Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
18684/15.3T8LSB.L1.S1
Nº Convencional: 4ª SECÇÃO
Relator: GONÇALVES ROCHA
Descritores: ANTIGUIDADE DO TRABALHADOR
MUDANÇA DE PAÍS
DISCRIMINAÇÃO
ÓNUS DA PROVA
Data do Acordão: 05/09/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA
Área Temática:
DIREITO DO TRABALHO – CONTRATO DE TRABALHO / SUJEITOS / IGUALDADE E NÃO DISCRIMINAÇÃO.
DIREITO CIVIL – RELAÇÕES JURÍDICAS / FACTOS JURÍDICOS / NEGÓCIO JURÍDICO / OBJECTO NEGOCIAL, NEGÓCIOS USUÁRIOS / NULIDADE E ANULABILIDADE DO NEGÓCIO JURÍDICO.
Legislação Nacional:
CT/2009: - ARTIGOS 23.º, 24.º, N.º 1 E 25.º.
CT/ 2003: - ARTIGO 122.º, ALÍNEA J).
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 280.º, N.º 1 E 289.º, N.º 1.
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA (CRP): - ARTIGO 13.º, N.ºS 1 E 2.
Legislação Estrangeira:
-LEI GERAL DO TRABALHO DA REPÚBLICA DA GUINÉ-BISSAU, LEI N.º 2 DE 05-04: - ARTIGO 23.º, ALÍNEA I).
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNALDE JUSTIÇA:


-DE 18-12-2013, PROCESSO N.º 248/10.0TTBRG.P1.S1.
Sumário :

I- Tendo a R em vigor uma comunicação de serviço visando uniformizar procedimentos e que aplica aos seus trabalhadores que contratados num país queiram mudar-se para outro por razões da exclusiva conveniência dos trabalhadores, e que só defere tais pedidos se rescindirem o contrato de trabalho celebrado no país de origem e celebrarem um contrato novo, com antiguidade “0”, estas regras não ofendem os direitos dos trabalhadores resultantes da sua antiguidade.

II- Esta imposição da R não é ilegal por pretensa violação da alínea i) do artigo 23° da Lei Geral do Trabalho da República da Guiné-Bissau, e que proíbe o empregador de despedir e readmitir o trabalhador com o propósito de o prejudicar em direitos e garantias decorrentes da sua antiguidade, pois foram as trabalhadoras a denunciar o contrato de trabalho que vigorava naquele país.

III- Não se trata duma mera transferência de local de trabalho pois tendo as trabalhadoras aceitado denunciar os contratos de trabalho celebrados na Guiné-Bissau, não se pode considerar que existe uma transferência de local de trabalho respeitante a um contrato de trabalho extinto.

IV- Por outro lado, sendo as trabalhadoras admitidas em Lisboa para o exercício de funções distintas das que desempenhavam em Bissau, as partes quiseram celebrar um contrato de trabalho novo, com um objecto do contrato diferente do anterior e sujeito a um regime jurídico, legal e convencional, também diverso, por terem deixado de estar sujeitas à disciplina legal advinda da legislação guineense.

V- Invocando as trabalhadoras estar a ser discriminadas em relação a outros trabalhadores que identificaram, competia-lhes alegar e provar que a contagem do tempo de serviço a que a R atendeu em relação a estes resultou duma mudança, a seu pedido, do contrato de trabalho para outro país.

Decisão Texto Integral:
       

                       Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:

1----

AA e

BB instauraram a presente acção com processo comum, emergente de contrato de trabalho, contra

TRANSPORTES AÉREOS PORTUGUESES, SA, pedindo que lhes seja contada a antiguidade, para efeitos de pagamento de diuturnidades/anuidades, desde o início do exercício de funções na Guiné-‑Bissau, devendo ser colocadas no grau VI da carreira de Técnico Comercial, e ainda que lhes sejam pagas as anuidades/diuturnidades e diferenças salariais vencidas, no valor de, respectivamente, € 2.649,49 + € 54.279,00 e € 2.269,90 + € 43.729,00, tudo acrescido de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral e efectivo pagamento.

Para tanto, alegou a 1ª Autora que foi admitida ao serviço da Ré para exercer funções de “Tarefeira” na área de pessoal, contabilidade e secretariado, na representação da R da Guiné-Bissau, passando, a partir de 01/02/1989, a exercer funções de empregada administrativa, e a partir de 01/09/1999, a exercer funções de agente de tráfego, o que cumulou com funções de secretariado, contabilidade e caixa nos escritórios da Ré em Bissau, situação que perdurou até 09/11/2003, passando, a partir de 10/11/2003, a exercer funções em Lisboa, o que havia solicitado em 27/08/2003, e a Ré deferiu com a condição de a mesma subscrever uma declaração mediante a qual rescindia o contrato de trabalho que a ligava à estrutura na Guiné-Bissau, assinando novo contrato de trabalho.

Mais alega que a Ré desconsiderou a sua antiguidade anterior, atribuindo-lhe o grau iniciado de Técnica Comercial, pagando-lhe a quantia de € 647,00 mensais, tendo ascendido, em Maio de 2004, ao sub-grau I, grau I, em consequência do que passou a auferir € 746,00 mensais e, a partir de 01/10/2005, € 780,00 mensais. Em 01/04/2008, transitou para o grau II, auferindo € 920,00 mensais; em 01/04/2010, passou para o grau III, auferindo € 1.120,00 e, em 01/04/2013, passou para o grau IV, passando a auferir € 1.298,00.

A 2ª Autora, por sua vez, alega que foi admitida ao serviço da Ré no dia 21/07/1990, para exercer funções de empregada administrativa na delegação da Guiné- Bissau, passando a exercer funções de Técnica Comercial a partir de 01/09/1999, vindo, a partir de 19/01/2004, a exercer funções em Lisboa, o que solicitou a 01/11/2003, e a Ré deferiu com a condição de a mesma subscrever uma declaração mediante a qual rescindia o contrato de trabalho que a ligava à estrutura na Guiné- Bissau, assinando novo contrato de trabalho.

Mais alega que desta forma a Ré desconsiderou a sua antiguidade anterior, atribuindo‑lhe o grau iniciado de Técnica Comercial, pagando-lhe a quantia de € 647,00 mensais, tendo ascendido em 01/07/2004, ao sub-grau I, grau I, em consequência do que passou a auferir € 746,00 mensais e, a partir de 01/10/2005, € 780,00 mensais. Em 01/04/2007, transitou para o grau II, auferindo € 920,00 mensais; em 01/04/2009, passou para o grau III e em 01/04/2011, passou para o grau IV, auferindo € 1.070,00 até 28/02/2010, e € 1.120,00 a partir daquela data. Em 01/10/2013, passou para o grau V, auferindo € 1.403,00 mensais.

Concluem que, em consequência do que antecede, a Ré não lhes pagou anuidades de 2003/2004 a 2007, sendo-lhes ainda devidas as diferenças salariais reclamadas.

Contestando, alegou a Ré que os contratos de trabalho firmados para o exercício de funções na Guiné-Bissau cessaram por denúncia da 1ª Autora em 09/11/2003 e da 2ª Autora em 15/01/2004; que tais denúncias se fundaram em vontade e razões de ordem pessoal e familiar das trabalhadoras; que os contratos firmados para o exercício de funções em Portugal se iniciaram, respectivamente, a 10/11/2003, e 19/01/2004; que a 2ª Autora só ascendeu à categoria de Técnica Comercial no dia 19/01/2004, já em Lisboa; que o descritivo funcional de Técnica Comercial é distinto na Guiné-Bissau e em Portugal, sendo as funções mais complexas em Portugal; que a comunicação de serviço n.º 25.108, que regula os procedimentos a adoptar em caso de colocação de trabalhadores, a seu pedido, para países diferentes daqueles para que foram contratados, não foi revogada; e ainda, que o regime das anuidades só foi instituído pelo Protocolo de 28/11/1997.

