.º 2 do artigo 210º do Código Penal, já que relativamente aos demais ocorre a circunstância excludente de tal agravação estabelecida na última parte da al. b) do n.º 2 do artigo 210º.

Em conclusão, os arguidos praticaram, em co-autoria, dois crimes de roubo agravado, previsto no n.º 2, al. b), do artigo 210º, puníveis com penas de prisão de 3 (três) a 15 (quinze) anos, e dois crimes de roubo simples, puníveis nos termos do artigo 210º, n.º 1, com penas de 1 (um) a 8 (oito) anos de prisão.

(…)

Demonstraram-se, todavia, factos – os descritos em 26., 27., 29.2., 30. e 31., que consubstanciam a prática pelo arguido AA, no referido dia 22.09.2019, de um crime de roubo, na forma tentada, previsto nos termos dos já citados artigos 210º, n.º 1 (que não também n.º 2, já que nada se demonstrou – ou foi sequer alegado na acusação – relativamente ao valor que o arguido pretenderia obter), 22º e 23º do Código Penal, punível, por força do disposto no artigo 73º, n.º 1, al.s a) e b), e artigo 41º do Código Penal, com pena de prisão a fixar entre 1 (um) mês e 5 (cinco) anos e 4 (quatro) meses.

(…)

Penas

Como já referido, aos crimes praticados, em co-autoria, pelos arguidos AA e BB, são aplicáveis penas de prisão de 3 (três) a 15 (quinze) anos, no que respeita aos perpetrados em 09.09.2019 e em 15.09.2019, e de 1 (um) a 8 (oito) anos de prisão, no que concerne aos dois crimes praticados em 17.09.2019. E ao crime praticado pelo arguido AA em 22.09.2019 é aplicável pena de prisão a fixar entre 1 (um) mês e 5 (cinco) anos e 4 (quatro) meses.

Entre tais limites, determinam-se as penas, ponderando, de acordo com o critério estabelecido no artigo 71º do Código Penal, por referência ao estabelecido no artigo 40º do mesmo Código, em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, “todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor do agente ou contra ele”.

Ponderam-se assim, designadamente, os seguintes factores:

- as muito intensas exigências de prevenção geral relativamente ao crime de roubo, atenta a frequência da prática de crimes patrimoniais violentos, suscitando generalizada convicção comunitária de insegurança e impondo fortes e injustos constrangimentos (limitações da liberdade) no quotidiano da maior parte dos cidadãos;

- a concreta ilicitude dos factos em causa, não acentuada, quando consideradas as condutas potencialmente abrangidas pela incriminação e atentos os concretos meios empregues, ofensas pessoais (mais precisamente, violência moral) e danos patrimoniais;

- tais circunstâncias relevantes na valoração da objectiva gravidade das condutas, repercutem-se também no juízo de censura que o comportamento dos arguidos justifica, tal como releva na determinação da intensidade do juízo de censura (culpa) que as demonstradas acções merecem a intensidade do dolo, em qualquer dos casos directo (artigo 14º, n.º 1, do Código Penal);

- mas, nessa mesma sede, importa considerar também a modesta e adversa condição familiar e económica, bem como cognitiva e cultural (estas, na medida em que se repercutem em maior dificuldade na adequada percepção e ponderação do desvalor das acções), condições essas denotada nos factos enunciados em 32. a 44. (arguido AA) e em 46. a 57. (arguido BB);

- os factores referidos por último e, com pendor diverso, a ausência de anteriores condenações (45. e 58.), relevam também na valoração das exigências de prevenção especial, não especialmente acentuadas.

