Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
401/15.0T8BRG.G1.S1
Nº Convencional: 4ª. SECÇÃO
Relator: CHAMBEL MOURISCO
Descritores: FERIADO FACULTATIVO
TERÇA-FEIRA DE CARNAVAL
USOS DA EMPRESA
Data do Acordão: 03/09/2017
Votação: UNANIMIDADE COM * DEC VOT
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA
Área Temática:
DIREITO DO TRABALHO - DIREITO COLECTIVO ( DIREITO COLETIVO ) / INSTRUMENTOS DE REGULAMENTAÇÃO COLECTIVA ( INSTRUMENTOS DE REGULAMENTAÇÃO COLETIVA ) / CONVENÇÃO COLECTVA ( CONVENÇÃO COLETIVA ) / CONTRATO COLECTIVO ( CONTRATO COLETIVO ) / SUCESSÃO DE CONVENÇÕES / DIREITOS DOS TRABALHADORES.
Doutrina:
- Ernst Heissmann, «Betriebliche Ubung und Ruhegeldverpflichungen, Zum Urteil des Bundesfinanzhofes vom 12.1.1958», BB 1958, 633 e ss..
- Giulio Quadri, «Usi aziendali e autonomia negoziale, regole consuetudinaire e modificazioni unilateral nel rapporto di lavoro», Edizioni Scientifiche Italiane, Napoli, 2008, 125.
- Hugo Seiter, «Die Betriebsubung,Zugleich ein Beitrag zur Lehre vom Rechtsgeschaft und von den Zurechnungsgrunden rechtserheblichen Verhaltens im Privatrech», Verlag Handelsblatt GmBH, Dusseldorf, 78 e ss., citado pelo Professor Júlio Manuel Vieira Gomes.
- José Andrade Mesquita, Direito do Trabalho, 2.ª ed., Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa, 2004, 134.
- Júlio Manuel Vieira Gomes, «Dos usos da empresa em Direito do Trabalho», Revista de Direito e de Estudos Sociais, Ano XLIX, janeiro-dezembro de 2008, nº 1-4, Almedina, 104, 108, 109 (nota 29).
- Salvador da Costa, “Regulamento das Custas Processuais”, anotado e comentado, 2013, 5.ª Edição, Almedina, 158.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGO 637.º, N.º1.
CÓDIGO DE PROCESSO DO TRABALHO (CPT): - ARTIGOS 77.º, 81.º, N.º 1.
CÓDIGO DO TRABALHO (CT): - ARTIGO 1.º.
*
CONTRATO COLETIVO DE TRABALHO CELEBRADO ENTRE A ANIMEE (ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DAS EMPRESAS DO SECTOR ELÉTRICO E ELETRÓNICO), E O SINDICATO DOS ELETRICISTAS DO NORTE E OUTROS, PUBLICADO NO BOLETIM DE TRABALHO E EMPREGO (BTE), 1ª SÉRIE, N.º 26, DE 15/07/1977, DENOMINADO CONTRATO COLETIVO DE TRABALHO/77 ( ESTE FOI OBJETO DE REVISÕES PARCIAIS PUBLICADAS NOS BOLETINS DE TRABALHO E EMPREGO N.º 47, DE 22/12/1978, N.º 8, DE 28/02/1980, N.º 15, DE 22/04/1982, N.º 27, DE 22/07/1983, N.º 23, DE 22/06/1985, N.º 24, DE 29/06/1988, N.º 22, DE 15/06/1989, N.º 23, DE 22/06/1990, N.º 27, DE 22/07/1991 E N.º 41, DE 08/11/1999, TENDO VIGORADO ATÉ 2009).
PORTARIA DE EXTENSÃO, PUBLICADA NO BOLETIM DE TRABALHO E EMPREGO N.º 45, DE 08/12/1977.
CONTRATO COLETIVO DE TRABALHO CELEBRADO ENTRE A ANIMEE E O SIMA E OUTRO, PUBLICADO NO BOLETIM DE TRABALHO E EMPREGO N.º 29, DE 08/08/1996, OBJETO DE PORTARIA DE EXTENSÃO, PUBLICADA NO BOLETIM DE TRABALHO E EMPREGO N.º 3, DE 22/01/1997.
CONTRATO COLETIVO DE TRABALHO CELEBRADO ENTRE A ANIMEE E A FETESE E OUTROS, PUBLICADO NO BOLETIM DE TRABALHO E EMPREGO, N.º 39, DE 22/10/2002.
CONTRATO COLETIVO DE TRABALHO CELEBRADO ENTRE A ANIMEE E A FETESE E OUTROS (REVISÃO GLOBAL), PUBLICADO NO BTE N.º 17, DE 08/05/2006, (DENOMINADO CONTRATO COLETIVO DE TRABALHO/FETESE), O QUAL FOI OBJETO DE SUCESSIVAS ALTERAÇÕES, NOMEADAMENTE AS PUBLICADAS NOS BOLETINS DE TRABALHO E EMPREGO N.º 37, DE 08/10/2008, N.º 24 DE 29/06/2010, N.º 24, DE 29/06/2011, E N.º 23 DE 22/06/2013, E RESPETIVAS PORTARIAS DE EXTENSÃO (CFR. PORTARIA Nº 924/2006, DE 6 DE SETEMBRO, PORTARIA N.º 456/2009, DE 29 DE ABRIL, PORTARIA Nº 932/2010 DE 20 DE SETEMBRO, PORTARIA Nº 131/2013, DE 28 DE MARÇO, E PORTARIA Nº 94/2014 DE 30 DE ABRIL).
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

-DE 05/07/2007, PROCESSO N.º 06S2576, DISPONÍVEL EM WWW.DGSI.PT.
-DE 07/07/2010, PROCESSO N.º 123/07.5TTBGC, DISPONÍVEL EM WWW.DGSI.PT.
-DE 27/10/2010, PROCESSO N.º 3034/07.0TTLSB.L1.S1, DISPONÍVEL EM WWW.DGSI.PT
-DE 16/06/2015, PROCESSO N.º 962/05.1TTLSB.L1.S1, DISPONÍVEL EM WWW.DGSI.PT
-DE 17/11/2016, PROCESSO N.º 1032/15.0T8BRG.G1.S1, DISPONÍVEL EM WWW.DGSI.PT
Sumário :
1. Para que determinada prática, a nível de gestão empresarial, possa constituir um uso de empresa é necessário que a mesma se encontre sedimentada durante um considerável lapso de tempo, de forma a permitir que se possa concluir no sentido da existência de uma regra que leve os trabalhadores a adquirir legitimamente a convicção de que, no futuro e definitivamente, a mesma será aplicada.

2. Quatro anos é tempo insuficiente para que se configure a existência de uma regra subjacente ao comportamento do empregador que durante esse lapso de tempo, anualmente, concedeu o gozo da terça-feira de Carnaval aos seus trabalhadores, pelo que não se pode considerar constituído um uso de empresa.

Decisão Texto Integral:

Proc.º 401/15.0T8BRG.G1.S1 (Revista) - 4ª Secção

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:

                                                                                                                                                                      I

1. O Sindicato da Indústria Transformadora Energia e Atividades do Ambiente do ... -Site-...- (A.) instaurou a presente ação de processo comum contra AA, S.A. (R.) pedindo que se reconheça a ilicitude da decisão de retirar aos trabalhadores o direito ao gozo da terça-feira de Carnaval, sem perda de retribuição, ou seja o direito a não trabalharem nesse dia, sem que tal conduta possa ter efeitos desfavoráveis nestes e a manter este direito para o futuro.

