Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
031708
Nº Convencional: JSTJ00004288
Relator: H DIAS FREIRE
Descritores: PROCESSO PENAL
RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO
IMPOSTO DE JUSTIÇA
FIXAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Nº do Documento: SJ196702220317083
Data do Acordão: 02/22/1967
Votação: UNANIMIDADE
Referência de Publicação: DG IS 1967/03/17, PÁG. 236 - BMJ Nº 164, ANO 1967, PÁG. 181 - REV. LEG. JUR. ANO100
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PARA O PLENO
Decisão: TIRADO ASSENTO.
Indicações Eventuais: ASSENTO DO STJ.
Área Temática: DIR TRIB - DIR CUSTAS JUD.
Legislação Nacional: CPP29 ARTIGO 156 ARTIGO 663 ARTIGO 668 PARUNICO.
CPC61 ARTIGO 447 ARTIGO 456 ARTIGO 677 N1 ARTIGO 763 ARTIGO 766 N3 ARTIGO 767 N2.
CPC39 ARTIGO 447 A B ARTIGO 449 ARTIGO 456.
CCJ62 ARTIGO 171 N1 ARTIGO 183 N3 ARTIGO 188.
CCJ40 ARTIGO 150.
DL 44329 DE 1962/05/08.
Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃO STJ DE 1964/10/14 IN BMJ N140 PAG319.
ACÓRDÃO STJ DE 1963/05/29 IN BMJ N127 PAG275.
Sumário :
Em processo penal não e devido imposto de justiça pelo reu, quando, em recurso interposto pelo Ministerio Publico por imperativo legal, e confirmada a decisão condenatoria.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, em Tribunal Pleno:

O representante do Ministerio Publico recorre para o Tribunal Pleno do acordão de 14 de Outubro de 1964, junto por fotocopia a folhas 3-10, mas ja publicado no Boletim do Ministerio da Justiça, n. 140, paginas
319 e seguintes.
Alega que esse acordão esta em oposição, sobre a mesma questão de direito, com o de 29 de Maio de 1963, transitado em julgado e publicado no mesmo Boletim, n. 127, paginas 275 e seguintes, visto que:
O acordão recorrido decidiu que, em processo penal, o reu esta isento de imposto de justiça no caso de recurso obrigatorio interposto pelo Ministerio Publico, com confirmação da decisão recorrida.
Contrariamente, o acordão de 1963, decidiu, em caso igual, que o reu deve pagar imposto de justiça.
A secção criminal mandou seguir o recurso, de harmonia com o disposto nos artigos 668 e seu paragrafo unico do Codigo de Processo Penal e 763 e seguintes do Codigo de Processo Civil.
O recorrente apresentou a alegação junta a folhas 23 e seguintes, satisfazendo assim o estabelecido no n. 2 do artigo 767 daquele ultimo diploma.
Nela desenvolve doutas considerações tendentes a fundamentar um assento nos seguintes termos:
"E devido imposto de justiça pelo reu, quando em recurso interposto pelo Ministerio Publico por imperativo legal, e confirmada a decisão condenatoria".
Obtidos os vistos legais cumpre decidir.
Tudo visto e ponderado.
I - O acordão da secção criminal que reconheceu existir a oposição que serve de fundamento ao recurso não impede que o Tribunal Pleno decida em sentido contrario (artigo 766, n. 3, do Codigo de Processo Civil).
Apresenta-se-nos, porem, indubitavel que nada de recurso podera aduzir-se em favor da inviabilidade do recurso.
Na verdade:
Os dois acordãos em causa foram lavrados no dominio da mesma legislação.
O de 29 de Maio de 1963, transitado em julgado, decidiu que nos recursos obrigatorios do Ministerio Publico, ainda que a decisão recorrida, com que o reu se conformou, seja confirmada, tem o reu de suportar o imposto de justiça graduado no artigo 188 do Codigo das Custas Judiciais.
O de 14 de Outubro de 1964 - o recorrido -, em caso igual, decidiu que o reu esta isento de imposto de justiça.
Assim, temos de reconhecer, sem necessidade de outras considerações, que existe um conflito de jurisprudencia que devemos resolver.
II - Os principios fundamentais relativos a responsabilidade por custas, em processo civil, resultam das normas dos artigos 447 e seguintes do Codigo de Processo Civil.
Aquele artigo 447 enuncia com nitidez: a) O principio da causalidade, segundo o qual paga as custas quem a elas houver dado causa, devendo entender-se que lhes da causa "a parte vencida, na proporção em que o for"; b) O principio - relativo aos casos em que normalmente não ha vencimento da acção -, por virtude do qual paga as custas quem tira proveito do processo (inventario, divisão de coisa comum e processos especiais semelhantes).
Em desdobramento do principio da causalidade, o artigo 449 indica que "da causa a acção o autor sempre que o reu a ela não der causa e a não conteste" - (nota 2 a paginas 194 do n. 122 do Boletim do Ministerio da Justiça).
Em anotação ao artigo 456 do Codigo de Processo Civil de 1939 que, no fundamental, não era diferente do actual artigo 447, o Professor Alberto dos Reis, prevendo os casos de recurso, escreveu:
"O acordão da Relação ou do Supremo que julga um recurso ha-de condenar em custas a parte vencida, isto e, o recorrido se o recurso obteve provimento, o recorrente se a decisão recorrida foi confirmada.
Pouco importa que o recorrido não tenha acompanhado o recurso, isto e, não tenha sustentado a legalidade da decisão impugnada pelo recorrente; desde que tem a posição de parte vencida, ha-de suportar as custas do recurso" - (volume 2, pagina 203).
III - O Codigo de Processo Penal, sem formular principios basilares, não deixou de estabelecer, como regra, que o reu, no caso de condenação, pagara ao Estadoimposto de justiça (artigo 156).
Esta regra tem sido absorvida e desenvolvida por sucessivos diplomas relativos a regulamentação da tributação nos processos judiciais: Tabelas das Custas, artigo 20; Codigo das Custas Judiciais de 1940, artigos 150 e seguintes; actual Codigo das Custas Judiciais, artigos 171 e seguintes.
IV - Ora o artigo 171 do actual Codigo dispõe no seu n. 1:
"O reu pagara o imposto de justiça fixado pelo tribunal no caso de ser condenado na primeira instancia, decair total ou parcialmente em recurso ou ficar vencido em incidente que requeira ou a que faça oposição".
Ha aqui, sem duvida, uma enumeração que envolve a previsão de tres casos: a) O de o reu ser condenado em primeira instancia; b) O de o reu decair total ou parcialmente em recurso; c) O de o reu ficar vencido em incidente que requeira ou a que faça oposição.
O primeiro caso, que ja teve evidente dominio no Codigo de Processo Penal (citado artigo 156), contem, no fundo, a aplicação do principio da causalidade a um processo que o Estado impõe ou consente que se organize para exercer o o direito publico de punir.
Definido, pela condenação em primeira instancia, que o reu deu causa a acção penal, incumbe-lhe pagar imposto de justiça.
Mas, para alem da condenação em primeira instancia, a actividade judicial so continuara em caso de recurso. E então a lei determina - segundo caso previsto no citado artigo 171 -, em claro desdobramento do mesmo principio da causalidade, que passe a funcionar o principio da sucumbencia: o reu pagara imposto se decair e na medida em que decair.
Decai, ninguem o contesta, supomos, a parte que provoca uma actividade injustificada, a parte que sai vencida da sua controversia com a outra parte.
Assim, o reu, se e recorrente, decai na medida em que veja negado provimento parcial ou total ao seu recurso; se e recorrido, decai na medida em que o recorrente obtem provimento.
Se ha provimento que afecte os seus interesses, o reu fica necessariamente na posição de vencido e então bem se compreende e facilmente se justifica que suporte o encargo do imposto estabelecido para o recurso. E assim, ainda que "não tenha sustentado a legalidade da decisão impugnada pelo recorrente" (aplicação da doutrina de Alberto dos Reis).
Trata-se de uma aplicação do principio da causalidade como que fundido como o da sucumbencia por uma relação incindivel.
V - O recurso obrigatorio, seja qual for a sua fundamentação doutrinaria, ha-de sempre integrar-se no conceito legal de recurso: meio de impugnar as decisões judiciais (artigo 677, n. 1, do Codigo de Processo Civil).
Por isso, ainda que o recorrente concorde com a decisão recorrida, a propria imposição legal do recurso contem em si, implicita, a aceitação do elemento que caracteriza todos os recursos: a impugnação.
De outro modo não parece facil encontrar razoavel explicação para a inevitavel possibilidade de alterar a decisão recorrida.
Quer dizer: do julgamento do recurso obrigatorio ha-de necessariamente resultar, tal como dos recursos voluntarios, um vencedor e um vencido, qualificados atraves do principio da sucumbencia. E assim, a) O recorrente sera vencedor se vir modificada a decisão em prejuizo do reu, caso em que este fica necessariamente na posição de vencido e, portanto, constituido na obrigação de pagar imposto de justiça; b) O reu (não recorrente) sera vencedor - se vir confirmada a decisão que ele não impugnou e antes aceitou - apesar de condenado, absteve-se do livre exercicio do direito de recorrer -, ou se a vir alterada em termos que lhe sejam favoraveis; em qualquer destes casos não pagara imposto de justiça visto que não decaiu.
Interpretando deste modo, na parte que aqui interessa, o varias vezes citado artigo 171, respeitam-se os principios fundamentais da materia em causa e evitam-se "situações tributarias injustas" satisfazendo os expressos intuitos do legislador do actual Codigo das Custas Judiciais (relatorio do Decreto-Lei n. 44329, de 8 de Maio de 1962).
VI - As isenções tributarias quando não constituem privilegios em beneficio de certas pessoas ou entidades, são excepções a regras.
Por isso e uma vez que dispomos de uma regra de tributação em imposto de justiça aplicavel ao caso em apreço, so temnos que averiguar se ha alguma isenção que contenha qualquer desvio aquela regra
Ora temos por seguro que nenhum desvio pode justificar-se com base em qualquer das isenções estabelecidas no artigo 183 do citado Codigo das Custas Judiciais podendo sublinhar-se que no seu n. 3, ao regulamentar-se a tributação dos não recorrentes no caso previsto no artigo 663 do Codigo de Processo Penal, não foi esquecido o dominante principio da sucumbencia.
VII - Nestes termos, decidem confirmar o acordão recorrido e lavrar o seguinte assento:
"Em processo penal não e devido imposto de justiça pelo reu, quando, em recurso interposto pelo Ministerio Publico por imperativo legal, e confirmada a decisão condenatoria".
Sem imposto de justiça.

Lisboa, 22 de Fevereiro de 1967

H. Dias Freire (Relator) - Lopes Cardoso - Fernando Bernardes de Miranda - Gonçalves Pereira - Albuquerque Rocha - Oliveira Carvalho - Torre Paulo - Ludovico da Costa - Francisco Soares - Adriano Vera Jardim J.
Santos Carvalho Junior - Joaquim de Melo - Eduardo Correia Guedes - Antonio Teixeira de Andrade - Jose Cabral Ribeiro de Almeida.