Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
99/17.0YFLSB
Nº Convencional: SECÇÃO DE CONTENCIOSO
Relator: JOSÉ RAÍNHO
Descritores: RECURSO CONTENCIOSO
AJUDAS DE CUSTO
DESPESAS DE DESLOCAÇÃO
RECUSA DE PAGAMENTO
OMISSÃO DE PRONÚNCIA
FUNDAMENTAÇÃO
PRINCÍPIO DA IGUALDADE
INAMOVIBILIDADE DOS MAGISTRADOS JUDICIAIS
INDEPENDÊNCIA DOS TRIBUNAIS
Data do Acordão: 10/25/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO DE CONTENCIOSO
Decisão: JULGADO IMPROCEDENTE O RECURSO
Área Temática:
DIREITO CIVIL – LEIS, INTERPRETAÇÃO E APLICAÇÃO – RELAÇÕES JURÍDICAS / FACTOS JURÍDICOS / TEMPO E REPERCUSSÃO NAS RELAÇÕES JURÍDICAS.
DIREITO CONSTITUCIONAL – DIREITOS E DEVERES FUNDAMENTAIS – ORGANIZAÇÃO DO PODER POLITICA / TRIBUNAIS / ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA.
Doutrina:
- Francisco Ferreira de Almeida, Direito Administrativo, p. 129;
- Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, II, 3.ª Edição, p. 119;
- Rui Machete, Comentário à Revisão do Código do Procedimento Administrativo, 2016, p. 270;
- Vital Moreira e Gomes Canotilho, Constituição da República Portuguesa Anotada, II, 4.ª Edição, p. 586.
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 12.º, N.º 1 E 297.º, N.º 1;
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA (CRP): - ARTIGOS 13.º, 203.º, 216.º E 266.º, N.º 2;
ESTATUTO DOS MAGISTRADOS JUDICIAIS (EMJ): - ARTIGO 43 .º;
ESTATUTO DOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS E FISCAIS (ETAF): - ARTIGO 4.º, N.º 4, ALÍNEA C).
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

-DE 18-09- 2018, PROCESSO N.º 101/17.6YFLSB.
Sumário :
1. Estando em causa a definição jurídica do direito ao recebimento das ajudas de custo e despesas de deslocação, que concretiza o exercício de um poder administrativo, configura-se uma atividade materialmente administrativa, que se inclui no domínio de aplicação da alínea c) do n.º 4 do artigo 4.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, bem como das normas do Estatuto dos Magistrados Judiciais que regulam a impugnação das deliberações do Conselho Superior da Magistratura (CSM).

2. Não tendo o CSM decidido a reclamação do recorrente no prazo de três meses, presumindo-se assim indeferida para o efeito de interposição de recurso, e tendo o recorrente optado por enveredar pela jurisdição administrativa e fiscal contra o CSM e o Ministério da Justiça, tal não impedia que o CSM viesse a deliberar sobre a reclamação.

3. A deliberação em causa não dependia de qualquer decisão a produzir na ação administrativa (que visava a condenação no pagamento das ajudas de custo e despesas de deslocação), não funcionando assim esta decisão como causa prejudicial da deliberação a produzir no procedimento administrativo.

4. A deliberação do CSM pronunciou-se sobre a questão colocada na reclamação, tanto que a julgou improcedente, e indicou os fundamentos da decisão, ainda que de forma sucinta, pelo que não se verifica qualquer omissão de pronúncia, nem a pretendida insuficiência na respetiva fundamentação.

5. Não se configurando sucessão de leis no tempo, nem qualquer alteração legal de prazos, não faz sentido a alegação de que a deliberação do CSM violou os artigos 12.º, n.º 1, e 297.º, n.º 1 do Código Civil.

6. A compensação mediante ajudas de custo e pagamento de despesas de deslocação tem de ser conjugada com a circunstância decorrente da possibilidade de concurso para outro tribunal ou secção, apenas se justificando a atribuição de tal compensação enquanto o magistrado se encontrar vinculado a permanecer no local para onde concorreu, por não poder, atento o disposto artigo n.º43. do EMJ, ser transferido para outro tribunal ou secção.

7. Caso a enunciada vinculação não ocorra, deixa de se justificar a compensação da deslocalização supervenientemente conhecida, por o magistrado poder, se o pretender, ser movimentado para outro tribunal ou secção, termos em que, no caso, não se verificam as inconstitucionalidades apontadas, por referência aos artigos 13.º, 203.º, 216.º e 266.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa.

Decisão Texto Integral:

      Acordam no Supremo Tribunal de Justiça (Secção do Contencioso):

I - RELATÓRIO

AA, juiz de direito, recorre da deliberação do Plenário do Conselho Superior da Magistratura (CSM) de 17 de Outubro de 2017 que, avocando o poder de decisão deferido em primeira linha ao respetivo conselho permanente, julgou improcedente a reclamação hierárquica (contra decisão de 4 de Janeiro de 2017 do Juiz Secretário do CSM) que o Recorrente deduzira (conjuntamente com outras duas juízas) com vista à “prolação de decisão ordenando o processamento e pagamento dos boletins itinerários e de ajudas de custo remetidos pelos juízes colocados na Secção de Comércio, agora Juízo de Comércio de Aveiro, transitoriamente deslocalizados em Anadia”.

O CSM respondeu, concluindo pela improcedência do recurso.

Foram produzidas alegações, onde Recorrente e CSM mantiveram os respetivos pontos de vista.

O Ministério Público, pela pessoa do Exmo. Procurador-Geral Adjunto, emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.

                                                           +

Da respetiva petição recursiva extrai o Recorrente as seguintes conclusões:

1ª) A deliberação recorrida, ao recusar o pagamento das ajudas de custo e despesas de deslocação, aos juízes colocados em secções transitoriamente deslocalizadas, que como tal se mantenham, não respeita a lei processual, a lei civil, a lei administrativa, o Estatuto dos Magistrados Judiciais e a deliberação do CSM de 16•05•2015.

2ª) Para além disso, na interpretação seguida pela deliberação recorrida, a deliberação de 12.07.2016 e os arts. 26.° e 27.° do EMJ são inconstitucionais, por violação da tutela da confiança devida e dos princípios da igualdade, da inamovibilidade (ressalvando motivos disciplinares ou classificativos) e da independência dos juízes, garantidos nos artigos 13.°, 203.°, 216.° e 266.°, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa.

3ª) A deliberação recorrida foi proferida para além do prazo de três meses após a apresentação da reclamação, quando já operara o indeferimento tácito desta, ex vi do disposto no art. 167.°, n.º 3, do EMJ, e quando, por força dessa omissão, o Recorrente havia já lançado mão, nos Tribunais Administrativos e Fiscais, de acção de condenação, acompanhada de providência cautelar de regulação provisória para pagamento de quantia devida, pendentes no TAF de Aveiro com os nºs 1384/17.7BEPRT e 1386/17.3BEPRT, contra o Conselho Superior da Magistratura e o Ministério da Justiça, para as quais o CSM, quando proferiu a deliberação, havia já sido citado.

4ª) Em consequência, estava o CSM impedido de proferir decisão sobre a questão, pelo menos até ao trânsito em julgado das sentenças a proferir naqueles processos, pelo que, a deliberação em crise infringe as regras processuais previstas no artigo 167.°/3 e 4 do EMJ.

