Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
323/15.4T8SCR.L1.S1
Nº Convencional: 1ª SECÇÃO
Relator: MARIA JOÃO VAZ TOMÉ
Descritores: CONDOMÍNIO
ASCENSORES
CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO
PRESCRIÇÃO
RECONHECIMENTO DO DIREITO
PRECLUSÃO
PRESCRIÇÃO PRESUNTIVA
CLÁUSULAS CONTRATUAIS GERAIS
NULIDADE
Data do Acordão: 12/17/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO CIVIL – RELAÇÕES JURÍDICAS / FACTOS JURÍDICOS / TEMPO E REPERCUSSÃO NAS RELAÇÕES JURÍDICAS / PRESCRIÇÕES PRESUNTIVAS / INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO.
Doutrina:
- Adriano Vaz Serra, Prescrição e caducidade, in BMJ n.º 105, p. 32;
- Ana Filipa Morais Antunes, Algumas questões sobre prescrição e caducidade, Separata de Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor Sérvulo Correia, Coimbra, Coimbra Editora, 2010, p. 39;
- José Brandão Proença, Comentário ao Código Civil – Parte Geral, Lisboa, Universidade Católica Editora, 2014, p. 759;
- José Brandão Proença, Comentário ao Código Civil – Parte Geral, Lisboa, Universidade Católica Editora, 2014, p. 764-765;
- Mário Júlio Almeida Costa, Direito das Obrigações, Coimbra, Almedina, 1998, p.1004.
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 317.º, ALÍNEA B) E 325.º.
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 5.º.
DL N.º 446/85, DE 25 DE OUTUBRO: - ARTIGO 19.º, ALÍNEA C).
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:


- DE 23-02-2012, PROCESSO N.º 2254/03.1TBCLD.L1.S1;
- DE 29-11-2016, PROCESSO N.º 2643/12.0TBPVZ.P1.S1, AMBOS IN WWW.DGSI.PT.
Sumário :

I – De acordo com os princípios da preclusão e da concentração da defesa, compete ao credor, no que toca à invocação da exceção da prescrição, alegar na fase processual própria – in casu, na resposta à contestação – a existência de um reconhecimento do seu direito, nos termos do art. 325.º, do CC. Não o havendo feito, o acordo de pagamento não pode ser levado em linha de conta pelo tribunal, nem sequer ao abrigo do art. 5.º, do CPC, por se tratar de um facto essencial cuja alegação lhe cabia.
II – A prescrição presuntiva funda-se na presunção de cumprimento. No que respeita a determinadas obrigações, o credor é habitualmente rápido no exercício do seu direito e o devedor costuma cumpre num prazo curto sem exigir ou, pelo menos, sem guardar por muito tempo o respetivo documento de quitação. A prescrição presuntiva tem por finalidade tutelar o devedor contra o risco de satisfazer duas vezes dívidas de que não é usual exigir recibo ou guardá-lo por muito tempo, protegê-lo da dificuldade de prova do pagamento.
III - São, assim, elementos constitutivos da prescrição presuntiva consagrada no art. 317.º, al. b), o crédito ser de comerciante (ou de industrial), o decurso do prazo de dois anos sobre a venda de bem (ou o exercício da atividade industrial exercida) e o devedor não ser comerciante (ou industrial) ou, sendo-o, não destinar o bem ou a atividade ao seu comércio (ou ao seu exercício industrial). A cláusula penal constante de contrato de prestação de serviço de assistência a ascensores, que admite a resolução pelo prestador de serviço com fundamento na mora do cliente, no pagamento de quaisquer quantias, por mais de trinta dias, impondo ao cliente a obrigação de indemnização por danos no valor da totalidade das prestações do preço previstas até ao termo do prazo acordado nos contratos com duração até cinco anos e, nos contratos com duração superior, no valor de metade das referidas prestações, é desproporcionada aos danos a ressarcir (art. 19.º, al. c), do DL n.º 446/85, de 25 de outubro).
Decisão Texto Integral:

Processo n.º 323/15.4T8SCR.L1.S1

1.ª Secção

            Acordam no Supremo Tribunal de Justiça,

            I – Relatório
1. No âmbito da presente ação, intentada por AA, Lda., contra BB, o Tribunal de 1.ª Instância, julgando a acção procedente, decidiu condenar o Réu a pagar à Autora a quantia de € 32.432,76 acrescidos dos juros vencidos, à taxa legal, desde a data limite de pagamento de cada fatura até 13 de dezembro de 2013, no valor de € 5.104,47, e os vencidos desde 14 de dezembro de 2013 até a data da interposição da acção, 12 de maio de 2015, no montante de € 3.291,61, e dos juros vincendos até efetivo e integral pagamento.
2. Em causa está, pois, uma ação intentada por uma sociedade de fornecimento, montagem e conservação de elevadores contra um condomínio com que celebrou dois contratos de manutenção completa de elevadores.
3. A quantia em cujo pagamento a Autora pede a condenação do Réu respeita a faturas relativas a prestações mensais decorrentes da conservação dos elevadores, a faturas relativas a reparações e a faturas por resolução fundada em incumprimento contratual (cláusula penal) e respetivos juros de mora.
4. O Réu apresentou contestação, defendendo-se, nomeadamente, por exceção, invocando a prescrição dessa faturas e a nulidade da cláusula penal respeitante ao incumprimento por contrária à boa fé e ao regime das cláusulas contratuais gerais.
5. Inconformado com a sentença do Tribunal de 1.ª Instância, que julgou a ação totalmente procedente, o Réu interpôs recurso de apelação.
6. O Tribunal da Relação de Lisboa, por acórdão de 20 de março de 2018, proferido sem qualquer voto de vencido, manteve a condenação do Réu apenas no que toca ao pagamento de parte dos montantes peticionados a título de faturas mensais decorrentes da conservação dos elevadores (sessenta faturas), absolvendo o Réu do pedido de pagamento de parte das faturas respeitantes às prestações mensais decorrentes da conservação, por se encontrarem prescritas (sessenta faturas), do pedido de pegamento das faturas relativas às reparações, com base na prescrição presuntiva (seis faturas) e do pedido de pagamento das faturas emitidas com fundamento na resolução por incumprimento do contrato (duas faturas), e do pedido de pagamento dos respetivos juros de mora (parte de uma fatura).
7. Com efeito, segundo o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa:
“Pelo exposto julgam o recurso procedente e, em consequência, alteram a sentença, assim revogada quanto à correspondente condenação, para absolver o réu do pedido de pagamento das quantias discriminadas de 8 a 67 e de 129 a 136 no ponto 9 supra e dos respectivos juros incluídos em 137 do ponto 9 supra e assim no mais, ou seja quanto à condenação do réu a pagar à autora as quantias discriminadas de 68 a 128 no ponto 9 supra acrescidas cada uma delas dos respectivos juros de mora vencidos incluídos em 137 do ponto 9 supra e dos juros vencidos desde então vencidos e vincendos, à taxa legal, até efectivo e integral pagamento, não é a sentença alterada senão pela óbvia consequência de que estes juros vencidos estão sujeitos a nova e adequada liquidação.
Custas em ambas as instâncias pela autora e réu na proporção correspondente aos respectivos decaimentos: artigo 5270 do CPC”.

8. Irresignada, a Autora interpôs recurso de revista, apresentando as seguintes Conclusões:

103.               Tendo presente tudo o quanto antecede, formula a A. as suas Conclusões,
como segue:

      Resulta de acórdão ora recorrido, a absolvição do aqui reu, do pagamento à autora das faturas juntas à petição iniciai, com os números 8 a 67, bem como 129 a 134, e ainda assim, as 135 e 136, relativas à sanção contratual, com fundamento nas Cláusulas 5.5.2 dos contratos celebrados.
104. Entendeu-se desde logo o acordo de pagamento de dívida celebrado entre as partes nenhuma relevância nos autos assumia, e que "no caso, as cláusulas em apreço consagram cláusulas penais desproporcionadas a supostos danos que visem ressarcir".
105. Vejamos desde já os factos relevantes e depois o Direito, para se concluir que em contratos de manutenção completa - como é o caso do dos Autos - a cláusula não é desproporcional aos danos a ressarcir, logo, sendo considerada válida, bem como nenhuma prescrição de faturação junta aos autos pela autora

ocorreu.