Após audiência de julgamento foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e, por conseguinte, decidiu:

 

1. Condenar TRANSPORTES AÉREOS PORTUGUESES, SA. a reconhecer/ contabilizar a antiguidade de AA a partir de 09/03/1987.

2. Condenar TRANSPORTES AÉREOS PORTUGUESES, SA. a reconhecer/ contabilizar a antiguidade de BB a partir de 21/07/1990.

3. Condenar TRANSPORTES AÉREOS PORTUGUESES, SA. a pagar a AA o valor correspondente às anuidades vencidas desde 10/11/2003, a liquidar, deduzido do valor já pago, a que acrescem juros de mora, à taxa legal, desde 13/07/2015 até integral e efectivo pagamento.

4. Condenar TRANSPORTES AÉREOS PORTUGUESES, SA. a pagar a BB o valor correspondente às anuidades vencidas desde 19/01/2004, a liquidar, deduzido do valor já pago, a que acrescem juros de mora, à taxa legal, desde 13/07/2015 até integral e efectivo pagamento.

5. Absolver TRANSPORTES AÉREOS PORTUGUESES, SA. do demais peticionado por AA.

6. Absolver TRANSPORTES AÉREOS PORTUGUESES, SA. do demais peticionado por BB.

7. Condenar AA, BB e TRANSPORTES AÉREOS PORTUGUESES, SA. a pagarem as custas processuais, na proporção do respectivo decaimento.

           

Interposto recurso de apelação pela R, decidiu o Tribunal da Relação (por maioria) julgar procedente o recurso, pelo que, e revogando a sentença na parte impugnada, absolveu a R de todos os pedidos.

São agora as Autoras que, inconformadas nos trazem revista, cuja alegação remataram com as seguintes conclusões:

- As ora Recorrentes foram admitidas ao serviço da TAP na Guiné-Bissau para exercerem funções na Delegação que esta mantinha naquele país, sob a sua autoridade, direcção e fiscalização, tendo-o continuado a fazer, ininterruptamente, até aos dias de hoje, em Portugal, após deferimento do pedido que apresentaram para passar a exercer funções neste país, existindo, portanto, um vínculo jurídico contínuo entre ambas as partes;

- A alteração de local de trabalho pode operar entre países diferentes, pois a alteração em causa ocorreu sob a alçada da mesma entidade jurídica (TAP), à qual as ora Recorrentes sempre estiveram submetidas;

- a alegada mudança de regime legal e convencional não decorre da mera mudança do local de trabalho, mas resulta antes da imposição pela própria Recorrente dessa mudança de regime como condição da sua aceitação daquela alteração;

- O entendimento do Tribunal da Relação de que a alteração de local de trabalho para país diferente daquele para o qual o trabalhador foi admitido implica a "alteração do respectivo regime jurídico, legal e convencional, podendo representar para o empregador um agravamento da respectiva responsabilidade contratual", não é subsumível à realidade dos factos provados já que esta ocorreria, quanto muito, apenas no plano formal e não de facto, não acarretando para o empregador (a TAP) qualquer agravamento da responsabilidade contratual;

- À data dos factos a legislação guineense era um decalque quase total da legislação portuguesa - veja-se desde logo, a alínea i) do art. 23° da mencionada Lei Geral do Trabalho da República da Guiné-Bissau e a "correspondente" al. j) do art 122.º do Código do Trabalho Português de 2003;

- o Acordo de Empresa (AE) TAP / SIMA de 1997, em vigor em Portugal à data da alteração em causa nos presentes autos, e, em especial, a respectiva Cláusula 24.ª, aplica-se subsidiariamente aos trabalhadores ao seu serviço na Guiné-Bissau, por remissão expressa da Cláusula 40.ª do AE celebrado entre a TAP e os trabalhadores ao seu serviço nesse país (AE publicado no Boletim Oficial da República de Guiné-Bissau nº 21, de 23 de Maio de 1994);

- a mudança das Recorrentes da Guiné-Bissau para Portugal configura uma mera alteração de local de trabalho tendo aquelas exercido as suas funções de forma ininterrupta, primeiro na Guiné-Bissau e depois em Portugal, sempre sob a autoridade e direcção da Recorrente, tendo o douto acórdão ora recorrido aplicado erradamente o direito aos factos;

- para aceitação da transferência decorre do regime constante da Comunicação de Serviço n.º 25.108, pela qual a Recorrente impunha aos seus trabalhadores que, por razões de natureza pessoal, pretendessem ser colocados nos Serviços da Empresa em país diferente daquele para que foram contratados e/ou em que se encontrassem colocados, a cessação do contrato de trabalho no país de origem e celebração do contrato de trabalho no país de origem e celebração de novo contrato do país de destino, a qual tinha que ser necessariamente aceite por estes, sob pena de rejeição do pedido de alteração;

- Ao condicionar a transferência das Recorridas à aceitação da condição estabelecida na Comunicação de Serviço 25.108, a Recorrente tinha como objectivo único a renúncia destas a sua antiguidade na empresa, já que nenhuma outra razão ou fundamento existe para a observância desse procedimento em virtude de estarmos perante a mesma entidade jurídica e haver prestação ininterrupta de funções sob a direcção e autoridade dessa entidade, postergando assim as garantias das trabalhadoras;

- A TAP efectivamente não cessou (directamente) o contrato de trabalho com as ora Recorrentes, mas ao impor para a aceitação da sua transferência para Portugal a condição plasmada na Comunicação de Serviço n.º 25.108 logrou obter o mesmo efeito prático: a cessação do contrato de trabalho e assim obstar a que as mesmas usufruíssem de quaisquer direitos ou regalias decorrentes da antiguidade adquirida com a execução do contrato na Guiné-Bissau;

- as ora Recorridas apenas subscreveram as declarações constantes dos factos provados n.ºs 18) e 30), manifestando a vontade de rescindir o contrato que tinham em vigor, "em consequência directa e necessária" da condição imposta peia comunicação de serviço 25.108, como claramente se comprova pelo facto de tais declarações serem uma minuta elaborada pelos serviços da própria TAP;

- A TAP aproveitou-se da situação de fragilidade das ora Recorrentes que, em virtude da crescente insegurança e instabilidade verificada na Guiné-Bissau, não podiam deixar de aceitar tal condição para obter a referida transferência;

- Todas as disposições legais previstas na legislação passível de ser aplicada ao caso [art. 122.º, al. j)] do Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 09 de Agosto; art. 1.º e art. 23.º, al. i) da Lei n.º 2/86 de 5 de Abril da Guiné-Bissau) têm o propósito único de evitar a fraude à lei e obstar a que os trabalhadores sejam prejudicados, designadamente, por vontade do empregador, ou seja, nas palavras de Monteiro Fernandes, assegurar "uma específica protecção da antiguidade enquanto expressão da continuidade prática (não jurídica) da integração do trabalhador no serviço da entidade patronal";

- O entendimento perfilhado no douto acórdão recorrido não garantiu a protecção dos trabalhadores que são a parte mais fraca da relação de trabalho, ao olvidar-se que o contrato de trabalho se reveste de características especiais, em que a subordinação jurídica e a consequente maior fragilidade do trabalhador face à sua dependência perante o empregador, bem como a necessidade de garantir o emprego, o levam, não raras vezes e contra sua vontade, a tolerar a violação, por parte do empregador, dos seus direitos e/ou garantias laborais;

