Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
17/15.0YRLSB.S1
Nº Convencional: 7ª SECÇÃO
Relator: ANTÓNIO JOAQUIM PIÇARRA
Descritores: PROPRIEDADE INDUSTRIAL
PATENTE
TRIBUNAL ARBITRAL
RECURSO DA ARBITRAGEM
RECURSO DE REVISTA
ADMISSIBILIDADE DE RECURSO
OPOSIÇÃO DE JULGADOS
QUESTÃO RELEVANTE
Nº do Documento: SJ
Data do Acordão: 05/25/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NÃO SE TOMA CONHECIMENTO DO RECURSO
Área Temática:
DIREITO DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL - PATENTES - MEDICAMENTOS DE REFERÊNCIA E MEDICAMENTOS GENÉRICOS.
DIREITO ARBITRAL - DECISÃO ARBITRAL / IMPUGNAÇÃO DE DECISÃO ARBITRAL / COMPETÊNCIA DOS TRIBUNAIS ESTADUAIS.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL - PROCESSO DE DECLARAÇÃO / RECURSOS / ADMISSIBILIDADE DO RECURSO.
Doutrina:
- Alexandre Soveral Martins, Arbitragem e propriedade industrial: medicamentos de referência e medicamentos genéricos, in R.L.J., ano 144.º, n.º 3993, 432.
- Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 8.ª edição, 116.
- António Campinos e Luís Couto Gonçalves, “Código da Propriedade Industrial” Anotado, Almedina, 149.
- António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 2013, págs. 42 a 44.
- Armindo Ribeiro Mendes e Outros, “Lei da Arbitragem Voluntária” Anotada, Almedina, 2012, 113.
- Dário Moura Vicente, «O Regime Especial de Resolução de Conflitos em Matéria de Patentes (Lei N.º 62/2011)», R.O.A., ano 72, vol. III, 974, 976.
- Gomes Canotilho, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 3.ª Edição, Almedina, 467.
- Jorge Miranda e Rui Medeiros, “Constituição da República Portuguesa” Anotada, tomo I, Coimbra, 200 a 202.
- José de Oliveira Ascenção, in O Direito, Introdução e Teoria Geral, 13ª edição refundida, Almedina, 408 e 409.
- José Lebre de Freitas/A. Ribeiro Mendes, “Código de Processo Civil” Anotado, 2.ª edição., Tomo I, Volume 3.º, 17.
- Lopes do Rego, O Direito fundamental de acesso e a Reforma do Processo Civil – Estudos em Homenagem a Cunha Rodrigues, vol. I, Coimbra, 764.
- Luís Correia de Mendonça/Henrique Antunes, Dos Recursos, 2009, 315.
- Luís Couto Gonçalves, in Cadernos de Direito Privado 56.
- Mário Esteves de Oliveira e Outros, “Lei da Arbitragem Voluntária” Comentada, Almedina, 2014, 689.
- Pedro Caridade Freitas, «Medicamentos genéricos e tutela dos direitos de propriedade intelectual», Estudos de Direito de Propriedade Intelectual em Homenagem ao Prof. Doutor José de Oliveira Ascensão 50 anos de vida académica, Almedina, 1030.
- Pedro Metello Nápoles, “Lei da Arbitragem Voluntária” Anotada, 2.ª Edição, 150.
- Rui Medeiros, «Arbitragem necessária e Constituição», Estudos em Homenagem ao Cons. Artur Maurício, Coimbra, 1321.
- Sofia Ribeiro Mendes, «O Novo Regime da Arbitragem Necessária de Litígios Relativos a Medicamentos de Referência e Genéricos (Alguns Problemas)», Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor José Lebre de Freitas, vol. II, 1012 a 1014, 1028.
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGO 9.º.
CÓDIGO DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL (CPI): - ARTIGOS 46.º, N.º 3, 101.º.
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGO 629.º, N.º 2.
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA (CRP): - ARTIGOS 20.º, N.º 1, 32.º, N.º 1, 210.º, N.ºS 1 E 4, 211.º, N.º 2.
LEI DA ARBITRAGEM VOLUNTÁRIA (LEI N.º 63/2011, DE 14 DE DEZEMBRO): - ARTIGOS 59.º, N.º 1, AL. G) E O N.º 8.
LEI N.º 62/2011, DE 12 DE DEZEMBRO: - ARTIGOS 2.º, 3.º, N.º 7.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

-DE 17/06/2014, PROCESSO N.º 21/09.8TBMCN.P1.S1-A, E DE 19/05/2016, PROCESSO N.º 122702/13.5YIPRT.P1.S1, ACESSÍVEIS EM WWW.DGSI.PT .
-DE 13/07/2010, PROCESSO N.º 4210/06.9TBGMR.S1, DE 18/04/2012, PROCESSO N.º 3962/08.6TJCBR.C1-A.S1, DE 20.11.2014, PROCESSO N.º 7382/07.1TBVNG.P1.S1, DE 20.05.2015, PROCESSO N.º 321/12.0YHLSB.L1.S1, E DE 13.09.2016, PROCESSO N.º 671/12.5TBBCL.G1.S1, ACESSÍVEIS ATRAVÉS DE WWW.DGSI.PT .
- DE 06/05/2014, PROCESSO N.º 402/13.2YRLSB.S1
- DE 16/09/2014, PROCESSO N.º 183/14.2YRLSB.L1.S1
- DE 26/03/2015, PROCESSO N.º 1203/13.3YRLSB.S1.
- DE 14/04/2015, PROCESSO N.º 512/14.9YRLSB-B.S1
- DE 02/02/2017, PROCESSO N.º 393/15.5YRLSB.S1, ACESSÍVEL EM WWW.DGSI.PT .

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ACÓRDÃOS DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL:

-N.º 31/87 (DE 28 DE JANEIRO DE 1987) E 163/90 (DE 23 DE MAIO DE 1990) - AMBOS ACESSÍVEIS EM WWW.TRIBUNALCONSTITUCIONAL.PT .
-N.º 52/92, DE 5 DE FEVEREIRO DE 1992, PUBLICADO NO D.R., I SÉRIE, DE 14 DE MARÇO DE 1992, 1315 A 1321, E ACESSÍVEL EM WWW.TRIBUNALCONSTITUCIONAL.PT .
-N.º 123/2015, DE 12 DE FEVEREIRO DE 2015, PUBLICADO NO D.R., II SÉRIE, DE 7 DE JULHO DE 2015, PÁGS. 18143 A 18166. TRATA-SE DE ORIENTAÇÃO ULTERIORMENTE REAFIRMADA NOS ACÓRDÃOS DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL N.º 108/2016 (DE 24 DE FEVEREIRO DE 2016) E 435/2016 (DE 16 DE JULHO DE 2016), AMBOS ACESSÍVEIS WWW.TRIBUNALCONSTITUCIONAL.PT .
Sumário :
I - Em regra, não cabe recurso para o Supremo Tribunal de Justiça do acórdão do Tribunal da Relação proferido no âmbito dos litígios emergentes de direitos de propriedade industrial relativos a medicamentos de referência e medicamentos genéricos.

II - Essa regra de irrecorribilidade, fixada no n.º 7 do artigo 3º da Lei n.º 62/2011, de 12 de Dezembro, é, contudo, excepcionada se invocada alguma das situações elencadas no artigo 629º, n.º 2, do Cód. Proc. Civil, nomeadamente a contradição de julgados.

III - A contradição de julgados aqui equacionada e que releva como conditio da admissibilidade do recurso de revista pressupõe, além de mais, a coincidência dos mesmos factos em ambas as decisões e a pronúncia sobre a mesma questão fundamental de direito.

IV - A questão de direito fundamental só é a mesma, para este efeito, quando a subsunção do mesmo núcleo factual seja idêntica (ou coincidente), mas tenha, em termos de interpretação e aplicação dos preceitos sido feita de modo diverso.

V - Não releva, para tal efeito, a mera divergência argumentativa e marginal utilizada na fundamentação de acórdãos.

VI – A inadmissibilidade da revista, quer nos termos gerais, quer pela via atípica, deita o recurso por terra e arrasta, na queda, todas as restantes questões que a recorrente lhe acoplou.

Decisão Texto Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:



Relatório

I – “AA GMBH & CO.KG”, BB GMBH” e “CC, LDA.” intentaram contra “DD FARMACÊUTICA, S.A.. a presente acção, no Tribunal Arbitral competente, pedindo que a mesma seja julgada procedente e, consequentemente, a ré condenada no seguinte:

a) a abster-se de, em território português, ou tendo em vista a comercialização nesse território, importar, fabricar, armazenar, introduzir no comércio, vender ou oferecer os medicamentos genéricos contendo como princípio ativo o Telmisartan e Hidroclorotiazida em associação fixa, enquanto a EP 502314 e o CCP 41, e as EP 1467712, EP 1545467, EP 2120884 e EP 2260833 se encontrarem em vigor;

b) a não transmitir a terceiros as AIMs identificadas no artigo 88º da petição incial, até à referida data de caducidade dos direitos ora exercidos;

c) a pagar a totalidade dos encargos da acção arbitral;

d) a pagar uma sanção pecuniária compulsória, nos termos do artigo 829º-A do Código Civil, de valor não inferior a € 50 000,00 (cinquenta mil euros) por cada dia de atraso no cumprimento da condenação que vier a ser proferida.

A ré contestou, por excepção e por impugnação, tendo a final pugnado pela total improcedência da acção.

As autoras responderam às excepções invocadas, pugnando pela sua inverificação.

Percorrida a subsequente tramitação, foi proferido acórdão arbitral que, na total improcedência da acção, absolveu a ré dos pedidos.

Apelaram as autoras, tendo a Relação de Lisboa, na parcial procedência do recurso, ordenado o desentranhamento do documento n.º 3, alterado alguns pontos da matéria de facto e revogado o recorrido acórdão arbitral, condenando a ré no seguinte:

a) “a abster-se de, em território português, ou tendo em vista a comercialização nesse território, importar, fabricar, armazenar, introduzir no comércio, vender ou oferecer os medicamentos genéricos contendo como princípio ativo o Telmisartan e Hidroclorotiazida em associação fixa, enquanto as EP 1467712, EP 1545467, EP 2120884 e EP 2260833 se encontrarem em vigor;

b) a não transmitir a terceiros, até à data de caducidade dos direitos respeitantes às EP indicadas em a), as três AIM publicadas, todas elas, no dia 19/12/2012 e cujas cópias constituem os documentos nºs 9 a 11 juntos com a petição inicial e que foram requeridas, também todas elas, no dia 07 /12/2012, que contêm as seguintes referências comuns, diferenciando-se apenas nas dosagens quer dos medicamentos quer dos medicamentos de referência a que correspondem e visam substituir (umas 40mg+12,5mg, outras 80mg+12,5mg e as terceiras 80mg+25mg):

Nome do requerente da Autorização de Introdução no Mercado: DD FARMACÊUTICA, SA,

Morada do requerente da Autorização de Introdução no Mercado: Rua …, 19 27…-  …, Portugal,

Substância(s) do medicamento: Hidroclorotiazida; Telmisartan,

DCI do medicamento: Telmisartan + Hidroclorotiazida,

Forma farmacêutica do medicamento: comprimido,

Medicamento de referência: MicardisPlus,

Forma farmacêutica do medicamento de referência: comprimido”.

Agora inconformada, interpôs a ré recurso de revista, finalizando a sua alegação, com as conclusões que se transcrevem:

1) O presente recurso vem interposto do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa que decidiu parcialmente procedente a apelação interposta pelas ora Recorridas, da decisão proferida, por unanimidade, pelo Tribunal Arbitral constituído no âmbito da arbitragem necessária iniciada pelas Recorridas, nos termos da Lei n.º 62/2011, de 12 de dezembro, e que, consequentemente, decidiu:

• Altera[r] a parte da deliberação arbitral através da qual foram enunciados os factos provados na ação nos termos indicados nos pontos 6.2.7 e 6.3.3 do presente acórdão;

• Revoga[r] o decreto absolutório do acórdão arbitral recorrido, decretando em sua substituição que:

i.  Vai a Demandada condenada a abster-se de, em território português, ou tendo em vista a comercialização nesse território, importar, fabricar, armazenar, introduzir no comércio, vender ou oferecer os medicamentos genéricos contendo como princípio ativo o Telmisartan, Hidroclorotiazida em associação fixa identificada na petição inicial enquanto as EP 1467712, EP 1545467, EP 2120884 e EP 2260833 se encontrarem em vigor;

ii. Vai a Demandada condenada a não transmitir a terceiros, até à data de caducidade dos direitos respeitantes às EP indicadas em i), as três AIMs publicadas, todas elas, no dia 19/12/2012 e cujas cópias constituem os documentos n.ºs 9 a 11 juntos com a petição inicial (…);

iii. Vai a Demandada absolvida do pedido de condenação no pagamento de sanção pecuniária compulsória por cada dia de atraso no cumprimento das condenações decretadas em i) e ii).

2) O presente recurso é fundamentado no erro de interpretação e de aplicação da lei substantiva e na violação da lei de processo, nos termos previstos no artigo 674.º, n.º 1, alíneas a) e b), do CPC.

3) O recurso de Revista, ordinário, que tem por objeto sentenças da Relação em sede de recurso de decisões no âmbito da arbitragem necessária realizada ao abrigo da Lei n.º 62/2011, de 12 de dezembro, é admissível, como já consignou esse Venerando Supremo Tribunal, em douto acórdão de 23/06/2016, processo 1248/14.6YRLSB.S1.

4) A admissibilidade do presente recurso funda-se na interpretação, sufragada nesse aresto, do artigo 3.º, n.º 7 da Lei n.º 62/2011, quando conjugado com o artigo 59.º, n.º 8 da Lei n.º 63/2011 (Lei da Arbitragem Voluntária).

5) A interposição do presente recurso de revista ordinária é ainda admissível nos termos do artigo 629.º, n.º 2, alínea d), por a decisão do Tribunal a quo estar em frontal oposição ao acórdão do mesmo Tribunal da Relação de Lisboa, 6.ª Secção, proferido no âmbito do processo 850/15.3YRLSB em 18 de fevereiro de 2016, cf. doc. n.º 1 (acórdão fundamento).

6) Nessa sede, haverá sempre recurso desde que não esteja esse recurso vedado por insuficiência do valor da causa e da sucumbência, conquanto existam duas ou mais decisões das Relações em oposição com aquela emanada do Tribunal a quo, tiradas no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, o que se verifica quando confrontados o acórdão fundamento e a douta decisão do Tribunal a quo.

7) No acórdão fundamento discutiu-se se um medicamento genérico composto, entre outras, pelas substâncias ativas Telmisartan e Hidroclorotiazida violava as patentes sob discussão nestes autos, apresentando as mesmas substâncias ativas e um processo de produção tecnologicamente igual ao do medicamento genérico sob apreciação in casu.

8) Ademais, estava em causa a suposta infração dos direitos de propriedade industrial das aqui Recorridas, ali Recorrentes, por esse medicamento, o que configura uma mesma questão fundamental de direito. Em concreto, no acórdão fundamento foram invocadas a EP 502314 e respetivo Certificado Complementar de Proteção n.º 41 (CCP 41), a EP 1467712, a EP 1545467 e a EP 2120884, que estão também sob discussão nos presentes autos.

9) A questão foi discutida ao abrigo do artigo 101.º do Código da Propriedade Industrial (Decreto-Lei n.º 36/2003, de 5 de Março), norma também ela determinante na decisão do Tribunal a quo, pelo que nos movemos, em ambas as situações, no domínio da mesma legislação.

10) Apesar da perfeita analogia das situações, no âmbito do processo n.º 850/15.3YRLSB tanto o Tribunal Arbitral como o Tribunal da Relação de Lisboa, no referido acórdão fundamento, entenderam que aquelas soluções técnicas não infringem as patentes das Recorridas ali invocadas, nem em sentido literal, nem por equivalência, ao passo que no presente caso, com exceção da EP 502314 e respetivo CCP 41, cuja vigência caducou no dia 12 de dezembro de 2013, o acórdão recorrido entendeu que os medicamentos genéricos da Recorrente infringem a EP’712, a EP’467 e a EP’884.

11) O Tribunal a quo veio, em conformidade com o peticionado pelas Apelantes, aqui recorridas, alterar os factos provados n.ºs 91), 92), 93), 110) e 113), bem como aditar ao acervo de factos dados como provados, o facto n.º 114).

12) Na alteração ao facto provado n.º 91), o Tribunal a quo eliminou as referências “o comprimido produzido pela Demandada não é em duas camadas ao contrário do que está definido nas patentes em vigor da titularidade das Demandantes”, por haver considerado que tais informações constituem “declarações conclusivas e não factos concretos”.

13) Tal entendimento é porém errado, em virtude de o facto provado n.º 91) constituir efetivamente um facto concreto que transpõe as circunstâncias de que, (i) o comprimido genérico sub judice não assume uma composição em bicamada, (ii) divergindo assim dos medicamentos das aqui Recorridas, que no texto das respetivas patentes são qualificados como comprimido em bicamada.

14) Por outro lado, ao eliminar do acervo de factos provados a factualidade contida no anterior facto provado n.º 91), o Tribunal a quo entrou em contradição consigo mesmo porquanto havia considerado que o comprimido da aqui Recorrente não está estruturado em duas camadas, em evidente oposição com o que “está definido nas patentes em vigor da titularidade das Demandantes”.

15) A decisão do Tribunal a quo no sentido de alterar, ou verdadeiramente eliminar, o anterior facto provado n.º 91) é ainda de censurar porquanto está em manifesta contradição com o acórdão arbitral que bem esclareceu que o comprimido genérico sub judice (em monocamada) é diferente das invenções protegidas pelas EP’s 1467712, 2260833 e 1545467 que protegem um medicamento em bicamada, conforme resulta dos factos provados n.ºs 51), 80), 87) e 89), bem como da apreciação expendida em torno da análise da primeira questão técnica.

