Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
82/17.6T8VPC-B.G1.S1
Nº Convencional: 1.ª SECÇÃO
Relator: ISAÍAS PÁDUA
Descritores: RECURSO DE APELAÇÃO
NULIDADE DE ACÓRDÃO
ARGUIÇÃO DE NULIDADE
OMISSÃO DE PRONÚNCIA
LEGITIMIDADE
CONTRA-ALEGAÇÕES
Nº do Documento: SJ
Data do Acordão: 03/14/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: ANULAR O ACÓRDÃO E ORDENAR A REMESSA DOS AUTOS AO TRIBUNAL
DA RELAÇÃO PARA SUPRIR A NULIDADE
Sumário :
I - Tendo o recorrido nas contra-alegações ao recurso de apelação invocado a falta de legitimidade da apelante para interpor o recurso de apelação, pugnando com base nesse fundamento pela inadmissibilidade do mesmo, e tendo o juiz desembargador relator se limitado a proferir despacho tabelar a admitir o recurso (que nem sequer foi notificado às partes), tal impõe que o coletivo de juízes da Relação conheça e se pronuncie sobre tal questão (referente à invocada ilegitimidade da recorrente) no acórdão que vier a proferir para conhecer do objeto do recurso.

II - Não o fazendo, o acórdão da Relação, de que se recorre de revista, enferma do vício de nulidade por omissão de pronúncia.

III - Sendo esse vício insuprível pelo STJ, tal implica a baixa dos autos à 2a. instância a fim de aí se proceder à reforma do acórdão recorrido, com apreciação da sobredita questão cuja conhecimento foi omitido.

Decisão Texto Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça

I- Relatório

1. O Ministério Público (MºPº) instaurou ação de inibição do exercício das responsabilidades parentais, contra AA, com os demais sinais dos autos, pedindo que se decrete a inibição total do exercício das responsabilidades parentais do requerido relativamente ao seu filho menor BB, nascido em .../.../2010.

Para o efeito, e em síntese, alegou:

Que o menor BB, a sua mãe CC e o pai/requerido viveram juntos até ao dia 20 de maio de 2016, data em que a mãe do menor e este se refugiaram numa casa abrigo, por força das agressões perpetradas, em ambos, pelo progenitor.

Na sequência dessas agressões, a progenitora apresentou queixa, tendo, em consequência, sido instaurado o competente processo-crime, que correu termos sob o nº. 207/16.... no Tribunal Judicial ..., no qual foi o requerido condenado, por sentença já transitada em julgado, na pena de 3 anos e 2 meses de prisão, suspensa na sua execução, pela prática de um crime de violência doméstica na pessoa de CC, mãe do menor BB, e na pena de 2 anos e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução, pela prática de um crime de violência doméstica, na pessoa desse seu filho BB, e ainda na pena acessória de proibição de contactos com o mesmo, pelo período de 2 anos.

Desde maio de 2016 e até à presente data que o menor não tem qualquer contacto com o seu pai, crescendo e vivendo aos cuidados da sua mãe e da sua avó paterna, com quem reside, onde se encontra integrado, sendo estas que lhe proporcionam as necessárias condições de saúde, educação e equilíbrio emocional, sendo certo que o requerido nunca fomentou o seu desenvolvimento físico, intelectual e moral, antes pelo contrário, agredindo-o e insultando-o com frequência, o que configura uma infração culposa dos seus deveres para com o seu filho, com grave prejuízo deste, sendo evidente que o mesmo não tem condições, no futuro, de cumprir com esses mesmo deveres.


2. Contestou o requerido, pugnando, no fundo, pela improcedência da ação.


3. Instruídos os autos, procedeu-se à audiência de discussão e julgamento.


4. Seguiu-se a prolação da sentença que, no final, julgou a ação improcedente, absolvendo o requerido do pedido.


5. Inconformada com tal sentença dela apelou a progenitora/mãe do menor, CC, pugnando pela sua revogação, e a substituição por outra que julgasse a ação procedente e decretasse a requerida inibição do progenitor/requerido.


6. Contra-alegou o requerido, pugnando, desde logo, pela falta de legitimidade daquela apelante para interpor o referido recurso e, assim não se entendendo, de qualquer modo, sempre pela improcedência do mesmo.


7. No despacho a que alude o artº. 641º do CPC, a exma. sra. juíza titular dos autos apreciou concretamente a questão da invocada ilegitimidade da apelante, concluindo pela legitimidade da mesma, após que o admitiu o recurso de apelação pela mesma interposto.


8. Subidos os autos à Relação, o exmo. sr. juiz desembargador relator, a quem os mesmos foram distribuídos, proferiu, liminarmente, em 30/10/2022, o seguinte despacho:

“Recurso próprio, devidamente processado, e recebido com o efeito devido. Inscreva em tabela. Aos vistos.”

