Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
329/08.0TAEVR.S1
Nº Convencional: 3ª SECÇÃO
Relator: PIRES DA GRAÇA
Descritores: PENA
CULPA
FINS DAS PENAS
PREVENÇÃO GERAL
PREVENÇÃO ESPECIAL
MEDIDA CONCRETA DA PENA
ABUSO SEXUAL DE CRIANÇAS
Data do Acordão: 05/24/2011
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Sumário : I -Todos estão hoje de acordo em que é susceptível de revista a correcção do procedimento ou das operações de determinação, o desconhecimento pelo tribunal ou a errónea aplicação dos princípios gerais de determinação, a falta de indicação de factores relevantes para aquela, ou, pelo contrário, a indicação de factores que devam considerar-se irrelevantes ou inadmissíveis. Não falta, todavia, quem sustente que a valoração judicial das questões de justiça ou de oportunidade estariam subtraídas ao controlo do tribunal de revista, enquanto outros distinguem: a questão do limite ou da moldura da culpa estaria plenamente sujeita a revista, assim como a forma de actuação dos fins das penas no quadro da prevenção, mas já não a determinação, dentro daqueles parâmetros, do quantum exacto de pena, para controlo do qual o recurso de revista seria inadequado. Só não será assim, e aquela medida será controlável mesmo em revista, se, v.g., tiverem sido violadas regras da experiência ou se a quantificação se revelar de todo desproporcionada – vide Figueiredo Dias, Direito Penal Português – As consequências Jurídicas do Crime, Aequitas, Editorial Notícias, 1993, § 278, p. 211, e Ac. do STJ de 15-11-2006, Proc. n.º 2555/06 - 3ª.
II - A aplicação de penas e de medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade – art. 40.º, n.º 1, do C.P. O art. 71.º do CP estabelece o critério da determinação da medida concreta da pena, dispondo que a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção.
III - As penas como instrumentos de prevenção geral são instrumentos político-criminais destinados a actuar (psiquicamente) sobre a globalidade dos membros da comunidade, afastando-os da prática de crimes através das ameaças penais estatuídas pela lei, da realidade da aplicação judicial das penas e da efectividade da sua execução, surgindo então a prevenção geral positiva ou de integração como forma de que o Estado se serve para manter e reforçar a confiança da comunidade na validade e na força da vigência das suas normas de tutela de bens jurídicos e, assim, no ordenamento jurídico-penal; como instrumento por excelência destinado a revelar perante a comunidade a inquebrantabilidade da ordem jurídica, pese todas as suas violações que tenham tido lugar (idem, Figueiredo Dias, pág. 84).
IV -Todavia, em caso algum pode haver pena sem culpa ou acima da culpa, pois que o princípio da culpa, como salienta o mesmo Insigne Professor, “ não vai buscar o seu fundamento axiológico a uma qualquer concepção retributiva da pena, antes sim ao princípio da inviolabilidade da dignidade pessoal. A culpa é condição necessária, mas não suficiente, da aplicação da pena; e é precisamente esta circunstância que permite uma correcta incidência da ideia de prevenção especial positiva ou de socialização.”
V -A verdadeira função da culpa no sistema punitivo reside efectivamente numa incondicional proibição de excesso; a culpa não é fundamento de pena, mas constitui o seu limite inultrapassável: o limite inultrapassável de todas e quaisquer considerações ou exigências preventivas – sejam de prevenção geral positiva de integração ou antes negativa de intimidação, sejam de prevenção especial positiva de socialização ou antes negativa de segurança ou de neutralização. A função da culpa, deste modo inscrita na vertente liberal do Estado de Direito, é por outras palavras, a de estabelecer o máximo de pena ainda compatível com as exigências de preservação da dignidade da pessoa e de garantia do livre desenvolvimento da sua personalidade nos quadros próprios de um Estado de direito democrático.
VI - O ponto de partida das finalidades das penas com referência à tutela necessária dos bens jurídicos reclamada pelo caso concreto e com significado prospectivo, encontra-se nas exigências da prevenção geral positiva ou de integração, em que a finalidade primária da pena é o restabelecimento da paz jurídica comunitária posta em causa pelo comportamento criminal.
VII - Por outro lado, como salienta o mesmo Distinto Professor, a pena também tem uma função de prevenção geral negativa ou de intimidação, como forma estadualmente acolhida de intimidação das outras pessoas pelo mal que com ela se faz sofrer ao delinquente e que, ao fim, as conduzirá a não cometerem factos criminais. Porém, “não constitui todavia por si mesma uma finalidade autónoma de pena apenas podendo” surgir como um efeito lateral (porventura desejável) da necessidade de tutela dos bens jurídicos.” (ibidem, pág.118)
VIII - Mas, em termos jurídico-constitucionais, é a ideia de prevenção geral positiva ou de integração que dá corpo ao princípio da necessidade de pena.
IX - A moldura de prevenção, comporta ainda abaixo do ponto óptimo ideal outros em que a pressuposta tutela dos bens jurídicos “é ainda efectiva e consistente e onde portanto a pena pode ainda situar-se sem que perca a sua função primordial de tutela de bens jurídicos. Até se alcançar um limiar mínimo – chamado de defesa do ordenamento jurídico – abaixo do qual já não é comunitariamente suportável a fixação da pena sem se pôr irremediavelmente em causa a sua função tutelar de bens jurídicos.” (idem, ibidem, pág. 117)
X - O ponto de chegada está nas exigências de prevenção especial, nomeadamente da prevenção especial positiva ou de socialização, ou, porventura a prevenção negativa relevando de advertência individual ou de segurança ou inocuização, sendo que a função negativa da prevenção especial, se assume por excelência no âmbito das medidas de segurança.
XI - As circunstâncias e critérios do art. 71.º do CP devem contribuir tanto para co-determinar a medida adequada à finalidade de prevenção geral (a natureza e o grau de ilicitude do facto impõe maior ou menor conteúdo de prevenção geral, conforme tenham provocado maior ou menor sentimento comunitário de afectação dos valores), como para definir o nível e a premência das exigências de prevenção especial (as circunstâncias pessoais do agente, a idade, a confissão, o arrependimento), ao mesmo tempo que também transmitem indicações externas e objectivas para apreciar e avaliar a culpa do agente.
XII - As imposições de prevenção geral devem, pois, ser determinantes na fixação da medida das penas, em função de reafirmação da validade das normas e dos valores que protegem, para fortalecer as bases da coesão comunitária e para aquietação dos sentimentos afectados na perturbação difusa dos pressupostos em que assenta a normalidade da vivência do quotidiano.
XIII - Porém tais valores determinantes têm de ser coordenados, em concordância prática, com outras exigências, quer de prevenção especial de reincidência, quer para confrontar alguma responsabilidade comunitária no reencaminhamento para o direito do agente do facto, reintroduzindo o sentimento de pertença na vivência social e no respeito pela essencialidade dos valores afectados.
XIV - Ante a matéria dada por provada, da qual ressalta que o ilícito global é composto por 2 crimes contra a autodeterminação sexual de menor, sendo que um consistiu em coito anal que produziu ao menor «laceração do ânus» e «tonicidade do esfíncter diminuída»; o outro, em carícias na «região das nádegas e pénis, roçando com o seu pénis erecto pala zona das nádegas e ânus do menor; a idade e a qualidade da vítima – 7 anos, sobrinho do arguido; que este sabia que as práticas sexuais que levou a cabo na pessoa do menor, eram susceptíveis de causar prejuízo ao desenvolvimento harmonioso deste, do ponto de vista social, afectivo, psicológico e sexual, causando-lhe medo e perturbação, conforme sucedeu, não se coibindo, mesmo assim o arguido de levar a cabo tais condutas; ao agir da forma descrita, fê-lo sempre com propósitos lascivos de satisfação de impulsos libidinosos, bem sabendo que o fazia contra a vontade do menor e que atentava contra a livre disposição do corpo por parte deste, sabendo igualmente qual era a idade deste, e que o mesmo não tinha, por conseguinte, idade para entender e se determinar livremente para a prática de actos sexuais daquela natureza e bem assim que após ter saído de cumprimento de pena por factos do mesmo jaez, o arguido foi acolhido pela irmã, mãe do menor, na casa desta, a quem proclamou «que não faria mal a mais ninguém», não deixando de, pouco tempo depois, abusar sexualmente do seu sobrinho, afigura-se adequada e proporcional a pena de 10 anos de prisão.
Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça

      

No processo comum n.º 329/08.0TAEVR, no Círculo Judicial de Évora, foi julgado pelo Tribunal Colectivo, o arguido AA, filho de BB e de CC, natural da freguesia de …, concelho de Benavente, nascido em …, solteiro, mecânico, residente na Rua …, n.º ..., sendo-lhe imputados, em autoria material, na forma consumada, em concurso efectivo e sob reincidência:

-Um crime e abuso sexual de crianças, previsto e punível pelo n.º 2 do art.º 171.º, agravado pela reincidência, ao abrigo das previsões do art.º 75.º, n.º 1 e do art.º 76.º, n.º 1 do Código Penal;

-Um crime de abuso sexual crianças, previsto e punível pelo n.º 1 do art.º 171.º, agravado pela reincidência, ao abrigo das previsões do art.º 75.º, n.º 1 e do art.º 76.º, n.º 1 do Código Penal.

Realizada a audiência de julgamento, aquele tribunal, em 21 de Fevereiro de 2011, acordou:

“1) Em condenar o arguido AA, pela prática, em autoria material, na forma consumada, em concurso efectivo e sob reincidência de:

-Um crime abuso sexual crianças, previsto e punível pelo n.º 2 do art.º 171.º, agravado pela reincidência, ao abrigo das previsões do art.º 75.º, n.º 1 e do art.º 76.º, n.º 1 do Código Penal, na pena de oito anos de prisão.