16) A alteração factual promovida pelo Tribunal a quo surge ainda, sem a necessária justificação, em contradição com o teor do relatório pericial apresentado nos autos, onde, conforme expresso nos quesitos I.1, I.3, I.7, II.A 14, II.C 32, II.C 33, II.C 34, II.C 40. II.C 41 se apurou que a composição em monocamada do medicamento genérico da Recorrente é contrária/diferente das soluções patenteadas pelas ali Demandantes, aqui Recorridas.

17) O Tribunal a quo ainda andou mal ao subtrair ao acervo de factos considerados provados o teor do original facto provado n.º 92) porquanto também este constitui efetivamente um facto concreto que transmite que (i) a solução tecnológica/arquitetura do comprimido genérico sob apreciação (em bicamada) é diferente das soluções protegidas pelas patentes das aqui Recorridas, em razão de (ii) a composição uniforme do medicamento numa mistura de pós ou num co-granulado (conforme a do medicamento genérico) ter sido a solução desejada mas não alcançada nos produto e processo protegidos pelas EP’s 1467712 e 2260833, no âmbito dos quais se teve de recorrer à formulação de um comprimido com duas camadas.

18) A eliminação do facto provado n.º 92) diverge, sem justificação atendível, do teor do facto provado n.º 83) – que se manteve inalterado – e não reflete o teor do relatório pericial que conforme resulta dos quesitos II.A 12, II.A 13, II.C 38, II.C 39, II.C 40 e II.F 74 concluiu no inequívoco sentido de que a solução tecnológico que subjaz ao medicamento genérico sob apreciação – onde as substâncias ativas estão homogeneamente distribuídas sem necessidade de estruturar o comprimido em duas camadas – veio resolver o problema da incompatibilidade entre substâncias que se verificava, através de uma solução que as titulares das patentes 1467712 e 2260833 pretenderam alcançar, mas sem sucesso.

19) O Tribunal a quo eliminou a parte do facto provado n.º 93) que estatuía que as duas matrizes microscopicamente diferentes contidas no comprimido genérico de composição uniforme “não correspondem ao comprimido de dupla camada protegido nas patentes da titularidade das Demandantes”, por haver considerado que tal segmento textual constituía uma declaração conclusiva e não um facto concreto.

20) Porém, o segmento textual subtraído assume natureza de facto e transmite a circunstância de que a composição uniforme do medicamento genérico não corresponde à geometria em bicamada do comprimido protegido pelas patentes europeias n.ºs 1467712 e 2260833.

21) Por outro lado, a eliminação parcial do facto provado n.º 93), que o Tribunal a quo também não cuidou de devidamente justificar, afigura-se contrária quer ao entendimento do Tribunal Arbitral vertido no facto provado n.º 51), quer ao teor do relatório pericial que nos quesitos II.C 33, II.C 34 e II.C 41 refere que a solução encontrada no medicamento genérico sob apreciação não corresponde às soluções patenteadas, porquanto – entre todas as outras diferenças demonstradas – o medicamento genérico é de composição uniforme, contrariamente aos produto e processos patenteados pelas Recorridas que protegem um medicamento em bicamada.

22) Por último, ao eliminar a segunda parte da redação do facto provado n.º 93), o Tribunal a quo, mais uma vez, entrou em contradição consigo mesmo, na medida em que havia já admitido em sede de fundamentação à alteração do facto provado n.º 91) que não existem duas camadas no comprimido genérico, não se verificando assim motivo para a eliminação parcial do facto.

23) A alteração efetuada pelo Tribunal a quo quanto ao facto provado n.º 110) releva quanto a duas questões essenciais, a saber, (i) se a área superficial do manitol usado no medicamento da Recorrente é da mesma gama que a área superficial do sorbitol reivindicado na EP’884; e (ii) se o manitol e o sorbitol são substâncias diferentes, ainda que funcionalmente equivalentes.

24) Quanto à primeira questão, o próprio Tribunal a quo afirma que os peritos não dispunham de informação sobre as áreas superficiais do sorbitol nem do manitol.

25) Tanto que, do depoimento da testemunha EE aludido na fundamentação do Tribunal não se pode concluir rigorosamente nada quanto àquelas áreas superficiais.

26) Acresce que, nada resultou provado quanto à área superficial do manitol utilizado nos comprimidos da Recorrente.

27) A redação do facto 110), ao eliminar o trecho “uma vez que são substâncias diferentes” descura ainda os factos provados sob o ponto 106) e 107), onde foram dadas como provadas as diferenças entre os dois excipientes, manitol e sorbitol.

28) Termos em que, a alteração levada a cabo pelo Tribunal recorrido quanto ao facto 110) peca por duas razões: (i) dá como provado que as áreas superficiais do sorbitol e do manitol são da mesma gama sem que tal encontre o mínimo suporte na prova produzida; e (ii) é fundamentada no depoimento de uma testemunha que é completamente incongruente com a factualidade assente no ponto 106), o que resulta na incompatibilidade da factualidade vertida no ponto 110) - após alteração - com a matéria provada sob os pontos 106) e 107).

29) A matéria dada como provada no ponto 113) pelo Tribunal Arbitral na sua redação original vem na sequência lógica da factualidade dada como provada nos factos 64), 90), 111) e 112) e no seguimento do penúltimo parágrafo da página 36 do acórdão arbitral.

30) O Tribunal a quo entendeu que, pelo simples facto de o medicamento genérico conter o excipiente povidona e de esta substância ter, entre outras, propriedades tensioativas, ficaria provado que a povidona é usada como agente tensioativo nos comprimidos da Recorrente.

31) No entanto, dos depoimentos indicados no acórdão recorrido não se retira que no contexto da formulação do medicamento da Recorrente a povidona seja usada como tensioativo.

32) Ao ter considerado que a povidona é usada no fabrico dos comprimidos da Recorrente com aquela função específica, o Tribunal a quo desviou-se do sentido das respostas do colégio pericial, que afirmou categoricamente que aquele comprimido não contém nenhum agente tensioativo.

33) O que vem dito resulta ainda da resposta ao quesito I.1., onde os peritos que formaram a maioria concluíram de forma cristalina que o processo de fabrico do medicamento genérico não é idêntico nem equivalente ao processo descrito na EP’467, precisamente porque para este processo o uso de um tensioativo é um elemento diferenciador.

34) Conclui-se assim que os depoimentos invocados pelo Tribunal a quo não autorizam a desconsideração pela prova resultante do relatório pericial supra citada, pelo que aquele Tribunal não poderia nunca ter alterado o facto 113) nos termos em que o fez.

35) Ao ter aditado o facto provado n.º 114) aos factos provados considerando apenas depoimentos de algumas testemunhas e olvidando por completo o teor do relatório pericial relevante para a matéria, o Tribunal a quo deu por provado um facto que não corresponde à realidade material.

36) Ademais, no acórdão não se referem os motivos que levaram o Tribunal a quo a não considerar o relatório pericial, que é farto nas respostas que dá sobre a matéria relevante nesta sede.

37) Termos em que o aditamento do ponto 114) aos factos não tem qualquer sustento na prova produzida, sendo por isso, ilegal.

38) Torna-se patente que o Tribunal a quo se distanciou em vários pontos, e com o intuito de alterar a matéria de facto decorrente da decisão do Tribunal Arbitral, daquela que era a opinião maioritária (e por vezes unânime) do colégio de peritos, em domínios que o Tribunal a quo afirmou recorrente e veementemente se afiguravam extremamente complexos, bem como o litígio daí decorrente, em virtude da tecnicidade das matérias sob apreciação.

39) A modificação da matéria de facto assim operada consubstancia uma subvalorização infundada da prova pericial, acompanhada da violação do dever de fundamentação, consagrado no artigo 154.º, n.º 1, e no artigo 607.º, n.º 4, ambos do CPC, e que corresponde aliás a um imperativo constitucional vertido no artigo 205.º, n.º 1 da Lei Fundamental.

40) Pese embora exista liberdade de apreciação da prova, e em particular, da prova pericial, consagrada no artigo 607.º, n.º 5 do CPC, a livre apreciação da prova não pode corresponder a um exercício discricionário e até arbitrário por parte do julgador.

41) Em particular, os nossos Tribunais superiores não hesitam em identificar um dever de especial fundamentação quando o juiz decide em desconformidade com o sentido unânime ou quase unânime de um laudo pericial. Nesse sentido se pronunciaram os Tribunais da Relação de Lisboa (em 11/07/2010, processo 949/05.4TBOVR-A.L1-8), do Porto (em 16/02/1998, processo 9751295, e em 26/01/2000, processo 9921333), de Coimbra (em 24/04/2012, processo 4857/07.6TBVIS.C1) e de Guimarães (em 19/02/2015, processo 165/10.3TBMUR-A.G1).

42) Tendo em consideração que a matéria dos autos reveste-se de grande complexidade técnica, não é lícito ao Tribunal recorrido descartar as conclusões técnicas que mereceram a concordância da maioria (e por vezes unanimidade) do painel de peritos, de forma pouco ou nada fundamentada, sendo impercetíveis as razões que levaram a tal desconsideração do relatório pericial.

43) A discordância do Tribunal a quo com o sentido da prova pericial não foi fundada em provas alternativas com igual ou superior credibilidade, como exige o dever de especial fundamentação densificado pela jurisprudência.

44) Desta forma, o Douto Tribunal a quo não fundamentou de forma suficiente a sua sentença, em violação da lei de processo, em especial dos números 3 e 4 do artigo 607.º e do artigo 154.º, ambos do CPC, sendo que essa violação do dever de fundamentação implica sem mais a revogação da sentença, que aqui se pede.

45) Mais ainda, a deficiente fundamentação do acórdão recorrido, por desrespeito do dever de especial fundamentação, atinge uma garantia constitucional da Recorrente, isto é, o direito a ser destinatária de uma sentença formal e materialmente fundamentada, o que aqui se argui para os devidos efeitos.

46) Os erros incorridos pelo Tribunal a quo e a falta de fundamentação devida quanto à decisão sobre a matéria de facto são erros de aplicação do direito, que em todo o caso são sempre sindicáveis em sede de recurso de revista, conforme afirmado pela jurisprudência deste Supremo Tribunal (acórdão de 28/06/2012, processo n.º 3728/07.0TVLSB.L1.S1 e acórdão de 21/06/2016, processo n.º 2683/12.0TJLSB).

47) A modificação da matéria de facto por parte do Tribunal a quo, que se cingiu a apenas alguns dos factos, provocou incoerências insanáveis entre elementos da factualidade dada como provada, pelo que é impossível que o Tribunal a quo possa alcançar uma solução jurídica correta para os casos sub iudice, pois a operação jurídica típica do processo aqui controvertido (a saber, a verificação da violação, ou não violação, de certas patentes pelo medicamento da Recorrente) depende inelutavelmente de uma correta conformação da factualidade, sem a qual a aplicação das normas jurídicas aos factos fica comprometida.

48) Inelutavelmente, essas incoerências implicam que o acórdão recorrido padeça de vícios na aplicação do direito que justificam que este Supremo Tribunal o revogue.

49) Ao ter considerado que os medicamentos genéricos da Recorrente infringem, por equivalência, o âmbito de proteção das patentes europeias EP 1467712, EP 1545467, EP2120884 e EP 2260833 das Recorridas, o Tribunal a quo laborou numa errónea interpretação da doutrina dos equivalentes e numa indevida aplicação do artigo 101.º do CPI, o que culminou numa violação dos normativos legais substantivos aplicáveis ao litígio sub judice.

50) A EP‘712 reivindica um método de produção de um comprimido farmacêutico de duas camadas compreendendo Telmisartan e Hidroclorotiazida. A EP‘833 protege um comprimido farmacêutico de duas camadas compreendendo Telmisartan e um diurético obtido através do processo constante na EP’712.

51) O cerne essencial destas patentes consiste na separação das substâncias ativas em duas camadas para ultrapassar o problema técnico existente à data de prioridade da patente da incompatibilidade da Hidroclorotiazida com os compostos básicos presentes nas formulações convencionais de Telmisartan (ponto 84) dos factos provados).

52) Ao invés, resultou provado que o medicamento genérico da Recorrente constitui um comprimido de composição uniforme e geometria convencional, onde não são observáveis ou cindíveis duas camadas (pontos 90) e 91) dos factos provados). No comprimido da Recorrente a solução encontrada para minimizar o contacto entre os granulados de Telmisartan e Hidroclorotiazida e ultrapassar os problemas de instabilidade daí advenientes consiste no revestimento do granulado de Telmisartan com povidona, [não na separação dos granulados por camadas (ponto 25) dos factos provados)].

53) Nesta diferença reside a evidência de que as referidas patentes protegem, respetivamente, um processo e um produto, diferentes do medicamento da Recorrente.

54) A solução técnica que é proposta no medicamento genérico da Recorrente foi concedida pelo Instituto Europeu de Patentes como uma patente de produto válida e eficaz - EP 2029112 -, pelo que aquela solução (i) constitui efetivamente uma solução inovadora face ao problema técnico que as titulares das patentes sub judice enfrentaram, (ii) não está abrangida pelo texto das EP‘712 ou EP‘833, e (iii) não estava ao alcance do perito médio na especialidade.

55) Esta constatação bastaria para demonstrar que as soluções técnicas em confronto nunca poderiam ser consideradas iguais, nem tão pouco equivalentes, uma vez que existe na solução proposta nos medicamentos genéricos da Recorrente um efeito material técnico distinto. A não ser assim, tal solução nunca poderia ter sido objeto de patente autónoma avaliada e concedida anos depois das patentes sub judice.

56) Tanto a doutrina como a jurisprudência portuguesas entendem que, para que se verifique a equivalência entre os inventos ou soluções técnicas em confronto, é necessário que estejam verificadas três condições cumulativas, a saber: (i) identidade do efeito técnico; (ii) identidade funcional ou semelhança dos meios; e (iii) evidência da equivalência - acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 17/09/2009, (Relatora Ondina Carmo Alves).

57) No caso em apreço, resulta claro que os elementos modificados para obter o comprimido genérico não estavam efetivamente ao alcance de um perito na especialidade, a partir da interpretação lógica e objetivista do conteúdo das reivindicações das patentes das Recorridas. Ou seja, não existe qualquer evidência de equivalência, já que a solução técnica proposta no medicamento genérico não era de facto evidente face ao estado da técnica à data das patentes das Recorridas, tendo aliás sido declaradamente tida por impossível.

58) Face à prova produzida quanto ao facto de o comprimido da Recorrente ser uma composição uniforme, i.e., não separada por camadas, onde os granulados de Telmisartan e Hidroclorotiazida são misturados e posteriormente prensados para originar o comprimido final (ponto 90) dos factos provados), e à novidade e atividade inventiva da EP’112 que protege aquele comprimido, fica também arredada a identidade funcional face aos inventos das EP’712 e EP’833, que são relativos a comprimidos em bicamada.

59) O que ficou dito quanto à EP’712 aplica-se igualmente à EP’833, a qual diz respeito a um comprimido farmacêutico de duas camadas obtido através do processo constante da EP’712.

60) A análise de uma hipotética infração por equivalência quanto ao método de secagem dos granulados deve ser feita à luz dos elementos interpretativos que derivam do texto de patente. Na EP’712 foi especificamente reivindicada a “secagem por pulverização”, atribuindo-lhe vantagens que não reconheceram à granulação em leito fluidizado - método que ficou deliberadamente omisso nas reivindicações da patente e que foi o adotado pela Recorrente.

61) Mediante a reivindicação específica da secagem por pulverização e a descrição das vantagens deste método sobre o método de granulação em leito fluidizado, ao interpretar o texto da patente o perito médio teria depreendido que a granulação por secagem por pulverização era um requisito essencial ou particular da invenção para o titular da patente, obrigando a que exista uma correspondência literal com o que está expresso na reivindicação para que se verifique infração da patente por equivalência (Improver vs. Remington e acórdãos do TCA – Sul de 02/06/2010 e de 13/10/2010, citando Couto Gonçalves).

62) Resultou provado que o comprimido da Recorrente não é estruturado em duas camadas (ponto 90) dos factos provados), pelo que não se pode considerar que o processo de produção do medicamento genérico da Recorrente segue os passos (iii), (iv), (v) e (vi) da reivindicação 13 da EP’712, os quais se julgaram consistentes com a criação de um comprimido em duas camadas (ponto 89) dos factos provados). Sendo a EP’712 uma patente de processo de produção com seis passos cumulativos, basta que o fabrico do medicamento da Recorrente não siga um desses passos para que não se verifique infração.

63) Sendo a EP’833 uma patente de produto, o ónus da prova de que o medicamento genérico da Recorrente infringe as reivindicações da patente cabia às Recorridas e não à aqui Recorrente, conforme resulta do artigo 98.º do Código da Propriedade Industrial e n.º 1 do artigo 342.º do Código Civil, sendo certo que as Recorridas não lograram demonstrar a alegada infração. Por outro lado, a inversão do ónus da prova prevista no artigo 98.º do CPI também não pode operar face à EP’712, na medida em que, sendo a associação entre o Telmisartan e a Hidroclorotiazida já conhecida do estado da técnica à data do depósito daquela patente (ponto 54) dos factos provados), o produto obtido através do processo constante na EP’712 não era, à data relevante, um produto novo.

64) Inexistindo qualquer infração às EP’712 e EP’833, direta ou por equivalência, por parte da Recorrente e por referência ao medicamento genérico objeto dos presentes autos, ao ter condenado a Recorrente a abster-se de comercializar os seus medicamentos genéricos o Tribunal recorrido violou o disposto no artigo 101.º do CPI.

