Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
350/1997.L1.S1
Nº Convencional: 7ª SECÇÃO
Relator: LOPES DO REGO
Descritores: RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL
ACIDENTE DE VIAÇÃO
PRIORIDADE DE PASSAGEM
VEÍCULO EM MARCHA URGENTE
RESPONSABILIDADE DO FUNDO DE GARANTIA AUTOMÓVEL
Data do Acordão: 04/10/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADO PROVIMENTO À REVISTA DO 1.º R; CONCEDIDO, EM PARTE, PROVIMENTO À REVISTA DO R./ FGA.
Área Temática:
DIREITO CIVIL - DIREITO DAS OBRIGAÇÕES / RESPONSABILIDADE CIVIL .
DIREITO DOS SEGUROS - SEGURO OBRIGATÓRIO DE RESPONSABILIDADE CIVIL AUTOMÓVEL / FUNDO DE GARAANTIA AUTOMÓVEL.
DIREITO ESTRADAL - TRÂNSITO DE VEÍCULOS / ILUMINAÇÃO
DIREITO PROCESSUAL CIVIL - PROCESSO DE DECLARAÇÃO / RECURSOS.
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 503.º, N.º3, 805.º, N.º3.
CÓDIGO DA ESTRADA (CEST): - ARTIGOS 62.º, 63.º.
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGO 712.º.
D.L. N.° 522/85, DE 31-12, COM A REDACÇÃO DO D.L. N.° 18/93, DE 23-01: - ARTIGOS 6.º, 29.º.
Sumário :

1. As normas constantes dos arts. 62º e 63º do C. Estrada não podem ser interpretadas em termos de uma viatura de bombeiros cuja marcha é assinalada com sinais luminosos rotativos está dispensada de observar as mais elementares cautelas ao entrar numa intersecção de vias protegida por sinal de Stop – estando os demais utentes que circulam na via principal absolutamente vinculados, independentemente das circunstâncias concretas da circulação e da distância real a que se encontrem do ponto de intersecção, a ceder-lhe passagem.

2. Tem, deste modo, de imputar-se ao condutor/comissário da viatura dos bombeiros, apesar de seguir em marcha de emergência, a culpa na eclosão do acidente quando se não provou a que velocidade circulava o outro veículo ( nomeadamente, se excedia o limite de 50 km horários vigente no local), a que distância estava do cruzamento no momento em que o R. o invadiu e se, apercebendo-se ou devendo ter-se apercebido o seu condutor da presença da viatura dos bombeiros, teve ainda oportunidade de parar em segurança ou de evitar a colisão .

3. A responsabilidade imputada solidariamente ao FGA está sujeita aos limites, vigentes à data do acidente, quanto ao capital mínimo do seguro obrigatório.

Decisão Texto Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

         1. AA intentou acção de condenação, processada inicialmente na forma sumária, contra BB, CC e Fundo de Garantia Automóvel, pedindo a condenação solidária dos RR. a pagarem-lhe indemnização nos montantes de:

-Esc: 40.000.000$00, a titulo de danos não patrimoniais;

-Esc: 34.114 038$00, pela perda da capacidade de ganho;

-Esc: 1.493.980$00, a titulo de lucros cessantes;

-Esc: 1.155.702500, a título de danos patrimoniais;
-Todos os encargos com que A. foi confrontado pelos serviços médicos prestados pelos Hospitais S. Francisco de Xavier, SantAna e Centro de Medicina de Reabilitação do Alcoitão, no valor de Esc:3.454.024$50;
-Todas as demais despesas ainda não participadas ao A. e que o venham a ser no futuro;

-Todas as importâncias relativas às despesas a efectuar pelo A. nas intervenções cirúrgicas, prótese e suas afinações que irá efectuar e aplicar, no montante que se venha a liquidar em execução de sentença.

-Sendo todas estas quantias acrescidas de juros, à taxa legal, desde a data da citação até efectivo e integral pagamento".

Como fundamento de tal pretensão, alega que, no dia 16/7/1995, ocorreu um acidente de viação em que foram intervenientes o veículo ligeiro de mercadorias, com a matrícula VD..., pertencente à 2ª R. e que circulava sem seguro válido e eficaz e o motociclo com a matrícula ...CFR, conduzido pelo A. e a este pertencente , o qual se terá devido a culpa exclusiva do 1ºR., condutor do VD. Em consequência do sinistro, sofreu o A. múltiplas e graves lesões, geradoras de avultados danos patrimoniais e não patrimoniais, ficando afectado por gravosa incapacidade permanente, decorrente das sequelas das lesões sofridas.

Os RR contestaram, impugnando o 1ª R. a versão factual do acidente, que considera ser de culpa exclusiva do A.

A 2ª R. – CC – invoca a respectiva ilegitimidade, já que o 1ª R. conduziria o VD no interesse e sob a orientação da DD, a cujos quadros pertencia, sendo tal entidade proprietária da viatura em causa desde Junho de 1994 – requerendo a intervenção principal passiva desta entidade.

Por sua vez, o FGA – sem questionar a inexistência de seguro – impugnou por desconhecimento as circunstâncias do acidente e os montantes indemnizatórios peticionados.

Foi reclamada nos autos o pagamento de prestações pecuniárias por parte do Centro Regional de Segurança Social de Lisboa e pelos vários estabelecimentos hospitalares onde o lesado foi tratado e assistido.

        A 2ª R: deduziu ainda ulteriormente incidente de intervenção principal provocada da Companhia de Seguros EE, por admitir que vigorasse, à data do acidente, seguro de responsabilidade civil referente aos danos causados pela circulação da viatura VD.

         Ambas as chamadas a intervir contestaram, invocando a DD a existência de um acordo de permuta de viaturas, no âmbito do qual o registo de propriedade do VD apenas seria efectuado após legalização dessa viatura, sendo que até esse momento a manutenção do seguro competiria à CC – tendo efectuado seguro da viatura em causa com início em 18/2/97 – pelo que à data do acidente seria a 2ª R. a titular do registo de propriedade e da respectiva apólice – invocando ainda a excepção peremptória de prescrição.

         Por sua vez, a FF invocou a inexistência de seguro do VD à data do acidente, suscitando também a excepção de prescrição.

         Foi proferido despacho saneador, em que se julgou improcedente a excepção de ilegitimidade das RR, Associações …; e procedente a excepção de prescrição do direito do A. quanto às chamadas a intervir Associação DD e Companhia FF, absolvendo-as consequentemente dos pedidos formulados no seu confronto.

         Finda a audiência, foi proferida sentença a absolver os primitivos RR. do pedido formulado pelo A., por se considerar o acidente exclusivamente imputável a este, não tendo a 2ª R. a direcção efectiva e a utilização interessada do veículo VD.

2. Inconformado, apelou o A., impugnando logo o decidido em sede de matéria de facto; tal impugnação procedeu em parte, reformulando a Relação a resposta ao art. 17º da base instrutória ( ponto nº 15 da matéria de facto) o que conduziu à estabilização do seguinte quadro factual:

"1. O autor nasceu no dia …de Julho de 19… - alínea A) dos FACTOS ASSENTES.

