Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
08S2309
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: MÁRIO PEREIRA
Descritores: DESPEDIMENTO COLECTIVO
DESPACHO SANEADOR
CASO JULGADO
CADUCIDADE DA ACÇÃO
PRAZO
ERRO SOBRE OS MOTIVOS
DISSOLUÇÃO DE SOCIEDADE
ENCERRAMENTO DA EMPRESA
TRANSMISSÃO DE ESTABELECIMENTO
DIREITO COMUNITÁRIO
REENVIO PREJUDICIAL
ABUSO DE DIREITO
Nº do Documento: SJ20090225023094
Data do Acordão: 02/25/2009
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA PARCIALMENTE
Sumário :
I – Deve considerar-se que não transitou em julgado o segmento do saneador-sentença proferido em acção de impugnação de despedimento colectivo que julgou ilícito o despedimento por inexistência do fundamento invocado, apesar de se ter tornado definitiva a decisão da Relação que julgou extemporânea a arguição de nulidades do saneador invocada pelo empregador recorrente, se este, na apelação, além de imputar ao saneador a comissão daquelas nulidades, sustentou que as razões do despedimento são as razões económicas que levaram à dissolução da sociedade empregadora e vem a reafirmar, na revista, que se verifica fundamento para o despedimento colectivo.
II - Os prazos de propositura de acção são geralmente qualificados como prazos substantivos de caducidade, mas podem ser também prazos judiciais, o que ocorre quando o prazo esteja directamente relacionado com uma outra acção e o seu decurso tenha um mero efeito de natureza processual e não o de extinção de direito material.
III – O prazo de 90 dias para impugnar o despedimento previsto no art. 25.º do Regime Jurídico da Cessação do Contrato Individual do Trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro (LCCT), é um prazo de caducidade (cfr. o n.º 2 do art. 298.º do Código Civil) e tem natureza substantiva, na medida em que não pressupõe, necessariamente, a prévia propositura de uma acção, ou a existência de um processo, pelo que não lhe é aplicável a suspensão judicial do prazo prevista no art. 144.º do Código de Processo Civil, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 457/80, de 10 de Outubro.
IV – O cômputo deste prazo está submetido às regras do art. 279.º do Código Civil, v.g. à sua alínea e), em nada colidindo a transferência do termo do prazo que termine em férias judiciais para o primeiro dia útil após férias nela prevista, com a insusceptibilidade de suspensão do prazo de caducidade prescrita no art. 328.º do mesmo diploma, por serem realidades distintas a suspensão do prazo de caducidade, por um lado, e a dilação ou transferência do termo desse prazo, por outro.
V – Sendo a data da cessação do contrato constante da comunicação de despedimento o dia 30 de Abril de 1993, deve considerar-se tempestiva a acção de impugnação de despedimento colectivo instaurada em 15 de Setembro de 1993 (primeiro dia útil seguinte após as férias judiciais de Verão de 1993), uma vez que o termo do prazo de caducidade do direito de acção ocorreria nas férias judiciais (29 de Julho de 1993).
VI – Ainda que na petição inicial da acção de impugnação de despedimento colectivo seja invocada uma situação de erro sobre os motivos que viciou a aceitação pelos trabalhadores da compensação paga pelo despedimento, a previsão do art. 287.º, n.º 1 do Código Civil – que estabelece o prazo de um ano para arguir a anulabilidade do negócio jurídico – não afasta a aplicabilidade do prazo de caducidade do direito de impugnar o despedimento colectivo previsto no art. 25.º, n.º 2 da LCCT.
VII – O processo de impugnação do despedimento colectivo adoptou soluções processuais que visam, além do mais, um controle célere e uniforme da avaliação da legalidade do despedimento e do procedimento patronal que o precedeu, sendo disso reflexo a apensação obrigatória de acções até ao momento do despacho saneador e o chamamento para intervenção dos trabalhadores com legitimidade processual, previstos, respectivamente, nos arts. 36.º e 156.º-A, ambos do CPT, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 272-A/81 de 30/09, com a redacção do Decreto-Lei n.º 315/89 de 21/09.
VIII – Na apreciação judicial do despedimento colectivo, apenas nos casos de gestão inteiramente inadmissível, ou grosseiramente errónea, poderão ser postos em causa os critérios de gestão observados pelo empregador.
IX – A dissolução de uma sociedade (pessoa jurídica) não se confunde com o encerramento da empresa ou estabelecimento (bem por aquela pessoa explorado).
X – Todavia, a deliberação da assembleia-geral de uma sociedade anónima no sentido da sua própria dissolução implica o encerramento da empresa em que se materializa o exercício da actividade económica dessa sociedade, ficando os poderes dos liquidatários limitados aos actos enunciados no n.º 3 do art. 151.º do Código das Sociedades Comerciais (CSC), sempre que, a par da deliberação de dissolução, não haja qualquer outra deliberação da assembleia-geral a autorizar os liquidatários a continuar a actividade, a alienar em globo o património social, ou a trespassar o estabelecimento da sociedade [alíneas a), c) e d), do n.º 2 do art. 151.º do CSC].
XI – A decisão sobre o encerramento definitivo da empresa (organização produtiva afecta à prossecução do objecto social), implicando a cessação da actividade para cujo exercício em comum a sociedade anónima foi constituída e que dá sentido à sua existência, excede o campo da mera gestão da sociedade comercial reservado ao respectivo conselho de administração ou à comissão liquidatária, sendo da competência da assembleia-geral, a quem cabe decidir sobre a dissolução da própria sociedade.
XII – Basta a verificação de uma situação factual de transferência da empresa (ainda que, “de iure”, a comissão liquidatária da sociedade não tivesse poderes para efectuar tal transferência) para fazer operar o efeito transmissivo dos contratos de trabalho que o art. 37.º da LCT estabelece.
XIII – O conceito de “estabelecimento” (ou empresa) para efeitos do art. 37.º da LCT abrange, quer a organização afecta ao exercício de um comércio ou indústria, quer os conjuntos subalternos que correspondem a uma unidade técnica de venda, de produção de bens, ou de fornecimento de serviços, desde que a unidade destacada do estabelecimento global constitua uma entidade produtiva autónoma, com organização específica: uma unidade económica.
XIV – Da aplicação do critério material de unidade económica resulta a irrelevância quer da transmissão de elementos patrimoniais isolados, não agregados entre si, quer da transmissão de bens, interligados ou não, mas não essenciais ou não destinados à prossecução de uma determinada actividade económica.
XV – O conceito de “transmissão” para este efeito é especialmente amplo, abrangendo todas as alterações estáveis (mas não necessariamente definitivas) na gestão do estabelecimento ou da empresa, mesmo que inexista um vínculo obrigacional directo entre transmitente e transmissário e nele se abarcando os casos de transmissão ou cessão da exploração inválidos.
XVI – O critério fundamental para a aplicação das directivas comunitárias nº 77/187/CEE do Conselho, de 14 de Fevereiro de 1977 e n.º 2001/23/CE de 12 de Março, é o de saber: (i) se há uma entidade que desenvolve uma actividade económica organizada de modo estável; (ii) se essa entidade, depois de mudar de titular, manteve a sua identidade.
XVII – Para determinar se a entidade económica subsiste na esfera do transmissário como um conjunto de meios organizados com suficiente autonomia para poder funcionar de forma independente no mercado (uma unidade económica), há que ponderar a globalidade das circunstâncias em que se processaram os factos susceptíveis de indiciar a transferência do estabelecimento.
XVIII – Não pode concluir-se que uma companhia aérea transmitiu para outra um conjunto organizado de factores produtivos com relevância suficiente para se afirmar que constitui um suporte autónomo para o desempenho da actividade de voos não regulares que a primeira anteriormente prosseguia, se o que se verifica são meros actos de liquidação do património da sociedade dissolvida em benefício dos respectivos credores, diluindo-se o equipamento da companhia de voos não regulares, que a segunda passou a utilizar, no conjunto do equipamento desta.
XIX – Neste contexto, e efectuando a segunda companhia voos regulares e não regulares, neles utilizando indiferenciadamente o seu pessoal e o seu equipamento, não se vislumbra no seu seio a reorganização de uma unidade económica dedicada à aviação comercial irregular.
XX – A obrigação de reenvio prejudicial, que impende sobre os órgãos jurisdicionais nacionais cujas decisões não sejam susceptíveis de recurso judicial previsto no direito interno (§ terceiro do art. 234.° do Tratado de Roma), só se afirma quando esses mesmos órgãos jurisdicionais considerem que o recurso ao direito comunitário é necessário para a solução do litígio que perante eles corre e, além disso, que se tenha suscitado uma questão de interpretação desse direito.
XXI – Mas, só se justifica que os órgãos jurisdicionais de algum Estado Membro implementem o referido reenvio quando ocorra dúvida sobre a interpretação das normas comunitárias.
XXII – O juiz nacional não pode efectuar um reenvio que tenha por objecto a interpretação do direito nacional ou aferir da compatibilidade entre um preceito de direito interno e outro de direito comunitário.
XXIII – Não se insere também na competência do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias saber se determinado normativo de direito comunitário é, ou não, aplicável (ainda que não directamente) a uma dada situação sobre a qual se debruçam os tribunais nacionais dos vários Estados Membros.
XXIV – Verifica-se o fundamento enunciado no art. 16.º da LCCT para o despedimento colectivo de todos os trabalhadores da sociedade anónima que delibera a sua dissolução em virtude de graves dificuldades económicas da sua empresa, se se verifica que a sociedade cessa definitivamente a sua actividade com a dissolução e se a empresa não subsiste após tal data, encerrando definitivamente.
XXV – A invocação de abuso do direito relativa aos despedimentos colectivos tem de reportar-se a esses mesmos despedimentos, não permitindo a apreciação de condutas gestionárias da empresa que lhes sejam alheias.
XXVI – Só é possível proceder ao levantamento da personalidade colectiva em casos em que o exercício do direito subjectivo conduz a um resultado clamorosamente divergente do fim para que a lei o concedeu e dos interesses jurídica e socialmente aceitáveis.
Decisão Texto Integral:

