Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
08P2807
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: SIMAS SANTOS
Descritores: DESOBEDIÊNCIA
DESOBEDIÊNCIA QUALIFICADA
APREENSÃO DE VEÍCULO
SEGURO OBRIGATÓRIO AUTOMÓVEL
FALTA
Nº do Documento: SJ20090218028075
Data do Acordão: 02/18/2009
Votação: UNANIMIDADE
Referência de Publicação: DR Iª SÉRIE,55,19-03-2009, P.1762-1768.
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: FIXAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Decisão: FIXADA JURISPRUDÊNCIA
Sumário :
O depositário que faça transitar na via pública um veículo automóvel, apreendido por falta de seguro obrigatório, comete, verificados os respectivos elementos constitutivos, o crime de desobediência simples do artigo 348.º, n.º 1, alínea b), do Código Penal, e não o crime de desobediência qualificada do art. art. 22.º, n.ºs 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 54/75, de 12 de Fevereiro.
Decisão Texto Integral:
1.

O Ministério Público interpôs recurso, extraordinário para uniformização de jurisprudência, do acórdão, de 20.5.2008, do Tribunal da Relação de Lisboa (proc. n.º2472/08-5), invocando como fundamento o acórdão da Relação de Coimbra de 7.3.2007 (proc. n. º 15/04.OGAVGS.C1).

Por acórdão de 8.10.2008, da 5.ª Secção, teve este Supremo Tribunal de Justiça por verificada a oposição operativa de julgados quanto à questão da qualificação jurídica da conduta daquele que, tendo sido nomeado depositário de um veículo automóvel, apreendido ao abrigo do disposto no art. 162.º, n.º 2 al. f) do Código da Estrada, o conduz: crime de desobediência qualificada do art. 22°., n.º 2 do DL n° 54/75, de 12 de Fevereiro ou crime de desobediência simples do art. 348.º, n.º 1, al. b), do C. Penal.

Cumprido o disposto no art. 442.º do CPP, veio o Ministério Público neste Tribunal produzir detalhadas alegações escritas em que concluiu:

1. Entendendo-se que o aresto recorrido deverá ser revogado e que o conflito que se suscita há-de resolver-se fixando-se jurisprudência no sentido do decidido no aresto fundamento.

2. Propõe-se, para tal efeito, a seguinte redacção:

“O depositário que utiliza um veículo automóvel, apreendido por falta de seguro obrigatório, comete, verificados os respectivos elementos constitutivos, o crime de desobediência simples do art. 348.º, n.º 1, alínea b), do Código Penal, por não ser tal conduta enquadrável nas disposições contidas no art. 22.º, n.ºs 1 e 2, do Dec-Lei n.º 54/75, de 12 de Fevereiro.

Colhidos os vistos e realizada a conferência em Plenário das Secções Criminais, cumpre conhecer e decidir.

2.1.

E conhecendo.

Continua a entender-se, como decidiu o acórdão da secção sobre a questão preliminar, que se verificam os necessários pressupostos da uniformização de jurisprudência, designadamente a oposição de julgados quanto à mesma questão de direito de direito: se o depositário que utiliza um veículo automóvel, apreendido ao abrigo do disposto no art.162º, n.º 2, al. f) do Código da Estrada, comete o crime de desobediência qualificada, previsto no art. 22.º, n.º 2 do DL n.º 54/75, de 12 de Fevereiro ou um crime de desobediência simples do art. 348.º, n.º 1 al. b) do Código Penal, por não ser tal conduta enquadrável nas disposições contidas naquele art. 22.º, n.ºs. 1 e 2.

Com efeito, ambos os acórdãos (fundamento e recorrido) se pronunciam sobre a questão já identificada em termos opostos.

O acórdão fundamento (de 7.32007 da Relação de Coimbra, proc. n.º 15/04.OGAVGS.C1), publicado na íntegra na respectiva base de dados, tem aí o seguinte sumário:

«I – As disposições contidas no art. 22.º do DL n.º 54/75 têm aplicabilidade no âmbito específico do registo de propriedade de veículos e respectivos documentos, não abrangendo as situações de falta de documentos que titulem a existência de seguro obrigatório.

II – Quem circular com veículo apreendido por não ter apresentado, no prazo legal, os documentos relativos ao seguro obrigatório comete o crime de desobediência simples e não o de desobediência qualificada.»

E, na verdade, escreve-se nesse aresto:

«Contudo, não estabelece qualquer cominação, designadamente a de desobediência qualificada para a circulação do veículo apreendido.

Por sua vez o art. 162.º n.º 1. al. f). do Cód. Estrada, na redacção do DL n.º 265-A/200l, de 28 de Setembro, dispõe que o veículo deve ser apreendido pelas autoridades de investigação criminal ou fiscalização ou seus agentes quando não tenha sido efectuado seguro de responsabilidade civil nos termos da lei.

Depois o n.° 4, deste artigo, limita-se a prever que o proprietário pode ficar, como ocorreu nos autos, como fiel depositário do veículo apreendido, não estabelecendo também qualquer cominação.