2. Por escrito datado de 24 de Novembro de 1997 e autenticado com selo branco, GG, na qualidade de Directora de Serviços de Regimes de Segurança Social do SERVIÇO SUB-REGIONAL DE … DO CENTRO REGIONAL DE SEGURANÇA SOCIAL DE …, declarou que:

«(...) certifico que ao beneficiário n.° …- AA foi processado e pago subsídio de doença no período de 16 de Julho de 1995 até 3 de Dezembro de 1997 (s/alta), no montante de Esc. 1.454.073$00 (um milhão quatrocentos e cinquenta e quatro mil e setenta e três escudos).

O referido subsídio de doença foi pago na consequência do acidente ocorrido em 16 de Julho de 1995.

Por ser verdade e me ter sido solicitada, passo a presente certidão que vai por mim assinada e autenticada com o selo branco em uso neste Serviço Sub-Regional» - alínea B) dos FACTOS ASSENTES.

3.         Por contrato titulado pela apólice n.° ... a DD transferiu a responsabilidade civil emergente da circulação do veículo de matrícula VD... para a COMPANHIA DE SEGUROS EE, hoje denominada COMPANHIA DE SEGUROS FF, S.A., com início a 17 de Fevereiro de 1997 - alínea C) dos FACTOS ASSENTES.

4.         No dia 16 de Julho de 1995, pelas 16 horas e 20 minutos, circulava pela Rua de …, no sentido Cascais/Alcabideche, no cruzamento da Rua … com a Rua …, em Alcabideche, o motociclo com a matrícula ...CF, conduzido pelo autor - resposta ao artigo 1° da BASE INSTRUTÓRIA.

5.         Nas mesmas circunstâncias de tempo e lugar circulava o veículo ligeiro de mercadorias com a matrícula VD..., conduzido pelo réu BB, no sentido Rua …/Rua de …, em direcção ao mencionado cruzamento - resposta ao artigo 2.° da BASE INSTRUTÓRIA.

6.         Quando o motociclo seguia na faixa de rodagem mencionada e ao passar o referido cruzamento foi embatido pelo veículo de matrícula VD... - resposta ao artigo 3.° da BASE INSTRUTÓRIA.

7.         Não foi possível ao autor efectuar qualquer manobra para evitar a colisão entre o motociclo e o veículo de matrícula VD... - resposta ao artigo 6.° da BASE INSTRUTÓRIA.

8.         O motociclo embateu com a sua frente na frente do lado direito do veículo de matrícula VD... - resposta ao artigo 7.° da BASE INSTRUTÓRIA.

9.         O veículo de matrícula VD... seguia assinalando a sua marcha com sinais luminosos rotativos - resposta ao artigo 8° da BASE INSTRUTÓRIA.

10.       Quando saiu do quartel dos Bombeiros ..., o veículo de matrícula VD... entrou na Rua …, no sentido Este/Oeste, até ao cruzamento da Rua ... com a Rua …, em Alcabideche -resposta ao artigo 9° da BASE INSTRUTÓRIA.

11.       Aí chegado, o réu BB parou, por instantes, o veículo de matrícula VD... face ao sinal de "STOP" ali existente - resposta ao artigo 10.° da BASE INSTRUTÓRIA.

12.       De seguida, porque a visibilidade era reduzida, o réu BB avançou um pouco com o referido veículo a fim de observar se existia trânsito no sentido Alcabideche/Cascais da Rua ... - resposta ao artigo 11.° da BASE INSTRUTÓRIA.

13.       Como não existia trânsito no sentido Alcabideche/Cascais, o réu BB avançou com a viatura para a Rua ..., pretendendo voltar à esquerda, isto é, para o sentido Alcabideche/Cascais - resposta ao artigo 12.° da BASE INSTRUTÓRIA.

14.       Nesse momento ocorreu o embate supra referido em 6 - resposta ao artigo 13° da BASE INSTRUTÓRIA.

15.       Quem circulasse na Rua ... no sentido Cascais/Alcabideche, tinha visibilidade dos veículos que, no momento, entrassem no cruzamento daquela via com a rua dos …, desde, pelo menos, 100 metros antes daquele - resposta ao artigo 17.° da BASE INSTRUTÓRIA, com a alteração determinada pela Relação.

16.       O autor não trazia colocado o capacete de protecção - resposta ao artigo 19.° da BASE INSTRUTÓRIA.

17.       Na zona do embate não é permitido circular a mais de 50Kms/hora -resposta ao artigo 20.° da

18.       Antes do cruzamento onde se deu o embate existe uma passagem de peões - resposta ao artigo 21.° da BASE INSTRUTÓRIA.

19.       E existia, à data dos factos, uma placa que assinalava "Saída de Viaturas" - resposta ao artigo 22° da BASE INSTRUTÓRIA.

20.       O motociclo havia sido adquirido pelo autor em data anterior ao embate - resposta ao artigo 24.° da BASE INSTRUTÓRIA.

21.       O réu BB era, à data do embate, motorista da Associação DD - resposta ao artigo 27° da BASE INSTRUTÓRIA.

22.       O embate ocorreu na área de intervenção do Corpo dos Bombeiros Voluntários ... - resposta ao artigo 28° da BASE INSTRUTÓRIA.

23.       Após negociações com a Associação DD, a ré CC deliberou, em 18 de Abril de 1994, a troca da sua viatura de matrícula VD... com uma viatura de marca M... propriedade da Associação DD - resposta ao artigo 29.° da BASE INSTRUTÓRIA.

24.       No seguimento do deliberado, o veículo com a matrícula VD..., de marca M… foi entregue à Associação DD em Junho de 1994 - resposta ao artigo 30.° da BASE INSTRUTÓRIA.

25.       Desde Junho de 1994 que o veículo de matrícula VD... deixou de pertencer à ré CC - resposta ao artigo 31.° da BASE INSTRUTÓRIA.

26.       E passou, desde tal data, a pertencer à Associação DD - resposta ao artigo 32.° da BASE INSTRUTÓRIA.

27.       O veículo conduzido pelo réu BB com a matrícula VD... seguia, na data do embate, ao serviço da Associação DD - resposta ao artigo 33.° da BASE INSTRUTÓRIA.

28.       No dia do embate o veículo de matrícula VD... saiu do quartel da Associação DD pelas 16 horas e 05 minutos, atento a existência de um fogo que havia deflagrado e cujo pedido de socorro havia sido efectuado para aquela Corporação de Bombeiros -resposta ao artigo 34.° da BASE INSTRUTÓRIA.