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:

1. Relatório
A presente acção especial de impugnação do despedimento colectivo que corre termos no Tribunal do Trabalho de Lisboa contra as rés AIR …, sociedade em liquidação, e TAP – …, SA, de acordo com o disposto no art. 156º-A do CPT de 1981, foi instaurada em 15 de Setembro de 1993 com o n.º 246/1993, pelos seguintes autores (Assistentes de bordo e Comissários de bordo):
1. A 1
2. A 2
3. A 3
4. A 4
5. A 5
6. A 6
7. A 7
8. A 8
9. A 9
10. A 10
11. A 11
12. A 12
13. A 13
14. A 14
15. A 15
16. A 16
17. A 17
18. A 18
19. A 19
20. A 20
21. A 21
22. A 22
23. A 23
24. A 24
25. A 25
26. A 26
27. A 27
28. A 28
29. A 29
30. A 30
31. A 31
32. A 32
33. A 33
34. A 34
35. A 35
36. A 36
37. A 37
38. A 38
39. A 39
40. A 40
41. A 41
42. A 42
43. A 43
44. A 44
45. A 45
46. A 46
47. A 47
48. A 48


Estes autores concluem o seu articulado inicial peticionando que se declarem improcedentes os fundamentos invocados pela ré AIR ... (AIA) para o despedimento colectivo e, consequentemente, se declare o mesmo ilícito, se condene a ré TAP a reintegrar os AA, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade e se condenem as duas rés, solidariamente, no pagamento das retribuição intercalares que deixaram de auferir desde 30 dias antes da propositura da acção (15.08.03) até à sentença.
Em fundamento da sua pretensão alegam, em síntese: que foram trabalhadores da ré AIA (assistentes/comissários de bordo) até 30.04.93, data em que a AIR ... foi dissolvida e os AA cessaram os seus contratos por comunicação de despedimento colectivo; que apesar de ter sido invocado como motivo de despedimento colectivo o encerramento definitivo da empresa (em virtude da acumulação de resultados negativos desde 1990, da liberalização do transporte aéreo, elevadas rendas do leasings de aviões e política cambial), o verdadeiro motivo para a dissolução da ré AIA e para o despedimento colectivo foi a intenção da ré TAP voltar a deter a exploração do transporte aéreo não regular, com redução de custos, devendo, consequentemente, ser julgados improcedentes os motivos invocados para o despedimento colectivo; que ocorreu transmissão do estabelecimento da ré AIA para a ré TAP, nos termos do art. 37.º da LCT, porque a TAP, a partir de 1.05.93, passou a realizar todas as operações de voos de fretamento contratados e programados pela ré AIA para o Verão IATA 93, utilizando 4 dos aviões que pertenciam à AIA (3 Boeing 737-300 - ..., ..., e ...- e 1 Boeing 737-200 –...), além de equipamento de escritório e outro que transitou das instalações da ré AIA de Faro e Lisboa para a TAP e que somente após o despedimento tiveram conhecimento que a ré TAP continuou a actividade charter.

A ré TAP contestou, excepcionando a sua própria ilegitimidade, a caducidade do direito de accionar, a aceitação dos despedimentos, a caducidade dos contratos de trabalho dos autores e a prescrição extintiva dos direitos reclamados. Impugnou ainda os fundamentos fácticos em que os pedidos dos AA. assentam, particularmente quanto à alegada transmissão de estabelecimento, e alegou, em suma: que a deliberação de dissolução da AIA foi decidida por ela própria em Assembleia-Geral; que não ocorreu qualquer transmissão de estabelecimento, porque a ré TAP nunca deixou de realizar voos charter mesmo durante o tempo em que a AIA esteve em actividade, executando-os como actividade própria e tendo estrutura para o efeito montada; que assegurou algumas operações charter no Verão IATA com as quais a ré AIA se havia comprometido anteriormente, o que fez para evitar que os operadores turísticos exigissem judicialmente o pagamento de elevadas indemnizações, por incumprimento dos contratos; que ficou com aviões, sendo que parte eram seus e encontravam-se apenas cedidos temporariamente à AIA e outros não podiam ser devolvidos antes de esgotados o prazo dos alugueres sob pena de a AIA ter de satisfazer à locadora todas as rendas vincendas até ao final do contrato, sendo que os aviões locados serão devolvidos aos locadores findo o prazo dos respectivos contratos de locação financeira; que o equipamento de escritório e outro foi entregue à TAP como fiel depositária com o acordo da comissão liquidatária, dada a sua posição de accionista e principal credora.