Para o efeito, alegou em síntese:

Tem legitimidade para a presente ação, nos termos do art.º 5.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho, por se tratar de um direito coletivo de todos os trabalhadores vinculados à R., incluindo dos seus associados;

Desde a data de admissão de cada um dos trabalhadores da R. e até ao ano de 2013, inclusive, sempre lhes foi concedido o gozo da terça-feira de Carnaval, permitindo assim aos trabalhadores não terem de trabalhar nesse dia, sem perda de retribuição;

Ao retirar aquele direito aos seus trabalhadores, em 2014, a R. agiu em violação do princípio da irredutibilidade dos direitos adquiridos pelos seus trabalhadores.

Realizou-se a audiência de partes sem que se lograsse obter a conciliação das mesmas.

A R. contestou negando a existência de qualquer direito adquirido, referindo ainda que não existiu por parte da empresa qualquer prática reiterada e suficientemente duradoura para preencher o conceito de uso laboral como fonte de direito legalmente reconhecida.

Concluiu assim que a ação deve improceder com a sua consequente absolvição dos pedidos formulados pelo Autor.

Realizou-se audiência de julgamento, tendo sido proferida sentença que decidiu julgar a presente ação improcedente, por não provada, com a absolvição da R. do pedido.

2. Inconformado com esta decisão, o A. interpôs recurso de apelação para o Tribunal da Relação de ..., que decidiu julgar a apelação procedente, condenando a R. a reconhecer a ilicitude da decisão de retirar aos trabalhadores o direito ao gozo da terça--feira de Carnaval sem perda de retribuição, devendo manter-se tal direito para o futuro.

             

3. Perante esta decisão a R. interpôs recurso de revista, tendo formulado as seguintes conclusões:

1. Vem o presente recurso interposto do douto acórdão do Venerando Tribunal da Relação de ... - que julgou procedente o recurso interposto pelo A. e condenou a R. "a reconhecer a ilicitude da decisão de retirar aos trabalhadores o direito ao gozo da terça-feira de Carnaval, sem perda de retribuição, devendo manter-se tal direito para futuro" - por entender a R. que o mesmo, para além de violar - por incorreta interpretação e aplicação - os artigos 3.º do Código Civil; 1.º, 3.º, 234.º e 235.º do Código do Trabalho e 412.º do Código de Processo Civil, é nulo, nos termos das alíneas a), b) e c) do n.º 1 dos artigos 674.º e 615.º, n.º 1, al. c) do Código de Processo Civil, conforme infra se demonstra.

2. Começa desde logo por se dizer que, em face da factualidade provada, e da documentação junta aos autos, o sentido da decisão do Venerando Tribunal da Relação de ... teria necessariamente de ter sido ser outro, designadamente, no sentido da não verificação de uma prática /conduta da R. (ainda que generalizada e reiterada) sem convicção da sua obrigatoriedade, considerando que a atribuição do gozo da terça-feira de Carnaval aos seus trabalhadores da R. resultou da aplicação do regime previsto na lei e nos Instrumentos de Regulamentação Coletiva aplicáveis na empresa.

3. Assim, e considerando desde logo que a "atendibilidade" de uma conduta geral, espontânea e reiterada, constitutiva de um uso, pressupõe uma ausência de disposição imperativa ou supletiva da lei ou da regulamentação coletiva sobre determinado aspeto da relação de trabalho - cf. Monteiro, Fernandes, in Direito do Trabalho, 12.ª Edição, pág. 115), não se entende como pôde o Venerando Tribunal da Relação de ... concluir pela existência de um uso no caso dos autos.

4. Com efeito, conforme resulta da documentação junta aos autos, desde 1990 (data da constituição da Ré) até 2013 (ano em que esta deixou de atribuir o gozo da terça-feira de Carnaval aos seus trabalhadores) sempre existiu norma legal e de regulamentação coletiva sobre esta matéria, cujo regime a R. aplicou, como se impunha, aos respetivos trabalhadores.

5. Concretamente: o Contrato Coletivo de Trabalho celebrado entre a ANIMEE (atualmente, Associação Portuguesa das Empresas do Sector Elétrico e Eletrónico), de que a R. é associada, e o Sindicato dos Eletricistas do Norte e outros, publicado no Boletim de Trabalho e Emprego, 1.ª série n.º 26 de 15/07/1977 (CCT/77), o qual foi objeto de revisões parciais publicadas nos Boletins de Trabalho e Emprego n.º 47 de 22/12/1978, n.º 8 de 28/02/1980, n.º 15 de 22/04/1982, n.º 27 de 22/07/1983, n.º 23 de 22/06/1985, n.º 24 de 29/06/1988, n.º 22 de 15/06/1989, n.º 23 de 22/06/1990, n.º 27 de 22/07/1991 e n.º 41 de 08/11/1999, aplicável aos trabalhadores da R. filiados no sindicato aqui Autor (que integra a federação denominada FIEQUIMETAL), pelo menos, até 2009, data em que veio a caducar, conforme respetivo aviso de caducidade junto aos autos com a contestação como doc. 1, o qual vigorou até 2009, e previa na sua cláusula 47.ª, o feriado de Carnaval como "obrigatório" (cfr. doc. 2 junto aos autos com contestação).

6. O Contrato Coletivo de Trabalho celebrado entre a ANIMEE e o SIMA e outro, publicado no Boletim de Trabalho e Emprego, 1.ª série n.º 29 de 08/08/1996 e Contrato Coletivo de Trabalho celebrado entre a ANIMEE e a FETESE e outros, publicado no BTE, 1.ª série n.º 39 de 22/10/2002, os quais foram substituídos pelo Contrato Coletivo de Trabalho celebrado entre a ANIMEE e a FETESE e outros (Revisão - Global) publicado no Boletim de Trabalho e Emprego, 1.ª série n.º 17 de 08/05/2006 (CCT/FETESE), o qual foi objeto de sucessivas alterações, nomeadamente as publicadas nos Boletim de Trabalho e Emprego, n.º 37 de 08/10/2008, n.º 24 de 29/06/2010, n.º 24 de 29/06/2011 e n.º 23 de 22/06/2013, aplicável aos restantes trabalhadores da R., isto é, aos trabalhadores filiados nos sindicatos subscritores e aos trabalhadores não sindicalizados, de acordo com as respetivas Portarias de Extensão (que previam expressamente a não aplicação do CCT/FETESE aos trabalhadores filiados em sindicatos representados pela FIEQUIMETAL, como é o caso do sindicato aqui A.- cfr., entre outras, Portaria n.º 924/2006, de 6 de Setembro, Portaria n.º 456/2009, de 29 de abril, Portaria n.º 932/2010 de 20 de setembro, Portaria n.º 131/2013 de 28 de março e Portaria n.º 94/2014 de 30 de abril).

7. Não corresponde por isso à verdade, a afirmação do Venerando Tribunal da Relação de ..., de que "desde de sempre e até 2013 inclusive quer os trabalhadores estivessem ou não abrangidos pela aplicação de convenção coletiva de trabalho tinham direito ao gozo da terça-feira de Carnaval" (pág. 14 do douto acórdão recorrido),

8. Porquanto, desde 1990 e até 2009, todos os trabalhadores da Ré estavam abrangidos pelas CCT acima identificadas, mesmo os não sindicalizados, abrangidos pelas mesmas por força das respetivas portarias de extensão.

9. A atribuição do gozo da terça-feira de Carnaval pela R. aos seus trabalhadores resultou pois, apenas e tão só, da aplicação do regime previsto, em cada momento, nos Instrumentos de Regulamentação Coletiva do Trabalho em vigor na empresa, e no próprio regime legal (CT).