29.       Em consequência do embate o Autor sofreu fractura do 1/3 médio da clavícula esquerda, fractura da omoplata esquerda, fractura da apófise transversa de D1, pneumotórax esquerdo em que foi efectuada drenagem tóraxica na urgência e posteriormente em 20 de Julho de 199, fractura do baço com hemoperitoneu pelo qual foi submetido a esplenectomia total em 17 de Julho d 1995, fractura exposta (Grau III) do fémur direito com perda óssea total do 1/3 inferior do referido osso incluindo toda a superfície articular, fractura exposta (Grau II) dos ossos da perna direita, ferida contusa do dorso do pé direito, suturado no serviço de urgência, incapacidade de dorsifletir o pé direito por paralisia do ciático popliteu externo - resposta ao artigo 35° da BASE INSTRUTÓRIA.

30.       Após o embate o Autor foi transportado em ambulância, aos serviços de urgência do Hospital ... - resposta ao artigo 36.° da BASE INSTRUTÓRIA.

31.       Na urgência o autor foi submetido a uma arteriografia que não revelou lesões vasculares do membro inferior direito - resposta ao artigo 37.° da BASE INSTRUTÓRIA.

32.       Posteriormente o autor foi transferido para o Hospital de S. Francisco Xavier - resposta ao artigo 38.° da BASE INSTRUTÓRIA.

33.       Tendo sido submetido a duas operações cirúrgicas: "OSTEOTÁXIS" com fixador tubular "AO" tentando manter o comprimento do membro e esplenectomia total do baço - resposta ao artigo 39.° da BASE INSTRUTÓRIA.

34.       O autor entrou em coma - resposta ao artigo 40.° da BASE INSTRUTÓRIA.

35.       O autor permanecer no Hospital de S. Francisco Xavier em regime de internamento até ao dia 28 de Julho de 1995 - resposta ao artigo 43.° da BASE INSTRUTÓRIA.

36.       Altura em que veio a ser transferido para o Hospital de Sant’Ana a fim de ser submetido a diversas intervenções cirúrgicas - resposta ao artigo 44.° da BASE INSTRUTÓRIA.

37.       Nesse hospital o autor foi submetido, no dia 09-08-95 a Osteotomia tangencial da clavícula esquerda - resposta ao artigo 45.° da BASE INSTRUTÓRIA.

38.       A 20-09-95 foi submetido a Esquiriolectomia da tíbia direita - resposta ao artigo 46.° da BASE INSTRUTÓRIA.

39.       A 06-12-95 foi submetido a Amputação supra condiliana do fémur direito - resposta ao artigo 47.° da BASE INSTRUTÓRIA.

40.       Para todas estas intervenções cirúrgicas submeteu-se o autor a anestesia geral - resposta ao artigo 48° da BASE INSTRUTÓRIA.

41.       Destas cirurgias resultaram para o autor os seguintes períodos de internamento: de 16-07-95 a 27-07-95; de 28-07-95 a 16-08-95; de 06-09-95 a 26-09-95; de 18-10-95 a 24-10-95 e de 04-12-95 a 19-12-95 - resposta ao artigo 49.° da BASE INSTRUTÓRIA.

42.       O autor recebeu alta, passando ao regime de consulta externa, neste último Hospital até ao dia 2-01-96 - resposta ao artigo 50.° da BASE INSTRUTÓRIA.

43.       Logo após a alta do Hospital Sant’Ana o Autor passou a ser observado no Centro de Medicina Física e Reabilitação do Alcoitão - resposta ao artigo 51.° da BASE INSTRUTÓRIA.

44.       O autor somente se movia com o apoio de umas canadianas e à custa de muito sofrimento - resposta ao artigo 52.° da BASE INSTRUTÓRIA.

45.       O autor fez, diariamente e no Centro de Medicina Física e Reabilitação do Alcoitão, fisioterapia desde Fevereiro a Agosto de 1996 - resposta ao artigo 53.° da BASE INSTRUTÓRIA.

46.       Como consequência do embate o autor apresenta no couro cabeludo perda de escalpe derivada das escoriações e cicatrizes em todo o corpo com carácter permanente e alterando a estética - resposta ao artigo 54.° da BASE INSTRUTÓRIA.

47.       Como consequência do embate o autor apresenta hiper- sensibilidade do lado esquerdo do corpo resultante das lesões na omoplata e clavícula esquerda - resposta ao artigo 55.° da BASE INSTRUTÓRIA.

48.       O autor tem ainda, em consequência do embate, uma costela que lhe está a pressionar o externo - resposta ao artigo 56.° da BASE INSTRUTÓRIA.

49.       Após as intervenções a que se submeteu o autor apresenta, de modo definitivo, amputação do fémur direito, perda do baço, hiper-sensibilidade do lado esquerdo do

corpo e remoção da clavícula esquerda - resposta ao artigo 57.° da BASE INSTRUTÓRIA.

50.       O autor é portador de sequelas anátomo-funcionais, resultantes da amputação do fémur direito e clavícula esquerda, que lhe determinam uma incapacidade permanente geral fixável em 70% - resposta ao artigo 58.° da BASE INSTRUTÓRIA.

51.       À data do embate o autor exercia as funções de barman no ex-Hotel ..., hoje Hotel ..., onde auferia uma retribuição mensal de 80.000$00 [€ 399,04] - resposta ao artigo 59.° da BASE INSTRUTÓRIA.

52.       O montante total da assistência médica, internamento, intervenções cirúrgicas e demais encargos dos serviços prestados ao autor pelo Hospital de S. Francisco Xavier ascende a 1.027.600$00 [€ 5.125,65] - resposta ao artigo 61.° da BASE INSTRUTÓRIA.

53.       O montante total da assistência médica, internamento, intervenções cirúrgicas e demais encargos dos serviços prestados ao autor pelo Hospital de Sant’Ana ascende a 2.042.314$00 [€10.187,02] - resposta ao a ri INSTRUTÓRIA.

54.       O autor despendeu com a assistência médica e demais encargos dos serviços prestados pelo Centro de Medicina de Reabilitação do Alcoitão a quantia de 384.110$00 [€1.915,93] - resposta ao artigo 63.° da BASE INSTRUTÓRIA.

55.       Todos os tratamentos e intervenções cirúrgicas a que já se submeteu provocaram e continuarão a provocar, ao Autor dores e sofrimentos - resposta ao artigo 64.° da BASE INSTRUTÓRIA.

56.       As lesões que o autor sofreu na omoplata e clavícula esquerda impedem-no de se deitar para o lado esquerdo - resposta ao artigo 65.° da BASE INSTRUTÓRIA.

57.       Provocam-lhe hiper-sensibilidade em toda a parte esquerda do corpo o que lhe causa des...o e lhe limita os movimentos do membro superior esquerdo - resposta ao artigo 66.° da BASE INSTRUTÓRIA.

58.       O autor foi sujeito a angústias profundas durante cerca de cinco meses, perante a eventualidade de vir a perder o membro inferior direito e clavícula esquerda - resposta ao artigo 67.° da BASE INSTRUTÓRIA.

59.       É provável que o autor tenha, no futuro, que se sujeitar a mais duas cirurgias - resposta ao artigo 68° da BASE INSTRUTÓRIA.