A ré AIA também contestou, igualmente excepcionando a caducidade dos contratos de trabalho, a aceitação dos despedimentos e a respectiva quitação, a caducidade do direito de accionar e a prescrição dos créditos reclamados, e impugnando os fundamentos fácticos em que os pedidos dos demandantes assentam. Nessa sede, explicitou a situação de leasing dos 4 aviões que passaram para a TAP, e o acordo que ficou estabelecido entre as duas empresas, assumindo a TAP a posição de locatária, invocando que parte do equipamento foi dado à TAP para amortização do crédito que detinha sobre a ré AIA e que a dissolução da AIA se ficou a dever aos resultados negativos acumulados derivados da liberalização do transporte aéreo com desvantagens para as operadoras charter.

Em resposta às excepções os AA alegaram: quanto à caducidade do direito de acção, que terminando o prazo em férias judiciais (29.07.93), de acordo com o disposto no art. 279º e), do Cód. Civil, transferiu-se para o primeiro dia útil, ou seja, 15.09.93, dia em que foi proposta a acção; que este prazo não é de prescrição, mas sim de caducidade, não dependendo a sua interrupção da citação; quanto à prescrição de créditos prevista no art. 38º da LCT, alegam que este regime não tem aplicação dado que, havendo transmissão do estabelecimento, não há cessação dos contratos de trabalho; que ocorrendo transmissão do estabelecimento para a ré TAP os contratos não caducam; que os fundamentos invocados não são verdadeiros, dado que ocorreu transmissão do estabelecimento e que, sendo o despedimento colectivo declarado ilícito para um trabalhador, necessariamente o terá de ser para os restantes.

Em cumprimento do disposto no n.º 2 do art. 36.º do CPT (apensação obrigatória de outras acções emergentes do mesmo despedimento colectivo), foram apensados a estes autos os seguintes processos:
Proces so n.º 194/94, em que são autores (três Pilotos e uma Assistente de bordo):
1. A 49
2. A 50
3. A 51
4. A 52
Estes autores concluem a sua petição inicial com o seguinte pedido:
- julgar-se inconstitucional o disposto no art. 23º, 3, do DL 64-A/89, de 27-2, referente à presunção de aceitação do despedimento do trabalhador que aceita a compensação;
- caso não proceda este pedido, anular-se por erro o negócio jurídico consistente no recebimento da indemnização;
- serem declarados improcedentes os fundamentos invocados pela ré AIA para o despedimento colectivo, julgando-se este ilícito;
- julgar-se ilícito o despedimento dos três primeiros AA por falta de pagamento pela 1ª ré da integral indemnização;
- serem as duas rés condenadas no pagamento das retribuições intercalares que se vencerem até final como se os AA. tivessem estado ininterruptamente ao serviço;
- serem as RR condenadas no pagamento, a cada um dos AA, a título de danos morais, de uma quantia a liquidar em execução de sentença, que computam até à propositura da acção em 5.000.000$00;
- ser a ré TAP condenada a reintegrar os AA, sem prejuízo das suas categorias e antiguidades.
Em fundamento destes pedidos descrevem factualidade idêntica à alegada na acção n.º 246/93 e invocam, ainda, em suma: que os 3 primeiros AA não receberam a compensação integral, pelo que também por essa via o despedimento é ilícito (art. 24º, d), LCCT); que o normativo que institui a presunção referida no art. 23º da LCCT, está ferido de inconstitucionalidade orgânica (falta de autorização expressa da AR ao Governo sobre a possibilidade deste reduzir o direito de acção) e material (denegação do direito de acesso aos tribunais - art. 20ºCRP -, por falta de poder económico daquele que não recebe a compensação, e impossibilidade de recorrer ao tribunal do trabalhador que a recebe, violando também o principio da igualdade – art. 13º CRP); que, caso assim se não entenda, sempre esta seria uma presunção juris tantum; que a declaração de aceitação da compensação está viciada por erro, dado que os AA não tiveram consciência de que, ao receber a compensação, aceitavam o despedimento, e porque atribuíram o despedimento à situação recessiva vivida na altura decorrente da liberalização do transporte aéreo, desconhecendo que afinal a ré TAP continuaria a actividade de voos charter até ali desenvolvidos pela AIA, e que a causa do encerramento residia no interesse da TAP em eliminar uma concorrente; que sofreram danos morais (desgosto pela impossibilidade de exercerem a profissão e situação de desemprego, reflexos negativos na vida social derivados do despedimento), com a agravante de a ré TAP organizar concursos para pilotos após o despedimento colectivo, sem dar qualquer preferência aos AA.

A ré TAP apresentou contestação.
Em sede de excepção, invocou a sua ilegitimidade, a caducidade do direito de acção por decurso do prazo de 90 dias (art. 25.º, n.º 2 da LCCT), a aceitação do despedimento com o recebimento da compensação e quitação. Em sede de impugnação, reproduz fundamentalmente o já alegado no processo principal. Impugna a matéria do erro e dos danos morais e invoca que a dissolução da AIA foi ditada exclusivamente pela total inviabilidade da sua exploração económica, que não passou a explorar normalmente o mercado charter após a dissolução da AIA e que o estabelecimento da AIA não foi transmitido para a TAP encontrando-se em processo de liquidação. Refuta que se verifique a inconstitucionalidade orgânica e material do art. 23.º, n.º3 da LCCT e contesta a anulação por erro do recebimento da compensação legal para o despedimento colectivo, invocando que não houve qualquer erro e que a conduta dos AA. exprime a aceitação do esquema em que se operou o despedimento.

A ré AIA contestou por excepção, mantendo três das excepções já alegadas no processo inicial: a caducidade dos contratos de trabalho dos AA, derivada da dissolução da AIA, por impossibilidade superveniente absoluta e definitiva de a entidade patronal receber a prestação; a aceitação do despedimento com o recebimento da compensação e quitação; a caducidade do direito de acção por decorrido o prazo do art. 25.º, n.º 2 da LCCT quando foi instaurada a acção. Contesta também por impugnação nos mesmos moldes apresentados na acção principal e impugna, especificamente, as datas de admissão dos AA, a natureza regular de algumas componentes retributivas (por serem variáveis e dependerem de efectiva prestação de trabalho, ou por se reportarem a comparticipação da ré no custo de seguro colectivo de voo e de saúde pago pelo SPAC). Quanto ao mais, acompanha a impugnação da ré TAP e invoca, fundamentalmente, que as indemnizações pagas aos AA. excederam os valores legalmente devidos, que o despedimento colectivo efectuado se baseou nos fundamentos para tanto invocados pela AIA e não se efectuou uma transmissão do estabelecimento, mas uma operação de liquidação deste. Refuta, ainda a inconstitucionalidade do art. 23.º da LCCT e a existência do invocado erro.