10. Nesse sentido, vejam-se as cláusulas dos Contratos Coletivos de Trabalho aplicáveis, sobre a matéria do feriado de Carnaval, as quais previam o seguinte:

- Contrato Coletivo de Trabalho/77 (Cláusula 47º) - Previa o Feriado de Carnaval como "obrigatório" (cfr. doc. 2 junto aos autos com contestação);

- Contrato Coletivo de Trabalho entre ANIMEE e SIMA de 1996 (Cláusula 42°) - Previa o Feriado de Carnaval como "obrigatório" (cfr. doc. 3 junto aos autos com contestação);

- Contrato Coletivo de Trabalho/FETESE de 2002 (Cláusula 42°) - Previa o Feriado de Carnaval como "obrigatório" (cfr. doc. 4 junto aos autos com contestação);

- Contrato Coletivo de Trabalho/FETESE na versão de 2010 (Cláusula 52º-A°) - Previa a possibilidade de a empresa, querendo, atribuir o Feriado de Carnaval, como feriado facultativo ("pode ser observado...") (cfr. doc. 5 junto aos autos com contestação);

- Contrato Coletivo de Trabalho/FETESE na versão de 2013, atualmente em vigor (Cláusula 62.ª) - Prevê a possibilidade de a empresa, querendo, atribuir o Feriado de Carnaval, como feriado facultativo ("pode ser observado...") (cfr. doc. 6 junto aos autos com contestação).

11. Quanto ao regime legal (relativo aos feriados facultativos), vigente ao longo do tempo (1990 a 2013) previa:

- DL 874/76 de 28/12 (lei das férias, feriados e faltas):

"Art. 19.º (Feriados Facultativos)

3. Além dos feriados obrigatórios, apenas podem ser observados: o feriado municipal da localidade ou, quando este não existir, o feriado distrital; a terça-feira de Carnaval, (sublinhado nosso)

4. (...) "

- Código do Trabalho (CT/2003):

Art. 209.º (Feriados Facultativos)

3. Além dos feriados obrigatórios, apenas podem ser observados a terça-feira de Carnaval e o feriado municipal da localidade, (sublinhado nosso)

4. (...)»

- Código do Trabalho (CT/2009):

Art. 235.º (Feriados Facultativos)

3. Além dos feriados obrigatórios, apenas podem ser observados a título de feriado, mediante instrumento de regulamentação coletiva de trabalho ou contrato de trabalho, a terça-feira de Carnaval e o feriado municipal da localidade, (sublinhado nosso)

4- (...) "

12. Ora tal factualidade parece não ter sido relevada pelo Venerando Tribunal da Relação de ... para efeitos de decisão, como se impunha, desde logo em violação do disposto no art. 412° do CPC.

13. De 1990 a 2009 a atribuição do gozo da terça-feira de Carnaval pela Ré a todos os seus trabalhadores (filiados no sindicato A., filiados noutros sindicatos, e não filiados), resultou expressamente do regime previsto nos Instrumentos de Regulamentação Coletiva vigentes em cada momento, e do próprio regime legal.

14. A partir de 2009 (ano em que o Instrumento de Regulamentação Coletiva aplicável aos trabalhadores sindicalizados no sindicato aqui A. caducou), a Ré continuou a atribuir a estes o gozo da terça-feira de Carnaval (erradamente convencida de que deveria passar a aplicar aos mesmos o CCT/ANIMEE que aplicava aos restantes trabalhadores), mas tendo-o feito apenas até 2013 (cfr. ponto 13 dos factos assentes), ou seja, apenas durante 4 anos, período manifestamente insuficiente para a referida conduta/prática poder consubstanciar um "uso", designadamente para efeitos do disposto no art. 1.º do CT.

15. A lei define (e reconhece) como uso laboral, a prática generalizada e reiterada

a. realizada sem convicção da sua obrigatoriedade (cfr. arts. 18.º a 21.º supra e "Novos Estudos de Direito de Trabalho, Prof. Júlio Gomes, 1.ª Edição, págs. 18 e segs.) e

b. reiterada ao longo de um período de tempo relevante (20, 30 anos, de acordo com o que tem sido o entendimento dos Tribunais e da doutrina).

16. Ora, nenhum desses requisitos se verifica no caso dos autos, razão pela qual a conduta da Ré jamais poderia consubstanciar a prática de um "uso" para efeitos do disposto n art.º 3.º do Código Civil.

17. Refere ainda o Venerando Tribunal da Relação de ... que a atribuição do gozo da terça-feira de Carnaval pela Ré aos seus trabalhadores durante 23 anos foi de "molde a fazer surgir na esfera jurídica dos seus trabalhadores a legítima expectativa de serem titulares do direito a esse gozo da terça-feira de Carnaval" (pág. 14 do douto acórdão recorrido).

18. Todavia, conforme já alegado pela R. na sua contestação, não se pode falar em "direitos adquiridos" quando em causa está uma mera expectativa relativamente à continuidade de uma regra ou norma favorável que entretanto é postergada por um Instrumento de Regulamentação Coletiva de Trabalho ou lei posterior (como sucede no caso dos autos)

19. Não podendo tal expectativa ser caracterizada como direito adquirido, sendo aliás aquelas merecedoras da tutela da confiança apenas quando a previsibilidade da sua manutenção se fundamente em valores reconhecidos no sistema e não apenas na inércia ou na manutenção do status quo (cfr. Ac. TC n.º 786/96), o que não é de todo o caso.

20. Conforme sublinha o Professor Júlio Gomes, em "Novos Estudos de Direito de Trabalho", pág. 46. "os usos são sobretudo referidos no nosso Código do Trabalho em matéria de retribuição", sendo que "noutros domínios -sobretudo nos atinentes aos limites ao exercício do poder de direção em sentido amplo - dificilmente se poderá consolidar uma confiança legítima por parte dos trabalhadores suscetível de justificar a vinculação do empregador pelo uso", dando o seguinte exemplo: " (...) não se pode, entre nós, por exemplo (...) considerar que numa empresa há um uso de observância de um feriado que entretanto legalmente deixou de o ser, mas que continuou a ser respeitado", (cfr. Novos Estudos de Direito de Trabalho, Prof. Júlio Gomes, 1ª. Ed.).

21. Nessa medida, e ao contrário do que entendeu o Venerando Tribunal da Relação de ... no douto acórdão recorrido, a conduta da R. - de deixar de atribuir o gozo da terça-feira de Carnaval aos seus trabalhadores em 2013 (tendo-o feito até ali ao abrigo dos CCT aplicáveis) não consubstancia qualquer comportamento ilícito ou violador dos direitos desses trabalhadores,

22. Ainda que a R. tenha continuado a atribuir o gozo da terça-feira de Carnaval, entre 2009 e 2013 (ou seja, durante 4 anos), aos trabalhadores sindicalizados no Sindicato A. (cuja CCT que lhes era aplicável caducou em 2009), uma vez que o referido período é manifestamente insuficiente para efeitos de qualificação - de tal conduta - como "uso".

23. Perante a matéria de facto dada como assente, e feita a integração jurídica da mesma, o Venerando Tribunal da Relação de ... teria de ter concluído, ao contrário do que concluiu, que a Ré não se vinculou, por força dos usos, a reconhecer aos seus trabalhadores o direito ao gozo da terça-feira de Carnaval, uma vez que não se tratou de uma prática realizada sem convicção da sua obrigatoriedade (ainda que geral e reiterada), e nem suficientemente duradoura (4 anos) para preencher o conceito de uso laboral como fonte de direito legalmente reconhecida.

