Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
1420/11.0T3AVR.G1-O.S1
Nº Convencional: 3.ª SECÇÃO
Relator: MARIA DO CARMO SILVA DIAS
Descritores: RECURSO DE DECISÃO CONTRA JURISPRUDÊNCIA FIXADA
PRESSUPOSTOS
EXTEMPORANEIDADE
REJEIÇÃO DE RECURSO
INADMISSIBILIDADE LEGAL
Data do Acordão: 05/31/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO DE FIXAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA (PENAL)
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Sumário :
I. Neste caso falha um pressuposto essencial (e que é motivo de inadmissibilidade) do presente recurso extraordinário de decisão proferida contra jurisprudência fixada pelo STJ (o que determina a sua rejeição), uma vez que à data da prolação do acórdão recorrido (proferido em 30.09.2019) ainda não estava publicado o acórdão fundamento invocado (AUJ n.º 3/2020, publicado no DR I Série de 18.05.2020, sendo a partir desta data que ganhou a eficácia indicada no art. 445.º do CPP). Daí que, não assista razão ao recorrente, uma vez que à data em que foi proferido o ac. recorrido de 30.09.2019, ainda não existia o referido AUJ e, por isso, falece um pressuposto essencial deste recurso extraordinário, uma vez que não se pode afirmar que a decisão recorrida tenha sido proferida contra jurisprudência fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça.

II. Para além disso, mesmo tendo em vista o disposto no art, 446.º, n.º 1, do CPP, o presente recurso de decisão proferida contra jurisprudência fixada pelo STJ foi interposto extemporaneamente.

III. Com efeito, o que resulta do processado é que o recorrente, através de sucessivos requerimentos dilatórios e usando abusivamente do processo, procurou evitar numa primeira fase o trânsito em julgado da decisão final com os vários recursos que interpôs para o STJ e para o TC e, depois, tem tentado evitar a execução da pena em que foi condenado. Por isso, é que no acórdão do TRG de 20.03.2023 foi já aplicado o disposto no art. 670.º do CPC ex vi do art. 4.º do CPP, e determinada a exequibilidade imediata do despacho de 14 de Julho de 2021 quanto ao recorrente, por forma a que o mesmo passasse a cumprir, de imediato e independentemente de qualquer eventual novo requerimento, a pena de prisão em que foi condenado. E, uma vez que o acórdão do TRG de 13.01.2020 não conhece, a final, do objeto do processo (antes desatendeu nulidades e conheceu de reclamações do acórdão final que conheceu dos recursos interlocutórios e dos recursos interpostos do acórdão da 1ª instância), também por força do disposto no art. 400.º, n.º 1, al. c), do CPP, não era admissível recurso para o STJ.

IV. Por isso, o arguido/recorrente apenas podia no prazo de 10 dias (e não 30 dias) invocar eventual nulidade, pedir qualquer correção ou interpor recurso para o Tribunal Constitucional (art. 105.º, n.º 1 do CPP e art. 75.º, n.º 1 da Lei do Tribunal Constitucional). De resto, como é sabido, a decisão de reclamação (por não ser admitido o recurso para o STJ), proferida no âmbito do incidente instaurado ao abrigo do art. 405.º do CPP, não interfere no prazo do trânsito do acórdão da Relação proferido em 13.01.2020. E, o mesmo se diga da decisão que não admitiu o recurso para o TC. Nem se podia aceitar que, como sucede neste caso, através de expedientes artificiais inadmissíveis, se tentasse artificialmente prolongar, de forma ilegal, um prazo que não pode ser alargado. E, é este o entendimento que tem sido seguido de forma praticamente uniforme pelo STJ, pois, se assim não fosse, estaria encontrado um expediente artificial de alargar prazos previstos legalmente.

V. Assim sendo, é manifesto que quando apresentou, o recurso extraordinário de decisão proferida contra jurisprudência fixada em 6.09.2020, que deu origem aos presentes autos, o mesmo era manifestamente extemporâneo (art. 446.º, n.º 1, do CPP), pelo que falece igualmente este pressuposto formal para a sua admissibilidade, concluindo-se pela sua rejeição.