8.1. Despacho esse que não foi notificado às partes.


9. Na apreciação desse recurso, o Tribunal da Relação de Guimarães (TRG), por acórdão de 10/11/2022, decidiu, no final, nos seguintes termos:

« (…) julgar o recurso procedente, e em consequência, revogando a decisão recorrida, decreta a inibição total do exercício das responsabilidades parentais do requerido relativamente ao seu filho menor BB.

Nos autos de regulação das responsabilidades parentais será definida a obrigação de alimentos a cargo do requerido. »


10. Foi agora a vez do requerido, inconformado com tal acórdão, dele interpor recurso de revista, cujas respetivas alegações concluiu nos seguintes termos (respeitando-se a ortografia nelas adotada):

1. O, ora, Recorrente sustentou, oportunamente, em sede de contra-alegações, que a Progenitora não tinha legitimidade para interpor o recurso para o Venerando Tribunal da Relação de Guimarães,

2. Assim, importaria, e em primeira linha, que o Tribunal da Relação de Guimarães decidisse esta questão: pode(ia) ou não, a Progenitora interpor o recurso? Tem legitimidade para o fazer ?

3. O Tribunal da Relação de Guimarães, pura e simplesmente, não proferiu qualquer decisão, quanto a essa questão.

4. O douto Acórdão mostra-se, assim, ferido de nulidade, por omissão de pronúncia.

5. O douto Acórdão viola, ainda, de forma ostensiva, o princípio ne bis in idem.

6. No âmbito do processo nº. 207/16...., que correu termos no Tribunal ..., o Recorrente (ali, arguido) foi condenado pela prática de dois crimes de violência doméstica, na pena de quatro anos e dois meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período, condicionada a regime de prova e na pena acessória de proibição de contacto com o menor BB,

pelo período de dois anos (cfr. pontos 1 a 5 da matéria de facto provada).

7. Acresce ao exposto que, “desde que a requerida e o menor foram acolhidos na casa abrigo, em Maio de 2016, o menor não mais esteve, viu ou contactou com o requerido” (nº. 11 dos factos provados).

8. A Requerida e a avó materna do BB não permitem que o requerido contacte com o menor (cfr. nº. 20 dos factos provados).

9. Pode, assim, concluir-se que, por decisão judicial (inicialmente) e por vontade da Progenitora e da Avó materna (depois), desde Maio de 2016 que o Recorrente não contacta, vê, nem está com o seu filho !!!

10. O Tribunal a quo, sustenta que, apesar não existirem elementos (quaisquer elementos probatórios) para avaliar o relacionamento Pai/Filho, desde Maio de 2016 e até ao presente, dispõe de matéria suficiente (com base na sentença penal de que se socorre) para determinar a inibição total do exercício das responsabilidades parentais !!!

11. Temos que esta é uma visão injusta, ultrapassada e incorrecta de avaliar as coisas.

12. Recorrente foi sancionado pelo Tribunal ... com a pena acessória de proibição de contacto com o menor pelo período de dois anos.

13. O Recorrente cumpriu tal sanção (cfr., desde logo, o referido em 11 dos factos provados).

14. Agora, volvidos seis anos (contados de Maio de 2016, data da separação do Recorrente, BB e a mãe deste) e mais de quatro anos (do transito em julgado da sentença proferida pelo Tribunal ...), e sem quaisquer outros elementos novos, vem o Tribunal da Relação de Guimarães (o sumário do douto Acórdão é, particularmente, esclarecedor, ao elencar factos que constam, única e exclusivamente, da sentença proferida pelo Tribunal ... e transitada em Outubro de 2018…), sobrepor-se à decisão condenatória do Tribunal ... e, agora, num segundo momento, determinar que o afastamento deve ser total e definitivo…

15. O Recorrente não pode ser sancionado, duas vezes, pelos mesmos factos.

16. O Tribunal da Relação de Guimarães desrespeitou o princípio ne bis in idem e o preceituado nos artº.s 608º., 615º., nº. 1, al. d) e 619º. e ss. CPC.

Nestes termos, e nos melhores de direito, deve julgar-se o douto Acórdão recorrido nulo e, em qualquer caso, o mesmo revogado e substituído por douto Acórdão que julgue a acção improcedente, com todas as legais consequências.


11. Contra-alegou a progenitora/apelante, ora recorrida, tendo concluído as suas contra-alegações nos seguintes termos:

« 1. Os presentes autos que deram aso ao presente recurso, a ação de inibição de responsabilidades parentais é uma ação de jurisdição voluntária, regulada pelo Regime Geral do Processo Tutelar Cível, aprovado pela lei 141/2015, de 08 de Setembro.

2. Quanto a legitimidade de recorrer no âmbito das ações de Inibição de responsabilidades parentais, é muito claro o artigo 32.º do supracitado Diploma legal, “Sem prejuízo do disposto no artigo 63.º, podem recorrer o Ministério Publico as partes, os pais, o representante legal e quem tiver guarda de facto da criança” 3. Portanto, duvidas, não restam, que a mãe, recorrida CC tem legitimidade plena para recorrer de uma decisão desfavorável ao superior interesse da criança, proferida pelo Tribunal Judicial ....