60.       Uma delas para aliviar o externo da pressão da costela - resposta ao artigo 69° da BASE INSTRUTÓRIA.

61.       E outra para corrigir a omoplata e clavícula de modo a conferir-se ao autor uma maior mobilidade de movimentos - resposta ao artigo 70° da BASE INSTRUTÓRIA.

62.       Como resultado directo das lesões que sofreu o autor não aguenta permanecer em pé - resposta ao artigo 71° da BASE INSTRUTÓRIA.

63.       O que o impede de prosseguir com a sua actividade de barman -resposta ao artigo 72.° da BASE INSTRUTÓRIA.

64.       E obriga-o a sujeitar-se a empregos menor remunerados e que sejam adaptados à sua incapacidade - resposta ao artigo 73.° da BASE INSTRUTÓRIA.

65.       À data do embate o autor não padecia de qualquer incapacidade -resposta ao artigo 74.° da BASE INSTRUTÓRIA.

66.       O autor terá que adquirir e afinar regularmente uma prótese para o seu membro inferior - resposta ao artigo 76.° da BASE INSTRUTÓRIA.

67.       É provável que o autor tenha, no futuro, que efectuar nova cirurgia a fim de adaptar o coto à prótese - resposta ao artigo 77.° da BASE INSTRUTÓRIA.

68.       Em virtude do acidente de que foi vítima, e relativamente ao período compreendido entre 16 de Julho de 1995 e 10 de Julho de 1998, o autor recebeu, a título de subsídio de doença, o valor total de € 9.130,67 - resposta aos artigos 78.° e 79° da BASE INSTRUTÓRIA.

69.       O autor gastou em despesas com farmácia desde o embate e por causa deste a quantia de 4.708$00 [€ 23,48] - resposta ao artigo 80.° da BASE INSTRUTÓRIA.

70.       Em consultas médicas gastou o autor a quantia de 1.600$00 [€ 7,98] -resposta ao artigo 81.° da BASE INSTRUTÓRIA.

71.       No embate ficou destruído o motociclo conduzido pelo autor de marca …, modelo … (4BR) - resposta ao artigo 82.° da BASE INSTRUTÓRIA.

72.       Com o reboque do motociclo pagou o autor a quantia de15.444$00 [€ 77,03] - resposta ao artigo 83.° da BASE INSTRUTÓRIA.

73.       Pelo parqueamento do motociclo na oficina "HH" foi apresentada ao autor uma dívida para com esta oficina que se quantifica em 220.950$00 [€ 1.102,09] - resposta ao artigo 84.° da BASE INSTRUTÓRIA.

74.       Em resultado do embate ficaram destruídos diversos objectos pessoais do autor, nomeadamente calças de ganga, t-shirt, relógio, ténis, óculos e meias -resposta ao artigo 85.° da BASE INSTRUTÓRIA.

75.       A entidade patronal do autor cessou o respectivo contrato de trabalho em 20 de Dezembro de 1996, com fundamento em "Extinção do posto de trabalho por motivos estruturais, tecnológicos e conjunturais de carácter económico e de mercado" - resposta ao artigo 86° da BASE INSTRUTÓRIA.

76.       Se o autor, no momento do embate, estivesse a usar o respectivo capacete de protecção, nunca teria ficado com perda de escalpe, derivada de escoriações - resposta ao artigo 87° da BASE INSTRUTÓRIA.".

            3. Passando a apreciar os pressupostos da responsabilidade civil imputada aos demandados, considerou a Relação que o acidente – perante, nomeadamente, a alteração introduzida na matéria de facto – se devia imputar a culpa exclusiva do 1º R, enquanto comissário ao serviço da Associação DD, nessa medida onerado com a presunção de culpa decorrente do estatuído no nº3 do art. 503º do CC, considerada não ilidida face ao quadro factual definido, assentando a decisão de mérito na seguinte fundamentação:

Desde logo, na sequência da alteração da decisão da 1ª instância quanto à matéria do art.° 17° da base instrutória, cai por terra a base do raciocínio enunciado na 1ª instância.

E por isso que tendo subsistido como provado apenas que "Quem circulasse na Rua ... no sentido Cascais/Alcabideche, tinha visibilidade dos veículos que, no momento, entrassem no cruzamento daquela via com a Rua …, desde pelo menos 100 metros antes daquele." - e não já que "Quem circulasse na Rua ... no sentido Cascais/Alcabideche, tinha visibilidade dos veículos que, no momento, entrassem no cruzamento daquela via com a Rua …, desde pelo menos 100 metros antes daquele." - não é possível concluir que "tendo o autor avistado a - pelo menos - 100 metros uma viatura à qual estava obrigado a ceder passagem, era-lhe exigível que imobilizasse o seu veículo, permitindo a passagem do veículo (prioritário) conduzido pelo primeiro réu.".

Não se sabe a que distância se encontrava o A. do cruzamento, no momento em que o 1º Réu avançou pela faixa de rodagem da Rua ....

Nem logo, assim, a que distância foi visível para o A. o VD..., a entrar na dita faixa de rodagem,

Importando ter presente as seguintes noções nesta matéria:

Distância de reacção: distância percorrida pelo veículo durante o tempo de reação.

Tempo de reação: intervalo de tempo que se inicia no momento em que o condutor se apercebe do perigo e termina no momento em que o condutor inicia a travagem. Geralmente varia entre 0,4 s e 1 s.

Distância de travagem: é a distância percorrida pelo veículo, desde o momento em que o condutor inicia a travagem, até ao momento em que o veículo se imobiliza.

Tempo de travagem: intervalo de tempo que decorre desde o momento, em que se inicia a travagem, até à sua conclusão.

Distância de paragem: distância de reação + distância de travagem.

Dependendo a distância de reação da velocidade do veículo e do tempo de reação do condutor, e a distância de travagem da velocidade do veículo, das características deste, do estado do pavimento e das condições atmosféricas.

Partindo do tempo médio de reação, para um condutor normal, de ¾ de segundo, é referido - por Jerónimo de Freitas, citando Baptista Lopes e Ayres Pereira - para uma velocidade de 50 KM/h - sendo de recordar ter resultado não provado que o Autor circulasse a velocidade superior - uma distância de reação de 10,4 metros...

... E uma distância de travagem de 19,2 metros...

...Perfazendo uma distância de paragem de 29,6 metros.

Já Dário Martins de Almeida,16 indicava, com citação de Georges Pascal e Serge Plumelle, para a mesma velocidade, e para um veículo equipado com travões de disco às quatro rodas, uma distância de travagem de 20,61 metros, por força da consideração de uma distância de travagem inferior, de 10, 20 metros.

O que quer dizer, e por um lado, que, em condições médias/normais, o A. teria de se encontrar a, pelo menos, cerca de 21 metros do cruzamento, no momento em que o VB entrou na Rua ..., para poder, pela sua parte, evitar o embate.