- É forçoso concluir que as declarações subscritas pelas Recorridas constantes dos factos provados n.ºs 18) e 30), manifestando a vontade de rescindir o contrato que tinham em vigor, "em consequência directa e necessária" da condição imposta pela comunicação de serviço 25.108, são nulas por emergirem de condição contrária a lei imperativa;

- Ao contrário do que do que agora foi decidido, estando no âmbito da liberdade contratual, entendemos que o "ónus" deveria estar do lado da TAP, que teve sempre a possibilidade de não aceitar o pedido de transferência das ora Recorrentes, como bem resume a douta sentença da 1.ª instância: "As Autoras pediram e a Ré anuiu." E "anuiu, porque quis";

- Contrariamente ao decidido pelo Tribunal da Relação e acompanhando o entendimento perfilhado na douta sentença de 1.ª instância, a passagem das trabalhadoras da Guiné-Bissau para Lisboa ocorreu por acordo entre as partes, uma vez que as Recorridas solicitaram a sua transferência e a Recorrida aceitou a mencionada transferência, havendo uma prestação ininterrupta de funções sob a direcção e autoridade da mesma entidade, dentro de um quadro juridicamente idêntico;

- O acórdão que ora se recorre não relevou igualmente o facto de a TAP ter considerado a antiguidade efectiva de catorze trabalhadores que estavam nas mesmas condições das ora Recorrentes ou seja, foram transferidos, a seu pedido e no seu interesse exclusivo, de países de onde inicialmente haviam sido contratados para outros países;

- Ao não reconhecer a antiguidade efectiva das Recorrentes como fez a esses catorze trabalhadores, a TAP tratou de forma diferente trabalhadores em situações idênticas, consubstanciando-se esse comportamento em tratamento desigual, em clara violação do art. 24.º do Código do Trabalho Português, o qual prevê o direito à igualdade no trabalho, tendo os trabalhadores em igualdade de circunstâncias direito à igualdade na promoção e carreiras profissionais.

A TAP contra-alegou, pugnando pela manutenção do decidido, tendo rematado a sua alegação com as seguintes conclusões:

1. Vem o presente recurso interposto do douto Acórdão que revogou a sentença de lª Instância que havia julgado parcialmente procedente a acção, condenando a ora Recorrida a reconhecer a antiguidade da Autora AA desde 9.03.1987 e à Autora BB desde 10.11.2003 e, em consequência, a pagar-lhes as correspondentes anuidades vencidas desde, respectivamente, 10.11.2003 e 19.01.2004.

2. As Recorrentes foram contratadas para o exercício de funções na República da Guiné-Bissau, aplicando-se aos seus contratos de trabalho a lei do trabalho daquele país e os instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho sucessivamente aplicáveis aos trabalhadores da Recorrida naquele mesmo país (Factos 1 a 9, 25 e 26), tendo sido a pedido das mesmas, e exclusivamente por razões pessoais das Recorrentes, que a ora Recorrida as aceitou admitir ao seu serviço em Lisboa (Factos 10, 11, 12, 18 e 28), vigorando na Recorrida a Ordem de Serviço 25.108, de 22.11.1982 (Facto 24).

3. As Recorrentes foram admitidas através de contratos de trabalho celebrados na Guiné - Bissau, aos quais se aplicava Instrumentos de Regulamentação Colectiva do Trabalho exclusivamente para os trabalhadores contratados exercer funções naquele país (à data estava em vigor o AE de 23.05.1994, junto a fls. 244 a 250), bem como a Lei Geral do Trabalho da Guiné - Bissau (à data a Lei n.° 2/86, junta a fls. 251 e sgs), naturalmente também só aplicável naquele país, ou seja, até à sua vinda para Portugal, as Recorrentes nunca aqui haviam trabalhado, nem nunca lhes fora aplicável a lei laboral portuguesa ou a regulamentação colectiva em vigor em Portugal para os trabalhadores da Recorrida.

4. Se é certo que as Recorrentes pretenderam alterar o seu "local de trabalho", não é menos certo que a vinda para Portugal das Recorrentes não configura uma mera e simples alteração do local de trabalho, ou se quer "constitui juridicamente uma alteração do contrato de trabalho"), mas antes que "a transferência de trabalhador, a pedido do próprio, para posto de trabalho situado empais diferente daquele para o qual foi admitido é mais do que mera alteração do local de trabalho, na medida e que implica a alteração do respectivo regime jurídico, legal e convencional, ..." (cfr. douto Ac. do TRL).

5. A simples mudança de local de trabalho está prevista nos dois ordenamentos jurídicos em causa, mas no seu âmbito territorial, ou seja, a alteração do local de trabalho "na" Guiné - Bissau ou "em" Portugal, mas não era aplicável às Recorrentes nem a lei laboral portuguesa à data em vigor, nem o regime convencional da mudança de local de trabalho então em vigor na Recorrida (cfr. a Cl.a 24.a do Acordo de Empresa (AE) TAP / SIMA de 1997, em vigor à data, em Portugal).

6. O que estava em causa, e efectivamente aconteceu, não configurou uma mera alteração do local de trabalho, mas antes toda a mudança do regime jurídico aplicável (quer legal, quer convencional), a tanto não obstando uma qualquer similitude de soluções dos regimes legais em causa, em qualquer caso regimes jurídicos nacionais diversos, deixando de se aplicar o regime legal e convencional em vigor na Guiné-Bissau.

7. O regime da Ordem de Serviço n.° 25.108 em vigor na Recorrida e aplicável, de forma geral e abstracta, a todas as situações que se lhe subsumam, sejam quais forem os regimes jurídicos antes aplicáveis aos trabalhadores que solicitam, exclusivamente por vontade e interesses seus, a vinda para Portugal, e independentemente da maior ou menor similitude com o regime legal ou convencional aplicável aos trabalhadores da Recorrida em Portugal.

8. O argumento de que estamos perante uma "mera alteração do local de trabalho", é contraditório com a conclusão a que se chegou quanto à inserção das Recorrentes na Recorrida e em Portugal, no que diz respeito às categorias profissionais e às actividades que as mesmas passaram a exercer em Portugal, com regimes, por exemplo, na progressão na carreira, que não são minimamente compatíveis com o exercício de actividades ao abrigo de outros regimes legais ou convencionais.

9. A Recorrida formou a sua decisão de aceitar a vinda das Recorrentes para Portugal não só atendendo às razões exclusivamente pessoais por elas invocadas, mas também às condições legais e regulamentares em que tal ocorreria, maxime, a cessação dos contratos na Guiné - Bissau.

10. Não foi a Recorrida quem impôs a condição da cessação dos contratos de trabalho, nem as Recorrentes alguma vez invocaram qualquer vício na formação ou na declaração da vontade de o fazer, potencial gerador de qualquer nulidade ou anulabilidade por essa via, pois seguramente não foram "forçadas" a cessar os seus contratos de trabalho na Guiné - Bissau.

11. A vinda para Portugal das Recorrentes não correspondeu a qualquer interesse, vontade, ou pretensão da Recorrida, sendo certo que até houve alguma dificuldade em as aqui integrar, atentas as diferentes actividades antes desenvolvidas, como ficou demonstrado nos autos.

12. A Recorrida aceitou os pedidos das Recorrentes, e a sua vinda para Portugal, no quadro da sua regulamentação interna, designadamente na convicção da aplicabilidade da Ordem de Serviço n.° 25.108 e da validade e licitude das suas regras.