3. Defende ainda o recorrente que não pode ser julgado duas vezes pelo mesmo crime, tendo desta forma sido violado o princípio Ne Bis In Idem, alegando para o efeito que “o recorrente foi condenado, em processo crime na pena acessória de não contactar com o filho por um período de dois anos”

4. Dispõe o n.º 5 do artigo 29.º da Constituição das República Portuguesa “Ninguém pode ser julgado mais do que uma vez pelo mesmo crime”.

5. No acaso em apreço, não está de forma nenhuma o recorrente, a ser condenado pelo mesmo crime.

6. O recorrente foi condenado, no âmbito de um processo n.º 207/16...., por um crime de violência doméstica perpetrado contra o seu filho BB, numa pena de dois anos e seis meses de prisão e numa pena acessória de proibição de contacto com o seu filho, por um período de dois anos.

7. Aqui em causa não estamos a julgar um processo crime, o que se pretende com a presente demanda judicial é somente aferir da capacidade deste progenitor exercer as suas responsabilidades parentais.

8. Em momento nenhum, no decorrer do processo, foram julgados factos que deram origem aquele processo crime, até porque se assim não fosse não seria somente inibido das responsabilidades parentais, como seria condenado numa nova pena, o que de facto não sucedeu.

9. O processo que agora é objeto de recurso, é um processo de natureza cível, de jurisdição voluntária, que não aplica nenhuma pena, somente foram analisados os possíveis efeitos que a aproximação deste progenitor poderia ter efeito na vida na saúde emocional, tal como no desenvolvimento psíquico desta criança.

10. Não houve, nem poderia haver, qualquer diligência no sentido de averiguar se existiu crime de violência doméstica, visto que por esse crime já foi o recorrente condenado e já transitou em julgado.

11. Não podendo de forma nenhuma acolher o alegado pelo recorrente, relativamente a violação do princípio Ne Bis In Idem.

12. Por outro lado, mais uma vez, está o recorrente, somente a zelar pelos seus interesses e não pelo superior interesse da criança.1

13. Não pode o direito do pai, prevalecer sobre o direito da criança, direito a ser protegida, de estar em segurança.

14. Alega o recorrente que passaram seis anos desde que viu o menor pela última vez, que não tem o tribunal elementos novos, contudo se forem analisados cuidadosamente e atentamente toda a prova produzida em sede de Audiência e Julgamento, poderemos concluir que existem provas, nomeadamente os relatórios médicos dos peritos do serviço de Clinica e Patologia Forenses do INMLCF-Delegaçãodo Norte,que concluem que “no domínio afetivo e relacional, a sistematização e articulação dos dados clínicos obtidos sugerem, ainda, que o examinado, apesar de calmo e seguro poderá apresentar mais dificuldades em gerir a tensão. Os dados parecem ainda apontar para uma centração em si próprio, uma tendência narcisista e manipuladora e com tendência a expressar a sua raiva diretamente.”,

15. Ou seja, existem, elementos nos autos que provam que face à personalidade do recorrente, que tais comportamentos se possam voltar a repetir, pondo em causa a saúde, o bem estar, a segurança e o desenvolvimento físico e psíquico do menor.

16. Para esse efeito, basta considerar que o recorrente se encontra, na presente data a cumprir pena de 4 anos e 2 meses de prisão, proferida no identificado processo, bem como foi acusado de no âmbito do processo judicial 432/20...., de quatro crimes de Violação agravados e quatro crimes de importunação sexual.

Pelos factos supra explanados, concluímos que, não podem colher os fundamentos expostos pelo recorrente AA, devendo esse recurso ser julgado improcedente por não provado, mantendo-se a decisão do Tribunal da Relação de Guimarães, inibindo-se assim as responsabilidades parentais do progenitor AA. »


12. Cumpre-nos, agora, apreciar e decidir.


***

II- Fundamentação



1. Do objeto do recurso.

Como é sabido, e constitui hoje entendimento pacífico, é, em regra, pelas conclusões das alegações dos recorrentes - podendo sê-lo também, em determinadas circunstâncias, por referência às contra-alegações -, que se afere, fixa e delimita o objeto dos recursos, não podendo o tribunal de recurso conhecer de matérias ou questões nelas não incluídas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso (cfr. artºs. 635º, nº. 4, 639º, nº. 1, 608º, nº. 2, ex vi 679º do CPC).

Ora, calcorreando as conclusões das alegações do sobredito recurso do Requerido, verifica-se que as questões que se nos impõe aqui apreciar e decidir são as seguintes:

a) Da nulidade do acórdão (por omissão de pronúncia);

b) Da violação do princípio ne bis in idem;

c) Da (in)verificação dos pressupostos para decretar a inibição do exercício das responsabilidades parentais do requerido/recorrente relativamente ao seu filho menor BB.