Não se vendo razão para diferenciar a responsabilidade dos arguidos relativamente aos factos que praticaram em co-autoria, atentos os aludidos critérios e factores, entre os limites legais já indicados, conclui o Tribunal Colectivo serem consentidas pela culpa de cada um dos arguidos, necessárias para significar o desvalor dos factos praticados e a validade da sua proibição legal e necessárias também para advertir os arguidos contra a prática de novos crimes, as penas de: 3 (três) anos e 9 (nove) meses de prisão, pelo crime praticado no dia 09.09.2019; 3 (três) anos e 9 (nove) meses de prisão, pelo crime praticado no dia 15.09.2019; 1 (um) ano e 9 (nove) meses de prisão, pelo crime praticado no dia 17.09.2019, em ….; 1 (um) ano e 9 (nove) meses de prisão, pelo crime praticado no dia 17.09.2019, em …; e a pena de 9 (nove) meses de prisão, no que respeita ao crime praticado apenas pelo arguido AA no dia 22.09.2019.

(…).

Concatenando o dito em supra 11. e 12. com o dito na fundamentação do acórdão agora transcrita, conclui-se que o tribunal interpretou de forma correcta e adequada, o disposto nos artigos 40.º e 70.º do CP, ponderando a determinação de cada uma das  penas, em função da culpa e das exigências de prevenção geral de integração e da prevenção especial de socialização, tendo em atenção, no caso concreto, as necessidades de tutela do bem jurídico violado, e as exigências sociais decorrentes daquela lesão, sem ter olvidado as condições pessoais do ora recorrente.

Pelo que, nesta parte, improcede a pretensão do arguido AA.

15. Passemos, agora, a apreciar o acerto da pena única aplicada aos arguidos, que pretendem a sua redução.

Na moldura abstracta unitária, definida no n.º 2, do artigo 77.º, do CP, ressalta o seguinte:

Ao arguido AA é aplicável a pena entre 3 anos e 9 meses de prisão (correspondente à mais elevada das penas parcelares) a 11 anos e 9 meses de prisão (correspondente à soma material de todas as penas parcelares). Foi condenado na pena única de 6 anos de prisão.

Ao arguido BB é aplicável a pena entre 3 anos e 9 meses de prisão (correspondente à mais elevada das penas parcelares) a 11anos de prisão (correspondente à soma material de todas as penas parcelares). Foi condenado na pena única de 5 anos e 9 meses de prisão.

16. Vejamos, ainda:

O artigo 77.º, n.º 1, do CP, estabelece que o critério específico a usar na fixação da medida da pena única é o da consideração em conjunto dos factos e da personalidade do agente (cfr. ainda supra 11. e 12.).

Não tendo o legislador nacional optado pelo sistema de acumulação material (soma das penas com mera limitação do limite máximo), nem pelo da exasperação ou agravação da pena mais grave (elevação da pena mais grave, através da avaliação conjunta da pessoa do agente e dos singulares factos puníveis, elevação que não pode atingir a soma das penas singulares, nem o limite absoluto legalmente fixado), é forçoso concluir que, com a fixação da pena conjunta, se pretende sancionar o agente, não só pelos factos individualmente considerados, mas também e, especialmente, pelo respectivo conjunto,  e não como mero somatório de factos criminosos, mas enquanto revelador da dimensão e gravidade global do comportamento delituoso do agente, visto que a lei manda se considere e pondere, em conjunto (e não unitariamente), os factos e a personalidade do agente - Professor Jorge de Figueiredo Dias, em “Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime”, Aequitas, 1993, pp. 290-292, como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado.
O todo não equivale à mera soma das partes e, além disso, os mesmos tipos legais de crime são passíveis de relações existenciais diversíssimas, a reclamar uma valoração que não se repete, de caso para caso.

17. A este novo ilícito corresponderá uma nova culpa (que continuará a ser culpa pelo facto) mas, agora, culpa pelos factos em relação – afinal, a valoração conjunta dos factos e da personalidade, de que fala o Código Penal.

Na avaliação da personalidade– unitária – do agente relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência ou, eventualmente, mesmo a uma “carreira” criminosa, ou tão-só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade: só no primeiro caso, não já no segundo, será cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta.