107.            A matéria de facto dado como provada consta de pontos 1.   a 11. já

reproduzidos supra.

108. De cláusula 5.5.2 dos contratos celebrados consta: "independentemente do direito ò indemnização por mora, estipulado em 5.5.1, sempre que haja incumprimento do presente contrato por parte do cliente, e nomeadamente quando se verifique mora no pagamento de quaisquer quantias devidas à otis por mais de 30 dias, poderá esta resolver o presente contrato, sendo-lhe devida uma indemnização por danos, no valor da totalidade das prestações do preço previstas até ao termo do prazo contratado para contratos com duração até 5 anos, no valor de 50% das prestações do preço para contratos com duração superior a 5 anos".
109. Ao contrário do decidido em acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, a Cláusula 5.5.2 dos contratos dos autos, não é nula!

110. Desde logo, por Acórdão datado de 20.12.2017, do Supremo Tribunal de Justiça, debruçando-se sobre um contrato de manutenção completa, decidiu-se:
"Por sua vez, a cláusula 7.4. estabelece uma cláusula penai em caso de denuncia antecipada do contrato.
Face ao valor concreto do pedido, a titulo de clausula penal, é manifesto que a clausula 7.4. do contrato acaba por não se mostrar desproporcionada, tendo em consideração a razão de ser da fixação do prazo para a denuncia do contrato, já anteriormente explicitada. Com esta perspectiva, é manifesto que tal cláusula, não se revelando demasiado elevada ou excessivamente onerosa, podia ser utilizada, sem ofensa do disposto na alínea m) do n.g 1 do art. 22- do regime jurídico das Cláusulas Contratuais Gerais previsto no referido DL n.Q 446/85. O acórdão recorrido, perspetivando a questão apenas à luz do disposto no art. 812g n.g 1 do CC (afastada a natureza do contrato de adesão), concluiu também no sentido da cláusula não ser desproporcionada, condenando no seu pagamento, nomeadamente pelo valor peticionado/'
111. Os contratos dos autos, aqui em causa são "CONTRATO … MANUTENÇÃO OM", MANUTENÇÃO COMPLETA, e não contratos de manutenção simples.

112. Essa dicotomia não é de todo despicienda.
113. Em Manutenção Completa estas cláusulas visam salvaguardar o investimento permanente feito nas instalações dos seus clientes e enquanto os contratos estão em vigor.
114. Se, de facto, quanto ao "Contrato de Manutenção Simples", a corrente dominante pode ir no sentido da nulidade de tais clausulas penais; aqui, no "Contrato de Manutenção Completa", bastas vezes, tem sido dada a razão à AA, considerando as cláusulas válidas e as sanções devidas...

115. Mas mais, considerando a alegação da aqui A., de que os Contratos como o dos Autos já foram alterados, em todas as cláusulas em questão, em contratos
celebrados com os clientes e a AA e até são alteráveis a todo o tempo, já na vigência do próprio contrato;
116. E na verdade ainda que as cláusulas propostas pela aqui A. aos seus Clientes são explicadas, negociadas, e/ou, alteradas e derrogadas se aceites (se o não forem, não há, naturalmente, contrato), passando para as "Condições Particulares" (não cabendo aí, nesse espaço, ficam em ''adenda"), e passam a valer enquanto tal,
117. O que significa, que, para os efeitos do art. I9 do DL 446/85, de 25 de Outubro, não só há "prévia negociação individual", como os destinatários (os clientes da AA), não se limitam a subscrever, como não se limitam a aceitar, podendo mesmo influenciar o seu conteúdo, afastando-o assim, indelevelmente, da esfera dos contratos de adesão, "tout court", com as legais consequências.
118. Quando o cliente assina o Contrato aceita que, se incumprir o Contrato -ou porque não paga o serviço/reparações ou porque decide terminar o Contrato antes do seu termo e sem justa causa - incorre na sanção que contratou e de forma faseada, em função da duração contratada. É ponto assente.
119. A fórmula encontrada foi esta, expressa na Clausula, podia ter sido outra, mas foi esta, nos termos do Princípio da Liberdade Contratual (art. 4055 do CC) e as partes assim a aceitaram ao contratar.
120. Não nos podemos esquecer que aqui, no "Contrato OM", estamos na Manutenção Completa, e o grau de exigência é absolutamente maior para com a EMA. De facto,
121. Estamos, aqui, no âmbito do DL 320/2002, de 28 de Dezembro, que, no seu Anexo II descreve os "serviços constantes do contrato de manutenção".

122. Na al. a) desse Anexo II descreve o que é um contrato de "manutenção simples", e na al. b) descreve o que é um contrato de "manutenção completa", e a diferença é abissal, e não pode deixar ninguém indiferente.
123. Ou seja, a AA do "minuto zero" (assinatura do Contrato) ao "minuto final" (no seu termo sem vicissitudes), obriga-se a aplicar no seu cliente - na sua instalação, no(s) seu(s) elevador(es) - e a custo zero para ele, todos estes componentes, que, obviamente, custam uns milhares de euros e representam um evidente investimento, que tem de ter o seu retorno.
124. Se a cláusula agora em questão não existisse, o cliente podia sair a todo o tempo, sem permitir acautelar à AA o retorno do investimento que, indiscutivelmente, foi fazendo na instalação propriedade do cliente e ao longo dos anos...
125. Atente-se, que, não é por acaso que o contrato de "Manutenção Completa" têm de ter no mínimo 5 anos (como decorre do Anexo II do DL 320/2003 já transcrito), exatamente, para acautelar o retorno desse investimento.
126. Aceitar esta declaração de nulidade da clausula 5.5.2., sem mais, é perverso e inexplicável: em abstraio, percebe-se que o consumidor tem de ser protegido (por acaso, hoje em dia, cada vez menos, face à sua auto-informação permanente...), mas deixá-lo enriquecer sem causa só "porque sim", isso não...
127. Convencionaram as partes, que sendo posto termo ao Contrato, o Cliente aceitará pagar - sem necessidade de prova dos prejuízos da e pela AA - a título de indemnização, o valor percentual correspondente às prestações em falta desde esse momento e até ao termo do mesmo.

128. Na verdade, as inúmeras vantagens comerciais que a AA apresenta aos seus Clientes - atendimento, tempo de resposta, serviço 24H, disponibilidade de componentes, serviço de avarias, assunção da responsabilidade civil e criminal pelo funcionamento dos elevadores -e o correspondente preço, têm por base a expectativa de que a manutenção da prestação do serviço corresponderá ao tempo antecipadamente previsto pelas partes.
129. A acrescer às visitas mensais decorrentes do contrato e da Lei, a AA programa-se para fazer regulares inspeções técnicas por um seu supervisor, está disponível para responder vinte e quatro horas por dia dos 365 dias do ano a qualquer solicitação para avarias e assume a responsabilidade civil e criminal sobre o equipamento (dispondo de apólice de seguro para o efeito), tudo decorrente do Contrato dos Autos.
130. Além do mais, com a celebração de contrato para a Manutenção Completa do(s) elevador(es) do Cliente, a AA assegura um stock de peças para responder às substituições de componentes que estiverem incluídos no objecto do Contrato.
131. Pelo exposto, é legítimo e razoável esperar, que um contraente que assegura as vantagens que a AA oferece aos seus Clientes, tenha a salvaguarda de que os danos resultantes de uma abrupta, antecipada e injustificada resolução contratual, sejam previamente definidos e acordados entre as partes.
132. Até porque, se assim não fosse - se a AA não tivesse essa segurança - o preço mensal praticado pela manutenção dos elevadores seria tremendamente superior.
133. Na verdade, o preço apresentado pela AA tem por critério base, precisamente, a duração do contrato e a circunstância de ver salvaguardado ao longo dos anos de vigência o investimento efectuado em cada contrato através dessas cláusulas.
134. Atente-se, por exemplo, ao Acórdão de 01.04.2014, referente ao Proc. n.^ 29.216/09.2T2SNTL1, da l.s Secção do Tribunal da Relação de Lisboa.-
135. Além do mais, tendo em conta a dimensão empresarial da AA, as partes acordaram em previamente estipular a indemnização devida pelo Cliente em caso de termo antecipado do Contrato.Convencionaram este valor com vista a dispensar o credor da - diabólica, quando não impossível - "prova da extensão dos prejuízos sofridos, sendo o montante da indemnização aquele que as partes tiverem, previamente, acordado, prevenindo e evitando as dificuldades do cálculo da indemnização e a intervenção do juiz, para esse efeito, dispensando ao credor a alegação e a prova do dano concreto", cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24.04.2012, Proc. 605/06.6TBVRL.P1.51, disponível para consulta em http://www.dgsi.pt
136. Além do mais, "era ao Réu, devedor, a quem competia provar a flagrante desproporção entre esses mesmos prejuízos e o valor acertado contratualmente em sede de fixação da cláusula penal, uma vez que se trata duma circunstância modificativa do direito invocado pela A., constituindo matéria de defesa por excepção (peremptória) - (art5 342&, ng 2, do Código Civil; arts? 487S, n*2e 493^, n* 3, do Cod. Proc. Civil)", Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 26.10.2010 (negrito nosso).
137. Em igual sentido: "Importa referir ainda que não tendo o Réu alegado eventuais despesas que a prestadora de serviços deixou de efectuar por causa da revogação antecipada do contrato, nem sendo possível afirmar a existência de uma relação causal entre a revogação antecipada e uma eventual redução dessas despesas, a indemnização por lucros cessantes corresponde ao valor das receitas projectadas para o período contratual em falta", cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 05.02.2015, Proc. n.e 4747/07.2TVLSB.L1.S1, disponível para consulta em http://www.dgsi.pt.