No sentido de que quem conduzir ciclomotor apreendido por falta do respectivo seguro de responsabilidade civil comete o crime de desobediência simples nos termos acima apontados, decidiram o Ac. da Rel. do Porto, de 19/11/2003, Tomo V, pág. 225 e Ac. Rel. de Lisboa, 7/12/2004, Tomo V, pág. 142. Assim sendo, pelos motivos acima mencionados, deve concluir-se que não existe norma que estabeleça a cominação, designadamente de desobediência qualificada e que por isso bem andou o tribunal recorrido, na sua douta e bem fundamentada sentença ao condenar o arguido pela prática de um crime de desobediência simples, p. e p. pelo art. 348.º, n.º 1, al. b), do CP.»

Já no acórdão recorrido (da Relação de Lisboa 20.5.2008, proc. n.º 2472/08-5), foi decidido, diversamente, que o depositário que utiliza um veículo automóvel, apreendido ao abrigo do disposto no art. 162.º, n.º 2, al. f) do Código da Estrada, comete um crime de desobediência qualificada, por se encontrar tal conduta contemplada no art. 22.º, n.º 2 do DL n.º 54/75, de 12 de Fevereiro.

Finalmente, no intervalo da prolação dos dois acórdãos, não ocorreu modificação legislativa que interfira directa ou indirectamente na resolução da questão controvertida.

Importa, pois, entrar na questão controvertida, com vista à desejada uniformização de jurisprudência.

2.2.

Essa questão, a de saber se aquele que, tendo sido nomeado depositário de um veículo automóvel, apreendido ao abrigo do disposto no art. 162.º, n.º 2 al. f) do Código da Estrada, o conduz, comete um crime de desobediência simples ou de desobediência qualificada, tem tido desencontradas soluções por parte dos Tribunais Superiores.

Assim,

No sentido de que comete o crime de desobediência simples, do art. 348.º, n.º 1 al. b) do C. Penal, pronunciaram-se os seguintes acórdãos:

– Da Relação do Porto: acórdãos de 16-4-1997, proc. n.º 9740164 (1), de 19-11-2003, proc. n.º 4510/03, de 6-4-2005, proc. n.º 0510023, de 19-10-2005, proc. n.º 0511904.

– Da Relação de Coimbra: acórdãos de 7-3-2007, proc. n.º 15/04.0GAVGS.C1 (2)., de 7-11-2007, proc. n.º 676/06.5TAGRD.C1, de 9-1-2008, proc. n.º 711/06.7TAACB.C1, e o acórdão fundamento de 7.3.2007, proc. n. º 15/04.OGAVGS.C1.

– Da Relação de Lisboa: acórdãos de 13-10-1998, proc. n.º 0038485 (3), de 7-10-2004, proc. n.º 4883/04 e de 18-1-2005, proc. n.º 7988/04-5.

– Da Relação de Évora: acórdão de 19-12-2006, proc. n.º 1752/06-1 (4).

Já no sentido de que esse comportamento corporiza o crime de desobediência qualificada, do art. 22.º, n.º 2 do DL n.º 54/75, de 12 de Fevereiro, pronunciaram-se os seguintes acórdãos:

– Da Relação do Porto: acórdãos de 17-6-1998, proc. n.º 9840440 (5), de 21-10-1998, proc. n.º 9810715 (6), de 5-4-2000, proc. n.º 9941372 (7), e de 12-7-2000, proc. n.º 0040286 (8)..

– Da Relação de Coimbra: acórdão de 16-7-2008, proc. n.º 480/07.3GAMLD (9).

– Da Relação de Lisboa: acórdãos de 25-1-1994, proc. n.º 0021345 (10), e de 26-2-2004, proc. n.º 10196/03-9 (11) e o acórdão fundamento, de 20.5.2008.

Este Supremo Tribunal de Justiça foi chamado a pronunciar-se no acórdão de 26-4-1989, proc. n.º 39903 (12). e fê-lo no primeiro sentido:

«Comete o crime de desobediência simples – art.ºs 43.º, § 2 do Código da Estrada, e 388.º, n.º 1 do Código Penal – aquele que conduz na via pública um veiculo que fora apreendido por intervenção num acidente sem que nessa data estivesse seguro, embora posteriormente a apreensão o arguido tivesse procedido ao seguro do veiculo, uma vez que tal apreensão ainda não tinha sido levantada pelo tribunal.»

2.3.

Isto posto, analisemos, então, a disciplina legal a atender, ou seja, o regime do seguro obrigatório de responsabilidade civil, os art.ºs 150.º e 162.º do Código da Estrada, o art. 348.º do Código Penal e o art. 22.º do DL n.º 54/75, de 12 de Fevereiro

2.3.1.

A obrigatoriedade do seguro de responsabilidade civil automóvel e o respectivo regulamento foram estabelecidas pelo DL n.º 165/75 e pelo Decreto n.º 166/75, ambos de 28 de Março, diplomas que, no entanto, viram a sua entrada em vigor adiada e, depois, a própria execução adiada sine die (13).