65) A EP’467 refere-se a composições farmacêuticas sólidas compreendendo Telmisartan, um agente básico, um tensioativo ou emulsionante, e um diluente hidrossolúvel (ponto 63) dos factos provados). De acordo com a EP’467 a presença de um tensioativo ou emulsionante é essencial para a invenção (ponto 65) dos factos provados).

66) Os medicamentos da Recorrente contêm o excipiente povidona, que serve para revestir o granulado de Telmisartan e assim reduzir o contacto daquele ingrediente ativo com o granulado de Hidroclorotiazida (pontos 17), 22), 23) e 26) dos factos provados).

67) Apesar de no acórdão recorrido nada se dizer quanto à concreta infração da EP’467 pelos medicamentos genéricos, a Recorrente supõe que terá sido porventura à luz da alteração do facto 113) efetuada na mesma sede, que o Tribunal a quo assumiu que a utilização da povidona, por ser (também) um tensioactivo, infringe a patente.

68) No entanto, a conclusão de que no comprimido da Recorrente a povidona é usada como / produz necessariamente o mesmo efeito que um agente tensioativo não é autorizada, nem mesmo à luz da alteração ao facto 113) levada a cabo pelo Tribunal a quo. Do facto de a povidona ter, entre muitas outras, características de tensioativo não resulta necessariamente que ela cumpra sempre essa função.

69) Resulta da prova produzida nos autos e dos factos provados 17), 22), 23), 26), 111) e 112) precisamente que a presença da povidona tanto nos medicamentos genéricos como no contexto da EP’467 está relacionada com outras das funções que aquele excipiente pode desempenhar.

70) Concretamente no contexto da EP’467 a povidona é referida na página 6 da descrição, onde lhe são expressamente atribuídas características de aglutinante, e de diluente ou veículo, precisamente as características pelas quais a povidona é comummente conhecida, e que estão aliás em conformidade com o que é descrito no dossier dos medicamentos genéricos.

71) A patente não identifica a povidona como tensioativo ou emulsionante. Pelo contrário, a EP’467 ensina (nas suas reivindicações 3 a 5 e na página 5 da descrição) quais são os tensioativos passíveis de serem utilizados nas formulações farmacêuticas sólidas por ela protegidas, a saber, poloxâmmeros ou pluronics, polietilenoglicóis, monoestearato de polietilenoglicol, polissorbatos, laurel sulfato de sódio, óleo de rícinio polietoxilado e hidrogenado.

72) Aludindo às normas de interpretação de patentes acolhidas pela doutrina e pela jurisprudência (quer das Câmaras de Recurso do Instituto Europeu de Patentes, que dos tribunais dos Estados Contratantes da CPE), a única conclusão possível é no sentido de que, ao não ter elencado a povidona como agente tensioativo, o invento protegido pela EP’467 não usa aquele excipiente com aquela função, mas sim com a função de aglutinante, de diluente ou de veículo expressamente descrita.

73) É esta a conclusão resultante dos critérios interpretativos do artigo 1.º do Protocolo Interpretativo do artigo 69.º da Convenção sobre a Patente Europeia, segundo os quais o âmbito de proteção conferido por uma patente deve ser definido com base nas reivindicações, sustentadas pela descrição e pelos desenhos, não podendo, contudo, o âmbito de proteção ultrapassar o que esteja devidamente ancorado na descrição.

74) Não é devido ao facto de o medicamento genérico da Recorrente utilizar povidona como retardante da cristalização do Telmisartan (na primeira fase) e como revestimento do granulado daquela substância ativa (na segunda fase) que há infração da EP’467. Atentas as regras de interpretação de patentes aludidas, só haveria infração da EP’467 se os medicamentos genéricos usassem algum dos agentes tensioativos reivindicados na patente ou se a povidona fosse usada naqueles medicamentos como agente tensioativo, para obter esse efeito.

75) Ao ter considerado que o medicamento da Recorrente violava a EP’467 por equivalência, o Tribunal a quo fez uma aplicação errada do disposto no artigo 101.º do CPI, decorrente da errada interpretação que fez da patente.

76) Não obstante o manitol e o sorbitol serem ambos dissolventes hidrossolúveis funcionalmente equivalentes, o raciocínio do Tribunal a quo quanto à equivalência do manitol utilizado no medicamento da Recorrente face ao sorbitol reivindicado na EP’884 não se encontra autorizado nem pela doutrina dos equivalentes nem pelas normas de interpretação de patentes.

77) Dos factos 106) a 110) dados como provados não resulta que a utilização do manitol no comprimido da Recorrente (i) determine uma dureza do comprimido ou camada de comprimido; (ii) que a taxa de dissolução da substância ativa Telmisartan específica seja equivalente à da EP’884. Daqueles factos dados como provados também não resulta que a área superficial do manitol utilizado no comprimido da Recorrente, mesmo que seja da mesma gama que a do sorbitol ou esteja compreendida nos intervalos reivindicados na EP’884, tivesse as mesmas propriedades ou o mesmo desempenho sobre dureza do comprimido ou camada de comprimido e na taxa de dissolução do Telmisartan que o sorbitol.

78) Assim, da prova produzida não resulta qualquer identidade de efeito técnico do manitol e do sorbitol, o que afasta necessariamente a verificação da primeira condição cumulativa já apontada supra para a verificação da equivalência i.e., a identidade de efeito técnico.

79) Dos factos provados também não resultou demonstrada a evidência de equivalência entre o manitol presente nos comprimidos da Recorrente e o sorbitol com a área concreta especificamente reivindicada na EP’884, porquanto, à luz das normas de interpretação de patentes, decorre da correta interpretação da EP’884 que a presença do sorbitol com as características especificamente reivindicadas é um elemento essencial para o invento.

80) Face à menção do sorbitol apenas (e de mais nenhum dissolvente hidrossolúvel) na descrição da patente, e à reivindicação do sorbitol com uma determinada área superficial específica, o perito na matéria sempre concluiria que é essencial para o invento protegido pela EP’884 que o dissolvente hidrossolúvel utilizado seja o sorbitol, e nenhum outro.

81) Os medicamentos genéricos da Recorrente não poderiam nunca ser considerados infratores por equivalência da EP’884 por utilizarem o manitol em vez do sorbitol como dissolvente hidrossolúvel, na medida em que ambos os excipientes e a sua utilização como dissolventes hidrossolúveis em formulações de Telmisartan eram conhecidos do estado da técnica à data de prioridade da patente (sendo a utilização do manitol, inclusivamente, referida na EP’712 das Recorridas, depositada 6 anos antes da EP’884).

82) O Tribunal a quo aplicou indevidamente a doutrina dos equivalentes quando considerou que o medicamento genérico da Recorrente, ao usar o manitol como dissolvente hidrossolúvel, infringe por equivalência a EP’884. Consequentemente, ao condenar da Recorrente a abster-se de comercializar os seus medicamentos genéricos, o Tribunal a quo fez uma incorreta aplicação do artigo 101.º do CPI.

83) O presente recurso de Revista vem ainda interposto com fundamento no contraditório de julgados entre o acórdão recorrido e o acórdão proferido em 18 de fevereiro de 2016 pelo mesmo Tribunal da Relação de Lisboa (6.ª Secção), no âmbito do processo 850/15.3YRLSB, onde se discutiu a invocada infração das EP’712, EP’467 e EP’884 por um medicamento composto pelas substâncias ativas Telmisartan e Hidroclorotiazida produzido precisamente através do processo e tecnologia usados no medicamento genérico aqui sub judice.

84) No acórdão fundamento, o Tribunal da Relação de Lisboa confirmou integralmente a decisão que havia sido proferida pelo Tribunal Arbitral, o qual decidiu, no âmbito daquele processo, que o medicamento genérico sob apreciação não infringia nenhuma das patentes invocadas pelas ali Recorrentes que são, precisamente as aqui Recorridas.

85) No acórdão fundamento, o Tribunal da Relação de Lisboa decidiu, em suma, que,

i. o comprimido em monocamada do medicamento genérico sob apreciação não infringe a EP’712, pois esta patente reivindica proteção para um processo de fabrico de um comprimido em dupla camada;

ii. o medicamento genérico sob apreciação - não obstante conter povidona, atentas as suas propriedades de aglutinante - não tinha nenhum tensioativo ou emulsionante, não infringindo, assim, a EP’467;

iii. o medicamento genérico sob apreciação, que usa o excipiente manitol como dissolvente hidrossolúvel, não infringe, a que título for, a EP’884;

,tendo o Ttribunal, consequentemente, confirmado a absolvição das ali Recorridas de todos os pedidos.

86) Nos presentes autos, o Tribunal a quo entendeu que, à luz da doutrina dos equivalentes, o medicamento genérico da Recorrente infringia a EP’712 (e a EP’833), a EP’467 e a EP’884, o que levou à condenação da Recorrente a não comercializar o se medicamento.

87) É manifesta e evidente a contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento, os quais, com apenas 4 meses de diferença, que se pronunciam de forma absolutamente oposta quanto à infração das EP’712, EP’467 e EP’884 por medicamentos genéricos com as substâncias ativas Telmisartan; Hirdroclorotiazida e que utilizam soluções técnicas idênticas.

88) A contradição de julgados impõe a revogação do acórdão recorrido, nos termos e para os efeitos do artigo 629.º, n.º 2 alínea d) do CPC, quanto ao decisório relativo à proibição de comercialização do medicamento genérico sub judice.

89) O acórdão recorrido deve ainda ser revogado na parte em que condenou a Recorrente a abster-se de comercializar os seus medicamentos genéricos por estes infringirem a EP’884, porquanto esta patente foi, entretanto, revogada por decisão da Câmara de Recurso do Instituto Europeu de Patentes, datada de 12 de abril de 2016, com fundamento em falta de capacidade inventiva.

90) A menção da decisão de revogação da EP’884 foi publicada no Boletim Europeu de Patentes 32/2016, do dia 10 de agosto de 2016, data a partir da qual a revogação produz efeitos nos termos do artigo 105.º-B, n.º 3 da CPE. Ao produzir efeitos apenas no dia 10 de agosto de 2016, a revogação da EP’884 é um facto objetivamente superveniente à prolação do acórdão recorrido.

91) A revogação da EP’884 não deixa de ser relevante neste momento, na medida em que dela resulta a invalidade dos direitos conferidos por aquela patente. A não revogação condenação da Recorrente pela infração de direitos inválidos, é ilegal e choca o mais elementar sentido de justiça, pelo que deve o douto Tribunal ad quem determinar aquela revogação.

92) O titular de um direito, ao proceder à sua transmissão, transmite-o tal como este se encontra configurado, o que significa que, se sobre esse direito impende uma oneração ou qualquer outra limitação, é precisamente nesses termos que esse direito será transmitido e, consequentemente, adquirido por terceiro (com a oneração ou limitação que sobre ele impende).

93) A condenação da Recorrente a não transmitir ou ceder a terceiros as AIMs do medicamento genérico é ilícita e mesmo inconstitucional por pretender introduzir uma limitação dos poderes de disposição desta, quanto a um ativo de que é titular, pelo que jamais poderá ser procedente.

94) Ao titular da patente apenas assiste o direito de impedir o início da comercialização do medicamento, enquanto a sua patente não caducar. Mas já não pode impedir terceiros de iniciar o procedimento tendente à obtenção de AIM nem impedir que a mesma seja concedida ou que seja fixado o PVP do medicamento em causa.

95) De acordo com o princípio da especialidade de competências, cabe ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial a promoção e proteção da propriedade intelectual, cabendo ao INFARMED o controlo da qualidade, eficácia e segurança dos medicamentos. O INFARMED, no processo tendente à concessão de AIMs, não tem que considerar a existência de direitos de propriedade industrial.

96) Porque o pedido de AIM não se conecta com a esfera da propriedade industrial, jamais poderia o Tribunal Arbitral ter condenado a Recorrida a não transmitir as AIMs do seu medicamento genérico enquanto as patentes das Recorrentes se mantiverem em vigor, porquanto tanto a constituição da AIM como a sua transmissão a terceiro escapam ao conteúdo dos direitos de propriedade industrial (cfr, Acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 03.10.2013, Apelação 747/13.1YRLSB e de 28.11.2013, Apelação 606/13.8YRLSB).

97) A condenação da Recorrente a não transmitir as AIMs em causa nos autos está, mais uma vez, em contradição com o sentido da decisão do Tribunal da Relação de Lisboa proferida no âmbito do processo n.º 850/15.3YRLSB.

As autoras ofereceram contra-alegação a pugnar pela inadmissibilidade do recurso e pelo seu total insucesso.

Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

II -  Fundamentação de facto

A factualidade tida por provada pelas instâncias é a seguinte:

«A – Das substâncias ativas: Telmisartan e Hidroclorotiazida

1) “Telmisartan” é o nome genérico usado em farmácia (DCI — Denominação Comum Internacional) do composto cuja fórmula consta de folhas 67

2) O Telmisartan é um antagonista específico do recetor da angiotensina II (tipo AT1) com ação farmacológica ao nível da hipertensão essencial no adulto e na redução da morbilidade em adultos com doença aterotrombótica cardiovascular ou com diabetes mellitus tipo 2 com lesão ou risco de lesão cardíaca;

3) O Telmisartan é uma substância ativa utilizada, isoladamente ou em associação com outros fármacos (anti-hipertensores ou diuréticos), em medicamentos de uso humano;

4) O Telmisartan está indicado no tratamento da hipertensão essencial, por ser um antagonista ativo e específico do recetor da angiotensina II (tipo AT1) cujo efeito anti-hipertensor consistente permanece ao longo de 24 horas, mesmo durante as primeiras horas da manhã, quando o risco de episódios cardiovasculares é mais elevado;

5) A Hidroclorotiazida é um derivado de benzotiadiazina, tem uma ação farmacológica primária no aumento da excreção de elecrólitos, e, secundariamente, aumenta o fluxo urinário por retenção osmótica da água;

6) Ao inibir a absorção de sódio, aumentar a excreção de potássio e ao aumentar também o fluxo urinário, a Hidroclorotiazida contribui para a redução da pressão arterial, uma vez que a perda de água provoca o aumento da diurese e a diminuição do volume líquido extracelular;

7) A Hidroclorotiazida, em monoterapia, é um fármaco diurético de tiazida com atividade farmacológica no tratamento oral de edema e hipertensão, sendo, porém, um anti-hipertensor fraco;

8) Quando associado a outros hipertensores mais potentes, a Hidroclorotiazida tem interesse farmacológico por prevenir complicações cardiovasculares, sendo utilizado com sucesso em associação fixa com outros fármacos anti-hipertensores potentes, como o Telmisartan;

9) A administração destas duas substâncias ativas Telmisartan e Hidroclorotiazida, em associação fixa, confere uma potenciação da ação farmacológica quando comparada com a administração em monoterapêutica de cada um dos fármacos, originando reduções adicionais da pressão arterial, sendo esta potenciação particularmente indicada nos doentes hipertensos que não respondem adequadamente ao Telmisartan em regime de monoterapêutica;

B – Dos medicamentos de referência

10) Uma das formas farmacêuticas orais contendo Telmisartan e Hidroclorotiazida em associação fixa, utilizada para o tratamento da hipertensão essencial, é comercializada em Portugal pela Demandante CC sob a marca MicardisPlus®;

11) Foram concedidas AIM’s para o medicamento MicardisPlus® nas dosagens 40mg+12,5mg, 80mg+12,5mg e 80mg+25mg;

12) Outra das formas farmacêuticas orais contendo Telmisartan e Hidroclorotiazida em associação fixa, utilizada para o tratamento da hipertensão essencial, é comercializada em Portugal pela FF, A.G. sob a marca Pritorplus®, existindo um acordo de co-comercialização celebrado entre esta última e a Demandante BB GMBH;

C – Dos medicamentos genéricos

13) De acordo com a lista publicada na página eletrónica oficial do INFARMED em 19 de dezembro de 2012, a Demandada requereu, em 7 de dezembro de 2012, três AIM’s para medicamentos genéricos contendo as substâncias ativas Telmisartan e Hidroclorotiazida;

14) A Demandada requereu AIM’s para os medicamentos genéricos nas dosagens 40mg+12,5mg, 80mg+12,5mg e 80mg+25mg;

15) Os medicamentos cujas AIM’s a Demandada requereu contêm a associação fixa dos princípios ativos Telmisartan e Hidroclorotiazida;

16) Os medicamentos com o nome comercial MicardisPlus® serviram de referência aos medicamentos genéricos da Demandada;

17) Na sua composição, para além das duas substâncias ativas (Telmisartan e Hidroclorotiazida), os medicamentos genéricos compreendem os seguintes excipientes: hidróxido de sódio, manitol, amido de milho, celulose microcristalina, carmelose de cálcio, povidona, dióxido de silício, fumurato sódico de estearilo e água purificada, sendo que esta última não permanece no produto acabado;

18) Na produção dos medicamentos genéricos, o granulado de Hidroclorotiazida (HCTZ) é obtido num granulador de leito fluido em que se atomiza com água purificada a celulose microcristalina, a povidona (parte), a carmelose cálcica (parte), o amido de milho (parte), os estearil fumarato sódico e a HCTZ, sendo o granulado assim obtido seco no mesmo equipamento;

19) Na produção dos medicamentos genéricos, a granulação de Telmisartan efetua-se em duas fases;

20) Na primeira fase, dissolve-se em água purificada o hidróxido de sódio, parte da povidona, o Telmisartan e a sólica, obtendo-se o líquido de granulação;

21) O líquido de granulação é depois utilizado para humedecer, por aspersão num granulador de leito fluido, o manitol, parte do amido de milho e parte da carmelose cálcica;