139.            É público e notório, que a A. é a maior empresa do mundo de elevadores,
em Portugal é líder de mercado, e para satisfazer a percentagem do parque de
elevadores do País que detém, só pode ter os parâmetros de estrutura já dados
a conhecer nos autos.

140. Assim, é ponto assente, que a saída deste elevador em concreto da sua carteira (e ainda por cima sem justa causa), tem reflexos em termos de prejuízos, danos emergentes e lucros cessantes.
141. Nessa perspetiva, a sanção contratual faturada tem razão de ser, desempenhando uma dupla função: a função ressarcidoro e a função coercitiva.
142. A finalidade desta cláusula é, em primeiro lugar, estimular o devedor ao cumprimento do contrato (chamada função coercitiva) e, num segundo momento, evitar dúvidas futuras e litígios entre as partes quanto à determinação do montante da indemnização {chamada função ressarcidora)( Cfr. Rodrigues Bastos, in Notas ao Código Civil, vol. Ill; e Ac. do STJ, de 12 de janeiro de 1994, proferido no processo 084387).
143. Nesta sede importa abordar, ainda, a questão da eventual redução equitativa da referida cláusula penal.
144. Com efeito, a cláusula penal pode ser reduzida pelo Tribunal, de acordo com a equidade, quando for manifestamente excessiva, ainda que por causa superveniente, conforme disposto no artigo 812°, n° 1, do Cód. Civil.
145. Daí que, por toda a parte, apenas se reconheça ao Juiz o poder moderador, de acordo com a equidade, quando a cláusula penal for extraordinária ou manifestamente excessiva, ainda que por causa superveniente.
146. Do que fica dito, é claro que o Julgador tem o poder de reduzir, mas não de invalidar ou suprimir a cláusula penal manifestamente excessiva, e que só tem o poder de reduzir a cláusula penal manifestamente excessiva e não já a cláusula excessiva.

147. Ora, "in casu", importa considerar a justificação para esta cláusula penal, referida nos termos da própria cláusula e respeitantes à própria estrutura empresarial   da  a.,  o  que,  de  resto,   é  consentâneo  com  as  particulares
características e particular especificidade deste ramo de actividade comercial, relacionada com a segurança do transporte quotidiano de pessoas, com o inerente desgaste do material utilizado, apertadas regras de responsabilização, licenciamento e fiscalização dos elevadores a entidades que asseguram a sua manutenção, não se olvidará também que este tipo de contrato é obrigatório por lei.
148. De resto, e particularmente, é do conhecimento público ainda, além daquele teor contratual, também que, efetivamente, a A. tem que adequar os seus meios técnicos e de pessoal ao cumprimento deste contrato, de entre um conjunto de cerca de 25 mil clientes, efetuando investimentos, nomeadamente, tendo que aprovisionar peças todos os anos, por forma a que até ao último dia disponha de peças a substituir, as quais, com o decurso do tempo, são descontinuadas.
149. Em suma, a A. dimensiona, assim, pois, a sua estrutura empresarial em ordem a atender cada cliente de acordo com a natureza, âmbito de duração dos serviços contratados.


150. A referida cláusula dá assim cobertura compensatória aos prejuízos sofridos (inevitavelmente) em consequência do não cumprimento do contrato, seja em vista dos investimentos e alocação de pessoal e meios realizados em vista de um contrato de duração longa, seja ainda em vista da legítima e fundada expectativa da a. na manutenção desse contrato pelo período acordado e consequente lucro expectável.

151. Por outro lado, importará não esquecer que a cláusula penal assume também uma função penalizadora (Mota Pinto, "direito civil", 1980, pág. 197), contexto em que, como se reconhece ainda no citado ac. do tribunal da relação de lisboa de 26/10/2010, "tende a ser normalmente economicamente mais gravosa que o que resultaria do mero cumprimento do contrato, pois só desse modo se consegue alcançar outra das suas finalidades pretendidas pela cláusula penal, que é a da mesma constituir um verdadeiro estímulo à execução pontuai
do contrato por parte do devedor".         -

152. Assim, se é evidente a relativa dureza da sanção, também não é menos certo que a duração do contrato — querida por ambas as partes — e as especiais exigências que tal duração implica para a a. (como para qualquer outra sociedade no mesmo ramo de atividade) exigem alguma especial proteção da a., salvaguardando o seu investimento e, simultaneamente, constituindo um sério incentivo à manutenção da relação contratual salvo motivo ponderoso e atendível.
153. Ponderando tudo isto, cremos mostrasse justificado no quadro negocial padronizado o critério indemnizatório fixado na clausula 5.5.2, não havendo elementos para concluir que a indemnização é desproporcionada aos danos ou manifestamente excessiva no sentido de atentatória da boa fé.

154. Por conseguinte, não é tal cláusula nula.
155. De acórdão ora recorrido consta ainda que "procede, pois, a pretensão do recorrente de desconsideração, como matéria provada, desse acordo de pagamento a prestações dos montantes referentes às faturas de 8 a 67 no ponto 9 supra".
156. Ou ainda que "a autora, oportunamente, na ocasião processual própria para produzir a defesa por contra-excepção, a resposta que apresentou em audiência prévia, não invocou essa contra-excepção de que na sentença oficiosamente se conheceu.

257.            ORA, Por requerimento datado de 10.02.2016 a A. juntou aos autos

acordo de pagamento de dívida, por meio do qual o aqui R. se confessava devedor da A. do montante de eur.: 18.795,49€ (dezoito mil, setecentos e noventa e cinco euros, e quarenta e nove cêntimos).
158. Tal documento foi admitido por despacho datado de 31.03.2016 que determinava: "Nos termos do disposto no art. 423.º, n.º 2 do CPC, por o documento ter sido junto até 20 dias antes que se dê inicio à produção de prova e por se entender que o mesmo poderá ser útil à decisão da causa, admite-se a sua junção, (...)".
159. Mal se compreende que se venha nesta sede por em causa o teor e o propósito de tal documento, na medida em que nem o Reu o fez à data!
160. A verdade é que o R. dos autos sempre assumiu ser devedor de todas as facturas cuja prescrição é agora alegada, aliás como resulta de acordo de pagamento de dívida junto aos autos e ainda fax enviado pelo A. à A., em 29.02.2008.
161. Na verdade, conforme da prova produzida nos autos, as partes estabeleceram diversos contactos com vista a celebrar acordo para pagamento das facturas sub judice.
162. A isto acresce que o reu, devidamente interpelado para proceder ao pagamento das facturas, não colocou em causa a prestação dos serviços prestados ou valores peticionados, conformando-se e aceitando ser devedora da Recorrida nos valores que esta lhe vinha peticionando.