5ª) Tal como, infringe as regras atinentes à pendência de causa prejudicial (art. 38.° do Novo Código de Procedimento Administrativo), padecendo por isso de anulabilidade, nos termos do art. 163.°, n.º 1, do NCPA.

6ª) A deliberação recorrida obnubila e deturpa os fundamentos essenciais da reclamação, que não aprecia, não apreciando igualmente os factos relevantes que foram invocados para a sua procedência.

7ª) Em consequência disso, tal deliberação padece de nulidade, por omissão de pronúncia, e invalidade, por insuficiência de fundamentação, infringindo o disposto nos arts. 615.°/1, al. d), do CPC e 153.°/2 do NCPA.

8ª) Ao interpretar a deliberação de 12.07.2016 como tendo fixado o limite de 1 ano, ou seja, até Agosto de 2015, para o recebimento das ajudas de custo e despesas de deslocação, para os reclamantes, juízes colocados em secções deslocalizadas transitoriamente, que como tal se mantêm, a deliberação recorrida reduziu o prazo que para o efeito resultou da deliberação de 16.05.2015.

9ª) Pois esta deliberação (de 16.05.2015) não definiu prazo certo para o final da atribuição das ajudas de custo, tal como esse prazo não ficou definido na deliberação do CSM de 27.08.2015, na qual foi apreciado o Regulamento dos juízes colocados em quadro complementar, daí tendo resultado o reconhecimento e efectiva atribuição das ajudas de custo, pelo menos, durante todo o 2. ano de exercício de funções em secção transitoriamente deslocalizada.

10ª) Assim se explicando que o Recorrente, como as demais juízas do Juízo de Comércio de ..., que se mantém transitoriamente deslocalizado em ..., tenham recebido ajudas de custo e despesas de deslocação, no regime de dias sucessivos (correspondendo a 100% do seu valor), desde Novembro de 2015 (2. ano de exercício de funções em secção deslocalizada) até Outubro de 2016 (já em pleno 3. ano de exercício de funções).

11ª) Aquela redução de prazo da atribuição das ajudas de custo e despesas de deslocação por dias sucessivos viola os princípios, que resultam do art. 12.°, n.º 1, do Código Civil para todo o ordenamento jurídico, de não retroactividade das alterações normativas e de preservação dos efeitos já produzidos à data dessas modificações.

12ª) Tal como, não reconhecendo o direito ao recebimento das ajudas de custo e despesas de deslocação ao Recorrente até, pelo menos, ao final do 3. ano de exercício de funções em secção deslocalizado, a deliberação recorrida infringe as regras sobre alterações de prazos previstas no 297.° do CC, padecendo por isso de anulabilidade, nos termos do art.163.º, n.º 1, do NCPA.

13ª) Uma vez que os juízes do Juízo de Comércio de ..., deslocalizado transitoriamente para ..., jamais foram ouvidos sobre uma eventual pretensão de fazer cessar a atribuição de ajudas de custo, a deliberação de 12-07-2016, no sentido que lhe é atribuído na deliberação recorrida, é ineficaz em relação aos referidos juízes ou, na terminologia administrativa, um acto que enferma de nulidade, por total preterição do procedimento administrativo legalmente exigido para a sua eficácia (art. 161.°, n.º 2, al. l), do NCPA).

14ª) E como o acto nulo não produz quaisquer efeitos (art.162.º, n.º 1, do NCPA), não tem qualquer justificação que a entidade decisória se fundamente na referida deliberação de 2016 para, em relação aos reclamantes, fixar em 1 ano o período a que teriam direito ao recebimento das ajudas de custo e despesas de deslocação.

15ª) A deliberação recorrida ofende igualmente a lei administrativa uma vez que, sendo a deliberação de 16-05-2015 constitutiva de direitos em relação aos reclamantes, no que concerne à atribuição de ajudas de custo e despesas de deslocação, por dias sucessivos, a fixação posterior de um prazo (de 1 ano) entretanto já extinto (seja na deliberação de 2016, seja na deliberação recorrida) para essa atribuição, representa, claramente, revogação administrativa de acto constitutivo de direitos, nos termos do art. 165.°, n.º 1, do NCPA.

16ª) Por isso, a deliberação recorrida, ao atribuir efeitos retroactivos à revogação administrativa, é ilegal e anulável, por ofensa ao disposto nos arts.171.º/1 e 2 do NCPA.

17ª) Pois o período relativamente ao qual existe a referida proibição de retroactividade, quanto aos reclamantes, inclui o 3. ano de exercício de funções em secção deslocalizada, cujo movimento estava já encerrado quando a deliberação de 12-07-2016 (e, ainda mais, a deliberação recorrida) foi proferida.

18ª) A deliberação recorrida afronta ainda, e ostensivamente, o disposto nos arts. 26.° e 27.° do EMJ e o direito que estas normas concedem aos juízes de receberem de ajudas de custo e despesas de deslocação quando tenham de deslocar-se, em exercício de funções, para fora da área do Tribunal onde se encontrem sediados.

19ª) A interpretação mais consentânea com a letra e o espírito das referidas normas é aquela que lhe é atribuída no parecer elaborado pelo Ex.mo Sr. Dr. BB, subjacente à deliberação do CSM de 16-06-2015, segundo o qual, “são devidas ajudas de custo, por dias sucessivos aos magistrados colocados em determinada secção sempre que esta esteja temporariamente deslocalizada para fora da área do município onde se encontra legalmente sediada, independentemente da distância dessa deslocação, atento o disposto no artigo 27.°, n.º 1, do EMJ (...)”.

20ª) Todavia, mesmo assim não se entendendo, e ainda que fosse admissível, no que não se concede, restringir retroactivamente o direito a ajudas de custo ao 1. ano de exercício de funções em secção deslocalizada no regime de dias sucessivas, a recusa do pagamento de despesas de deslocação e de ajudas de custo, sequer no correspondente às percentagens (25% ou 50%) de acordo com o horário de exercício de funções efectivamente realizadas, sempre seria claramente contrária aos referidos arts. 26.º e 27.º do EMJ.

21ª) A deliberação recorrida infringe ainda a deliberação do CSM de 16-06-2015, pois esta teve em decisiva conta a quebra de expectativa criada relativamente ao município em que seria exercida a função reportada ao momento da colocação em secção deslocalizada.

22ª) A deliberação de 16-06-2015 visou tutelar a situação dos juízes que, como os reclamantes, concorreram em 2014 para tribunal de determinado município (..., no caso) e, por decisão posterior ao encerramento desse movimento, foram colocados, por via da deslocalização transitória, noutro município (in casu, ...), caso em que existe, notoriamente, e a própria deliberação em crise o reconhece, quebra das expectativas criadas.

23ª) Ao reportar a quebra de expectativas para os anos seguintes ao da colocação em secção deslocalizada, quando tal deslocalização se mantenha em termos transitórios, a deliberação recorrida extrapola injustificadamente a ratio da deliberação do CSM de 2015, deturpando a tutela que ela visou conferir, sob o pretexto de que era possível a movimentação de juízes no movimento subsequente ao da colocação.

24ª) O que faz de forma totalmente ilegítima, seja porque o juiz colocado em secção deslocalizada temporariamente que aí permaneça, e precisamente por se tratar de uma deslocalização temporária, não sabe se esta vai manter-se ou, ao invés, se vai cessar no ano seguinte.

