Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
070681
Nº Convencional: JSTJ00002132
Relator: LIMA CLUNY
Descritores: SOCIEDADE POR QUOTAS
MERA DENOMINAÇÃO PARTICULAR
PACTO SOCIAL
UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Nº do Documento: SJ198503130706812
Data do Acordão: 03/13/1985
Votação: UNANIMIDADE
Referência de Publicação: DR IS 1985/05/14, PÁG. 1312 A 1315 - BMJ Nº 345 ANO 1985 PÁG. 149
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PARA O PLENO
Decisão: TIRADO ASSENTO.
Indicações Eventuais: ASSENTO DO STJ.
Área Temática: DIR COM - SOC COMERCIAIS.
Legislação Nacional: LSQ ARTIGO 29 PAR1 PAR2 ARTIGO 30.
CCIV66 ARTIGO 9 N2.
CPC67 ARTIGO 763 ARTIGO 765.
Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃO STJ DE 1979/12/18 IN BMJ N292 PAG401.
ACÓRDÃO STJ DE 1981/05/07 IN BMJ N307 PAG287.
ACÓRDÃO STJ DE 1982/06/17 IN BMJ N318 PAG457.
Sumário :
"A regra de maioria contida na primeira parte do artigo 30 da Lei das Sociedades por Quotas e de natureza supletiva, so funcionando quando, no pacto social das sociedades por quotas com mera denominação particular, não exista estipulação que a contrarie, pois, havendo-a, o ai estipulado prevalece sobre aquela, mesmo em relação a terceiros".
Decisão Texto Integral:
Acordam em pleno no Supremo Tribunal de Justiça:

A "Companhia A..., E.P." recorreu para o tribunal pleno, ao abrigo do disposto nos artigos 763 e 765 do Codigo de Processo Civil, do acordão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, em 17 de Junho de 1982, no recurso de revista com o n. 70033, em que ela figurou como recorrente, tendo figurado como recorrida a "B..., Lda.".
Segundo a recorrente, existe oposição, quanto a mesma questão fundamental de direito, entre o mencionado aresto e o acordão de 18 de Dezembro de 1979, proferido pelo mesmo Supremo Tribunal e transitado em julgado, este publicado no Boletim do Ministerio da Justiça, n. 292, paginas 401-404.
Admitido o recurso pelo despacho fotocopiado a folhas 7 e tendo-se seguido a fase preliminar, veio a ser proferido o acordão de folhas 15-16 verso que decidiu o prosseguimento do recurso por haverem sido tidos por verificados os pressupostos apontados no n. 1 do artigo 763 do ja referido diploma.
Posto o que, ao abrigo do dispositivo do n. 2 do respectivo artigo 766, a recorrente ofereceu alegação em que formulou as conclusões que seguem:
1 - O acordão recorrido acha-se em oposição sobre a mesma questão fundamental de direito com o acordão de 18 de Dezembro de 1979 (Boletim, n. 292, paginas 401-404).
2 - Deve prevalecer a doutrina do acordão de 1979, por ser mais consentanea com a actual pratica comercial.
3 - O artigo 30 da Lei das Sociedades por Quotas deve ser entendido em correlação com a natureza imperativa do artigo 29, paragrafo 2, da mesma Lei.
4 - O artigo 29, paragrafo 2, da Lei das Sociedades por Quotas tem natureza claramente imperativa.
5 - O artigo 30 deve ser interpretado de harmonia com a solução estabelecida para as sociedades com firma.
6 - A regra de maioria deve sempre valer nas relações da sociedade com terceiros.
7 - A disposição em contrario, prevista nos estatutos, so deve ser relevante nas relações juridicas entre socios.
8 - Deve, por isso, ser tirado Assento no seguinte sentido
- "Nas sociedades comerciais por quotas com denominação social em que haja igual numero de socios-gerentes, cada um detentor de igual fracção do capital, deve ter-se por obrigada a sociedade perante terceiros desde que a respectiva obrigação esteja subscrita apenas por um socio-gerente ou por um dos grupos igualitarios de socios-gerentes, independentemente do disposto no respectivo pacto social".
9 - O acordão recorrido violou o artigo 30 da Lei das Sociedades por Quotas.
Em contra-alegação, a recorrida B..., Lda. concluiu no sentido de que:
A) O artigo 30 da Lei das Sociedades por Quotas tem caracter supletivo.
