Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
10290/13.3YIPRT.L1.S1
Nº Convencional: 7ª SECÇÃO
Relator: MARIA DOS PRAZERES PIZARRO BELEZA
Descritores: IVA
SISTEMA COMUM DE IVA
PRINCIPIO DA NEUTRALIDADE FISCAL
DIREITO À DEDUÇÃO DO IMPOSTO REPERCUTIDO
PRAZO DE CADUCIDADE
FACTURAS
LIQUIDAÇÃO ADICIONAL
SUJEITO PASSIVO DE IVA
QUESTÃO PREJUDICIAL
REENVIO PREJUDICIAL
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DA UNIÃO EUROPEIA
DIREITO DA UNIÃO EUROPEIA
UNIÃO EUROPEIA
DIRECTIVA COMUNITÁRIA
DIRETIVA COMUNITÁRIA
Data do Acordão: 07/05/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO TRIBUTÁRIO - LIQUIDAÇÃO E PAGAMENTO DO IMPOSTO / OUTRAS OBRIGAÇÕES DOS CONTRIBUINTES / GARANTIAS DOS SUJEITOS PASSIVOS.
Doutrina:
-Sérgio Vasques, O Imposto sobre o Valor Acrescentado, Coimbra, 2015, p. 182 e 341.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DO IMPOSTO SOBRE O VALOR ACRESCENTADO (CIVA) : - ARTIGOS 29, N.º 7 E 36.º,N.º 5 E N.º, 98.º, N.º 2.
Referências Internacionais:
DIRETIVA N.º 2006/112/CE DO CONSELHO DA EUROPA, DE 28-11-2006: - ARTIGOS 63.º, 167.º, 168.º, 178.º, 180.º, 182.º E 219.º.
Jurisprudência Internacional:

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DA UNIÃO EUROPEIA (TJUE):



- DE 15-07-2010, PROCESSO 368/09, PANNON GÉP CENTRUM KFT CONTRA APEH;
- DE 12-07-2012, PROCESSO C-284/11, EMS‑BULGARIA TRANSPORT OOD CONTRA DIREKTOR NA DIREKTSIA «OBZHALVANE I UPRAVLENIE NA IZPALNENIETO» PLOVDIV, EU:C:2012:458, N.° 62 E 71;
- DE 11-12-2014, PROCESSO C‑590/13, IDEXX LABORATORIES ITALIA, EU:C:2014:2429, N.° 39;
- DE 09-07-2015, PROCESSO C‑183/14, SALOMIE E OLTEAN, EU:C:2015:454, N.° 58;
- DE 28-07-2016, PROCESSO C-332/15, GIUSEPPE ASTONE CONTRA PROCURA DELLA REPUBBLICA;
- DE 21-03-2018, PROCESSO C-533/16, VOLKSWAGEN, EU:C:2018:204, º 50;
- DE 12-04-2018, PROCESSO C-8/17.
Sumário :
I - Segundo o entendimento do TJUE, o direito de dedução é um princípio fundamental do sistema comum do IVA instituído pela UE, o qual garante o princípio da neutralidade da carga fiscal de todas as actividades económicas sujeitas a IVA. O exercício do direito de dedução está sujeito a requisitos e condições, não sendo incompatível com a Directiva IVA o estabelecimento de um prazo de preclusão, desde que sejam respeitados os princípios da equivalência e da efectividade.

II - O direito à dedução constitui-se quando o imposto dedutível se torna exigível, o que, num caso em que é obrigatória a emissão de facturas, coincide com essa emissão ou com o termo do prazo para o efeito. Havendo lugar a rectificações, devem ser emitidas as facturas correspondentes às mesmas (n.º 7 do art. 29.º do CIVA), as quais, em princípio, deverão conter as indicações constantes do n.º 5 do art. 36.º do CIVA, por valerem quanto a elas as razões subjacentes às exigências legais.

III - Assim, é de considerar que o prazo de caducidade a que se refere o n.º 2 do art. 98.º do CIVA apenas pode iniciar o seu curso a partir do momento em que a autora recebeu os avisos de lançamento enviados pela ré e destinados a rectificar as facturas que inicialmente lhe foram remetidas, pois só a partir deste momento aquela estava em condições formais para exercer o direito à dedução do acréscimo do imposto determinado por liquidação adicional. Como foi entendido pelo TJUE, reportar o início desse prazo a momento anterior contrariaria os arts. 63.º, 167.º, 168.º, 178.º a 180.º, 182.º da Directiva n.º 2006/112/CE, do Conselho, de 28-11-2006 e o princípio da neutralidade fiscal.

IV - Constando dos avisos de lançamento mencionados em III a indicação dos números das facturas aí aludidas, é de concluir pela existência de uma referência expressa às mesmas, pelo que aqueles documentos devem ser tidos como documentos equivalentes às facturas para efeitos do n.º 7 do art. 29.º do CIVA. Não se verifica qualquer violação formal que impeça a verificação dos requisitos materiais do direito à dedução, sendo que a solução adversa seria desconforme com o disposto no art. 219.º da Directiva n.º 2006/112/CE e com o entendimento do TJUE sobre a questão.

Decisão Texto Integral:
Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça: 



1. Em 21 de Janeiro de 2013, AA - Indústria de Reciclagem, S.A., apresentou um requerimento de injunção contra BB - Pavimentos, S.A., pretendendo o pagamento de € 102.434,49 (€ 100.916,50 a título de capital e € 1.517,89 de juros de mora vencidos), acrescido dos juros de mora vincendos. Para o efeito, e em síntese, alegou ter vendido à ré, “no exercício da sua actividade comercial”, granulado de borracha, no valor de € 664.538,77, entre Fevereiro de 2008 e Maio de 2010, e ter ocorrido inexactidão na aplicação da taxa devida de IVA nas facturas correspondentes, a taxa reduzida de 5%.

Alegou ainda que, para regularizar essa inexactidão, emitiu as notas de débito e de crédito que identifica, relativas “à diferença entre o imposto liquidado no momento das aquisições e o montante que resulta da aplicação da taxa correcta de IVA (taxa normal em vez da taxa reduzida)”; estarem vencidos desde 4 de Outubro de 2012 os correspondentes avisos de lançamento, enviados à ré por carta registada recebida em 24 de Outubro de 2012, ré essa que não procedeu a qualquer pagamento, apesar de interpelada “por diversas vezes”, entrando assim em mora.

A requerida opôs-se, não reconhecendo qualquer dívida à requerente e alegando ter oportunamente pago “todos os produtos adquiridos à requerente nos anos de 2008, 2009 e 2010, bem como em qualquer outro momento (…), de acordo com as facturas elaboradas e apresentadas pela própria à requerida”, sendo apenas da responsabilidade da requerente qualquer inexactidão na aplicação da tava de IVA, e afirmando que as notas de débito foram emitidas “à sua revelia”, não lhes reconhecendo “legitimidade e/ou obrigatoriedade”.

Remetido o processo ao Tribunal de Família e Menores e de Comarca de …, foi determinado que o processo passasse a seguir a forma ordinária (despacho de fls. 38).

A autora replicou. Afirmou, nomeadamente, que “improcede totalmente a invocação do pagamento do preço dos produtos adquiridos”, pois “a obrigação do adquirente dos bens que é sujeito passivo de IVA, de suportar o imposto que lhe seja, posteriormente, imputado, nada tem a ver com o cumprimento da obrigação de pagamento do preço”; e que “é manifestamente falso” que tenha procedido “às correcções do imposto sem” dar conhecimento à ré.