Decisão Texto Integral:

            Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça


I. Relatório

1. O arguido AA, interpôs recurso extraordinário de decisão proferida contra jurisprudência fixada pelo STJ, nos termos do artigo 446.º, n.º 1, n.º 2 e n.º 3, do CPP, considerando haver acórdão de fixação de jurisprudência proferido pelo STJ (n.º 3/2020), publicado no DR, que é contrário ao decidido nestes autos (n.º 1420/11.0T3AVR.G1), pelo Ac. do TRG de 30.09.2019, agora transitado em julgado parcialmente quanto ao recorrente, na parte que indica (decisão que o considerou, tal como ao arguido BB, como funcionários, por força do art. 28.º do CP, condenando-os, por isso, por crimes de corrupção, o que contraria a jurisprudência fixada pelo acórdão do STJ nº 3/2020, segundo a qual os próprios funcionários da Associação Humanitária de Bombeiros Voluntários de ... não são funcionários para efeitos da lei penal, pelo que se aqueles o não são, também ele não pode ser condenado por “corromper funcionário” que afinal não é, como foi o caso do arguido CC, examinador, que “recebeu compensações/dinheiros”, pelo que essa qualidade de funcionário não lhe é comunicável por ser comparticipante), concluindo que por não ser, nem ter corrompido “funcionário” ao abrigo da lei penal, deve ser absolvido dos crimes de corrupção.


2. Para o efeito, apresenta a seguinte argumentação (transcrição, sem negritos, nem sublinhados) que considera como questões prévias de relevo:

1.ª QUESTÃO PRÉVIA:

Nos presentes autos, o Supremo Tribunal da Justiça, por decisão notificada ao arguido AA em 07.07.2020 decidiu não aceitar o recurso ao Tribunal Constitucional.

Pela maior e mais elementar cautela processual entendemos que, quanto aos crimes de corrupção pelos quais foi condenado, ocorre o trânsito em julgado parcial da decisão.

Parcial, dizemos nós porque, como se sabe, encontra-se pendente de recurso ao S.T.J. a parte da prescrição em relação a todos os crimes de falsificação de documentos.

Porém, entendemos que, se só estão a ser discutidos os crimes de falsificação de documentos, isto é, se se encontram prescritos ou não, os crimes de corrupção e tudo o quanto se passou em relação aos mesmos e dentro do processo (alterações efectuadas), encontra-se definitivamente transitado em julgado.

Quer isto dizer que, o prazo de interposição do recurso extraordinário iniciou a sua contagem 10 dias após o dia 07.07.2020, suspendeu-se o prazo em férias judiciais de 16.07.2020 a 31.08.2020, estando assim o presente recurso apresentado de forma tempestiva.

A data do trânsito em julgado em relação a vários arguidos é diferente de uns para os outros.

O que significa que o presente recurso de decisão contra a jurisprudência já fixada é tempestivo, por ser interposto em 30 dias contados a partir do trânsito em julgado da decisão dos crimes de corrupção, conforme ordena o art.º 446 n.º 1 do Código Processo Penal.

2.ª QUESTÃO PRÉVIA – despacho proferido pelo Exmo. Sr. Dr. Juiz Desembargador Relator datado de 19.06.2020

Entendeu o Senhor Juiz Desembargador Relator, mal quanto a nós, que já não podia alterar o que estava decidido, mais dizendo que a eficácia do Acórdão Uniformizador n.º 3/2020 do S.T.J. era nenhuma, com base no facto de o Acórdão do Tribunal da Relação ser datado de Setembro de 2019 e a Jurisprudência n.º 3/2020 ser posterior aquele Acórdão.

Ora, cremos não ser isto que diz o Código de Processo Penal, lamentando que o Exmo. Sr. Desembargador não tenha efectuado, quanto a nós, uma correcta interpretação da lei.

Estatui o art.º 446.º n.º 1 do Código Processo Penal que “é admissível recurso directo para o Supremo Tribunal de Justiça de qualquer decisão proferida contra jurisprudência por ele fixada, a interpor no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado da decisão recorrida”.

O ponto de referência a ter em atenção é, unicamente, a data do trânsito em julgado, e não a data em que foi proferido o Acórdão do Tribunal da Relação.

Quis a sorte dos arguidos que o Supremo Tribunal de Justiça tivesse proferido um A.U.J. que tem inteira aplicação (como tem) nestes autos, permitindo assim (e agora) a aplicação de uma verdadeira Justiça, sem analogias proibidas.

Assim, tendo o Acórdão dos presentes autos transitado em julgado em Julho de 2020, na data em que o mesmo transitou em julgado há (e já havia) jurisprudência fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça – o AUJ n.º 3/2020 – que ao ser aplicado nos presentes autos, sempre terá que absolver os arguidos dos crimes de corrupção, por não poderem ser considerados funcionários ao abrigo da lei penal, o que desde já se requer.