Só com o DL n.º 408/79, de 25 de Setembro, que entrou em vigor em 1.1.1980, foi realmente instituído o seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel: um sistema de transição que estabelecia a obrigatoriedade do seguro da responsabilidade civil que pudesse resultar da sua utilização para os veículos terrestres a motor, seus reboques e semi-reboques, que circulassem na via pública, ou em locais públicos ou privados abertos ao público ou a certo número de pessoas com o direito de os utilizar (art. 1.º)

Previu-se então, no domínio da fiscalização e penalidades, a obrigatoriedade de exibição, pelos condutores ou pessoas abrangidas pelo seguro, do documento comprovativo da efectivação do seguro sempre que solicitado pelas autoridades competentes (art. 23.º), implicando a falta da sua exibição (certificado de seguro ou cartão de responsabilidade civil) no prazo de 5 dias a imediata apreensão do veículo, a manter-se enquanto não fosse feita prova de ter sido efectuado o seguro obrigatório (art. 24.º). A circulação do veículo sem seguro de responsabilidade civil constituía contravenção (art. 26.º).

O DL n.º 522/85, de 31 de Dezembro, que revogou o DL n.º 408/79, propôs-se reforçar e aperfeiçoar o seguro obrigatório de responsabilidade civil, estabelecendo a obrigação de segurar (art.1.º) e exigência de que a circulação de veículos só fosse possível depois de efectuado esse seguro (art. 30.º). A circulação de veículo sem seguro obrigatório de responsabilidade civil constituía contra-ordenação (art. 34.º) e levava à apreensão de veículo quando não fosse apresentado o documento comprovativo da realização ao seguro até 8 dias a contar da data em que for solicitado pelas autoridades competentes (art. 32.º, n.º 1), com um regime específico para os casos de acidente de viação em que aquela falta implicava a apreensão imediata (n.º 2).

Por sua vez, o DL n.º 522/85 foi revogado pelo DL n.º 291/2007, de 21 de Agosto de 2007 (14) que transpôs parcialmente para ordem jurídica interna a Directiva n.º 2005/14/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de Maio, que altera as Directivas n.ºs 72/166/CEE, 84/5/CEE, 88/357/CEE e 90/232/CEE, do Conselho, e a Directiva 2000/26/CE, relativas ao seguro de responsabilidade civil resultante da circulação de veículos automóveis (5.ª Directiva sobre o Seguro Automóvel) e regula actualmente a matéria do seguro obrigatório de responsabilidade civil, mantendo a obrigatoriedade do seguro dos veículos terrestres a motor e seus reboques que circulem em território nacional (art. 80.º), remetendo também para o art. 150.º do Código da Estrada. Obrigatoriedade a controlar pela exibição do certificado de seguro pelo condutor, sempre que um veículo a motor transite na via pública (art. 85.º do Código da Estrada), sem prejuízo da apreensão do veículo prevista na al. f) do n.º l do art. 162.º do mesmo Código (art. 81.º).

No que se refere à garantia da responsabilidade civil e da situação registal do veículo, dispõe-se que a sanção da circulação do veículo sem seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel, bem como o respectivo processo de aplicação, se encontram fixados no Código da Estrada, com ressalva da previsão (n.º 1 do art. 85.º) da contra-ordenação da circulação do veículo sem o devido dístico (n.º 2) e da contra-ordenação da não entrega do certificado de matrícula, ou do livrete e do título de registo de propriedade (n.º 3).
2.3.2.
Vigorava, aquando da instituição do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel (DL n.º 408/79), o Código da Estrada aprovado pelo DL n.º 39.672, de 20 de Maio de 1954 que a tal matéria se referia expressamente no seu Preâmbulo (15). Coerentemente prescrevia que «o veículo que tenha dado causa a um acidente será imediatamente apreendido pela autoridade ou agente da autoridade que levantar o auto, excepto se o respectivo proprietário ou quem o representar provar que transferiu a sua responsabilidade para uma companhia de seguros (…) (n.º 2 do art. 48.º), consistindo a «apreensão na entrega do veículo ao seu proprietário ou a quem o represente, com a obrigação de o não utilizar ou alienar por qualquer forma e de o entregar quando lhe for exigido, sob as penas da lei, que cessará logo que o interessado pague a indemnização ou preste qualquer das garantias referidas no parágrafo anterior».
Ou seja, anteriormente à vigência do DL n.º 408/79, face a este Código da Estrada, só era obrigatório o seguro de responsabilidade civil automóvel, para a exploração de transportes colectivos, pelo que não existiam disposições relativas a seguro obrigatório ou à apreensão de veículo pela falta de seguro(16).

O DL n.º 114/94, de 3 de Maio, veio revogar o Código de 1954 e aprovar um novo Código da Estrada(17), que previa a obrigatoriedade de seguro (art. 133.º n.º 1), remetendo a punição da respectiva infracção com coima, para a legislação especial (n.º 2 – o art. 34.º do DL n.º 522/85). A falta de seguro obrigatório de responsabilidade civil determinava a apreensão do veículo [art. 163.º n.º l al. e)], podendo o proprietário ser nomeado fiel depositário (n.º 3), mantendo-se a apreensão até ser efectuado o seguro ou, em caso de acidente, até que se mostrassem satisfeitas as indemnizações dele derivadas ou prestada caução por montante equivalente ao valor mínimo do seguro obrigatório (n.º 5) (18).