E isto, assim, quando o veículo conduzido pelo 1o Réu - que segundo o depoimento das testemunhas que no mesmo seguiam, não terá efectuado a manobra de mudança de direção seguindo uma rigorosa

perpendicular em relação ao eixo da via: "ninguém faz assim" disse a testemunha II - não tenha mesmo obliquado para a esquerda...

E, por outro, que a encontrar-se o A. a 10 metros do cruzamento, no momento em que o 1º Réu avançou com o VB para a Rua ..., nem sequer teria tempo de, reagindo, iniciar a travagem...

O que, diga-se, é mesmo sugerido pela inexistência de rastos de travagem no local.

Certo aqui não ser facto notório que, porventura, um motociclo de média ou alta cilindrada tenha sistema de travagem mais eficiente do que o de um automóvel com travões de disco à frente e atrás...

Anotando-se, apenas marginalmente, que a mota está muito mais sujeita às condições do piso, que o atrito da superfície de borracha é menor - a mota é mais leve - e a superfície em contacto com o asfalto também é menor (quatro pneus vs. dois pneus).

Não sendo pertinente, nesta contingência, apelar ao dever de o A. ceder a passagem ao veículo dos Bombeiros, porque prioritário, nos termos das disposições conjugadas dos artºs 62°, n.° 1 e 63°, ambos do Código da Estrada, na redação aqui considerável.

Tal cedência é devida...desde que exequível sem perigo para o condutor cedente.

Com efeito, de acordo com o citado art.° 62°, n.° 2, os condutores de veículos em serviço de urgência "não podem, porém, em circunstância alguma, pôr em perigo os demais utentes da via"...

..."sendo, designadamente, obrigados a suspender a sua marcha: b) Perante o sinal de paragem obrigatória em cruzamento ou entroncamento.".

Assinalando-se que o sinal de Stop, "B-2", é, mais exactamente, um sinal de "Paragem obrigatória na intersecção.

E, de acordo com o art.° 3°-A, n.° 2, do regulamento do Código da Estrada, aditado pela Portaria n.° 46-A/94, de 17 de Janeiro, aquele dá a "Indicação de que o condutor é obrigado a parar antes de entrar na intersecção junto da qual o sinal se encontra colocado e ceder a passagem a todos os veículos que transitem na via em que vai entrar;".

De onde se retira que, não estando o veículo prioritário obrigado "a parar enquanto for necessário para respeitar as regras próprias - perante o sinal (...) Stop" - mas apenas a suspender a sua marcha, essa obrigação reporta-se não à anterioridade do ponto de inserção do sinal Stop, mas à da intersecção junto da qual aquele se encontra colocado.

Sendo aliás variável a distância a que esse sinal poderá estar colocado relativamente a tal interseção, cfr. citado art.° 3°-A, n.° 3:

"Os sinais B1, B2 e B10 deverão ser colocados na proximidade imediata da intersecção ou da passagem de nível, tanto quanto possível na posição correspondente ao local onde os condutores deverão parar e aguardar a passagem dos veículos na via com prioridade (...)".

Ora, rigorosamente, nem o 1o Réu alegou que, depois de parar em obediência ao sinal stop, e "avançar" "a fim de verificar se existia trânsito em ambos os sentidos da Rua ...", tenha, para essa observação, parado o VD...

Nem tal decorre da factualidade provada.

Apenas se tendo logrado apurar que...avançou para verificar...e como não existia trânsito...mais avançou para a Rua ..., nas palavras da testemunha JJ, "devagarinho"...

...O que é compatível com uma continuidade de avanço lento, após a paragem ao sinal Stop...

...Como de resto é frequente ocorrer em casos que tais.

Permanecendo, em qualquer caso, também em aberto, a possibilidade de o VD ter entrado na faixa de rodagem da Rua ... quando o A. circulava já muito próximo do cruzamento, porventura uma fracção de segundo antes deste último chegar ao local do embate.

Provado não tendo resultado que o 1o Réu se haja assegurado, antes de entrar na aludida faixa de rodagem, de que não havia trânsito no sentido Cascais/Alcabideche, à sua esquerda.

Não se concedendo pois que os elementos fornecidos pelos autos sustentem o provado de não ter tido o 1o Réu culpa na ocorrência do acidente, como também não que tivesse o A. tido culpa na produção daquele.

Subsistindo pois a presunção de culpa do 1º R.

Que exclui a responsabilidade pelo risco do A., cfr. art.° 506°, n.° 1, do Código Civil.

E tal linha argumentativa conduziu à seguinte decisão:

- Nestes termos, acordam em julgar a apelação parcialmente
procedente revogando a sentença recorrida, com exceção da parte em que
absolve    a    Ré    CC do pedido,     

e julgam a ação parcialmente procedente, condenando os Réus BB e Fundo de Garantia Automóvel, e a interveniente principal, Associação DD,
solidariamente, a pagarem:-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------

-Ao Autor:-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------

a) a quantia global de duzentos e quarenta e seis mil setecentos e oitenta e sete euros e cinquenta e oito cêntimos (€ 246.787,58), acrescida de juros de mora, à taxa legal, sobre seis mil setecentos e oitenta e sete euros e cinquenta e oito cêntimos (€ 6.787,58), desde a data da citação do 1o Réu, e atéà presente data, e, desde a presente data, sobre aquele montante global, até efetivo e integral pagamento;--------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
b) a quantia que se vier a liquidar, a título de indemnização pelos danos referidos em II - 6 - 4. e 6., acrescida de juros de mora a calcular desde a data da citação do 1o Réu.------------------------------------------------------------------------------------------

- Ao Instituto de Segurança Social - I.P., a quantia de sete mil duzentos

e cinquenta e dois euros e oitenta e oito cêntimos (€7.252,88),-------------------------------------------------------------------

absolvendo-os do mais peticionado.

            4. Inconformados com tal sentido decisório, recorreram o A. e o FGA, que encerraram as suas alegações, respectivamente, com as seguintes conclusões:

   I.      O douto acórdão recorrido contém nulidades insanáveis.

II.        Com efeito, ao condenar como condenou a Associação DD, quando quanto a esta já havia recaído uma transitada em julgado, que decretou prescrito o direito quanto a ele reclamado;

III.      Prescrição essa que constitui uma excepção peremptória, o que assim foi julgado nos termos e para os efeitos dos art.°s 493°, n° 3 e 496° do CPC em vigor na altura dos factos, em sede despacho saneador.

IV.      Estamos perante uma nulidade constante da alínea d) do n° 1 do art°. 615° do NCPC, o que desde já se alega para os devidos efeitos legais;

V.        Caso assim não se entenda, então também a companhia de seguros FF teria que ser condenada, uma vez que, e seguindo as mesmas regras que levaram á condenação da Associação DD, levariam também às desta chamada;

VI.      Caso tal acontecesse, ao ser a Companhia de Seguros FF, SA condenada, para esta se encontrava transferida a responsabilidade civil, razão pela qual,

os demais RR teriam que forçosamente serem absolvidos, por ilegitimidade processual, o que não pode deixar de alegar para os devidos efeitos legais.