22) Na segunda fase, prepara-se uma solução de revestimento com parte da povidona que será atomizada sobre os grânulos da primeira fase (que foram previamente tamisados), após o que se segue uma etapa de secagem. Ou seja, os grânulos húmidos de Telmisartan são secos e depois calibrados para uniformização de tamanhos e, de seguida, revestidos com uma solução de povidona, havendo uma segunda secagem;

23) O granulado de Telmisartan do comprimido da Demandada é revestido com povidona;

24) O comprimido para administração oral contendo Telmisartan e Hidroclorotiazida da Demandada compreende o Telmisartan na forma amorfa, i.e., o Telmisartan encontra-se na forma amorfa;

25) A estratégia adotada na formulação dos comprimidos da Demandada para ultrapassar o problema da instabilidade da Hidroclorotiazida com compostos básicos foi revestir os grânulos de Telmisartan, separando o hidróxido de sódio da HCTZ;

26) Nos comprimidos da Demandada, o Telmisartan e a Hidroclorotiazida encontram-se em grânulos distintos, impedindo-se assim o contacto direto entre a Hidroclorotiazida, o Telmisartan e o hidróxido de sódio, sendo que parte da povidona utilizada na formulação tem a função isolante entre os grânulos e a celulose microcristalina integra unicamente os grânulos contendo Hidroclorotiazida;

27) Os medicamentos genéricos da Demandada utilizam como matéria-prima o Telmisartan na forma livre;

28) Os medicamentos genéricos da Demandada não contêm sorbitol;

D – Da EP 502314 e correspondente CCP 41

29) A Demandante AA GMBH & CO. KG. é titular da Patente Europeia n.º 502314 (abreviadamente EP 502314), que se refere a “Benzimidazoles, medicamentos contendo estes compostos e processo para a sua preparação”;

30) A Demandante AA GMBH & CO. KG. é titular do Certificado Complementar de Proteção n.º 41 (abreviadamente CCP 41), concedido por referência ao medicamento contendo Telmisartan como substância ativa e tendo por base a EP 502314;

31) A EP 502314 foi requerida em 31 de janeiro de 1992 e vigorou até 31 de janeiro de 2012;

32) A primeira Autorização de Introdução no Mercado (abreviadamente AIM) de um medicamento contendo Telmisartan como princípio ativo data de 11 de dezembro 1998;

33) O CCP 41 estendeu o período de tempo de proteção da EP 502314 em relação a qualquer produto que contivesse Telmisartan como substância ativa até 12 de dezembro de 2013;

34) A EP 502314 e o CCP 41 protegiam o Telmisartan em monoterapêutica;

E – Da EP 1442023

35) A Demandante AA GMBH & CO. KG. é titular da Patente de Invenção Europeia n.º 1442023 (abreviadamente EP 1442023), referente a “Sal de sódio cristalino do Telmisartan e sua utilização como antagonista de angiotensina”;

36) A EP 1442023 foi requerida ao Instituto Europeu de Patentes em 11 de outubro de 2002 e foi concedida em 15 de agosto de 2007;

37) Em 5 de setembro de 2007 foi entregue no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) a tradução para português do fascículo da patente EP 1442023;

38) A EP 1442023 vigora até 11 de outubro de 2022;

39) A EP 1442023 reivindica uma forma estável do sal de sódio cristalino de Telmisartan e os seus hidratos e solvatos, bem como formulações farmacêuticas contendo essa forma cristalina do sal de sódio do Telmisartan;

40) A 1.ª reivindicação da EP 1442023 protege o sal de sódio cristalino de Telmisartan de fórmula 1, caracterizado por apresentar um ponto de fusão T = 245 ± 5ºC;

41) O objeto da invenção a que se refere a EP 1442023 consiste na disponibilização de uma nova forma estável do Telmisartan (forma cristalina de sal de sódio de Telmisartan), uma vez que já se conhecia da EP 502314 o ácido livre (forma cristalina) de Telmisartan: “Telmisartan é passível de ser obtido sob a marca registada Micardis. Partindo do ácido livre de telmisartan é preparada a forma de administração, por meio da qual é comercializado telmisartan, através de um processo trabalhoso de secagem por aspersão”;

42) A EP 1442023 descreve a preparação, a caracterização e as propriedades distintivas da forma cristalina do sal sódico de Telmisartan, bem como o uso da forma cristalina do sal sódico de Telmisartan como matéria-prima;

43) O sal sódico do Telmisartan tem propriedades físico-químicas diferentes do Telmisartan (ou Telmisartan na forma livre), pelo que são substâncias distintas;

44) Ácidos e respetivos sais das bases conjugadas – caso do Telmisartan livre e respetivo sal sódico – são entidades químicas diferentes, assim como formas cristalinas – caso do Telmisartan livre no estado cristalino e usado como matéria-prima – e amorfas – tal como o Telmisartan amorfo nos comprimidos – são entidades diferentes com propriedades físicas próprias;

45) A reivindicação 10 da EP 1442023 depende da reivindicação 9 da mesma patente, a qual refere “compostos da fórmula 2”, sendo estes sais de ácido toluenossulfónico ou ácido metanossulfónico do Telmisartan, e não o sal sódico de Telmisartan ou ainda o Telmisartan denominado ácido livre;

F – Da EP 1467712

46) A Demandante AA GMBH & CO. KG. é titular da Patente de Invenção Europeia n.º 1467712 B2 (abreviadamente EP 1467712), referente a “Método de produção de um comprimido farmacêutico de duas camadas compreendendo Telmisartan e Hidroclorotiazida”;

47) A EP 1467712 foi requerida ao Instituto Europeu de Patentes em 16 de janeiro de 2002 e foi concedida em 12 de dezembro de 2007;

48) Em 14 de novembro de 2011 foi entregue no INPI nova tradução da EP 1467712 publicada no boletim do Instituto Europeu de Patentes n.º 11/35 de 31 de agosto de 2011, devido a oposição;

49) A EP 1467712 vigora até 16 de janeiro de 2022;

50) A EP 1467712 reivindica o método de produção de um comprimido farmacêutico de duas camadas, em que a composição da primeira camada contém Telmisartan, um agente básico e um solubilizador e/ou retardador da cristalização, e a composição da segunda camada contém Hidroclorotiazida;

51) A EP 1467712 reivindica um comprimido com uma camada inferior e outra superior, i.e., reivindica a separação de duas matrizes – uma primeira básica para o Telmisartan e uma segunda não básica para a Hidroclorotiazida – , na forma de duas camadas;

52) O processo reivindicado na EP 1467712 consiste nos seguintes seis passos:

«(i) proporcionar uma composição da primeira camada do comprimido

 a) preparando uma solução aquosa de telmisartan, pelo menos, um agente básico e um solubilizante e/ou um retardador de cristalização;

b) secando por pulverização a referida solução aquosa para obter um granulado seco por pulverização;

c) misturando o referido granulado seco por pulverização com um diluente hidrossolúvel para obter uma pré-mistura;

d) misturando a referida pré-mistura com um lubrificante para obter uma mistura final para a primeira camada do comprimido;

(ii) proporcionar uma composição da segunda camada do comprimido     

  e) misturando e/ou granulando hidroclorotiazida com os    constituintes de uma matriz de comprimido desintegrante;

  f) juntando um lubrificante para obter uma mistura final para a segunda camada do comprimido;

(iii) introduzir a composição da primeira ou da segunda camada do comprimido numa prensa de comprimidos;

(iv) comprimir a referida composição da camada do comprimido para formar uma camada do comprimido;

(v) introduzir a composição da outra camada do comprimido na prensa de comprimidos; e

(vi) comprimir ambas as composições das camadas do comprimido para formar um comprimido de duas camadas.»

53) Os comprimidos de duas camadas eram conhecidos do estado da técnica antes de 16 de janeiro de 2002, data de depósito da EP 1467712;

54) A associação fixa entre as substâncias ativas Telmisartan e Hidroclorotiazida era conhecida do estado da técnica antes de 16 de janeiro de 2002, data de depósito da EP 1467712, entendendo-se por associação fixa das substâncias ativas a administração concomitante de cada uma delas aos doentes;

55) As operações de granulação descritas na EP 1467712 eram conhecidas do estado da técnica antes de 16 de janeiro de 2002, data de depósito dessa patente;

56) O processo de granulação a húmido era conhecido do estado da técnica antes de 16 de janeiro de 2002, data de depósito da EP 1467712;

57) As operações de compressão para obtenção de comprimidos eram conhecidas do estado da técnica antes de 16 de janeiro de 2002, data do depósito da EP 1467712;

58) A generalidade dos comprimidos existentes é obtida por compressão – daí a sua denominação – e, frequentemente, pelo processo de granulação a húmido, sendo esta uma das técnicas gerais de produção de granulados, e era-o já antes de 16 de janeiro de 2002;

G– Da EP 1545467

59) A Demandante BB GMBH é titular da Patente de Invenção Europeia n.º 1545467 (abreviadamente EP 1545467), referente a “Formulações farmacêuticas sólidas compreendendo Telmisartan”;

60) A EP 1545467 foi requerida ao Instituto Europeu de Patentes em 18 de setembro de 2003 e foi concedida em 12 de setembro de 2007;

61) Em 14 de novembro de 2007 foi entregue no INPI a tradução para português do fascículo da patente EP 1545467;

62) A EP 1545467 vigora até 18 de setembro de 2023;

63) De acordo com o resumo da patente, a invenção da EP 1545467 refere-se a novas composições farmacêuticas sólidas compreendendo o antagonista do recetor de angiotensina II telmisartan, um agente básico, um tensioativo ou emulsionante e um diluente solúvel em água, e.g., na forma de granulados ou na forma de um pó, bem como com formulações orais sólidas prontas para utilização/ingestão, e.g., formulações em cápsulas ou em comprimidos preparadas a partir das referidas composições farmacêuticas, e métodos para a produção das referidas composições e formulações utilizando um processo de granulação em leito fluidizado ou um processo de secagem por pulverização;

64) A 1.ª reivindicação da EP 1545467 refere-se a uma composição farmacêutica compreendendo 3 a 50% em peso de Telmisartan disperso numa matriz de dissolução compreendendo:

«(a) um agente básico numa proporção molar de agente básico: telmisartan = 1:1 a 10:1,

(b) um tensoactivo ou emulsionante numa quantidade de 1 a 20% em peso da composição final,

(c) 25 a 70% em peso de um diluente solúvel em água, e

(d) Opcionalmente 0 a 20% em peso de excipientes e/ou adjuvantes adicionais, perfazendo a soma de todos os componentes 100%;

65) A presença de um tensioativo ou emulsionante é parte essencial e integrante da invenção descrita na EP 1545467;

66) A reivindicação 11 da EP 1545467 inclui a associação do Telmisartan com um diurético;

H– Da EP 2120884

67) A Demandante BB GMBH é titular da Patente de Invenção Europeia n.º 2120884 (abreviadamente EP 2120884), referente a “Composição farmacêutica”;

68) A EP 2120884 foi requerida ao Instituto Europeu de Patentes em 13 de março de 2008 e foi concedida em 29 de dezembro de 2010;

69) Em 3 de fevereiro de 2011 foi entregue no INPI a tradução para português do fascículo da patente EP 2120884;

70) A EP 2120884 vigora até 13 de março de 2028;

71) A EP 2120884 refere-se a um processo de fabrico de comprimido ou camada de comprimido farmacêutico compreendendo o antagonista do recetor da angiotensina II Telmisartan na forma amorfa, um agente básico e sorbitol, caracterizado por o sorbitol possuir uma área superficial específica entre 0,75 e 3,5 m2/g;

72) A EP 2120884 descreve um processo de preparação de um comprimido ou camada de comprimido com uma única substância ativa, o Telmisartan;

73) A EP 2120884 protege as composições em que o sorbitol apresenta uma área de superfície específica (0,75 – 3,5 m2/g), sendo certo que à data desta invenção o sorbitol era um excipiente conhecido;

74) O sorbitol constitui um elemento essencial da invenção descrita na EP 2120884;

I– Da EP 2260833

75) A Demandante AA GMBH & CO. KG é titular da Patente de Invenção Europeia n.º 2260833 (abreviadamente EP 2260833), referente a “comprimido farmacêutico de duas camadas compreendendo telmisartan e um diurético”;

76) A EP 2260833 foi requerida ao Instituto Europeu de Patentes em 16 de janeiro de 2002 e foi concedida em 21 de novembro de 2012;

77) Em 11 de dezembro de 2012 foi entregue no INPI a tradução para português do fascículo da patente EP 2260833;

78) A EP 2260833 vigora até 21 de novembro de 2032;

79) A EP 2260833 refere-se a um processo de fabrico de um comprimido farmacêutico de duas camadas para tratamento de hipertensão compreendendo uma primeira camada formulada para a libertação imediata do antagonista do recetor da angiotensina II telmisartan, a partir de uma matriz de comprimido dissolvente, que contém telmisartan na forma substancialmente amorfa, e uma segunda camada formulada para a libertação imediata de um diurético de tiazida, a partir de uma matriz de comprimido desintegrante;

80) A 1.ª reivindicação da EP 2260833 refere-se a «comprimido farmacêutico de duas camadas para utilização num método de tratamento de hipertensão compreendendo uma primeira camada contendo telmisartan em, pelo menos, 90% na forma amorfa como determinada por medição por difração em pó de raio X, numa matriz de comprimido dissolvente compreendendo um agente básico e um diluente hidrossolúvel, e uma segunda camada contendo um diurético de tiazida numa matriz de comprimido desintegrante»;

81) Na EP 2260833, a primeira camada está concebida para a libertação imediata do Telmisartan através da dissolução da própria camada;

82) Na EP 2260833, a segunda camada está formulada para a libertação imediata do diurético por desagregação da camada;

83) Tal como referido na pág. 3 da descrição da EP 2260833, a combinação de Telmisartan e Hidroclorotiazida numa mistura de pós ou num co-granulado não foi possível devido a incompatibilidade entre a Hidroclorotiazida e compostos básicos como a meglumina, o que fez com que a titular da patente optasse, após experimentar outras possibilidades, pela solução de formular o comprimido de dupla camada que foi patenteado. § 7.2.º;

84) Resulta da descrição e das reivindicações da EP 1467712 que a concessão desta patente se ficou a dever à invenção de um processo que permite resolver o problema de incompatibilidade química das duas substâncias ativas, devido à instabilidade da Hidroclorotiazida em meio básico que é o meio necessário para o Telmisartan ter uma dissolução adequada. A valorização desta invenção é evidenciada na descrição da patente, página 4 da descrição (versão B2): «Têm sido investigadas várias vias galénicas para ultrapassar o problema de incompatibilidade. Uma via clássica é a de revestir as partículas de HCTZ, num granulador de leito fluidizado, com uma solução polimérica contendo polímeros hidrossolúveis, como hidroxipropilcelulose, hidroxipropilmetilcelulose ou polivinilpirrolidona, reduzindo deste modo a área de superfície de contacto das partículas de HCTZ com a formulação de telmisartan durante a mistura e compressão. Contudo, por estes meios, num comprimido prensado, não foi possível reduzir a área de contacto de HCTZ com a formulação de telmisartan até um grau suficiente para alcançar a duração de armazenamento prolongado desejada»;

85) Da mesma forma, resulta da descrição e das reivindicações da EP 2260833 que a concessão desta patente também resulta da invenção de um processo que permite resolver o problema de incompatibilidade química das duas substâncias ativas, devido à instabilidade da Hidroclorotiazida em meio básico que é o meio necessário para o Telmisartan ter uma dissolução adequada. Isto é evidenciado na descrição da patente, página 4 da descrição: «Têm sido investigadas várias vias galénicas para ultrapassar o problema de incompatibilidade. Uma via clássica é a de revestir as partículas de HCTZ, num granulador de leito fluidizado, com uma solução polimérica contendo polímeros hidrossolúveis, como hidroxipropilcelulose, hidroxipropilmetilcelulose ou polivinilpirrolidona, reduzindo deste modo a área de superfície de contacto das partículas de HCTZ com a formulação de telmisartan durante a mistura e compressão. Contudo, por este meio, num comprimido prensado, não foi possível reduzir a área de contacto de HCTZ com a formulação de telmisartan até um grau suficiente para alcançar a duração de armazenamento prolongado desejada»;

86) A natureza desta invenção resulta da criação de uma abordagem nova em que as duas substâncias ativas estão separadas entre si através da produção separada de grãos contendo um tipo de grão Telmisartan e o outro tipo de grão Hidroclorotiazida;

87) Nas EP 1467712 e EP 2260833, o processo patenteado compreende, inicialmente, a compressão do grão contendo Telmisartan, gerando-se assim uma parte do comprimido (primeira camada) e seguidamente é adicionado o grão contendo Hidroclorotiazida, que é comprimido por cima da primeira camada, sendo assim gerada a segunda camada;

88) Na EP 2260833, a novidade da invenção está na redução da superfície de contacto através da produção de um comprimido em duas camadas. A importância da necessidade de ter o mínimo de superfície de contacto entre as substâncias ativas é evidente na seguinte especificação técnica constante das páginas 18 e 19 da descrição da patente: «Para a produção do comprimido de duas camadas, de acordo com a presente invenção, a primeira e segunda composição das camadas do comprimido são comprimidas numa prensa de comprimidos de duas camadas, e.g., uma prensa rotativa, no modo de comprimido em duas camadas, da maneira descrita acima. De modo a evitar qualquer contaminação cruzada entre a primeira e a segunda camada do comprimido (o que poderia conduzir à decomposição da HTCZ), quaisquer resíduos do granulado têm de ser cuidadosamente removidos durante a compressão dos comprimidos por sucção intensa da mesa de molde dentro da câmara de compressão»;

89) A descrição do processo de produção dos comprimidos nas duas patentes (EP 1467712 e EP2260833) é consistente com a criação de um comprimido em duas camadas;

90) O comprimido produzido pela Demandada resulta também da preparação separada de grãos, contendo um tipo de grão Telmisartan e o outro tipo de grão Hidroclorotiazida, sendo que no caso do grão contendo o Telmisartan existe um passo específico no processo para gerar um revestimento de povidona à volta do grão. Os dois grãos são depois misturados numa proporção de HCTZ: Telmisartan de 3:2 e posteriormente prensandos para originar o comprimido final (Módulo 3.2.P.3.3 do dossier entregue pela GENERIS no INFARMED);

91) Alterado pela Relação (cfr. fls. 79 e 80)[1];

92) Alterado pela Relação (cfr. fls. 79 e 80)[2];

93) Alterado pela Relação (cfr. fls. 79 e 80)[3], ficando os três pontos com a seguinte redacção: De acordo com a formulação descrita pela Demandada, a necessidade de proteger a Hidroclorotiazida do meio básico existente no granulado contendo o Telmisartan origina um comprimido com uma estrutura macroscopicamente homogénea, que microscopicamente contém duas matrizes diferentes que não se contactam, permanecendo separadas e indivudualizadas.