As regras do presente recurso “excepcional” estão, por sorte, preenchidas, uma vez que, o trânsito em julgado ocorreu já depois de existir aquele A.U.J. e manda a lei que o A.U.J. já exista quando a decisão transitar e que o recurso seja interposto no prazo de 30 dias.

Estão preenchidos, assim, todos os pressupostos legais, objectivos e subjectivos que a lei faz depender para que o presente recurso seja admitido, apreciado e decidido, devendo considerar-se, por equiparação, que os funcionários da Associação ... não são funcionários para efeitos de lei penal, bem como que, se aqueles não o são (os da Associação), os arguidos condenados em co-autoria com aqueles, também não poderão ser condenados por corromper tal funcionário que, afinal, não é funcionário para efeitos de lei penal.

Significa isto, por outras palavras, que, os arguidos AA e BB que nunca foram funcionários públicos nem de qualquer entidade pública, não podem ser (nem ficar) condenados por crimes de corrupção, caso o arguido CC (funcionário que recebeu compensações/dinheiros) seja considerado “não funcionário para efeitos de lei penal” por fazer parte de uma Associação ....

Se um não o é (funcionário), o outro e outros arguidos condenados com base no facto do arguido CC ser funcionário, também não cometem o crime de corrupção.

Face ao exposto, e sem mais considerações porque desnecessárias, requer-se ao S.T.J. que aplique o A.U.J. n.º 3/2020 do S.T.J. nos presentes autos, com as demais consequências legais, por ser esse A.U.J. integralmente aplicável aos presentes autos processuais pelos motivos invocados e todos os outros motivos que sejam favoráveis aos recorrentes.


3. O Ministério Público respondeu ao presente recurso concluindo, em resumo, que por um lado o recorrente não cumpriu o disposto no art. 412.º, n.º 1, do CPP, uma vez que não apresentou conclusões e, por outro lado, que é extemporâneo o presente recurso extraordinário, devendo ser rejeitado, por ter sido interposto em 6.09.2020, para além do prazo aludido no art. 438.º, n.º 1, do CPP, visto que o acórdão proferido em último lugar transitou em julgado em 27.01.2020.


4. Subiram os autos a este Supremo Tribunal de Justiça e, o Sr. PGA emitiu parecer no sentido de dever ser rejeitado o presente recurso, por ser manifestamente extemporâneo (tendo sido interposto em 6.09.2020 foi muito além do prazo legal de 30 dias, uma vez que o acórdão transitou em 27.01.2020), se assim não se entender, deve o recorrente ser notificado para formular conclusões em falta e, por último, não foi proferida decisão contra jurisprudência fixada “pois que a decisão recorrida versou sobre quem, mesmo provisória ou temporariamente, mediante remuneração ou a título gratuito, voluntária ou obrigatoriamente, tiver sido chamado a desempenhar ou a participar no desempenho de uma actividade compreendida na função pública administrativa.; E não sobre quem …desempenhar funções em organismos de utilidade pública ou nelas participar”.


5. Notificado o Parecer do Sr. PGA ao recorrente para, querendo, em 10 dias se pronunciar, não respondeu.


6. No exame preliminar a Relatora ordenou que fossem cumpridos os vistos legais e realizada a conferência, incumbe, agora, decidir da admissibilidade ou rejeição deste recurso extraordinário (art. 441.º do CPP).


II. Fundamentação

7. O recurso extraordinário de decisão proferida contra jurisprudência fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça, previsto no art. 446.º do CPP, tem por finalidade a “unidade do direito”, visando manter a uniformidade da jurisprudência já fixada, sendo um meio de corrigir divergências infundadas de jurisprudência fixada, que não tiverem sido corrigidas em recurso ordinário.

Também aqui está em causa «o interesse público de obstar à flutuação da jurisprudência e, bem assim, contribuir para a certeza e estabilidade do direito», como se assinala no ac. do STJ n.º 5/2006, publicado no DR I-A Série de 6.06.2006.

Pressuposto deste recurso extraordinário é que a decisão recorrida seja proferida contra jurisprudência fixada pelo STJ, o que significa que esta (a jurisprudência fixada pelo STJ) tem de estar já publicada no DR (art. 444.º, n.º 1, do CPP), para ter a eficácia que lhe é conferida pelo art. 445.º do CPP, quando a decisão recorrida é proferida.

Compreende-se que as divergências infundadas de jurisprudência fixada pelo STJ possam ser corrigidas através de recurso ordinário e, caso assim não suceda (ou esgotados aqueles), então, face ao elevado interesse público em jogo, o legislador admitiu este recurso extraordinário direto para o STJ, para promover a referida correção, assim favorecendo os princípios da segurança e previsibilidade das decisões judiciais e, ao mesmo tempo, promovendo a igualdade dos cidadãos.