13. As condições e requisitos constantes da Ordem de Serviço n.° 25.108 - a de cessarem os contratos de trabalho celebrados na Guiné - Bissau - não violam quaisquer garantias legais das Recorrentes enquanto trabalhadoras, quer ao abrigo da Lei Geral do Trabalho daquele país, quer do agora disposto no art.° 122.° alínea j) do Código do Trabalho.

14. A validade da Ordem de Serviço n.° 25.108 terá que ser apreciada à luz do disposto nos então aplicáveis arts. 21.° n.° 1, alínea h) da Lei Geral do Trabalho (Decreto Lei n.° 49.408), para a l.a Autora, e art.° 122.°, alínea j) do Código do Trabalho (em vigor à data da contratação da 2.a Autora, em Portugal).

15. O que ambos os dispositivos legais previam (tal como o regime actual), era a proibição da entidade patronal despedir o trabalhador e readmiti-lo, ainda que com o seu acordo, com o propósito de o prejudicar em direitos ou garantias decorrentes da antiguidade, e tinham, e tem a norma actualmente em vigor, um único propósito: evitar a fraude à lei, e obstar a que os trabalhadores sejam prejudicados, designadamente na sua antiguidade, por vontade do empregador.

16. No caso dos presentes autos, e sem prejuízo de a lei aplicável aos contratos de trabalho das Recorrentes ser a Lei Geral do Trabalho da Guiné - Bissau, a cessação daqueles contratos, e a subsequente celebração de novos contratos de trabalho em Portugal, não teve em vista qualquer intenção de a Recorrida prejudicar as Recorridas, ou evitar que as mesmas usufruíssem de quaisquer direitos ou regalias decorrentes da antiguidade.

17. As Recorrentes sempre tiveram perfeito conhecimento das condições e das regras a que os seus pedidos ficavam sujeitos e, por isso, podiam eventualmente ser deferidos, não tendo a Recorrida proposto, sugerido e muito menos imposto, a vinda das Recorrentes para Portugal, limitando-se a definir as regras em que essa mudança estava sujeita.

18. As Recorrentes quiseram vir para Portugal e aceitaram as regras da mudança, porque entenderam que as mesmas lhes eram, no conjunto das suas pretensões e interesses, mais favoráveis e se coadunavam, com as suas necessidades pessoais.

19. O complexo de direitos e obrigações decorrentes de um contrato de trabalho não se limita à antiguidade ou aos seus efeitos, estando em causa na Ordem de Serviço n.° 25.108 a cessação de um contrato de trabalho com todo um conjunto de regras (que têm por fonte os mais diversos regimes legais e convencionais estrangeiros) que não podiam continuar a vigorar em Portugal, por exemplo, ao nível da integração nas categorias profissionais aqui em vigor, e ao respectivo regime de evolução e progressão.

20. A Recorrida podia pura e simplesmente não ter atendido os pedidos das Recorrentes (facto inquestionável) para virem para Portugal, uma vez que nada a obrigava a aceitá-los e, se o tivesse feito, e as aquelas mantivessem o seu interesse em vir para Portugal, teriam que denunciar os seus contratos na Guiné - Bissau e, nesse caso, já não lhe seria imputável a alegada violação dos direitos e garantias tal como consagradas na alínea j) do art.° 122.° do Código do Trabalho.

21. Assim, é inequívoco que, podendo a Recorrida pura e simplesmente não ter aceite os pedidos das Recorrentes, não violando nenhuma garantia das Recorrentes, também não pode deixar de poder estabelecer os termos e condições em que está disposta a aceitar a sua vinda para Portugal.

22. A cessação dos contratos de trabalho das Recorrentes na Guiné - Bissau, e a posterior admissão em Portugal, não visou prejudicá-las nos seus direitos ou garantias decorrentes da antiguidade.

23. A Recorrida violou o princípio da igualdade ao considerar a antiguidade adquirida ao abrigo de contratos de trabalho celebrados noutros países, relativamente a outros trabalhadores pois (i) não ficou demonstrado (pelo contrário) que as aqueles trabalhadores estavam nas mesmas condições que as Recorrentes, (ii) tratou-se de uma situação excepcional, limitada no seu âmbito de aplicação e com efeitos temporais limitados, uma vez que não foi reconhecida a antiguidade desde a data em que cada um daqueles trabalhadores tinha sido admitido nos países de origem.

24. Andou bem o Tribunal da Relação ao decidir como decidiu, ou seja, que a actuação da Recorrida foi lícita não violando qualquer norma legal ou convencional, designadamente, o disposto no art.° 122.° alínea j) do Código do Trabalho (à data em vigor).

A R também alegou pugnando pela manutenção do decidido.

Admitida revista, a Senhora Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer no sentido da improcedência da revista, por considerar que a denúncia do contrato que as autoras tinham celebrado na Guiné-Bissau e a celebração dum novo contrato de trabalho em Portugal integram uma postura legítima da R, tal como se entendeu no acórdão recorrido, em virtude de ser do interesse das trabalhadoras a sua vinda para Portugal.

              Notificadas deste parecer, nenhuma das partes se pronunciou.

              Cumpre pois decidir.

2---

Para tanto, importa ter presente a seguinte matéria de facto que as instâncias fixaram e não se mostra impugnada na revista:  

 

1. Em 09 de Março de 1987, a 1ª Autora foi admitida pela Ré, como tarefeira, exercendo funções na área de pessoal, contabilidade e secretariado na Representação da Ré na Guiné-Bissau[1].

2. Posteriormente, em 01 de Fevereiro de 1989, a 1ª Autora foi contratada a termo, com a categoria profissional de empregada administrativa, pelo período de seis meses, renovável por igual período, na referida Delegação da Ré na Guiné-Bissau.

3. Nessa altura, o Delegado da TAP na Guiné-Bissau enviou à Ré os respectivos formulários para atribuição à 1ª Autora do “número TAP”.

4. Consequentemente, a Ré atribuiu à 1ª Autora o número TAP 18380/6.

5. Por comunicação datada de 03 de Agosto de 1989, a Ré comunicou à 1ª Autora a renovação do seu contrato de trabalho por mais seis meses, com efeitos desde 01 de Agosto de 1989.

6. Novamente, por comunicação datada de 31 de Janeiro de 1990, a Ré comunicou à 1ª Autora a prorrogação do referido contrato de trabalho por novo período de seis meses, com efeitos desde 1 de Fevereiro de 1990.

7. E, mais uma vez, por comunicação datada de 31 de Julho de 1990, a Ré comunicou à 1ª Autora a prorrogação do referido contrato de trabalho por novo período de seis meses, com efeitos desde 3 de Agosto de 1990.

8. Finalmente, após as sucessivas renovações acima referidas, em 14 de Janeiro de 1991, a Ré informou a 1ª Autora que esta passaria, com efeitos a partir de dia 21 de Janeiro de 1991, a fazer parte dos seus quadros, tornando-se assim trabalhadora efectiva, conforme comunicação de 14 de Janeiro de 1991.

9. Encontrando-se há mais de dez anos a exercer funções com a categoria de Empregada Administrativa, em 01 de Setembro de 1999, a 1ª Autora passou a exercer funções de agente de tráfego, cumulando funções de secretariado, contabilidade e caixa nos escritórios da Ré na cidade de Bissau.