25ª) Seja ainda porque as condições do Movimento de 2015 foram completamente díspares do movimento do ano anterior, visto que no Movimento judicial de 2014 os juízes foram colocados nos diversos tribunais simplesmente de acordo com os critérios gerais do seu mérito e antiguidade, ao passo que, no(s) ano(s) seguinte(s), a colocação já não foi livre, tendo os juízes anteriormente colocados preferência no Tribunal da sua colocação sobre os juízes que quisessem movimentar-se, independentemente do mérito e da antiguidade de uns e outros.

26ª) Seja, finalmente, porque implica consequências nefastas para os juízes colocados em secção deslocalizada com base num ónus (de terem de concorrer no movimento de 2015) que eles não poderiam conhecer e cumprir como tal, pois quer a deliberação de 12-07-2016, quer a deliberação recorrida, que os obrigava a tanto, são posteriores.

27ª) Por isso, também pela via da violação de deliberação anterior (de 16-06-2015), a deliberação recorrida afronta o disposto no art. 167.°, n.º 2 do NCPA, padecendo de anulabilidade.

28ª) A arguição da anulabilidade no âmbito deste recurso é tempestiva, seja quanto à deliberação recorrida, tomada há menos de 1 mês, seja quanto à deliberação de 12-07¬2016, por apenas agora ter sido praticado um acto administrativo (a deliberação recorrida) que confere à deliberação anterior, quanto aos juízes do Juízo de Comércio de Aveiro, a referida interpretação e sentido, desconformes à lei (art. 58.° do CPTA).

29ª) Na interpretação que lhe é dada na deliberação recorrida, a deliberação de 12-07-2016 e os arts. 26.° e 27.° do EMJ afrontam o Princípio da Boa Fé, na sua vertente de tutela da confiança, quebrando a confiança legitimamente criada sobre o quadro remuneratório que, à data desse encerramento do movimento de 2016, estava previsto para o ano judicial subsequente, e alterando desfavoravelmente, de forma retroactiva, o regime das ajudas de custo e subsídio de deslocação já estabelecido, no final desse movimento, para os juízes colocados no Juízo de Comércio de ....

30ª) Tal como infringem os princípios da igualdade, da inamovibilidade (ressalvando motivos disciplinares ou classificativos) e da independência, pois que extraem consequências desfavoráveis da opção, que se pretende totalmente livre (ressalvados os referidos motivos, que aqui não estão em causa), de os juízes colocados em secção deslocalizada não terem concorrido no movimento judicial de 2015.

31ª) Criando a posteriori um ónus - participar no Movimento de 2015 em condições altamente desvantajosas - que comprime injustificadamente tais princípios e direitos, e que os juízes colocados em secções transitoriamente deslocalizada não podiam conhecer como tal.

Termina dizendo que deve:

a) Ser anulada a deliberação impugnada;

b) Caso se entenda não estar prejudicada por tal anulação, ser proferida decisão que ordene ao Conselho Superior da Magistratura a realização do pagamento das ajudas de custo e despesas de deslocação requeridas nos boletins itinerários apresentados pelo Recorrente relativos aos meses de Novembro de 2016 até Agosto de 2017.

                                                           +

Corridos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

                                                           +

II - ÂMBITO DO RECURSO

Importa ter presentes as seguintes coordenadas:

- Há que conhecer das questões colocadas, e não das razões ou fundamentos que às questões subjazam;

- O presente procedimento não visa criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do ato recorrido.

                                                           +

São questões a conhecer:

- Invalidade da deliberação por efeito de anterior indeferimento tácito e ocorrência de causa prejudicial;

- Invalidade da deliberação por omissão de pronúncia e por fundamentação insuficiente;

- Invalidade da deliberação por violação dos art.s 12.º, n.º 1 e 279.º, n.º 1 do CCivil;

- Invalidade da deliberação por preterição do procedimento exigido para a sua eficácia;

- Invalidade da deliberação por revogação de anterior ato constitutivo de direitos;

- Direito às ajudas de custo e ao recebimento das despesas de deslocação;

- Inconstitucionalidade dos art.s 26.º, n.º 1 e 27.º, nº 1 do Estatuto dos Magistrados Judiciais, quando interpretados no sentido em que os interpretou a deliberação.

                                                           +

III - FUNDAMENTAÇÃO

De facto

1. Por deliberação de 17 de Outubro de 2017 do Plenário do CSM, foi julgada improcedente a reclamação hierárquica apresentada pelo Recorrente (e mais duas juízas) contra a decisão (de 4 de janeiro de 2017) do Juiz Secretário do CSM de devolução (não pagamento) dos boletins itinerários apresentados pelo Recorrente.

2. Mediante tal deliberação decidiu-se, em conclusão, que «a situação concreta de exercício de funções dos Reclamantes no, agora, Juízo de Comércio de ..., deslocalizado em ..., já não confere o direito ao recebimento das reclamadas ajudas de custo, por já não se verificar a situação de “quebra das expetativas” que as justificava.»

3. A deliberação apresenta a seguinte fundamentação:

«A questão a resolver na presente reclamação foi já por duas ocasiões objeto de apreciação genérica pelo Plenário do Conselho Superior da Magistratura, como de resto apontam os reclamantes e se faz alusão no despacho do Ex.mo Sr. Juiz Secretário do Conselho Superior da Magistratura. Em concreto tratam-se das deliberações de 16-06-2015 e de 12-07-2016.

A primeira, de 16-06-2015, por unanimidade, aprovou, “«(i) concordar com as conclusões gerais i., ii., v., vi., vii., viii. e ix. do referido parecer; (ii) quanto à conclusão geral iii. do referido parecer, concordar com a mesma, mas apenas quando a secção tenha sido temporariamente deslocalizada da sua sede legal por despacho ministerial, publicado após a abertura do Movimento Judicial pelo qual o magistrado judicial foi colocado ou destacado, e já não quando a deslocalização ocorreu em momento anterior, por via legal, uma vez em que tais situações não ocorre quebra da expetativa criada relativamente ao município em que seria exercida a função; (iii) quanto à conclusão iv., concordar com a mesma no que tange ao cálculo das ajudas de custo, por dias sucessivos, nos termos do n.º 4 do art. 8.º do DL n.º 106/98, de 24 de abril, desde o primeiro dia em que o juiz exerce funções na secção deslocalizada e relegar para o momento em que for discutido o direito a ajudas de custo pelos juízes que exercem funções nos quadros complementares quanto a saber se deve aplicar-se o limite de tempo previsto no art. 12.º, n.º 1, do DL n.º 106/98, de 24 de abril, ou se não há limite de tempo».

Já a segunda, também por unanimidade, deliberou “concordar com as conclusões genéricas do Parecer - Ajudas de Custo - Secções deslocalizadas, elaborado pelo Exmo. Senhor Adjunto do GA VPM, Dr. CC em 08.06.2016, que aqui se dá por integralmente reproduzido (…)”.

Assentes as deliberações adotadas pelo Plenário (que assumira as conclusões genéricas dos Pareceres) há, agora, que apreciar se assiste razão aos reclamantes. Sendo que está em causa, unicamente, a segunda dessas deliberações uma vez que, como referem os reclamantes, o pagamento das ajudas de custo nunca foi questionado ao abrigo da primeira das deliberações.