B) Sobre a forma de a sociedade com denominação particular se obrigar perante terceiros e decidindo da validade dos respectivos actos rege, em primeiro lugar, o disposto nos estatutos e, se estes nada disserem, vale o estabelecido no artigo 30 da Lei das Sociedades por Quotas.
C) Nas sociedades com denominação particular com dois gerentes e se os estatutos nada disserem, a forma de elas se obrigarem e mediante a intervenção de ambos (maioria =
= metade mais um).
Finalizando, pediu a confirmação do decidido no acordão em recurso.
Por sua vez, em douto parecer emitido a folhas 31 e seguintes dos presentes autos, o Excelentissimo Procurador-Geral Adjunto pronunciou-se no sentido de que se deve proferir assento com a formulação que segue:
"Face ao prescrito no artigo 30 da Lei das Sociedades por Quotas, as letras subscritas por um socio-gerente de sociedade por quotas com denominação particular, constituida por dois socios, não responsabilizam a sociedade, se o pacto social preve a necessidade da assinatura dos dois socios-gerentes para a obrigar".
Corridos os vistos, cumpre decidir:
I - Ainda que o tribunal pleno não esteja vinculado a decisão preliminar da Secção sobre os pressupostos que condicionam o conhecimento do objecto do presente recurso (n. 3 do artigo 766 do Codigo de Processo Civil), isso não significa que, em caso de vir a concluir-se pela confirmação do decidido na fase preliminar, o tribunal pleno haja de reeditar, ponto por ponto, as razões que a tanto conduziram.
Basta que se afirme (como agora se faz) que se não veem motivos para decidir em contrario do que, no tocante a questão de pressupostos, ja se decidiu na fase preliminar, ou seja, mais precisamente, no acordão de folhas 15-16 verso dos presentes autos.
Importa, consequentemente, que passemos a apreciar do merito do presente recurso com vista a firmar doutrina sobre a questão de direito decidida diferentemente nos dois referidos acordãos.
II - Ora, o acordão de 17 de Julho de 1983, fotocopiado a folhas 4-5 verso dos autos e objecto do presente recurso, foi proferido em recurso de revista em que se considerou que a "B... Lda." - que e uma sociedade por quotas sem firma, mas com denominação particular - não se obrigou, perante a ora recorrente, relativamente a um emprestimo titulado por oito aceites bancarios de que esta mesma recorrente se apresentou como legitima portadora e que por aquela teriam sido sacados.
E assim se considerou e decidiu na medida em que, tendo a "B..." apenas dois socios, cada um deles com uma quota de valor igual a do outro, sendo ambos gerentes e constando expressamente do respectivo pacto social que a sociedade so se obrigaria mediante a intervenção e a assinatura de ambos os gerentes, sucedeu que as ditas letras so se mostravam subscritas por um dos referidos gerentes.
Dai que, com fundamento no dispositivo do artigo 30 da Lei de 11 de Abril de 1901 (Lei das Sociedades por Quotas), que se entendeu como preceito de natureza supletiva, se tenha concluido no sentido de que, exigindo o pacto social de "B..." a intervenção e as assinaturas dos dois gerentes para que a sociedade seja obrigada, tal exigencia prevalece sobre a previsão legal de que, para tanto, e suficiente a intervenção e a assinatura da maioria dos gerentes.
E entendeu-se ainda que, de qualquer modo e havendo so dois gerentes com quotas de valor igual, a intervenção de um so nunca poderia representar a maioria.
Mas diferentemente se entendeu no acordão de 18 de Dezembro de 1979, dito em oposição, tambem do Supremo Tribunal de Justiça e publicado no Boletim, n. 292, paginas 401-404.
Versando sobre situação identica, em que ate a demandada - "B..." - foi a mesma, este aresto decidiu responsabiliza-la pelo pagamento do montante do titulo accionado na acção respectiva (no caso concreto, uma livrança) com o acrescimo dos juros correspondentes.
E assim foi decidido, não so por se ter atribuido ao dispositivo da primeira parte do artigo 30 da Lei das Sociedades por Quotas a natureza de preceito imperativo, mas tambem por se haver considerado que a disposição estatutaria que exige as assinaturas dos dois gerentes so tem "significado interno entre estes e a sociedade que representam, sem que produzam efeitos quanto a terceiros".