10. Em Agosto de 2003, a 1ª Autora remeteu ao Representante da Ré em funções na Guiné-Bissau, Fernando Carvalho, o fax de fls. 38 dos autos, prestando as seguintes informações:

“CONFORME NOSSO CONTACTO TELEFONICO INFORMO:

COMECEI A TRABALHAR NA TAP COMO TAREFEIRA NO DIA 09 DE MARCO DE 1987;

PASSEI A EMPREGADA EVENTUAL NO DIA 01 DE FEVEREIRO DE 1989;

PASSEI A EMPREGADA EFECTIVA NO DIA 21 DE JANEIRO DE 1991;

PASSEI DO CR A801 PARA O CRA86I DE EMPREGADA CONTABILIDADE PARA AGENTE DE TRÁFEGO NO DIA 01 DE SETEMBRO DE 1999;

MEU NOME COMPLETO: AA;

MINHA FILHA CC TEM 17 ANOS E ESTÁ NO 11º ANO;

MEU FILHO TEM 10 ANOS E ESTÁ NO 5 ANO”.

11. Por e-mail datado de 27-08-2003, Fernando Carvalho remeteu à 1ª Autora o e-mail de fls. 39 dos autos, com o seguinte teor:

“ATT AA,

Aqui vai a minuta da carta que deverás preparar e deixar assinada:

QUOTE

Ex.mo Senhor Representante da TAP Air Portugal para a Guiné-Bissau e Senegal

Bissau

Exmo Senhor,

Por razões que se prendem com a inexistência de condições em Bissau para o prosseguimento dos estudos de minha filha de 17 anos e de meu filho de 10 anos, por um lado, e pelo facto de já não só não ter quaisquer familiares em Portugal, que deles se possam ocupar, mas também pela indisponibilidade bastante de meios financeiros que os habilitem a ali poderem estudar sozinhos, por outro, venho pela presente solicitar os melhores ofícios de V. Exa no sentido de que me possa ser assegurada a minha transferência para os quadros da TAP em Lisboa.

Como é do conhecimento de Vexa iniciei a prestação de serviços à empresa como tarefeira em 1987.03.09. Passei a assumir o estatuto de empregada contratada a termo em 1989.02.01, tendo acabado por ser efectivada em 1991.01.21 como empregada de contabilidade. Em 1999.09.01, após o conflito politico-militar que assolou o país, fui transferida para o CR A861 (Escala de Bissau), onde passei a exercer desde então funções de agente de tráfego.

Esperando o breve diferimento desta minha ansiada pretensão, face ao início do período escolar que se aproxima, apresento a V. Exa os meus melhores cumprimentos.

AA

TAP …/6.”.

12. Em 27-08-2003 a 1ª Autora remeteu a carta de fls. 40 dos autos ao Representante da Ré na Guiné-Bissau, Fernando Carvalho, com o seguinte teor:

“Ex.mo Senhor,

Por razões que se prendem com a inexistência de condições em Bissau para o prosseguimento dos estudos de minha filha de 17 anos e de meu filho de 10 anos, por um lado, e pelo facto de já não só não ter quaisquer familiares em Portugal, que deles se possam ocupar, mas também pela indisponibilidade bastante de meios financeiros que os habilitem a ali poderem estudar sozinhos, por outro, venho pela presente solicitar os melhores ofícios de V.Exª no sentido de que me possa ser assegurada a minha transferência para os quadros da TAP em Lisboa.

Como é do conhecimento de V. Exª iniciei a prestação de serviços à Empresa como tarefeira em 1987.03.09. Passei a assumir o estatuto de empregada contratada a termo em 1989.02.01, tendo acabado por ser efectivada em 1991.01.21 como empregada de contabilidade. Em 1999.09.01, após o conflito político-militar que assolou o País, fui transferida para o CR A861 (Escala de Bissau), onde passei a exercer desde então funções de Agente de Tráfego.

Esperando o breve diferimento desta minha ansiada pretensão, face ao início do período escolar que se aproxima, apresento a V. Exª os meus melhores cumprimentos.

AA

TAP …/6”.

13. Após a apresentação do pedido, no dia 10-10-2003, DD, trabalhador da Ré em funções na Guiné-Bissau, remeteu a EE, Director de Recursos Humanos para o Transporte Aéreo na Ré, o e-mail de fls. 42 com o seguinte teor:

Caro Dr EE,

De acordo com nossa conversa em LIS, informo que a empregada AA estará de férias em Portugal na semana de 20 a 24 Outubro, pelo que será uma boa oportunidade para a entrevistar, com vista e sua transferência para a Sede.

Deste modo, e de acordo com sua disponibilidade, solicito audiência para a Srª AA no dia 20 Out.

Aproveito para relembrar, que a funcionária é uma pessoa eficiente, dedicada, disponível para a empresa.

Aguardo indicações de sua disponibilidade.”.

14. No dia 20-10-2003, EE remeteu a FF, Vice-Presidente Executivo da Ré, o e-mail de fls. 41 dos autos com o seguinte teor:

“Sr. Eng° FF

Solicito a sua autorização para a admissão, a seu pedido, em Lisboa da nossa colega AA que está excedentária na Guiné Bissau e virá ocupar a vaga no CCO resultante do despedimento com justa causa da GG.”.

15. No dia 20-10-2003, HH remeteu a EE o e-mail de fls. 41 dos autos, com o seguinte teor:

“Caro EE,

Em princípio não tenho nada contra. Favor obter o acordo do Sr. II, que devera avaliar se a referida funcionária tem condições para o exercício da função.

Cpts

FF”.

16. No dia 20-10-2003, EE remeteu o e-mail de fls. 41 dos autos com o seguinte teor:

“Sr. Eng° FF

O sr. II entrevistou a Empregada e considerou que a mesma tinha condições para ocupar o lugar.”

17. No dia 20-10-2003, FF remeteu a EE o e-mail de fls. 41 dos autos com o seguinte teor.

“Ciente. Obrigado, pode prosseguir com a transferência.”

18. No dia 04-11-2003 a 1ª Autora remeteu ao Representante na Guiné-Bissau a missiva de fls. 43 dos autos com o seguinte teor:

“Ex.mo Senhor,

Eu, AA, pretendo rescindir o contrato de trabalho que me liga à estrutura da Empresa na Guiné-Bissau com efeitos a 09 de Novembro de 2003.

Pretendo em 10 de Novembro de 2003, celebrar novo contrato de trabalho ao abrigo das disposições legais vigentes na Sede.”.

19. A 1ª Autora passou a exercer funções em Portugal, na sede (Aeroporto de Lisboa), a partir de 10-11-2003, tendo-lhe a Ré atribuído a categoria profissional de Técnica Comercial Iniciada e a antiguidade a 10-11-2003.

20. No dia 14-04-2004, a 1ª Autora remeteu ao Director de Recursos Humanos em funções na Ré a missiva de fls. 83 dos autos, solicitando: “Se digne a considerar a sua antiguidade para efeitos de facilidades de passagens a partir de 01 de Fevereiro de 1989 data em que fui admitida em Bissau.”.

21. O requerido pela 1ª Autora em 14-04-2004, foi deferido pela Ré nos termos constantes da informação número 53/TA/DRH junta a fls. 84 dos autos, cujo teor se reproduz na íntegra.

22. Por cartas datadas de 26-01-2005, 09-09-2005, 18-10-2005 e 06-06-2006 juntas a fls. 89, 90-91 e 95-96 dos autos, cujo teor se dá como reproduzido na íntegra, a 1ª Autora reclamou junto da Ré que a sua antiguidade fosse considerada desde a altura em que iniciou funções na Guiné-Bissau.

23. A Ré respondeu às missivas da 1ª Autora nos termos constantes de fls. 92 dos autos cujo teor se reproduz na íntegra.

24. A Ré emitiu, para todos os trabalhadores da área do ACT e delegações, a comunicação do serviço com a Referência 25.108, datada de 22-11-1982, com o seguinte teor:

ASSUNTO: Colocação de trabalhadoras, a seu pedido, em Serviços da TAP situados em países diferentes daqueles para que foram contratados.