24. A atribuição pela R. do gozo da terça-feira de Carnaval até 2013 não resultou de qualquer uso da empresa (prática regular, uniforme e reiterada sem convicção da obrigatoriedade), mas sim da aplicação do regime previsto nos Contratos Coletivos de Trabalho aplicáveis.

25. E sendo tal conduta uma decorrência da estrita aplicação da lei, não pode ser a mesma geradora de qualquer uso ou direito adquirido, visto não se poder falar em "direitos adquiridos" quando em causa está apenas uma mera expectativa - no caso dos trabalhadores - relativamente à continuidade, ou não, de uma regra ou norma favorável (entretanto postergada).

26. O Venerando Tribunal da Relação de ... fez assim uma incorreta apreciação/aplicação da matéria de facto assente, bem como da prova documental junta aos autos, e dos artigos 3.º do Código Civil; 1.º, 3.º, 234.º e 235.º do Código do Trabalho e 412.º do Código de Processo Civil.

27. O douto acórdão recorrido enferma ainda de nulidade, nos termos da alínea c) do n.º 1 dos artigos 674.º  e al. c) do n.º 1 do 615.º do CPC, considerando que os seus fundamentos estão em manifesta oposição com o sentido da decisão recorrida (cfr. Pontos 1, 3, 6, 13 e 17 e o teor das págs. 12 a 15 do douto acórdão recorrido).

28. Razões pelas quais deve a douta decisão recorrida ser integralmente revogada e substituída por outra que declare licitude da decisão de retirar aos trabalhadores o direito ao gozo da terça-feira de Carnaval - visto o gozo da terça-feira de Carnaval atribuída pela R. até 2013 não consubstanciar nenhum uso (prática regular, uniforme e reiterada sem convicção da obrigatoriedade), e muito menos um direito adquirido que passou a integrar o conteúdo dos contratos de trabalho dos trabalhadores, absolvendo a R. em conformidade.

O A. contra-alegou, defendendo a manutenção do Acórdão recorrido, não tendo formulado conclusões.

Neste Supremo Tribunal de Justiça, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer no sentido de ser negada a revista e confirmado o acórdão recorrido, tendo salientado:

Esta mesma questão, com substrato factual praticamente idêntico, objeto de ação proposta pelo também aqui Autor e Recorrido Sindicato da Industria Transformadora, Energia e Atividades do Ambiente do Norte, foi apreciada no acórdão deste Supremo Tribunal, de 17.11.2016, proferido no Proc.º 1032/15.0T8BRG.G1.S1, aresto no qual, depois de se debruçar sobre a relevância dos usos como fonte de direito do trabalho, apreciando se no caso ali presente era possível concluir da prática da empresa o nascimento de um uso que legitimasse a pretensão do Autor, se concluiu que:

"Conforme resulta da matéria de facto apurada pelas instâncias, desde 1994 e até ao ano de 2013 (inclusive), a ré sempre concedeu o gozo da terça-feira de Carnaval a todos os seus trabalhadores.

 Quebrando-a unilateralmente, foi abalada esta confiança na sua continuidade, pois tratando-se duma prática reiterada, assumiu por isso a natureza dum "uso" relevante à luz dos artigos 12.º, n.º 1 da LCT, e dos artigos 1.º do CT/2003 e do CT/2009, pois abarcou o período de vigência de todas estas normas.

Consideramos por isso ilegítimo que a R. tenha retirado, unilateralmente, o gozo da terça-feira de Carnaval, a partir de 2014, tal como fez, pois esta prática tornou-se vinculativa".

O entendimento perfilhado nesse aresto, com o qual concordamos e que integralmente subscrevemos, é inteiramente transponível para o caso sub judice.

Por seu turno, a recorrente respondeu ao parecer, pugnando que o mesmo não seja considerado para efeitos de decisão, invocando, em abono da sua posição:

É certo que a R. durante vários anos concedeu a todos os seus trabalhadores o gozo da terça-feira de Carnaval.

Sendo todavia igualmente certo que o fez por a isso estar obrigada, quer por lei, quer pelos Instrumentos de Regulamentação Coletiva vigentes em cada momento na empresa.

A atribuição do gozo da terça-feira de Carnaval pela R. aos seus trabalhadores resultou expressamente do regime previsto na lei e nos Instrumentos de Regulamentação Coletiva vigentes em cada momento.

A atribuição do gozo da terça-feira de Carnaval pela R. aos seus trabalhadores durante o referido período temporal, para poder "assumir a natureza de um uso relevante à luz dos artigos 12° n,° 1 da LCT e dos artigos 1.º do Código do Trabalho/2003 e do Código do Trabalho/2009" (como refere o douto acórdão da Relação de ..., e cita a Exma. Senhora Procuradora-Geral Adjunta), teria de ser (para além de generalizada e reiterada) realizada sem convicção da sua obrigatoriedade ("Novos Estudos de Direito de Trabalho, Prof. Júlio Gomes, 1.ª Ed., págs. 18 e seguintes).

0 que não sucede no caso dos autos!

Bem pelo contrário, resultou da mera aplicação do regime previsto nas normais legais e na regulamentação coletiva aplicável às relações laborais sub judice.

A conduta da R. (de atribuir o feriado de Carnaval aos seus trabalhadores durante o referido período de tempo) não resultou de nenhuma vontade espontânea e infundada, mas da simples aplicação da lei e dos CCT aplicáveis.

E sendo tal conduta uma decorrência da estrita aplicação da lei, não pode ser a mesma geradora de qualquer uso ou direito adquirido, visto não se poder falar em "direitos adquiridos" quando em causa está apenas uma mera expectativa - no caso dos trabalhadores - relativamente à continuidade, ou não, de uma regra ou norma favorável (entretanto postergada).

4. Nas suas conclusões a R. (recorrente) suscita as seguintes questões:

a) A nulidade do acórdão recorrido com fundamento no disposto no art.º 615.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Civil;

b) A licitude da decisão de a R. retirar aos seus trabalhadores o gozo da terça-feira de Carnaval.

Cumpre apreciar o objeto do recurso interposto.

II
1. As instâncias deram como provados os seguintes factos:

1- O Autor é uma associação sindical filiada na FIEQUEMETAL que por sua vez integra a CGTP.IN.

2- Os estatutos do A. encontram-se registados no Ministério do Trabalho.

3- A Ré é associada da ANIMEE – Associação Portuguesa das Empresas do Sector Elétrico e Eletrónico.

4- A Ré é uma sociedade anónima integrada no grupo Multinacional AA, com o número único de pessoa coletiva e matrícula na Conservatória do Registo Comercial 000 000 407, e tem por objeto o fabrico, comércio e venda de aparelhos de receção, emissão, gravação e/ou reprodução de som para veículos automóveis, nomeadamente de autorrádios e de gravadores e ou reprodutores de fitas magnéticas ou de disco, assim como peças e acessórios.

5- A Ré possuiu o estabelecimento industrial na Rua ..., n.º 00, freguesia de ..., 0000-000 ..., vulgarmente designado “Complexo BB” encontrando-se ao seu serviço cerca de 2004 (dois mil e quatro) trabalhadores.

6- Do universo de trabalhadores ao serviço da Ré, 947 são associados do Autor, e 1057 são não sindicalizados.

7- Como estrutura representativa dos trabalhadores encontra-se devidamente constituída e registada a Comissão de Trabalhadores da Ré.