Os AA apresentaram respostas às excepções sustentando que não há caducidade dos contratos de trabalho, por extinção da AIA, já que os mesmos se mantêm em vigor por força da transmissão do estabelecimento, que quanto aos primeiros AA. esta excepção não é invocável pois não receberam toda a a indemnização a que tinham direito e invocam, mais uma vez, que a aceitação é anulável por erro em que foram induzidos pois, afinal, a TAP pretendia eliminar uma concorrente e reduzir custos, e somente mais tarde vieram a ter conhecimento da transmissão do estabelecimento.
*
Processo n.º 196/94, em que são autores (Pilotos):
1. A 53
2. A 54
3. A 55
4. A 56
5. A 57
Os pedidos destes AA coincidem com os formulados no processo n.º 194/94, bem como os fundamentos para os mesmos invocados, sendo que, neste caso, a invocação de que receberam quantias inferiores às devidas se estende a todos os AA.

As contestações apresentadas pelas RR. coincidem, também, com as apresentadas no processo n.º 194/94, embora a ré TAP acrescente a excepção da prescrição dos créditos reclamados nos termos do art. 38º da LCCT, por ter decorrido o prazo de um ano após a cessação dos contratos de trabalho.

Os AA responderam às excepções, pugnando pela sua improcedência.
*
Processo n.º 1263/94, em que são autores (Pilotos):

1. A 58
2. A 59
3. A 60
4. A 61
5. A 62
6. A 63
7. A 64
8. A 65
9. A 66
10. A 67
11. A 68
12. A 69
13. A 70
14. A 71
15. A 72
16. A 73
17. A 74
18. A 75
19. A 76
20. A 77
21. A 78
22. A 79
23. A 80
24. A 81
25. A 82
26. A 83
27. A 84
28. A 85

Estes AA intentaram acção apenas contra a ré TAP.
Em consequência do pedido por esta formulado de chamamento da AIR ... (fls. 644), foi admitido o pedido de chamamento à autoria (despacho proferido a fls 653 do processo respectivo), e ordenada a citação da AIA.
Na petição inicial, os AA. peticionaram:
- a condenação da ré TAP a reintegrar os AA nos seus quadros e a pagar-lhes as remunerações a que têm direito, de acordo com as suas categorias e antiguidade, incluindo as retribuições intercalares que deixaram de auferir desde a cessação do contrato;
- a condenação da ré TAP a pagar a cada um dos AA indemnizações por danos morais entre 10.000.000$00 e 20.000.000$00, a serem liquidados em execução de sentença.
Em fundamento das suas pretensões invocam que a TAP detinha os instrumentos jurídicos de organização do Conselho de Administração da AIA, era a responsável pela sua operacionalidade e teve uma posição de domínio absoluto no processo de dissolução da AIA, pelo que tem que assumir as responsabilidades e a posição jurídica da AIA perante os trabalhadores, sob pena de violação da boa fé e abuso do direito. Invocam, ainda, a nulidade do despedimento colectivo, nos termos dos art.s 286.º e ss. do CC, por impossibilidade jurídica pois que a A.G. deliberou não a extinção da empresa (universalidade de elementos materiais e imateriais com vista à prossecução de um fim económico), mas antes a dissolução da sociedade (pessoa jurídica) proprietária do estabelecimento, não reflectindo a deliberação tomada na A.G. o motivo invocado para o despedimento; que o recebimento da indemnização assentou em erro na medida em que os AA tomaram como verdadeiros os motivos invocados pela ré AIA, só mais tarde tendo conhecimento de que a ré TAP continuou a actividade de voos charter; que a Comissão Liquidatária nomeada pela R. procedeu à transferência de grande parte do estabelecimento da AIA para a TAP e que sofreram danos morais pelo facto de a TAP ter aberto concursos para novos pilotos, após o despedimento dos AA, sem lhes dar preferência, e a situação de desemprego que muito os abalou psicologicamente.
A ré TAP contestou por excepção arguindo a sua ilegitimidade, a caducidade do direito de acção, a aceitação do despedimento por recebimento da compensação, a caducidade do contrato de trabalho por extinção da ré AIA, e a prescrição dos créditos reclamados. Impugnou ainda os factos articulados pelos AA. e refutou a tese de que haja sido transmitida para a TAP a empresa da AIA, cuja inviabilidade económica foi o motivo único da dissolução da AIA e do encerramento da sua actividade, bem como de que só agora a TAP tenha passado a efectuar voos não regulares, para os quais possui alvará desde antes de a AIA se ter constituído, bem como de que houvesse erro no recebimento da compensação legal pelo despedimento.
Os AA. responderam à contestação apresentada pela TAP nos termos de fls. 674 e ss. do processo apenso n.º 1263/94, sustentado a improcedência das excepções suscitadas.
A fls 461 do processo principal (vol II), foi apresentado pelos AA do proc. 194/94, articulado superveniente, relativamente à abertura de novos concursos pela TAP para recrutamento de novo pilotos, preterindo os AA. e recorrendo a pilotos de Moçambique. Este articulado foi admitido por despacho de fls 482 e a respectiva matéria deu origem ao art. 146.º do questionário.
*
Foram nomeados os Assessores e os Técnicos para os assistirem.
Não se conformando com a nomeação dos Técnicos para assistirem os Assessores, recorreram os autores dos processos n.º 194/94 e 196/94 (fls. 314 e 324), recursos que foram admitidos como agravos, com subida diferida (fls. 361).
Os Assessores juntaram aos autos o Relatório elaborado (apenso em dossier) e o seu Parecer (fls. 396 e ss.) no qual, após elencarem os fundamentos do despedimento colectivo enunciados pela AIA no documento reproduzido a fls. 22-23 destes autos, concluem que “os factos enunciados pela AIA como fundamento do despedimento colectivo apresentam consistência e foram determinantes na opção política da TAP no sentido de propor a dissolução da sua afiliada”, tendo o Técnico nomeado pelos AA. apresentado declaração de discordância.
*
Foi proferido despacho saneador em 27 de Junho de 1997 (fls 629 e ss. - vol. II, dactilografado a fls. 1252 e ss. - vol. III) – onde se decidiu logo de mérito sobre os fundamentos invocados para o despedimento, declarando-se que “se não verifica o fundamento invocado para o despedimento colectivo, sendo este ilícito”.
No que diz respeito às excepções, a excepção da ilegitimidade foi julgada improcedente e foi relegado para decisão final o conhecimento das seguintes excepções:
1º - a caducidade do direito de propor a acção de impugnação do despedimento colectivo, por ter decorrido o prazo de 90 dias fixado no art. 25º, n.º 2, do Dec. Lei 64-A/89, de 27.02 (por não se saber quando cessaram os contratos em virtude da alegada transferência do estabelecimento);
2º - a aceitação do despedimento decorrente da presunção iuris et de jure retirada da aceitação da compensação (com excepção do autor A 17), o que impediria os AA. de questionarem a licitude do despedimento (por ser controverso o alegado erro, que também depende da conclusão sobre a verificação da transferência de estabelecimento);
3º - a extinção do contrato de trabalho dos AA por caducidade, relativamente à ré AIA, derivada da sua dissolução nos termos do art. 6º, n.º 3, DL 64-A/89, porque, ainda que se considere inválido o despedimento, estaria legalmente impedida de continuar a sua actividade pois foi dissolvida por escritura pública de 19.02.93, registada em 19.04.93 (por serem controvertidos os factos relativos à transferência do estabelecimento);
4º - a prescrição extintiva dos créditos peticionados nos termos do art. 38º da LCT, em virtude de ter decorrido mais do prazo de um ano contado desde o dia seguinte ao término do contrato (30.04.93) até à citação, que no caso do processo 246/03 se atrasou por facto imputável aos AA que apresentaram uma petição deficiente, que mereceu convite de aperfeiçoamento, somente sendo apresentada nova petição inicial em 10.10.94 (também por serem controvertidos os factos relativos à transferência do estabelecimento).
Organizou-se, ainda, especificação e questionário (cf. fls. 636 verso a fls. 643. - vol. II), ambos objecto de reclamações, oportunamente decididas.
Inconformada com o despacho saneador na parte em que julgou improcedentes os fundamentos do despedimento, dele recorreu a ré AIA (cf. fls. 855 - II vol.), recurso que foi admitido como apelação e com efeito meramente devolutivo (fls. 1901 - VI vol.).
O processo prosseguiu com a audiência de discussão e julgamento (fls. 1517 - V vol.).
Foram deduzidas nos autos várias intervenções espontâneas de trabalhadores (fls. 1456 - IV vol, 1596, 1611, 1630, 1639, 1654, 1666, 1675, 1685, 1699, 1714, 1725, e 1743 - V vol.), as quais não foram admitidas (fls 1555 e 1772 - V vol.), tendo sido interposto recurso de agravo de ambos os despachos de rejeição (fls. 1767 - vol V, 1784, 1788, 1792, 1796, 1800, 1804, 1808, 1812, 1816, 1820, 1824 e 1828 - vol VI), o qual foi admitido com subida imediata e efeito suspensivo (fls. 1783, 1876, 1877 e 1900 - vol VI).