1) Um crime abuso sexual crianças, previsto e punível pelo n.º 1 do art.º 171.º, agravado pela reincidência, ao abrigo das previsões do art.º 75.º, n.º 1 e do art.º 76.º, n.º 1 do Código Penal, na pena de três anos de prisão.

2) Fixar, em cúmulo jurídico, a pena unitária de dez anos de prisão.

3) Condena-se o arguido a pagar as custas crime do processo, fixando-se a taxa de justiça em duas UCs. (arts. 513.º e 514.º do C. P. Penal).

            Notifique e registe.”

            Inconformado, recorreu o arguido para o Tribunal da Relação de Évora apresentando as seguintes conclusões na motivação de recurso:

            a- O crime foi praticado em 2007, há três anos.

b- Dado o lapso de tempo decorrido a exigência de prevenção prevista no artº 71º nº 1 do CP acaba por perder um pouco o sentido.

c- Não foi devidamente valorada a confissão do arguido e o seu arrependimento.

d- Ao longo de quase um ano que está sob vigilância electrónica o arguido tem mostrado que acata as obrigações impostas pele justiça.  

e-Pelo que, a pena aplicada ao arguido, pelo menos no crime p.p. pelo artigo 171º nº 2 do CP, foi porque próxima do seu limite máximo, muito exagerada.

f-Assim, deverá a pena do arguido ser reduzida.

Com tanto, e com o douto suprimento de V. Exª, se pede e espera que se faça a costumada JUSTiÇA!

            Respondeu o Ministério Público à motivação de recurso, concluindo:

            - São fortes as necessidades de prevenção especial, de relevo as expectativas dos cidadãos na força e vigor da lei penal para prevenir casos similares ao que acresce a não menos essencial pedagogia da pena sobre a futura conduta do arguido.

Assim, mantendo no essencial o teor da douta decisão recorrida farão V.as Ex.as a costumada Justiça!

            Neste Supremo, o Dig.mo Procurador-Geral Adjunto emitiu douto Parecer, onde refere:

“O ilícito global é composto por dois crimes contra a autodeterminação sexual de menor. Um consistiu em coito anal que produziu ao menor «laceração do ânus» e «tonicidade do esfíncter diminuída»; o outro, em carícias na «região das nádegas e pénis, tendo roçado com o seu pénis erecto pala zona das nádegas e ânus do menor.»

A vítima, então com 7 anos de idade, é sobrinho do arguido.

Cremos, por outro lado, ser de valorizar negativamente a personalidade do arguido e sua projecção nos crimes praticados.

Acolhido pela irmã, a quem proclamou «que não faria mal a mais ninguém», não deixou de, pouco tempo depois, abusar sexualmente do seu sobrinho, revelando particular perigosidade, com dificuldades em controlar as suas compulsões.

Deve-se, também, sublinhar que se trata de reincidente por actos da mesma natureza.

Em suma, nada mais se nos oferecendo acrescentar ao que a instância destacou na fundamentação (fis. 571 e 572), e sendo desnecessário reiterar as exigências de prevenção, geral e especial, que o caso recomenda, apenas nos resta concluir que a pena fixada é justa, cumprindo os critérios legais que a determinam.”

            Cumpriu-se o disposto no artº 417º nº 2 do CPP.




            Não tendo sido requerida audiência, seguiu o processo para conferência, após os vistos legais.

            Consta do acórdão recorrido:

 “FUNDAMENTAÇÃO

A) DE FACTO

Realizada a audiência de julgamento, resultaram provados os seguintes factos:

Quanto à culpabilidade:

1.º Em data não concretamente apurada, mas ocorrida entre 1 de Fevereiro de 2007 e o verão desse ano, o arguido pediu à sua irmã DD para ir viver com ela, pois não tinha onde viver, dizendo que não faria mal a mais ninguém.

            2.º Ao tempo, o agregado familiar de DD tinha a seguinte composição:

-EE, unido de facto, desde meados de 1991, com a irmã do arguido;

            -A irmã do arguido, DD;

            -FF, de 12 anos de idade, sobrinho do arguido;

            -GG, de 7 anos de idade, sobrinho do arguido;

            -HH, de 5 anos de idade, sobrinha do arguido.

3.º DD teve pena do irmão e acedeu ao pedido deste, tendo o arguido AA ido habitar para a Travessa …, na localidade de …, concelho de Évora, onde, ao tempo, DD e a sua família viviam.

4.º Em data não concretamente apurada, mas ocorrida próxima do verão do ano de 2007, durante a noite, dentro da habitação acima referida, AA introduziu-se no quarto onde o seu sobrinho GG dormia, e deitou-se de lado na cama deste, encostou-se ao corpo dele, ficando virado de frente para as costas do menor.

            5.º Seguidamente, o arguido baixou as cuecas que trazia vestidas, tendo também baixado as calças do pijama de GG, tendo-lhe acariciado o ânus, as nádegas e o pénis.