VII.     O douto acórdão recorrido, ao condenar um chamado, a Associação DD, e não condenando o outro, incorreu, igualmente numa nulidade, nomeadamente na prevista na alínea c) do nº 1 do art° 615° do NCPC, o que desde já se invoca para os devidos efeitos legais.

VIII.   O douto acórdão recorrido veio determinar uma alteração à matéria de facto, no que se refere ao art° 17° da base instrutória, através dos critérios das regras da experiência comum e não com o recurso à prova produzida, o que, como é amplamente consabido lhe está vedado por Lei, pelo que estamos perante uma nulidade nos termos do art°. 615°, n°. 1, alínea d) do NCPC;

IX.      A alteração da resposta á matéria de facto daquele artigo da base instrutória para a seguinte redacção:

"Quem circulasse na Rua ... no sentido Cascais/Alcabideche, tinha visibilidade dos veículos que, no momento, entrassem no cruzamento daquela via com a Rua …, desde pelo menos 100 metros antes daquele", quando o que ficou provado pelo Tribunal de 1ª Instância deu como provado, foi

"O autor, circulando na Rua ... no sentido Cascais/Alcabideche, via a viatura conduzida pelo réu BB a, pelo menos, 100 metros do local onde se deu o embate - resposta ao artigo 17º da BASE INSTRUTÓRIA."

X.        Nada se alterou em regime de prova, e o Tribunal " a quo" apenas o fez pela sua livre convicção, o que não lhe é permitido;

XI.      Ao considerar-se que o Recorrente conduzia a referida viatura VD..., nessa mesma data, ao serviço da Associação DD;

XII.     E se esta veio ao ser condenada, como o foi, faz com que esta condenação, enferme de nulidade insanável por força do disposto na alínea d) do n° 1 do art°. 615° do NCPC;

XIII. Pese embora a alteração à resposta do art°. 17° da base instrutória, não está estabelecida a presunção de culpa prevista no art°. 503°, n° 1 do Código Civil;

XIV.   Dada a matéria de facto dada como assente não pode levar à alteração da decisão tomada, ao contrário do referido no douto acórdão recorrido, pois não se pode alterar como alterou, a dinâmica em como se desenvolveu o acidente;

XV.     O recorrente conduzia o aludido veiculo VD em, missão de socorro, urgente, encontrando-se a sua marcha devidamente assinalada;

XVI.   Apesar de se encontrar em missão de socorro, o recorrente ao chegar ao cruzamento suspendeu a sua marcha e parou o veículo num STOP ali existente;

XVII.  Nas circunstâncias descritas e dadas como assentes pelo acórdão recorrido, que o A. estava obrigado a ceder passagem ao veículo conduzido pelo Recorrente, como aliás decorre do artº 63° do Código da Estrada, sendo certo que o A. bem viu a viatura conduzida pelo recorrente estando

XVIII.            E devia-o ter feito, e impunha-se, dado que, e tal como resulta provado dado que tinha espaço e tempo suficiente para imobilizar o motociclo, e não o fez;

XIX.   O A circulava com excesso de velocidade;

XX.     Existiu a omissão do dever de ceder passagem ao veículo conduzido pelo Recorrente e que assim foi causa determinante do embate, e por consequência foi o A o único culpado do acidente;

XXI.   A actuação do A, como resulta provado é qualificada como culposa, dado o seu inquestionável comportamento negligente, que assim, foi o único causador para a produção do acidente, como resultou provado, pelo que é o seu único culpado.

XXII. Como resultou provado pelas circunstâncias de circulação o condutor do VD, o aqui Recorrente gozava de prioridade de passagem pelo que tal permitia-lhe não modificar a sua velocidade ou direcção ficando o A. condutora do motociclo obrigado a

XXIII. abrandar ou a parar por forma a facultar-lhe a passagem, apesar de o recorrente ainda ter parado num STOP, só tendo avançado quando para tal verificou que o podia fazer;

XXIII.            É certo que este direito não conferia ao Recorrente a faculdade de usar exclusivamente a via em seu proveito nem a irresponsabilidade pelo seu exercício abusivo, pois a prioridade não é um direito incondicional e absoluto que dispense a adopção de precauções e que dispense a regra básica da condução (dever geral de prudência) que o Recorrente teve, como resultou provado;

XXIV.            É forçoso concluir que o embate verificou-se, não porque o condutor do VD tivesse uma condução descuidada, violadora do dever geral de prudência, mas porque o A. não cumpriu o dever de lhe ceder a passagem violando o dever de redobrado cuidado que nas circunstâncias em que circulava se impunha;

XXV.              Não logrou o A. provar a sua versão da dinâmica do acidente, como decorreu da factualidade provada.

XXVI.                        E assim, estamos perante um inquestionável afastamento da culpa por parte do ora recorrente, pelo que está afastada a presunção de culpa estatuída no disposto no art° 503°, N°. 3, 1ª parte do Código Civil;

XXVII.           Face á factualidade dada como assente, entendeu o Tribunal da Relação de Lisboa, fixar como adequado o valor de € 246.787,58, a título indemnizatório. Neste montante encontram-se fixados a título de danos de natureza não patrimonial a quantia de € 100.000,00.

XXVIII.         Quanto aos danos de natureza patrimonial, e face ao valor que o A auferia mensalmente, € 399,04, sempre, através dos cálculos matemáticos chegaríamos a valor substancialmente inferior ao que chegou o tribunal " a quo";

XXIX.            Já quanto os danos de natureza não patrimonial fixados, €100.000,00 são excessivos, com o devido respeito, até mesmo em função do estilo de vida do próprio A. à data dos factos;

XXX.  Decorre do próprio artigo 496° do Código Civil, e apesar do douto aresto recorrido o referir, a indemnização tem e deve ser fixada equitativamente, o que no caso dos autos não foi;

XXXI.    A jurisprudência já estabelecida quanto a esta situação tem definido que ao estabelecer indemnizações, e tem-no feito em casos semelhantes, fixou montantes que são substancialmente inferiores em dois terços do ora fixado.

XXXII. O douto acórdão recorrido está, assim, eivado das nulidades contidas no artigo 615, N° 1 alíneas c) e d) do NCPC, e violou, de entre outros os artigos 576° e 579° do NCPC, artºs 496°, 503°, n°s 1 e 3, 1ª parte, 570° do Código Civil, art° 63° do Código da Estrada à data dos factos.

    Por sua vez, o recorrente/FGA formulou as seguintes conclusões:

A)        O Tribunal "a quo", ao não considerar, na sua decisão, o limite do capital pelo qual o Fundo de Garantia Automóvel poderia ser responsabilizado, violou os artºs 6º e 21° do D.L. n.° 522/85 de 31.12, com a redacção do D.L. n.° 18/93 de 23 de Janeiro.