163. Pelo exposto, é inequívoco que a prescrição invocada pelo reu interrompeu-se nos termos dos artigos 323.9, n.9 4 e 325.e do Código Civil, aliás, como consta de douta sentença recorrida : "No caso "sub judice" entendemos que a prescrição se interrompeu porquanto, atento o facto descrito em 7) e os documentos de fls. 362 a 366, que se devem considerar como processualmente adquiridos, o Réu reconheceu o crédito da Autora. Primeiro, através do "fax" datado de 29.02.2008 no qual solicita o envio das segundas vias das facturas em dívida, informando que seriam regularizadas pela então administração. Em segundo lugar, por via do acordo pagamento por débito directo para divido vencida (junta a fls. 362), na qual se diz expressamente que "Dívida vencida de €18.795,49 (extrato anexo)".

164. Significa isto que tendo existido reconhecimento da dívida por parte do Réu, o prazo prescricionol das facturas referentes à conservação dos elevadores
emitidas até 01.11.2012 foi interrompido, voltando a correr de novo desde esta altura (art? 3269 n° i d0 Código Civil). Deste modo, aquando da propositura da acção em 2015 ainda não haviam decorrido cinco anos, pelo que não se verifica a alegada prescrição."
165. Do mesmo modo, e quanto à prescrição presuntiva das faturas juntas à Petição inicial com os números 129 a 134, alegada pelo R., e que em sede de acórdão do Tribunal da Relação se deu colhimento, o mesmo não pode aceitar-se, sem mais.
166. Esta presunção de cumprimento tem por base a proteção do consumidor comum para obrigações em que não é usual a entrega de quitação ou não se afigure necessária a conservação desse comprovativo de pagamento durante muito tempo.
167. "As prescrições presuntivas respeitam a obrigações que costumam ser pagas em prazo bastante curto e relativamente às quais, por via de regra, se não exige quitação, ou, pelo menos, não se conserva por muito tempo documento de quitação", cfr. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 11.10.2011, Proc. 151882/10.0YIPRT-A.P1, disponível para consulta em http://www.dRsi.pt.
168. Ou seja, a ratio legis das prescrições presuntivas consiste na protecção dada a quem, por não possuir, por norma, contabilidade organizada, teria dificuldade em fazer prova do pagamento.
169. Como brilhantemente expôs o Tribunal da Relação do Porto no Acórdão acima mencionado: "A ratio da norma [artigo 317.9 do Código Civil] não justifica a convocação, como pretende o apelante, desta prescrição de curto prazo. Com efeito, o apelante está em condições de, à semelhança de qualquer credor comum, fazer prova do pagamento do crédito que lhe é pedido e não reclama, por isso, da especial protecção que o legislador visou conceder peia prescrição presuntiva de curto prazo". (negrito nosso).

170.             Mais se lê naquele Acórdão: "[...] o regime das prescrições presuntivas
foi criado pelo legislador de 1966 à luz de um mundo de reduzida expressão
económica, em que as unidades empresariais eram incipientes, muitas sem
escrituração   comercial  e   em   que,   por  regra,   as   transacções  comerciais

dispensavam qualquer suporte documental. Donde a necessária protecção do consumidor comum que, não dispondo de quitação, por não constituir regra a sua entrega, mereceu este regime de dispensa da prova da quitação após o decurso do prazo prescricíonal. Por isso, esse regime tem de ser hoje interpretado ò luz do ordenamento jurídico global, designadamente quando o regime jurídico vigente exige a guarda de documentos comprovativos de quitação".
171. Em suma, como sucinta e paradigmaticamente afirmou o Prof. João Baptista Machado nas suas lições de interpretação e integração da lei: "O conhecimento deste fim visado pelo legislador ao elaborar a norma (ratio legis), sobretudo acompanhado do conhecimento das circunstâncias (políticas, sociais, económicas, morais, etc.,) em que a norma foi elaborada ou da conjuntura político-económico-social que motivou a ''decisão" legislativa (occasio legis) constitui um subsidio da maior importância para determinar o sentido da norma" in Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador.
172. Ora, o reu é administrado, e já o era na data da prestação dos serviços de reparação pela aqui autora, por uma sociedade comercial que tem por objecto social a administração de condomínios!
173. No escopo da sua atividade está a obrigação de prestar contas aos condomínios, justificando os pagamentos efectuados e comprovando-os documentalmente.
174. Assim, "// - Estando o administrador de condomínio obrigado a apresentar contas ò assembleia e a guardar e conservar todos os documentos que digam respeitam ao condomínio, está o mesmo em condições de efectuar prova cabal do pagamento e. por isso, não gozo da protecção conferida pelas prescrições presuntivas, ou seia. da presunção de cumprimento gue lhes é inerente", ob. cit. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 11.10.2011. (negrito e sublinhado nossos).

175. 0 reu não assume, naturalmente, a qualidade de "consumidor comum", que é quem se pretende proteger pela prescrição presuntiva do artigo 317.5 do Código Civil.
176. Mais, as transmissões de bens e as prestações de serviços efectuadas no território nacional a título oneroso, por um sujeito passivo, agindo como tal, estão sujeitas a IVA conforme dispõe o artigo 1.-, alínea a) do CIVA.
177. Os créditos cujo reconhecimento aqui se peticiona enquadram-se na delimitação de incidência objectiva desenhada pelo artigo referido.
178. Daqui resulta que, conforme se salientou no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 11.10.2011: "não havendo dispensa de facturação [como é o caso dos presentes autos], sempre recaía sobre a empresa prestadora de serviços o ónus de emitir a factura correspectivo e, contra o pagamento, de. entregar recibo de quitação, o que colocaria o demandado em condições de efectuar a prova documental correspondente, desconsiderando o benefício de presunção de pagamento inerente às prescrições presuntivas"'. (sublinhado nosso).
179. A autora cumpre escrupulosamente as suas obrigações fiscais, ou seja, entrega sempre o recibo de quitação quando recebe qualquer pagamento relativo a prestação sujeita a IVA;
180. Deste modo, dúvidas não restam que, por força da lei e dos seus próprios estatutos, a administração do reu tem à sua disposição diversos elementos contabilísticos que lhe permitem juntar aos presentes autos comprovativo dos pagamentos que alega ter feito;

181. Não os junta, todavia, porque não os fez!
182. Aliás, como bem explanado em sentença recorrida: "A inaplicabilidade do regime da prescrição presuntiva em tais casos assenta na consideração de que nenhuma tutela especial demanda o devedor, pois não corre o risco de ter de cumprir duas vezes (por estar impedido de comprovar, com o documento de quitação, a satisfação da obrigação), pois nestes casos o devedor não tem qualquer dificuldade de prova do pagamento (o documento de quitação è exigido, é emitido e é conservado em arquivo contabilístico).

183. Atentos estes considerandos não nos resta senão concluir que estando o administrador do Condomínio (aqui Réu) habilitado a comprovar, com facilidade, os pagamentos dos serviços que lhe hajam sido prestados (exibindo os recibos de
quitação ou documentos comprovativos do pagamento), não se justifica que beneficie da protecção que através da prescrição presuntiva a lei confere ao consumidor comum relativamente àquelas obrigações geradas de relações da vida quotidiana e de cujo pagamento não é usual guardar ou sequer exigir quitação (neste sentido, cf. Acórdãos da Relação do Porto de 11/10/2011 e de 23/2/2012, ambos consultados na "internet" em www.dgsi.pt).
184. Por todo o exposto, conclui-se que não ocorreu prescrição em qualquer uma das facturas dadas à acção."
185. A decisão recorrida violou, na parte em que declarou nula a cl. "5.5.2" e absolveu o r. do seu pagamento, o disposto nos arts. 607e, 4 do cpc, 3429, 2 e 4052 do cc e 1, 12^, 199 c) ^o dl 446/85, de 25 de outubro, arts 3109 e 317^ b) do CC.

Nestes termos, e nos melhores de Direito que V. Exas. sempre suprirão, deve ao presente Recurso ser concedido provimento, e, em conformidade, ser a douta Decisão recorrida substituída por outra, na parte em que é desfavorável à A., condenando-se o R., finalmente "in totum", com as legais consequências, só assim se fazendo e alcançando a almejada

JUSTIÇA”.