94) A EP 1467712 protege um processo específico de produção de um comprimido de duas camadas compreendendo Telmisartan e Hirdroclorotiazida – resulta claro do texto das reivindicações da própria patente, uma vez que se refere sempre “método de produção” ou “método como reivindicado”;

95) O método ou processo de secagem por pulverização é reivindicado na EP 1467712, tanto na primeira reivindicação como nas seguintes, surgindo como relevante (atribui-se-lhe a designação de “método específico”) para a justificação da invenção;

96) Ambas as técnicas (granulação em leito fluido e de secagem por pulverização) fazem parte dos processos industriais de produção de comprimidos;

97) A granulação em leito fluidizado consiste em colocar pó num recipiente e, de alguma forma, esse pó fica suspenso numa corrente de ar e é humedecido, sendo depois aquecido para secar e produzir grânulos;

98) O processo de secagem por pulverização ou “spray drying” consiste em secar um líquido que está dividido, atomizado em pequenas partículas, transformando-o num pó fino;

99) A forma como o grão (ou pó) é gerado ou como cresce é diferente nos dois processos (granulação em leito fluido e de secagem por pulverização);

100) Os dois métodos (granulação em leito fluido e de secagem por pulverização) permitem a formação de grãos (ou pós), sendo que o “spray drying”, pela metodologia que tem, é um processo que origina pós mais finos, enquanto o outro origina grânulos, i.e., o resultado ou “produto” final obtém-se em gamas de tamanho diferentes em cada um dos dois métodos;

101) No processo da Demandada é usado Telmisartan na forma de ácido livre que é neutralizado com um excesso de base (hidróxido de sódio), originando o sal de sódio de Telmisartan (de acordo com o diagrama de descrição do processo utilizado pela Demandada constante do módulo 3.2.P.3.3.;

102) Eliminado pela Relação (cfr. fls. 79 verso e 80)[4];

103) Eliminado pela Relação (cfr. fls. 79 verso e 80)[5];

104) Eliminado pela Relação (cfr. fls. 79 verso e 80)[6];

105) Na EP 2120884, a invenção resulta da descoberta de que a área superficial do sorbitol é determinante na dureza do comprimido e na taxa de dissolução do Telmisartan;

106) O sorbitol e manitol são disteriómeros (hexoses), ou seja, compostos com a mesma fórmula molecular, os mesmos grupos funcionais e as mesmas ligações, mas não são a imagem um do outro num espelho plano (enantiómeros);

107) O sorbitol e o manitol são substâncias diferentes, tendo geralmente propriedades distintas como ponto de fusão, pontos de ebulição, temperaturas de decomposição, desvio de polarização da luz (no caso de terem centros assimétricos), índice de refração, polaridade (nomeadamente em separação cromatográfica);

108) A diferença entre o sorbitol e o manitol reside apenas na posição relativa de um grupo hidroxilo, pelo que devido a esta grande semelhança entre as duas estruturas é previsível que tenham algumas propriedades físicas muito parecidas;

109) No contexto de formulação do medicamento, apesar de serem funcionalmente equivalentes, é previsível que possam ter diferenças em termos de velocidade de dissolução, grau de dissolução em água e capacidade de absorção de água (higroscópicos);

110) Relativamente à área superficial, tanto o sorbitol como o manitol têm, na forma cristalina, uma área superficial na mesma gama uma vez que são substâncias activas funcionalmente equivalentes (alterado pela Relação, cfr. fls. 79 verso e 80)[7];

111) Na descrição da EP 1545467 são identificados tensioativos e emulsionantes e na reivindicação 3 é feita a sua seleção: «Composição farmacêutica da reivindicação 1, em que os tensoactivos e emulsionantes são selecionados de poloxâmeros ou pluronics, polietilenoglicóis, monoestearato de polietilenoglicol, polissorbatos, laurel sulfato de sódio, óleo de rícino polietoxilado e hidrogenado»;

112) Na EP 1545467, os inventores descrevem a função de outros ingredientes, tendo considerado a povidona como exemplo específico de aglutinante de granulação por via húmida e como diluentes e veículos (página 6 da descrição): «(…) Exemplos específicos de aglutinantes de granulação por via húmida são amido de milho, polivinilpirrolidona (Povidona), copolímero de vinilpirrolidona-acetato de vinilo (Copovidona) e derivados de celulose como hidroximetilcelulose, hidroxietilcelulose, hidroxipropilcelulose e hidroxipropilmetilcelulose. (…) Os outros excipientes e adjuvantes, se utilizados, são de um modo preferido selecionados de diluentes e veículos tais como celulose em pó, celulose cristalina ou celulose microcristalina, derivados de celulose como hidroximetilcelulose, hidroxietilcelulose, hidroxipropilcelulose e hidroxiprpilmetilcelulose, fostato de cálcio dibásico, amido de milho, amido pré-gelatinizado, polivinilpirrolidona (Povidona), etc;»;

113) Consta do dossier do INFARMED a indicação de que, no processo descrito pela Demandada, a povidona, que tem características de agente tensioactivo, é utilizada, na primeira fase do processo, com a função de retardar a cristalização do Telmisartan, de forma a obter-se o Telmisartan preferencialmente na forma amorfa, e na segunda fase, como revestimento dos grãos contendo Telmisartan (alterado pela Relação, cfr. fls. 79 verso e 80)[8].

III – Fundamentação de direito

A apreciação do presente recurso, delimitado pelas conclusões da alegação da recorrente (art.ºs 635º, n.º 4 , e 639º, n.º 1, do Cód. de Proc. Civil), passa, em primeiro lugar, por decidir da admissibilidade do recurso interposto tendo por objecto a impugnação do acórdão da Relação que apreciou o recurso incidente sobre a decisão arbitral proferida no âmbito de litígio emergente de direitos de propriedade industrial em que estão em causa medicamentos de referência e genéricos, ou seja, pela análise e dilucidação da eventual recorribilidade directa, nos termos gerais, ou também pela invocada contradição de julgados e, só depois, concluindo-se pela admissibilidade do recurso, nos termos gerais, é que haverá lugar à apreciação das restantes questões acopladas pela recorrente: alteração da matéria de facto (valor probatório da perícia), transmissibilidade e infracção de patentes por equivalência.

Apreciando, então, a admissibilidade do interposto recurso de revista, importa ter em conta que estamos perante uma acção arbitral iniciada já no âmbito da Lei n.º 62/2011, de 12 de Dezembro, que instituiu um regime de composição extrajudicial dos litígios emergentes de direitos de propriedade industrial em que estejam em causa medicamentos de referência e genéricos, visando também pôr termo ao denominado patent linkage[9].

 Subjacente à criação desse regime esteve, como se sabe, a constatação das delongas e estrangulamentos verificados no ingresso de medicamentos genéricos no mercado, a preocupação com as inerentes repercussões financeira[10] e, bem assim, com o avolumar de processos judiciais em que, com base na invocação de direitos de propriedade industrial a favor de outrem, se debatia a concessão da autorização de introdução no mercado desses medicamentos.

A solução encontrada passou pela submissão dos litígios em que se discuta a existência, ou não, de violação dos direitos de propriedade industrial à apreciação de um tribunal arbitral necessário, criando um regime processual pensado para ser dotado de celeridade[11], o que é concretizado nos artigos 2º e 3º daquele diploma. Aí, para além da expressa submissão dos diferendos que opõem os titulares de direitos de propriedade industrial relacionados com medicamentos de referência e os requerentes de autorização de introdução no mercado de medicamentos genéricos à arbitragem necessária (institucionalizada ou não institucionalizada), é notória a preocupação patenteada com a resolução célere desses conflitos no regime adjectivo que se fixa nos vários números que compõem o artigo 3º da Lei n.º 62/2011, de 12 de Dezembro.

Nesse regime processual, destaca-se o disposto no n.º 7 do artigo 3º[12], no qual se estabelece que a decisão arbitral é, com efeito meramente devolutivo, recorrível perante o competente Tribunal da Relação, o que só pode significar, como resulta da exposição de motivos da proposta de Lei 13/XII, aprovada em Conselho de Ministros e que deu origem àquele diploma, que o legislador, no âmbito da arbitragem necessária, quis garantir o acesso a um único tribunal estadual, que expressamente determinou ser o da Relação.

Note-se, aliás, que, no processo legislativo e apesar das preocupações expressas pelo Conselho Superior do Ministério Público e pela Associação Portuguesa de Arbitragem[13] acerca da impugnação judicial da decisão arbitral, o citado preceito reproduziu ipsis verbis a redacção do n.º 7 do artigo 3º da Proposta de Lei n.º 13/XII, tudo a apontar, portanto, para a conclusão de que a possibilidade de solicitar a reapreciação da decisão arbitral aos tribunais estaduais se cinge ao recurso perante a Relação.

Esta interpretação colhe claro apoio, desde logo, no pensamento legislativo (artigo 9º do Código Civil), bem expresso na exposição de motivos[14], quando refere que se atribui aos litigantes «o direito a uma [sublinhado nosso] instância de recurso (…)», limitação essa que também se mostra consonante com a preocupação da rápida resolução deste tipo de litígios. E essa preocupação, que, como já se disse, norteia o aludido regime legislativo, encontra plena correspondência na letra da lei e nos elementos gramaticais nela vertidos, não cabendo, pois, desconsiderá-la (cfr. n.º 2 do artigo 9º do Código Civil).

Também a dimensão sistemática da interpretação parece apontar no sentido que preconizamos, na medida em que os preceitos que resolvem a questão da recorribilidade das decisões da Relação em matéria de propriedade industrial e, paralelamente, no domínio da arbitragem voluntária não vão no sentido da irrestrita irrecorribilidade das mesmas para o Supremo Tribunal e Justiça.

Com efeito, o n.º 3 do artigo 46.º do Código da Propriedade Industrial – em cujo regime substantivo se buscaria, em parte, a solução para o caso em apreço – prevê que «Do acórdão do Tribunal da Relação não cabe recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, sem prejuízo dos casos em que este é sempre admissível»[15], fixando, assim, a Relação como normal tecto recursório para o recurso, de plena jurisdição, previsto no artigo 39º desse Código, tendo por objecto a impugnação das decisões que concedam ou recusem direitos de propriedade industrial.

Por outro lado, a alínea g) do n.º 1 do artigo 59º da Lei da Arbitragem Voluntária (Lei n.º 63/2011, de 14 de Dezembro[16]), define como tribunal judicial competente para conhecer das específicas questões ou decisões arbitrais aí referidas, relativas a litígios pertencentes à respectiva jurisdição, a Relação em cujo distrito se situe o lugar da arbitragem, atribuindo-lhe «o grosso das questões e decisões que devem ser sujeitas (em 1ª ou 2ª instância) aos tribunais judiciais»[17] e o n.º 8 do mesmo preceito que estatui sobre o recurso dessas decisões salvaguarda, na parte final, sempre  «que tal recurso seja admissível segundo as normas aplicáveis à recorribilidade das decisões em causa»[18].

Atenta a quase contemporaneidade deste último diploma, não se descortina sequer necessidade de interpretação actualista do n.º 7 do artigo 3º da Lei n.º 62/2011, de 12 de Dezembro, que limita o recurso à Relação e logicamente exclui o acesso ao Supremo Tribunal de Justiça, interpretação que temos por mais acertada e conforme à celeridade que o legislador quis, de caso pensado, imprimir a esse regime.

Este entendimento foi perfilhado nos seguintes acórdãos deste Supremo, cujos sumários, na parte que interessa, se transcrevem:

II - Com a Lei n.º 62/2011, de 12-12, pretendeu-se por termo ao denominado patent linkage – como resulta da exposição de motivos da proposta de Lei 13/XII, aprovada em Conselho de Ministros e que deu origem àquele diploma – razão pela qual o disposto no art. 3.º, n.º 7, só pode significar que o legislador, no âmbito da arbitragem necessária, quis garantir o acesso a um tribunal estadual, que expressamente determinou ser o da Relação, o que implica, logicamente, a exclusão do 2.º grau de recurso para o STJ. 

III - Se é certo que o legislador não pode abolir in toto o sistema de recursos, nem restringi-lo de tal modo que, na prática, levasse à supressão do direito de recorrer, também o é que o direito de acesso aos tribunais não impõe ao legislador ordinário que garanta sempre aos interessados o acesso a diferentes graus de jurisdição para defesa dos seus direitos (acórdão de 06-05-2014, proferido no processo n.º 402/13.2YRLSB.S1).

I - A Lei n.º 62/2011, de 12-12, criou um novo regime de composição dos litígios emergentes de direitos de propriedade industrial quando estejam em causa medicamentos de referência e medicamentos genéricos, determinando, nesses casos, a obrigatoriedade de recurso à arbitragem (arbitragem necessária). 

II - Do regime estabelecido resultou clara uma preocupação de celeridade, bem como o direito a uma instância de recurso, sendo que o elemento gramatical, racional e histórico da interpretação convergem no sentido de se considerar que o regime criado pela Lei n.º 62/2011 vedou o acesso das partes ao STJ, sendo a Relação a única instância de recurso facultada às partes (acórdão de 16-09-2014, proferido no processo n.º 183/14.2YRLSB.L1.S1).

I - No que tange à arbitragem necessária no âmbito da Lei n.º 62/2011, de 12-12 – que criou um novo regime de composição de litígio emergentes de direitos da propriedade industrial quando estejam em causa medicamentos de referência e medicamentos genéricos – quis o legislador deixar explícito que a garantia constitucional de acesso a um tribunal estadual – o tribunal da Relação – exclui o recurso de revista para o STJ (acórdão de 26-03-2015, proferido no processo n.º 1203/13.3YRLSB.S1).

I - O art. 3.º, n.º 7, da Lei nº 62/2011, de 12-12 – diploma que criou um novo regime de composição dos litígios emergentes de direitos de propriedade industrial quando estejam em causa medicamentos de referência e medicamentos genéricos – deve ser interpretado no sentido de que da decisão arbitral cabe apenas recurso para o tribunal da Relação, não sendo já admissível recurso de revista normal do acórdão da Relação para o STJ (acórdão de 14-04-2015, proferido no processo n.º 512/14.9YRLSB-B.S1).

I - No âmbito dos litígios emergentes de direitos de propriedade industrial relativos a medicamentos de referência e medicamentos genéricos, não é admissível recurso do acórdão do Tribunal da Relação, nos termos do n.º 7 do art. 3.º da Lei n.º 62/2011, de 12 de dezembro.

II - A contradição de julgados no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, para efeitos de recurso, pressupõe também a coincidência dos mesmos factos em ambas as decisões (acórdão de 02-02-2017, proferido no processo n.º 393/15.5YRLSB.S1) [19].

Esta orientação da jurisprudência de vedar o acesso ao mais Alto Tribunal, cingindo a possibilidade de recurso da decisão arbitral à Relação, é aceite pela maioria da doutrina.

Assim, Dário Moura Vicente, ob. cit., pág. 976, escreve que «Importa, outrossim, ter presente que o alcance da referida imposição de arbitragem necessária pela lei n.º 62/2011 é consideravelmente mitigado por duas ordens de factores. Em primeiro lugar, a circunstância, já aludida, de as decisões dos tribunais arbitrais previstos nesse diploma serem susceptíveis de recurso para os tribunais da relação: em última análise, sempre serão, por conseguinte, os tribunais estaduais a decidirem os litígios entre titulares de patentes e fabricantes de medicamentos genéricos. (…)»;

Por seu turno, Sofia Ribeiro Mendes, ob. cit., pág. 1028, refere que «(…) Da decisão arbitral cabe recurso para o Tribunal da Relação competente (…)», no que é acompanhada por Pedro Caridade Freitas, Medicamentos genéricos e tutela dos direitos de propriedade intelectual – Estudos de Direito de Propriedade Intelectual em Homenagem ao Prof. Doutor José de Oliveira Ascensão 50 anos de vida académica, Almedina, pág. 1030, onde explana, a tal propósito, que «Em relação à possibilidade de recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, tem sido posição deste Tribunal que a menção expressa de o legislador a admitir o recurso para o Tribunal da Relação, sem referência a qualquer outra instância de recurso, exclui a admissibilidade de recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, pelo que a Lei n.º 62/2011 apenas contempla uma instância de recurso (…)».