***


2. Os Factos Provados (dados pelo tribunal ora a quo e descritos no acórdão recorrido).

1) O menor BB, nasceu em .../.../2010, em ... e é filho de CC e de AA;

2) Os requeridos, viveram em união de facto cerca de 10 anos, tendo cessado essa convivência em 20 de Maio de 2016;

3) Correu termos sob o n.º 207/16.... no Tribunal Judicial ..., processo-crime no qual foi o ali arguido acusado da prática em autoria material e na forma consumada, de um crime de violência doméstica, perpetrado na pessoa de CC e de um crime de violência doméstica, perpetrado na pessoa do seu filho BB.

4) Por sentença transitada em julgado, em 04-10-2018, foi o arguido AA condenado, entre o mais, na pena de 4 (quatro) anos e 2 (dois) meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período, condicionada a regime de prova, pela prática de dois crimes de violência doméstica;

5) Mais foi ali o arguido condenado na pena acessória de proibição de contacto com o menor BB, pelo período de 2 (dois) anos;

6) A requerida é operadora de caixa na cadeia de supermercados ..., tendo aí iniciado funções em 14-08-2017, no distrito ..., onde reside desde então, de forma habitual;

7) Em Fevereiro de 2009, a requerida auferia como vencimento base € 610,00/mês;

8) Durante o período laboral da requerida, o BB fica entregue aos cuidados da avó materna, com quem reside habitualmente, na cidade ...;

9) O menor está com a mãe aos fins de semana e bem assim nas folgas e férias daquela;

10) O menor sente-se seguro e emocionalmente preenchido em casa da avó materna e do companheiro desta, que lhe prestam todos os cuidados necessários ao seu crescimento;

11) Desde que a requerida e o menor foram acolhidos na casa abrigo, em Maio de 2016, o menor não mais esteve, viu ou contactou com o requerido;

12) O menor revela um comportamento inquieto e ansioso, fruto da vivência em comum dos e com os progenitores;

13) A possibilidade de voltar a conviver com o requerido, causa ao menor perturbação e angústia;

14) O menor tem medo que uma aproximação ao requerido permita uma aproximação desta à requerida e sente-se, por isso, mais seguro fora do agregado familiar desta, encontrando estabilidade aos cuidados da avó.

15) O menor é acompanhado semanalmente em consulta de psicologia desde Dezembro de 2021 e tem apresentado uma evolução clínica favorável;

16) Em 09-02-2022, o BB foi submetido a perícia médico-legal, de foro psicológico, no serviço de Clínica e Patologia Forenses do INMLCF – Delegação Norte, tendo sido relatadas as seguintes conclusões:

a. O examinando mostrou-se disponível para este processo de avaliação, colaborando com tudo o que lhe o que lhe foi pedido. Expressa-se de forma clara, organizada e coerente, sem indício de alteração ao nível da estrutura e conteúdo do pensamento. Consciente, orientado auto e alopsiquicamente, no tempo e no espaço. Evidencia competências cognitivas. Atenção, memória e percepção sem qualquer indício de perturbação.

b. A análise e integração dos dados clínicos obtidos sugerem, ainda, que o examinando apresenta funções intelectuais dentro dos níveis normativos, estando perfeitamente capaz de manejar intelectualmente a informação, de operar distinção entre bem/mal, certo/errado e de operar de acordo com essa mesma avaliação.

c. No domínio afectivo e relacional, a sistematização e articulação dos dados clínicos obtidos sugerem, ainda, que o examinando, apesar de calmo, evidencia alguma fragilidade emocional reactiva à reactivação das memórias relacionadas com o progenitor, assim como em relação aos episódios de perseguição deste. Evidencia marcada angústia perante a Possibilidade de ter de voltar a conviver com o progenitor.

d. No seu conjunto, estas características condicionam o examinando na gestão de relações de maior proximidade (nomeadamente com a mãe e com a sua família nuclear) e em situações sociais, uma vez que o menor adopta sempre uma postura de evitamento/fuga de todas as situações em que se sente inseguro e ameaçado pela hipotética Possibilidade de ter contacto com o progenitor.

e. Da observação da interacção da díade mãe-filho, podemos concluir que ambos mantiveram sempre uma atitude de grande cumplicidade, com proximidade física e uma tonalidade afectiva positiva.

f. Em termos emocionais, o examinando revela níveis normativos de ajustamento psicológico. Ao longo do processo avaliativo, demonstrar-se bastante inquieto e angustiado com este processo e com a Possibilidade de ter de voltar a conviver com o progenitor.

g. Relativamente ao domínio da parentalidade, o examinando demonstra uma grande ligação emocional a mãe, a avó materna e ao companheiro desta, projectando-os no seu projecto e objectivos de vida. O seu relato a propósito da mãe e da avó materna foi sempre acompanhado de uma tonalidade emocional positiva, tendo descrito vários momentos de interacção securizante com ambas.

h. Como pontos menos positivos, e que contribuem decisivamente para a instabilidade emocional do menor, não podemos deixar de apontar a judicialização e o elevado grau de conflituosidade mantido entre a examinanda e o progenitor, em grande parte provocado e alimentado pelo Sr. AA;