9. O Réu não apresentou contra-alegações.

II - Questões a decidir

Como é sabido, o objeto do recurso determina-se pelas conclusões da alegação dos recorrentes, nos termos dos arts. 635.º, n.os 3 a 5 e 639.º, n.º 1, do CPC, só se devendo tomar conhecimento das questões que tenham sido suscitadas nas alegações e levadas às conclusões, ainda que outras, eventualmente, tenham sido suscitadas nas alegações propriamente ditas.

Assim, a esta luz, são as seguintes questões a conhecer:

1) Da interrupção da prescrição quanto às faturas respeitantes à conservação;

2) Do uso da prescrição presuntiva (art. 317.º, al. b), do Cód. Civil);

3) Da nulidade da Cláusula 5.5.2 dos contratos celebrados entre as partes.

III – Fundamentação
A) De facto

A factualidade dada como provada, nas instâncias, é a seguinte:
“1) A Autora é uma sociedade comercial, que tem como actividades, principais, o fornecimento, a montagem e a conservação de elevadores.
2) Em data anterior a Setembro de 2007, o Réu celebrou com a Autora dois Contractos de Conservação de Elevadores.
3) Em 15.11.2012, a relação comercial existente entre Autora e Réu foi ajustada, tendo sido nessa altura celebrados dois novos contractos de manutenção completa (com peças incluídas), denominados “Contrato AA Manutenção OM”, cujas cópias se encontram a fls.17 a 28 e cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido.
4) Nos termos dos contractos referidos em 3), a Autora obrigava-se a conservar, por períodos de 15 anos, renováveis por iguais períodos, os elevadores instalados no Edifício do Réu, os quais se identificam do seguinte modo:
i) Nº de Contrato/Instalação: NMP001
Tipo de Facturação (periodicidade): Mensal
Datas do Contrato: Início - 01.12.2012, Termo (Inicial) 30.11.2027;
ii) Nº de Contrato/Instalação: NMP002
Tipo de Facturação (periodicidade): Mensal
Datas do Contrato: Início - 01.12.2012, Termo (Inicial) 30.11.2027.
5) Os serviços contratados tinham o valor mensal inicial de €100,00 (+IVA), por cada contrato, o qual sofreu, entretanto, as actualizações anuais de preço respectivas, como contratadas.
6) Desde o início do Contrato dos Autos, a Autora foi conservando mensalmente os elevadores do Réu, e foi procedendo às reparações, quando e sempre que adjudicadas e/ou autorizadas pelo Réu.
7) Em 29.02.2008, o Réu – através da sua administração - solicitou à Autora o envio das segundas vias das facturas em dívida ao tempo, informando que seriam regularizadas pela então administração.
8) O atraso na regularização do valor em dívida levou a Autora a ponderar o seu interesse na manutenção da relação comercial com o Réu, havendo em 07.11.2013 enviado uma carta ao mesmo na qual lhe concedia um prazo suplementar – até 15.11.2013 - para a regularização do valor em aberto, sob pena de se considerar o contrato resolvido e emitida a competente factura de indemnização contratual, correspondente ao período contratual ainda por cumprir, o que veio, efectivamente, a suceder.
9) A Autora emitiu as seguintes facturas:

Doc. NºTipo de FacturaNº da FacturaData de Emissão/ VencimentoValor em dívida (€)
8CONSERVAÇÃOFCC00025.09.2007149,86
9CONSERVAÇÃOFCC00025.10.2007149,86
10CONSERVAÇÃOFCC00025.11.2007157,35
11CONSERVAÇÃOFCC00025.12.2007157,35
12CONSERVAÇÃOFCC00025.01.2008154,22
13CONSERVAÇÃOFCC00025.01.2008157,35
14CONSERVAÇÃOFCC00025.02.2008154,22
15CONSERVAÇÃOFCC00029.02.2008157,35
16CONSERVAÇÃOFCC00025.03.2008154,22
17CONSERVAÇÃOFCC00025.03.2008157,35
18CONSERVAÇÃOFCC00025.04.2008154,22
19CONSERVAÇÃOFCC00025.04.2008157,35
20CONSERVAÇÃOFCC00025.05.2008154,22
21CONSERVAÇÃOFCC00025.05.2008157,35
22CONSERVAÇÃOFCC00025.06.2008154.22
23CONSERVAÇÃOFCC00025.06.2008157,35
24CONSERVAÇÃOFCC00025.07.2008152,87
25CONSERVAÇÃOFCC00025.07.2008155,99
26CONSERVAÇÃOFCC00025.08.2008152,87
27CONSERVAÇÃOFCC00025.08.2008155,99
28CONSERVAÇÃOFCC00025.09.2008152,87
29CONSERVAÇÃOFCC00025.09.2008155,99
30CONSERVAÇÃOFCC00025.10.2008152,87
31CONSERVAÇÃOFCC00025.10.2008155,99
32CONSERVAÇÃOFCC00025.11.2008160,52
33CONSERVAÇÃOFCC00025.11.2008163,78
34CONSERVAÇÃOFCC00025.12.2008160,52
35CONSERVAÇÃOFCC00025.12.2008163,78
36CONSERVAÇÃOFCC00025.01.2009163,78
37CONSERVAÇÃOFCC00025.02.2009160,52
38CONSERVAÇÃOFCC00025.02.2009163,78
39CONSERVAÇÃOFCC00025.03.2009160,52
40CONSERVAÇÃOFCC00025.03.2009163,78
41CONSERVAÇÃOFCC00025.04.2009160,52
42CONSERVAÇÃOFCC00025.04.2009163,78
43CONSERVAÇÃOFCC00025.05.2009160,52
44CONSERVAÇÃOFCC00025.05.2009163,78
45CONSERVAÇÃOFCC00025.06.2009163,78
46CONSERVAÇÃOFCC00025.06.2009160,52
47CONSERVAÇÃOFCC00025.07.2009160,52
48CONSERVAÇÃOFCC00025.07.2009163,78
49CONSERVAÇÃOFCC00025.08.2009160,52
50CONSERVAÇÃOFCC00025.08.2009163,78
51CONSERVAÇÃOFCC00025.09.2009160,52
52CONSERVAÇÃOFCC00025.09.2009163,78
53CONSERVAÇÃOFCC00025.10.2009160,52
54CONSERVAÇÃOFCC00025.10.2009163,78
55CONSERVAÇÃOFCC00025.11.2009168,55
56CONSERVAÇÃOFCC00025.11.2009171,97
57CONSERVAÇÃOFCC00025.12.2009168,55
58CONSERVAÇÃOFCC00025.12.2009171,97
59CONSERVAÇÃOFCC00025.01.2010168,55
60CONSERVAÇÃOFCC00025.01.2010171,97
61CONSERVAÇÃOFCC00025.02.2010168,55
62CONSERVAÇÃOFCC00025.02.2010171,97
63CONSERVAÇÃOFCC00025.03.2010168,55
64CONSERVAÇÃOFCC00025.03.2010171,97
65CONSERVAÇÃOFCC00025.04.2010168,55
66CONSERVAÇÃOFCC00025.04.2010171,97
67CONSERVAÇÃOFCC00025.05.2010168,55
68CONSERVAÇÃOFCC00025.05.2010171,97
69CONSERVAÇÃOFCC00025.06.2010168,55
70CONSERVAÇÃOFCC00025.06.2010171,97
71CONSERVAÇÃOFCC00025.07.2010170,03
72CONSERVAÇÃOFCC00025.07.2010173,48
73CONSERVAÇÃOFCC00025.08.2010170,03
74CONSERVAÇÃOFCC00025.08.2010173,48
75CONSERVAÇÃOFCC00025.09.2010170,03
76CONSERVAÇÃOFCC00025.09.2010173,48
77CONSERVAÇÃOFCC00025.10.2010170,03
78CONSERVAÇÃOFCC00025.10.2010173,48
79CONSERVAÇÃOFCC00025.11.2010178,53
80CONSERVAÇÃOFCC00025.11.2010182,15
81CONSERVAÇÃOFCC00025.12.2010182,15
82CONSERVAÇÃOFCC00025.01.2011180,08
83CONSERVAÇÃOFCC00025.01.2011183,73
84CONSERVAÇÃOFCC00025.02.2011180,08
85CONSERVAÇÃOFCC00025.02.2011183,73
86CONSERVAÇÃOFCC00025.03.2011180,08
87CONSERVAÇÃOFCC00025.03.2011183,73
88CONSERVAÇÃOFCC00006.07.2012149,86
89CONSERVAÇÃOFCC00006.07.2012146,88
90CONSERVAÇÃOFCC00006.07.2012149,86
91CONSERVAÇÃOFCC00006.07.2012146,88
92CONSERVAÇÃOFCC00006.07.2012149,86
93CONSERVAÇÃOFCC00006.07.2012146,88
94CONSERVAÇÃOFCC00006.07.2012149,86
95CONSERVAÇÃOFCC00006.07.2012143,41
96CONSERVAÇÃOFCC00006.07.2012140,54
97CONSERVAÇÃOFCC00006.07.2012143,41
98CONSERVAÇÃOFCC00006.07.2012140,54
99CONSERVAÇÃOFCC00006.07.2012143,41
100CONSERVAÇÃOFCC00025.08.2012198,86
101CONSERVAÇÃOFCC00025.08.2012202,90
102CONSERVAÇÃOFCC00025.09.2012198,86
103CONSERVAÇÃOFCC00025.09.2012202,90
104CONSERVAÇÃOFCC00025.10.2012198,86
105CONSERVAÇÃOFCC00025.10.2012202,90
106CONSERVAÇÃOFCC00025.11.2012211,79
107CONSERVAÇÃOFCC00025.11.2012216,09
108CONSERVAÇÃOFCC00012.12.2012122,00
109CONSERVAÇÃOFCC00025.01.2012122,00
110CONSERVAÇÃOFCC00025.02.2013122,00
111CONSERVAÇÃOFCC00025.03.2013122,00
112CONSERVAÇÃOFCC00025.03.2013122,00
113CONSERVAÇÃOFCC00025.04.2013122,00
114CONSERVAÇÃOFCC00025.04.2013122,00
115CONSERVAÇÃOFCC00025.05.2013122,00
116CONSERVAÇÃOFCC00025.05.2013122,00
117CONSERVAÇÃOFCC00025.06.2013122,00
118CONSERVAÇÃOFCC00025.06.2013122,00
119CONSERVAÇÃOFCC00025.07.2013122,00
120CONSERVAÇÃOFCC00025.07.2013122,00
121CONSERVAÇÃOFCC00025.08.2013122,00
122CONSERVAÇÃOFCC00025.08.2013122,00
123CONSERVAÇÃOFCC00025.09.2013122,00
124CONSERVAÇÃOFCC00025.09.2013122,00
125CONSERVAÇÃOFCC00025.10.2013122,00
126CONSERVAÇÃOFCC00025.10.2013122,00
127CONSERVAÇÃOFCC00025.11.2013122,00
128CONSERVAÇÃOFCC00025.11.2013122,00
129REPARAÇÃOFRT00011.03.2010693,12
130REPARAÇÃOFRT00011.03.2010346,56
131REPARAÇÃOA000005.05.2010346,56
132REPARAÇÃOFRT00015.12.2012315,98
133REPARAÇÃOFRT00015.01.2013315,98
134REPARAÇÃOFRT00015.02.2013315,98
135RESOLUÇÃORCC00002.12.20135.457,06
136RESOLUÇÃORCC00002.12.20135.457,06
137JUROSNDJ00013.12.20135.104,47
Total €37.537,23