            6.º De seguida, o arguido AA colocou o seu próprio pénis, já erecto, entre as pernas de GG, e introduziu-o parcialmente no ânus deste, fazendo movimentos oscilatórios para a frente e para trás, o que causou dores a GG.

            7.º Como consequência directa e necessária da conduta do arguido, GG ficou com uma laceração no ânus, com cerca de um centímetro de comprimento por dois milímetros de largura, e com a tonicidade do esfíncter diminuída.

            8.º Passados uns dias, em data não concretamente apurada, o arguido AA voltou a deitar-se na cama de GG, encostou-se a ele, acariciou-lhe a região das nádegas e o pénis, tendo roçado com o seu pénis erecto pela zona das nádegas e ânus do menor.

            9.º Após ambas as condutas, o arguido disse ao menor GG que lhe batia, caso ele contasse a alguém o que tinha acontecido, o que atemorizou o menor, conforme o arguido bem sabia e quis.

10º O menor GG nasceu a 30-11-1999.

            11.º O arguido AA, ao agir da forma descrita, fê-lo sempre com propósitos lascivos de satisfação de impulsos libidinosos, bem sabendo que o fazia contra a vontade do menor e que atentava contra a livre disposição do corpo por parte deste.

            12º O arguido sabia igualmente qual era a idade do menor, e que o mesmo não tinha, por conseguinte, idade para entender e se determinar livremente para a prática de actos sexuais daquela natureza.

            13.º O arguido também sabia que as práticas sexuais que levou a cabo na pessoa do menor GG, eram susceptíveis de causar prejuízo ao desenvolvimento harmonioso deste, do ponto de vista social, afectivo, psicológico e sexual, causando-lhe medo e perturbação, conforme sucedeu, não se coibindo, mesmo assim o arguido de levar a cabo tais condutas.

            14º Por outro lado, por sentença exarada no processo a que coube o n.º 352/03.0GCBNV do 2.º Juízo do Tribunal Judicial de Benavente, transitada em julgado em 24 de Março de 2004, o arguido foi condenado na pena de prisão efectiva de 5 anos, pela prática de dois crimes de abuso sexual de criança, previstos e punidos pelo n.º 1 do art.º 172.º do Código Penal, na pessoa de menor com cerca de 7 anos de idade ao tempo dos factos, ocorridos no ano de 2002.

            15.º O arguido cumpriu tal pena de prisão, tendo sido restituído à liberdade, condicionalmente, em 1 de Fevereiro de 2007, após o cumprimento de mais de dois terços da pena aplicada.

            16.º Apesar de ter o arguido sido anteriormente condenado a pena de prisão, por abuso sexual de outra criança, essa sanção não o demoveu de praticar as referidas condutas, idênticas às anteriores, sobre o menor GG.

17.º O arguido agiu sempre deliberada e conscientemente, bem sabendo que lhe eram proibidas tais condutas.

 
            Quanto à determinação da sanção:

18 - Por outro lado, por sentença exarada no processo a que coube o n.º 352/03.0GCBNV do 2.º Juízo do Tribunal Judicial de Benavente, transitada em julgado em 24 de Março de 2004, o arguido foi condenado na pena de prisão efectiva de 5 anos, pela prática de dois crimes de abuso sexual de criança, previstos e punidos pelo n.º 1 do art.º 172.º do Código Penal, na pessoa de menor com cerca de 7 anos de idade ao tempo dos factos, ocorridos no ano de 2002.

            19 - O arguido cumpriu tal pena de prisão, tendo sido restituído à liberdade, condicionalmente, em 1 de Fevereiro de 2007, após o cumprimento de mais de dois terços da pena aplicada.

20 - O arguido tem como habilitações literárias o 4º ano de escolaridade.

21 – Vive com o pai em casa deste.

22 – Beneficia de uma reforma por invalidez no montante de € 207.

23 – Encontra-se sujeito a medida de coacção de obrigação de permanência na habitação, fiscalizada por vigilância electrónica.”

O que tudo visto

Inexistem vícios de que cumpra conhecer, nos termos do artigo 410º nºs 2  do CPP.

Os factos provados sob o nºs 14 e 15, encontram-se repetidos respectivamente nos nºs 18 e 19, sem que importe qualquer consequência na decisão da causa.

O recorrente não discute as ilicitudes por que foi condenado, nem a agravante da reincidência, que resultam da matéria fáctica provada, e insurge-se apenas contra a pena que considera muito exagerada, pelo menos no crime p.p. pelo artigo 171º nº 2 do CP, porque próxima do seu limite máximo e, pretende ver reduzida, porque o crime foi praticado em 2007, há três anos e dado o lapso de tempo decorrido a exigência de prevenção prevista no artº 71º nº 1 do CP acaba por perder um pouco o sentido.

Alega ainda que não foi devidamente valorada a confissão do arguido e o seu arrependimento e que ao longo de quase um ano que está sob vigilância electrónica o arguido tem mostrado que acata as obrigações impostas pele justiça.            

