Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
9976/16.5T8LRS-C.L1 -A.S1
Nº Convencional: 2.ª SECÇÃO
Relator: FERNANDO BAPTISTA
Descritores: DESPACHO DO RELATOR
CONFERÊNCIA
TRIBUNAL DA RELAÇÃO
RECURSO DE APELAÇÃO
INADMISSIBILIDADE
RECURSO DE REVISTA
REVISTA EXCECIONAL
RECLAMAÇÃO
Data do Acordão: 05/05/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECLAMAÇÃO - ARTº 643 CPC
Decisão: NEGADA
Indicações Eventuais: TRANSITADO EM JULGADO
Sumário :
I. Não é admissível recurso para o Supremo Tribunal de Justiça do Acórdão proferido em Conferência, no Tribunal da Relação (confirmativo da decisão singular do Relator), que indefere a reclamação da decisão da 1.ª instância de não admissão de recurso de apelação, confirmando essa decisão (pois não estamos perante qualquer uma das situações previstas no artigo 671.º do Código de Processo Civil de admissibilidade do recurso de revista).

II. Aquele Acórdão apenas seria recorrível nos casos em que é sempre admissível recurso, ínsitos nos artigos 629.º, n.º 2, e 671.º, n.º 2, do Código de Processo Civil.

Decisão Texto Integral:

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA, SEGUNDA SECÇÃO


I – RELATÓRIO


AA - Requerida no processo de regulação do exercício das responsabilidades parentais em que é Requerente BB -, inconformada com o despacho do Juiz ... do Juízo de Família e Menores ..., datado de 23/10/2019, que lhe não admitiu — com fundamento na pretensa Extemporaneidade do respectivo requerimento de interposição – o recurso por ela interposto em 16/09/2019 da Sentença (proferida nos autos em 16/06/2019) que regulou as responsabilidades parentais relativas à menor CC, reclamou do mesmo para a Relação (nos termos do art0. 643° do Código de Processo Civil actualmente em vigor).


Nem o MINISTÉRIO PÚBLICO nem a parte contrária responderam à Reclamação apresentada pela Recorrente (n° 2 do cit. artigo 643° do C.P.C.).


Em decisão singular do Relator a quem foi distribuído o processo, foi mantido o supra referido despacho, do Juiz ... do Juízo de Família e Menores ..., datado de 23/10/2019, que não admitiu o recurso.


Veio a recorrente AA reclamar para a Conferência daquela decisão singular do Relator, solicitando a prolação de um acórdão.


Em acórdão de 09.11.2021, a Relação ... decidiu confirmar a decisão singular da Relatora.


Vem, agora, a mesma AA interpor recurso de revista daquele acórdão da Relação que, em Conferência, rejeitou a reclamação havida da decisão singular do Relator que indeferiu a reclamação do despacho do juiz da 1ª instância que não admitiu o recurso ali interposto.


Porque se nos afigurou a possibilidade de não conhecer do mérito do recurso, deu-se cumprimento ao estatuído no artº 655º do CPC.


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II. DA (IN)ADMISSIBILIDADE DA REVISTA

II. 1. COMUM (NORMAL)


Como dito, a presente revista é interposta do acórdão proferido pela Relação que, em conferência, incidiu sobre uma decisão singular do Relator que rejeitou a reclamação que havia sido interposta do despacho do juiz da 1ª instância que não admitiu o recurso ali interposto.


Antes de mais, deve anotar-se que a decisão da Relação que admitiu o recurso não vincula o tribunal superior (ut 641º, nº 5 CPC).


Tem sido decidido por este Supremo Tribunal - em sintonia, aliás, com a boa doutrina - que o acórdão proferido em conferência, no Tribunal da Relação, que indefere a reclamação da decisão da 1.ª instância de não admissão de recurso de apelação, confirmando essa decisão, em princípio, não é recorrível para o Supremo Tribunal de Justiça. Assim não será apenas nos casos em que é sempre admissível recurso, ínsitos nos artigos 629.º, n.º 2, e 671.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, pois não estamos perante qualquer uma das situações previstas no artigo 671.º do Código de Processo Civil de admissibilidade do recurso de revista.