Dos factos provados podemos concluir que aquando quer da abertura quer do termo do prazo para apresentação de desistência ao movimento judicial de 2014, não havia despacho ministerial a deslocalizar a, então, secção de comércio de .... Tal despacho, de 14.8.2014. veio, no entanto, a ser publicado a 21 de Agosto desse ano.

Esta conjugação de circunstâncias permitia que, ao abrigo da deliberação de 16-06-2015, fosse reconhecido o direito às ajudas de custo dos agora reclamantes.

A segunda deliberação (a de 12-07-2016) não altera a posição assumida pelo Conselho Superior da Magistratura (a de que são devidas ajudas de custo “apenas quando a secção tenha sido temporariamente deslocalizada da sua sede legal por despacho ministerial, publicado após a abertura do Movimento Judicial pelo qual o magistrado judicial foi colocado ou destacado, e já não quando a deslocalização ocorreu em momento anterior, por via legal”). Efetivamente, as conclusões, genéricas, A, B e C reafirmam e complementam a anterior deliberação:

“A) O CSM, na deliberação tomada em 16-06-201,5 e no que respeita às ajudas de custo respeitantes a secções deslocalizadas sufragou o entendimento de que são devidas ajudas de custo aos juízes colocados em secções que tenham sido temporariamente deslocalizadas para fora da área do município onde legalmente deveria ser a sua sede, quando a secção tenha sido temporariamente deslocalizada da sua sede legal por despacho ministerial, publicado após a abertura do Movimento Judicial pelo qual o magistrado judicial foi colocado ou destacado;

B) Sem prejuízo do referido em A), já não serão devidas ajudas de custo quando a deslocalização ocorreu em momento anterior, por via legal, uma vez que em tais situações não ocorre, de acordo com o deliberado, quebra da expectativa criada relativamente ao município em que seria exercida a função;

C) Nos casos em que a deslocalização temporária se ache legalmente prevista ou em que seja operada por despacho até ao termo do prazo em que seja possível a alteração do requerimento para movimento judicial, ou seja, em que a deslocalização de instalações não constitui surpresa para os magistrados que concorram para obter lugar em tais secções (sabendo de antemão onde se irão localizar as instalações temporariamente objeto de deslocalização)”.

A novidade, no que agora nos importa apreciar, surge unicamente com a conclusão E:

“A compensação referida em D) apenas se justifica enquanto o magistrado judicial se encontre vinculado a permanecer no lugar para onde concorreu, não podendo, atento o disposto no artigo 43.°, n. ° 1, do EMJ, ser transferido para outro tribunal ou secção, sendo que, caso tal vinculação não ocorra (v.g. nos casos a que alude o n.o 5 do artigo 43.° do EM] ou caso tenha cessado o impedimento de movimentação (cfr. artigo 43.°, n. ° 1, do EM] então deixa de se justificar a compensação da deslocalização supervenientemente conhecida, por o magistrado judicial poder, se o pretender, ser movimentado para outro tribunal ou secção (ainda que tal, de facto, não venha a ocorrer, por circunstâncias que já se prendem com as regras do movimento e, não, com a impossibilidade legal de movimentação)”.

Defendem os reclamantes que esta limitação, temporal, não se lhes aplica pela circunstância de estarem abrangidos pela limitação legal prevista no artigo 43.°, n. 1, do Estatuto. Ou seja, a de que apenas podem ser transferidos a seu pedido quando decorridos três anos sobre a data da deliberação que os tenha nomeado para o cargo anterior.

Contudo, não é assim.

Logo no Aviso do Movimento Judicial do ano de 2015 constava o ponto 33 com o seguinte teor: “Ao presente movimento judicial não é aplicável o disposto no n.º 1, do artigo 43.°, do EMJ, por decorrência do disposto no n. ° 5, do mesmo preceito, tendo por referência que todos os lugares de efetivo dos Tribunais de Primeira Instância foram criados e providos ex novo no movimento judicial ordinário de 2014.”

Ou seja, desde pelo menos o Movimento Judicial de 2015 os Exmos Juízes colocados em secções ou Juízos deslocalizados podiam ser colocados noutros Tribunais. Ou, na expressão clara da deliberação de 16-06-2015, a partir do Movimento Judicial de 2015 já “(…) não ocorre quebra da expectativa criada relativamente ao município em que seria exercida a função”.

O que nos remete para a situação prevista na segunda dessas deliberações, a de 12.7.2016: “deixa de se justificar a compensação da deslocalização supervenientemente conhecida, por o magistrado judicial poder, se o pretender, ser movimentado para outro tribunal ou secção (ainda que tal, de facto, não venha a ocorrer, por circunstâncias que já se prendem com as regras do movimento e, não, com a impossibilidade legal de movimentação)”».

4. O Recorrente, após concorrer (movimento judicial ordinário de 2014), foi colocado, por deliberação de 8 de Julho de 2014, com efeitos a 1 de Setembro de 2014, na então ...ª Secção de Comércio de ... (atualmente Juízo de Comércio de ...).

5. Por despacho (n.º 10780/2014) de 21 de Agosto, a Ministra da Justiça determinou que “no Tribunal Judicial da comarca de ..., a ....ª Secção de Comércio da Instância Central, com sede em ..., é, transitoriamente, deslocalizada para Anadia”.

6. No âmbito do Gabinete de Apoio ao Vice-Presidente e Membros do CSM foi emitido, em 12 de Fevereiro de 2015, o parecer de fls. 1132 a 1150, nos termos do qual se concluiu, designadamente:

«iii. São devidas ajudas de custas aos magistrados colocados em determinada secção sempre que esta seja temporariamente deslocalizada para fora da área do município onde se encontra legalmente sediada, independentemente da distância dessa deslocação, atento o disposto no artigo 27.º, n.º 1, do EMJ, norma especial relativamente à prevista no n.º 1 do art. 1.º do DL n.º 106/98, de 24 de abril, e desde que verificados os requisitos do artigo 8.º deste diploma.

iv. As ajudas de custo referidas em “iii.” devem ser calculadas por dias sucessivos e sem limite de tempo, nos termos do n.º 4 do artigo 8.º do DL n.º 106/98, de 24 de abril, desde o primeiro dia em que o juiz exerce funções na secção deslocalizada até que a deslocalização termine ou cessem ali as suas funções.

v. Para além dessas ajudas de custo, é devido subsídio de transporte (…)»

7. O Plenário do Conselho Superior da Magistratura, em 16 de Junho de 2015, deliberou por unanimidade:

«(i) concordar com as conclusões gerais i., ii., v., vi., vii., viii. e ix. do referido parecer; (ii) quanto à conclusão geral iii. do referido parecer, concordar com a mesma, mas apenas quando a secção tenha sido temporariamente deslocalizada da sua sede legal por despacho ministerial, publicado após a abertura do Movimento Judicial pelo qual o magistrado judicial foi colocado ou destacado, e já não quando a deslocalização ocorreu em momento anterior, por via legal, uma vez em que tais situações não ocorre quebra da expetativa criada relativamente ao município em que seria exercida a função; (iii) quanto à conclusão iv., concordar com a mesma no que tange ao cálculo das ajudas de custo, por dias sucessivos, nos termos do n.º 4 do art. 8.º do DL n.º 106/98, de 24 de abril, desde o primeiro dia em que o juiz exerce funções na secção deslocalizada e relegar para o momento em que for discutido o direito a ajudas de custo pelos juízes que exercem funções nos quadros complementares quanto a saber se deve aplicar-se o limite de tempo previsto no art. 12.º, n.º 1, do DL n.º 106/98, de 24 de abril, ou se não há limite de tempo».