Todos estão hoje de acordo em que é susceptível de revista a correcção do procedimento ou das operações de determinação, o desconhecimento pelo tribunal ou a errónea aplicação dos princípios gerais de determinação, a falta de indicação de factores relevantes para aquela, ou, pelo contrário, a indicação de factores que devam considerar-se irrelevantes ou inadmissíveis. Não falta, todavia, quem sustente que a valoração judicial das questões de justiça ou de oportunidade estariam subtraídas ao controlo do tribunal de revista, enquanto outros distinguem: a questão do limite ou da moldura da culpa estaria plenamente sujeita a revista, assim como a forma de actuação dos fins das penas no quadro da prevenção, mas já não a determinação, dentro daqueles parâmetros, do quantum exacto de pena, para controlo do qual o recurso de revista seria inadequado. Só não será assim, e aquela medida  será controlável mesmo em revista, se, v.g., tiverem sido violadas regras da experiência ou se a quantificação se revelar de todo desproporcionada. ( Figueiredo Dias in Direito Penal Português -As consequências Jurídicas do Crime, Aequitas, Editorial Notícias, 1993, § 278, p. 211, e Ac. de 15-11-2006 deste Supremo, , Proc. n.º 2555/06- 3ª)

            A aplicação de penas e de medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade – artº 40º nº 1 do C.Penal.

            O artigo 71° do Código Penal estabelece o critério da determinação da medida concreta da pena, dispondo que a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção.

Na lição de Figueiredo Dias ( Direito Penal –Questões fundamentais – A doutrina geral do crime- Universidade de Coimbra – Faculdade de Direito, 1996, p. 121):

“1) Toda a pena serve finalidades exclusivas de prevenção, geral e especial. 2) A pena concreta é limitada, no seu máximo inultrapassável, pela medida da culpa. 3) dentro deste limite máximo ela é determinada no interior de uma moldura de prevenção geral de integração, cujo limite superior é oferecido pelo ponto óptimo de tutela dos bens jurídicos e cujo limite inferior é constituído pelas exigências mínimas de defesa do ordenamento jurídico. 4) Dentro desta moldura de prevenção geral de integração a medida da pena é encontrada em função de exigências de prevenção especial, em regra positiva ou de socialização, excepcionalmente negativa ou de intimidação ou segurança individuais.

            As penas como instrumentos de prevenção geral são “instrumentos político-criminais destinados a actuar (psiquicamente) sobre a globalidade dos membros da comunidade, afastando-os da prática de crimes através das ameaças penais estatuídas pela lei, da realidade da aplicação judicial das penas e da efectividade da sua execução”, surgindo então a prevenção geral positiva ou de integração “como forma de que o Estado se serve para manter e reforçar a confiança da comunidade na validade e na força da vigência das suas normas de tutela de bens jurídicos e, assim, no ordenamento jurídico-penal; como instrumento por excelência destinado a revelar perante a comunidade a inquebrantabilidade da ordem jurídica, pese todas as suas violações que tenham tido lugar (idem, ibidem, p. 84)

Todavia em caso algum pode haver pena sem culpa ou acima da culpa  (ultrapassar a medida da culpa), pois que o princípio da culpa, como salienta o mesmo Insigne Professor – in ob. cit. § 56 -, “não vai buscar o seu fundamento axiológico a uma qualquer concepção retributiva da pena, antes sim ao princípio da inviolabilidade da dignidade pessoal. A culpa é condição necessária, mas não suficiente, da aplicação da pena; e é precisamente esta circunstância que permite uma correcta incidência da ideia de prevenção especial positiva ou de socialização.”

Ou, e, em síntese: A verdadeira função da culpa no sistema punitivo reside efectivamente numa incondicional proibição de excesso; a culpa não é fundamento de pena, mas constitui o seu limite inultrapassável: o limite inultrapassável de todas e quaisquer considerações ou exigências preventivas – sejam de prevenção geral positiva de integração ou antes negativa de intimidação, sejam de prevenção especial positiva de socialização ou antes negativa de segurança ou de neutralização. A função da culpa, deste modo inscrita na vertente liberal do Estado de Direito, é por outras palavras, a de estabelecer o máximo de pena ainda compatível com as exigências de preservação da dignidade da pessoa e de garantia do livre desenvolvimento da sua personalidade nos quadros próprios de um Estado de Direito democrático. E a de, por esta via, constituir uma barreira intransponível ao intervencionismo punitivo estatal e um veto incondicional aos apetites abusivos que ele possa suscitar.- v. FIGUEIREDO DIAS, in Temas Básicos da Doutrina Penal, Coimbra Editora, 2001, p. 109 e ss.

O ponto de partida das finalidades das penas com referência à tutela necessária dos bens jurídicos reclamada pelo caso concreto e com significado prospectivo, encontra-se nas exigências da prevenção geral positiva ou de integração, em que a finalidade primária da pena é o restabelecimento da paz jurídica comunitária posta em causa pelo comportamento criminal.