Recordou ainda que era sua obrigação proceder à repercussão do imposto “para os seus clientes que eram sujeitos passivos de IVA”, como a ré, e que, para o efeito, após ter apresentado “um pedido de informação vinculativa à Administração Tributária, ao abrigo do artigo 68º da Lei Geral Tributária (…), obteve o esclarecimento de que as operações em causa (…) estavam sujeitas à taxa normal de IVA” e “foi alvo de um procedimento inspectivo, que resultou numa liquidação adicional de IVA, pela aplicação inexacta da taxa de imposto”. Assim, procedeu “à rectificação das facturas já emitidas”, cabendo à ré fazer a dedução correspondente, ou, sendo caso disso “apresentar um pedido de reembolso”; e que “não se trata de apurar responsabilidades”, já apuradas – pagou “o imposto que não liquidou a todos os seus clientes, bem como (…) [as] coimas junto da Administração tributária”, “mas, pelo contrário, de respeitar o mecanismo do imposto”.

Frisou também que as notas de débito eram documento equivalente a facturas, para o efeito de conferir “o direito à dedução do IVA”.

A sentença de fls. 488 julgou a acção improcedente. Considerando que a questão a resolver era a de “saber se, tendo havido erro da Autora na taxa de IVA aplicada nas facturas emitidas à Ré e por esta pagas, deve a Ré, que não é consumidora final, pagar o remanescente de IVA à taxa legal devida”, o tribunal entendeu que o CIVA (artigo 37º) “consagra o dever de repercutir o imposto”, mas “não prevê expressamente qualquer limite temporal para o exercício desse dever”; que, “não obstante existir obrigação de repercutir o imposto, o sujeito passivo adquirente dos bens só pode ser obrigado ao seu pagamento se as facturas ou documentos equivalentes forem emitidos a tempo de lhe permitir exercer a respectiva dedução ou pedido de reembolso, pois só assim poderá ser assegurado o funcionamento do imposto de forma neutral”; que “nos termos do art. 19º, nº 2” do CIVA; “só confere direito a dedução do imposto mencionado em facturas ou documentos equivalentes passados em forma legal, sendo tais requisitos além do mais, os consagrados no art. 36º, nº 5 do CIVA”.

Por conseguinte, “em finais de Outubro de 2012, na melhor das hipóteses no dia 24/10, quando foram recepcionados os avisos de lançamento de fls. 114 e segs., já a Ré estava impossibilitada (por motivo totalmente imputável à Autora) de efectuar qualquer dedução (e consequentemente qualquer pedido de reembolso) relativamente às operações anteriores a 24 de Outubro de 2008.

Conclui-se assim que, por esta razão, a Ré não estava obrigada a pagar o imposto adicional de IVA relativamente às aquisições de bens feitas até 24 de Outubro de 2008, cobrado decorridos mais de 4 anos desde tais aquisições, por se encontrar impedida de efectuar a respectiva dedução ou pedido de reembolso, o que contraria toda a lógica do IVA, tornando este agente económico em consumidor final quando de modo algum o erro de facturação lhe é imputável."

Quanto às aquisições posteriores a essa data, entendeu ainda a sentença que os “avisos de lançamento «não contêm nem “em si, nem por remissão (…) os elementos legais necessários que caracterizam a factura, não se mostrando, nessa medida, preenchida a condição formal para o direito de dedução do imposto”, tal como se exige nos artigos 29º, nº 7 e 36º, nº 5, então vigentes, do CIVA. Concretamente, “são datados, numerados sequencialmente e contêm os nomes, firmas ou denominações sociais e a sede ou domicílio do fornecedor de bens ou prestador de serviços e do destinatário ou adquirente, bem como o número de identificação fiscal da Ré. Porém, naquilo que parece ser a descrição da operação pode ler-se de forma idêntica nos avisos de lançamento, variando apenas o mês e ano a que respeitam: «valor de vossa conta referente ao valor adicional de IVA do período de Fevereiro de 2008 decorrentes de correcções efectuadas pela administração fiscal (operação não sujeita a IVA)», após o que aparecem enumerados numa coluna números de facturas (sendo que em alguns avisos esta coluna não é sequer precedida da menção ‘factura’ (…), seguindo-se uma coluna com uma correspondência de valores, com a designação ‘débito’. Os ditos avisos não contêm a quantidade a denominação usual dos bens transmitidos, a taxa aplicada e a taxa devida, e nem contêm, relativamente a cada factura indicada, o respectivo preço líquido de imposto, e nem a data em que os bens foram colocados à disposição do adquirente ou a respectiva data de emissão”. É certo que estes dados omissos constam das facturas juntas a cada um dos avisos, todavia não há nos avisos de lançamento qualquer menção de que dos mesmos fazem parte as facturas correspondentes ou que estas lhe estejam anexas (…), donde, julgamos que as mesmas não podem considerar-se incluídas ou incorporadas em tais avisos”.

A improcedência da acção foi totalmente confirmada pelo Tribunal da Relação de ….

A autora interpôs recurso de revista excepcional, que foi admitido.

2. Nas alegações que apresentou, a autora formulou as seguintes conclusões (deixando agora de lado as que se referem aos pressupostos da revista excepcional):

«(…) XII. O Acórdão Recorrido não pode manter-se na medida em que incorre em erro de julgamento das normas legais aplicáveis, nomeadamente:

i. No que respeita ao fundamento da impossibilidade de repercutir IVA a adquirentes que, pelo decurso do prazo, se encontrem impossibilitados de deduzir o mesmo imposto:

1. Violação da obrigação da Recorrente em proceder à repercussão do IVA na  esfera da adquirente e ora Recorrida, prevista no número 1 do artigo 37.º do Código do IVA;

2. Violação do princípio da responsabilidade solidária do adquirente, previsto no número 1 do artigo 79.º do Código do IVA;

ii. No que respeita ao fundamento de os Avisos de lançamento não serem conformes o artigo 36.º do Código do IVA, erro na interpretação do referido artigo e, nomeadamente, dos requisitos que os documentos rectificativos de factura devem conter.

XIII. O número 1 do artigo 37.º do Código do IVA impõe que o sujeito passivo do imposto, neste caso o vendedor, exija ao adquirente das mercadorias o imposto liquidado na factura e, correspondentemente, que o adquirente das mercadorias proceda ao pagamento do imposto liquidado – trata-se de uma obrigação consagrada na Lei e não de um Direito;

XIV. A violação da obrigação do sujeito passivo em repercutir o imposto é, inclusivamente, punida com a coima prevista na alínea a) do número 5 do artigo 114.º do RGIT;

XV. Não decorre do referido artigo 37.º do Código do IVA, de qualquer outra disposição legal do mesmo Código, ou de qualquer legislação relevante, incluindo a Directiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de Novembro de 2006 [na redacção que lhe foi conferida pela Directiva 2010/88/EU do Conselho de 7 de Dezembro de 2010], relativa ao sistema comum do Imposto sobre o valor acrescentado, que a obrigação de repercussão do IVA (para o transmitente) e a obrigação de pagar o imposto (pelo adquirente) cessa quando o adquirente fique impedido de deduzir o IVA repercutido;

XVI. Tratando-se da repercussão de um Imposto, não estava na esfera da Adquirente, ora Recorrida, recusar a sua repercussão pelo facto de não poder deduzir o referido imposto.