B)        O Tribunal "a quo" fixou, nos presentes autos, a título de dano não patrimonial pelas ofensas corporais sofridas pelo Autor, o valor de 10.000,00 Euros;

C)        A fixação em tal ordem de valores, para além da convicção e consciência pessoal do douto Tribunal "a quo", baseou-se num quadro traçado na fundamentação da douta sentença cujos componentes são de elevada gravidade, é certo, (no domínio das ofensas corporais) pelo que desenquadrado do contexto jurisprudencial, ainda que o mais recente considerado, para aquele tipo de danos, e que deveria apontar para um valor conforme, em montante não superior a 40.000,00 Euros, e não, 100.000,00 Euros;

D)        O douto Acórdão recorrido violou, assim o disposto no art.° 496° do Código Civil e art.°s 6o e 21° do D.L. n.° 522/85 de 31.12, com a redacção do D.L. n.° 18/93 de 23 de Janeiro.

   A Fidelidade contra alegou, secundando a arguição e nulidade imputada ao acórdão recorrido, no que respeita à condenação da interveniente Associação DD, reiterando ainda , quanto à sua responsabilidade, a inexistência de seguro do veículo em causa à data do acidente.

5. Antes da subida das revistas interpostas, a Relação supriu a invocada nulidade, reconhecendo o caso julgado emergente da decisão absolutória proferida no saneador, o que conduziu à estabilização do seguinte segmento decisório:

  - Nestes termos, acordam em julgar a apelação parcialmente
procedente revogando a sentença recorrida, com exceção da parte em que
absolve    a    Ré    CC, do pedido,       

e julgam a ação parcialmente procedente, condenando os Réus BB  e Fundo de Garantia Automóvel, solidariamente, a pagarem:-------------------------------------------------------------------------------------------------------------- -Ao Autor:--------------------------------------------------------------------------------------------------

c) a quantia global de duzentos e quarenta e seis mil setecentos e oitenta e sete euros e cinquenta e oito cêntimos (€ 246.787,58), acrescida de juros de mora, à taxa legal, sobre seis mil setecentos e oitenta e sete euros e cinquenta e oito cêntimos (€ 6.787,58), desde a data da citação do 1o Réu, e até à presente data, e, desde a presente data, sobre aquele montante global, até efetivo e integral pagamento;---------------------------------------
d) a quantia que se vier a liquidar, a título de indemnização pelos danos referidos em II - 6 - 4. e 6., acrescida de juros de mora a calcular desde a data da citação do 1o Réu.-----------------------------------

- Ao Instituto de Segurança Social - I.P., a quantia de sete mil duzentos

e cinquenta e dois euros e oitenta e oito cêntimos (€7.252,88),-------------------------------------------

absolvendo-os do mais peticionado.

         6.  A primeira questão suscitada na revista interposta pelo A. – decorrente da violação do caso julgado absolutório associado ao reconhecimento da prescrição quanto à interveniente passiva – está , pois, totalmente ultrapassada,

em consequência da decisão final proferida na Relação, reconhecendo e suprindo tal nulidade.

   Questiona ainda o A./ recorrente a circunstância de não se ter condenado a Companhia de seguros FF, na qualidade de interveniente passiva, identicamente absolvida do pedido no despacho saneador, por força do reconhecimento da excepção de prescrição do direito do lesado no seu confronto: tal argumento é, porém, manifestamente improcedente, por o valor de caso julgado material, decorrente de tal absolvição, obstar evidentemente à reapreciação do tema da responsabilidade da seguradora, em sede de decisão final do litígio.

   Volta a salientar-se que o trânsito em julgado de tal decisão absolutória, alcançada na fase de saneamento do processo, foi consequência inevitável da inércia das partes que – confrontadas com tal sentido decisório – não curaram de o impugnar tempestivamente; na verdade, se as partes na causa, nomeadamente o A., ora recorrente, entendiam que não era legalmente

possível o decretamento da prescrição apenas quanto à seguradora, sem previamente se ter verificado a ocorrência de prescrição quanto à responsabilidade dos beneficiários do possível seguro obrigatório a cargo de tal entidade, deviam naturalmente ter recorrido dessa decisão absolutória – devendo ter presente que, ao deixarem transitar em julgado a decisão proferida e não impugnada, a definitividade inerente ao caso julgado material inviabilizava de pleno que a questão da responsabilidade da seguradora, definitivamente  absolvida, pudesse voltar a ser recolocada.

   Note-se, ainda, que, em termos substanciais, a questão que o A. agora parece pretender recolocar, com desconsideração do efeito associado inelutavelmente ao caso julgado da sentença absolutória contida no despacho saneador, carece de fundamento, já que resulta dos autos que efectivamente não existia seguro válido e eficaz do veículo causador do acidente, à data da ocorrência deste: na verdade, a prova documental produzida acerca desta matéria levou as instâncias a concluírem ( ponto 3.

da matéria de facto ) que a Associação de bombeiros detentora e interessada na circulação da viatura VD transferiu a responsabilidade civil emergente dos riscos de circulação para a FF em apólice com início a 17/2/1997 – ou seja, muito depois de ter ocorrido o acidente em causa nos autos.

   Aliás, só assim se compreende a imputação de responsabilidade ao FGA, já que a mesma assenta inelutavelmente no pressuposto da inexistência de seguro válido e eficaz, à data do acidente…

   Relativamente à restante argumentação esgrimida pelo recorrente, ela traduz-se essencialmente em pretender pôr em causa o juízo substancial da Relação acerca da dinâmica do acidente e da culpa na ocorrência do mesmo: estando o 1º R., na qualidade de condutor/comissário ( cfr. pontos 21 e 27 da matéria de facto), onerado com a presunção de culpa extraída do nº3 do art. 503º do CC, tudo está em saber se – perante o quadro factual definitivamente assente – logrou ou não o condutor da viatura de mercadorias ao serviço dos bombeiros  ilidir tal presunção de culpa.

   Cumpre, desde já, salientar que não é sindicável num recurso de revista o resultado da reapreciação da matéria de facto pela Relação, na parte em que – na sequência da impugnação deduzida pelo A./ apelante – determinou alteração do teor do ponto 15 da matéria de facto, considerando-se não provado que o A. tivesse visto a viatura dos bombeiros a entrar na intersecção das vias a, pelo menos, 100 metros do local do embate; na realidade, perante o teor da resposta dada pela Relação no acórdão recorrido a tal quesito , apenas ficou provado que, em abstracto, quem circulasse na via principal no sentido do A. poderia ter uma visibilidade sobre o cruzamento de, pelo menos, 100 metros - não ficando, porém, assente que, nas concretas circunstâncias do acidente, o A. se tivesse efectivamente apercebido a tal distância da manobra realizada pelo veículo pertencente à corporação de bombeiros.

   Trata-se, como é óbvio, de uma questão estritamente factual, naturalmente subtraída aos poderes cognitivos deste Supremo, enquanto resultado do exercício pela Relação do duplo grau de jurisdição quanto à matéria de facto impugnada pelo apelante, assente na livre valoração das provas gravadas , articulada com as presunções naturais que à Relação compete extrair , com base  nas regras da experiência, dos depoimentos prestados em audiência.