Por outro lado, como salienta o mesmo Distinto Professor, a pena também tem uma função de prevenção geral negativa ou de intimidação, como forma estadualmente acolhida de intimidação das outras pessoas pelo mal que com ela se faz sofrer ao delinquente e que, ao fim, as conduzirá a não cometerem factos criminais. Porém, “não constitui todavia por si mesma uma finalidade autónoma de pena apenas podendo” surgir como um efeito lateral (porventura desejável) da necessidade de tutela dos bens jurídicos.” (ibidem, p. 118)

            Mas, em termos jurídico-constitucionais, é a ideia de prevenção geral positiva ou de integração que dá corpo ao princípio da necessidade de pena.

A moldura de prevenção, comporta ainda abaixo do ponto óptimo ideal outros em que a pressuposta tutela dos bens jurídicos “é ainda efectiva e consistente e onde portanto a pena pode ainda situar-se sem que perca a sua função primordial de tutela de bens jurídicos. Até se alcançar um limiar mínimo – chamado de defesa do ordenamento jurídico – abaixo do qual já não é comunitariamente suportável a fixação da pena sem se pôr irremediavelmente em causa a sua função tutelar de bens jurídicos.” (idem, ibidem, p. 117)

O ponto de chegada está nas exigências de prevenção especial, nomeadamente da prevenção especial positiva ou de socialização, ou, porventura a prevenção negativa  relevando de advertência individual ou de segurança ou inocuização, sendo que a função negativa da prevenção especial, se assume por excelência no âmbito das medidas de segurança.

Segundo o mesmo Ilustre Professor  –As Consequências Jurídicas do Crime, §55  “Só finalidades relativas de prevenção geral e especial, e não finalidades absolutas de retribuição e expiação, podem justificar a intervenção do sistema penal e conferir fundamento e sentido às suas reacções específicas. A prevenção geral assume, com isto, o primeiro lugar como finalidade da pena. Prevenção geral, porém, não como prevenção geral negativa, de intimidação do delinquente e de outros potenciais criminosos, mas como prevenção positiva ou de integração, isto é, de reforço da consciência jurídica comunitária e do seu sentimento de segurança face à violação da norma ocorrida: em suma, como estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias na validade e vigência da norma ‘infringida’”

As circunstâncias e critérios do art. 71.º do CP devem contribuir tanto para co-determinar a medida adequada à finalidade de prevenção geral (a natureza e o grau de ilicitude do facto impõe maior ou menor conteúdo de prevenção geral, conforme tenham provocado maior ou menor sentimento comunitário de afectação dos valores), como para definir o nível e a premência das exigências de prevenção especial (as circunstâncias pessoais do agente, a idade, a confissão, o arrependimento), ao mesmo tempo que também transmitem indicações externas e objectivas para apreciar e avaliar a culpa do agente.

As imposições de prevenção geral devem, pois, ser determinantes na fixação da medida das penas, em função de reafirmação da validade das normas e dos valores que protegem, para fortalecer as bases da coesão comunitária e para aquietação dos sentimentos afectados na perturbação difusa dos pressupostos em que assenta a normalidade da vivência do quotidiano.

Porém tais valores determinantes têm de ser coordenados, em concordância prática, com outras exigências, quer de prevenção especial de reincidência, quer para confrontar alguma responsabilidade comunitária no reencaminhamento para o direito do agente do facto, reintroduzindo o sentimento de pertença na vivência social e no respeito pela essencialidade dos valores afectados.

O n ° 2 do artigo 71º do Código Penal, estabelece, que:

Na determinação concreta da pena o tribunal atende a todas as circunstâncias que não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou, contra ele, considerando nomeadamente:

a) O grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente;

b) A intensidade do dolo ou da negligência:

c) Os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram;

d) As condições pessoais do agente e a sua situação

e) A conduta anterior ao facto e a posterior a este, especialmente quando esta seja destinada a reparar as consequências do crime;

f) A falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena.

            Considerou a decisão recorrida:

            “Ante a matéria dada por provada, da qual ressalta a tenra idade da ofendida, não restam dúvidas que o arguido praticou (artº 26º), com dolo directo (artº 14º, nº 1):

- Um crime abuso sexual crianças, previsto e punível pelo n.º 2 do art.º 171.º, agravado pela reincidência, ao abrigo das previsões do art.º 75.º, n.º 1 e do art.º 76.º, n.º 1 do Código Penal;

- Um crime abuso sexual crianças, previsto e punível pelo n.º 1 do art.º 171.º, agravado pela reincidência, ao abrigo das previsões do art.º 75.º, n.º 1 e do art.º 76.º, n.º 1 do Código Penal.

            A agravação pela reincidência justifica-se, ante a factualidade provada, pois tudo indica que a condenação anterior não serviu de advertência para que o arguido praticasse novos crimes da mesma natureza durante o período de liberdade condicional.