Rege, agora, o Código da Estrada(19), quanto à obrigação de seguro (art. 150.º) que «os veículos a motor e seus reboques só podem transitar na via pública desde que seja efectuado, nos termos da legislação especial, seguro de responsabilidade civil que possa resultar da sua utilização» (n.º 1) e que «quem infringir o disposto no n.º 1 é sancionado com coima de €500 a €2500 se o veículo for um motociclo ou um automóvel ou de €250 a €1250 se for outro veículo a motor» (n.º 2).

Sobre a apreensão de veículos, estabelece o art. 162.° que «o veículo deve ser apreendido pelas autoridades de investigação criminal ou de fiscalização ou seus agentes quando (n.º 1): (…), f) não tenha sido efectuado seguro de responsabilidade civil nos termos da lei; (…)»

E que, «nos casos previstos no número anterior, o veículo não pode manter-se apreendido por mais de 90 dias devido a negligência do titular do respectivo documento de identificação em promover a regularização da sua situação, sob pena de perda do mesmo a favor do Estado.» (n.º 2) (…)

«Nos casos previstos nas alíneas c) a j) do n.º l, o titular do documento de identificação pode ser designado fiel depositário do respectivo veículo.» (n.º 5)

«No caso de acidente, a apreensão referida na alínea f) do n.° l mantém-se até que se mostrem satisfeitas as indemnizações dele derivadas ou, se o respectivo montante não tiver sido determinado, até que seja prestada caução por quantia equivalente ao valor mínimo do seguro obrigatório, sem prejuízo da prova da efectivação de seguro.» (n.º 6) (…).

Temos, assim, de acordo com o Código da Estrada, que é obrigatório o seguro, de responsabilidade civil que possa resultar da sua utilização, para os veículos a motor e reboques quando transitem na via pública, devendo, na sua falta, ser o veículo apreendido pelas competentes autoridades. A apreensão, em caso de acidente, mantém-se até estarem satisfeitas as indemnizações ou até que seja prestada caução por quantia equivalente ao valor mínimo do seguro obrigatório. Nesse caso o titular do documento de identificação pode ser designado fiel depositário do respectivo veículo.

O conjunto normativo constituído pelo DL n.º 291/07 e pelo Código da Estrada actual não comina (20)., pois, com a prática do crime de desobediência qualificada a utilização do veículo automóvel apreendido por falta de seguro obrigatório de responsabilidade civil.

2.3.3.

Com efeito, dispõe o art. 348.º (desobediência) do C. Penal que «1. Quem faltar à obediência devida a ordem ou a mandado legítimos, regularmente comunicados e emanados de autoridade ou funcionário competente, é punido com pena de prisão até l ano ou com pena de multa até 120 dias se:

a) Uma disposição legal cominar, no caso, a punição da desobediência simples; ou

b) Na ausência de disposição legal, a autoridade ou o funcionário fizerem a correspondente cominação.»

«2. A pena é de prisão até 2 anos ou de multa até 240 dias nos casos em que uma disposição legal cominar a punição da desobediência qualificada.»

O que significa que o crime de desobediência ocorre quando se verifica a falta de obediência a ordem ou mandado legítimos, regularmente comunicados e emanados de autoridade ou funcionário competente (corpo do n.º 1), seja porque uma disposição legal comina no caso a sua punição como desobediência simples [al. a) do n.º 1], seja porque a correspondente cominação foi feita pela entidade competente [al. b) do n.º 1]. Se uma disposição legal como tal a cominar, a desobediência será qualificada (n.º 2).

Como se vê da al. a) do n.º 1 do n.º 2 deste art. 348.º, este dispositivo é referência para incriminações provenientes dos mais diversos diplomas legais que visam armar a Administração Pública, na sua múltipla actividade.

Protege-se com este tipo de ilícito a função de autoridade pública «sem distinguir entre autoridade administrativa, judiciária ou outra. (…) parece legitima a asserção de que o conceito de autoridade assume um sentido objectivo, ligado à ideia de poder legal (funcional) de impor um determinado comportamento, na ausência de indicação dos sujeitos a quem é atribuído tal poder (concepção subjectiva)» (21).

Protege-se a autonomia intencional do Estado, «(…) de uma forma particular, a não colocação de entraves à actividade administrativa por parte dos seus destinatários». O conceito de administração, para efeitos criminais, «há-de ser entendida em sentido funcional, ou seja, como o conjunto, historicamente variável, das funções assumidas como próprias pelo Estado com vista ao bom andamento da vida comunitária» (22)..

O que implica, como ficou plasmado no art. 348.º bastante plasticidade e margem de manobra para o legislador conforme a actividade, em cada caso, visada, consagrando aquele artigo o maior denominador comum.

2.3.4.

O que desloca a nossa atenção para o normativo já referido: o art. 22.º do DL n.º 54/75, de 12 de Fevereiro.