8. Também pelo mesmo Gabinete foi emitido, em 24 de Junho de 2016 - no âmbito do expediente apresentado pela juíza de direito DD e onde esta solicitava esclarecimentos acerca da deliberação tomada em 16 de Junho de 2015 - o parecer de fls. 1152 a 1159, nos termos do qual se concluiu, designadamente, que:

«A) O CSM, na deliberação tomada em 16-06-2015 e no que respeita às ajudas de custo respeitantes a secções deslocalizadas sufragou o entendimento de que são devidas ajudas de custo aos juízes colocados em secções que tenham sido temporariamente deslocalizadas para fora da área do município onde legalmente deveria ser  a sua sede, quando a secção tenha sido temporariamente deslocalizada da sua sede legal por despacho ministerial, publicado após a abertura do Movimento Judicial pelo qual o magistrado judicial foi colocado ou destacado;

B) Sem prejuízo do referido em A), já não serão devidas ajudas de custo quando a deslocalização ocorreu em momento anterior, por via legal, uma vez que em tais situações não ocorre, de acordo com o deliberado, quebra da expetativa criada relativamente ao município em que seria exercida a função;

D) Igualmente se inserem nos casos mencionados em A), as situações em que, por despacho tenham sido deslocalizadas instalações de secções, se tal sucedeu após a data até à qual era admissível a apresentação de requerimento de alteração ao Movimento Judicial que precedeu tal deslocalização.

E) Já nos casos em que a deslocalização temporária foi conhecida ulteriormente à abertura do Movimento Judicial, a mesma, podendo frustrar a confiança devida (em que a mencionada deslocalização de instalações constitui uma alteração das circunstâncias em que os mesmos basearam os pressupostos do seu requerimento para movimento) deverá ser compensada com a atribuição de ajudas de custo – conforme sucedeu, com os seguintes casos:

a) No Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, a ...ª secção de comércio da instância central com sede em ..., que foi transitoriamente deslocalizada para ...; (…)

E)(repetida) A compensação referida em D) apenas se justifica enquanto o magistrado judicial se encontre vinculado a permanecer no lugar para onde concorreu, não podendo, atento o disposto no artigo 43.º, n.º 1, o EMJ, ser transferido para outro tribunal ou secção, sendo que, caso tal vinculação não ocorra (v.g. nos casos a que alude o n.º 5 do art. 43.º do EMJ) ou caso tenha cessado o impedimento de movimentação (cfr. artigo 43.º, n.º 1, do EMJ) então deixa de se justificar a compensação da deslocalização supervenientemente conhecida, por o magistrado judicial poder, se o pretender, ser movimentado para outro tribunal ou secção (ainda que tal, de facto, não venha a ocorrer, por circunstâncias que já se prendem com as regras do movimento e, não, com a impossibilidade legal de movimentação;

F) No movimento judicial em curso (2016), caso sejam efetuados requerimentos/provimentos para lugares em secções deslocalizadas (já sendo conhecido, previamente ao requerimento para movimento, que as mesmas não se encontram instaladas na sede legalmente prevista – independentemente, parece-nos, da forma pela qual se efetive a deslocalização de instalações – por despacho ou por via legal) não se mostra que haja qualquer confiança a reintegrar, pelo que, não se afigura, nestes casos, ser devido o pagamento de quaisquer ajudas de custo».

9. Em 12 de Julho de 2016 o Plenário do CSM deliberou por unanimidade concordar com as conclusões genéricas deste último parecer.

10. Do aviso de abertura do movimento judicial ordinário de 2015, consta: “33. Ao presente movimento judicial não é aplicável o disposto no n.º 1 do art. 43.º do EMJ, por decorrência do disposto no n.º 5, do mesmo preceito, tendo por referência que todos os lugares de efetivo dos tribunais de primeira instância foram criados e providos ex novo no movimento judicial ordinário de 2014”.

De direito

1. Sustenta o Recorrente (conclusões 3ª, 4ª e 5ª) que a deliberação impugnada é anulável, nos termos do n.º 1 do art. 163.º do Código de Procedimento Administrativo (CPA), por isso que não podia ter sido produzida. Argumenta, para o efeito, com a circunstância de ter sido formado anteriormente um indeferimento tácito da reclamação que apresentara, bem como com a circunstância de ter entretanto recorrido aos tribunais administrativos e fiscais com vista à condenação no pagamento omitido e à regulação provisória para pagamento.

Mas, segundo cremos, carece de razão.

Afigura-se que, diferentemente do que sustenta o Recorrente, a situação subjacente à sua reclamação envolvia a definição jurídica do direito ao recebimento das ajudas de custo e despesas de deslocação, resolvendo-se assim a deliberação recorrida num verdadeiro ato administrativo, que exprime o exercício de um poder administrativo (logo, estamos perante atividade materialmente administrativa). Não se tratou, deste modo, de uma mera atuação administrativa (por oposição a ato administrativo) do CSM, situada no mesmo plano da manifestação do particular (o Recorrente) e simplesmente relacionada com a prática do ato material de processamento e pagamento de quantias previamente estabelecidas. Logo, estamos no domínio de aplicação da alínea c) do n.º 4 do art. 4.º do ETAF, bem como das normas do Estatuto dos Magistrados Judiciais (EMJ) que regulam para a impugnação das deliberações do CSM.

Não tendo o CSM decidido a reclamação do Recorrente no prazo de três meses (presumindo-se assim, nos termos do n.º 3 do art. 167.º do EMJ, indeferida para o efeito do reclamante poder interpor o recurso facultado pelos art.s 168.º e seguintes), e tendo o Recorrente optado por enveredar pela jurisdição administrativa e fiscal contra o CSM e o Ministério da Justiça (contra quem pediu a condenação no pagamento das prestações em causa, mas sabendo-se que, no que toca ao CSM, o tribunal administrativo se veio a declarar incompetente em razão da matéria), tal não impedia que o CSM viesse a deliberar sobre a reclamação. Pelo contrário, tinha até que deliberar, visto que o Recorrente não impugnou o presumido ato de indeferimento da reclamação. É o que resulta do n.º 4 do art. 167.º do EMJ. De observar, a propósito, que o EMJ constitui lei especial, pelo que não vale aqui o regime geral que decorre do CPA (art.s 129.º e 130.º), e que é no sentido da inexistência ou inconsequência de atos tácitos de indeferimento.

De outro lado, a deliberação em causa não dependia de qualquer decisão a produzir na ação administrativa (que, repete-se, visava a condenação no pagamento das ajudas de custo e despesas de deslocação), não funcionando assim esta decisão como causa prejudicial da deliberação a produzir no procedimento administrativo. Embora o entorno factual subjacente à ação administrativa e ao procedimento administrativo fosse coincidente e estivesse balizado pela mesma pretensão (direito ao recebimento das referidas prestações), tal não representa a existência de qualquer dependência entre um objeto e outro, mas sim a existência de objetos parcialmente cumulativos. Na verdade, só pode falar-se em questão prejudicial quando esta funcione como condicionante da decisão a tomar, e não é o caso.

O que significa que, contrariamente ao pretendido pelo Recorrente, o art. 38.º do CPA não tem aqui qualquer aplicação.