Por isso, a admissibilidade desta modalidade de recurso extraordinário, que pode ser direto para o STJ, depende desde logo do “trânsito em julgado da decisão recorrida”, como estabelece o n.º 1 do art. 446.º do CPP, sendo correspondentemente aplicáveis as disposições do presente capítulo.

Além da tempestividade da interposição do recurso (prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado da decisão recorrida – art. 446.º, n.º 1, do CPP), é pressuposto da sua admissibilidade a legitimidade do recorrente (definida nos termos do art. 446.º, n.º 2, do CPP), devendo ser ainda indicada a jurisprudência fixada que foi contrariada pela decisão recorrida (o que é subjacente ao próprio recurso e decorre do art. 446.º, n.º 1, do CPP).

Ao sindicar a decisão recorrida, o Supremo Tribunal de Justiça pode limitar-se a aplicar a jurisprudência fixada, apenas devendo proceder ao seu reexame se entender que está ultrapassada (art. 446.º, n.º 3, do CPP).


8. Feitas estas considerações genéricas, vejamos se, neste caso concreto, estão ou não preenchidos todos os requisitos acima apontados.

Assim.

Analisados os autos não há dúvidas que o arguido AA tem legitimidade para interpor o presente recurso extraordinário (art.446.º, do CPP) dado o seu interesse em agir (era arguido/recorrente, no acórdão recorrido).

Invoca o recorrente que o ac. do TRG de 30.09.2019 é contrário ao decidido no AUJ n.º 3/2020.

Porém, o Acórdão de Uniformização de Jurisprudência n.º 3/2020 foi publicado no DR I Série em 18/5/2020 (conforme o art. 444.º, n.º 1, do CPP), sendo a partir dessa data que ganhou a eficácia indicada no art. 445.º do CPP.

Daí que, não assista razão ao recorrente, uma vez que à data em que foi proferido o ac. do TRG, ou seja, em 30.09.2019, ainda não existia o referido AUJ e, por isso, falece um pressuposto essencial deste recurso extraordinário, uma vez que não se pode afirmar que a decisão recorrida tenha sido proferida contra jurisprudência fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça.

Logo, por aí, verifica-se um motivo de inadmissibilidade do presente recurso e, consequente rejeição, uma vez que à data da prolação do acórdão recorrido ainda não estava publicado o acórdão fundamento[1].

De todo o modo, vejamos, se se mostra ou não verificado o pressuposto formal da tempestividade da interposição deste recurso extraordinário.

Com efeito, nos termos do art. 446.º, n.º 1, do CPP, o recurso de decisão proferida contra jurisprudência fixada pelo STJ é interposto no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado da decisão recorrida, sendo correspondentemente aplicáveis as disposições do presente capítulo.

Para interpor o presente recurso extraordinário, o recorrente aceita e admite que o acórdão recorrido transitou em julgado, como é seu pressuposto.

A questão que se coloca agora é se foi interposto tempestivamente, o que significa que importa apurar quando é que ocorreu o trânsito em julgado (se foi em 27.01.2020 como diz o tribunal recorrido ou se foi em 6.07.2020, como diz o recorrente).

Ora, o acórdão recorrido invocado pelo recorrente foi proferido pelo Tribunal da Relação de Guimarães, em 30.09.2019, no âmbito deste Proc. n.º 1420/11.0T3AVR.G1.

Posteriormente, em 13.01.2020 foi proferido novo acórdão a indeferir, nomeadamente, requerimentos apresentados por outros arguidos, que haviam invocado nulidades e pedido a reforma e correção do acórdão de 30.09.2019 e a julgar procedente a reclamação para a conferência da decisão singular proferida em 11-12-2019, tendo sido considerado como validamente praticado o ato processual de interposição de recurso por outro arguido (arguido DD) para o Tribunal Constitucional, a apreciar oportunamente.

O arguido/recorrente AA pretendeu recorrer para o STJ, mas o recurso não foi admitido, pelo que reclamou desse despacho, mas foi indeferida a reclamação por decisão de 18.03.2020, tendo depois o arguido interposto recurso dessa decisão para o TC, que não foi admitido por despacho de 2.07.2020.