Por fim, e ainda que por forma um tanto difusa, deu-se tambem a entender no mencionado aresto que, sendo apenas dois os gerentes com igual participação no capital social e mostrando-se a livrança assinada por um so, a interpretação da vontade negocial leva a considerar bastante a intervenção desse para assegurar a maioria.
III - Perante uma tal panoramica, poderia supor-se que, em vez de uma, seriam afinal duas as questões de direito que os dois acordãos teriam decidido diferentemente, de modo a que o tribunal pleno tivesse de fixar doutrina em relação a ambos.
Assim, teriamos em primeiro lugar a questão de saber se a primeira parte do artigo 30 da Lei das Sociedades por Quotas tem, ou não, natureza supletiva e se a sua segunda parte (em que se faz referencia a eventual estipulação na escritura social) tem alcance em relação a terceiros, ou apenas respeita as relações da sociedade com os socios.
E, em segundo lugar, a questão de saber se, em caso de a sociedade ter apenas dois socios gerentes, a intervenção de um basta para atingir a maioria a que a primeira parte do mencionado artigo 30 faz referencia.
Sucede todavia que, no que respeita a esta segunda questão, o acordão recorrido não chegou propriamente a pronunciar-se em sentido decisivo, isto na medida em que, ao aborda-la e ao afirmar que a intervenção de um so não chega para obter a maioria, o fez apenas para utilizar tal afirmação como argumento adjuvante para a solução do caso concreto que se lhe deparava.
Com efeito, o argumento decisivo para a solução do pleito "sub judice" foi antes o de que, sendo a primeira parte do preceito do artigo 30 de natureza supletiva, ela so rege para o caso de, no pacto social, não haver disposição estatutaria em contrario.
E foi precisamente por haver no pacto social da "B..." disposição no sentido de ser necessaria a intervenção dos dois socios gerentes para obrigar a sociedade e por se ter considerado tal disposição com alcance em relação a terceiros , que o acordão recorrido - sem necessidade de recorrer ao criterio da maioria - resolveu a questão sujeita a julgamento... vindo depois a produzir a afirmação de que um de entre dois não faz maioria, apenas como mero elemento adjuvante - não decisivo - da decisão tomada.
Deste modo, ao tribunal pleno impõe-se fixar doutrina quanto a primeira das referenciadas questões de direito, uma vez que o n. 1 do artigo 763 do Codigo de Processo Civil, ao falar de "... dois acordãos que, relativamente a mesma questão fundamental de direito, assentem sobre soluções opostas..." necessariamente que quis aferir-se as soluções que serviram de base a decisão do pleito... e não a quaisquer outras que, como mero reforço ou por qualquer outro motivo, hajam sido trazidas a parte discursiva do aresto.
IV - Ora, para que possamos pronunciar-nos sobre o verdadeiro sentido do preceito do artigo 30 da Lei das Sociedades por Quotas na parte em que os dois acordãos se pronunciaram diversamente, convem rememorar que tal preceito rege apenas relativamente as sociedades por quotas, sem firma, mas com denominação particular.

E o seu teor e o de que:
"Quando a sociedade não tiver firma, mas uma denominação particular, so ficara obrigada se os actos forem assinados, em seu nome, pela maioria dos gerentes, salvo qualquer estipulação em contrario na escritura social".
No que respeita as sociedades por quotas com firma (e adiante veremos a que vem agora chamadas) rege o preceito do artigo 29 segundo o qual:
"So podem usar da firma os gerentes.
Paragrafo 1 - Para que a sociedade fique obrigada, basta que um dos gerentes assine com a firma social.
Paragrafo 2 - E pessoalmente responsavel para com a sociedade o gerente que assinar a firma em actos que envolvam violação quer da lei ou do contrato social, quer das deliberações dos socios ou dos gerentes em numero legal".
Durante muito tempo veio sendo entendido que os dois preceitos tinham natureza supletiva, ate que o Professor Raul Ventura, pronunciando-se directamente sobre o preceito do paragrafo 1 do artigo 29 se inclinou no sentido da sua natureza preceptiva (conferir "Funcionamento da Gerencia das Sociedades por Quotas", em O Direito, ano 100, paginas 145 e seguintes).