Consequentemente, nada impedindo substantivamente ou processualmente a produção da deliberação em causa, segue-se que esta não é inválida (anulável) pelo simples facto de ter sido produzida.

Improcede pois o recurso nesta parte.

2. Mais sustenta o Recorrente que a deliberação impugnanda é nula por omissão de pronúncia, por isso que deixou de apreciar os argumentos aduzidos na reclamação sobre que incidiu. Diz ainda que a deliberação apresenta fundamentação insuficiente quanto ao restante, o que implica também a sua invalidade. Conclui dizendo que foram infringidos os art.s 615.º, n.º 1, alínea d) do CPCivil e 153.º, n.º 2 do CPA.

Também aqui carece de razão.

A questão que foi colocada ao CSM por via da reclamação apresentada pelo Recorrente foi a do direito ao recebimento das ajudas de custo. Esta a questão a decidir.

O mais que o Recorrente aduziu foram argumentos ou razões, e sobre estes não tinha a deliberação que se pronunciar especificamente.

Ora, a deliberação impugnanda pronunciou-se sobre a questão colocada na reclamação, tanto que a julgou improcedente. E indicou claramente os fundamentos da decisão, ainda que de forma sucinta (como, aliás, se impunha, atento o disposto no n.º 1 do art. 153.º do CPA). Efetivamente, como se retira do facto acima descrito sob o ponto 3, a deliberação impugnanda justificou a denegação da pretensão do Recorrente com fundamento no teor da deliberação de 12 de Julho de 2016, deliberação esta que interpretara o quadro normativo subjacente ao direito a ajudas de custo em caso de deslocalização no sentido de que a compensação apenas será devida enquanto o magistrado judicial se encontrar vinculado a permanecer no lugar para onde concorreu. Já quando essa vinculação não ocorra - por exemplo, na hipótese a que alude o n.º 5 do art. 43.º do EMJ - deixaria de haver direito à compensação (trata-se aqui, acrescenta a deliberação, de uma deslocalização supervenientemente conhecida, por o magistrado judicial poder, se o pretender, ser movimentado para outro tribunal ou secção - ainda que tal, de facto, não venha a ocorrer, por circunstâncias que já se prendem com as regras do movimento e, não, com a impossibilidade legal de movimentação).

De igual forma, a deliberação impugnanda justificou a denegação da pretensão do Recorrente com fundamento no teor da deliberação de 16 de Junho de 2015, aí onde esta também decidiu que não há lugar a ajudas de custo quando a deslocalização se verifica em momento anterior à abertura, por via legal, do movimento judicial, uma vez em que em tal situação, mais se expendeu nesta deliberação, não ocorre quebra da expetativa criada relativamente ao município em que seria exercida a função.

E assim, como, nos termos do Aviso do Movimento Judicial do ano de 2015, o Recorrente não estava vinculado a permanecer no lugar para onde concorreu, concluiu a deliberação impugnanda pela inexistência de direito às pretendidas ajudas de custo.

Como se vê, a deliberação expõe as razões por que decidiu como decidiu. Logo, está devidamente fundamentada. Poder-se-á eventualmente discordar da leitura que a deliberação impugnanda fez do direito aplicável; não pode é dizer-se que a deliberação omitiu o pronunciamento devido e que não indicou com suficiência as razões por que decidiu como decidiu.

Improcedem deste modo as conclusões 6ª e 7ª.

3. Mais diz o recorrente que a deliberação impugnanda violou os art.s 12.º, n.º 1 e 297.º, n.º 1 do CCivil, sendo por isso inválida. Reporta-se ainda ao direito a receber ajudas de custo e despesas de deslocação pelo “prazo” de 3 anos.

Mas é manifesta a sua falta de razão.

Não estamos perante a sucessão de leis no tempo nem perante a alteração legal de prazos, e daqui que não faça sentido a chamada à colação de tais normas.

E, de outro lado (e como mostra saber o Recorrente), o CSM nada decidiu, aquando da deliberação de 16 de Junho de 2015, sobre o tempo durante o qual haveria direito a ajudas de custo (pelo contrário, relegou para momento ulterior a correspondente decisão), assunto que veio a ser decidido pela deliberação de 12 de Julho de 2016, acolhida pela deliberação impugnanda. E veio a ser decidido no sentido acima transcrito, ou seja, no sentido de que o direito insubsiste quando, como se entendeu ser o caso do Recorrente, cessa a vinculação à permanência no tribunal deslocalizado. Não se entende assim, no contexto em que nos movemos aqui, a menção que o Recorrente faz aos “prazos” de 1 e de 3 anos, pois que nenhuma das deliberações envolvidas definiu que o limite temporal para o pagamento de ajudas de custo e despesas de deslocação era de 1 ano ou que era de 3 anos.

Improcedem, consequentemente, as conclusões 8ª, 9ª, 10ª, 11ª e 12ª.

4. De igual forma improcedem as conclusões 13ª e 14ª.

Diz o Recorrente, a propósito destas conclusões, que jamais foi ouvido sobre a possibilidade de cessação das ajudas de custo e despesas de deslocação previamente à deliberação de 12 de Julho de 2016, e daqui que tal deliberação lhe é ineficaz. Mais diz, citando o art. 161.º, n.º 2, alínea l) do CPA, que se trata de um ato que enferma de nulidade, pois foi praticado relativamente à sua pessoa com “total preterição do procedimento administrativo legalmente exigido para a sua eficácia”.

O Recorrente não leva em linha de conta, porém, que a deliberação anulanda foi suscitada pela reclamação que apresentou (contra decisão do Secretário do CSM que foi alicerçada precisamente no parecer sufragado pela deliberação de 12 de Julho de 2016), e nesta reclamação, pese embora se reportar bastamente à dita deliberação de 12 de Julho de 2016, o Recorrente não invocou a nulidade e a ineficácia de que agora vem falar. E daqui que também a deliberação anulanda não se pronunciou sobre essa matéria e, como assim, não foi chamada a afastar a dita deliberação. E, segundo cremos, é quanto basta para a improcedência da questão em causa, na certeza também de que não identificamos no caso a presença de qualquer causa de invalidade (v. art. 95.º, n.º 3 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, passível de aplicação ex vi do art. 178.º do EMJ).

Mas, ex abundanti, dir-se-á que inexiste a pretensa ineficácia e a pretensa nulidade. É certo que o Recorrente não foi ouvido, mas também não tinha que ser ouvido, visto que a referida deliberação de 12 de Julho de 2016 não se resolve num verdadeiro ato administrativo. Sobre este assunto limitamo-nos a extratar aqui o que já houve oportunidade de ser exposto no acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de 18 de Setembro de 2018 (processo n.º 101/17.6YFLSB, relator Olindo Geraldes), que incidiu sobre situação igual à presente (estavam em causa as mesmas deliberações, a mesma precisa reclamação e os mesmos interesses de duas juízas colocadas também no Juízo de Comércio de ...):

«A deliberação impugnada, como resulta do seu teor, assenta a sua fundamentação nas deliberações do CSM de 16 de junho de 2015 e 12 de julho de 2016, inteiramente compatíveis entre si, atentando ao seu conteúdo, e limitou-se a aprovar, com algumas reservas, os pareceres jurídicos elaborados pelos serviços do CSM.