8- A Ré foi constituída em 1990, sob a denominação “CC, LDA”, posteriormente alterou a sua denominação para “DD, LDA”, em 2009 para “AA, LDA” e em 2010 para “AA, SA”, tendo sido sempre detida pelo Grupo AA (e não pelo Grupo BB).

9- Por acordo entre os GRUPOS (AA e BB) a Ré contratou vários trabalhadores da “BB LDA (…) ” para a área de negócios de fabrico de autorrádios, tendo ocorrido a transmissão dos respetivos contratos.

10- Esses trabalhadores “transferidos” (parte dos atuais trabalhadores da Ré) mantiveram todos os direitos que tinham enquanto trabalhadores do Grupo BB, e que continuaram a ser respeitados pela Ré.

11- A Ré garantiu sempre todos os direitos que estes trabalhadores tinham quando estavam ao serviço do Grupo BB, nomeadamente a antiguidade e a categoria profissional.

12- A outra parte dos trabalhadores da Ré foi diretamente admitida pela Ré.

13- Durante a antiguidade e até ao ano de 2013, inclusive, foi concedido a todos os trabalhadores o gozo da terça-feira de Carnaval, permitindo aos trabalhadores não terem de trabalhar no referido dia, sem ficarem prejudicados a nível retributivo.

14- Alguns desses trabalhadores têm uma antiguidade superior a 30 anos.

15- No dia 05/02/2013, a Ré divulgou junto dos trabalhadores o comunicado (INFORM+), junto a fls. 87 verso, como documento nº 7 da contestação, o qual mereceu oposição do Autor e das estruturas representativas dos Trabalhadores.

16- No ano de 2014, mais precisamente no dia 4 de março, a Ré deixou de observar o feriado de Carnaval e considerou injustificadas as faltas dos trabalhadores que não compareceram para trabalhar nesse dia.

17- Às relações de trabalho entre associados do Autor e a Ré sempre se aplicou a Contrato Coletivo de Trabalho/77 até 2009/1.

2. A R. (recorrente) nas suas alegações e conclusões defende que o acórdão recorrido enferma da nulidade prevista no art.º 615.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Civil, pois os seus fundamentos estão em manifesta oposição com o sentido da decisão recorrida.

Esta nulidade não foi arguida, expressa e separadamente, no requerimento de interposição de recurso, que se encontra a fols. 436 dos autos.

Em processo laboral, resulta do art. 77.º, do Código de Processo do Trabalho, que existe um regime particular de arguição de nulidades de sentença, que se traduz no facto de a arguição ter de ser feita, expressa e separadamente, no requerimento de interposição de recurso, e, quando da sentença não caiba recurso ou não se pretenda recorrer, a arguição das nulidades da sentença é feita em requerimento dirigido ao juiz que a proferiu.

Apesar de no processo laboral o requerimento de interposição de recurso dever conter a alegação do recorrente (art.º 81.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho), não pode confundir-se o requerimento de interposição de recurso com a alegação de recurso. O requerimento é dirigido ao tribunal que proferiu a decisão – art. 637.º, n.º 1, do Código de Processo Civil - e a alegação é dirigida ao tribunal superior devendo conter as razões da discordância em relação à sentença e os fundamentos que, no entender do recorrente, justificam a sua alteração ou revogação.

 O Supremo Tribunal de Justiça já se pronunciou inúmeras vezes sobre esta questão, sempre de forma unânime, no sentido de que a arguição de nulidades não deve ser atendida, caso a arguição de nulidades de sentença não seja feita pela forma prevista no art.º 77.º, do Código de Processo do Trabalho, nomeadamente quando tal arguição foi só suscitada na alegação de recurso.

No recente Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16/6/2015, processo n.º 962/05.1TTLSB.L1.S1, pode ler-se no seu sumário:

 «Só se mostra cumprido o desiderato constante do art. 77.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho, quando o recorrente, no próprio requerimento em que interpõe recurso da decisão, consigna, de forma expressa e em separado – dizer, em separado do pedido ou da intenção de recurso -, que argui nulidades dessa mesma decisão, explicitando--as.»

O mesmo aresto desenvolve a questão nos seguintes termos:

«Efetivamente, aí se dispõe (art.º 77.º, do Código de Processo do Trabalho) que a «arguição de nulidades da sentença é feita expressa e separadamente no requerimento de interposição de recurso», tendo vindo a ser firmado, de forma consistente, por esta Secção do Supremo Tribunal de Justiça o entendimento de que só se mostra cumprido o desiderato constante deste normativo quando o recorrente, no próprio requerimento em que interpõe recurso da decisão, consigna, de forma expressa e em separado, isto é, em separado do pedido ou da intenção de recurso, que argui nulidades dessa mesma decisão, explicitando-as, ainda que minimamente.

A razão de ser, como se salienta em todos esses arestos, tem a ver com os princípios da celeridade e economia processual, na medida em que o cumprimento daquela norma comporta a vantagem de permitir ao juiz a imediata perceção de que está colocada a questão da nulidade da sentença, dela podendo conhecer, suprindo-a ou tendo-a por infundada.

Como se consignou, no aresto desta Secção de 31/01/2012, na Revista n.º 70/04.2TTLSB.L1.S1, disponível em www.dgsi.pt, «nos termos do disposto no art. 77.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho, a arguição de nulidades tem de ser feita, obrigatoriamente, no requerimento de interposição do recurso de forma explícita e concreta, dado que o requerimento de interposição constitui uma peça processual diferente das alegações, sendo que aquele é dirigido ao tribunal “a quo” e estas o são ao tribunal “ad quem”».

Ou, ainda, como de forma mais explícita, foi sumariado no aresto de 27/10/2010, Revista n.º 3034/07.0TTLSB.L1.S1, disponível em www.dgsi.pt:

I - A exigência contida no artigo 77.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho – no sentido de a arguição de nulidades da sentença ter que ser feita expressa e separadamente no requerimento de interposição de recurso – justifica-se por razões de celeridade e economia processual que, marcadamente, inspiram o processo laboral, visando possibilitar ao tribunal recorrido a rápida e clara deteção das nulidades arguidas e respetivo suprimento.

II - A mera referência aos textos legais que preveem as nulidades não é suficiente para permitir que o tribunal recorrido detete, rápida e claramente, os vícios invocados.

Em suma, a norma contida no n.º 1, do art. 77.º, do Código de Processo do Trabalho, própria do contencioso laboral, também aplicável à arguição de nulidades apontadas ao Acórdão da Relação (art.º 666.º do Novo Código de Processo Civil), exige, a par da necessidade do anúncio da nulidade que se aponta à decisão recorrida, a invocação da motivação que sustenta esse vício, devendo essa motivação ser explanada de forma expressa e separada, de molde a facilitar ao juiz a perceção, imediata e sem necessidade de maiores indagações, de que está colocada a questão da nulidade da sentença.»

Apreciando o requerimento de interposição de recurso logo se vê que a recorrente não suscitou a nulidade de sentença de forma expressa e separadamente, limitando-se a fazer referência à mesma nas suas alegações e conclusões, pelo que não respeitou o estatuído no art.º 77.º, do Código de Processo do Trabalho, razão pela qual, na sequência da jurisprudência citada, que perfilhamos, dela não se conhece.

3. Nas conclusões da alegação de recurso, a R. defende que a decisão de retirar aos seus trabalhadores o gozo da terça-feira de Carnaval não violou a lei, insurgindo-se contra o acórdão recorrido, que para fundamentar a ilicitude da sobredita decisão invocou a existência de um uso na empresa de os trabalhadores gozarem o referido dia.