Acresce que importará relevar o efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização).

Realce-se ainda que, na determinação da medida das penas parcelar e única não é admissível uma dupla valoração do mesmo factor com o mesmo sentido: assim, se a decisão faz apelo à gravidade objectiva dos crimes está a referir-se a factores de medida da pena que já foram devidamente equacionados na formação das penas parcelares.

Será, assim, o conjunto dos factos que fornece a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique.

Um dos critérios fundamentais em sede daquele sentido de culpa, numa perspectiva global dos factos, é o da determinação da intensidade da ofensa e dimensão do bem jurídico ofendido, sendo certo que assume significado profundamente diferente a violação repetida de bens jurídicos ligados à dimensão pessoal, em relação a bens patrimoniais.

Por outro lado, importa determinar os motivos e objectivos do agente, no denominador comum dos actos ilícitos praticados e, eventualmente, dos estados de dependência, bem como a tendência para a actividade criminosa expressa pelo número de infracções, pela sua permanência no tempo, pela dependência de vida em relação àquela actividade.

Na avaliação da personalidade expressa nos factos é todo um processo de socialização e de inserção, ou de repúdio pelas normas de identificação social e de vivência em comunidade, que deve ser ponderado[3].

O artigo 77.º, n.º 2, do CP, por seu turno, estabelece que pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 25 anos, tratando-se de pena de prisão, e 900 dias tratando-se de pena de multa; e, como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes.

Será, assim, o conjunto dos factos que fornece a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação, a conexão e o tipo de conexão, que se verifique entre os factos concorrentes.

O concurso de crimes tanto pode decorrer de factos praticados na mesma ocasião, como de factos perpetrados em momentos distintos, temporalmente próximos ou distantes. Por outro lado, o concurso tanto pode ser constituído pela repetição do mesmo crime, como pelo cometimento de crimes da mais diversa natureza. Por outro lado, ainda, o concurso tanto pode ser formado por um número reduzido de crimes, como pode englobar inúmeros crimes.

18. Revertendo ao caso.

Ponderou o acórdão recorrido as exigências de prevenção geral muito intensas relativamente ao crime de roubo, atento o número dos crimes patrimoniais praticados e com utilização de violência, suscitando generalizada convicção comunitária de insegurança e impondo fortes e injustos constrangimentos (limitações da liberdade) no quotidiano da maior parte dos cidadãos; a concreta ilicitude dos factos em causa, não acentuada, quando consideradas as condutas potencialmente abrangidas pela incriminação e atentos os concretos meios empregues, ofensas pessoais (mais precisamente, violência moral) e danos patrimoniais; e, ainda, as circunstâncias relevantes na valoração da objectiva gravidade das condutas, repercutindo-se, ainda, no juízo de censura que o comportamento dos arguidos justifica, tal como releva na determinação da intensidade do juízo de censura (culpa) que as demonstradas acções merecem, e a intensidade do dolo, em qualquer dos casos, directo.

Quanto às imposições de prevenção especial, diz o acórdão recorrido que (…) importa considerar também a modesta e adversa condição familiar e económica, bem como cognitiva e cultural (estas, na medida em que se repercutem em maior dificuldade na adequada percepção e ponderação do desvalor das acções), condições essas denotadas nos factos enunciados em 32. A 44. (arguido AA) e em 46. a 57. (arguido BB); bem como os factores referidos por último e, com pendor diverso, a ausência de anteriores condenações (…). Conclui que estas não são especialmente acentuadas.

Acresce, por último, que (…) Não se vendo razão para diferenciar a responsabilidade dos arguidos relativamente aos factos que praticaram em co-autoria, atentos os aludidos critérios e factores, entre os limites legais já indicados, conclui o Tribunal Colectivo serem consentidas pela culpa de cada um dos arguidos, necessárias para significar o desvalor dos factos praticados e a validade da sua proibição legal e necessárias também para advertir os arguidos contra a prática de novos crimes(…) entende o Tribunal Colectivo ajustadas as penas únicas de 6 (seis) anos de prisão, fixada ao arguido AA, e a de 5 (cinco) anos e 9 (nove) meses de prisão, fixada ao arguido BB (…).