Foi, entretanto, suspensa a audiência de discussão e julgamento (fls. 1783, 2ª parte - VI vol).
Por acórdão proferido a fls. 1922 - VI vol, o Tribunal da Relação deu provimento aos recursos de agravo, ordenou o chamamento de todos os trabalhadores ainda não intervenientes no processo e negou provimento à apelação interposta do despacho saneador.
Inconformada com este acórdão, recorreu a ré AIA de revista (fls. 1941 - VI vol), e recorreu também a ré TAP no que diz respeito à matéria relativa aos incidentes de intervenção principal (fls. 1942 - VI vol).
O recurso da ré TAP não foi recebido por falta de alegação (fls. 1943, 2ª parte - VI vol).

A R. AIA apresentou as suas alegações de revista, nelas concluindo do seguinte modo:
1. A natureza, o objecto e a finalidade do processo especial de impugnação de despedimento colectivo regulado no artigo 156º - A e seguintes do CPT não consente mais do que a apreciação da licitude ou ilicitude do despedimento colectivo nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 25º nº 2 e 24º do Dec.Lei nº 64-A/89. Nada mais do que isso!
2. O próprio nº 2 do citado artigo 25º indica expressamente em que fundamentos se deve basear a causa de pedir relevante nesta acção especial o disposto no número 1 do artigo 24º.
3. Ora, o despacho saneador-sentença recorrido conheceu da licitude do despedimento colectivo efectuado, considerando-o ilícito.
4. Assim sendo, o processo finda em primeira instância com essa decisão, seja qual fôr o seu fundamento concreto, pois está esgotado o poder jurisdicional do juiz na matéria objecto desse processo especial.
5. Não pode por isso o processo prosseguir para verificação da alegada e eventual transmissão do estabelecimento e dos contratos de trabalho dos autores para a co-ré TAP. Isso é matéria objecto de processo comum.
6. Prosseguir o processo para verificação dessa matéria e admitir a própria TAP a intervir neste processo é exceder os limites do direito cuja verificação a lei confia ao processo especial de despedimento colectivo.
7. Declarada a ilicitude do despedimento, não há que saber, se ainda assim, houve ou não houve, para além daquela ilicitude, transmissão dos contratos de trabalho.
8. Mas, ainda que houvesse de prosseguir, tal deveria suceder apenas para discussão e prova do encerramento definitivo, ou não, da empresa pela recorrente Air ... e, tão-somente, com esta em juízo, excluindo-se a TAP, por não poder ser demandada neste processo especial, dada a sua qualidade de parte terceira relativamente à problemática da licitude ou ilicitude do despedimento colectivo.
9. Ao contrário do que entendeu o, aliás, douto acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de que se recorre, não se trata de nulidade da sentença a decisão proferida no despacho saneador:
1º de admitir nos autos a Ré TAP;
2º de mandar prosseguir a instância, após declarar ilícito o despedimento colectivo, para se verificar, a final, se houve ou não transmissão do estabelecimento para a TAP e, logo, também, dos contrato de trabalho dos recorridos.
10. De facto, isso não constitui objecto de sentença, pois dessa matéria não constituem as questões que lhe foram colocadas pelos autores. São meras decisões interlocutórias que, todavia, não têm cabimento neste processo especial.
11. Do que se trata é de erro de julgamento sobre a natureza, objecto e finalidade do processo especial de impugnação de despedimento colectivo, tal como se concluiu na minuta do recurso de apelação, muito embora nele tivéssemos sido levados a concluir, de jure, pela nulidade da sentença. A consequência daqueles vícios cometidos é o da nulidade das decisões proferidas no despacho saneador e como tal devem ser revogadas.
12. Assim sendo, não tinha de ser, expressa e separadamente, alegada, nos termos do artigo 72º CPT, no requerimento de interposição do recurso, podendo e devendo sê-lo, como foi, nas alegações do recurso.
13. A qualificação como erro de julgamento, e não como nulidade da sentença, é mera questão de direito e, por isso, não carecia de ser alegada no recurso de apelação.
14. O encerramento definitivo da empresa verificou-se, tendo-se extinguido os postos de trabalho.
15. Os recorridos deixaram caducar o direito de impugnar o despedimento colectivo de que foram objecto, dado que todos eles instauraram as respectivas acções de impugnação muito para além do prazo de 90 dias estabelecido no artigo 25º nº 2. do Dec. Lei nº 64-A/89.
16. O despacho saneador não podia ter conhecido da ilicitude do despedimento colectivo como conheceu com base em meros índices de eventual transmissão do estabelecimento, afastando assim liminarmente o fundamento do encerramento definitivo da empresa invocado pela recorrente.
17. Por outro lado, também não podia ter declarado aquela ilicitude sem conhecer previamente da excepção de caducidade do direito de impugnação. Deste modo, violou o dever consignado no artigo 660º nº 2 CPC e cometeu a nulidade do artigo 668º nº 1., alínea d), primeira parte, do mesmo diploma.
18. Procedendo desse modo, se transitar em julgado a decisão do saneador quanto à licitude do despedimento colectivo antes da decisão final da causa tornar-se-á inútil o conhecimento relegado para final da referida caducidade com fundamento na pretensa manutenção dos vínculos laborais pela não menos pretensa transmissão do estabelecimento para a TAP.
19. A pretensa transmissão do estabelecimento ou é um acto lícito de liquidação da massa liquidatária da reclamante e por isso não pode inquinar a validade do despedimento colectivo...