Dispõe ele que «1. A apreensão, a penhora e o arresto envolvem a proibição de o veículo circular» e que «2. A circulação do veículo com infracção da proibição legal sujeita o depositário às sanções aplicáveis ao crime de desobediência qualificada.»

Seguramente que, à luz dos elementos até agora recolhidos, a circulação do veículo apreendido com infracção desta proibição legal sujeita o depositário às sanções aplicáveis ao crime de desobediência qualificada, como resulta da conjugação do n.º 2 do art. 22.º do DL 54/75, com o n.º 2 do art. 348.º do Código Penal.

Mas será aplicável desta disciplina ao desrespeito pelo depositário, de veículo automóvel apreendido, por falta de seguro, da ordem de apreensão, de forma a considerar essa conduta como desobediência qualificada (uma vez que, como se viu, quer os sucessivos código da estrada e os diplomas sobre o seguro obrigatório de responsabilidade civil, nunca cominaram expressamente como desobediência qualificada aquele desrespeito)?

A consideração da génese deste diploma legal e a hermenêutica impõem uma resposta negativa.

Na verdade, o DL n.º 45/75, de 12 de Fevereiro visou remodelar a matéria de registo de automóveis, propriedade ou outros direitos ou factos com ele directamente relacionados, individualizando os respectivos proprietários, tornar possível o seu tratamento automático e dar publicidade aos direitos inerentes aos veículos automóveis (art. 1.º).

E as suas normas prendem-se, sempre, directa ou indirectamente, com questões de registo de ou sobre automóveis. Reportam-se sempre a situações que estão previstas como actos sujeitos a registo (art. 5.º) e procuram regular procedimentos que decorrem da obrigatoriedade de registo (cfr. v.g. o art. 10.º) ou acautelar o desenvolvimento dos seus procedimentos, como a apreensão que visa acautelar a venda do veículo e o direito do credor (cfr. v.g. art.ºs 17.º e 18.º).

Isso mesmo, aliás, consta do respectivo preâmbulo (23) .

Assim, o registo dos actos a ele sujeitos abrange, além do arresto e penhora de veículos automóveis, «a apreensão prevista neste diploma» [art. 5.º, al. e)], expressão significativa que se refere à apreensão ordenada pelo juiz no âmbito do processo para apreensão de veículo, a que se referem os art.ºs 15.º a 21°: a apreensão em virtude do vencimento e não pagamento do crédito ou, quando se trate de reserva de propriedade, do não cumprimento do contrato por parte do adquirente, ordenada pelo juiz no processo a que se reporta o art. 15.º.

Ora, é essa apreensão (ao lado da penhora e arresto de veículos, todas especialmente referidos no DL n.º 45/75 e sujeitas a registo) que envolve a proibição de o veículo circular, e comina com o crime de desobediência qualificada (art. 22.º n.ºs l e 2) a violação de tal proibição pelo depositário e que se distingue da penhora de veículos, enquanto penhora de bens móveis, feita também através da sua apreensão, mas que foram objecto de referência distinta no mencionado art. 22.º

Uma é a apreensão ordenada no âmbito da acção prevista no art. 15.º. enquanto que outra é a apreensão em que, nos termos gerais das leis do processo a qual, se materializa a penhora de veículos, bens móveis sujeitos a registo. Sendo certo que a alínea e) do n.º 1 do art. 5.º usa a expressão “prevista neste diploma” visando tão só à apreensão, não a estendendo à penhora e ao arresto.

É essa a conclusão a extrair dos textos analisados, numa hermenêutica saudável (24).

Interpretar um preceito consiste, antes do mais, em tirar das palavras usadas na sua redacção um certo sentido, um certo conteúdo de pensamento, uma significação; em extrair da palavra – expressão sensível duma ideia – a própria ideia nela condensada. Não se tratará, porém, de colher da lei um qualquer sentido, o primeiro que o texto legal traga ao espírito do jurista. É que a lei não se destina a alimentar a livre especulação individual; é um instrumento prático de realização e de ordenação da vida social, que se dirige sempre a uma generalidade mais ou menos ampla de indivíduos, não concretamente determinados, para lhes regular a conduta (Pires de Lima e Antunes Varela, Noções Fundamentais de Direito Civil, I, 1973, pág. 144 - Carlos Maximiliano Hermenêutica e Aplicação do Direito, 5.º Edição, 1951, pág. 24)