10) Os serviços descritos nas facturas enumeradas em 9) foram prestados.
11) A Autora interpelou o Réu para pagamento.

Vem julgada não provada a seguinte matéria:                                 
a- O réu pagou as facturas descritas em 9;                          
b- Os contractos referidos em 3 são objecto de negociação entre as partes quanto às cláusulas 5.5.1 e 5.5.1 neles constantes”.


B) De Direito
1) Da interrupção da prescrição por reconhecimento do direito da Autora quanto às faturas respeitantes à conservação dos elevadores

No que concerne à interrupção do prazo de prescrição das faturas referentes às prestações mensais decorrentes da conservação dos elevadores (faturas 8 a 67 do facto provado sob o n.º 9), a Recorrente entende que não se verifica a prescrição em virtude de ter apresentado um acordo de pagamento da dívida que equivale a reconhecimento do direito com efeito interruptivo da prescrição nos termos do art. 325.º, do Cód. Civil. Em todo o caso, a Recorrente não põe em causa que o prazo de prescrição dessas faturas é de 5 anos, conforme o art. 310.º, al. g), do Cód. Civil.

Parece deve secundar-se a posição do Tribunal da Relação de Lisboa que não atendeu à junção do referido documento como facto interruptivo da prescrição relativamente às faturas em causa. De acordo com o respetivo acórdão, a fls. 635, o Tribunal da Relação entendeu que não verifica um novo facto interruptivo com base na junção desse acordo, porquanto a Autora não alegou na resposta à contestação, deduzida oralmente na audiência prévia (cfr. transcrição da acta de fls. 606 e ss.), a existência desse mesmo acordo enquanto facto constitutivo do efeito impeditivo da prescrição. O Tribunal da Relação afastou-se, assim, do Tribunal da 1.ª Instância, na medida em que este valorou, na fundamentação de direito, aquele acordo, ao afirmar que os factos a que se refere o documento de fls. 362 a 366 se deveriam “considerar processualmente adquiridos”, desconsiderando, pois, que esta factualidade não se encontrava na matéria de facto provada. De resto, de acordo com os princípios da preclusão e da concentração da defesa, competia à Autora/Recorrente, no que toca à invocação da exceção da prescrição, alegar na fase processual própria – in casu, na resposta à contestação – a existência de um reconhecimento do seu direito, nos termos do art. 325.º, do Cód. Civil. Não o havendo feito, e tendo-se limitado a anexá-lo já numa fase adiantada do processo, o acordo de pagamento mencionado supra não pode ser levado em linha de conta pelo tribunal, nem sequer ao abrigo do art. 5.º, do CPC, por se tratar de um facto essencial cuja alegação cabia à Autora/Recorrente.

Improcede, por isso, nesta parte, o recurso de revista interposto pela Autora.
2) Do uso da prescrição presuntiva (art. 317.º, al. b), do Cód. Civil) no âmbito das faturas respeitantes à reparação dos elevadores

            Segundo a Recorrente, no que toca às faturas respeitantes às reparações levadas a cabo, o Tribunal da Relação de Lisboa não devia ter lançado mão da prescrição presuntiva de dois anos (art. 317.º, al. b), do Cód. Civil), porquanto as razões subjacentes ao estabelecimento desse prazo não se verificam no caso sub judice, pois que, inter alia, sobre o Réu/Recorrido impende uma obrigação de escrituração. É que, de acordo com o acórdão recorrido, a fls. 636 e 637, não se procedendo à sua interpretação corretiva, deve aplicar-se o preceito o art. 317.º, al. b), do Cód. Civil ao caso em apreço.

A “prescrição consiste no instituto por virtude do qual a contraparte pode opor-se ao exercício de um direito, quando este não se verifique durante certo tempo indicado na lei e que varia consoante ao casos”[1].

 Decorrido esse prazo, que varia consoante os casos, aquele a quem a prescrição aproveita pode invocá-la e, assim, recusar o cumprimento da prestação ou opor-se ao exercício do direito prescrito (arts. 298.º, n.º 1, 301.º, 303.º e 304.º, n.º 1, do Cód. Civil).

No caso em apreço, está em causa a assim denominada prescrição presuntiva, que se funda na presunção de cumprimento. Entende-se que o decurso do prazo presume o cumprimento, não necessitando o devedor de provar o facto extintivo da obrigação. Diferentemente da prescrição extintiva, a prescrição presuntiva não se funda na inércia do devedor e na certeza e segurança jurídicas. A prescrição presuntiva baseia-se antes no pressuposto de que, no que respeita a determinadas obrigações, o credor é habitualmente rápido no exercício do seu direito e o devedor costuma cumprir num prazo curto sem exigir ou, pelo menos, sem guardar por muito tempo o respetivo documento de quitação. A prescrição presuntiva tem por finalidade tutelar o devedor contra o risco de satisfazer duas vezes dívidas de que não é usual exigir recibo ou guardá-lo por muito tempo, protegê-lo da dificuldade de prova do pagamento. Deste modo, decorrido o prazo legalmente consagrado, não exercendo o credor o seu direito e invocando o devedor a prescrição presuntiva, presume-se que a dívida se encontra saldada e dispensa-se o devedor da prova do pagamento (art. 312.º, do Cód. Civil). Não se afasta, naturalmente, a ilisão da presunção (arts. 350.º, n.º 2, 313.º e 314.º, do Código Civil)[2].