Manteve-se todavia intocada a ideia da natureza supletiva daquilo a que passaremos a chamar de "regra de maioria", contida na primeira parte do artigo 30, ate que, em sentido contrario, veio a decidir-se neste Supremo Tribunal, primeiramente no acordão de 18 de Dezembro de 1979 (o chamado "acordão-fundamento" no presente recurso) e depois no de 7 de Maio de 1981 (no Boletim, n. 307, pagina 287), ambos alias saidos da pena do mesmo Relator.
Afigura-se-nos porem ser mais correcta a solução adoptada no acordão ora recorrido, ou seja a de que, no que respeita a chamada "regra de maioria" tem o preceito do artigo 30 natureza supletiva, sendo alem disso eficaz em relação a terceiros e prevalecendo sobre tal regra - no que concerne as sociedades com denominação particular - o que haja sido estabelecido em contrario no respectivo pacto social.
Efectivamente, tal como vem salientado pelo Professor Raul Ventura a proposito do paragrafo 1 do artigo 29, se a lei tivesse querido estabelecer regime identico quanto a responsabilização obrigacional das sociedades por quotas -
- sejam elas dotadas de "firma" ou de "denominação particular" - não se justificaria a dualidade dos preceitos (paragrafo 1 do artigo 29 e artigo 30), que assim so encontra justificação na intenção do legislador em estabelecer uma diversidade de regimes.
A tal respeito e com a clareza de expressão que lhe e peculiar, escreveu ele o que passamos a transcrever:
"O paragrafo 1 do artigo 29 esta redigido de forma perceptiva e nenhum argumento solido leva a atribuir-lhe natureza diversa da identidade pela forma. Não se diga ser pouco razoavel fazer prevalecer os estatutos quando a sociedade tem denominação e fazer prevalecer a lei quando a sociedade tem firma.
Por um lado, a distinção aberta pela lei, conforme a sociedade tem firma ou denominação particular, e pouco razoavel: por outro lado, a distinção seria perfeitamente inutil se tanto num caso como noutro o contrato pudesse determinar o modo de actuação dos gerentes, quer dizer, se afinal o modo de actuação dos gerentes fosse nos dois casos determinado em primeiro lugar pelo contrato e em segundo lugar pela lei, a distinção, alem de pouco razoavel, seria desprovida de alcance pratico; em terceiro lugar, estranha seria a omissão do valor da estipulação contratual quanto a sociedade com firma, se não fosse intencional, pois logo no artigo seguinte o legislador considerou o problema quanto as sociedades com denominação" - (ibidem, pagina 160).
Face as razões constantes da transcrição que vem de ser feita (alias secundadas por Pinto Furtado, em Codigo Comercial Anotado, volume II - Das Sociedades em Especial, tomo II, pagina 779, nota 4 - Almedina/1979) e sem tomarmos posição quanto a interpretação a dar ao paragrafo
1 do artigo 29, por estar fora do ambito do presente recurso, a verdade e que se torna evidente que, no que respeita a responsabilização obrigacional das sociedades por quotas com mera denominação particular, não pode deixar de ser entendido que o dispositivo da primeira parte do artigo 30 da Lei das Sociedades por Quotas tem natureza supletiva.
Efectivamente, as razões aduzidas pelo Professor Raul Ventura no sentido de ser atribuida a natureza preceptiva no paragrafo 1 do artigo 29, valem, pelo menos, no sentido de se manter o entendimento de que e de natureza supletiva a chamada "regra de maioria" contida na primeira parte do artigo 30, natureza essa que alias resulta da ressalva contida na segunda parte e traduzida na expressão "salvo qualquer estipulação em contrario na escritura social".
Consequentemente, importa concluir que a "regra de maioria" contida na primeira parte do artigo 30 so funciona quando não haja, em contrario, estipulação contida no pacto social.
V - Acresce ainda o dever entender-se que a eventual existencia de clausula estatutaria contraria a chamada "regra de maioria" tem eficacia em relação a terceiros e não apenas quanto as relações internas da vida da sociedade.
Isto não so resulta inequivoco da expressão legal utilizada - "...a sociedade... so ficara obrigada..." - sem que se tivesse estabelecido qualquer distinção entre os possiveis sujeitos activos da obrigação; como da circunstancia de, no paragrafo 2 do artigo 29 (que não teve qualquer paralelo no artigo 30) se haver estabelecido um regime especifico da responsabilidade nas relações internas das sociedades dotadas de firma, para alem da responsabilidade obrigacional para com terceiros regulada no respectivo paragrafo 1... este sim paralelo ao preceito do artigo 30, ainda que diferenciado quanto a forma da responsabilização.