Acresce ainda que tal orientação respeita inteiramente a garantia de acesso ao direito (n.º 1 do artigo 20º da Constituição da República Portuguesa – e, em particular, a dimensão que se traduz no direito a uma tutela jurisdicional efectiva), contemplando, ademais, como se infere da previsão de instância recursória, o direito de recurso (cfr. n.os 1 e4 do artigo 210º e n.º 2 do artigo 211º da Lei Fundamental)[20], que não é suprimido, mas apenas limitado por razões racionalmente fundadas e não excessivas, tanto mais que a exigência constitucional de um duplo grau de jurisdição se acha confinada ao domínio do processo penal (n.º 1 do artigo 32º da Constituição da República Portuguesa)[21].

Aliás, no domínio da arbitragem necessária[22] instituída pela Lei n.º 62/2011, de 12 de Dezembro, tem sido entendido, sob o prisma constitucional,  que «o legislador instituiu um mecanismo de reexame da decisão arbitral perante um órgão judicial do Estado, permitindo ao particular discutir a decisão arbitral que se pronunciou sobre o fundo da causa ou que, sem conhecer deste, pôs termo ao processo arbitral, junto do Tribunal da Relação competente, a quem caberá a última palavra na resolução dos litígios submetidos à jurisdição arbitral necessária. Assim sendo, em certa medida, o regime de arbitragem necessária em análise (decorrente da norma inserta no artigo 2.º da Lei n.º 62/2011) vai ao encontro das garantias assinaladas na jurisprudência citada (…)» pelo que «não se mostrará desconforme com a garantia decorrente do direito de acesso aos tribunais e a uma tutela jurisdicional efetiva, na medida em que se encontra assegurada a intervenção de tribunal estadual na reapreciação das decisões proferidas quanto à questão de fundo na justiça arbitral. (…)»[23].

Assim sendo e posto que a limitação do recurso da decisão arbitral para os tribunais estaduais em um só grau assenta numa razão suficientemente objectiva – a falada preocupação de celeridade na resolução dos litígios que envolvem a introdução no mercado de medicamentos genéricos –, não se divisa que a interpretação que sustentamos possa ser tida como inconstitucional[24].

Diga-se ainda que não evola da Lei n.º 62/2011, de 12 de Dezembro, qualquer limitação quanto ao âmbito do recurso para a Relação, pelo que o mesmo pode envolver (como, de resto, sucedeu no caso) a impugnação da matéria de facto e a reapreciação das questões jurídicas, o que contribui para reforçar a conclusão extraída no antecedente parágrafo[25].

Deste modo, não se vislumbram quaisquer razões para que se devam franquear as portas do Supremo Tribunal de Justiça a todas as demandas em que se dirimam questões relacionadas com medicamentos genéricos e com a invocação de direitos de propriedade industrial respeitantes a medicamentos de referência, arrastando um processo que se quis célere e protelando a definição da respectiva situação, o que nos leva a concluir pela irrecorribilidade, nos termos gerais, do acórdão da Relação de Lisboa que a recorrente impugnou.

Essa regra de irrecorribilidade é, no entanto, excepcionada se invocada alguma das situações elencadas no artigo 629º, n.º 2, alíneas a), b), c) e d), do Cód. Proc. Civil, ou seja, quando estejam em causa violação das regras de competência absoluta, ofensa de caso julgado, decisão respeitante ao valor da causa, com o fundamento de que o mesmo excede a alçada do tribunal recorrido, decisão proferida contra a jurisprudência uniformizada do Supremo Tribunal de Justiça e contradição de julgados[26].

Não se verificando qualquer uma destas situações excepcionais permissivas da revista «atípica», cujo objectivo é garantir que não fiquem sem possibilidade de resolução pelo mais Alto Tribunal os conflitos de jurisprudência verificados entre acórdãos das Relações, em matérias que, de acordo com a regra geral, nunca poderiam vir a ser apreciadas pelo Supremo Tribunal de Justiça[27], não será de admitir recurso para o Supremo Tribunal de Justiça tendo por objecto o acórdão da Relação proferido no âmbito de acção arbitral, iniciada já na vigência da Lei n.º 62/2011, de 12 de Dezembro, em que estejam em causa medicamentos de referência e genéricos.

A presente revista tem por fundamento precisamente a oposição de julgados, impondo-se, por isso, verificar se ocorre essa condição de admissibilidade do recurso.

A contradição aqui equacionada e que releva como conditio da admissibilidade do recurso de revista pressupõe, além de mais, pronúncia sobre a mesma questão fundamental de direito, sendo que a questão de direito fundamental só é a mesma quando a subsunção do mesmo núcleo factual seja idêntica (ou coincidente), mas tenha, em termos de interpretação e aplicação dos preceitos legais sido feita de modo diverso[28]. Além disso, a oposição terá de ser frontal e incidir sobre decisões expressas relativamente a concreta questão, não abrangendo os argumentos ou fundamentos utilizados, nem sendo suficiente a oposição meramente tácita ou sequer uma diversidade implícita ou pressuposta[29].

Para efeitos da alínea d) do n.º 1 do artigo 629.º do actual Código de Processo Civil, deve-se considerar que existe oposição de julgados quando, por um lado, exista identidade da questão fundamental de direito – o que pressupõe o núcleo factual seja idêntico (ou, em larga medida, coincidente) – e, por outro, a interpretação e aplicação dos mesmos preceitos haja sido efectuada de modo oposto ou, pelo menos, diverso.

Posto isto, cotejemos, o acórdão recorrido e o acórdão fundamento (o proferido pela Relação de Lisboa, em 18.02.2016, no processo n.º 850/15.3YRLSB), a fim de neles descortinar razões de identidade que, a ser aplicável o citado preceito adjectivo, levarão à admissão do recurso.

No acórdão recorrido, o quadro factual considerado como demonstrado foi já atrás elencado e, quanto à dilucidação se os fármacos comercializados pela recorrente infringem as patentes europeias EP 1467712, EP 1545467, EP 2120884 e EP 2260833 – nele se discorreu do seguinte modo:

«6.4.2. Dirimidas estas questões de carácter mais genérico e estrutural, importa, finalmente, operar a subsunção dos factos declarados provados na previsão/estatuição das normas legais reguladoras das situações jurídicas como aquela que está em causa nesta acção, nomeadamente, as enunciadas em epígrafe.

E, para esse efeito, considera-se útil recordar o conteúdo da fundamentação de Direito do acórdão arbitral, a qual, no que verdadeiramente respeita ao conflito espelhado nos autos, é a seguinte: (…)

6.4.3. Compulsada a argumentação esgrimida em sede de recurso pelas apelantes, constata-se que estas não questionam que a protecção concedida à patente EP 502314 (com a extensão resultante do também ele caducado CCP 41) caducou no decurso do presente processo, mais concretamente em 12 de Dezembro de 2013, bem como a conclusão de que “perdeu interesse o julgamento sobre a alegada violação desta patente, pelo que também o julgamento de direito se fará apenas por referência às restantes cinco patentes referidas”.

E porque assim é, uma vez mais à luz do estatuído nos artºs 663º n.º 2 e 608º n.º 2 do CPC 2013, também este Tribunal Superior não se irá pronunciar sobre essa matéria.

Por outro lado e com invocação destes mesmos exactos fundamentos, está totalmente vedado a este Tribunal Superior, sob pena de estar a praticar uma nulidade (artºs 666º n.º 1 e 615º n.º 1 d), in fine, do CPC 2013), emitir pronúncia sobre os efeitos que poderão recorrer para o litígio espelhado nos autos (e para a solução a dar-lhe) da protecção garantida através da patente europeia EP 1442023 não invocada na petição inicial nem posteriormente em qualquer articulado de ampliação da causa de pedir.

O que, sem que se mostre necessária a apresentação de qualquer outra argumentação lógica justificativa, aqui se declara para que dúvidas não se suscitem.

6.4.4. Passando, então, ao escrutínio do argumentário desenvolvido pelos Senhores Árbitros, cumpre referir que, pelos motivos já enunciados na parte final do ponto 6.2.3. supra - e, no fundo, por comodidade de exposição -, se irá manter a estrutura lógica concebida pelos mesmos para buscar a solução do litígio e que é, no essencial, mantida na apresentação das críticas formuladas pelas apelantes e, naturalmente, dos correspondentes encómios manifestados nas contra-alegações da apelada.

Como é sabido, o Tribunal Arbitral considerou não existir qualquer violação dos direitos de propriedade intelectual das recorrentes e absolveu a recorrida dos pedidos contra ela formulados pelas Demandantes.

Ora, face à prova produzida, é nítido que existem algumas (poucas) violações literais dos direitos garantidos pelas patentes tituladas pelas apelantes que ainda estão em vigor - por exemplo, as duas compressões necessárias para a produção dos fármacos comercializados pela apelada que são realizadas como reivindicado nos passos (iii), (iv), (v), e (vi) da reivindicação I da EP 1467712 (circunstância que, o que se assinala, permite, nessas limitadas situações, a aplicação ao caso do estatuído no art.º 98.º do Código da Propriedade Industrial (Inversão do ónus da prova), norma cujo texto integral é «Se uma patente tiver por objecto um processo de fabrico de um produto novo, o mesmo produto fabricado por um terceiro será, salvo prova em contrário, considerado como fabricado pelo processo patenteado.» mas também no art.º 344.º do Código Civil).

Porém e é isso que essencialmente releva para o destino do pleito, o que mais se constata é a ocorrência de modificações de um ou mais elementos do processo descrito e reivindicado na patente para a obtenção de um mesmo produto em tudo equivalente ao protegido por título de propriedade industrial - e sendo esses outros métodos igualmente equivalentes aos protegidos pelas patentes, que assim são violadas.

Citando um acórdão do Supremo Tribunal Federal dos Estados Unidos no caso “Graver Tank & Mfg Co. v. Linde Air Prods Co., 339 US, 1950” (…).

E é por isso que é verdadeiramente penoso e desgastante observar os extremos mas vãos esforços das recorrentes numa fútil e inútil tentativa de provar que os comprimidos para os quais a recorrida obteve as AIM em disputa nos autos têm duas camadas quando manifestamente não têm.

Ou seja, para este Tribunal Superior, à luz dos critérios operativos de análise crítica sustentados pela Doutrina dos Equivalentes, as apelantes conseguiram comprovar que os fármacos (comprimidos) comercializados pela apelada, muito embora não tenham essas tão debatidas duas camadas, porque as duas substâncias (Telmisartan e Hidroclorotiazida), que até são incompatíveis, não se contactam, permanecendo separadas e individualizadas, são produzidos com violação das patentes tituladas por aquelas Demandantes, a começar pelas EP 1467712, 2260833 e 1545467, porquanto o problema técnico que alegadamente se visou ultrapassar é o mesmo que se colocava em relação à patente das recorrentes - ou seja, a fraca solubilidade do ingrediente ativo (Telmisartan) -, os elementos modificados introduzidos no processo de fabricação dos medicamentos genéricos da mesma Demandada estão, sem margem para dúvidas, ao alcance de um médio perito na especialidade, designadamente os excipientes que exercem a mesma função na formulação farmacêutica (sobitrol versus manitol), e, finalmente, a solução técnica e o resultado final obtido nesses medicamentos é exatamente o mesmo que se encontra patenteado - em concreto: uma taxa de dureza do comprimido e dissolução do ingrediente ativo (Telmisartan).

E, só por estas razões, haveria que julgar procedente a pretensão submetida a Juízo pelas aqui recorrentes e, em igual medida, a apelação que aqui e agora se aprecia.

6.4.5. Convirá, porém, clarificar com maior detalhe, o que afirma e defende a chamada Doutrina dos Equivalentes. (…)

E, em concreto, essa é a situação que se verifica nestes autos, sendo dispensável citar a visão doutrinal dominante nos Estados Unidos da América, que vem sendo adoptada desde 1853, no caso Winans v. Denmead, no qual se concluiu, conforme mencionam Luís M. Couto Gonçalves (in “Manuel de Direito Industrial. Patentes, Desenhos ou Modelos, Marcas e Concorrência Desleal” 2ª edição. Almedina, 2008. p. 120.) e Denis Borges Barbosa (in “Da doutrina dos Equivalentes em direito de Patentes” - http://denisbarbosa.addr.com/equivale.pdf.), que a reivindicação abrange todas as variáveis que o requerente não tenha de alguma forma dela excluído, e que, nos tempos mais recentes, assenta no chamado «teste function-way-result», que, voltando às palavras de Daphne Constantinopolos, “… consiste em identificar se o elemento do invento patenteado e a variante desempenham a mesma função, de uma maneira substancialmente igual e obtendo o mesmo resultado. Se se observar tal realidade (semelhança ao desempenhar a mesma função, do mesmo modo e obtendo o mesmo resultado), haverá a equivalência” (sic), que, em boa verdade, também leva a concluir no mesmo sentido que a visão alemã da aludida Doutrina.

Nesta conformidade e face aos direitos conferidos pela patente que estão previstos no art.º 101º do CPI, a saber: (…), forçoso se torna concluir que está devidamente demonstrado no processo que os produtos comercializados pela Demandada violam os direitos de propriedade industrial das Demandantes consubstanciados nas ainda vigentes patentes europeias EP 1467712, EP 1545467, EP 2120884 e EP 2260833.

Claro que não se ignoram as consequências económicas e sociais (e os benefícios para os doentes e para o Erário Público do País - ou para se ser mais exacto, para o dinheiro amealhado a partir dos rendimentos dos contribuintes) da introdução no mercado dos medicamentos genéricos.

Mas, a verdade é que sem a contribuição dos criativos de cujas capacidades técnicas e espírito inventivo nascem os medicamentos de referência (originais) sem os quais os resultados do combate da Humanidade contra a Doença (e as doenças) seriam tão precários como o foram nos séculos (rectius, milénios) que antecederam a produção industrial de fármacos.

Em suma, na definição da compreensão/extensão lógica dos critérios operativos inerentes à doutrina dos equivalentes deve buscar-se a solução que, dando cumprimento à regra estabelecida no n.º 1 do art.º 335º do Código Civil (no qual se lê e se estatui que «Havendo colisão de direitos iguais ou da mesma espécie, devem os titulares ceder na medida do necessário para que todos produzam igualmente o seu efeito, sem maior detrimento para qualquer das partes.» - e é de direitos validados por valores ético-sociais iguais que aqui se cuida), garanta um equilíbrio proporcionado entre a necessidade de assegurar o progresso tecnológico e a de proteger a certeza, a segurança e a tranquilidade do comércio jurídico.

Equilíbrio que, no entendimento deste Tribunal Superior, é alcançado com a solução dada neste acórdão à questão controvertida consubstanciada no primeiro dos pedidos deduzidos pelas ora apelantes cujo mérito e fundamento é aqui reconhecido e deferido. (…)”.

Por sua vez, no acórdão fundamento tiveram-se por demonstrados os seguintes factos:

«a) "Telmisartan" é o nome usado em farmácia do composto com a fórmula descrita nos arts. 5.° da petição inicial a 50.° da contestação e com o nome químico completo que consta do art. 51. ° da contestação.

b) O Telmisartan é um antagonista específico do recetor da angiotensina II (tipo ATI) com acção farmacológica ao nível da hipertensão essencial no adulto e na redução da morbilidade em adultos com doença aterotrombótica cardiovascular ou com diabetes mellitus tipo 2 com lesão ou risco de lesão cardíaca.

c) O Telmisartan é uma substância activa utilizada, isoladamente < associação com outros fármacos, em medicamentos de uso humano.

d) O Telmisartan, em monoterapêutica, é comercializado, em Portugal, pela CC, sob a marca MICARDIS® e sob a marca PRITOR®, pela FF A.G., no âmbito de um acordo de co-comercialização celebrado entre esta e a BB GMBH.

e) As formas farmacêuticas orais contendo Telmisartan e Hidroclorotiazida associação fixa, no tratamento da hipertensão essencial, são comercializadas em Portugal sob a marca MICARDISPLUS® e sob a marca PRITORPLUS®, pela BB GmbH e pela FF, A.G., no âmbito do mesmo acordo de co-comercialização.

f) A Hidroclorotiazida é um derivado de benzotiazina, tendo acção farmacológica primária no aumento da excreção de electrólitos e secundariamente aumenta o fluxo urinário por retenção osmótica da água. Esta perda de água provoca o aumento da diurese e diminuição do volume líquido extracelular e, consequentemente, a redução da pressão arterial.

g) A Hidroclorotiazida, em monoterapia, é um fármaco diurético com tiazida com actividade farmacológica no tratamento oral de edema e hipertensão, sendo, porém, um anti-hipertensor fraco. Quando associado com outros hipertensores mais potentes, tem interesse farmacológico por prevenir complicações cardiovasculares, sendo assim utilizado com sucesso em associação fixa com outros fármacos antihi per tensores potentes, como o Telmisartan.

h) A administração das substâncias activas Telmisartan e Hidroclorotiazida, em associação fixa, confere uma potenciação da acção farmacológica, originando reduções adicionais da pressão arterial, quando comparada com a administração em njionoterapia de cada um dos fármacos.

i) A primeira AIM concedida para os comprimidos contendo Telmisartan combinado com Hidroclorotiazida em associação fixa (MicardisPlus) foi cohcedida e 17 de Novembro de 2000, nos EUA.

j) Em 19 de Abril de 2002, a Comissão Europeia concedeu uma AIM para o medicamento MicardisPlus, válida para toda a União Europeia, que foí renovada em 19 de Abril de 2007.

k) As Demandadas GG, S.L. e Laboratórios HH, S.A.. (requereram ao INFARMED autorização para a introdução no mercado (AIM) dos medicamentos denominados "Telmisartan + Hidroclorotiazida Chemo" "MeldocPlus", mis dosagens de 40 mg. + 12,5 mg., 80 mg. + 12,5 mg. e 80 mg. + 25 mg., e na forma de comprimidos.