Em defesa da inexistência do mencionado uso a R. argumenta que a atribuição do gozo da terça-feira de Carnaval aos seus trabalhadores resultou da aplicação do regime previsto na lei e nos Instrumentos de Regulamentação Coletiva aplicáveis na empresa.

Concretizando, a R. sublinha que desde 1990 e até 2009 todos os seus trabalhadores estavam abrangidos por Convenções Coletivas de Trabalho que previam o dia de Carnaval como feriado obrigatório ou facultativo, mesmo os não sindicalizados por força das respetivas portarias de extensão, e que a partir de 2009, ano em que caducou o Instrumento de Regulamentação Coletiva aplicável aos trabalhadores sindicalizados no sindicato autor nesta ação, continuou a atribuir a estes o gozo da terça-feira de Carnaval na convicção de que lhes era aplicável o Contrato Coletivo de Trabalho/ANIMEE, que aplicava aos restantes trabalhadores.

Conclui a R. que apenas atribuiu o gozo da terça-feira de Carnaval até 2013, ou seja durante quatro anos, período manifestamente insuficiente para que a referida conduta ou prática possa consubstanciar um uso, designadamente para efeitos do disposto no art.º 1.º, do Código do Trabalho.

O art.º 1.º do Código do Trabalho refere que o contrato de trabalho está sujeito, em especial, aos instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho, assim como aos usos laborais que não contrariem o princípio da boa-fé.

Como salienta o Professor Júlio Manuel Vieira Gomes[1] «De acordo com a visão dominante na doutrina, o uso apresenta-se como uma prática regular, uniforme, reiterada ou continuada e com características de generalidade».

O mesmo Professor salienta que a maior parte dos autores sublinha que esta prática é realizada sem convicção da sua obrigatoriedade jurídica, nisso se diferenciando do costume.

Acrescenta ainda que «Ínsita ou implícita na noção de uso é a ideia de uma reiteração ou repetição de um comportamento, ao longo do tempo ou, melhor, de um período de tempo relevante».

Quanto ao tempo necessário para que nasça um uso, o referido Professor menciona que os ordenamentos que dão relevância aos usos não estabelecem esse lapso de tempo, acrescentando que essa é uma questão que cabe aos tribunais decidir no caso concreto, podendo aquele lapso de tempo variar em função da importância social e económica do uso.

No caso em apreciação, a R. defende que apenas atribuiu o gozo da terça-feira de Carnaval durante quatro anos, período manifestamente insuficiente para que a referida conduta ou prática possa consubstanciar um uso, pois de 1990 até 2009 todos os seus trabalhadores estavam abrangidos por Convenções Coletivas de Trabalho que previam o dia de Carnaval como feriado obrigatório ou facultativo, mesmo os não sindicalizados por força das respetivas portarias de extensão.

A secção social do Supremo Tribunal de Justiça pronunciou-se, recentemente, no Acórdão de 17/11/2016[2], sobre a questão de saber se a concessão por uma empresa do gozo da terça-feira de Carnaval poderia ou não integrar um uso.

Nesse aresto referiu-se o seguinte:

Conforme resulta da matéria de facto apurada pelas instâncias, desde 1994 e até ao ano de 2013 (inclusive), a ré sempre concedeu o gozo da terça-feira de Carnaval a todos os seus trabalhadores, independentemente da sua sindicalização, permitindo-lhes assim não terem que trabalhar nestes dias, sem que fossem prejudicados na retribuição.

 É certo que o n.º 2 da cláusula 75ª da convenção coletiva de trabalho celebrada entre a AIMMAT, Associação dos Industriais Metalúrgicos, Metalomecânicos e afins de Portugal, de que a R é associada, e a FIQUIMETAL, Federação Intersindical da Metalurgia, Metalomecânica, Minas, Química, Farmacêutica, Petróleo e Gás e outros, de que o A era uma associação sindical filiada, publicada no dia 22 de março de 2002, e que vigorou entre 2002 e 17/2/2009, consagrava este direito para os trabalhadores por ela abrangidos.

No entanto, tendo aquele instrumento de regulamentação coletiva caducado nesta data (17/2/2009), constatamos que a prática da ré de conceder aos seus trabalhadores o gozo da terça-feira de Carnaval vigorou muito além do mero cumprimento da convenção coletiva de trabalho supramencionada.

Efetivamente, tal gozo foi concedido pela ré durante toda a antiguidade de cada um dos seus trabalhadores, sindicalizados ou não no sindicato autor, e abrangendo quer os que foram admitidos diretamente ao seu serviço, quer os que transitaram das anteriores sociedades comerciais, detendo alguns deles uma antiguidade superior a trinta anos.

Assim sendo, temos de concluir que o direito ao gozo da terça-feira de Carnaval e que a R retirou aos seus trabalhadores a partir de 2014 não teve fundamento legal, conforme concluiu a Relação.

Na verdade, tratando-se duma prática que vigorou desde 1994 e até 2013, temos de concluir que estamos perante uma prática espontânea da empresa, pois a regulamentação coletiva de trabalho que vigorou no período de 2002 a 2009 abrangeu apenas os trabalhadores filiados no sindicato outorgante.

Por outro lado, tratou-se duma prática constante, uniforme e pacífica, sendo por isso merecedora da tutela da confiança dos trabalhadores na sua continuidade, pois face aos anos em que a mesma vigorou, criou nestes a convicção de que o empregador a prosseguiria no futuro

Quebrando-a unilateralmente, foi abalada esta confiança na sua continuidade, pois tratando-se duma prática reiterada, assumiu por isso a natureza dum “uso” relevante à luz dos artigos 12º, nº 1 da LCT, e dos artigos 1.º do Código do Trabalho/2003 e do Código do Trabalho/2009, pois abarcou o período de vigência de todas estas normas.

Consideramos por isso ilegítimo que a R tenha retirado, unilateralmente, o gozo da terça-feira de carnaval, a partir de 2014, tal como fez, pois esta prática tornou-se vinculativa.

O caso que estamos a apreciar apresenta algumas particularidades em relação ao caso tratado no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça citado, pois segundo a recorrente de 1990 até 2009 todos os seus trabalhadores estavam abrangidos por Convenções Coletivas de Trabalho que previam o dia de Carnaval como feriado obrigatório ou facultativo, mesmo os não sindicalizados por força das respetivas portarias de extensão.

No acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17/11/2016 a questão não foi assim enquadrada, tendo a decisão repousado no fundamento de que o gozo do dia de Carnaval foi concedido pela empregadora desde 1994 a 2013 a todos seus trabalhadores, sindicalizados ou não no sindicato autor, ainda antes do começo da vigência da Convenção Coletiva de Trabalho, em 2002, tendo-se prolongado até 2013, ou seja, para além da data em que esta caducou, em 17/2/2009.

Antes de mais, importa indagar como eram reguladas as relações de trabalho entre a R. e os seus 2004 trabalhadores, sendo 947 associados no sindicato Autor.

Vejamos:

O A. é uma associação sindical filiada na FIEQUEMETAL que por sua vez integra a CGTP e a R. é associada da ANIMEE – Associação Portuguesa das Empresas do Sector Elétrico e Eletrónico.

Às relações de trabalho entre os trabalhadores da R. filiados no sindicato ora Autor e a R. aplicou-se o Contrato Coletivo de Trabalho celebrado entre a ANIMEE (Associação Portuguesa das Empresas do Sector Elétrico e Eletrónico), de que a R. é associada, e o Sindicato dos Eletricistas do Norte e outros, publicado no Boletim de Trabalho e Emprego (BTE), 1ª série, n.º 26, de 15/07/1977, denominado Contrato Coletivo de Trabalho/77.