Não se apura qualquer causa de exclusão da ilicitude ou da culpa pelo que se impõe a determinação da pena a aplicar.

            A todo o crime corresponde uma reacção penal, pela qual a comunidade expressa o seu juízo de desvalor sobre os factos e a conduta realizada pelo arguido, partindo-se para o efeito do respectivo tipo legal.

O crime de abuso sexual previsto e punível pelo art. 171º, nº 1, do Código Penal, é punido com pena de um a oito anos de prisão.

O crime de abuso sexual previsto e punível pelo art. 171º, nº 2, do Código Penal, é punido com pena de três a dez anos de prisão.

Em caso de reincidência os limites mínimos das penas são elevados de um terço, permanecendo os limites máximos inalterados.

Atendendo ao disposto no artº 71º, a medida concreta da pena determina-se em função da culpa do agente – a censurabilidade pessoal do acto proibido realizado, perante alternativas de condutas não proibidas – tendo ainda em conta as exigências de prevenção.

Os fundamentos da medida da pena aplicada devem constar expressamente da sentença, assim o impondo os Art.º 205º, nº 1, da Constituição da República Portuguesa, 374º, nº 2, e 375º, nº 1, do Código de Processo Penal e 71º, n 3 do Código Penal.

Para graduar em concreto a pena, cumprirá observar o critério fornecido pelo nº 2 do artº 71º, ou seja, atender a "todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor do agente ou contra ele".

A exigência de as circunstâncias referidas, favoráveis ou desfavoráveis ao agente (atenuantes ou agravantes) não integrarem o tipo legal de crime, é corolário do facto de já haverem sido contempladas pelo legislador na determinação da moldura legal, em não o sendo assim, ofender-se-ia o princípio “ne bis in idem'", A. Robalo Cordeiro, Escolha e medida da pena, in Jornadas de Direito Criminal, CEJ, pág. 272.

Assim, é pela dimensão da culpa – que a pena não pode ultrapassar – que se vai determinar o limite superior da pena, como impõe o nº 2 do artº 40º.

Este trecho legal verte o princípio geral e fundamental de que o Direito Penal é estruturado com base na culpa do agente, comungando da defesa da dignidade da pessoa humana, com expressão constitucional.

Há que tomar em linha de conta, também, as exigências de prevenção geral que traçam uma moldura interior, a situar no limite da culpa.

E será dentro da moldura da prevenção geral que se fixará a pena a aplicar, considerando as necessidades de prevenção especial, isto é, atendendo às exigências de ressocialização e reintegração do agente.

Considerando, o grau de ilicitude da conduta do arguido - muito elevado -, estando em causa um bem jurídico com elevada protecção jurídica no nosso ordenamento, como sejam a liberdade sexual.

O dolo directo que imprimiu às suas conduta;

As consequências emocionais para o ofendido, que se viu limitado na sua liberdade;  

Este tipo de crimes pela sua natureza e repercussão social, causam grande alarme, tornando ponderosas as necessidades de prevenção geral.

No caso concreto, essas exigências são maiores, uma vez que o arguido, por força das medidas de coacção impostas nestes autos, tem permanecido em casa, em qualquer contacto com menores

A existência de antecedentes criminais;

A seu favor:

- Apenas a confissão.

Pelo exposto:

- fixa-se em três anos de prisão, a pena pelo crime de abuso sexual previsto e punível pelo art. 171º, nº1, do Código Penal.

- fixa-se em oito anos de prisão, a pena pelo crime de abuso sexual previsto e punível pelo art. 171º, nº 2, do Código Penal.

Operando o necessário cúmulo jurídico, atendendo ao limite mínimo de oito anos de prisão e ao limite máximo de onze anos de prisão, fixa-se a pena única de dez anos de prisão.”

            Tendo em conta:

A elevada gravidade dos factos, modo de execução e gravidade das consequências pois como salienta o Exm Magistrado do MPº Pº em seu douto Parecer:

“O ilícito global é composto por dois crimes contra a autodeterminação sexual de menor. Um consistiu em coito anal que produziu ao menor «laceração do ânus» e «tonicidade do esfíncter diminuída»; o outro, em carícias na «região das nádegas e pénis, tendo roçado com o seu pénis erecto pala zona das nádegas e ânus do menor.»

A vítima, então com 7 anos de idade, é sobrinho do arguido.”

            O arguido sabia que as práticas sexuais que levou a cabo na pessoa do menor GG, eram susceptíveis de causar prejuízo ao desenvolvimento harmonioso deste, do ponto de vista social, afectivo, psicológico e sexual, causando-lhe medo e perturbação, conforme sucedeu, não se coibindo, mesmo assim o arguido de levar a cabo tais condutas.           

A forte intensidade do dolo:

 -O arguido ao agir da forma descrita, fê-lo sempre com propósitos lascivos de satisfação de impulsos libidinosos, bem sabendo que o fazia contra a vontade do menor e que atentava contra a livre disposição do corpo por parte deste.