20. Ou é, ela própria, parte da fundamentação do despedimento colectivo e, então, não podia deixar o Tribunal "a quo" de conhecer no saneador da excepção de caducidade do direito de acção judicial impeditiva do conhecimento do mérito do despedimento colectivo. Todavia, tal questão ficou logo prejudicada (idem artigo 660 nº 2. CPC) com a ilicitude de que o saneador efectivamente tomou conhecimento e, erradamente embora, reconheceu e declarou.
21. Acresce, que o tribunal da primeira instância também não conheceu no saneador sentença, como devia, dos efeitos da aceitação da compensação que os recorridos receberam da recorrente, com excepção (segundo eles) de alguns deles. Tal facto significa legalmente, para aqueles que a receberam, renúncia à impugnação do despedimento colectivo.
22. Decidindo como decidiu, a decisão recorrida violou, entre outros, o disposto nos artigos 156º A e segs. do CPT, 25º nº 2 e 24º nº 1 do Dec.Lei nº 64-A/89, 4ª alínea b) e 6º do mesmo diploma e, ainda, os artigos 45º-C do CPT, 23º nº 3 CPT, 510º nº 1, alínea b), 660 nº 2 e 668º nº 1, alínea d), CPC e, por fim, artigo 156º - F, nº 1 alínea b) e nº 3 CPT.
Terminou pedindo que se julgue a revista procedente, anulando-se o acórdão recorrido, se ordene a baixa do processo ao Tribunal da Relação para ser julgada a apelação ou, se se entender de outro modo, que se julgue a presente revista procedente pelos demais fundamentos alegados.
*
O Supremo Tribunal de Justiça (por acórdão proferido em 10 de Abril de 2002, a fls. 2041 - VI vol.), apreciando da oportunidade da subida do recurso da ré AIA, não conheceu do objecto da revista e considerou que a mesma deverá subir a final e não imediatamente, por se reportar a acórdão da Relação que negou provimento à apelação do despacho saneador proferido no âmbito do processo especial de despedimento colectivo que, decidindo parcialmente o mérito da causa, declarou ilícito o despedimento por não verificado o fundamento invocado (arts. 695º e 724º, nº1 do CPC, art. 1º, nº 2 a) do CPT e arts. 15º e 25º do DL 329-A/95, de 12/12).
Em cumprimento do decidido, foi ordenada a notificação da ré AIA para indicar os trabalhadores que foram alvo de despedimento colectivo, com excepção dos AA. e intervenientes já admitidos (despacho de fls. 2046 - VI vol).
*
Após indicação de lista de trabalhadores pela ré AIA e sua citação para intervir, deduziram intervenção, passando a figurar como intervenientes principais, os seguintes trabalhadores (numeração correspondente à alínea f) da matéria assente que, por sua vez, adoptou a numeração da lista apresentada pela R. AIA a fls. 2051 e ss. vol. VII):
2. A 86 - Técnica qualificada
3. A 87- Técnico qualificado
5. A 88 - Técnica qualificada
7. A 89 - Técnico qualificado
8. A 90 - Técnico qualificado
9. A 91 - Técnico qualificado
11. A 92 - Técnica qualificada
12. A 93 - Licenciada
13. A 94 - Supervisor de tráfego
15. A 95 - Supervisor de tráfego
16. A 96 - Técnico qualificado
17. A 97 - Técnico qualificado
18. A 98- Empregada de escritório
20. A 99 - Técnica qualificada
21. A 100 - Empregada de escritório
22. A 101- Economista
23. A 102- Empregada de escritório
24. A 103- Empregada de escritório
32. A 104 - Assistente de tráfego
33. A 105- Assistente de tráfego
36. A 106- Comissário de bordo
37. A 107- Comissário de bordo
38. A 108- Assistente de bordo
39. A 109- Comissário de bordo
41. A 110- Assistente de bordo
42. A 111- Assistente de bordo
44. A 112 e A 113 - Comissário/Assistente de bordo
45. A 114 - Assistente de bordo
46. A 115 - Comissário de bordo
47. A 116 - Empregada de escritório
48. A 117 - Chefe de cabine
50. A 118 - Comissário de bordo
52. A 119 - Comissário de bordo
53. A 120- Assistente de bordo
56. A 121- Técnica qualificada
60. A 122- Assistente de tráfego
61. A 123- Empregado de escritório
62. A 124- Assistente de tráfego
64. A 125- Técnica administrativa
66. A 126- Técnica qualificada
67. A 127 - Empregada de escritório
68. A 128- Empregada de escritório
70. A 129- Empregada de escritório
71. A 130- Técnico qualificado
73. A 131- Empregada de escritório
74. A 132- Técnico qualificado
79. A 133- Empregada de escritório
80. A 134 - Técnica qualificada
81. A 135 - Assistente de tráfego
83. A 136- Técnica qualificada
85. A 137- Assistente de tráfego
87. A 138- Empregada de escritório
89. A 137- Motorista
90. A 140- Assistente de tráfego
92. A 141- Assistente de tráfego
93. A 142- Assistente de tráfego
96. A 143- Assistente de tráfego
100. A 144- Empregada de escritório
101. A 145- Empregada de escritório
103. A 146- Contabilista
105. A 147- Empregada de escritório
108. A 148- Tesoureira
111. A 149- Empregada de escritório
120. A 150- Empregado de escritório
121. A 151- Empregado de escritório
122. A 152- Assistente de tráfego
129. A 153- Assistente de tráfego
132. A 154- Assistente de tráfego

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1. A 155- Comissário de bordo
2. A 156- Assistente de bordo
3. A 157- Assistente de bordo
4. A 158- Assistente de bordo
5. A 159- Assistente de bordo
6. A 160- Assistente de bordo
7. A 161- Assistente de bordo
8. A 162- Assistente de bordo
9. A 163- Assistente de bordo
10. A 164- Assistente de bordo
11. A 165- Comissário de bordo
12. A 166- Assistente de bordo
13. A 167– Assistente de bordo
14. A 168- Assistente de tráfego
15. A 169- Assistente de bordo
16. A 170- Assistente de tráfego
17. A 171- Técnica qualificada
18. A 172- Técnica qualificada
19. A 173– Programador.
[cont. da alínea f) da matéria assente – intervenientes espontâneos que apresentaram articulado com data anterior (identificados até ao n.º13) e posterior (os identificados de 14. a 19.) ao despacho de fls.2046, que ordenou a intervenção de trabalhadores em obediência ao acórdão da Relação de fls. 1922 e ss.]