Entende a Sra. Procuradora-Geral Adjunta que, e transcreve-se parte do seu Parecer: (…) Ora, todas estas circunstâncias serão de molde a concluir verificarem-se boas condições de ressocialização em liberdade dos recorrentes AA e BB, sendo que ambos nasceram em 1989, ambos tiveram problemas de consumo de estupefacientes, uma vida pouco estruturada (frequentando vários cursos e com vários empregos), e necessitando de acompanhamento psicológico e psiquiátrico.

E, apesar dos crimes de roubo que cometeram serem considerados graves e gerarem forte alarme social, entende-se que tais crimes não atingiram uma gravidade tal que exija a aplicação de uma pena de prisão efectiva como medida inarredável para defesa do ordenamento jurídico.

Assim, os factos relevantes para a determinação da pena conjunta deverão resultar de uma visão global sobre as circunstâncias que determinaram a actividade criminosa, traçando-se um quadro de interconexão entre os diversos ilícitos cometidos e a personalidade de quem os cometeu, de forma a apurar se existe uma propensão para o crime, ou se estamos perante um conjunto de eventos criminosos episódicos.

No caso, entende-se que os factos cometidos pelos recorrentes AA e BB não revelam que estes tenham uma inclinação criminosa, sendo que os delitos cometidos ocorreram entre 9 e 22 de Setembro de 2019, e correspondem a um pedaço das suas vidas em que os mesmos desenvolviam ocupações laborais precárias e temporárias, passando o seu quotidiano a ser organizado em função dos valores monetários que conseguiam arranjar para obter produto estupefaciente para consumo.

E, não tendo os recorrentes AA e BB à data dos factos antecedentes penais, os crimes por si cometidos evidenciam uma pluriocasionalidade, não se podendo dizer que os mesmos tenham tido até então um estilo de vida parasitário, uma vez que desenvolveram várias actividades profissionais, e encontravam-se de certa forma familiarmente integrados.

E, consta da decisão recorrida que os recorrentes AA e BB têm cumprido com correcção funções como faxinas de limpeza da zona prisional e têm tido oportunidade de se habilitarem para o exercício de uma actividade produtiva lícita, sendo que fora do estabelecimento prisional o AA tem apoio familiar, não o tendo o BB porque a sua mãe está internada em Unidade de Cuidados Continuados, contudo tal facto não o poderá prejudicar de forma a impedir a sua ressocialização, caso seja posto em liberdade.

Ora, a censurabilidade ético-jurídica é elevada, tendo os recorrentes AA e BB agido com dolo direto e persistente, indiferentes à situação em que colocaram as vítimas, o que demanda a aplicação de uma pena única que respeite os limites traçados pela prevenção geral de integração e pela culpa, e que seja suficiente e adequada a adverti-los séria e fortemente, instando-os a reflectir sobre o seu comportamento futuro, permitindo-lhes ao mesmo tempo a sua reintegração na comunidade.

Contudo, no caso há que ponderar o circunstancialismo concreto apurado nos autos, designadamente a idade dos recorrentes AA e BB, o valor das quantias de que se apropriaram, a pouca violência utilizada no constrangimento das vítimas, e há que recorrer ao princípio da proporcionalidade, de modo a não aplicar uma pena única superior àquela que é exigida para reafirmar a estabilização dos bens jurídicos ofendidos, face à culpa suportada por ambos, à medida das suas vontades, à persistência e gravidade da sua conduta global e à personalidade algo frágil que ambos evidenciam.