Alias, ao concluir-se no sentido de que a "regra de maioria" contida na primeira parte do artigo 30 tem natureza supletiva de modo a ter de ceder o passo a existencia de clausula estatutaria em contrario, implicitamente se esta aceitando a eficacia desta em relação a terceiros... sem o que ficaria sem sentido a afirmação da natureza supletiva de tal regra.
Por isso mesmo atras se considerou, como integrados numa so questão de direito, as problematicas realacionadas com a natureza supletiva daquela norma e com a eficacia de clausula em contrario eventualmente inserida no pacto social.
E pode acrescentar-se que assim se tem entendido quase pacificamente, uma vez que - com excepção dos dois aludidos acordãos discordantes - ninguem tem posto duvidas quanto a eficacia da estipulação estatutaria em relação a terceiros (conferir Professor Raul Ventura, ibidem, pagina 166; Santos Lourenço, Das Sociedades por Quotas, pagina 38; Azevedo Souto, Lei das Sociedades por Quotas, 3 edição, paginas 112/113; e Professor Vaz Serra, na Revista de Legislação e de Jurisprudencia", ano 113, paginas 217/218, precisamente em comentario ao acordão de 18 de Dezembro de 1979).
VI - Por fim, cabe fazer referencia ao argumento utilizado pela ora recorrente na parte discursiva da sua alegação (mais precisamente a folhas 22 dos presentes autos) segundo o qual, a fazer vencimento a tese do acordão recorrido, dai decorrera "redobrada rigidez de comportamento, por parte das instituições bancarias, que, no fundado receio de não verem satisfeitos os seus creditos, em caso de recurso a Juizo, farão tabua rasa do principio da boa fe, que deve presidir a sua actuação, negando a realização de qualquer operação cambiaria, caso um dos seus dois socios de uma sociedade com denominação particular se mostre impedido de facto de firmar o titulo, podendo com essa actuação obrigar a paralisação da empresa, com todo o cortejo de prejuizos que dai possam advir" - (Sic).
Em consequencia do que - segundo a recorrente - deve prevalecer a doutrina do "acordão fundamento" (o de 18 de Dezembro de 1979) detonador de uma nova interpretação do artigo 30 da Lei das Sociedades por Quotas, merecedora de vencimento.
Simplesmente - e em primeiro lugar - sucede que, por muito validas que sejam as razões apontadas, elas so podem conduzir a uma alteração da politica legislativa sobre tal materia, com interesse no plano do direito a constituir, mas sem força para inverter o sentido e o alcance da lei vigente mediante uma interpretação que não encontra na lei um minimo de correspondencia verbal (n. 2 do artigo 9 do Codigo Civil).
E, em segundo lugar, a poderem verificar-se os inconvenientes apontados, com incidencia mais directa nos interesses e na vida da empresa, a esta cabera preveni-los atraves duma cautelosa elaboração do pacto social.
VII - Por todo o exposto, negando provimento ao recurso, resolvem o conflito de jurisprudencia suscitado mediante a formulação do assento que segue:
"A regra de maioria contida na primeira parte do artigo 30 da Lei das Sociedades por Quotas e de natureza supletiva, so funcionando quando, no pacto social das sociedades por quotas com mera denominação particular, não exista estipulação que a contrarie, pois, havendo-a, o ai estipulado prevalece sobre aquela, mesmo em relação a terceiros".
Custas pela recorrente.

Lisboa, 14 de Maio de 1985

Lima Cluny (Relator) - Lopes Neves - Almeida Ribeiro - Villa Nova - Alves Peixoto - Solano Viana - Avelino Costa Ferreira - Dias da Fonseca - Antero Leitão - Miguel Caeiro
- Rui Corte-Real (Não obstante ter assinado o acordão fundamento votei o presente, por melhor esclarecido) - Leite de Campos - Magalhães Baião - Licinio Caseiro - Melo Franco - Alves Cortes - Quesada Pastor - Vasconcelos Carvalho - Jose Luis Pereira - Manuel Amaral Aguiar - Manuel dos Santos Carvalho - Amilcar Moreira da Silva - Belarmino Cerqueira - Tinoco de Almeida - Gois Pinheiro.