XVII. A própria Informação Vinculativa pedida pela Recorrida e junta ao processo a fls. 98 e 99 não faz qualquer referência quanto ao facto de existir uma limitação temporal à obrigação de repercutir o imposto.

XVIII. Consequentemente, o fundamento da impossibilidade de repercutir IVA a adquirentes que, pelo decurso do prazo, se encontrem impossibilitados de deduzir o mesmo imposto viola expressamente o número 1 do artigo 37.º do Código do IVA.

XIX. Acresce ainda que o mesmo argumento viola o princípio da responsabilidade solidária do adquirente previsto no nº 1 do artigo 79º do Código do IVA.

XX. Este princípio determina a responsabilidade solidária do adquirente "...quando a factura ou documento equivalente, cuja emissão seja obrigatória nos termos do artigo 29.º, não tenha sido passada, contenha uma indicação inexacta quanto ao nome ou endereço das partes intervenientes, à natureza ou à quantidade dos bens transmitidos ou serviços fornecidos, no preço ou no montante de imposto devido”.

XXI. Esta responsabilidade só se encontra limitada pela prova, a efectuar pelo adquirente, do pagamento do imposto que se mostre devido, e pelo montante correspondente ao pagamento efectuado ao transmitente do bem.

XXII. O artigo 79.º do Código do IVA não prevê, como fundamento de dispensa da responsabilidade solidária o decurso do prazo para a dedução do IVA por parte do adquirente.

XXIII. É assim, errada, a conclusão o Acórdão Recorrido, quando conclui que "... o sujeito passivo adquirente dos bens só pode ser obrigado ao seu pagamento se as facturas ou documentos equivalentes forem emitidas a tempo de lhe permitir exercer a respectiva dedução ou pedido de reembolso, pois só assim poderá ser assegurado o funcionamento do imposto de forma neutral."

XXIV. Pelo contrário, torna-se claro que a obrigação de repercutir o Imposto (pelo sujeito passivo, ora Recorrente), por um lado, e a obrigação de pagar o Imposto (pelo adquirente, ora Recorrido), por outro, não cediam pelo facto do adquirente se encontrar (eventualmente) impedido de deduzir o imposto que lhe era repercutido.

XXV. Acresce ainda que o Acórdão Recorrido incorre em erro na distinção entre facturas e documentos equivalentes e documentos rectificativos de factura e, consequentemente, incorre em erro na interpretação do artigo 36º do Código do IVA.

Factura ou, à data dos factos, documento equivalente, é o documento através do qual se titula a transmissão de bens ou prestação de serviços e que poderia ser consubstanciado num documento com a designação de "Factura", "Venda a Dinheiro", "Recibo", etc...

XXVI. Documento rectificativo de factura é qualquer documento que se destine a proceder à correcção para mais ou para menos de uma factura inicialmente emitida, e que podia consistir numa nota de débito, nota de crédito, aviso de lançamento, nota ou guia de devolução, ou qualquer outro documento do qual se retirasse a intenção das partes em proceder à correcção de uma factura original;

XXVIII. Ora, os requisitos apontados como estando em falta – os requisitos previstos no número 5 do artigo 36.º do Código do IVA – são requisitos das facturas ou
documentos equivalentes e não requisitos dos documentos rectificativos das facturas;

XXVII. Com efeito, à data dos factos, o Código do IVA e o referido artigo 36.º não impunha quaisquer requisitos aos documentos rectificativos de factura, com excepção dos documentos que titulasse a devolução de mercadoria;

XXVIII. Só com a alteração introduzida no número 6 do artigo 36.º do Código do IVA, pelo DL n.º 197/2012, de 24 de Agosto, é que os documentos rectificativos de facturas que não envolvessem o transporte dos bens [As notas e guias de devolução passaram a estar expressamente referidos no código do IVA] e, ainda assim, apenas sujeitos às obrigações de além da data e numeração sequencial, a identificação das partes, bem como a referência à factura a que respeitam e as menções desta que são objecto de alterações.

XXXI. Estes requisitos têm sido ainda mais flexibilizados pela própria Autoridade Tributária, que no âmbito da doutrina administrativa citada nas alegações passou a dispensar a indicação das próprias facturas a corrigir, desde que seja referido apenas o período temporal das facturas corrigidas;

XXXII. Assim, a posição da AT reflectida na informação vinculativa junta pela Recorrente e subscrita pela Directora de Serviços do IVA foi posteriormente (tacitamente) revogada pelo Ofício Circulado n.º 30141/2013, emitido pelo Subdiretor-geral do IVA (superior hierárquico da Directora de Serviços do IVA) e pela Ficha Doutrinária referente ao processo n.º 4766, emitido pelo mesmo Subdiretor-geral do IVA-ambos os documentos referidos previamente;

XXXIII. Esta posição está em linha, aliás, com a posição que o Tribunal de Justiça da União Europeia tem vindo a fazer sobre os elementos necessários nas facturas;

XXXIV. Acresce ainda que o mesmo tipo de documento "Aviso de Lançamento", emitido pela Recorrente a outro cliente, tendo por base a mesma necessidade de repercutir IVA mal liquidado inicialmente, foi escrutinado pela AT no âmbito de um pedido de reembolso, tendo a AT aceite o referido documento como válido e suficiente para repercutir IVA (pelo alienante) e permitir a dedução e reembolso suportado pela adquirente.

XXXV. Por tudo, os avisos de lançamento cujas cópias se encontram juntas ao processo entre as fls. 114 e 371 dos autos cumpriam os requisitos formais acima identificados e não podiam servir de fundamento para legitimar a recorrida a recusar o pagamento.

XXXVI. Assim, torna-se claro que o acórdão recorrido, ao sustentar a sentença de primeira instância, incorreu em erro na interpretação do artigo 36º do CIVA, impondo-se também quanto a esta questão, o que desde já se requer, a revogação do acórdão recorrido e a sua substituição por outra decisão que condene a recorrida no pagamento reclamado pela recorrente.»


A ré contra-alegou, sustentado a insusceptibilidade de revista excepcional e a improcedência do recurso. Concluiu assim, também apenas no que interessa ao mérito do recurso:


IX. É legítimo à Recorrida recusar o pagamento adicional de IVA que lhe estava a ser cobrado, em consequência de um erro da Recorrente;

X. Não há, na Sentença recorrida, qualquer erro de julgamento quanto à interpretação do vertido no número 1 do artigo 37.º e/ou número 1 do artigo 79.º, ambos do Código do IVA.

XI. Não há violação do princípio da solidariedade, o qual a Recorrente aqui tenta distorcer e aplicar,

XII. Bem como não há uma interpretação errada do art. 36º do Código do IVA, relativamente à desconformidade dos "Avisos de Lançamento" para efeitos de dedução ou reembolso do imposto liquidado.

XIII. É a Recorrente quem viola, ou quer violar, a essência do IVA enquanto imposto neutral, pretendendo fazer recair sobre a Recorrida, que em nada contribuiu para o erro da Recorrente, o custo do valor adicional de IVA.

XIV. A Recorrente, incumpridora das obrigações fiscais que são impostas em função da sua actividade, obrigada a responder perante a Autoridade Tributária, pretende agora fazer recair sobre a Recorrida os custos desse erro.