E, ponderado tudo isto, entende-se ser de reduzir a pena única a aplicar ao recorrente AA para 5 (cinco) anos de prisão, entende-se ser de reduzir a pena única aplicada ao recorrente BB para 4 (quatro) anos e 9 (nove) meses de prisão, e entende-se também que estão reunidas as condições para a aplicação de uma pena de substituição a cada um deles, de forma a dar-lhes uma oportunidade para se poderem ressocializar em liberdade. (sublinhados nossos).

De tudo o que ficou exposto, e porque concordamos com a ponderação exemplarmente exposta no Parecer da Sra. Procuradora-Geral Adjunta, que nos escusamos de repetir, entendemos que, do conjunto de imposições exigíveis, quer de prevenção geral, quer de prevenção especial, de onde relevam a intensidade do dolo (directo e persistente), a culpa mediana, a primariedade dos arguidos, o facto de ambos terem experienciado a situação de reclusão, o que pode constituir um marco determinante para inflexão num percurso disruptivo face às normas que vigoram na ordem jurídica, o apoio familiar que podem ter, uma vez em liberdade, encontramos fundamento bastante que justifica a redução das penas aplicadas, o que permite que a pena se fixe em patamar situado junto do limite mínimo da moldura penal.

Ponderando tudo o exposto, e sem necessidade de mais considerandos, concluímos que, como impõem os artigos 40.º, 71.º e 77.º, do CP, a pena adequada, proporcional e justa, no caso em concreto, se fixa em:

- Quanto ao recorrente AA, 5 (cinco) anos de prisão; e,

- Quanto ao recorrente BB, 4 (quatro) anos e 9 (nove) meses de prisão.

Pelo que procede, deste modo, e nesta parte, a pretensão dos ora recorrentes.

19. Estas penas admitem a suspensão da execução, por força do artigo 50.º, nº 1, do CP, medida expressamente solicitada pelos arguidos e que sempre teria de ser ponderada, por força da mesma disposição legal.

Condição formal da suspensão da pena de prisão é esta não ser superior a 5 anos, o que é o caso, encontrando-se a mesma preenchida.

Vejamos, agora, se estão reunidos os elementos necessários ao preenchimento da condição material, ou seja, se podemos concluir, no caso dos recorrentes, que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam as finalidades das penas.

Como é sabido, à opção pela suspensão da execução da pena de prisão, enquanto medida de reacção criminal autónoma, são alheias considerações relativas à culpa do agente, valendo exclusivamente as exigências postas pelas finalidades preventivas da punição, sejam as de prevenção geral positiva ou de integração, sejam as de prevenção especial de socialização (artigo 40.º, n.º 1 do CP). De molde que a opção por esta pena deverá assentar, em primeira linha, na formulação de um juízo positivo ou favorável à recuperação comunitária do agente através da censura do facto e da ameaça da prisão, sem a efectiva execução desta prisão, que ficaria suspensa, mas desde que esta opção não prejudique ou contrarie a necessidade de reafirmar a validade das normas comunitárias, ou seja, desde que o sentimento comunitário de crença na validade das normas infringidas não seja contrariado ou posto em causa com tal suspensão.

Ora, como atrás se disse a favor dos arguidos regista-se o facto de serem primários, terem confessado os factos que lhe eram imputados, mostrarem-se arrependidos, e estarem de certa forma inseridos familiarmente. O que entendemos ser de relevar.

Deve, ainda, ter-se em linha de conta a intensidade do dolo e o apontado grau de ilicitude do facto, tendo-se a culpa como mediana, razão que levou a fixar a pena em patamar situado junto do limite mínimo da moldura penal.

Recorde-se, neste momento, o Prof. Figueiredo Dias para o cuidado “…com que têm de ser manipulados estes factores, dada a particularíssima ambivalência de que são dotados: só em concreto se pode determinar o papel, agravante ou atenuante, que desempenham circunstâncias como as da condição económica e social do agente, a sua idade e sexo, a sua educação, inteligência, situação familiar e profissional, etc., quando conexionadas com o círculo de deveres especiais que ao agente incumbiam[4] (sublinhado nosso).