Com vista a assegurar um tratamento uniforme para a colocação de trabalhadores, a seu pedido, em Serviços da TAP situados em países diferentes daqueles para que foram contratados, deverão ser observados os seguintes procedimentos:

1. Quando um trabalhador da TAP, por razões de natureza pessoal, pretenda ser colocado nos Serviços da Empresa em país diferente daquele para que foi contratado ou em que se encontra colocado, deve formular tal pretensão em documento dirigido, através da respectiva hierarquia, à Direcção dos Serviços de Administração do Pessoal (D.G.P.) com cópia para a Direcção Geral Comercial (Órgão da Sede).

2. Nesse documento, deve o interessado declarar de forma expressa e inequívoca que:

a) aceita rescindir o contrato de trabalho que o liga à estrutura da Empresa no país em que está colocado caso a eventualidade de colocação em outro país se concretize

b) aceita celebrar novo contrato de trabalho ao abrigo das disposições legais vigentes nesse país.

3. só serão tidos em consideração, para eventual satisfação, os pedidos que venham formulados nos termos dos n.ºs 1. e 2..

4. São da exclusiva responsabilidade dos interessados, caso a TAP venha a autorizar a nova colocação solicitada:

a) a mudança de residência;

b) o transporte de bens, designadamente quanto a transporte, despacho aduaneiro, alfandegas, etc.;

c) obtenção de documentos e observância das formalidades que o habilite a exercer legalmente uma actividade profissional no país para onde deseje emigrar.

5. O novo contrato a que se refere a alínea b) do n.º 2 acima deve ser reduzido a escrito, antes de efectuada a transferência.

6. A antiguidade a considerar, para todos os efeitos conexos com o novo contrato de trabalho, será exclusivamente, aquela que na execução desse mesmo contrato for sendo adquirida, exceptuando-se, porém, as situações de regresso à sede ou a delegação onde o trabalhador já tenha estado vinculado por contrato de trabalho, casos em que a antiguidade já adquirida na execução desse contrato de trabalho deverá também ser considerada.

Esclarece-se ainda que, para além destas excepções, a antiguidade de companhia anteriormente adquirida em qualquer situação poderá ser tida em conta para efeitos de concessão de facilidades de passagem, mediante proposta dos Serviços, a apreciar caso a caso pelo Conselho de Gerência.

7. Esta Comunicação Serviço substitui a n.º 30518 de 07.12.81.”.

25. Em 21 de Julho de 1990, a 2ª Autora foi admitida pela Ré, com contrato a termo certo, com a categoria profissional de empregada administrativa, na sua Delegação na Guiné-Bissau.[2]

26. Posteriormente, em 15 de Fevereiro de 1992, a 2ª Autora foi admitida como trabalhadora efectiva, na referida representação da Ré na Guiné-Bissau.

27. Aquando da sua passagem para os quadros da Ré, esta atribuiu à 2ª Autora o número TAP 19720/2.

28. No dia 01-11-2003 a 2ª Autora remeteu ao representante da Ré em Bissau a missiva de fls. 103 dos autos, com o seguinte teor:

“Assunto: Pedido de Transferência para Portugal

BB, funcionária da TAP Air Portugal em Bissau desde 21 de Julho de 1990, vem por este meio expor a consideração de V. Exª o seguinte:

1 - Por ter dois filhos menores, que necessitam de uma formação sólida, o que não é possível no actual contexto sócio-político por que passa a Guiné-Bissau, em que os sectores da Educação e Saúde são os mais negligenciados;

2 - Pelo facto de seu esposo ter decidido fixar residência em Portugal a fim de garantir uma melhor educação para os filhos;

3 - Por se encontrar sozinha na Guiné-Bissau, e necessitar reunificar a família, tendo dado entrada nos SEF- Serviços de Estrangeiros e Fronteiras de Portugal do Pedido de Residência Permanente,

Vem, mui respeitosamente, solicitar os bons ofícios de V. Exa. no sentido de autorizar a sua transferência para Portugal.”.

Na expectativa de que este assunto merecera a sua atenção, aguarda deferimento.”.

29. No dia 31-12-2003, JJ, Psicóloga em funções na Ré, remeteu a KK e a EE o e-mail de fls. 104, com o seguinte teor:

“Na sequência do processo supra citado e conforme acordado, a funcionária LL efectuará um período de formação On-Job de 29/12/2003 a 8/1/2004, após o qual, se avaliado positivamente, poderá apresentar-se em 19/1/2004 para início de funções na Sede, no TA/CO/Irregularidades de Passageiros.”.

30.. No dia 15-01-2004, a 2ª Autora remeteu ao representante da Ré na Guiné a missiva de fls. 105 dos autos com o seguinte teor:

“Eu, BB, pretendo rescindir o contrato de trabalho que me liga à estrutura da empresa na Guiné-Bissau com efeitos a partir de 25 de Janeiro de 2004 a fim de celebrar novo contrato de trabalho a 26 de Janeiro de 2004 ao abrigo das disposições legais vigentes na sede.”.

31. No dia 04-02-2004, EE remeteu a MM e NN, ambos administradores da Ré, o e-mail de fls. 122 dos autos com o seguinte teor:

“Subject: RE: Transferência da trabalhadora LL da Guiné-Bissau para a Loja de Vendas de Lisboa ….”.

32. No dia 04-02-2004, MM remeteu o e-mail de fls. 122 a EE, com o seguinte teor:

“Subject: Transferência da trabalhadora LL da Guiné-Bissau para a Loja de Vendas de Lisboa

Sr. Eng° OO

Solicito a sua autorização para admitir em Lisboa a nossa funcionária LL que se encontra excedentária na Guiné- Bissau.

Esta trabalhadora vem ocupar a vaga em aberto pela demissão com justa causa do trabalhador PP.

Em termos de concretização da transferência a trabalhadora pedirá demissão, a seu pedido, na Guiné-Bissau, entrando com antiguidade “0” em Lisboa, tal como é prática na Empresa.”

33. A 2ª Autora passou a exercer funções em Portugal, na sede da Ré (Aeroporto de Lisboa), a partir de 19-01-2004, tendo-lhe a Ré atribuído a categoria de Técnica Comercial iniciada e a sua antiguidade a 19-01-2004.

34. Por cartas datadas de 25-05-2005 e 01-11-2005, juntas a fls. 34 e 35 dos autos, cujo teor se dá como reproduzido na íntegra, a 2ª Autora reclamou junto da Ré que a sua antiguidade fosse considerada desde a altura em que iniciou funções na Guiné-Bissau.

35. A Ré respondeu à 2ª Autora nos termos constantes da missiva de fls. 120 dos autos, cujo teor se dá como reproduzido na íntegra.

36. Em 1999 a 2ª Autora exercia funções no balcão de vendas/passageiros da delegação da Guiné Bissau, procedendo ao atendimento de passageiros, prestando informações, fazendo o cálculo de tarifas, emitindo bilhetes, incluindo para transporte de carga, assim como o manifesto de carga.

37. Nos dias de voo a 2ª Autora também dava apoio no aeroporto, fazendo o check in e o cálculo do peso do avião.

38. A 2ª Autora teve formação na Ré de 29/12/2003 a 08/01/2004, tendo ficado afecta, na sede da Ré em Lisboa, ao sector das irregularidades tidas no transporte aéreo, controlo operacional, “TA/CO/Irregularidades de Passageiros”, onde faz a protecção dos passageiros sempre que os mesmos sofrem constrangimentos relacionados com o voo e que determinem a sua intervenção (reservas em hotéis, novos embarques, etc.).