1) As patentes equivalentes, no território dos Estados Unidos da América, às Patentes Europeias n.ºs 1442023,1467712, 1545467 e 2120884 não são assinaladas pelas Demandantes no registo do medicamento «Micardis HCT®» (designação comercial do medicamento equivalente ao «Micardis Plus®» nos E.U.A.) junto da autoridade competente (FDA).

Patente Europeia n. ° 502314 e Certificado Complementar de Protecção n. ° 41

m) A patente referenciada como patente base para o Telmisartan é a patente de invenção europeia n." 502314, requerida em 31 de Janeiro de 1992, pela GmbH (que foi, em 1998, objecto de fusão com a BB origem à BB Pharma KG), reivindicando a prioridade do pedido de patente alemã DE 1991-4103492, de 6 de Fevereiro de 1991, para vigorar âmbito do território português.

n) A Patente Europeia n.? 502314 foi concedida pelo Instituto Europeu de Patentes, em 20 de Maio de 1998.

o) Em 19 de Agosto de 1998, foi entregue no Instituto Nacional da Propriedade Industrial a tradução do respectivo fascículo.

p) A substância Telmisartan foi descrita pela primeira vez a 6 de Fevereiro de 1991, não fazendo parte do estado da técnica à data do pedido da Patente 502314.

q) A Patente Europeia n. ° 502314 divulga uma família de compostos produtos farmacêuticos, dado serem antagonistas de angiotensina II, representada pela fórmula geral descrita nos arts. 59.° a 61.° da contestação.

r) A Patente Europeia n.? 502314 tem dois grupos de reivindicações, sendo que apenas o segundo grupo de reivindicações é aplicável a Portugal, como Estado signatário, e respeita ao processo de preparação de benzimidazoles novos e inventivas.

s) O grupo de reivindicações aplicável a Portugal comporta sete reivindicações, compreendendo o processo de preparação do Telmisartan ou de composições farmacêuticas que o contenham como substância activa.

t) A substância activa Telmisartan é um composto da fórmula geral I, compreendida na Reivindicação 1 da Patente Europeia n. ° 502314, existindo quatro métodos/processos alternativos para sua preparação, protegidos por essa reivindicação.

u) As Reivindicações 2 a 6 referem-se a outros processos, dependentes da Reivindicação 1.

v) A reivindicação 7 refere-se a um processo caracterizado por se incorporar, por via não-química, um composto obtido de acordo com, pelo menos, uma das reivindicações 1 a 6, em um ou mais veículos e!ou diluentes inertes.

w) De acordo com a Patente Europeia n." 502314 os compostos de fórmula geral I podem ser associados em formulações com outras substâncias activas, como a Hidroclorotiazida.

x) Foi concedido à titular desta Patente o Certificado Complementar n.º 41, por referência ao medicamento contendo o Telmisartan como substância que estende o período de tempo de protecção de Patente Europeia n.? 502314 em relação a qualquer produto que contenha Telmisartan como ingrediente activo Dezembro de 2013.

y) Conforme reivindicado na Patente Europeia n. o 502314, o Telmisartan é produzido na forma de um ácido livre (forma cristalina).

Patente Europeia n.º 1442023

z) A Patente Europeia n. o 1442023 foi pedida a 11 de Outubro de AA GmbH & Coo KG, reivindicando a prioridade de patente alemã DE 2001-10153737, de 31 de Outubro de 2001.

aa) A Patente Europeia n. o 1442023 foi concedida pelo Instituto Europeu de Patentes, em 15 de Agosto de 2007.

bb) Em 5 de Setembro de 2007, foi entregue no Instituto Nacional da Propriedade Industrial a tradução do respectivo fascículo.

cc) A Patente Europeia n. o 1442023 reivindica uma forma estável do sja1 de sódio cristalino de telmisartan e os seus hidratos e solvatos, bem como formulações farmacêuticas contendo essa forma cristalina do sal de sódio do telmisartan.

dd) A Patente Europeia n° 1442023 estará em vigor até 11 de Outubro de 2022.

Patente Europeia n.º 1467712

ee) A Patente Europeia n. o 1467712 foi pedida a 16 de Janeiro de AA GmbH & Coo KG.

ff) A Patente Europeia n.? 1467712 foi concedida pelo Instituto Ejuropeu de Patentes, em 12 de Dezembro de 2007.

gg) Em 26 de Dezembro de 2007, foi entregue no Instituto Nacional da Propriedade Industrial a tradução do respectivo fascículo.

hh) Patente Europeia n.? 1467712 reivindica o método de produção de um comprimido de duas camadas, em que a composição da primeira camada contém Telmisartan em forma substancialmente amorfa e a composição da segunda camada contém Hidroclorotiazida.

ii) A Reivindicação 1 desta refere-se ao método de produção de um comprimido farmacêutico de duas camadas, compreendendo a primeira Telmisartan a segunda Hidroc1orotiazida, através de 6 passos devidamente descritos nesta reivindicação, e descritos nos arts. 53 a 55 da petição inicial.

jj) A Patente Europeia n.? 1467712 estará em vigor até 16 de Janeiro de 2022.

Patente Europeia n. ° 1545467

kk) A Patente Europeia n." 1545467 foi pedida a 18 de Setembro de BB GMBH, reivindicando a prioridade do patente alemã DE 10244681, de 24 de Setembro de 2002.

ll) A Patente Europeia n. ° 1545467 foi concedida pelo Instituto Europeu de Patentes, em 12 de Setembro de 2007.

mm) Em 4 de Novembro de 2007, foi entregue no Instituto Nacional da Propriedade Industrial a tradução do respectivo fascículo.

nn) Patente Europeia n. ° 1545467 reivindica novas formulações farmacêuticas sólidas compreendendo Telmisartan e métodos para a sua produção, através da obtenção de Telmisartan na forma de granulado ou pó amorfo, pela dissolução de Telmisartan na forma cristalina, em meio básico, utilizando um tensoativo ou emulsionante não iónico, mistura do granulado ou pó amorfo com un diluente adequado e posterior secagem do granulado por leito fluído ou por secagem por pulverização, e reivindica ainda a utilização dessas formulações nos termos descritos no art. 61. ° da petição inicial.

oo) As Reivindicações 1 a 7 referem-se a composições farmacêuticas.

pp) As Reivindicações 8 a 10 referem-se a formulações farmacêuticas sólidas.

qq) A Reivindicação 11 refere-se a comprimidos farmacêuticos em bicamada, compreendendo uma primeira camada de comprimido contendo Telmisaitan, e uma segunda camada contendo um diurético e uma matriz de desintegração de comprimido.

rr) As Reivindicações 12 a 13 referem-se a processos para a preparação da composição farmacêutica da reivindicação 1.

ss) A Reivindicação 14 refere-se a processo para a preparação do comprimido em bicamada da Reivindicação 11, através de 6 passos.

tt) A Patente Europeia n." 1442023 estará em vigor até 18 de Setembro de 2023.

Patente Europeia n. ° 2130884

uu) A Patente Europeia n.º 2120884 foi pedida a 13 de Março de 2008, pela BB GMBH, reivindicando a prioridade do pedido de patente alemã DE 07104157, de 14 de Março de 2007.

vv) A Patente Europeia n.º 2120884 foi concedida pelo Instituto Ifuropeu de Patentes, em 29 de Dezembro de 2010.

ww) Em 3 de Fevereiro de 2011, foi entregue no Instituto Nacional da Propriedade Industrial a tradução do respectivo fascículo.

xx) A Patente Europeia n." 2120884 refere-se a um processo de fabrico de comprimidos em duas camadas para produção da associação fixa de Telmisartan c Hidroc1orotiazida, segundo as formulações e os métodos de fabrico reivindicados r Patentes Europeias n.º 1467712 e 1545467, nos termos descritos no art. 69[° e 70.° da petição inicial.

yy) A Patente Europeia n.? 2120884 estará em vigor até 13 de Março de 2028. zz) A AA GmbH & Coo KG concedeu à BB GmbH uma licença de exploração da Patente 502314 e do Certificado Complementar de Protecção n.? 41, tendo esta concedido uma sub-licença de exploração a favor da CC, Lda., com efeitos no território português, tendo sido averbadas junto do Instituto Nacional da Propriedade Industrial.

Na sequência do Despacho de 14 de fevereiro de 2014, o Tribunal fixou os seguintes temas de prova, dando por provado o seguinte:

Tema de prova 1 - O processo de produção dos medicamentos genéricos cujas AIM as Demandadas requereram é diferente, e não equivalente, ao protegido pela Patente Europeia n. ° 1442023?

(…) O Tribunal entende que não foi feita prova quanto à efetiva presença do sal de sódio cristalino de Telmisartan, com o grau de fusão reivindicado nos medicamentos das Demandadas. (...)

Tema de prova 2 - Nos medicamentos em causa é usada a substância ativa Telmisartan naforma de sal sádico?

Não provado.

Tema de prova 3 - O processo de produção dos medicamentos geriéricos cujas AIM as Demandadas requereram é diferente, e não equivalente, ao protegido pela Patente Europeia n.º 1467712?

(...) No entanto, e ainda que se entendesse que os dois processos de secagem são equivalentes, o Tribunal considera provado que o produto final obtido pelas Demandadas é diferente e não equivalente ao comprimido de dupla camada reivindicado na EP 1467712.

Tema de prova 4 - Nos processos de produção dos medicamentos genéricos cujas AIM as Demandadas requereram é utilizado um processo de secagem por pulverização para se obter um granulado seco?

Não provado.

Tema de prova 5 - O processo de produção dos medicamentos genéricos cujas AIM as Demandadas requereram é diferente, e não equivalente, ao protegido pela Patente Europeia n.º 1545467?

(...) A partir dos depoimentos prestados, o Tribunal formou, assim, a a convicção de que a povidona não é utilizada no procedimento de composição das Demandadas por ser um tensioativo, nem ali podendo desempenhar esta sim por agir como um aglutinante.

Tema de prova 6 - Este processo não utiliza nenhum agente tensioactivo nem agentes emulsionantes?

Provado que a povidona tem propriedades tensioativas. Não ficou que a povidona agisse como um tensioativo no processo de produção do comprimido das Demandadas.

Tema de prova 7 - O processo de produção dos medicamentos gen AIM as Demandadas requereram é diferente, e não equivalente, ao protegido Europeia n. °2130884?

(...) De quanto antecede, conclui-se que processo de produção dos medicamentos genéricos cujas AIM as Demandadas GG SL e Laboratórios Liconsa, SA requereram é diferente, e não equivalente, ao protegido pela Patente Europeia n.º 2120884

Tema de prova 8 - Este processo não contêm "Sorbitol" em "Telmisartan"?

Provado que o processo não contém "sorbitol" mas sim "manitol».

E sobre a questão solvenda, escreveu-se no acórdão fundamento: (...) Os ónus de alegação e prova da infracção das patentes de invenção europeia n.º EP1442023, EP1467712, EP1545467 e EP2120884 impendem sobre as aqui Recorrentes. Ainda assim, as Recorridas, que carrearam para os autos os elementos probatórios relevantes do dossier de pedido de autorização de introdução no mercado dos referidos medicamentos - lograram fazer prova dos factos de sentido oposto ao alegado pelas Recorrentes, como decorre da matéria de facto constante dos temas da prova acima analisada e que manteve inalterada.

3. Do pedido não transmissão das AIM a terceiros

Como referem as Recorridas em contra-alegações, uma autorização de introdução no mercado traduz-se num acto administrativo praticado pela autoridade legalmente competente, no caso o INFARMED, IP, certificando que aquele medicamento em concreto cumpre os requisitos e padrões legais de segurança, qualidade e eficácia terapêutica. Nessa conformidade, a emissão da autorização de introdução no mercado, tal corno a respectiva transmissão, não constitui qualquer violação das patentes de invenção europeia com os n.os EP1442023, a EP1467712, a EP 1545467 e a EP2120884. Com efeito, estatuem os n."s 1 e 2 do artigo 101.º do Código da Propriedade Industrial, que as patentes conferem aos seus titulares os seguintes direitos:

• o exclusivo quanto à exploração da invenção; e

• o direito de impedir que terceiros, sem o seu consentimento, fabriquem, ofereçam, armazenem, introduzam no comércio ou utilizem produtos objecto de patente ou importem ou possuam alguns desses produtos para os fins mencionados.

Constata-se, assim que do elenco dos direitos conferidos no referido preceito legal não faz parte a possibilidade de as Recorrentes impedirem a transmissão de autorização de introdução no mercado. Ademais, o n° 1 do artigo 37° do Decreto-Lei n.º 176/2006, de 30 de Agosto, permite a transferência de titularidade de autorizações de introdução no mercado. Esta transferência depende, tão-somente, de autorização do INFARMED, IP, a emitir no prazo de 60 dias a contar da data da apresentação do requerimento. Por sua vez, o artigo 3. º, n." 1, alínea ppp), do Decreto-Lei n." 176/2006, de 30 de Agosto, define exactamente o conceito de "transferência" de autorização de introdução no mercado, assim: «a mudança de titular de uma autorização de um medicamento, desde que não se trate apenas da mudança do nome do titular que permanece o mesmo (por exemplo, alteração societária com a manutenção da identidade subjectiva do titular).»,

Por outro lado, o pedido de proibição da transmissão da autorização de introdução no mercado atinge a eficácia da própria autorização, na medida em que se traduz numa suspensão parcial, consubstanciada na intransmissibilidade durante a vigência dos direitos de propriedade industrial. Com efeito, o n° 2 do artigo 179° do Decreto-Lei n.º 17612006, de 30 de Agosto - redação introduzida pela Lei n° 62/2011, de 12 de Dezembro - determina que: «A autorização, ou registo de introdução no mercado de um medicamento não pode ser alterada, suspensa ou revogada com fundamento na eventual existência de direitos de propriedade industrial.».

Resulta, aliás, do disposto na Lei n." 62/2011, de 12 de Dezembro, artigos 4° a 9.°, que estão excluídas de ilicitude as condutas consistentes em pedidos de autorização de introdução no mercado. Tais condutas não consubstanciam uma oferta ao público de medicamentos genéricos, nem podem ser qualificadas, per se, como actos preparatórios da comercialização dos mesmos. Se assim é, por maioria de razão, a transmissão da AIM a terceiros também é insusceptível de violar direitos de propriedade industrial'.

Acresce que, a proibição de transmissão da AIM é desnecessária, na medida em que, a ocorrer tal vicissitude, sempre o transmissário da AIM assumiria a posição jurídica do transmitente, com os inerentes direitos e obrigações que impendiam sobre o anterior titular. (...)

Em suma, a eventual transmissão das autorizações de introdução no mercado tituladas pelas Recorridas não representaria qualquer violação do exclusivo resultante dos direitos de propriedade industrial invocados nos autos. Consequentemente, bem andou o tribunal arbitral ao não estabelecer a mencionada proibição no âmbito de acção instaurada nos termos e ao abrigo da Lei nº 62/2011, de 12 de Dezembro. (...)».

Concluído este excurso, verifiquemos, então, se, como alega a recorrente, se pode considerar que, com base em factos, que são essencialmente idênticos se aplicou diferenciadamente o disposto no artigo 101.º do Código da Propriedade Industrial.

Note-se, contudo e antes de mais, que como se colhe do relatório do acórdão fundamento, aí apenas esteve em causa a violação das patentes europeias EP 1467712, EP 1545467 e EP 2120884 e que a causa de pedir invocada pelas recorridas para sustentar a alegação de que os direitos concedidos por essas patentes foram atingidos não era totalmente coincidente com aquela que figura na petição que deu início a estes autos.

Ainda assim, particularizemos os aspectos em que existem pontos de intersecção entre os arestos, de modo a evidenciar (ou não) o acerto da mencionada alegação.

Relativamente ao processo de fabrico protegido pela EP 1467712, o acórdão fundamento manteve o que fora decidido na instância arbitral, i.e. que embora os «dois processos de secagem sejam equivalentes» «o produto final obtido pelas Demandadas é diferente e não equivalente ao comprimido de dupla camada reivindicado na EP 1467712.»

O acórdão recorrido, por seu turno, teve como demonstrado que o «processo de granulação em leito fluidizado utilizado pela Demandada é um processo diferente do que está descrito no passo (b) da 1.ª reivindicação da EP 1467712, i. e., do processo de secagem por pulverização», pois «(…) a granulação em leito fluido e a secagem por pulverização são processos ou tecnologias diferentes, não obstante as diferenças detetadas entre os dois processos colocarem um desafio de avaliação sobre se constituem duas soluções técnicas equivalentes. Tendo a atenção do Tribunal incidido sobre o caso concreto dos autos, conclui-se que os dois métodos (granulação em leito fluido e secagem por pulverização) visam permitir a formação de grãos (ou pós), pelo que, apesar de o resultado ou “produto” final se poder obter em gamas de tamanho diferentes em cada um dos dois métodos, são duas soluções técnicas equivalentes em termos de objetivo (formação de grão ou pó) [sublinhado nosso]. Por outro lado, nada releva de substancial na sequência de ambos os processos de fabrico que leve a concluir que as duas soluções técnicas (granulação em leito fluido e secagem por pulverização) se devam considerar, neste contexto, não equivalentes. [sublinhado nosso] (…)».

No que toca ao processo de produção protegido pela EP 1545467[30], a Relação de Lisboa, no acórdão fundamento, manteve que «a povidona não é utilizada no procedimento de composição das Demandadas por ser um tensioativo, nem ali podendo desempenhar esta sim por agir como um aglutinante» e que, apesar de ter «propriedades tensioativas», não agia «como um tensioativo no processo de produção do comprimido das Demandadas.».