Como se diz, no despacho de 14.07.2021 - e, repete-se no acórdão do TRG de 20.03.2023, com a respetiva retificação do lapso de escrita - “datando a última decisão sobre o recurso da decisão final de 13/1/2020 (desatendimento de nulidades e reclamações) e não sendo o mesmo suscetível de recurso ordinário, deve entender-se que o Acórdão sobre a decisão final transitou já em 27/1/2020 - tendo em conta a data da respetiva notificação e o prazo geral de 10 (dez) dias, para qualquer nova arguição.”

E, de facto, assim é (cf. também respetiva certidão).

O que resulta do processado é que o recorrente, através de sucessivos requerimentos dilatórios e usando abusivamente do processo, procurou evitar numa primeira fase o trânsito em julgado da decisão final com os vários recursos que interpôs para o STJ e para o TC e, depois, tem tentado evitar a execução da pena em que foi condenado.

Por isso, é que no acórdão do TRG de 20.03.2023 foi já aplicado o disposto no art. 670.º do CPC ex vi do art. 4.º do CPP, e determinada a exequibilidade imediata do despacho de 14 de Julho de 2021 quanto ao recorrente, por forma a que o mesmo passasse a cumprir, de imediato e independentemente de qualquer eventual novo requerimento, a pena de prisão em que foi condenado.

E, uma vez que o acórdão do TRG de 13.01.2020 não conhece, a final, do objeto do processo (antes desatendeu nulidades e conheceu de reclamações do acórdão final que conheceu dos recursos interlocutórios e dos recursos interpostos do acórdão da 1ª instância), também por força do disposto no art. 400.º, n.º 1, al. c), do CPP, não era admissível recurso para o STJ.

Por isso, o arguido/recorrente apenas podia no prazo de 10 dias (e não 30 dias) invocar eventual nulidade, pedir qualquer correção ou interpor recurso para o Tribunal Constitucional (art. 105.º, n.º 1 do CPP e art. 75.º, n.º 1 da Lei do Tribunal Constitucional).

De resto, como é sabido,  a decisão de reclamação (por não ser admitido o recurso para o STJ), proferida no âmbito do incidente instaurado ao abrigo do art. 405.º do CPP, não interfere no prazo do trânsito do acórdão do TRG proferido em 13.01.2020. E, o mesmo se diga da decisão que não admitiu o recurso para o TC.

Nem se podia aceitar que, como sucede neste caso, através de expedientes artificiais inadmissíveis, se tentasse artificialmente prolongar, de forma ilegal, um prazo que não pode ser alargado.

Aliás, este entendimento tem sido seguido de forma praticamente uniforme pelo STJ, pois, se assim não fosse, estaria encontrado um expediente artificial de alargar prazos previstos legalmente[2].

Assim sendo, é manifesto que quando apresentou, o recurso extraordinário de decisão proferida contra jurisprudência fixada em 6.09.2020, que deu origem aos presentes autos, o mesmo era manifestamente extemporâneo (art. 446.º, n.º 1, do CPP).

Por isso, uma vez que o recurso extraordinário em apreciação foi interposto extemporaneamente (visto o disposto no art. 446.º, n.º 1, do CPP), isto é, foi interposto para além do prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado do acórdão recorrido, falece igualmente este pressuposto formal para a sua admissibilidade, concluindo-se pela sua rejeição.

De esclarecer, ainda, que a decisão que admite o recurso não vincula o tribunal superior (art.414.º, n.º 3, do CPP).

                                                *

III - Decisão

Pelo exposto, acordam os juízes desta Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça em rejeitar, por inadmissibilidade legal, este recurso extraordinário de decisão proferida contra jurisprudência fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça.

Vai o recorrente condenado em 4 UCs de taxa de justiça, a que acresce, nos termos dos arts. 420º, nº 3 e 448.º, do CPP, o pagamento de 8 UCs.


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Processado em computador e elaborado e revisto integralmente pela Relatora (art. 94.º, n.º 2, do CPP), sendo assinado pela própria e pelos Senhores Juízes Conselheiros Adjuntos.

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Supremo Tribunal de Justiça, 31 de Maio de 2023

Maria do Carmo Silva Dias (Relatora)

Pedro Branquinho Dias (Adjunto)

Teresa Almeida (Adjunta)

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[1] Assim, ac. STJ de 2.06.2021 (Clemente Lima), consultado no site do ITIJ.
[2] Ver, entre outros, ac. do STJ de 26.11.2020, Proc. 775/18.0T9LRA.C1-B.S1 (Helena Moniz); de 9.12.2021, proc. 441/11.8JDLSB.P1-C.S1 (Sénio Alves); de 24.03.2022, proc. 307/20.0KRLSB.L1-A.S1 (Cid Geraldo).