Ambos os arguidos sofreram já cerca de 16 meses de prisão preventiva.

O descrito circunstancialismo permite formular um juízo positivo quanto ao comportamento futuro dos arguidos pelo que será de criar as condições para que o seu processo de ressocialização possa decorrer em liberdade.

Suspende-se, por isso, a execução da pena pelo período correspondente à medida da condenação, suspensão esta, sujeita a regime de prova a definir pela Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais (DGRSP).

Pelo que também, nesta parte, procede, a pretensão dos recorrentes.

20. Por último, vem o arguido AA, requerer a revogação do acórdão recorrido na parte em que declarou perdido a favor do Estado, o seu veículo automóvel, de marca e modelo “….”, matrícula …..-HS, nos termos do artigo 109.º, n.º 1, do CP.

Estipula o citado artigo 109.º, n.º 1, do CP, sob a epígrafe “Perda de instrumentos”, e cita-se: “São declarados perdidos a favor do Estado os instrumentos de facto ilícito típico, quando, pela sua natureza ou pelas circunstâncias do caso, puserem em perigo a segurança das pessoas, a moral ou a ordem públicas, ou oferecerem sério risco de ser utilizados para o cometimento de novos factos ilícitos típicos, considerando-se instrumentos de facto ilícito típico todos os objetos que tiverem servido ou estivessem destinados a servir para a sua prática(sublinhado nosso).

Ora, no caso em apreço, consta amplamente da decisão recorrida que veículo ….., propriedade do recorrente AA, foi por si utilizado para a prática de todos os crimes de roubo pelos quais foi condenado. Razão pela qual foi decretada a sua apreensão. E, posteriormente, o seu perdimento.

Vejamos se se encontram preenchidos os pressupostos enunciados no artigo 109.º, n.º 1, do CP[5].

O fundamento da perda de “instrumentos e produtos” regulada neste preceito radica nas exigências, individuais e colectivas, de segurança e na perigosidade dos bens apreendidos, ou seja, nos riscos específicos e perigosidade do próprio objecto e não na perigosidade do agente do facto ilícito (daí que não possa ser considerada uma medida de segurança), ou na culpa deste ou de terceiro (daí que não possa ser vista como uma pena acessória).A perda de objectos a favor do Estado regulada no Código Penal (dotada de eficácia real, já que se opera a transferência da propriedade do objecto a favor daquele), apresenta-se como uma providência sancionatória de natureza análoga à medida de segurança, não sendo um efeito da pena ou da condenação, visto poder ter lugar sem elas, como se infere do artigo 109.º, n.º 2. Constitui pressuposto formal da perda de instrumentos e produtos prevista no artigo 109.º, que os mesmos tenham sido ou estivessem destinados a ser utilizados numa actividade criminosa, ou que, por esta tenham sido produzidos.

Assim, só podem ser declarados perdidos a favor do Estado os objectos que tenham servido ou estivessem destinados a servir para a prática de um facto ilícito típico e seja possível prognosticar que esses objectos podem colocar em perigo a segurança das pessoas, a moral ou a ordem públicas, ou que oferecem sério risco de serem utilizados para o cometimento de novos factos ilícitos típicos.

Dizendo de outro modo, a declaração de perda está agora condicionada à perigosidade ou risco de poderem ser utilizados para a prática de novos crimes.

Neste caso, pela sua natureza, o automóvel só poderia ter sido declarado perdido se houvesse "sério risco de ser utilizado para o cometimento de novos factos ilícitos típicos".

O que não se pode afirmar, perante o juízo de prognose favorável elaborado sobre o comportamento futuro dos arguidos.

Pelo que procede a pretensão do arguido, revogando o acórdão recorrido na parte em que declara perdido a favor do Estado, o veículo automóvel “….” de matrícula ….-HS., propriedade do arguido AA.