17) Em 09-02-2022, a requerida foi submetida a perícia médico-legal, de foro psicológico, no serviço de Clínica e Patologia Forenses do INMLCF – Delegação Norte, tendo sido relatadas as seguintes conclusões:

a. A examinanda mostrou-se disponível para este processo de avaliação, colaborando com tudo o que lhe o que lhe foi pedido. Expressa-se de forma clara, organizada e coerente, sem indício de alteração ao nível da estrutura e conteúdo do pensamento. Consciente, orientada auto e alopsiquicamente, no tempo e no espaço. Evidencia competências cognitivas. Atenção, memória e percepção sem qualquer indício de perturbação.

b. A análise e integração dos dados clínicos obtidos sugerem, ainda, que o examinando apresenta funções intelectuais ligeiramente abaixo dos níveis normativos, estando perfeitamente capaz de manejar intelectualmente a informação, de operar distinção entre bem/mal, certo/errado e de operar de acordo com essa mesma avaliação. Por conseguinte, reúne um conjunto de capacidades que lhe permitem responsabilizar-se pelos seus actos, não apresentando psicopatologia que a impeça de assumir voluntariedade, intencionalidade e responsabilidade pelos seus comportamentos;

c. No domínio afectivo e relacional, a sistematização e articulação dos dados clínicos obtidos sugerem, ainda, que a examinanda, apesar de calma e segura, evidencia alguma fragilidade emocional reactiva aos episódios de perseguição por parte do progenitor.

d. No seu conjunto, estas características condicionam a examinanda na gestão de relações de maior proximidade (nomeadamente com o filho e com a sua família nuclear) e em situações sociais, uma vez que privilegia sempre a segurança, bem-estar e estabilidade do menor BB.

e. Da observação da interacção da díade mãe-filho, podemos concluir que ambos mantiveram sempre uma atitude de grande cumplicidade, com proximidade física e uma tonalidade afectiva positiva.

f. Em termos emocionais, a examinanda revela níveis normativos de ajustamento psicológico.

g. Ao longo do processo avaliativo, demonstrar-se bastante preocupada e angustiada com este processo e com o impacto na estabilidade emocional do BB.

h. Relativamente ao domínio da parentalidade, a examinanda demonstra uma grande ligação emocional ao filho, projectando-o no seu projecto e objectivos de vida. O seu relato a propósito do BB foi sempre acompanhado de uma tonalidade emocional positiva, tendo descrito vários momentos de interacção securizante com o menor e de participação activa na vida deste. A examinanda revela estar motivada, interessada e empenhada em exercer as responsabilidades parentais do descendente, sentindo-se competente no desempenho do papel parental.

i. Relativamente às outras áreas envolvidas nas competências para o exercício da parentalidade (que não se reduzem à natureza dos afectos manifestados), a examinanda a presenta, no plano do conhecimento, recursos adequados, nomeadamente ao nível da

j. conceptualização de condições para desenvolvimento cognitivo, emocional e social do seu descendente. Realçamos que estas características facilitam o exercício da parentalidade de forma ajustada às necessidades e interesses do menor em questão.

k. Revelou conhecimentos teóricos adequados sobre as principais necessidades do filho, nomeadamente de afectividade, segurança, alimentação, rotinas de sono e higiene, acompanhamento, estimulação, saúde, promoção de autonomia e bem-estar geral. Deu igualmente mostras, em termos teóricos, de conhecer as diferentes etapas do desenvolvimento do filho, assim como estratégias educativas assertivas e ajustadas.

l. Como pontos menos positivos, e que podem ter implicações no exercício das responsabilidades parentais, não podemos deixar de apontar a judicialização e o elevado grau de conflituosidade mantido entre a examinanda e o progenitor, em grande parte provocado e alimentado pelo Sr. AA.

m. Face ao acima exposto, considerando a análise integrativa dos dados do presente exame pericial, torna-se claro que o conflito entre os progenitores interfere negativamente no bem-estar do BB, que desde que foi colocada a possibilidade de ter de conviver com o progenitor manifestou alterações de comportamento significativas, tradutoras de marcado desconforto emocional e psicológico e sentimentos marcados de insegurança e medo, negando completamente a possibilidade de qualquer contacto com o progenitor.

n. Neste sentido, sugerimos que a Sra. CC mantenha o acompanhamento em consulta de psicologia e psiquiatria, com o objectivo de potenciar a sua estabilidade emocional.

o. Considerando a evolução global do BB até à data, é fundamental que a sua vontade seja tida em consideração;

p. Considerando a análise integrativa dos dados, entendemos mais prudente a manutenção da Inibição e Limitação ao Exercício das Responsabilidades Parentais do progenitor, assim como a não alteração das Responsabilidades Parentais.