Já depois de proferida a sentença em 1.ª instância, foi ainda requerida e admitida a intervenção de:
20. A 174 (vol XX a fls. 5378 e vol XXI a fls. 5528)
21. A 175 (vol XXI a fls. 5921 e 5926).
*
As rés TAP e AIA vieram arguir a excepção de prescrição dos créditos de alguns dos trabalhadores intervenientes.
Por despacho proferido a fls. 3487 - XIV vol., a excepção de prescrição foi julgada improcedente relativamente aos trabalhadores intervenientes. Esta decisão transitou em julgado.
A ré TAP deduziu ainda três articulados supervenientes relativamente aos seguintes intervenientes:
1º - A 87, A 132, A 129 e A 125 (fls 3168-3170 - Vol XIII), articulado admitido por despacho proferido a fls 3279 e seg - XIV vol.;
2º - A 169, A 168, A 135 (fls 3343 - XIV vol), admitido por despacho preferido a fls 3453-55 - - XIV vol;
3º - A 102 e A 116 (fls 3523 - XIV vol), admitido por despacho proferido a fls 3539 - XIV vol.
Alega que os intervenientes mencionados em 1º, a interveniente A 135 mencionada em 2º, e os intervenientes mencionados em 3º, haviam rescindido o contrato antes do despedimento por iniciativa própria, facto de que recentemente teve conhecimento.
Quanto às intervenientes A 169 e A 168, mencionados em 2º, alega que, porque contratados a termo, o respectivo contrato havia caducado por comunicação de não renovação por banda da ré.
Os intervenientes A 187, A 132, A 129, A 125 e A 102, em resposta à excepção deduzida no articulado superveniente, vieram alegar uma situação de erro na rescisão dos contratos, porque desconheciam a transmissão do estabelecimento à data, tomaram como verdadeiros os motivos invocados e foram aconselhados pelo director de pessoal a rescindir os contratos para agilizar o processo. A matéria alegada pela ré relativa à rescisão dos contratos foi logo levada à especificação em aditamento ordenado e que foi objecto das alíneas D) a L).
Foi ordenado o aditamento à especificação [alínea f)] da matéria de facto relativa a todos os trabalhadores intervenientes (data de admissão, categoria e vencimento) e foi ainda determinado o aditamento ao questionário dos arts 146.º-A a 148.º de matéria relativa às respostas dos intervenientes aos articulados supervenientes da ré TAP.
Por despacho de fls 3774 - XV vol, proferido em 13 de Fevereiro de 2006, foi determinada a repetição dos actos de julgamento, anulando-se os anteriormente praticados. Este despacho foi objecto de arguição de nulidade e pedido de reforma, que foram indeferidos. Do despacho de indeferimento foi interposto recurso para o Tribunal Constitucional, não admitido no tribunal de 1ª instância, e que foi objecto de reclamação, posteriormente indeferida no Tribunal Constitucional (Ac. n.º 448/06, a fls 4719 e ss. - XVII vol).
Procedeu-se ao julgamento, que foi concluído com a decisão sobre a matéria de facto controvertida.
Os intervenientes A 122 (fls 5027 – IX vol.), A 171 e A 173 (fls 5027 e 5028 – XIX vol.), optaram pela indemnização legal em alternativa à reintegração.
Foi elaborada sentença (fls. 5059 e ss. do vol. XX) na qual foi proferida a decisão com o seguinte teor:
A) Julgo improcedentes as excepções arguidas pelas rés contra os AA de caducidade do direito de acção, de prescrição de créditos, de aceitação do despedimento/quitação, e de caducidade dos contratos de trabalho;
B) Julgo improcedentes as excepções arguidas pela ré nos articulados supervenientes relativamente aos intervenientes A 187, A 132, A 129, A 125, A 135, A 102 e A 116 (Al.s G, H, J, e L da especificação ), de cessação do contrato por rescisão de iniciativa própria ;
C) Julgo procedente a excepção arguida pela ré TAP de cessação dos contratos, por caducidade verificada no termo do prazo, e consequentemente improcedente os pedidos de declaração de ilicitude do despedimento e legais consequências relativamente às intervenientes A 169 e A 168 (al. I).
D) Condeno a ré TAP a reintegrar os AA (proc. 246/93, proc. 194/94, proc. 196/94, e 1263/94), nas categorias correspondentes, sem prejuízo da sua antiguidade, em consequência da já declarada ilicitude do despedimento em sede de despacho saneador;
E) Condeno a ré TAP a reintegrar todos os intervenientes discriminados no relatório desta sentença, nas suas categorias e sem prejuízo das sua antiguidade, com excepção das intervenientes discriminadas em C) e F) deste dispositivo;
F) Condeno as rés AIA e TAP solidariamente a pagarem aos intervenientes A 171 (nº 17) e A 173 (nº 19) indemnização legal de um mês de retribuição base, respectivamente 755,43€ e 876,56€, por cada ano completo ou fracção de antiguidade, antiguidade contada respectivamente de Abril de 1986, e ano de 1988, e até ao trânsito em julgado da presente sentença, acrescidas de juros de mora, à taxa legal, a contar também do trânsito da presente sentença;
G) Condeno as rés solidariamente a pagarem aos autores dos proc. 246/93, proc. 194/94, proc. 196/94, e 1263/94, o valor correspondente às retribuições, incluindo férias, subsídios de férias e de Natal, respectivamente desde 15.08.93, 20.03.94, 20.03.94, e 26.03.94, e até ao trânsito em julgado desta sentença, acrescidas de juros de mora, à taxa legal, a contar também do trânsito em julgado, e deduzindo-se as quantias a que se reporta o nº 2 alínea b), do art. 13º do DL 64-A/89, de 27.2, a liquidar em execução de sentença;
H) Condeno as rés solidariamente a pagarem a todos os intervenientes, com excepção dos referidas sob a alínea C ( A 169 e A 168), o valor correspondente às retribuições, incluindo férias, subsídios de férias e de Natal, a contar desde 30 dias antes da data da entrada dos respectivos requerimentos de intervenção até ao trânsito em julgado, e acrescidas de juros de mora, à taxa legal, também a contar do trânsito em julgado, deduzindo-se as quantias a que se reporta o nº 2 alínea b), do art. 13º do DL 64-A/89, de 27.2, a liquidar em execução de sentença;
I) Julgo totalmente improcedentes os pedidos dos autores de condenação da RR em indemnização por danos morais;
J) Julgo improcedente o pedido dos AA no sentido deste tribunal recusar a aplicação do disposto no art. 23º, 3, LCCT, por entender que o mesmo não é inconstitucional;
L) Anulo, por erro, a aceitação da compensação, com as legais consequências de restituição por todos os AA e intervenientes (excepto os mencionados em C do dispositivo) à ré AIA das quantias que desta receberam a título de compensação por despedimento colectivo;
M) Julgo improcedente o pedido dos AA respeitante à falta de pagamento integral da compensação que geraria por esta via ilicitude do despedimento, dele absolvendo as rés.
Custas a cargo dos autores/intervenientes e rés, na proporção [do] vencimento/decaimento.”
*
Após pedidos de aclaração da sentença formulados pelas RR. e alguns intervenientes, que foram objecto de indeferimento, as Rés TAP – ..., SA e AIR ..., SA interpuseram recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Lisboa (fls. 5438 - XXI vol.).
Também os intervenientes A 155 e outros, patrocinados pelo mesmo mandatário, apelaram da sentença e arguiram a sua nulidade (fls. 5431 - XXI vol.).
Os AA A 49 e outros (das acções n.ºs 194/94 e 196/94, fls. 5645 - XXI vol.), bem como os intervenientes A 118 e outros (identificados a fls. 5655 - XXI vol.), interpuseram recurso subordinado da sentença na parte em que nesta se ordenou a dedução das quantias a que se reporta o nº 2 do art. 13º do DL 64-A/89 de 27.02, a liquidar em execução de sentença, e arguiram a nulidade da mesma.
A interveniente A 100 arguiu a nulidade da sentença e dela interpôs recurso subordinado (fls. 5621 - XXI vol.).
Os AA A 58 e outros (acção nº 1263/94, a fls. 5784 – XXI vol.), aderiram ao recurso subordinado interposto por A 49 e outros.
Os intervenientes A 127 e outros (referidos a fls. 5786 – XXII vol.), aderiram ao recurso subordinado interposto por A 118 e outros.
Foram apresentadas contra-alegações, sendo que os AA A 49 e outros (das acções n.ºs 194/94 e 196/94 fls. 5629 - XXI vol.), ampliaram o objecto do recurso suscitando a apreciação da questão da inconstitucionalidade orgânica dos art.s 23.º, n.º3 e 25.º, n.º 2 da LCCT.