21. Em face do provimento dos recursos, ainda que parcial, quanto ao recorrente AA, não há lugar a condenação por custas – artigo 513.º, n.º 1, do CPP.

III.

22. Pelo exposto, acordam os juízes na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça em:

a) julgar parcialmente procedente o recurso interposto pelo arguido AA, na parte referente à pena única que se fixa em 5 (cinco) anos de prisão, suspensa na sua execução, com regime de prova (a elaborar no Tribunal de 1.ª instância), por idêntico período, e à decisão de perdimento a favor do Estado do veículo automóvel ….-HS, a qual se revoga;

b) julgar procedente o recurso interposto pelo arguido BB, condenando-o na pena única de 4 (quatro) anos e 9 (nove) meses de prisão, suspensa na sua execução, com regime de prova (a elaborar no Tribunal de 1.ª instância), por idêntico período;

c) manter no mais o acórdão recorrido;

d) Sem custas.

Passe mandados de libertação imediata dos arguidos, se não tiverem de ficar presos à ordem de outro processo, comunicando-se ao tribunal de 1ª instância pela via mais expedita.

11 de Fevereiro de 2021

Processado e revisto pela relatora, nos termos do disposto no artigo 94.º, n.º 2 do CPP, e assinado eletronicamente pelos signatários.

Margarida Blasco (Relatora)

Eduardo Loureiro (Adjunto)

_______________________________________________________


[1] Os arguidos encontram-se sujeitos à medida de coacção de prisão preventiva, à ordem do presente processo, desde 03.10.2019.
[2] cfr. Canotilho / Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, Vol. I, notas aos artigos 18.º e 27.º.

[3] Ac. deste STJ de 19-09-2019, Processo n.º 101/17.6GGBJA.E1. S1- 5.ª secção.

[4] Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, Aequitas, 1993, pág. 248.

[5] Cfr. as actas da Comissão Revisora do Código Penal, onde o Prof. Figueiredo Dias defendeu o seguinte: “Hoje em dia assiste-se à perda de coisas ou direitos que não têm qualquer relação relevante com o crime, não se obtendo por essa via qualquer objectivo de prevenção. Sendo este o pano de fundo existente, a Reforma deve-se orientar no sentido de a perda se apresentar como uma espécie de medida de segurança, não se aplicando somente a crimes, mas sim a qualquer facto ilícito punível, operando somente naqueles casos em que existe perigo de repetição de cometimento de novos factos ilícitos através do mesmo instrumento. Para o (então) artigo 108º apresentam-se duas alternativas: a primeira leva ao limite a concepção da perda como medida de segurança fundada na perigosidade do instrumento subsistindo independentemente do titular. É, no entanto, uma via que parece ir longe de mais. Daí a preferência pela segunda opção: a perigosidade não advém do instrumento em si, mas da sua ligação com o agente. Representando um desvio à pureza da ideia de medida de segurança, trata-se de solução mais próxima do direito vigente. O que se pretende obter com «facto ilícito», é o afastamento tia ideia de culpa, valendo também a medida para os inimputáveis. O Prof. Figueiredo Dias frisou que a interpretação dada no sentido de o n.º 1 não se ocupar desse tipo de situações corresponde por inteiro à sua intenção. Ou há perigo de repetição e então há perda do bem, ou, se não ocorre tal pressuposto, procede-se à sua restituição. Não se deslumbram razões para que, por exemplo, no crime ocasional, em que o tribunal tem tal juízo como adquirido, não havendo perigo de repetição, se não restitua o bem. Reafirmando o seu ponto de vista, o Prof. Figueiredo Dias fez notar que a preocupação dominante, na objecção apresentada, prende-se com a ideia de prevenção geral. Ora o que esta aqui em causa é a prevenção especial. O sentido da perda dos bens não radica nos efeitos que eles possam causar na generalidade. Se não há perigosidade criminal, deve-se proceder à restituição, contrariando-se uma certa sacralização social do instrumento do crime” (sublinhado nosso).