18) Em 09-02-2022, o requerido foi submetido a perícia médico-legal, de foro psicológico, no serviço de Clínica e Patologia Forenses do INMLCF – Delegação Norte, tendo sido relatadas as seguintes conclusões:

a. O examinando mostrou-se disponível para este processo de avaliação, colaborando com tudo o que lhe o que lhe foi pedido. Expressa-se de forma clara, organizada e coerente, sem indício de alteração ao nível da estrutura e conteúdo do pensamento. Consciente, orientado auto e alopsiquicamente, no tempo e no espaço. Evidencia competências cognitivas. Atenção, memória e percepção sem qualquer indício de perturbação.

b. A análise e integração dos dados clínicos obtidos sugerem, ainda, que o examinando apresenta funções intelectuais ligeiramente abaixo dos níveis normativos, estando perfeitamente capaz de manejar intelectualmente a informação, de operar distinção entre bem/mal, certo/errado e de operar de acordo com essa mesma avaliação. Por conseguinte, reúne um conjunto de capacidades que lhe permitem responsabilizar-se pelos seus actos, não apresentando psicopatologia que o impeça de assumir a voluntariedade, intencionalidade e responsabilidade pelos seus comportamentos.

c. No domínio afectivo e relacional, a sistematização e articulação dos dados clínicos obtidos sugerem, ainda, que o examinando, apesar de calmo e seguro, poderá apresentar mais dificuldades em gerir a tensão. Os dados parecem, ainda, apontar para uma centração em si próprio, uma tendência narcísica e manipuladora e com tendência a expressar a sua raiva directamente.

d. No seu conjunto, estas características podem condicionar o examinando na gestão de relações de maior proximidade e em situações sociais de maior ambivalência e/ou contrariedade (e.g., conflitos familiares; gestão de emoções; negociação de conflitos), podendo mesmo constituir um factor de bloqueio e/ou agravamento face a situações de conflito em que estejam envolvidas pessoas significativas.

e. Em termos emocionais, o examinando revela níveis normativos de ajustamento psicológico. No entanto, ao longo do processo avaliativo, apesar de demonstrar-se bastante preocupado e angustiado com a separação prolongada do filho, não podemos deixar de apontar que se encontrava, concomitantemente, centrado no conflito com a progenitora e com a avó materna.

f. Relativamente ao domínio da parentalidade, o examinando demonstra alguns sinais de ligação emocional ao filho, projectando-o no seu projecto e objectivos de vida. O seu relato a propósito do BB foi sempre acompanhado de uma tonalidade emocional positiva, tendo descrito momentos de interacção securizante com o menor ocorridos na ausência da progenitora, no passado enquanto coabitaram. O examinando revela estar motivado, sentindo-se competente no desempenho do papel parental.

g. Relativamente às outras áreas envolvidas nas competências para o exercício da parentalidade (que não se reduzem à natureza dos afectos manifestados), o examinando apresenta, no plano do conhecimento, recursos limitados, nomeadamente ao nível da conceptualização de condições para desenvolvimento cognitivo, emocional e social do seu descendente. Realçamos que estas características poderão dificultar o exercício da parentalidade de forma ajustada às necessidades e interesses do menor em questão. O examinando deu igualmente mostras, em termos teóricos, de desconhecer as diferentes etapas do desenvolvimento do filho.

h. Como pontos menos positivos, e que podem ter implicações no exercício das responsabilidades parentais, não podemos deixar de apontar a judicialização e o elevado grau de conflituosidade mantido entre o examinando, a mãe do descendente, e a avó materna do menor, com exposição directa do BB, não havendo espaços construtivos de análise, debate e negociação a respeito das necessidades educativas e desenvolvimentais do menor;

i. Salientamos, de igual forma, que decorre um processo judicial contra o examinado, instaurado após queixa da sua filha por alegada tentativa de violação.

j. Verificamos que o examinando e a progenitora do seu descendente se revelam incapazes de vir a concordar sobre assuntos relativos ao filho; a existência de indicadores de conflito prolongado, que envolvem a família alargada, e dificilmente ultrapassável; e um padrão de litigância crónica e de difícil gestão entre os progenitores. Estes factores colocam sérios obstáculos e constrangimentos à construção de um clima harmonioso, protector e securizante para o BB.

k. De referir, também, que o examinando coloca a responsabilidade de todo o conflito na mãe, alargando essa responsabilidade à avó materna do descendente, retratando-as de forma negativa e carregada de fragilidades, o que evidencia uma visão redutora e pouco crítica do problema instalado, do papel de cada um dos intervenientes e de todas as questões sistémicas envolvidas.

l. Face ao acima exposto, considerando a análise integrativa dos dados do presente exame pericial, torna-se claro que o conflito entre os progenitores interfere negativamente no bem-estar do BB, que desde que foi colocada a Possibilidade de ter de conviver com o progenitor manifestou alterações de comportamento significativas, tradutoras de marcado

m. desconforto emocional e psicológico e sentimentos marcados de insegurança e medo, negando completamente a Possibilidade de qualquer contacto com o progenitor.

n. Neste sentido, sugerimos que o Sr. AA possa ser ajudado a compreender as implicações negativas que esta situação de conflito teve e continua a ter no desenvolvimento global do filho, processo este que poderá envolver um aconselhamento técnico especializado.

o. Considerando a evolução global do BB até à data, é fundamental que a sua vontade seja tida em consideração.

p. Considerando a análise integrativa dos dados, entendemos mais prudente a manutenção da Inibição e Limitação ao Exercício das Responsabilidades Parentais do progenitor, assim como a não alteração das Responsabilidades Parentais.