    Tal alteração da matéria de facto, estribada no exercício dos poderes conferidos pelo art. 712º do CPC, cujo mérito ou substância – porque ligado à livre valoração dos meios probatórios, desprovidos de força legal – é insindicável pelo STJ, não implicou seguramente violação de qualquer regra ou padrão normativo que permitisse a sua inclusão no âmbito de um recurso de revista – pelo que é o quadro factual fixado definitivamente pela Relação que tem de servir de substrato ao juízo normativo sobre a culpa dos condutores na produção do acidente.

   Ora, quanto a esta matéria, nenhuma censura merece o decidido no acórdão recorrido, ao imputar a responsabilidade pela colisão à viatura que, seguindo embora em marcha urgente, invadiu uma intersecção de vias protegida por sinal de Stop, sem se ter certificado de que tal manobra não envolvia risco para os demais utentes da via, devendo ter-se apercebido, nomeadamente, de que na mesma circulava um motociclo - sem que se tivesse apurado da prova produzida  a que velocidade este seguia ( nomeadamente, se excedia o limite de 50 km horários vigente no local), a que distância estava do cruzamento no momento em que o R. o invadiu e se, apercebendo-se ou devendo ter-se apercebido o seu condutor da

presença da viatura dos bombeiros (cuja marcha era assinalada com sinais luminosos rotativos), teve ainda oportunidade de parar em segurança ou de evitar a colisão ( cfr. pontos 6, 7, 9 e 15 da matéria de facto).

   Note-se que parte da argumentação do R. não tem na devida conta o quadro factual definitivamente fixado pelas instâncias, nomeadamente ao insistir na tese da velocidade excessiva do motociclo - que não tem qualquer suporte na matéria de facto assente.

   Por outro lado, tal linha argumentativa do recorrente – ao pretender que uma viatura cuja marcha é assinalada com sinais luminosos rotativos está dispensada de observar as mais elementares cautelas ao entrar numa intersecção de vias protegida por sinal de Stop – estando os demais utentes que circulam na via principal absolutamente vinculados, independentemente das circunstâncias concretas da circulação e da distância real a que se encontrem do ponto de intersecção , a ceder-lhe passagem, não encontra qualquer apoio, como refere o acórdão recorrido, nas regras estradais, nomeadamente nas normas constantes dos arts. 62º e 63º do C. Estrada.

   Na verdade, para se poder imputar alguma parcela de culpa ao lesado seria indispensável que tivesse ficado provado, ou que este seguia em velocidade excessiva, ou que, encontrando-se, no momento da realização da manobra que causou a colisão, a uma distância suficiente do ponto de intersecção das vias, podendo consequentemente parar em segurança e facultar passagem ao veiculo em marcha urgente de cuja presença necessariamente se devia ter apercebido, o não fez injustificadamente.

   Ora, não resultando manifestamente tais circunstâncias da factualidade assente, é evidente que não pode afastar-se um juízo de censura relativamente à conduta do condutor / comissário da viatura que – apesar de seguir em marcha urgente – não estava legitimado para invadir zona de intersecção protegida pelo Stop sem previamente se ter assegurado da inexistência de trânsito em circulação na via prioritária, cuja segurança pudesse ser afectada com a realização da manobra pela viatura de emergência por ele conduzida.

   Impugna ainda o recorrente o montante pecuniário arbitrado como compensação dos danos patrimoniais e não patrimoniais: considera-se, porém, não existirem manifestamente razões para – tendo na devida

consideração a gravidade extrema das lesões causadas pelo acidente e as respectivas e irremediáveis sequelas no padrão de vida do sinistrado, bem reflectidas na matéria de facto fixada – pôr em causa os valores indemnizatórios alcançados no acórdão recorrido.

    Não foram, deste modo, violadas pelo acórdão recorrido as disposições legais invocadas pelo recorrente.

   Por sua vez, no recurso interposto pelo FGA suscita esta entidade duas questões – sendo que a primeira delas, referente ao quantitativo arbitrado a título de compensação dos danos não patrimoniais, pretendendo ver a quantia de €100.000 reduzida para o montante de apenas €40.000, se configura como manifestamente improcedente, perante a gravidade das lesões sofridas e os seus reflexos dramaticamente incapacitantes no padrão e qualidade de vida do sinistrado.

   A segunda questão traduz-se na desconsideração no acórdão recorrido do limite de capital pelo qual o FGA podia ser responsabilizado – e que, na

óptica da entidade recorrente, tratando-se de acidente ocorrido em 1995, não poderia exceder o valor do capital mínimo do seguro obrigatório fixado

no art. 6º do DL 522/85, na redacção emergente do DL 18/93: ou seja, €249.398,95.

   Saliente-se que efectivamente – atenta a data – 16/7/1995 - em que ocorreu o acidente em litígio nos presentes autos – aplicam-se ao âmbito da responsabilidade do FGA as normas constantes do DL 522/85, com as alterações emergentes do DL 18/93, de 23 de Janeiro, na medida em que este diploma legal actualizou os valores mínimos do capital do seguro obrigatório que, por sua vez, balizam a responsabilidade máxima a efectivar contra o FGA, nos termos do art. 23º daquele diploma legal.

   E, nesta medida, assiste razão ao recorrente/FGA quando sustenta que a respectiva condenação solidária, quanto ao capital da indemnização não poderá exceder o valor do referido capital mínimo, estabelecido pelo DL 18/93 no montante de 50.000 000$00 por sinistro – a que corresponde  o valor pecuniário de €249.398,95. Tal limite não se aplica, porém, quanto aos juros moratórios devidos sobre tal quantia, na medida em que estes traduzem mera consequência de um retardamento na realização da prestação, imputável ao devedor, nos termos previstos no art. 805º, nº3, do CC.

   Importa, pois, fazer constar este limite objectivo à responsabilidade civil solidariamente imputada pelo acórdão recorrido ao FGA.

         7. Nestes termos e pelo exposto:

-  nega-se provimento à revista do 1º R. ;

- concede-se, em parte, provimento à revista interposta pelo R./ FGA, determinando-se a revogação do acórdão recorrido na parte em que o julgou solidariamente responsável pela totalidade do capital indemnizatório arbitrado ao lesado, ficando a constar de tal condenação que o âmbito da condenação do FGA pelo capital indemnizatório arbitrado ao lesado não poderá exceder o valor do capital mínimo do seguro obrigatório em vigor à data do acidente, ou seja, o montante de € €249.398,95, confirmando-se em tudo o mais a decisão recorrida.

   Custas na proporção do decaimento, sem prejuízo, porém, do apoio judiciário oportunamente concedido ao A. e ao 1º R. , e estando o FGA isento de custas , por força do estatuído no nº11 do art. 29º do DL 522/85, disposição legal vigente à data da ocorrência do acidente em litígio.

Lisboa, 10 de Abril de 2014

Lopes do Rego (Relator)

Orlando Afonso

Távora Victor