XV. O erro da Recorrente, repercutido na Recorrida, representará para esta um custo real, face à impossibilidade legal de dedução do imposto, limitada aos quatro anos contados desde a data do facto que lhe deu origem.

XVI. "Analisando o CIVA vemos que a disposição legal que consagra o dever de repercutir o imposto não prevê expressamente qualquer limitação temporal para o exercício deste dever, no entanto, acompanhando neste particular o parecer do Mestre Rogério Ferreira, o mecanismo de transferência económica de carga tributária foi concebido para ser exercido em consonância com os prazos de dedução legalmente consagrados, caso contrário, diremos nós, o princípio da neutralidade fiscal do IVA para os operadores económicos seria desvirtuado.

        Ora, em nosso entender, não obstante existir obrigação de repercutir o imposto, o sujeito passivo adquirente dos bens só pode ser obrigado ao seu pagamento se as facturas ou documentos equivalentes forem emitidos a tempo de lhe permitir exercer a respectiva dedução ou pedido de reembolso, pois só assim poderá ser assegurado o funcionamento do imposto deforma neutral."

XVII. Decidiu bem, o Tribunal Recorrido ao entender não estar a Recorrida obrigada ao pagamento do IVA adicional – originado em erro imputável unicamente à Recorrente –, em virtude de àquela não ser já legalmente possível a dedução ou reembolso do mesmo,

XVIII. Ficando ela em posição equivalente à de um consumidor final, suportando o imposto como custo e desvirtuando toda a natureza e lógica do princípio da neutralidade aplicado ao sujeito passivo de boa fá na cadeia económica.

XIX. Não houve violação da obrigação do sujeito passivo na repercussão do imposto, contrariamente ao alegado pelo Recorrente.

XX. A própria ratio do IVA impõe que o documento a entregar ao adquirente, a fim deste o poder lançar para efeitos de dedução ou reembolso, cumpra os requisitos formais e temporais para o efeito, sob pena de ficar vazio de fundamento e desvirtuado na sua natureza.

XXI. Não há violação do princípio da solidariedade a que alude o número 1 do artigo 79.º do Código do IVA.

XXII. A Recorrente incumpriu os seus deveres de liquidação do imposto devido perante a Autoridade Tributária, e respondeu perante ela, sendo unicamente àquela que foi exigido o imposto adicional.

XXIII. A solidariedade prevista apenas aproveita à Administração Tributária;

XXIV. A Recorrida, de boa-fé e com as suas obrigações fiscais liquidadas perante a Recorrente e a Administração Tributária, fica desobrigada de qualquer solidariedade no pagamento.

XXV. Tal normativo legal vem "Impor ao adquirente, ele próprio sujeito passivo, e como tal conhecedor da disciplina legal, que controle a correcção da factura emitida pelo seu fornecedor não parece exigência desproporcionada.

XXVI. Estabelece-se, no entanto, que, salvo o caso de má-fé, a provar, evidentemente, pela Administração, o adquirente seja liberto da responsabilidade solidária pelo pagamento previsto neste artigo desde que prove ter pago o imposto ao seu fornecedor.

XXVII. Cumpriu a Recorrida as suas obrigações de fiscalização advenientes do normativo legal em apreço, manifestando as suas reservas quanto aos documentos de cobrança apresentados e solicitando parecer vinculativo à Administração Tributária.

XXVIII. O adquirente liquidou o imposto que lhe foi cobrado aquando da transacção económica realizada, não reconhecendo obrigação no pagamento do IVA adicional face ao parecer vinculativo emitido pela Administração Tributária que veio corroborar as suas suspeitas de incumprimento, por parte da Recorrente, nos formalismos dos "Avisos de Lançamento" emitidos para efeitos daquela cobrança.

XXIX. A Recorrida tinha informação da Autoridade Tributária, vinculativa para esta, concluindo que os avisos de lançamento em causa não observavam as disposições do artigo 36.º do Código do IVA.

XXX. Independentemente do dever de repercussão da Recorrente, é legítimo à Recorrida recusar o pagamento do IVA adicional que lhe é exigido.

XXXI. Não obstante a Recorrida ter tido conhecimento, em tempo, das reservas da Recorrida quanto à validade dos documentos- "Avisos de Lançamento" – para efeitos de dedução e/ou reembolso de imposto, não agiu em conformidade por forma a corrigi-los, sendo que já não o pode fazer para esse efeito, dado o lapso de tempo decorrido.

XXXII. "[...} a exigência da observância desses requisitos nas facturas tem como objectivo permitir à Administração Tributária o controlo da situação tributária, e não apenas obter prova dos factos a controlar, motivo pelo qual as facturas, emitidas de acordo com os termos da lei, constituem formalidade insusceptível de substituição por qualquer outro meio de prova. As formalidades exigidas pelo art. 35.º, n.º 5 do CIVA são formalidades "ad substantiam" cujo incumprimento acarreta a invalidade destes documentos/A

XXXIII. Em sede de resposta ao pedido de informação vinculativa, pronunciou-se a Administração Tributária, por referência aos "Avisos de Lançamento" emitidos pela Recorrida, que tais documentos não observam as disposições do artigo 36.º do Código do IVA, não sendo legítima a repercussão do IVA pretendida.

XXXIV. Decidiu bem o Tribunal Recorrido, ao entender que os "Avisos de Lançamento" em causa não preenchem os requisitos do artigo 36.º do Código do IVA e, por isso, não são susceptíveis de fazer repercutir o imposto através deles reclamado.

XXXV. É legítimo à Recorrida recusar o pagamento do IVA adicional, por não se basear em documento válido.

XXXVI. Tendo em conta o lapso de tempo decorrido, não obstante a invalidade do documento, à Recorrida já não era possível deduzir ou requerer o reembolso da quantia exigida a título de IVA adicional.

XXXVII. O erro na emissão dos documentos – "Avisos de Lançamento" –, apenas é imputável à Recorrente, que, apesar das reservas manifestadas pela Recorrida e do pedido de informação vinculativa, insistiu em não proceder à sua alteração/correcção nos termos legalmente exigidos.

XXXVIII. A decisão do Tribunal Recorrido determina a previsão legal que se ajusta aos factos provados, determina a norma a aplicar ao caso concreto, procedendo à sua correta interpretação, fixando o seu sentido e extensão, e faz a aplicação da norma ao caso concreto, determinando o efeito jurídico que, segundo a norma, se deve atribuir à situação litigiosa.

3. Vêm provados os seguintes factos:

1. No exercício da sua actividade, no período compreendido entre Fevereiro de 2008 e Maio de 2010, a Autora vendeu à Ré granulado de borracha no valor global de €664.538,77, cobrando o IVA à taxa reduzida (ponto 1 do requerimento injuntivo).

2. A Autora, no ano de 2011, foi alvo de uma inspecção tributária aos exercícios de 2008, 2009 e 2010, no que diz respeito exclusivamente apenas a IVA, tendo a Autoridade Tributária concluído que a Autora deveria ter liquidado IVA à taxa normal, em vez da taxa reduzida de 5%, na venda de granulado de borracha (facto expressamente acordado em audiência).