19) O requerido é estofador de automóveis, auferindo € 750,00/mês;

20) A requerida e a avó materna do BB não permitem que o requerido contacte com o menor;

21) O requerido é pessoa tida, no núcleo familiar e de amigos em que está inserido, como pessoa respeitadora e cuidadora;

22) Em 11-01-2022, o requerido efectuou, no laboratório L..., em ..., análise a drogas de abuso e seus metabolitos na urina, para despiste de cannabis, cocaína e opiáceos/morfina/heroína, tendo tal pesquisa resultado negativa.


***


3. Quanto à 1ª. questão

- Da nulidade do acórdão (por omissão de pronúncia).

Invoca o recorrente a nulidade do acórdão recorrido (da Relação), por omissão de pronúncia.

Nulidade essa que fundamenta aduzindo para o efeito que nas suas contra-alegações ao recurso de apelação sustentou então que a recorrente (progenitora) não tinha legitimidade para interpor esse recurso. Porém, o Tribunal da Relação, no seu acórdão de que ora recorre, não se pronunciou sobre tal questão, e ao não o fazer incorreu, por omissão de pronúncia, na violação do artº. 615º, nº. 1 al. d), do CPC.

Apreciando.

Como é sabido, as nulidades da sentença (leia-se aqui acórdão, pois que tal dispositivo legal é também aplicável às decisões da 2ª. instância, ou seja, da Relação – cfr. artº. 666º, nº. 1, do CPC - e também deste mais alto tribunal – cfr. artº. 679º) encontram-se taxativamente previstas no artº. 615º CPC e têm a ver com vícios estruturais ou intrínsecos da sentença, também conhecidos por erros de atividade ou de construção da própria sentença, que não se confundem com eventual erro de julgamento de facto e/ou de direito.

Dispõe-se no invocado artº. 615º, nº. 1 al. d), do CPC, que é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não poderia tomar conhecimento. (sublinhado nosso).

Decorre de tal norma que o vício que afeta a decisão advém de uma omissão (1º. segmento da norma – aqui em causa, pois que a nulidade invocada pelo recorrente é sustentada, como vimos, numa omissão de pronúncia) ou de um excesso de pronúncia (2º. segmento da norma).

Preceito legal esse que deve ser articulado com o nº. 2 no artº. 608º do CPC, onde se dispõe que “o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.” (sublinhado nosso)

Impõe-se ali um duplo ónus ao julgador, o primeiro traduzido no dever de resolver todas as questões que sejam submetidas à sua apreciação pelas partes (salvo aquelas cuja decisão vier a ficar prejudicada pela solução dada antes a outras), e o segundo (que, como vimos, aqui não é colocado em causa pelo recorrente) traduzido no dever de não ir além do conhecimento dessas questões suscitadas pelas partes (a não ser que a lei lhe permita ou imponha o seu conhecimento oficioso).

Tendo presentes tais conceitos/considerações, e reportando-nos ao caso em apreço, diremos:

Compulsando o acórdão recorrido verificamos que o tribunal a quo circunscreveu o objeto do recurso de apelação à seguinte questão (dela passando a conhecer): “a única questão a decidir consiste em saber se, com base na factualidade apurada nos autos, o requerido AA deve ser inibido do exercício das responsabilidades parentais relativamente ao seu filho menor BB.”

Porém, como daí, aliás, ressalta, nem antes (vg. como questão prévia), e nem depois, conheceu da sobredita questão, referente à falta de legitimidade da então apelante (a progenitora CC) para interpor o referido recurso de apelação, que foi suscitada, ab initio, pelo ora recorrente (então recorrido) nas suas contra-alegações de recurso.

O facto de a referida questão ter sido apreciada (e decidida no sentido positivo dessa legitimidade) pela exma. sra. juíza titular dos autos, aquando da prolação do despacho a que alude o artº. 641º do CPC (e como se lhe impunha), não constitui caso julgado, pois que, como é sabido, essa decisão não vincula os tribunais superiores (cfr. artº. 641º, nº. 5, do CPC).

Como, é também sabido, igualmente não constitui caso julgado a decisão de admissibilidade do recurso de apelação proferida pelo juiz desembargador relator a quem os autos são distribuídos, uma vez que não vincula os restantes elementos (juízes) que irão compor o coletivo que irá julgar o recurso. E mais ainda no presente caso em que, por um lado, esse despacho liminar de admissibilidade do referido recurso foi proferido, pelo exmo. sr. juiz desembargador relator, de forma meramente tabelar, e, por outro lado, porque nem sequer o mesmo foi notificado às partes (impedindo-as, porventura, de o impugnar, vg. nos termos do artº. 652º, nº. 3, do CPC).