Parte-se do princípio que o devedor pagou, dispensando-o do ónus que sobre ele impenderia de provar o pagamento, nos termos do art. 342.º, n.º 2, do Cód. Civil (facto extintivo do direito invocado). Muito diferentemente da prescrição extintiva, a prescrição presuntiva apenas dispensa o beneficiário do ónus de provar o pagamento. Por conseguinte, é ao credor que compete o ónus da prova do não pagamento, ilidindo a presunção de pagamento.

Para que o beneficiário da prescrição presuntiva prevista no art. 317.º, al. b), do Cód. Civil, possa dela aproveitar, compete-lhe alegar e provar que está em causa um crédito de um comerciante (ou um crédito de pessoa que exerça profissionalmente uma indústria), que decorreu o prazo de dois anos sobre a venda (ou sobre o exercício da atividade industrial exercida) e que o objeto alienado (ou a atividade industrial exercida) não foi aplicado no comércio (ou na indústria). Provando estas circunstâncias, fica dispensado do ónus da prova do cumprimento da obrigação.

São, assim, elementos constitutivos desta prescrição presuntiva, o crédito ser de comerciante (ou de industrial), o decurso do prazo de dois anos sobre a venda de bem (ou o exercício da atividade industrial exercida) e o devedor não ser comerciante (ou industrial) ou, sendo-o, não destinar o bem ou a atividade ao seu comércio (ou ao seu exercício industrial).

In casu, todos esses elementos se verificam: o crédito é de comerciante. Nos termos do art. 13.º, n.º 2, do Cód. Comercial, a Autora Recorrente é comerciante[3]. Já decorreu o prazo de dois anos sobre a execução dos trabalhos. O devedor não é comerciante.

Além disso, parece fazer sentido aplicar a um condomínio um regime normativo pensado para valer ao devedor no caso de dívidas que costumam ser pagas rapidamente e de cujo pagamento não é habitual exigir recibo. Note-se, de resto, que, segundo o art. 1431.º, n.º 1, do Cód. Civil, a obrigação de conservação de documentos referentes a contas da administração não necessita de durar por mais de um ano.

Por outro lado, a situação em apreço não se afigura semelhante àquelas que, segundo o entendimento dominante da jurisprudência, a ratio da prescrição presuntiva não parece compatível com atividades (v.g., certas empreitadas duradouras de construção civil ou a prestação de serviços de limpeza a condomínios) que geram créditos cuja natureza não se revela favorável à tutela dos débitos correspetivos[4].

Por último, a aplicação da presunção presuntiva estabelecida no art. 317.º, al. b), do Cód. Civil, o facto de as faturas respeitantes a reparações, independentemente de estas serem suscetíveis de serem consideradas de per si como empreitadas – não duradouras -, terem sido emitidas ao abrigo de uma relação contratual duradoura, emergente de um contrato de manutenção completa de elevadores e não com base numa situação isolada no tempo, não parece obstar à justificação da presunção do seu pagamento. O mesmo se verifica noutras situações, v.g., art. 10.º, n.º 1, da Lei n.º 23/96 de 26 de julho (que cria no ordenamento jurídico alguns mecanismos destinados a proteger o utente de serviços públicos essenciais).

Enquanto a sentença do Tribunal de 1.ª Instância considerou que os créditos em causa não se encontram abrangidos pela norma do art. 317.º, al. b), do Cód. Civil, não os considerando presuntivamente prescritos, o Tribunal da Relação de Lisboa entendeu aplicar-lhes esse mesmo preceito, julgando-os presuntivamente prescritos.

Assim, também nesta parte, não se concede provimento ao recurso de revista interposto pela Autora.
3) Da nulidade da cláusula n.º 5.5.2 dos contratos celebrados entre as partes[5]

            Ao contrário do Tribunal da Relação de Lisboa, a Recorrente entende que a cláusula penal constante do ponto 5.5.2 dos contratos em apreço (fls. 21) não está ferida de nulidade e encontra justificação nos meios humanos e materiais que tem de afetar ao cumprimento das prestações a que se obrigou na vigência do contrato (cfr., por exemplo, conclusões 62 e 63), não sendo desproporcionada nos termos do art. 19.º, n.º 1, al. c), da LCCG.

            Importa notar que o Tribunal da Relação de Lisboa entendeu que a Autora se limitou, a este propósito, a “alegações genéricas, imprecisas, designadamente não foi feita a concreta descrição da diferença de preços consoante tempos de duração do contrato” (fls. 638).

            Segundo a cláusula 5.5.2 dos contratos celebrados:
Independentemente do direito à indemnização por mora, estipulado em 5.5.1, sempre que haja incumprimento do presente contrato por parte do cliente, e nomeadamente quando se verifique mora no pagamento de quaisquer quantias devidas à AA por mais de 30 dias, poderá esta resolver o presente contrato, sendo-lhe devida uma indemnização por danos, no valor da totalidade das prestações do preço previstas até ao termo do prazo contratado para contratos com duração até 5 anos, no valor de 50% das prestações do preço para contratos com duração superior a 5 anos”.

No que respeita a cláusulas similares utilizadas em contratos celebrados pela ora Recorrente, o Supremo Tribunal de Justiça já teve, recentemente, oportunidade de se pronunciar.

Assim, de acordo com o acórdão de 5 de maio de 2016 (Salazar Casanova), Proc. n.º 13161/14.2T2SNT.L1.S1:

“(…) III - A cláusula penal constante de contrato de prestação de serviços de assistência a ascensores, prorrogável automaticamente findo o prazo de duração, que admite a denúncia do contrato, impondo ao denunciante que suporte sem mais o custo integral de todas as prestações que seriam devidas até ao termo do prazo contratado, tal cláusula é desproporcionada aos danos a ressarcir (art. 19.º, al. c), do DL n.º 446/85, de 25-10). 

IV - Os danos considerados equivalem à perda das prestações que seriam recebidas como contrapartida de serviços que, em razão da denúncia, deixaram de ser prestados; eles visam ressarcir o designado interesse contratual positivo.” 

Conforme o acórdão de 9 de novembro de 2017 (Rosa Tching), Proc. n.º 26399/09.5T2SNT.L1.S1:

“I - Não tendo a ré suscitado, na contestação, a questão da nulidade de uma cláusula contratual geral, tendo-o feito apenas em sede de alegações de recurso, nada impede o tribunal da Relação de, no acórdão que conheceu da apelação interposta da sentença do tribunal de 1.ª instância, apreciar tal nulidade, por, apesar de ser questão nova, ser de conhecimento oficioso.

II - Condicionante desse conhecimento oficioso é apenas o dever do juiz, imposto pelos princípios do contraditório, na vertente proibitiva de decisão surpresa, e da igualdade das partes, consagrados no art. 3.º, n.os 3 e 4, e no art. 4.º, ambos do CPC, de convidar as partes a pronunciarem-se sobre a questão da nulidade da cláusula contratual geral.

III - Para a aferição da adequação do conteúdo da concreta cláusula penal com a norma da al. a) do art. 19.º do DL n.º 446/85, de 25-10, há que, através de um juízo objetivo e abstrato, reportado ao momento em que a cláusula penal é fixada, estabelecer uma relação entre os danos que normal e tipicamente resultam, dentro do quadro negocial padronizado em que o contrato se integra, e a pena contratual.

IV - É nula a cláusula penal inscrita em contrato de adesão de manutenção completa de elevadores que estipula que “em caso de denúncia antecipada pelo cliente, (…) terá direito a uma indemnização por danos, (…), no valor de 25% do preço para os contratos com a duração entre 10 e 20 anos”, por impor uma indemnização desproporcionada face aos danos a ressarcir e, em consequência, ser proibida nos termos do disposto no art. 19.º, al. c), do DL n.º 446/85, de 25-10”.

Segundo o acórdão de 19 de setembro de 2019 (Acácio Neves), Proc. n.º 652/16.0T8SNT.L1.S1, que apreciou a ação intentada pelo Ministério Público ao abrigo do disposto no art. 26.º, n.º 1, al. c), do DL n.º 446/85, de 25 de outubro:

8) É esta, claramente, a situação dos autos, no que concerne às cláusulas em apreço.