Tais deliberações, que aprovaram os pareceres jurídicos, não tipificam um ato ou regulamento administrativo. Com efeito, as deliberações não visaram a produção de efeitos jurídicos externos para uma situação individual e concreta (art. 148.º do CPA), mas o estabelecimento de orientações gerais e abstratas para a prática dos correspondentes atos administrativos. Por outro lado, não visando produzir efeitos externos, as deliberações não são mais do que meros regulamentos internos (RUI MACHETE, Comentário à Revisão do Código do Procedimento Administrativo, 2016, pág. 270), não lhe sendo aplicável a disciplina própria do regulamento administrativo (art. 135.º e segs. do CPA).

Dada a natureza jurídica de tais deliberações não se lhe podem atribuir vícios próprios quer do ato administrativo quer, também, do regulamento administrativo (…).»

5. O que se afirma nas conclusões 15ª, 16ª, 17ª e 27ª, com reporte aos art.s 165.º, n.º 1, 167.º, n.º 2 e 171.º do CPA, também está votado à improcedência.

Desde logo porque, talqualmente sucede com a deliberação de 12 de Julho de 2016, a deliberação de 16 de Junho de 2015 não se resolve num verdadeiro ato administrativo, antes traduz-se no estabelecimento de orientações gerais e abstratas para a prática dos correspondentes atos administrativos. Daqui que a mesma não vale como ato constitutivo de direitos relativamente ao Recorrente. E, sendo assim, não pode dizer-se que a deliberação anulanda, que acolheu a dita deliberação, atentou contra um ato constitutivo de direitos.

Depois porque tal deliberação, como sobredito, nada definiu acerca do tempo durante o qual haveria direito a ajudas de custo, pelo contrário, relegou para momento ulterior a correspondente decisão. Logo, não se logra compreender, à luz dessa deliberação, a construção do Recorrente em torno de uns supostos “prazos” de 1 e 3 anos.

Por fim porque a deliberação recorrida não procedeu a qualquer revogação da deliberação de 16 de Junho de 2015, antes a acolheu na sua plenitude e se fundou nela, embora conjugadamente com a deliberação de 12 de Julho de 2016, que a completou. O que significa que resulta improcedente a alusão que o Recorrente faz a uma pretensa fixação de efeitos retroativos por parte da deliberação recorrida.

6. Nas conclusões 1ª, 2ª e 18ª a 31ª o Recorrente defende que a boa interpretação do quadro jurídico aplicável ao caso, com destaque para os art.s 26.º, n.º 1 e 27.º, n.º 1 do EMJ, leva a concluir que tem direito às ajudas de custo e ao pagamento das despesas de deslocação em questão. Nesta medida, a deliberação recorrida teria incorrido no vício de violação de lei sendo, assim, anulável. Mais defende que, interpretadas do modo como as interpretou a deliberação recorrida, são inconstitucionais as ditas normas.

Visto nomeadamente o disposto no art. 3.º, n.º 1 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, nada impede que se conheça da apontada violação de lei (vício que consiste na discrepância entre o conteúdo ou o objeto do ato e as normas jurídicas que lhe são aplicáveis, e é desta hipótese que se trata), na certeza de que estamos aqui perante uma atuação administrativa desenvolvida no âmbito do exercício de poderes vinculados (o conteúdo do ato resulta diretamente da lei, que apenas admite certo resultado), e não no âmbito do exercício de poderes discricionários (estes traduzem-se na possibilidade de escolha do conteúdo do ato, ajustando-o aos contornos da situação concreta).

Cremos que o Recorrente carece de razão.

Também aqui vale a fundamentação constante do supra referido acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de 18 de Setembro de 2018. Acórdão que, repete-se, incidiu sobre situação igual à presente (estavam em causa a mesma deliberação anulanda e a mesma precisa reclamação, e as interessadas e recorrentes eram duas juízas colocadas também no tribunal que foi deslocalizado para ..., a Secção de Comércio de ...). Aduziu-se o seguinte nesse acórdão:

«Neste recurso da deliberação do CSM, discute-se a problemática do abono das ajudas de custo a juízes, por serviço prestado em tribunal, transitoriamente, deslocalizado da sede da comarca, na sequência da organização judiciária aprovada pela Lei da Organização do Sistema Judiciário (LOSJ) – Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto.

Especificamente, no art. 27.º, n.º 1, da Lei n.º 21/85, de 30 de julho, que aprovou o Estatuto dos Magistrados Judiciais (EMJ), regula-se que “são devidas ajudas de custo sempre que um magistrado se desloque em serviço para fora da comarca onde se encontre sediado o respetivo tribunal ou serviço”.

Com a nova organização judiciária, esta norma ficou desajustada, nomeadamente quanto ao âmbito territorial da comarca, agora com uma extensão bastante mais alargada, identificada, em geral, com a área do distrito, enquanto antes correspondia, genericamente, à do respetivo município. Contudo, o direito específico ao recebimento do abono das ajudas de custo pelos juízes continua a manter-se sem qualquer modificação.

A questão que emerge dos presentes autos prende-se, sobretudo, com a existência, ou não, de limite temporal ao direito de abono das ajudas de custo, por efeito da deslocalização transitória do tribunal.

O direito ao abono de ajudas de custo foi reconhecido, em virtude da deslocalização do tribunal ter sido posterior ao concurso de preenchimento do respetivo lugar, afetando a expetativa legítima dos concorrentes e originando, em abstrato, acréscimo de despesas provocadas pela deslocação, suscetíveis de justificar o abono das ajudas de custo.

O mesmo direito, porém, já não foi reconhecido, quando se considerou não haver “quebra das expetativas”, nomeadamente a partir do preenchimento do lugar por efeito do movimento judicial ordinário de 2015, ao qual, conforme o respetivo aviso, não era aplicável a limitação do disposto no n.º 1 do art. 43.º do EMJ, por decorrência do disposto no n.º 5, do mesmo preceito, tendo por referência que todos os lugares de efetivo dos tribunais de primeira instância foram criados e providos ex novo no movimento judicial ordinário de 2014.

É contra este último entendimento que as Recorrentes se manifestam, considerando genericamente que, estando o tribunal deslocalizado, como ainda sucede, não existe limitação do direito ao abono das ajudas de custo.

Mas, as Recorrentes não têm a razão do seu lado.

Na verdade, as Recorrentes, podendo ter ficado surpreendidas pela deslocalização do tribunal já depois da deliberação do movimento judicial ordinário de 2014, que as colocara naquele tribunal, podiam depois ter concorrido a outro lugar, nomeadamente no movimento judicial ordinário de 2015, porquanto a limitação decorrente do n.º 1 do art. 43.º do EMJ, que as podia atingir, não era aplicável, conforme constava, expressamente, do respetivo aviso de abertura. Não estavam, por isso, obrigadas a permanecer no mesmo lugar e, dessa forma, continuar a suportar os efeitos imprevistos decorrentes da deslocalização do tribunal.

As Recorrentes, ao não concorrerem, quando podiam, nomeadamente no movimento judicial ordinário de 2015, para um outro lugar, sem os mesmos inconvenientes, acabaram, tacitamente, por aceitar prestar funções no tribunal deslocalizado. As condições dos movimentos, em abstrato, podem considerar-se semelhantes, impossibilitando a afirmação de que um certo movimento pode ser mais favorável ou desfavorável do que outro.