39. No dia 04/04/2000 a Ré decidiu considerar a antiguidade dos 14 trabalhadores identificados a fls. 88 dos autos, desde a data em que cada um foi admitido ao seu serviço em outros países, sem prejuízo dos descontos ali mencionados, circunscrevendo os efeitos de tal decisão, no que tange ao pagamento de anuidades, a partir de 04 Abril de 2000, conforme correcções de fls. 169 dos autos, cujo teor se reproduz na íntegra.

40. A 1ª Autora foi admitida em 10/11/2003, para o Grau Iniciado de Técnico Comercial, com o vencimento base de € 647,00.

a) em 01/05/2004, passou para o Grau I, sub grau zero, com o vencimento base de € 746,00;

b) em 01/10/2005, passou ao Grau I, com vencimento base de € 780,00;

c) em 01/04/2008, passou para o Grau II, com o vencimento base de € 946,00;

d) em 01/04/2010, passou para o grau III, com o vencimento base de € 1.120,00;

e) em 01/04/2013, passou para o grau IV, com o vencimento base de € 1.298,00.

41. A 2ª Autora foi admitida em 19/01/2004, para o Grau Iniciado de Técnico Comercial, com o vencimento base de € 647,00.

a) em 01/07/2004, passou para o Grau I, sub grau zero, com o vencimento base de € 746,00;                                                                                                                                                                

b) em 01/10/2005, passou ao Grau I, com o vencimento base de € 780,00;

c) em 01/04/2007, passou para o Grau II, com o vencimento base de € 920,00;

d) em 01/04/2009, passou para o Grau III, com o vencimento base de € 1.100,00;

e) em 01/03/2010, no grau III, passou a ter o vencimento base de € 1.120,00;

f) em 01/04/2011, passou para o grau IV, com o vencimento base de € 1.298,00;

g) em 01/10/2013, passou para o grau V, com o vencimento base de € 1.403,00.

3----

E decidindo:

Discute-se na revista se as autoras têm direito a somar à sua antiguidade na R em Lisboa, o período de tempo em que para ela trabalharam na Guiné-Bissau.

Efectivamente, tendo sido contratadas em Bissau e para aí exercerem funções ao serviço da R, em certa altura da vigência desse contrato de trabalho as autoras manifestaram junto da empresa interesse em mudar-se para Lisboa, por razões da sua vida particular.

A R anuiu nesta mudança, mas subordinando-a à observância das regras internas vigentes na empresa e que passavam pela denúncia do contrato de trabalho que as ligava à estrutura da empresa na Guiné-Bissau e pela celebração dum novo contrato de trabalho ao abrigo das disposições legais vigentes na sede.

Discute-se assim se este procedimento da R é legal.

As instâncias divergiram na sua posição sobre a questão, pois entendeu a 1ª instância que tal conduta contraria lei imperativa - a alínea j) do artigo 122º do CT de 2003 e o artigo 23º al. i) da lei geral do trabalho da Guiné-Bissau, aprovada pela lei nº 2/86 de 5/4 - concluindo assim pela nulidade das declarações de vontade apresentadas pelas AA de denunciarem os contratos que haviam celebrado na Guiné-Bissau, tudo ao abrigo dos artigos 280º, nº 1 e 289º, nº 1, aplicáveis ex vi do artigo 295º, todos do CC.

E nesta linha considerou que a passagem das AA para Lisboa constituiu uma mera alteração do contrato de trabalho, razão pela qual condenou a R a reconhecer-lhes a antiguidade desde que as mesmas foram admitidas ao seu serviço, ainda que para exercer funções na delegação da Guiné-Bissau.

Já a Relação entendeu que a conduta da empresa foi legal, e por isso a antiguidade das trabalhadoras conta-se apenas a partir da vigência dos contratos de trabalho que estas celebraram em Lisboa.

É contra tal entendimento que se insurgem as recorrentes, argumentando que a sua passagem para o serviço da R, em Portugal, integra uma mera mudança de local de trabalho; que a comunicação de serviço da R nº 25 108 viola lei imperativa, postergando assim garantias dos trabalhadores concernentes com a sua antiguidade; e que a conduta da R viola o artigo 24º do Código do Trabalho Português, por afrontar o direito à igualdade entre trabalhadores.

Sendo estas as questões a apreciar na revista, vejamos se as recorrentes têm razão.

3.1---

Quanto à colocação de trabalhadores, a seu pedido, em Serviços da TAP situados em países diferentes daqueles para que foram contratados, a R tem em vigor a comunicação do serviço com a Referência 25.108, datada de 22-11-1982, e que é do seguinte teor:

“1. Quando um trabalhador da TAP, por razões de natureza pessoal, pretenda ser colocado nos Serviços da Empresa em país diferente daquele para que foi contratado ou em que se encontra colocado, deve formular tal pretensão em documento dirigido, através da respectiva hierarquia, à Direcção dos Serviços de Administração do Pessoal (D.G.P.) com cópia para a Direcção Geral Comercial (Órgão da Sede).

2. Nesse documento, deve o interessado declarar de forma expressa e inequívoca que:

a) aceita rescindir o contrato de trabalho que o liga à estrutura da Empresa no país em que está colocado caso a eventualidade de colocação em outro país se concretize

b) aceita celebrar novo contrato de trabalho ao abrigo das disposições legais vigentes nesse país.

3. só serão tidos em consideração, para eventual satisfação, os pedidos que venham formulados nos termos dos n.ºs 1. e 2.”

Tendo a R agido de acordo com esta orientação quando as autoras manifestaram a vontade de se mudar para Lisboa por razões da sua exclusiva conveniência, depois de terem sido contratadas em Bissau e para aí exercerem funções ao seu serviço, sustentam as recorrentes que se trata duma mera transferência de local de trabalho.

 

Mas não podemos dar-lhes razão.

Efectivamente, no dia 04-11-2003, a 1ª Autora remeteu ao Representante na Guiné-Bissau a missiva de fls. 43 dos autos com o seguinte teor:

“Ex.mo Senhor,

Eu, AA , pretendo rescindir o contrato de trabalho que me liga à estrutura da Empresa na Guiné-Bissau com efeitos a 09 de Novembro de 2003.

Pretendo em 10 de Novembro de 2003, celebrar novo contrato de trabalho ao abrigo das disposições legais vigentes na Sede.”.

E no dia 15-01-2004, a 2ª Autora remeteu ao representante da Ré na Guiné a missiva de fls. 105 dos autos com o seguinte teor:

“Eu, BB, pretendo rescindir o contrato de trabalho que me liga à estrutura da empresa na Guiné-Bissau com efeitos a partir de 25 de Janeiro de 2004, a fim de celebrar novo contrato de trabalho a 26 de Janeiro de 2004, ao abrigo das disposições legais vigentes na sede.”.

Assim, tendo as autoras aceitado fazer cessar os respectivos contratos que haviam celebrado com a R em Bissau, não podemos considerar que se trata duma mera transferência de local de trabalho, pois não pode haver transferência de local de trabalho respeitante a um contrato de trabalho que se extinguiu.

Por outro lado, o contrato de trabalho celebrado em Lisboa foi para o exercício de funções completamente distintas das que as recorrentes desempenhavam em Bissau, pois a 1ª Autora passou a exercer funções no aeroporto de Lisboa com a categoria profissional de Técnica Comercial, enquanto na Guiné-Bissau exercia ultimamente funções de agente de tráfego, e que cumulava com funções de secretariado, contabilidade e caixa.

 

E quanto à 2ª Autora, quando passou a exercer funções em Portugal foi para exercer as funções da categoria de Técnica Comercial iniciada, enquanto na Guiné-‑Bissau detinha a categoria de técnica administrativa.