3. Na sequência da referida inspecção, a Autoridade Tributária liquidou adicionalmente IVA, correspondente à diferença entre a taxa reduzida e a taxa normal, no período de Fevereiro de 2008 a Junho de 2010 (facto expressamente acordado em audiência).

4. A Autora procedeu ao pagamento de todas as liquidações de IVA acima referidas cujo valor no que respeita à Ré ascende a € 100.906,50 (facto expressamente acordado em audiência).

5. Posteriormente a uma reunião havida entre as partes no dia 20 de Abril de 2012, a Autora procedeu ao envio à Ré, primeiro de um aviso de lançamento único de fls. 66 a 71, e depois, em 23 de Outubro de 2012, enviou à Ré que a recebeu, em 24/10/ 2012, a carta de fls. 72 e 79 contendo em anexo avisos de lançamento cujas cópias estão juntas a fls. 114 a 372 dos autos (facto expressamente acordado em audiência e facto instrumental - a data de recepção da carta de fls. 72 a 79 -resultante da discussão da causa).

6. A Ré devolveu à Autora o Io Aviso de lançamento enviado no valor de €100.916,50, através da carta de 06 de Setembro de 2012 junta a fls. 74 e 75 (facto expressamente acordado em audiência).

7. A Ré não pagou à Autora a quantia de €100.916,50 correspondente aos avisos de lançamento referidos (facto expressamente acordado em audiência).

8. A Ré é sujeito passivo de IVA e encontra-se enquadrada no regime normal com periodicidade mensal, não sendo, tal como a Autora, consumidora final dos produtos vendidos pela Autora (arts. 16° e 17° da réplica e facto instrumental resultante da discussão da causa).

9.     Em data posterior ao recebimento dos avisos de lançamento de fls. 114 a 372 dos autos, e anterior a 12 de Dezembro de 2012, a Ré solicitou à Autoridade Tributária um pedido de informação vinculativo pretendendo que fosse esclarecido, além de mais, se a serem legítimos os débitos de IVA, os mesmos beneficiariam de despacho favorável do respectivo reembolso, pedido cuja cópia consta de fls. 96 e 97 e se dá por inteiramente reproduzido (art. 33° da réplica).

10. As dúvidas da Ré e o pedido de informação vinculativo foram dados a conhecer à Autora por meio de carta junta a fls. 82 a 86, recebida pela Autora em 12 de Dezembro de 2012 e que se dá por integralmente reproduzida (art. 33° da réplica)

11. Em resposta a tal pedido, a Autoridade Tributária emitiu a informação que consta de fls. 98 e 99 e se dá por inteiramente reproduzida (facto instrumental resultante da discussão da causa).

4. Tendo em conta as conclusões das alegações de recurso, estão em causa as seguintes questões, erradamente julgadas, segundo a recorrente:

“impossibilidade de repercutir IVA a adquirentes que, pelo decurso do prazo, se encontrem impossibilitados de deduzir o mesmo imposto”, e as subsequentes questões da “violação da obrigação da recorrente de proceder à repercussão do  IVA na  esfera da adquirente e ora Recorrida, prevista no número 1 do artigo 37.º do Código do IVA” e da “violação do princípio da responsabilidade solidária do adquirente, previsto no número 1 do artigo 79.º do Código do IVA;

– saber se “os Avisos de lançamento” são ou não “ conformes com o artigo 36.º do Código do IVA, erro na interpretação do referido artigo e, nomeadamente,   dos requisitos que os documentos rectificativos de factura devem conter”.


5. Tendo em conta o objecto do recurso, assim delimitado, decidiu-se suspender a instância, a fim de colocar ao Tribunal de Justiça da União Europeia as seguintes questões prejudiciais, nos termos do disposto no artigo 267º, b), do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (despacho de fls. 661):


«1ª: Saber se a Directiva 2006/11/CE, e em particular os seus artigos 63º, 167º, 168º, 178º, 179º, 180º, 182º e 219º, bem como o princípio da neutralidade, se opõem a uma legislação da qual resulte que, numa situação em que o alienante dos bens, sujeito passivo de IVA, foi sujeito a uma inspecção tributária da qual resultou que a taxa de IVA que oportunamente aplicara era inferior à devida, pagou ao Estado o acréscimo de imposto e pretende obter o respectivo pagamento do adquirente, também sujeito passivo de IVA, o prazo para este último poder proceder à dedução desse acréscimo se conta a partir da emissão das facturas iniciais e não da emissão ou da recepção dos documentos rectificativos;

 2ª: Concluindo-se que não se verifica essa oposição, suscita-se então a dúvida de saber se a mesma Directiva e, em particular, os mesmos artigos e o princípio da neutralidade se opõem a uma legislação da qual decorra que, recebidos documentos rectificativos das facturas iniciais, emitidos na sequência da inspecção tributária e do pagamento ao Estado do acréscimo de imposto, e destinados a obter o pagamento desse acréscimo, num momento em que o referido prazo para o exercício do direito de dedução já decorreu, é ou não legítimo ao adquirente recusar o pagamento, assim entendendo que a impossibilidade de dedução do acréscimo de imposto justifica a recusa de repercussão.»

      Justificou-se este pedido nestes termos, que se transcrevem do despacho de fls. 661:

  «5. Segundo o disposto no nº 2 do artigo 98º CIVA, “o direito à dedução (…) só pode ser exercido até ao decurso de quatro anos após o nascimento do direito à dedução (…).

O direito à dedução constitui-se quando o imposto dedutível se torna exigível, o que ocorre, sendo obrigatória a emissão de facturas, como é o caso, quando esta emissão se verifica, ou quando termina o respectivo prazo (artigos 22º, nº 1, 7º, nº 1, a) e 8º, nº 1, a) e b), 29º, nº 1, b) e 36º, nº 1 do CIVA, na redacção aplicável), sabendo-se que “só confere direito a dedução o imposto mencionado (…) em facturas e documentos equivalentes passados na forma legal” (nº 2, al. a) do artigo 19º do CIVA, na redacção aplicável).

Havendo lugar a rectificações, devem ser emitidas as correspondentes facturas “ou documento equivalente” (nº 7 do artigo 29º CIVA, na redacção aplicável, “documento rectificativo de factura” na redacção posterior).

Quer as partes, quer as instâncias, entenderam que destas disposições do CIVA resulta que o prazo de 4 anos para o exercício do direito de dedução do acréscimo de imposto, exigido na sequência da inspecção tributária, se conta a partir do momento inicial em que o imposto se tornou exigível. Ou seja: a partir da data da emissão das facturas iniciais, com a liquidação de imposto à taxa de 5%, em vez dos 21% que a Administração Fiscal veio a considerar devidos, liquidando a diferença, paga pela autora. Consideraram pois irrelevante, para o efeito, a data da emissão ou da recepção dos documentos rectificativos (avisos de lançamento), com os quais a autora pretendeu repercutir a diferença de imposto, que a ré se recusa a pagar.

Daí concluíram as instâncias que, relativamente aos avisos de lançamento recebidos pela ré mais de 4 anos depois de emitidas as facturas iniciais, a autora não poderia repercutir sobre a ré os montantes correspondentes à diferença, porque a ré já não tinha o direito de proceder à dedução desses montantes, sendo certo que o erro na taxa aplicada era imputável à autora. Confrontado com a alegação de que esta solução contrariava “o princípio da neutralidade do IVA de que o IVA se destina a ser suportado pelo consumidor final”, o Tribunal da Relação teve “por evidente que deve ceder a norma que obriga à repercussão, sob pena de serem desvirtuados os princípios referidos” (acórdão, pág. 5).