As Recorrentes, ao manterem-se no mesmo lugar, quando podiam ter concorrido a outro lugar, aceitaram o exercício de funções no tribunal deslocalizado, aí estabelecendo o seu domicílio necessário. Não havendo deslocação do domicílio necessário, não se justifica a atribuição do abono das ajudas de custas, pelo serviço prestado em tribunal deslocalizado, levando em conta as normas dos arts. 1.º e 2.º, alínea a), do DL n.º 106/98, de 24 de abril, aplicáveis subsidiariamente por efeito do disposto no art. 32.º do EMJ. Na verdade, a prestação do exercício da função no domicílio necessário, não correspondendo a acréscimo de despesas, designadamente por inexistência de deslocação, não pode fundamentar o direito ao recebimento do abono de ajudas de custo (a Recorrente EE, aliás, sempre permaneceu em ...).

Nestas circunstâncias, a deliberação objeto de impugnação não padece de ilegalidade, nomeadamente por ofensa ao art. 27.º, n.º 1, do EMJ ou a qualquer norma subsidiária do DL n.º 106/98, de 24 de abril.»

Reiteramos este ponto de vista.

O n.º 1 do art. 27.º do EMJ não pode ser interpretado, isto no contexto da deslocalização de tribunais, como outorgando um direito permanente a ajudas de custo. Pelo contrário, dentro do espírito do regime legal de abono de ajudas de custo e despesas de transporte (Decreto-Lei n.º 106/98 e, anteriormente, Decreto-Lei n.º 519-M/79), tal abono deve ser visto como tendo natureza transitória.

A questão é saber até quando subsiste um tal direito transitório.

Considerando a especificidade do exercício de funções dos magistrados judiciais, não seria aceitável que se lhes aplicasse, sem mais, o limite temporal do art. 12.º do Decreto-Lei n.º 106/98. Mas já nos parece juridicamente sustentada a deliberação impugnanda (com reporte para o parecer de 24 de Junho de 2016, que a deliberação sufragou), quando entende que a compensação mediante ajudas de custo e pagamento de despesas de deslocação tem de ser conjugada com a circunstância decorrente da possibilidade de concurso para outro tribunal, apenas se justificando a atribuição de tal compensação enquanto o magistrado se encontrar vinculado a permanecer no local para onde concorreu (por não poder, atento o disposto no art. 43.º do EMJ, ser transferido para outro tribunal ou secção). Caso tal vinculação não ocorra - o que sucede na situação a que alude o n.º 5 do art. 43.º - deixa de se justificar a compensação da deslocalização supervenientemente conhecida, por o magistrado poder, se o pretender, ser movimentado para outro tribunal ou secção (ainda que, de facto, tal não venha a ocorrer, por circunstâncias que já se prendem com as regras do movimento, e não com a impossibilidade legal de movimentação).

O Recorrente, ao não concorrer para um outro lugar sem os mesmos inconvenientes, quando podia, nomeadamente no movimento judicial ordinário de 2015 - recorde-se que do aviso de abertura do movimento judicial ordinário de 2015 constava que não era aplicável o disposto no n.º 1 do art. 43.º do EMJ, por decorrência do disposto no n.º 5, tendo por referência que todos os lugares de efetivo dos tribunais de primeira instância haviam sido criados e providos ex novo no movimento judicial ordinário de 2014 -, acabou tacitamente por aceitar prestar funções no tribunal deslocalizado. As condições dos movimentos, em abstrato, podem considerar-se semelhantes, impossibilitando a afirmação de que um certo movimento pode ser mais favorável ou desfavorável do que outro. Assim, é adequado concluir que o Recorrente, ao manter-se no mesmo lugar quando podia ter concorrido a outro lugar, aceitou o exercício de funções no tribunal deslocalizado, aí estabelecendo transitoriamente o seu domicílio necessário, o que lhe retira direito ao recebimento das compensações em causa.

Vistas as coisas deste modo, como se afigura que devem ser vistas, não se pode argumentar, como faz o Recorrente, com a violação do princípio da boa-fé, na sua vertente da tutela da confiança (confiança criada sobre o quadro remuneratório). Parafraseando Freitas do Amaral (Curso de Direito Administrativo, II, 3ª ed., p. 119) e Francisco Ferreira de Almeida (Direito Administrativo, p. 129) podemos dizer que a proteção da confiança não é um princípio absoluto, antes depende da verificação simultânea do pressuposto da boa-fé subjetiva do lesado, da presença de elementos objetivos que tornem plausível ou justificada a confiança, do investimento de confiança (comportamento com base na crença entretanto consolidada) e na imputação da situação de confiança (que implica a existência de um autor a quem se fique a dever a expetativa do tutelado). Pelo que fica dito, não nos parece que estes pressupostos estejam aqui inteiramente cumpridos.

Argumenta ainda o Recorrente com os princípios da igualdade, da inamovibilidade e da independência dos juízes, dizendo que foram postos em causa.

Porém, também aqui se afigura que argumenta sem razão.

No que respeita à temática da inamovibilidade, importa dizer que o que esta tem em vista (e nisso se esgota) é impedir a mudança da situação dos juízes fora dos casos previstos na lei, embora também não lhe seja estranho o propósito de pôr os juízes a coberto da instabilidade e da dependência por via de atentados à sua segurança profissional ou pessoal (art.s 216.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa e 6.º do EMJ; cfr. Vital Moreira e Gomes Canotilho, Constituição da República Portuguesa Anotada, II, 4ª ed., p. 586). Não nos parece, todavia, que o que o Recorrente aduz em ordem a concluir pela violação da regra da inamovibilidade - que devia estar inteiramente livre na opção de concorrer nos diversos movimentos judiciais ou manter-se no tribunal da sua colocação – se insira nesse campo, e daqui que não vemos que a regra da inamovibilidade esteja a ser postergada.

Tão pouco encontramos que o princípio da independência esteja em causa. A independência dos juízes traduz-se legalmente (art. 4.º do EMJ) na não sujeição a ordens ou instruções (mas o princípio também parece dever ser correlacionado com tudo aquilo que seja suscetível de causar instabilidade e dependência, por contender com a segurança profissional ou pessoal dos juízes), e não é desse tipo de contingências que aqui estamos a tratar. Não pode ver-se um atentado à independência dos juízes em tudo aquilo que de alguma forma contenda com os seus interesses pecuniários no confronto da Administração Pública.

O princípio da igualdade postula - e para além de um tratamento diferenciado para situações distintas - um tratamento igual para situações iguais. No caso, a Administração (o CSM) adotou para o Recorrente o mesmo tratamento que foi adotado para outros juízes nas mesmas condições, de modo que não é identificável qualquer desvio decisório em termos de estatuto de igualdade.

Consequentemente, não se verificam as inconstitucionalidades que o Recorrente aponta, por referência aos art.s 13.º, 203.º, 216.º e 266.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa.

Do exposto resulta que a deliberação recorrida não enferma das invalidades que o Recorrente lhe atribui, pelo que não pode ser anulada.

IV. DECISÃO

Pelo exposto acordam os juízes neste Supremo Tribunal de Justiça em julgar improcedente o recurso.

Regime de custas:

O Recorrente é condenado nas custas do recurso. Taxa de justiça: 6 Uc’s.

Fixa-se à causa o valor de € 30.000,01.

                                                           ++

Lisboa, 25 de Outubro de 2018

José Raínho (Relator)

Roque Nogueira

Abrantes Geraldes

Raul Borges

Ribeiro Cardoso

Isabel São Marcos

Olindo Geraldes