Diversos elementos contribuem para esse objectivo. O elemento gramatical com uma primeira função de natureza negativa, eliminadora: a de eliminar dos sentidos possíveis da lei todos aqueles que, de qualquer modo exorbitam do texto respectivo (Pires de Lima e Antunes Varela, op. cit., pág. 159), tendo presente que, quanto às normas que comportam mais do que um significado (sentido, pensamento), nem todos esses sentidos recebem do texto legislativo igual apoio; uns hão-de naturalmente caber dentro da letra da lei mais à vontade do que outros; os primeiros corresponderão ao sentido natural das expressões utilizadas, os outros a um sentido arrevesado, forçado. O intérprete deve, em princípio, admitir que a lei procede de um legislador que sabe exprimir com suficiente correcção o seu pensamento (...); do simples texto da lei recebe maior impulso o sentido que melhor corresponde ao seu significado natural, ao seu alcance normal (cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, op. cit., pág. 159, 160).
Quando no texto da lei surgem vocábulos de sentido dúbio ou ambíguo, só o elemento lógico pode fixar o seu sentido e alcance decisivos, o que não significa que não deva esse elemento intervir mesmo quando o texto da lei é aparentemente claro, dada a possibilidade de o texto legislativo ter atraiçoado o pensamento real do legislador.
O elemento racional, a razão de ser, o fim visado pela lei (a ratio legis) e ainda nas circunstâncias históricas particulares (25) em que a lei foi elaborada (ocasio legis), contribuem para a avaliação da sua influência no espírito do legislador e, assim, para descortinar mais facilmente a disciplina que através da norma se pretendeu estatuir. O elemento sistemático, as disposições reguladoras do instituto em que se integra a norma a interpretar e as disposições reguladoras dos institutos ou problemas afins (26). E o elemento histórico, os materiais relacionados com a história da norma e que lançam alguma luz sobre o seu sentido e alcance decisivo (27).
Sintetizando pode reter-se que se trata de estabelecer o sentido das expressões legais para decidir a previsão legal e, logo, a sua aplicabilidade ao pressuposto de facto que se coloca perante o intérprete (28), cientes de que a interpretação da lei não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada» (art. 9.º, n.º 1 do CC), além de que «na fixação e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas» (art. 9.º, n.º 3).
Isto posto, é tempo de voltar aos textos implicados na solução da questão controvertida.
No que respeita ao elemento histórico, importa notar que, quer quando o DL n.º 45/75 foi publicado: 12.2.1975, quer quando entrou em vigor: 12.3.1975, ainda não tinha sido instituído legalmente o seguro obrigatório de responsabilidade civil (29), o que, já se viu, só veio a ocorrer com o DL n.º 408/79, de 25 de Setembro, que entrou em vigor a 1.1.1980.

Ou seja, o legislador do DL n.° 54/75, de 12 de Dezembro, não quis cominar como desobediência qualificada as situações de desrespeito pela ordem de apreensão decorrente da falta de seguro obrigatório de responsabilidade civil, realidade que então se não vivenciava, e que não determinava, por isso, a apreensão do veículo.

O elemento literal do preceito, que vimos ser decisivo para a solução da questão controvertida, sugere claramente que, para efeitos de qualificação do crime de desobediência, a apreensão (a que se refere − art. 22.º) diz respeito à apreensão sujeita a registo nos termos do art. 5.º do mesmo diploma.

Esse mesmo elemento, de alargado a todo o articulado do diploma não fornece indicação no sentido da aplicação genérica da referida cominação a casos que não os verificados no seu âmbito.

Âmbito que, como se viu, se reporta à apreensão, penhora e arresto, envolvendo a proibição de o veículo circular, como formas de garantir a realização do registo obrigatório, ou de satisfação de crédito hipotecário vencido e não pago ou de incumprimento das obrigações que originaram a reserva de propriedade.

E é a essas realidade específicas, bem distintas da falta de seguro obrigatório de responsabilidade civil na circulação automóvel, que se dirige, nada indicando em sentido diverso, designadamente quanto à sua aplicação em geral.

Como se sublinhou já, se o n.º 2 do art. 22.º prevê que “a circulação do veículo com infracção da proibição legal sujeita o depositário às sanções aplicáveis ao crime de desobediência qualificada“, o antecedente n.º 1 prescreve que “a apreensão, a penhora e o arresto envolvem a proibição de o veículo circular...” e os art.ºs 15.º, 16.º inserem-se num campo de previsão da possibilidade de apreensão do veículo e documentos nos casos de falta de registo quando obrigatório, de vencimento e não pagamento de crédito hipotecário ou de falta de cumprimento das obrigações legais que originaram a reserva de propriedade.

Se o legislador entendesse que a disciplina de tal diploma, que regula especificamente o registo da propriedade automóvel, era de natureza genérica ou que dela se revestiria a norma do art. 22.º, n.º 2, abrangendo todas as situações de apreensão de veículos, teria, dado o âmbito expressamente atribuído ao DL n.º 54/75, tê-lo-ia consagrado designadamente no Código da Estrada.

E ocasiões, como se viu, não lhe faltaram no domínio das diversas intervenções de que aquele Código foi sujeito. Ora, como lembra o Ministério Público, faria todo o sentido, se essa fosse a sua intenção, que o tivesse feito nesse diploma. Efectivamente, foi a partir do Código da Estrada de 1994 que o legislador optou por prever uma norma a determinar a apreensão com fundamento na falta de seguro, sendo certo, por outro lado, que também não o fez em nenhum dos diplomas que regularam especificamente o instituto do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel.

Mas, face aos n.ºs 1 e 2 do art. 150.º do Código da Estrada, a falta de seguro constitui contra-ordenação e o próprio DL n.º 291/07, que regulamenta actualmente o seguro obrigatório, determina a apreensão de veículo que circule sem esse seguro remetendo a apreensão para a al. f) do n.º l do art. 162.° do Código da Estrada, sem mais.