Efectivamente, como referem ABRANTES GERALDES, PAULO PIMENTA e PIRES DE SOUSA[1], o facto de à decisão do juiz da 1.ª instância que rejeitou o recurso suceder a decisão do relator, a qual, por sua vez, pode ainda ser submetida à conferência, numa multiplicidade de graus de jurisdição, torna a situação incompatível com a apresentação de um recurso de revista para o Supremo.

E sendo admissível o recurso de revista normal, igualmente o não é a revista excepcional prevista no artigo 672.º do Código de Processo Civil, pois que a admissibilidade deste tipo de recurso apenas permite superar o obstáculo de uma dupla conforme, não deixando de ser exigível que se encontrem verificados os pressupostos gerais da revista normal ou comum, o que, portanto, terá de incluir o preenchimento de uma das situações previstas no artigo 671.º, n.º 1 ou 2 do Código de Processo Civil.

Esta posição é largamente seguida, quer pela doutrina[2], quer pela jurisprudência[3] e que aqui se aceita sem qualquer reserva.


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Ora, tendo a recorrente AA interposto RECURSO DE REVISTA (comum, portanto)  “nos termos do disposto nos artigos 629.º, n.º 1, 652.º, n.º 5, al. b), 671.º, n.º 1 e 674.º, n.º 1, al. b) do Código de Processo Civil, com subida imediata e nos próprios autos, nos termos do disposto no art.º 675.º, n.º 1 do mesmo diploma legal, e com efeito meramente devolutivo, nos termos dos artigos 676.º, n.º 1 a contrario do Código de Processo Civil e 32.º, n.º 4 do Regime Geral do Processo Tutelar Cível, todos aplicáveis ex vi o disposto no art.º 33.º, n.º 1 do Regime Geral do Processo Tutelar Cível”, limitando-se, tão somente, a referir que a decisão é passível de recurso dado que (para além de ter valor -  alçada, que se não questiona) não há dupla conforme (pp 4 das alegações – dado as fundamentações vertidas nas decisões da 1ª instância e da Relação serem substancialmente distintas), sem invocar qualquer das situações que a lei prevê em que é sempre admissível o recurso de revista, é claro que a revista comum, pelo dito supra, não é admissível.

É certo que a recorrente faz menção a alguns arestos dos tribunais superiores, ao longo das suas alegações. Mas tão somente no fico de procurar sustentar a bondade da posição de mérito que defende ao longo das alegações (atinente à contagem dos prazos nestes recursos - se correm, ou não, em férias judiciais); tal menção é feita apenas e só para esse efeito, não se vislumbrando em ponto algum, quer do requerimento de interposição o recurso, quer das doutas alegações recursórias, a mais ínfima menção ou intenção de pretender recorrer com fundamento na contradição de arestos a que alude o artº 629º, nº2, al. d), ex vi do artº 671º, nº2, al. a), ambos do CPC. E, como é evidente, caso pretendesse estribar a revista comum em contradição de acórdãos, nos referidos termos, teria de o dizer/fazer de forma expressa e clara. O que, inequivocamente, não ocorreu em lugar algum da pretensão recursória.

Tanto basta, portanto, para que a revista comum não possa ser admitida, atento o que acima ficou dito.


II. 2. EXCEPCIONAL

Da mesma forma que não é admissível, in casu, a revista normal ou comum, também não há (não pode haver) lugar à revista excepcional - que a Recorrente interpõe subsidiariamente.


O n.º 1 do artigo 672.º citado estatui que «excepcionalmente, cabe recurso de revista do acórdão da Relação referido no n.º 3 do artigo anterior (…)», sendo que esse n.º 3 estatui que «não é admitida revista do acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1.ª instância, salvo nos casos previstos no artigo seguinte».