6. Como o TJUE tem observado uniformemente e em inúmeras decisões, o mecanismo da dedução desempenha uma função essencial na construção do sistema comum do IVA e na efectivação do princípio da neutralidade, tal como se encontra actualmente desenhado pela Directiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de Novembro de 2006, relativa ao sistema comum de imposto sobre o valor acrescentado (DIVA); ao que acresce que a DIVA não define qualquer prazo para o exercício do direito de dedução.

  No entanto, o TJUE já se pronunciou no sentido de que a DIVA não se opõe a que os direitos nacionais fixem um prazo para o exercício do direito de dedução, desde que sejam respeitados o princípio da equivalência e da efectividade (cf., a título de exemplo, os acórdãos de 12/7/2012, proc. C-284/11, EMS‑Bulgaria Transport OOD contra Direktor na Direktsia «Obzhalvane i upravlenie na izpalnenieto» Plovdiv, ou de 28/7/2016, proc. C-332/15, Giuseppe Astone contra Procura della Repubblica, nos quais se salienta a exigência de que o prazo não torne “excessivamente difícil ou impossível, na prática”, o exercício do direito de dedução (acórdão de 12/7/2012).

  No caso presente, o que está em causa é o início da contagem do prazo nas condições já descritas; e esse prazo, assim contado, interessa especificamente para saber se a ré pode recusar a repercussão que a autora pretende fazer, quanto ao acréscimo de IVA ou, no contexto desta acção, recusar o pagamento do acréscimo de imposto que deveria ter sido liquidado e repercutido no preço dos bens vendidos.

  Suscita-se assim a dúvida de saber se os artigos 63º, 167º, 168º, 178º, 179º, 180º e 182º da DIVA, bem como o princípio da neutralidade, se opõem a uma legislação da qual resulte que, numa situação em que o alienante dos bens, sujeito passivo de IVA, foi sujeito a uma inspecção tributária da qual resultou que a taxa de IVA que oportunamente aplicara era inferior à devida, pagou o acréscimo de imposto e pretende obter o respectivo pagamento do adquirente, também sujeito passivo de IVA, o prazo para este último deduzir esse acréscimo se conte a partir da emissão das facturas iniciais e não da emissão ou da recepção dos documentos rectificativos.

  A verdade é que, contado o prazo desde a emissão das facturas iniciais e permitindo a repercussão, torna-se impossível à ré o exercício do direito de dedução, pelo menos parcialmente, uma vez que vários dos documentos rectificativos respeitam a operações realizadas mais de 4 anos antes da data da recepção dos correspondentes avisos rectificativos; sendo certo que o erro que levou à rectificação foi cometido pela autora.

  Concluindo-se que não se verifica aquela oposição, suscita-se então a dúvida de saber se os mesmos artigos da DIVA e o mesmo princípio da neutralidade se opõem a uma legislação da qual decorra que, recebidos documentos rectificativos das facturas iniciais, emitidos na sequência da inspecção tributária e do pagamento ao Estado do acréscimo de imposto, e destinados a obter o pagamento desse acréscimo, num momento em que o referido prazo para o exercício do direito de dedução já decorreu, é ou não legítimo ao adquirente recusar o pagamento, assim entendendo que vale para a repercussão do imposto o prazo legalmente fixado para o exercício do direito de dedução.

  6. Contrariamente ao que vem decidido, entende-se que as deficiências formais apontadas pelas instâncias aos documentos rectificativos recebidos pela ré em 24 de Outubro de 2012, e que, no entender, quer da sentença, quer do acórdão recorrido, impedem que sirvam de base à dedução do IVA, não obstam à procedência da presente acção; por esta razão, é imprescindível saber se ocorreu ou não a caducidade do direito da ré de proceder à dedução do acréscimo de IVA pago pela autora e se, a ter ocorrido, a ré pode legitimamente recusar-se a pagar à autora o que esta pede na acção – pelo menos, no que respeita ao IVA respeitante às operações anteriores a 24 de Outubro de 2008, relativamente às quais teria operado a caducidade por terem decorrido os 4 anos previstos da lei.

  Na verdade, nesta acção estão em causa operações anteriores e operações posteriores a 24 de Outubro de 2008.

  Ou seja: a procedência ou improcedência desta acção, pelo menos parcial, depende do sentido da resolução das questões cuja apreciação se solicita ao Tribunal de Justiça da União Europeia.

  7. As partes foram notificadas da intenção de proceder ao reenvio, pelo despacho de fls. 649, que identificou as questões a colocar ao TJUE.

  Apenas se pronunciou a autora, que sugeriu que se acrescentassem duas questões, ambas relativas ao preenchimento dos requisitos necessários para que os avisos de lançamento emitidos pela autora e recebidos pela ré em 24/10/2012 possam servir de base à dedução do imposto.

  Não se acrescentam pela razão já acima apontada.

  8. Para além da sentença e do acórdão da Relação de … proferidos neste processo, não se conhece jurisprudência portuguesa que responda às questões aqui colocadas. Recorda-se, mais uma vez, que agora não está em causa a questão de saber se os avisos de lançamento recebidos pela ré em 24/10/2012 preenchem ou não os requisitos formais para servir de base à dedução.

  Também se não encontrou jurisprudência do TJUE que desse resposta inequívoca às questões de interpretação da DIVA que aqui se colocam, sendo que o Supremo Tribunal de Justiça é a última instância interna de recurso, na acepção do artigo 267º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE).»

Este despacho não foi objecto de reclamação para a conferência (cfr. artigo 652º, nº 3 e 679º do Código de Processo Civil), tendo, portanto, transitado em julgado.

6. Pelo acórdão de 12 de Abril de 2018, proc. C-8/17 e junto a fls. 773, o Tribunal de Justiça da União Europeia deliberou o seguinte:

“ Os artigos 63º, 167º, 168º, 178º a 180º, 182º e 219º da Diretiva 2006/112/Código das Expropriações do Conselho, de 28 de Novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, bem como o princípio da neutralidade fiscal, devem ser interpretados no sentido de que se opõem à legislação de um Estado-Membro nos termos da qual, em circunstâncias como as que estão em causa no processo principal, nas quais, na sequência de uma liquidação adicional, um acréscimo de imposto sobre o valor acrescentado (IVA) foi pago ao Estado e foi objecto de documentos rectificativos das faturas iniciais vários anos após a entrega dos bens em causa, o benefício do direito à dedução do IVA é recusado com o fundamento de que o prazo previsto na referida legislação para o exercício deste direito se conta a partir da data de emissão das faturas iniciais e expirou”.

Assim respondendo à questão colocada em primeiro lugar, o TJUE considerou não haver que responder à segunda questão.