Por outro lado, a interpretação actualista do art. 22.º, por forma a abranger a desobediência resultante da utilização do veículo automóvel apreendido por falta de seguro obrigatório de responsabilidade civil, traduzir-se-ia numa interpretação extensiva da norma, e agravativa da responsabilidade penal, vedada por força do princípio da legalidade.

Com efeito, de acordo com o disposto no n.º 3 do art. 1º do Código Penal «não é permitido o recurso à analogia para qualificar um facto como crime, definir um estado de perigosidade ou determinar a pena ou medida de segurança que lhes corresponde».

É certo que aqui não estaria em causa a analogia, mas sim a interpretação extensiva, essa ainda compatível com o princípio da legalidade, uma vez que se traduz na reconstituição, em todo o seu alcance, da previsão ou incriminação da norma.

Mas, a interpretação extensiva tem igualmente limites. Para além do pensamento legislativo que o elemento histórico nos desvendou, e que não contemplava a sua aplicabilidade à apreensão por falta de seguro obrigatório, importa notar, com Simas Santos e Leal-Henriques (30), que «o limite máximo da interpretação da lei penal é o “sentido literal possível” dos termos linguísticos utilizados na redacção do texto legal. Em direito penal toda a interpretação que exceda este sentido literal possível (…) deixa de ser interpretação para se converter em criação do direito por via judicial ou doutrinal e, na medida em que sirva para fundamentar ou agravar a responsabilidade, viola o princípio da legalidade».

Finalmente, importa lembrar que legislador do DL n.º 54/75, no âmbito dessa intervenção, cominou a desobediência qualificada em homenagem aos bens jurídicos que protege e que entendeu exigirem essa incriminação agravada, assim lhes conferindo uma maior protecção penal. Ponderou seguramente a circunstância de estar em causa a autoridade pública e autonomia intencional do Estado manifestada através de uma decisão judicial, no âmbito de processo movido para salvaguarda dos direitos dos interessados, como sucede no âmbito da acção prevista no art. 15.º do DL n.º 54/75 (31).

Dentro da liberdade de conformação que o art. 348.º do Código Penal consagrou e a que já se fez referência, mas que não se equaciona necessariamente da mesma forma quando se trata de apreensão por falta de seguro obrigatório.

Pode, pois, concluir-se, que a apreensão do veículo por falta de seguro obrigatório de responsabilidade civil não se enquadra em nenhum dos actos regulados no DL n.º 54/75 e, não sendo uma “apreensão prevista neste diploma” (a ela se não referem os n.ºs 1 e 2 do art. 22.º).

E que não existe ilícito próprio no qual se subsuma a conduta do agente que não respeite a proibição de conduzir um veículo apreendido por falta de seguro obrigatório, nem existe norma legal que a qualifique como desobediência simples ou qualificada.

E, sendo assim, resta a subsunção directa dessa conduta à al. b) do n.º l do art. 348.º do Código Penal.

Sendo o art. 150.º, n.º 1, do actual Código da Estrada («anterior n.º 1 do art. 131.º»): «Os veículos a motor e seus reboques só podem transitar na via pública desde que seja efectuado, nos termos de legislação especial, seguro da responsabilidade civil que possa resultar da sua utilização») a fonte de legitimidade da autoridade de trânsito que, ao apreender o veículo por falta de seguro, «proíba» o depositário de o fazer transitar.

3.

Pelo exposto, acordam os juízes do Pleno das Secções Criminais do Supremo Tribunal de Justiça, em:

a) Fixar a seguinte jurisprudência:

“O depositário que faça transitar na via pública um veículo automóvel, apreendido por falta de seguro obrigatório, comete, verificados os respectivos elementos constitutivos, o crime de desobediência simples do artigo 348.º, n.º 1, alínea b), do Código Penal, e não o crime de desobediência qualificada do art. art. 22.º, n.ºs 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 54/75, de 12 de Fevereiro.

b) Revogar a decisão recorrida que deverá ser reformulada, face ao que aqui se decide, pelo que se reenvia o processo nos termos do n.º 2 do art. 445.º do CPP.

Sem custas.

Lisboa, 18 de Fevereiro de 2009

Simas Santos (relator)
Santos Carvalho
Henriques Gaspar
Rodrigues da Costa
Santos Monteiro
Arménio Sottomayor
Santos Cabral
Oliveira Mendes
Souto de Moura
Maia Costa
Pires da Graça
Raul Borges
Soares Ramos
Fernando Fróis
Carmona da Mota
Pereira Madeira
Noronha Nascimento (Presidente)