Ora, tem sido entendimento unânime da Formação a que alude o normativo inserto no aludido artigo 672º, nº 3 do CPCivil, que a admissibilidade da Revista excepcional pressupõe que a Revista autónoma-regra não seja admissível por se verificar a situação de dupla conformidade – pois se aquela não existisse e a Revista não fosse de admitir, não se poderá lançar mão da Revista excepcional – , bem como que a respectiva competência se limita aos pressupostos específicos deste preciso recurso, sendo atribuição do Relator/Colectivo a quem o processo for distribuído a aferição dos pressupostos gerais[4].


Ou seja, a revista excepcional só é admissível se a revista «normal» também o não for mas apenas por existir dupla conforme - ou seja, não fora a dupla conforme e a revista normal seria admissível.

É isso, percute-se, que, de forma pacífica, é reiterado pelo STJ.


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Ora, como ressalta do explanado supra, a revista normal não é, in casu, admissível. E não o sendo, também o não é (não pode ser) a revista excepcional, independentemente, portanto, da dupla conforme.

O que tanto basta para ser arredada a (subsidiária) pretendida revista excepcional.


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III. DECISÃO

Pelo exposto, acorda-se em não admitir o recurso de revista interposto para o Supremo Tribunal de Justiça do Acórdão do Tribunal da Relação ... de 09.11.2021.

           


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Custas pela Recorrente.


Lisboa, 05-05-2022

Fernando Baptista de Oliveira (Juiz Conselheiro Relator)

Vieira e Cunha (Juiz Conselheiro (Juiz Conselheiro - 1º adjunto)

Ana Paula Lobo (Juíza Conselheira (Juíza Conselheira - 2º Adjunto)


______

[1] Código de Processo Civil Anotado, vol. I, Almedina, 2018, pág. 774.

[2] Além da referência constante da nota anterior, ABRANTES GERALDES, Recursos em Processo Civil, Almedina, 2020, pág. 229, e 401, nota 576, e ainda no domínio do Código de Processo Civil de 1961, LEBRE DE FREITAS E ABRANTES MENDES, Código de processo Civil Anotado, vol. III, tomo I, 2.ª ed., Coimbra Editora, 2008, pág. 76, e LUÍS MENDONÇA e HENRIQUE ANTUNES, Dos Recursos, Quid iuris, 2009, pág. 223-224.

[3] Exemplificativamente, os Acórdãos do S.T.J. de 19.02.2015, Proc. 3175/07 (Rel. Maria dos Prazeres Beleza), de 21.02.2019, Proc. 27417/16 (Rel. Rosa Ribeiro Coelho), de 10.12.2019, Proc. 4154/15 (Rel. Nuno Pinto Oliveira), de 25.02.2021, Proc. 12884/19 (Rel. João Cura Mariano); de 28.10.2021, Proc. 2743/17 (Rel. Nuno Pinto Oliveira), e de 9.12.2021, Proc. 2290/099 (Rel. Catarina Serra).

[4] Cfr inter alia os Ac da Formação deste STJ de 17 de Fevereiro de 2011 (Relator Sebastião Póvoas), 18 de Fevereiro de 2012 (Relator Bettencourt de Faria), 22 de janeiro de 2014 (Relator Sebastião Póvoas), 29 de Abril de 2014 (Relator Sebastião Póvoas), 31 de Janeiro de 2014 (Relator Silva Salazar), 6 de Fevereiro de 2014 (Relator Silva Salazar), 27 de Março de 2014 (Relator Moreira Alves), 8 de Abril de 2014 (Relator Moreira Alves), 27 de Janeiro de 2016 (Relator Alves Velho), 7 de Abril de 2016 (Relator Bettencourt de Faria), 15 de Setembro de 2016 (Relator João Bernardo), 22 de Fevereiro de 2017 (Relator Bettencourt de Faria), 25 de Maio de 2017 (Relator Paulo Sá), 22 de Junho de 2017 (Relator Paulo Sá), 21 de Setembro de 2017 (Relator Garcia Calejo), 19 de Outubro de 2017 (Relator João Bernardo), 9 de Novembro de 2017 (Relator João Bernardo), in SASTJ, site do STJ.