Donde termos de concluir que a passagem das recorrentes para Lisboa não constitui uma mera alteração do local de trabalho, pois constituiu uma alteração muito mais profunda por terem vindo ocupar um posto de trabalho duma categoria profissional distinta, e em país diferente daquele para que tinham sido contratadas.

Assim, tendo havido uma mudança do objecto do contrato e do respectivo regime jurídico, por terem deixado de estar sujeitas à disciplina legal advinda da legislação guineense, temos de concluir que estamos perante um novo contrato de trabalho, sem qualquer ligação com o contrato anterior.

Por isso, não se tratando duma mera mudança de local de trabalho, resta-‑nos analisar a questão sob o prisma da legalidade da actuação da R, sendo de aferir se era legal esta impor às trabalhadoras que fizessem cessar o contrato de trabalho que haviam celebrado na Guiné-Bissau e a celebração dum novo contrato em Lisboa, que começaria com antiguidade “0”.

Temos antes de mais de definir qual o regime legal que lhes era aplicável.

Ora, é indiscutível que, tendo as autoras sido admitidas ao serviço da R na Guiné-Bissau, enquanto aí exerceram funções foi-lhes aplicável apenas e só a lei e os instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho daquele país, mormente a lei geral do trabalho aprovada pela L. nº 2/86, publicada no Boletim Oficial da República da Guiné-Bissau de 5/4/86, parcialmente junta a fls. 251 e seguintes e o AE entre a TAP – Air Portugal e os trabalhadores ao seu serviço na delegação da Guiné Bissau, publicado no Boletim Oficial da Oficial da República da Guiné Bissau de 23/5/94, junto a fls. 244/250.

E só quando celebraram o contrato de trabalho em Lisboa é que passaram a ficar sujeitas ao regime legal português e à contratação colectiva que vincula a R no território nacional.

Por isso, a legalidade da actuação da R tem de ser apreciada à luz da lei guineense.

Sustentam as recorrentes que a imposição da R de fazerem cessar os contratos que haviam celebrado em Bissau é ilegal por violar a alínea i) do artigo 23° da mencionada Lei Geral do Trabalho da República da Guiné-Bissau, e que proíbe o empregador de despedir e readmitir o trabalhador com o propósito de o prejudicar em direitos e garantias decorrentes da antiguidade.

Mas não podemos dar-lhes razão.

Efectivamente, as autoras não foram vítimas dum qualquer despedimento promovido pela empresa, pois foram elas a denunciar o contrato de trabalho que vigorava na Guiné-Bissau.

Daí que não tenha havido violação do mencionado preceito.

Além do mais, a proibição resultante do artigo 23º, alínea i) da Lei Geral do Trabalho da República da Guiné Bissau visa proteger o trabalhador perante propósitos do empregador de o prejudicar quanto aos direitos e garantias decorrentes da antiguidade, objectivo que não se descortina no presente caso, pois a comunicação de serviço com a Referência 25.108, visa assegurar um tratamento uniforme para a colocação de trabalhadores, a seu pedido, em Serviços da TAP situados em países diferentes daqueles para que foram contratados.

Além disso, tendo as recorrentes aceitado as regras desta Comunicação em vigor na R, ao actuarem de acordo com as mesmas denunciando os respectivos contratos, temos de considerar que estamos perante um negócio jurídico que as autoras realmente quiseram e aceitaram em virtude deste satisfazer os seus objectivos pessoais, pois a sua mudança para Lisboa era da sua exclusiva conveniência.

Por outro lado, as autoras tiveram perfeito conhecimento que eram estas as regras vigentes na empresa, pois bem sabiam que os seus pedidos de mudança de país só seriam deferidos se fizessem cessar os contratos que vigoravam na Guiné-Bissau.

Por isso, tendo-se conformado com estas normas, temos de considerar legal a actuação da R, instituída pela “comunicação do serviço com a Referência 25.108”, datada de 22-11-‑1982, e que subordina a colocação de trabalhadores, a seu pedido, em serviços da TAP situados em países diferentes daqueles para que foram contratados, à existência duma denúncia do contrato que vigorava, com a consequente celebração dum novo contrato no país escolhido por aqueles trabalhadores.

 

Invocam ainda as recorrentes a conduta da R viola o Acordo de Empresa (AE) TAP / SIMA de 1997, em vigor em Portugal à data da alteração em causa nos presentes autos, e, em especial, a respectiva Cláusula 24.ª.

Mas não têm razão, dado que não estamos perante uma mera alteração do local de trabalho conforme já vimos.

E além disso, esta contratação colectiva só se aplica em Portugal, pelo que nunca se aplicaria à denúncia dos seus contratos operada na Guiné-Bissau..

 

3.2---

Resta apreciar a questão suscitada pelas recorrentes ao alegarem que a conduta da R viola o direito à igualdade entre trabalhadores, infringindo o artigo 24º do Código do Trabalho Português, invocando para tanto que decidiu considerar a antiguidade dos 14 trabalhadores identificados a fls. 88 dos autos, desde a data em que cada um foi admitido ao seu serviço em outros países.

Vejamos então se esta questão procede.

Conforme resulta do nº 1 do artigo 13º da Constituição da República Portuguesa, todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei, consagrando ainda o nº 2 que ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual.

Esta doutrina tem reflexo directo nos artigos 23º, 24º e 25º do CT/2009, estabelecendo o nº 1 do artigo 24º que o trabalhador tem direito à igualdade no acesso ao emprego e no trabalho, preceito que visa garantir-lhe que não seja vítima de diferenciações materialmente infundadas, sem qualquer fundamento razoável ou justificação objectiva e racional.

Por outro lado, o artigo 25.º proíbe o empregador de praticar qualquer tipo de discriminação, directa ou indirecta, advinda nomeadamente dos factores identificados no nº 1 do artigo anterior. 

Invocam as trabalhadoras que a R, ao não satisfazer a sua pretensão de contagem do tempo de trabalho prestado na Guiné-Bissau, está a violar o princípio da igualdade e está a discriminá-las em relação aos 14 trabalhadores identificados a fls. 88 dos autos.

Resulta com efeito do ponto 39 da matéria de facto que, no dia 04/04/2000, a Ré decidiu considerar a antiguidade desses trabalhadores desde a data em que cada um foi admitido ao seu serviço em outros países, sem prejuízo dos descontos ali mencionados.

Não se apuraram porém as condições concretas que levaram a R a contar o tempo de serviço desses trabalhadores, o que era essencial para que ficasse demonstrada a invocada discriminação.

Efectivamente, apesar da regra probatória mais favorável que vem estabelecida no nº 5 do artigo 25º do CT, competia às recorrentes alegar e provar que a contagem do tempo de serviço a que a R atendeu em relação aos trabalhadores identificados resultou também duma mudança, a seu pedido, do contrato de trabalho para outro país, doutrina que este Supremo Tribunal vem seguindo, nomeadamente no acórdão de 18-12-2013, Recurso n.º 248/10.0TTBRG.P1.S1, desta 4.ª Secção (Mário Morgado).

Como não se sabe se assim foi, esta questão também improcede.

4---

            Termos em que se acorda em negar a revista.

            Custas na revista e nas instâncias a cargo das recorrentes.

 

Anexa-se sumário do acórdão.

Lisboa, 9 de Maio de 2018

Gonçalves Rocha (Relator)

Leones Dantas

Júlio Vieira Gomes

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[1] Adiante rectificada a redacção substituindo a expressão em itálico por “para exercer funções”.
[2] Adiante aditada a expressão “…para aí exercer funções”