_______________________________________
(1) Relatados, respectivamente, por Neves Magalhães, Joaquim Braz, CJ XXVIII, 5, 225), Alves Fernandes e Borges Martins.
(2)Relatados, respectivamente, por Inácio Monteiro (relator), Belmiro Andrade e Alice Santos.
(3) Relatados, respectivamente, por Franco de Sá, Maria da Luz Batista e Filomena Lima.
(4)António João Latas (relator).
(5 )Teixeira Pinto (relator).
(6) Milheiro de Oliveira (relator).
(7)Teixeira Pinto (relator).
(8)Conceição Gomes (relatora).
(9)Fernando Ventura (relator).
(10)Correia da Costa (relator).
(11)Martins Simão (relator).
(12)Sendo Relator o Conselheiro Mendes Pinto
(13)DLs n.ºs 329-I/75, de 30 de Junho, 135-A/75, de 15 de Março e 377/76, de 19 de Maio.
(14) Rectificado pela DECL-RECT.96/2007.19.10.2007.PCM, DR.IS [202] de 19.10.2007. Revogado, a partir de 01.09.2008, o n.º 11 do art. 29º do DL n.º 522/85, de 31 de Dezembro, já revogado na íntegra, desde 20.10.2007, pelo DL n.º 34/2008.26.02.2008.MJ, DR.IS [40] de 26.02.2008. Alterado o art. 64º pelo DL n.º 153/2008.06.08.2008.MJ, DR.IS [151] de 06.08.2008
(15) “A conveniência da obrigatoriedade do seguro, tão frequentemente requerida, foi também encarada com particular cuidado. Todavia, surgiram razões de ordem económica insuperáveis, pois a imposição de tal obrigatoriedade exigiria o estudo e a reorganização de toda a indústria de seguros. Uma regulamentação parcial poderia, portanto, acarretar consequências dificilmente previsíveis. Estas considerações não impediram, contudo, que se mantivesse a obrigatoriedade já prescrita em certos casos, com um ou outro aperfeiçoamento que pareceu conveniente introduzir”.
(16) Dispunha-se no art. 57.º:
«1 – As pessoas ou entidades civilmente responsáveis pelos acidentes de trânsito poderão transferir esta responsabilidade para quaisquer companhias de seguros devidamente autorizadas.
2 – Nenhuma licença será passada para a exploração de transportes colectivos sem que o respectivo industrial apresente apólice de seguro ou caução idónea para a garantia da responsabilidade civil, resultante de acidente nos termos do artigo anterior (…)».
(17) Que pretendia fundamentalmente uma actualização das regras jurídicas aplicáveis ao trânsito nas vias públicas, sem proceder a uma alteração radical, ao mesmo tempo que realizava a “estratificação da paulatina evolução da regulamentação do trânsito, procurando conseguir a sua integração num quadro sistemático tanto quanto possível estável, harmónico e coerente e lançando, dessa forma, bases sólidas para a sua evolução futura”.
(18)Os DLs n.ºs 2/98, de 03.01, 265-A/2001, de 28 de Setembro, e 44/2005, de 23 de Fevereiro, alteraram o Código de 1994, mas sem expressão nesta matéria.
(19) Na redacção dada pelo DL n.º 44/2005, de 23 de Fevereiro.
(20) Como não resultava dos diplomas que os antecederam
(21) Lopes da Mota, Jornadas de Direito Criminal, Revisão do Código Penal, Vol. II, pág. 426.
(22) Cristina Líbano Monteiro, Comentário Conimbricense ao Código Penal, 2001, pág. 350
(23)Que assinala o objectivo de “proceder a uma profunda remodelação do actual sistema de registo, delineando-o em termos que bem se ajustem à natureza muito especial das coisas que constituem o seu objecto, particularmente caracterizadas pela limitadíssima duração e extrema mobilidade negocial inerentes aos veículos automóveis, e, simultaneamente, possibilitem o eventual funcionamento do sistema no regime de tratamento automático. (…) É com este duplo propósito que os diplomas agora publicados (…) refundem integralmente, nos seus múltiplos aspectos regulamentares, a disciplina em vigor, procurando limitar o recurso, como direito subsidiário, às normas aplicáveis ao registo predial, ao mínimo e apenas na medida compatível com a natureza especial dos veículos automóveis e das disposições legais contidas na legislação privativa do respectivo registo”.
(24) «Consigne-se que é das mais elementares regras de hermenêutica dever o intérprete esforçar-se por situar a norma interpretanda num quadro lógico com as demais disposições legais, nomeadamente as que respeitem a institutos e figuras afins ou paralelos», in Parecer da Procuradoria-Geral da República nº 92/81, de 8.10.1981, BMJ 315-33 a 40
(25)Políticas, sociais, económicas, morais, religiosas.
(26) O contexto da lei e os lugares paralelos (disposições reguladoras dos institutos afins).
(27)A história do direito (disposições reguladoras da mesma matéria em períodos anteriores), as fontes da lei (os textos que directa ou indirectamente serviram de modelo ao legislador) e os trabalhos preparatórios (as publicações onde se documenta a elaboração da norma).
(28) Muñoz Conde e Garcia Arán, Derecho Penal, Parte General, 3ª edição, Valência,
1998
(29)As referências ao seguro obrigatório feitas no Código da Estrada de 1954 já foram contextualizadas.
(30) Noções Elementares de Direito Penal, 3ª edição, Rei dos Livros, pág. 93, no prelo.
(31)Note-se, aliás, que o legislador o entendeu também, no processo civil, para as situações em que o agente viola uma providência cautelar decretada – art. 391.º do CPC.