Em breve síntese, o TJUE recordou que, “segundo jurisprudência constante” do Tribunal, da qual salientou o acórdão de 21 de Março de 2018, proc. C-533/16, Volkswagen / Direcção de Finanças da República Eslovaca (posterior ao pedido formulado por este Supremo Tribunal, mas incidente sobre uma questão semelhante), o direito de dedução “constitui um princípio fundamental do sistema comum do IVA instituído pela legislação da União”, sistema esse que “garante (…) a neutralidade quanto à carga fiscal de todas as actividades económicas, quaisquer que sejam os objectivos ou os resultados dessas actividades, desde que elas próprias estejam, em princípio, sujeitas a IVA”; que, embora, por princípio, não possa “ser limitado”, o direito de dedução está “sujeito ao respeito de requisitos ou condições, tanto substantivos como formais” (artigos 168º, a), 178º, a), 220º a 236º e 238º a 240º da Directiva IVA); que não é incompatível com o regime definido pela Directiva IVA a definição de um prazo preclusivo para o exercício do direito de dedução, desde que estejam respeitados os princípios da equivalência e da efectividade (artigos 167º, 178º, 179º, 180º e 182º, 273º; que, no caso, “a BB ficou objectivamente impossibilitada de exercer o seu direito à dedução antes da regularização do IVA efectuada pela AA, não tendo previamente tido acesso a documentos rectificativos das faturas iniciais nem sabido que era devido um acréscimo de IVA”; que foi só no seguimento dessa regularização que ficaram reunidas as condições substantivas e formais que dão direito à dedução do IVA e que a BB podia, assim, pedir a desoneração do encargo do IVA devido ou pago em conformidade com a Directiva IVA e com o princípio da neutralidade fiscal. Consequentemente, não tendo a BB dado provas de falta de diligência antes da receção dos avisos de lançamento e visto não haver abuso ou conluio fraudulento com a AA, não se podia validamente opor ao exercício do direito à dedução do IVA um prazo que tenha começado a correr na data da emissão das faturas iniciais e que, em relação a algumas operações, tenha expirado antes desta regularização (v. neste sentido, acórdão de 21 de Março de 2018 Volkswagen, C-533/16, EU:C:2018:204, º 50)”.

Cumpre portanto julgar o recurso tendo em conta a decisão do TJUE.

7. Antes de mais, cabe recordar que estamos perante uma acção cível que decorre entre as partes de um contrato , na qual não se encontra qualquer prova de existência de “práticas fraudulentas e de evasão fiscal” (cfr. ponto 41 do acórdão TJUE, quando se refere às observações apresentadas no processo pelo Governo português). E recordar, ainda, que ambas as instâncias consideraram, na fundamentação das respectivas decisões, que estava em causa um erro da autora AA, não se justificando que as consequências desse erro – pagamento à autora de quantias insusceptíveis de dedução, por ter passado o prazo para a efectuar – fossem suportadas, não pela autora, que lhes deu causa, mas pela ré. É todavia de supor que, como se diz nas referidas observações, a autora e a ré, na sua actividade comercial, tenham beneficiado da errada liquidação do IVA à taxa reduzida, uma vez que, como todos sabemos, a repercussão do IVA efectua-se acrescentando a respectiva liquidação ao valor da factura (artigo 37º Código IVA).

No entanto, nem recorrente, nem recorrida colocam qualquer questão respeitante à validade ou subsistência desse contrato, que caiba resolver.

8. É pois necessário determinar se, quando em 24 de Outubro de 2012 recebeu a carta do dia anterior, acompanhada “dos avisos de lançamento cujas cópias estão juntas a fls. 114 a 372” (cfr. ponto 5. dos factos provados), a ré podia recusar o pagamento do acréscimo de IVA, com o fundamento de que já não conseguia efectuar a correspondente dedução, no que respeita às aquisições de bens anteriores a 24 de Outubro de 2008, por ter decorrido o prazo de 4 anos previsto no nº 2 do artigo 98º do CIVA, “por motivo totalmente imputável à autora”; assim se decidiu na 1ª Instância e na Relação, como se viu já.

Ora, independentemente de saber, por agora, se os avisos de lançamentos em causa preenchiam os requisitos formais para servirem de base à dedução do acréscimo de imposto, a verdade é que não pode entender-se que o prazo de caducidade do direito de dedução correspondente tenha começado a correr em momento anterior à recepção dos avisos, ou seja, antes de 24 de Outubro de 2012.

Como se escreveu no despacho de fls. 661, segundo o disposto no nº 2 do artigo 98º CIVA, “o direito à dedução (…) só pode ser exercido até ao decurso de quatro anos após o nascimento do direito à dedução (…). O direito à dedução constitui-se quando o imposto dedutível se torna exigível, o que ocorre, como princípio, quando os bens transmitidos são colocados à disposição do adquirente (al. a) do nº 1 do artigo 7º do Código IVA); todavia, e como se disse no referido despacho, sendo obrigatória a emissão de facturas, como é o caso, “o direito à dedução nasce” (nº 1 do artigo 22º do Código IVA) quando aquela emissão se verifica, ou quando termina o respectivo prazo (artigos 22º, nº 1, 7º, nº 1, a) e 8º, nº 1, a) e b), 29º, nº 1, b) e 36º, nº 1 do CIVA, na redacção aplicável), sabendo-se que “só confere direito a dedução o imposto mencionado (…) em facturas e documentos equivalentes passados na forma legal” (nº 2, al. a) do artigo 19º do CIVA, na redacção aplicável). Havendo lugar a rectificações, devem ser emitidas as correspondentes facturas “ou documento equivalente” (nº 7 do artigo 29º CIVA, na redacção aplicável, “documento rectificativo de factura” na redacção posterior).”

Contar esse prazo a partir de um momento anterior àquele em que a autora dispunha das condições formais para exercer o direito de dedução do acréscimo do imposto, determinado por uma liquidação adicional, eventualmente (como seria o caso, em parte) inviabilizando esse exercício, contrariaria “os artigos 63º, 167º, 168º, 178º a 180º, 182º e 219º da Directiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de Novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, bem como o princípio da neutralidade fiscal” (acórdão TJUE de 12 de Abril de 2018, de fls. 775), como se decidiu no acórdão TJUE proferido neste processo e pelas razões nele indicadas.

No caso, o prazo de 4 anos para a dedução do acréscimo que está em causa só começou a contar em 24 de Outubro de 2012. Improcede, por isso, o motivo substancial que levou as instâncias a julgar a acção improcedente.

9. E improcede igualmente o motivo de natureza formal, como decorre do que se disse já na decisão de fls. 661.

Analisando os avisos de lançamento e as facturas juntas a fls. 114 a 372, ambas as instâncias entenderam que os avisos de lançamento “não contêm em si, nem por remissão (…) os elementos legais necessários que caracterizam a factura, não se mostrando, nessa medida, preenchida a condição formal para o direito de dedução do imposto” – artigos 29º, nº 7 e 36º, nº 5, vigentes à data da respectiva emissão; não podem, por isso, por si mesmos, ser havidos como “documentos equivalentes” a facturas (nº 7 do citado artigo 29º). Concretamente, “são datados, numerados sequencialmente e contêm os nomes, firmas ou denominações sociais e a sede ou domicílio do fornecedor de bens ou prestador de serviços e do destinatário ou adquirente, bem como o número de identificação fiscal da Ré. Porém, naquilo que parece ser a descrição da operação pode ler-se de forma idêntica nos avisos de lançamento, variando apenas o mês e ano a que respeitam: «valor de vossa conta referente ao valor adicional de IVA do período de Fevereiro de 2008 decorrentes de correcções efectuadas pela administração fiscal (operação não sujeita a IVA)», após o que aparecem enumerados numa coluna números de facturas (sendo que em alguns avisos esta coluna não é sequer precedida da menção ‘factura’ (…), seguindo-se uma coluna com uma correspondência de valores, com a designação ‘débito’. Os ditos avisos não contêm a quantidade a denominação usual dos bens transmitidos, a taxa aplicada e a taxa devida, e nem contêm, relativamente a cada factura indicada, o respectivo preço líquido de imposto, e nem a data em que os bens foram colocados à disposição do adquirente ou a respectiva data de emissão”. É certo que estes dados omissos constam das facturas juntas a cada um dos avisos, todavia não há nos avisos de lançamento qualquer menção de que dos mesmos fazem parte as facturas correspondentes ou que estas lhe estejam anexas (…), donde, julgamos que as mesmas não podem considerar-se incluídas ou incorporadas em tais avisos” (sentença).