Com efeito, das mesmas resulta que, na sequência de resolução do contrato pela recorrida - e, note-se, apenas com base na simples mora no pagamento de qualquer quantia devida por mais de 30 dias - ou de denúncia antecipada pelo cliente, e na hipótese de tal suceder logo na fase inicial do contrato, a recorrida, sem prestar qualquer serviço e sem os custos correspondentes, ficará a receber as prestações acordadas praticamente durante 5 anos (!!!) ou mesmo 10 ou 20 anos (ainda que, após os 5 anos com redução para 50% ou 25%, respetivamente).

Tal significa que as cláusulas em questão são, só por si. de todo desproporcionais em relação aos danos a ressarcir — resultando das mesmas a possibilidade de a recorrida vir a obter benefícios patrimoniais de todo injustificados e injustos.

E se já são desproporcionais em si mesmas, essa desproporcionalidade também se manifesta em relação a outras cláusulas do contrato.

Desde logo face à possibilidade de a recorrida poder resolver o contrato com base numa simples mora de 31 dias e, ainda por cima, relativamente ao pagamento de qualquer quantia (!!!).

E, por outro lado, face à comparação com a sanção decorrente do incumprimento por parte da recorrida, nos termos da cláusula 5.6 (referida no n° 12 dos factos provados), nos termos da qual “Na situação de eventual incumprimento imputável à AA é expressamente aceite que a AA apenas responderá até à concorrência do valor de três meses de faturação AA do presente contrato, como máximo de indemnização apagar ao cliente.”

Não poderemos deixar assim de acompanhar e subscrever o que diz o recorrente na conclusão 9a, no sentido de que “a desproporcionalidade das cláusulas é evidente em função da comparação com a cláusula 5.6 que estipulava como máximo de indemnização a pagar ao cliente, na situação de incumprimento a si imputável, o valor de três meses de faturação, e que se afigura ser desproporcionada mesmo na redação mantida na sequência da expurgação do último segmento da cláusula.”

9) Em face do exposto, na procedência das conclusões recursórias e acompanhando o entendimento da 1a instância, haveremos de concluir no sentido da desproporcionalidade das cláusulas em questão e, por consequência, no sentido da invalidade/nulidade das mesmas, à luz do disposto na al. c) do artigo 19° do RJCCG”.

Sem prejuízo de os acórdãos mencionados supra se referirem essencialmente a situações de denúncia pelo cliente (e não de resolução pela Autora) e de as cláusulas não serem inteiramente coincidentes com a cláusula dos autos (esta já de redação antiga e prevendo uma penalização de 50% do valor das prestações para contratos com duração superior a cinco anos), parece manifestar-se uma tendência na jurisprudência – ainda para mais quando não há prova da justificação para os danos em que se baseia - no sentido de a considerar nula, nos termos do art. 19.º, al. c), da LCCG, por consagrar uma cláusula penal desproporcionada aos danos a ressarcir.

O recurso improcede também nesta parte.

IV – Decisão

Nega-se provimento ao recurso de revista, confirmando-se o acórdão recorrido.

Custas pela Autora/Recorrente.

Lisboa, 17 de dezembro de 2019

Maria João Vaz Tomé - Relatora

António Magalhães

Jorge Dias

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[1] Mário Júlio Almeida Costa, Direito das Obrigações, Coimbra, Almedina, 1998, p.1004.

“Sem querer entrar na discussão de qual seja exactamente o fundamento da prescrição, que uns vêem na probabilidade de ter sido feito o pagamento, outros na presunção de renúncia do credor, ou na sanção da sua negligência, ou na consolidação das situações de facto, ou na protecção do devedor contra a dificuldade de prova do pagamento ou sossegado quando à não-exigência da dívida, ou na necessidade social de segurança jurídica e certeza dos direitos, ou de sanear a vida jurídica de direitos praticamente caducos, ou na de promover o exercício oportuno de direitos – pode dizer-se que a prescrição se baseia, mais ou menos, em todas estas considerações, sem que possa afirmar-se só uma delas ser decisiva e relevante” - vide Adriano Vaz Serra, “Prescrição e caducidade”, in BMJ n.º 105, p.32; Ana Filipa Morais Antunes, Algumas questões sobre prescrição e caducidade, Separata de Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor Sérvulo Correia, Coimbra, Coimbra Editora, 2010, p.39.

[2] Cfr. José Brandão Proença, “Artigo 312.º”, in Comentário ao Código Civil – Parte Geral, Lisboa, Universidade Católica Editora, 2014, p.759.
[3] Segundo o art. 2.º, n.º 1, do CSC, são sociedades comerciais aquelas que tenham por objeto a prática de atos de comércio e adotem o tipo de sociedade em nome coletivo, de sociedade por quotas, de sociedade anónima, de sociedade em comandita simples ou de sociedade em comandita por ações.
Em vista da qualificação de determinados atos como comerciais, afigura-se legítimo o recurso à analogia. A esta luz, um ato não previsto na lei comercial, mas com características análogas a outro legalmente previsto, será qualificado como comercial, por analogia com este. A admissibilidade do recurso à analogia legis não levanta grandes dificuldades. Mas também se admite o recurso à analogia iuris: é possível retirar (vários) princípios gerais de (vários) grupos de normas qualificadoras (por razões idênticas ou similares) de diversos atos como atos de comércio. O art. 230.º, n.º 2,do Cód. Comercial, trata das empresas que fornecem, “em épocas diferentes, géneros, quer a particulares, quer ao Estado, mediante preço convencionado”. Já se defendeu a desnecessidade de identificar, no art. 230.º, as empresas de fornecimentos de “outros objectos” apesar de a norma do n.º 2 se ter revelado muito fértil para, mediante a interpretação extensiva ou a integração por analogia legis, reconhecer a comercialidade de um conjunto de espécies empresariais. Com efeito, com base na interpretação extensiva, tem-se entendido que serem comerciais as empresas fornecedoras de água, gás e eletricidade. Também se tem entendido, com base na analogia legis, considerar como comerciais uma multiplicidade de empresas de fornecimento de serviços. No que respeita a empresas (de prestação) de serviços (distintas das empresas de fornecimentos de serviços propriamente ditas), que que não são análogas às previstas no n.º 2, ou noutros, do art. 230.º. nem àquelas passíveis de serem incluídas noutras disposições do Cód. Comercial, nem às consideradas comerciais em diplomas ulteriores, o recurso à teleologia imanente ao sistema legal mercantil, ao seu espírito, à analogia iuris (art. 10.º, n.º 3, do Cód. Civil), permite qualifica-las como comerciais. Na verdade, o facto de a lei, quer no Cód. Comercial, quer em diplomas ulteriores, considerar como comerciais muitas empresas de serviços conduz à afirmação da existência de um princípio geral de direito comercial segundo o qual as empresas de serviços são, em regra, comerciais.

[4] Cfr. José Brandão Proença, “Artigo 317.º”, in Comentário ao Código Civil – Parte Geral, Lisboa, Universidade Católica Editora, 2014, pp.764-765.

Refiram-se, a este propósito, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29 de novembro de 2016 (João Camilo), Proc. n.º 2643/12.0TBPVZ.P1.S1 – disponível para consulta in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/1a9a7546a3ee37c18025807a005926a5?OpenDocumentque entendeu que o direito ao preço resultante de um contrato de empreitada de construção civil não está incluído na previsão do art. 317.º, al. b), do Cód. Civil; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 23 de fevereiro de 2012 (Lopes do Rego), Proc. n.º 2254/03.1TBCLD.L1.S1 (Relator Lopes do Rego) – disponível para consulta in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/bb9369105dac1906802579b40040f579?OpenDocument -, segundo o qual não são abrangidos pela hipótese do art. 317.º, al. b), do Cód. Civil, enquanto norma delimitadora dos pressupostos da figura da prescrição presuntiva, os créditos emergentes de fornecimentos de rações, essenciais ao exercício empresarial pelo devedor de atividade no sector agro-pecuário (suinicultura), realizada de forma habitual e com fins lucrativos, envolvendo exploração de razoável dimensão económica.
[5] Tratando-se de uma cláusula simultaneamente penal e resolutiva, apenas está em causa a sua dimensão penal.