No acórdão recorrido, ao invés, demonstrou-se que a povidona era usada no medicamento da recorrente «como retardador da cristalização do Telmisartan e como revestimento da mesma substância ativa».

No que respeita à EP n.º 212084, o acórdão fundamento manteve a conclusão de que o «processo de produção dos medicamentos genéricos cujas AIM as Demandadas GG, SL e Laboratórios HH, SA requereram é diferente, e não equivalente, ao protegido pela Patente Europeia n.º 2120884», sendo que «este processo não contem sorbitol mas sim manitol».

Por sua vez, a respeito daquela mesmo patente, o tribunal recorrido afiançou apenas que «não ficou provado que o manitol e o sorbitol tenham o mesmo efeito na dureza do comprimido e na taxa de dissolução do Telmisartan.».

Fica, assim, evidenciado que a razão de ser para as discrepantes soluções a que chegaram os acórdãos em tela radica no respectivo substrato fáctico, mormente, no que concerne à equivalência/diferenciação dos processos de fabrico dos medicamentos genéricos empregues num e noutro caso, sendo certo ainda que no que toca à finalidade com que a povidona é usada num e noutro medicamento se notam também diferenças assinaláveis.

Por fim, note-se que a substância “sorbitol” não integrava a composição do medicamento genérico a que se reportou o acórdão fundamento e que, no acórdão recorrido, se apurou que a substância “manitol” não possuía o mesmo efeito que aqueloutra substância. 

Neste contexto, face aos factos provados elencados no acórdão recorrido e no acórdão fundamento (que, como se disse, constituem os mais salientes pontos de contacto entre os casos decididos numa e noutra decisão) e atentando nas particularidades acima focadas, não se pode considerar, como sustenta a recorrente, que são idênticos os feitos (melhor dizendo, as soluções técnicas empregues nos medicamentos genéricos) a que se referiram os arestos em cotejo. Por isso, o juízo fáctico-conclusivo formulado no acórdão recorrido que levou à conclusão de que os direitos de propriedade intelectual titulados pelas EP 1467712 e EP 1545467 foram infringidos[31] foi necessariamente divergente da consideração tecida no acórdão fundamento acerca da indemonstração dos pertinentes factos.

Deste modo, apesar de se ter como certo que, em ambos os arestos, se interpretou a mesma norma jurídica – essencialmente, o disposto no artigo 101.º do Código da Propriedade Industrial –, não se pode deixar de reconhecer que existem diferenças não menosprezáveis entre a factualidade considerada num e noutro acórdão. E, sendo assaz díspares os factos em causa, jamais se poderia considerar que a referida norma foi interpretada e/ou aplicada em sentidos opostos ou sequer diversos naquelas decisões.

Tudo isto para dizer, em suma, que inexiste identidade da questão fundamental de direito dirimida nos arestos postos em confronto. E mesmo que se pudesse discernir alguma contradição entre os julgados em cotejo, aquela sempre se deveria ter como sendo meramente implícita, o que, em todo o caso, a tornaria, como dissemos, irrelevante em ordem a abrir a porta recursória de acesso ao Supremo Tribunal de Justiça, através da revista «atípica».

Cai, assim, por terra a interposta revista, por inadmissível, quer nos termos gerais, quer pela via atípica, arrastando na queda todas as restantes questões que a recorrente lhe acoplou.


*


Pode, assim, concluir-se, em síntese, que:

1 - Em regra, não cabe recurso para o Supremo Tribunal de Justiça do acórdão do Tribunal da Relação proferido no âmbito dos litígios emergentes de direitos de propriedade industrial relativos a medicamentos de referência e medicamentos genéricos.

2 - Essa regra de irrecorribilidade, fixada no n.º 7 do artigo 3º da Lei n.º 62/2011, de 12 de Dezembro, é, contudo, excepcionada se invocada alguma das situações elencadas no artigo 629º, n.º 2, do Cód. Proc. Civil, nomeadamente a contradição de julgados.

3 - A contradição de julgados aqui equacionada e que releva como conditio da admissibilidade do recurso de revista pressupõe, além de mais, a coincidência dos mesmos factos em ambas as decisões e a pronúncia sobre a mesma questão fundamental de direito.

4 - A questão de direito fundamental só é a mesma, para este efeito, quando a subsunção do mesmo núcleo factual seja idêntica (ou coincidente), mas tenha, em termos de interpretação e aplicação dos preceitos sido feita de modo diverso.

5 - Não releva, para tal efeito, a mera divergência argumentativa e marginal utilizada na fundamentação de acórdãos.

6 – A inadmissibilidade da revista, quer nos termos gerais, quer pela via atípica, deita o recurso por terra e arrasta, na queda, todas as restantes questões que a recorrente lhe acoplou.

IV – Decisão

Nos termos expostos, decide-se que é inadmissível o recurso interposto e consequentemente dele não se toma conhecimento.

Custas pela recorrente.


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Anexa-se sumário do acórdão (art.ºs 663º, n.º 7, e 679º, ambos do CPC).

*


Lisboa, 25 de Maio de 2017


António Piçarra (relator)

Fernanda Isabel Pereira

Olindo Geraldes

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[1] Tinha a seguinte redacção: “O comprimido produzido pela Demandada não é em duas camadas, ao contrário do que está definido nas patentes em vigor da titularidade das Demandantes”.
[2] Tinha a seguinte redacção: “A solução técnica desenvolvida pela Demandada corresponde à arquitetura de comprimido que as patentes das Demandantes apresentam como não tendo sido bem-sucedida para justificar a invenção de dupla camada”.
[3] Tinha a seguinte redacção: “A necessidade de proteger a Hidroclorotiazida do meio básico existente no grão contendo o Telmisartan e atendendo à formulação descrita pela Demandada, origina um comprimido com uma estrutura macroscopicamente homogénea, mas que microscopicamente contém duas matrizes diferentes que, no entanto, não correspondem ao comprimido de dupla camada protegido nas patentes da titularidade das Demandantes”
[4] Tinha a seguinte redacção: Como a neutralização é realizada em solução aquosa, ou seja, com o hidróxido de sódio dissolvido em água, e sendo o sal de sódio do Telmisartan mais solúvel em água do que a forma ácido livre, a formação do sal de sódio do Telmisartan deve ocorrer em solução, pelo que não se pode formar o sal de sódio na forma cristalina durante a neutralização – só assim se irá obter o sal de Telmisartan amorfo.
[5] Tinha a seguinte redacção: Para se conseguir uma maior biodisponibilidade do Telmisartan é importante que ele esteja preferencialmente na forma amorfa, pelo que o processo de evaporação da água e formação do sal de sódio do Telmisartan no estado sólido é realizado de forma a evitar a formação do sal de sódio na forma cristalina através de uma evaporação rápida da água e usando componentes que dificultam a cristalização, como seja a povidona usada pela Demandada.
[6] Tinha a seguinte redacção: No processo de fabrico do comprimido da Demandada não se utiliza o sal de sódio de Telmisartan na forma cristalina;
.
[7] Tinha a seguinte redacção: “Relativamente à área superficial, tanto o sorbitol como o manitol poderão ou não ter, na forma cristalina, uma área superficial na mesma gama uma vez que são substâncias diferentes”.
[8] Tinha a seguinte redacção: “No processo descrito pela Demandada, a povidona é utilizada, intencionalmente, na primeira fase do processo, com a função de retardar a cristalização do Telmisartan, de forma a obter-se o Telmisartan preferencialmente na forma amorfa, e na segunda fase, como revestimento dos grãos contendo Telmisartan, o que significa que não é usada com a função específica de tensioativo ou emulsionante como reivindicado na reivindicação 1 e especificado na reivindicação 3 da EP 1545467”.
[9] A respeito do denominado patent-linkage, v. Dário Moura Vicente, O Regime Especial de Resolução de Conflitos em Matéria de Patentes (Lei N.º 62/2011), R.O.A., ano 72, vol. III, pág. 974, e Sofia Ribeiro Mendes, O Novo Regime da Arbitragem Necessária de Litígios Relativos a Medicamentos de Referência e Genéricos (Alguns Problemas) – Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor José Lebre de Freitas, vol. II, págs. 1012 a 1014.
[10] Com efeito, lê-se na exposição de motivos da Proposta de Lei n.º 13/XII – acessível em http://www.parlamento.pt/ActividadeParlamentar/Paginas/DetalheIniciativa.aspx?BID=36428 – «O Relatório do Inquérito da Comissão Europeia ao Sector Farmacêutico, referente ao período de 2000 a 2007, concluiu, relativamente a uma amostra de vendas de medicamentos com patente expirada, no valor de 50 mil milhões de euros, que esta despesa teria sido 15 mil milhões de euros superior, caso não tivesse ocorrido a entrada de genéricos no mercado.
O mesmo Relatório concluiu também que poderia ter ocorrido, ainda, uma poupança adicional de 3 mil milhões de euros se os genéricos tivessem entrado no mercado sem demora e que a entrada de genéricos nem sempre ocorre tão cedo quanto seria possível à luz do actual quadro jurídico aplicável. Naquele documento identificam-se como principais factores de estrangulamento as intervenções das empresas produtoras de medicamentos originais nos procedimentos administrativos que visam a concessão da autorização de introdução no mercado, a autorização do preço de venda ao público e a autorização da comparticipação do Estado no preço dos medicamentos, bem como as impugnações administrativas das mesmas decisões.
Quanto à concessão da autorização de introdução no mercado, a Comissão, na sequência do anteriormente assumido na Posição Comum n.º 61/2003, recorda que a legislação comunitária que rege o sector farmacêutico não prevê a apresentação de observações por parte de terceiros e, menos ainda, intervenções formais durante a avaliação de um pedido de autorização de entrada no mercado. Além disso, no que diz respeito à fixação dos preços e do regime de reembolso, a Comissão Europeia entende que os Estados-Membros não devem aceitar observações de terceiros em que sejam levantadas questões relacionadas com as patentes. Estes estrangulamentos verificam-se também em Portugal, assentes na incerteza quanto à existência de violação, ou não, de direitos de propriedade industrial por parte dos medicamentos genéricos que pretendem aceder ao mercado, a qual é agudizada pelas particularidades da legislação de propriedade industrial nacional, em especial a inexistência de patente de produto para especialidades farmacêuticas até 1995 e a transição para o direito actual.
Tem vindo, assim, a assistir-se a um vasto conjunto de litígios judiciais a respeito da concessão da autorização de introdução no mercado, da autorização do preço de venda ao público e da autorização da comparticipação do Estado no preço dos medicamentos relacionados com a subsistência de direitos de propriedade industrial a favor de outrem.
No entanto, a questão de saber se existe, ou não, violação de direitos de propriedade industrial depende de sentença a proferir pelos tribunais.»
[11] Continua a mesma exposição de motivos «Ainda com o objectivo de promover a celeridade, estabelecem-se prazos para a instauração do processo e para a oposição, contados da publicitação pelo INFARMED, I. P., do pedido de autorização de introdução no mercado. Verificando-se o incumprimento do prazo de oposição, o requerente de autorização de introdução no mercado do medicamento genérico não poderá iniciar a sua exploração industrial ou comercial na vigência dos direitos de propriedade industrial.
Adopta-se, ainda, uma tramitação consentânea com a preocupação de celeridade, com garantia pelo devido contraditório das partes (…)».
[12] Em que se lê que “Da decisão arbitral cabe recurso para o Tribunal da Relação competente, com efeito meramente devolutivo.”.
[13] O desenrolar do processo legislativo e os pareceres das referidas entidades estão acessíveis no endereço informático mencionado na nota n.º 1.
[14] Sobre o recurso a esta fonte, na interpretação dos textos legais, v. José de Oliveira Ascenção, in O Direito, Introdução e Teoria Geral, 13ª edição refundida, Almedina, págs. 408 e 409.
[15] Sobre a razão de ser desta limitação, v. António Campinos e Luís Couto Gonçalves Código da Propriedade Industrial Anotado, Almedina, pág. 149.
[16] A qual, por força do preceituado no n.º 8 do artigo 3.º da Lei n.º 62/2011 e no artigo 1085.º do Código de Processo Civil, é subsidiariamente aplicável à arbitragem necessária.
[17] Mário Esteves de Oliveira e Outros, Lei da Arbitragem Voluntária Comentada, Almedina, 2014, pág. 689.
[18] A este respeito, v. Pedro Metello Nápoles, Lei da Arbitragem Voluntária Anotada, 2.ª Edição, pág. 150, e Armindo Ribeiro Mendes e Outros, Lei da Arbitragem Voluntária Anotada, Almedina, 2012, pág. 113.
[19] Acessível em www.dgsi.pt.
[20] Por todos, v. Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição da República Portuguesa Anotada, tomo I, Coimbra, págs. 200 a 202.
[21] Assim, v. Jorge Miranda e Rui Medeiros, ob. cit. pág. 202, Lopes do Rego, O Direito fundamental de acesso e a Reforma do Processo CivilEstudos em Homenagem a Cunha Rodrigues, vol. I, Coimbra, pág. 764 e, entre tantos outros, os Acórdãos do Tribunal Constitucional n.º 31/87 (de 28 de Janeiro de 1987) e 163/90 (de 23 de Maio de 1990) - ambos acessíveis em http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/ - e os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 17 de Junho de 2014, proferido no processo n.º 21/09.8TBMCN.P1.S1-A, e de 19 de Maio de 2016, proferido no processo n.º 122702/13.5YIPRT.P1.S1, acessíveis em www.dgsi.pt.
[22] Sendo indiscutida, pelo Tribunal Constitucional, a admissibilidade constitucional desta particular forma de arbitragem. Por todos, v. o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 52/92, de 5 de Fevereiro de 1992, publicado no D.R., I Série, de 14 de Março de 1992, de págs. 1315 a 1321. 
[23] Cita-se o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 123/2015, de 12 de Fevereiro de 2015, publicado no D.R., II Série, de 7 de Julho de 2015, págs. 18143 a 18166. Trata-se de orientação ulteriormente reafirmada nos Acórdãos do Tribunal Constitucional n.º 108/2016 (de 24 de Fevereiro de 2016) e 435/2016 (de 16 de Julho de 2016), ambos acessíveis gratuitamente em http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos. No sentido de que a introdução do n.º 7 do artigo 3.º da Lei n.º 62/2011 visou precisamente acautelar o respeito pelos aludidos preceitos constitucionais, v. também Alexandre Soveral Martins, Arbitragem e propriedade industrial: medicamentos de referência e medicamentos genéricos in RLJ, ano 144.º, n.º 3993, pág. 432. Também Dário Moura Vicente - loc. cit. - aponta nesse sentido.
[24] Como salienta Rui Medeiros – Arbitragem necessária e Constituição Estudos em Homenagem ao Cons. Artur Maurício, Coimbra, pág. 1321 – neste domínio, apenas seria dificilmente tolerado pela Lei Fundamental uma disposição que «determinasse a irrecorribilidade em geral da decisão arbitral.».
[25] Note-se que, segundo Gomes Canotilho – Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 3.ª Edição, Almedina, pág. 467 –, o legislador ordinário está adstrito a consagrar «duas instâncias quanto a «matéria de facto» e uma instância de revisão quanto a «questões de direito»».
[26] Cfr, neste sentido, os acórdãos do STJ de 23.06.2016 e de 14.12.2016, proferidos no processo n.º 1248/14.6YRLSB.S1, acessíveis em www.dgsi.pt, merecendo o último inteiro aplauso de Luís Couto Gonçalves, Cadernos de Direito Privado 56, onde igualmente é aceite que, neste tipo de acções, a Relação é, em regra, a última instância de recurso.
[27] Cfr, neste sentido, entre outros, os acórdãos do STJ de 18.09.2014 (processo 1852/12.7TBLLE-C.E1.S1), de 02.06.2015 (processo 149/14.2YHLSB.L1.S1) e de 24.11.2016 (processo 1655/13.1TJPRT.P1.S1), acessíveis através de www.dgsi.pt.
[28] Cfr, neste sentido, Amâncio Ferreira, in Manual dos Recursos em Processo Civil, 8.ª edição, pág. 116, José Lebre de Freitas/A. Ribeiro Mendes, in Código de Processo Civil Anotado, 2.ª edição., Tomo I, Volume 3.º, pág. 17 (por referência a anterior versão do CPC, mas ainda actualizadas), e António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 2013, págs. 42 a 44.
[29] Cfr, neste sentido, António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 2013, págs. 42 e 43, Luís Correia de Mendonça/Henrique Antunes, Dos Recursos, 2009, pág. 315, e, entre outros, os acórdãos do STJ de 13.07.2010 (processo 4210/06.9TBGMR.S1), de 18.04.2012 (processo 3962/08.6TJCBR.C1-A.S1), de 20.11.2014 (processo 7382/07.1TBVNG.P1.S1), de 20.05.2015 (processo 321/12.0YHLSB.L1.S1) e de 13.09.2016 (processo 671/12.5TBBCL.G1.S1), acessíveis através de www.dgsi.pt.
.

[30] Ali designada, por diversas vezes e certamente por lapso, como EP 1445467.
[31] Escreveu-se, no acórdão recorrido, que «o problema técnico que alegadamente se visou ultrapassar é o mesmo que se colocava em relação à patente das recorrentes - ou seja, a fraca solubilidade do ingrediente ativo (Telmisartan) -, os elementos modificados introduzidos no processo de fabricação dos medicamentos genéricos da mesma Demandada estão, sem margem para dúvidas, ao alcance de um médio perito na especialidade, designadamente os excipientes que exercem a mesma função na formulação farmacêutica (sobitrol versus manitol), e, finalmente, a solução técnica e o resultado final obtido nesses medicamentos é exatamente o mesmo que se encontra patenteado - em concreto: uma taxa de dureza do comprimido e dissolução do ingrediente ativo (Telmisartan).»