Foi por faltar essa menção expressa, ou a expressa afirmação de que tais facturas se consideram parte integrante dos avisos, que as instâncias consideraram que os avisos de lançamento de fls. 114 e segs. não podiam considerar-se “factura ou documento equivalente”, no sentido do nº 7 do artigo 29º do Código do IVA, na redacção vigente à data da respectiva emissão.

Considera-se que, para poderem ser havidos como documentos equivalentes a facturas e portanto, aptos a servir de base à dedução, os documentos que venham corrigir o montante de IVA a repercutir devem respeitar as exigências de conteúdo das facturas, por valerem para ambos as mesmas razões. Em especial, para o que agora interessa, devem fornecer as indicações constantes do nº 5 do artigo 36º CIVA em vigor à data da respectiva emissão (avisos de lançamento juntos a fls. 114 e segs.).

Trata-se, portanto, de saber se tais exigências se podem considerar cumpridas, no caso presente.

10. Não há qualquer dúvida quanto à razão de ser da exigência formal de facturas com certo conteúdo, para serem aptas a servir de base à dedução do IVA repercutido. Como escreve Sérgio Vasques, O Imposto sobre o Valor Acrescentado, Coimbra, 2015, pág. 182, as exigências formais explicam-se porque as facturas são “no sistema europeu do IVA (…), o elo com o qual se constrói a cadeia da liquidação-dedução e o mecanismo dos pagamentos fraccionados do imposto. O legislador presume, afinal, que o IVA mencionado em cada factura é repercutido para diante, até que o peso integral do imposto chegue ao consumidor final no circuito. E só porque o presume admite que o direito à dedução seja exercido com base na factura”.

Exige-se, assim, no artigo 178º da Directiva nº 2006/112/CE que, para servirem de base à dedução (178º), as facturas tenham o conteúdo definido nos artigos 226º e segs; a lista das indicações obrigatórias consta do artigo 226º, resultando do artigo 218º que os Estados membros não podem ser mais exigentes do que a Directiva, e do artigo 219º, que assimila a factura “qualquer documento (…) que altere a factura inicial e a ela faça referência específica e inequívoca” (Cfr. acórdão TJUE de 15 de Julho de 2010, proc. 368/09, Pannon Gép Centrum kft contra APEH:  “40. O artigo 226º da Directiva 2006/112 precisa que, sem prejuízo das disposições particulares desta directiva, só as referências citadas neste artigo devem constar obrigatoriamente, para efeitos de IVA, das facturas emitidas em aplicação do artigo 220º da referida directiva. 41 Daqui decorre que não é legítimo aos Estados-Membros associar o exercício do direito à dedução do IVA ao preenchimento de pressupostos relativos ao conteúdo das facturas que não estão expressamente previstos nas disposições da Directiva 2006/112.

É facilmente compreensível o significativo grau de exigência quanto ao conteúdo das facturas, tendo em conta a respectiva função. Todavia, e como também refere Sérgio Vasques, op. cit., pág. 341, o TJUE, “reiterando embora a função da factura como suporte do direito à dedução, em correspondência com o artigo 178º da Directiva, tem permitido que sobre este requisito de forma prevaleça a substância das operações, sempre que isso se mostre necessário para garantir a neutralidade do IVA e não coloque risco demasiado”.

Tem plena aplicação ao caso presente a orientação adoptada no acórdão TJUE de 28 de Julho de 2016, proc. C-332/15, Giuseppe Astone: “45. Assim, segundo jurisprudência constante, o princípio fundamental da neutralidade do IVA exige que a dedução deste imposto pago a montante seja concedida se as exigências materiais forem observadas, mesmo que os sujeitos passivos tenham negligenciado certas exigências formais (acórdãos de 12 de julho de 2012, EMS‑Bulgaria Transport, C‑284/11, EU:C:2012:458, n.° 62 e jurisprudência referida, e de 9 de julho de 2015, Salomie e Oltean, C‑183/14, EU:C:2015:454, n.° 58 e jurisprudência referida).46. No entanto, pode assim não suceder se a violação dessas exigências formais tiver por efeito impedir a prova certa de que as exigências materiais foram observadas (acórdãos de 12 de julho de 2012, EMS‑Bulgaria Transport, C‑284/11, EU:C:2012:458, n.° 71, e de 11 de dezembro de 2014, Idexx Laboratories Italia, C‑590/13, EU:C:2014:2429, n.° 39 e jurisprudência referida)”.

No caso presente, verifica-se que os avisos de lançamento enviados à autora em 23 de Outubro de 2012 e por esta recebidos no dia seguinte (ponto 5. dos factos provado) referem expressamente os nºs das facturas a que respeitam, e que estão juntas. Não pode assim considerar-se que não há uma remissão expressa para essas facturas, das quais constam as indicações em falta nos avisos considerados em si mesmos, como verificaram as instâncias; nem que ocorra qualquer violação formal que impeça a verificação dos pressupostos materiais do direito à dedução (citado acórdão TJUE de 28 de Julho de 2016, proc. C-332/15).

Deve assim entender-se que os avisos de lançamento são documentos equivalentes às facturas, para o efeito do nº 7 do artigo 29º do Código IVA e, portanto, são formalmente aptos a servir de base à dedução do acréscimo de imposto. Aliás, porque a referência às facturas é expressa, entende-se que outra solução não seria conforme, nem com o artigo 219º da Directiva 2006/112/CE, nem com a orientação definida no acórdão TJUE de 15 de Julho de 2010, proc. 368/09.

11. Aqui chegados, torna-se inútil apreciar as questões suscitadas pela recorrente, no que toca à alegação de violação da obrigação de repercussão ou do princípio da responsabilidade solidária.

Resta acrescentar que, tendo recebido os avisos de lançamento em 24 de Outubro de 2012, a ré constitui-se em mora desde essa data. Cabe-lhe assim o pagamento nos correspondentes juros de mora vencidos à data da apresentação do requerimento de injunção, € 1.517,89, e vincendos, calculados à taxa legal própria dos juros comerciais comerciais.

12. Nestes termos, concede-se provimento à revista e condena-se a ré BB - Pavimentos, S.A. a pagar à autora AA - Indústria de Reciclagem, S.A., a quantia de € 102.434,49, acrescida de juros sobre a quantia de € 100.916,50, calculados à taxa de juros comerciais, desde a data da apresentação do requerimento de injunção até efectivo e integral pagamento.

Custas pela recorrida.

Lisboa, 05 de Julho de 2018

Maria dos Prazeres Pizarro Beleza (Relatora)

Salazar Casanova

Távora Victor