Este Contrato Coletivo de Trabalho/77 foi objeto de revisões parciais publicadas nos Boletins de Trabalho e Emprego n.º 47, de 22/12/1978, n.º 8, de 28/02/1980, n.º 15, de 22/04/1982, n.º 27, de 22/07/1983, n.º 23, de 22/06/1985, n.º 24, de 29/06/1988, n.º 22, de 15/06/1989, n.º 23, de 22/06/1990, n.º 27, de 22/07/1991 e n.º 41, de 08/11/1999, tendo vigorado até 2009, data em que veio a caducar.

O Contrato Coletivo de Trabalho/77 foi objeto de Portaria de Extensão, publicada no Boletim de Trabalho e Emprego n.º 45, de 08/12/1977, pelo que as disposições daquele Contrato Coletivo de Trabalho /77 passaram a ser extensivas aos trabalhadores não filiados nos sindicatos outorgantes.

Por outro lado, coexistiram com o Contrato Coletivo de Trabalho /77, os seguintes Contratos Coletivos de Trabalho:

1- O Contrato Coletivo de Trabalho celebrado entre a ANIMEE e o SIMA e outro, publicado no Boletim de Trabalho e Emprego n.º 29, de 08/08/1996, objeto de Portaria de Extensão, publicada no Boletim de Trabalho e Emprego n.º 3, de 22/01/1997, na qual se prevê expressamente a não aplicação do referido Contrato Coletivo de Trabalho aos trabalhadores representados pela FETESE;

2- O Contrato Coletivo de Trabalho celebrado entre a ANIMEE e a FETESE e outros, publicado no Boletim de Trabalho e Emprego, n.º 39, de 22/10/2002, o qual não foi objeto de Portaria de Extensão.

Estes Contratos Coletivos de Trabalho foram substituídos pelo Contrato Coletivo de Trabalho celebrado entre a ANIMEE e a FETESE e outros (Revisão Global), publicado no BTE n.º 17, de 08/05/2006, (denominado Contrato Coletivo de Trabalho/FETESE), o qual foi objeto de sucessivas alterações, nomeadamente as publicadas nos Boletins de Trabalho e Emprego n.º 37, de 08/10/2008, n.º 24 de 29/06/2010, n.º 24, de 29/06/2011, e n.º 23 de 22/06/2013, aplicável aos restantes trabalhadores da Ré, isto é, aos trabalhadores filiados nos sindicatos subscritores e aos trabalhadores não sindicalizados, de acordo com as respetivas Portarias de Extensão (cfr. Portaria nº 924/2006, de 6 de setembro, Portaria n.º 456/2009, de 29 de abril, Portaria nº 932/2010 de 20 de setembro, Portaria nº 131/2013, de 28 de março, e Portaria nº 94/2014 de 30 de abril).

Nestas Portarias de Extensão prevê-se expressamente a não aplicação do referido Contrato Coletivo de Trabalho/FETESE aos trabalhadores filiados em sindicatos representados pela FIEQUIMETAL, como é o caso do sindicato ora Autor.

O Contrato Coletivo de Trabalho/77 (Cláusula 47.ª), o Contrato Coletivo de Trabalho entre ANIMEE e SIMA de 1996 (Cláusula 42.ª) e o Contrato Coletivo de Trabalho/FETESE de 2002 (Cláusula 42.ª) previam o feriado de Carnaval como obrigatório.

Já o Contrato Coletivo de Trabalho/FETESE na versão de 2010 (Cláusula 52.ª-A) e de 2013 (Cláusula 62.ª) passaram a prever o aludido feriado como facultativo.

Perante este quadro normativo impõem-se as seguintes observações:

A R. alegou que após a publicação do aviso de caducidade do Contrato Coletivo de Trabalho/77 (Boletim de Trabalho e Emprego, 1ª série, n.º 15, de 22/04/2009), passou a aplicar aos seus trabalhadores filiados no A. o regime previsto no Contrato Coletivo de Trabalho/FETESE, por estar convencida de que teria de o fazer.

Sucede que, como vimos supra, o regime previsto no Contrato Coletivo de Trabalho/FETESE era aplicável apenas aos trabalhadores filiados em sindicatos subscritores daquele instrumento de regulamentação coletiva de trabalho e aos trabalhadores não sindicalizados. Ou seja, o Contrato Coletivo de Trabalho/FETESE não era aplicável aos trabalhadores filiados no sindicato A., conforme previam as respetivas Portarias de Extensão, na medida em que este integra a FIEQUIMETAL.

Deste modo, mesmo considerando a alegação da R., a atribuição do gozo do feriado de Carnaval aos trabalhadores filiados no A., de 2009 a 2013, teria sido ao abrigo de um instrumento de regulamentação coletiva que não lhes era aplicável.

Relativamente aos trabalhadores não sindicalizados, ou filiados em sindicatos subscritores do Contrato Coletivo de Trabalho/FETESE, a atribuição do feriado de Carnaval resultava do contrato coletivo, sendo certo que aquele feriado deixou de ser obrigatório a partir da sua versão de 2010.

Concluindo, o gozo do feriado de Carnaval pelos trabalhadores associados no Autor foi concedido desde a constituição da R., em 1990, até 2009, ao abrigo do respetivo Contrato Coletivo de Trabalho/77.

Importa agora determinar se a concessão pela R. do gozo da terça-feira de Carnaval para além da data em que cessou o Contrato Coletivo de Trabalho, em 2009, até 2013, é suscetível de configurar um uso da empresa que deva ser respeitado para o futuro.

Estamos perante um lapso de tempo de quatro anos na vida de uma empresa que foi constituída, como já se disse, em 1990, em que alguns dos seus trabalhadores têm uma antiguidade superior a 30 anos, por terem mantido a antiguidade que já detinham nas empresas do grupo de onde foram transferidos para a Ré.

A argumentação da R. de que após a publicação do aviso de caducidade do Contrato Coletivo de Trabalho /77 passou a aplicar aos seus trabalhadores filiados no A. o regime previsto no Contrato Coletivo de Trabalho/FETESE, por estar convencida de que teria de o fazer, poderia configurar uma situação de erro, consubstanciada numa interpretação errónea da convenção coletiva, que a ser atendida, como relevante, excluiria a existência do uso.

Só que no presente caso não está provado que a R. depois de ter cessado o Contrato Coletivo de Trabalho/77, em 2009, tenha aplicado aos seus trabalhadores associados do A. o Contrato Coletivo de Trabalho/FETESE.

O Supremo Tribunal de Justiça, no acórdão de 05/07/2007, já se pronunciou no sentido de que a repetição de uma conduta durante anos, ainda que tendo na sua base um erro da entidade patronal, é suscetível de constituir um uso, não dando assim relevância ao erro.[3]

De todo o modo, temos de reconhecer que o período de quatro anos não se pode considerar um período relevante de tempo para efeitos de se ter como consolidado um uso da empresa, de forma a ser observado no futuro.

O Supremo Tribunal de Justiça, em acórdão datado de 07/07/2010, proferido no processo nº 123/07.5TTBGC.L1.S1 - 4.ª Secção, relatado pelo Juiz Conselheiro Vasques Dinis, considerou que a circunstância demonstrada de que, durante cerca de quatro anos após a conclusão do doutoramento, o trabalhador com o conhecimento do empregador, continuou a prestar o seu trabalho no mesmo regime presencial de 16 horas por semana, só pode ser entendida como mera tolerância, não consubstanciando uma prática ou uso laboral suscetível de lhe conferir o direito a manter, de forma permanente, aquele regime presencial de 16 horas semanais, pois, para além de não se poder considerar aquele período como um período longo de tempo que justificasse que o trabalhador tivesse adquirido legitimamente a convicção de que, no futuro e definitivamente, esse regime presencial seria mantido, o trabalhador sabia que tal regime era excecional.