Conhecimento da aludida questão (referente à legitimidade ou ilegitimidade da apelante para interpor o referido recurso de apelação), suscitada pelo então recorrido nas suas contra-alegações a esse recurso, que, assim, se impunha que fosse conhecida/apreciada, pelo coletivo de juízes que intervieram no julgamento do recurso, no acórdão de que ora se recorre (ainda que como questão prévia, pois que se tratava de questão prejudicial de cuja decisão dependeria o conhecimento das demais questões que constituíam o objeto do recurso em si mesmo), a qual, aliás, diga-se, foi referenciada no relatório do respetivo acórdão.

E não se invoque, em sentido contrário ao que se defende, o 2º. segmento da norma do nº. 5 do acima citado artº. 641º do CPC, onde se dispõe que a decisão que admita o recurso, fixe a sua espécie e determine o efeito, não pode ser impugnada pelas partes.

Pois, que, como é bom de ver, e decorre de uma leitura atenta (teleológica e sistemática) desse segmento normativo, o que o legislador quer com ele dizer é que as decisões proferidas no que concerne a tais matérias não são suscetíveis de impugnação autónoma, ao contrário do que sucede com as decisões proferidas que não admitam o recurso ou o retenham, casos estes em que está prevista a sua impugnação autónoma através do incidente de reclamação para o tribunal superior (cfr. artºs. 641, nº. 6, e 643º do CPC).

Nesse sentido aponta também Abrantes Geraldes (in “Recursos em Processo Civil, 6ª. Edição Atualizada, Almedina, pág. 221) ao assim discorrer, em remate final à anotação a tal normativo legal: “Do despacho que não admita o recurso, seja qual for o fundamento, o interessado pode reclamar, nos termos do art. 643.º. Já as decisões de admissão ou indicação do efeito do recurso não são suscetíveis de impugnação, sem embargo da posição que sobre tais aspetos seja assumida nas contra-alegações e da sua apreciação pelo Tribunal Superior (artºs. 641.º, n.º 5, 655.º e 654.º)”. Sublinhado nosso.

Ora, a omissão de conhecimento/pronúncia pelo ora tribunal a quo sobre a referida questão inquina, desde logo, o acórdão recorrido do vício de nulidade (artº. 615º, nº. 1 al. d) – 1ª. parte -, ex vi artºs. 666º, nº. 1, 679º e 682º, nº. 1, do CPC), que aqui se declara, e que impede/prejudica o conhecimento das restantes questões acima elencadas.

Vicio esse que este Supremo Tribunal, independente do juízo que possa ter sobre tal questão (que in casu se nos afigura de fácil solução face ao que se encontra plasmado, a esse propósito, no artº. 32º, nº. 2, do RGPTC), está neste caso legalmente impedido de suprir, ao contrário do que sucede perante outras situações viciosas (cfr. nºs. 1 e 2 do artº. 684º do CPC).

Donde que, à luz do disposto no artº. 684º, nº. 2, do CPC, se impõe ordenar a remessa dos autos à 2ª. instância para que proceda – se possível pelo mesmo coletivo de juízes -, à reforma do acórdão recorrido, com o conhecimento/apreciação da sobredita questão (prejudicial) referente à (i)legitimidade da apelante para interpor o respetivo recurso, com a subsequente elaboração de novo acórdão, com a extração em consonância das respetivas consequências jurídicas.


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III- Decisão



Assim, em face do exposto, acorda-se em anular o acórdão ora recorrido, e determinar a remessa dos autos à 2ª. instância, a fim de proceder à sua reforma nos termos e para os efeitos que supra se deixaram expressos.

Custas deste recurso pela parte vencida a final (artº. 527º, nºs. 1 e 2, do CPC), se a elas vier a haver lugar.


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Sumário

I- Tendo o recorrido nas contra-alegações ao recurso de apelação invocado a falta de legitimidade da apelante para interpor o recurso de apelação, pugnando com base  nesse fundamento pela inadmissibilidade do mesmo, e tendo o juiz desembargador relator se limitado a proferir despacho tabelar a admitir o recurso (que nem sequer foi notificado às partes), tal impõe que o coletivo de juízes da Relação conheça e se pronuncie sobre tal questão (referente à invocada ilegitimidade da recorrente) no acórdão que vier a proferir para conhecer do objeto do recurso.

II- Não o fazendo, o acórdão da Relação, de que se recorre de revista, enferma do vício de nulidade por omissão de pronúncia.

III- Sendo esse vício insuprível pelo STJ, tal implica a baixa dos autos à 2ª. instância a fim de aí se proceder à reforma do acórdão recorrido, com apreciação da sobredita questão cuja conhecimento foi omitido.


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Lisboa, 2023/03/14

Relator: cons. Isaías Pádua

Adjuntos:

Cons. Manuel Aguiar Pereira

Cons. Jorge Leal