            O arguido sabia igualmente qual era a idade do menor, e que o mesmo não tinha, por conseguinte, idade para entender e se determinar livremente para a prática de actos sexuais daquela natureza.

O arguido agiu sempre deliberada e conscientemente, bem sabendo que lhe eram proibidas tais condutas.

Sentimentos manifestados e fins determinantes na prática dos crimes:

“Acolhido pela irmã, a quem proclamou «que não faria mal a mais ninguém», não deixou de, pouco tempo depois, abusar sexualmente do seu sobrinho, revelando particular perigosidade, com dificuldades em controlar as suas compulsões”, como salienta o Exmo Magistrado do MºPº

O arguido disse ao menor GG que lhe batia, caso ele contasse a alguém o que tinha acontecido, o que atemorizou o menor, conforme o arguido bem sabia e quis.

            A conduta anterior e posterior do arguido

            Por sentença exarada no processo a que coube o n.º 352/03.0GCBNV do 2.º Juízo do Tribunal Judicial de Benavente, transitada em julgado em 24 de Março de 2004, o arguido foi condenado na pena de prisão efectiva de 5 anos, pela prática de dois crimes de abuso sexual de criança, previstos e punidos pelo n.º 1 do art.º 172.º do Código Penal, na pessoa de menor com cerca de 7 anos de idade ao tempo dos factos, ocorridos no ano de 2002.

            O arguido cumpriu tal pena de prisão, tendo sido restituído à liberdade, condicionalmente, em 1 de Fevereiro de 2007, após o cumprimento de mais de dois terços da pena aplicada.

            A falta de preparação para manter conduta lícita:

Apesar de ter o arguido sido anteriormente condenado a pena de prisão, por abuso sexual de outra criança, essa sanção não o demoveu de praticar as referidas condutas, idênticas às anteriores, sobre o menor GG.

Não vem provado que existisse arrependimento, apesar de na motivção se dizer que confessou os factos integralmente e sem reservas

            São particularmente intensas as exigências de prevenção geral face à natureza e gravidade do bem jurídico violado, e à necessidade de dissuasão deste crime, bem como as exigências de prevenção especial, sendo o arguido já reincidente.

Assim, e tendo em conta o limite da culpa que se revela intensa, e, os limites das penas abstractamente aplicáveis aos diversos ilícitos verificados, e as penas parcelares concretamente aplicadas, conclui-se que estas não estão desadequadas aos ilícitos cometidos, ao grau de ilicitude, à intensidade da culpa, aos prejuízos provocados, não se mostrando pois desproporcionais.

            Quanto á pena conjunta   

O artigo 77º nº 1 do Código Penal, ao estabelecer as regras da punição do concurso, dispõe: “Quando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles é condenado numa única pena. Na medida da pena são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente.”

Não tendo o legislador nacional optado pelo sistema de acumulação material é forçoso concluir que com a fixação da pena conjunta pretende-se sancionar o agente, não só pelos factos individualmente considerados, mas também e especialmente pelo respectivo conjunto, não como mero somatório de factos criminosos, mas enquanto revelador da dimensão e gravidade global do comportamento delituoso do agente, visto que a lei manda se considere e pondere, em conjunto (e não unitariamente), os factos e a personalidade do agente, como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado ,- idem , ibidem, págs. 290-292),

Importante na determinação concreta da pena conjunta será, pois, a averiguação sobre se ocorre ou não ligação ou conexão entre os factos em concurso, a existência ou não de qualquer relação entre uns e outros, bem como a indagação da natureza ou tipo de relação entre os factos, sem esquecer o número, a natureza e gravidade dos crimes praticados e das penas aplicadas, tudo ponderando em conjunto com a personalidade do agente referenciada aos factos, tendo em vista a obtenção de uma visão unitária do conjunto dos factos, que permita aferir se o ilícito global é ou não produto de tendência criminosa do agente, bem como fixar a medida concreta da pena dentro da moldura penal do concurso. -

            Por outro lado, a pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, tendo no caso o limite mínimo de oito anos e o máximo de 11, anos de prisão,

Valorando o ilícito global perpetrado, de harmonia com o artº 77º nº 1 do C.Penal, a natureza e gravidade dos crimes, advindos de tendência criminosa do arguido, já reincidente, e a personalidade projectada e revelada pelos factos praticados e tendo em conta os efeitos previsíveis da pena aplicada no futuro comportamento da arguido, conclui-se que pena do cúmulo se afigura equilibrada, de harmonia com as regras legais, não sendo  desproporcionada, sendo pois, de manter

O recurso não merece provimento.

Termos em que, decidindo:

Acordam os deste Supremo – 3ª Secção º em negar provimento ao recurso, e confirmam o acórdão recorrido.

Tributam o recorrente em 6 Ucs de taxa de justiça

Supremo Tribunal de Justiça, 24 de Maio de 2011

                                  

Elaborado e revisto pelo relator

                                  

Pires da Graça (Relator)

Raul  Borges