Mesmo para a tese defendida por alguma doutrina, de que se salienta Giulio Quadri[4], citado pelo Professor Júlio Manuel Vieira Gomes[5], que sustenta que o lapso de tempo necessário para a gestação de um uso poderia ser mais reduzido em Direito do Trabalho, porquanto os comportamentos dos sujeitos evoluem e consolidam-se mais rapidamente “na intempérie das relações de trabalho subordinado”, o período de quatro anos seria insuficiente para consolidar como uso, um comportamento do empregador caracterizado por uma frequência reiterada anualmente.

É de todo pertinente a observação do Mestre José Andrade Mesquita[6] de que o lapso de tempo necessário para que se constitua um uso pode até depender da frequência da reiteração, sendo necessário mais tempo para que se constitua o uso da empresa de uma gratificação anual, do que para o uso que consiste no tratamento diário de uma pausa como tempo de trabalho.

Assim, para que determinada prática, a nível de gestão empresarial, possa constituir um uso de empresa é necessário que a mesma se encontre sedimentada durante um considerável lapso de tempo, de forma a permitir que se possa concluir pela existência de uma regra que leve os trabalhadores a adquirir legitimamente a convicção de que, no futuro e definitivamente, a mesma será aplicada.

O lapso de tempo necessário a atender para que se considere constituído um uso de empresa depende da frequência da reiteração do comportamento do empregador, devendo ser apreciado em cada caso concreto.

Quanto à necessidade de apreciação em cada caso concreto, o Professor Júlio Manuel Vieira Gomes[7], refere que este é um dos raros aspetos em que existe consenso entre os autores, citando Ernst Heissmann[8] quando este refere que “ saber com que regularidade e durante quanto tempo é que é necessária que a conduta se repita é questão a que não se pode responder em abstrato, tudo dependendo do caso concreto”.

O comportamento do empregador que se repete anualmente, traduzindo-se na concessão do gozo do dia de Carnaval, para se constituir um uso de empresa necessita de uma considerável sedimentação no tempo, de forma que se possa deduzir que esse comportamento se transformou em regra.

Para alguns autores, como o caso de Seiter[9], citado pelo Professor Júlio Manuel Vieira Gomes[10], é a repetição ou reiteração de comportamentos uniformes ou regulares que permite inferir a existência dessa regra.

Voltando ao caso concreto, quatro anos é tempo insuficiente para se concluir no sentido da existência de uma regra subjacente ao comportamento do empregador que durante esse lapso de tempo, anualmente, concedeu o gozo da terça-feira de Carnaval aos seus trabalhadores, pelo que não se pode considerar constituído um uso de empresa.                       

III

Pelos fundamentos expostos, delibera-se conceder revista e, em consequência, revoga-se o acórdão recorrido, mantendo-se a sentença da primeira instância, com a absolvição da Ré do pedido.

Sem custas, uma vez que o A., sindicato[11], está isento, nos termos do art.º 4.º, n.º 1, alínea f), do Regulamento das Custas Processuais, por se tratar de uma ação relativa a direitos respeitantes aos interesses coletivos que representa, nos termos do art.º 5.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho, e por não se concluir pela manifesta improcedência do pedido, atento o disposto no n.º 5, do art.º 4.º, do referido Regulamento.

 O A. é, no entanto, responsável pelos encargos a que deu origem no processo, nos termos do n.º 6, do art.º 4, do Regulamento das Custas Processuais, uma vez que a respetiva pretensão foi totalmente vencida.

Anexa-se o sumário do acórdão.

Lisboa, 09/03/2017

Chambel Mourisco - Relator

Pinto Hespanhol

Gonçalves Rocha (com declaração que anexo)

---*---

Sumário

           

- Feriados facultativos

- Terça-feira de Carnaval

- Usos de empresa


1. Para que determinada prática, a nível de gestão empresarial, possa constituir um uso de empresa é necessário que a mesma se encontre sedimentada durante um considerável lapso de tempo, de forma a permitir que se possa concluir no sentido da existência de uma regra que leve os trabalhadores a adquirir legitimamente a convicção de que, no futuro e definitivamente, a mesma será aplicada.


2. Quatro anos é tempo insuficiente para que se configure a existência de uma regra subjacente ao comportamento do empregador que durante esse lapso de tempo, anualmente, concedeu o gozo da terça-feira de Carnaval aos seus trabalhadores, pelo que não se pode considerar constituído um uso de empresa.   

Data do acórdão: 09/03/2017

PROC. 401/15.0T8BRG.G1.S1 (Revista) - 4ª Secção

Chambel Mourisco (relator)

Pinto Hespanhol

Gonçalves Rocha

---*---

Declaração de Voto

Acompanhei a posição seguida no acórdão, apesar de ter sido o relator do aresto citado no texto (acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de 17/11/2016, proferido no processo nº 1032/15.0T8BRG.G1.S1), cuja decisão foi em sentido diferente.

Efectivamente, neste último processo a matéria de facto apurada é substancialmente diversa, pois provou-se que a empregadora sempre garantiu a todos os seus trabalhadores, sindicalizados ou não, o gozo da terça-feira de carnaval.

Além disso, em termo de fundamentação de direito a questão a decidir não se colocou nos mesmos termos, pois não foi invocada a existência de qualquer portaria de extensão que justificasse a aplicação da contratação colectiva aos restantes trabalhadores da empresa, ao contrário do que acontece nos presentes autos.

António Gonçalves Rocha

_______________________________________________________
[1] Dos usos da empresa em Direito do Trabalho, estudo publicado na Revista de Direito e de Estudos Sociais, Ano XLIX, janeiro-dezembro de 2008, nº 1-4, Almedina, pág. 104.
[2] Proc. n.º 1032/15.0T8BRG.G1.S1, relatado pelo Juiz Conselheiro Gonçalves Rocha.
Este acórdão foi citado no parecer da Exma. Procuradora-Geral Adjunta, proferido nos presentes autos nos termos do art.º 87.º, n.º 3, do Código de Processo do Trabalho.
[3] Processo nº 06S2576.
[4] Giulio Quadri, Usi aziendali e autonomia negoziale, regole consuetudinaire e modificazioni unilateral nel rapporto di lavoro, Edizioni Scientifiche Italiane, Napoli, 2008, pág. 125.
[5] Estudo citado, pág. 109.
[6] Direito do Trabalho, 2ª ed., Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa, 2004, pág 134.
[7] Estudo citado, pág. 109, nota 29.
[8] Betriebliche Ubung und Ruhegeldverpflichungen, Zum Urteil des Bundesfinanzhofes vom 12.1.1958, BB 1958,págs. 633 e segs.
[9] Hugo Seiter, Die Betriebsubung,Zugleich ein Beitrag zur Lehre vom Rechtsgeschaft und von den Zurechnungsgrunden rechtserheblichen Verhaltens im Privatrech, Verlag Handelsblatt GmBH, Dusseldorf, pág.78 e segs, citado pelo Professor Júlio Manuel Vieira Gomes.
[10] Estudo citado, pág. 108.
[11] Considera-se que o A., sindicato, é uma pessoa coletiva privada sem fins lucrativos. Neste sentido, cfr. Conselheiro Salvador da Costa, Regulamento das Custas Processuais, anotado e comentado, 2013 -5ª Edição, Almedina, pág. 158.