Por acórdão proferido em 16 de Janeiro de 2008 (fls. 6599 e ss. - XXIV vol.), o Tribunal da Relação de Lisboa apreciou os recursos interpostos acordando:
“A) Em julgar parcialmente procedente o recurso interposto pelas Rés e, em consequência, julgar procedente a excepção da caducidade do direito de impugnação do despedimento colectivo, relativamente aos Autores das acções nº 194/94, 196/94 e 1263/94 e intervenientes que a elas aderiram;
B) Em julgar precludido relativamente a todos os Autores, com excepção do A. A 17, o direito de impugnação do despedimento colectivo, decorrente do recebimento da respectiva compensação;
C) Consequentemente, altera-se a decisão recorrida, revogando os segmentos decisórios constantes das alíneas A) (na parte em que julgou improcedentes as excepções arguidas pela Rés de caducidade do direito de acção, excepto quanto aos AA da acção nº 246/93, e de aceitação do despedimento, quanto a todos os AA, exceptuando apenas o A 17), e das alíneas D), E), F), G), H) e L), deles absolvendo as Rés, com excepção da decisão relativa ao A. A 17 que se mantém.
D) Julgar prejudicado o conhecimento do objecto dos restantes recursos interpostos;
E) Confirmar quanto ao mais a decisão recorrida.”

Deste aresto, cuja aclaração requerida pelo A. A 17, foi indeferida em Conferência (fls. 6642 - XXIV vol e fls. 6824 - XV vol.), foram interpostos os seguintes recursos para o Supremo Tribunal de Justiça:

§ Fls. 6647 - A 1 e outros autores do processo n.º 246/93 (com excepção do A. A 20), com alegações a fls. 6894 e ss.;
§ Fls. 6654 e 6665 – A 110, com alegações a fls. 7214 e ss. e 7228;
§ Fls. 6659 – A 100, com alegações a fls. 7077 e ss.;
§ Fls. 6662 - TAP - Transportes Aéreos Portugueses, SA, com alegações a fls. 7178 e ss.;
§ Fls. 6670 – A 126, cujo recurso foi julgado deserto por falta de alegação (despacho de fls. 7283);
§ Fls. 6672 - A 58 e restantes Autores do processo n° 1263/94 e aderentes aos recorrentes subordinados A 49 e Outros, com alegações a fls. 7085 e ss.;
§ Fls. 6674 – A 127 e restantes intervenientes ali indicados, com alegações a fls. 7121 e ss.;
§ Fls. 6676 – A 118, A 105, A 108 e A 148, com alegações a fls. 6924 e ss.;
§ Fls. 6681 – A 49, A 50, A 51, A 52, A 53, A 54, A 55, A 56 e A 57, com alegações a fls. 6997 e ss.;
§ Fls. 6686 e 6700 – A 49, com alegações a fls. 7159 e ss.;
§ Fls. 6688 e 6692 e 6702 – A 102, com alegações a fls. 7186 e ss. e 7200 e ss;
§ Fls. 6706 e 6764 – A 104, A 170, A 144, A 99, A 103, A 121, A 141 e A 174, com alegações a fls. 6764 e ss.;
§ Fls. 6757 – A 131, com alegações a fls. 6882 e ss.;
§ Fls. 6810 – A 155 e Outros, intervenientes principais, e A 20, autor, todos identificados a fls. 6887, com alegações a fls. 6810 e ss.
*
Os recorrentes A 1 e outros autores do processo n.º 246/93 (com excepção do autor A 20), em número de 47, remataram as suas alegações com as seguintes conclusões:
1ª Com vénia, é entendimento dos ora Recorrentes que o douto aresto em crise, atentos os factos provados, ao decidir como decidiu, violou o disposto no art. 37º da LCT; o art. 23º, 2 do mesmo diploma legal, o art. 252º, nº 2 do Cod.Civ. e o art. 683º, nº 2, al. c) do CPC;
2ª O presente recurso incidirá assim sobre as situações jurídicas controversas que atingem os AA. acima identificados: a transmissão de estabelecimento e o erro na formação da sua vontade (à excepção do A. A 17) ao aceitarem a compensação por despedimento colectivo.
3ª Quanto à questão da transmissão do estabelecimento, e sempre com o devido respeito, entendemos que bem andou a Mta. Juiz “a quo” ao concluir que os factos provados continham indícios bastantes (fls. 77 e 78 da douta sentença) para decidir ter existido aquela transmissão, “pelo menos em parte, porque se mantém a sua identidade e prossecução da mesma actividade, passando a ré TAP a ocupar a posição jurídica de empregador nos contratos de trabalho…”.
4ª Resultam esses indícios, mormente, das respostas aos Quesitos 4º, 5º, 6º, 7º e 13º, todos do Proc 246/93; ao Quesito 37º do Proc 194/94 e das respostas aos arts. 38º, 82º e 99º do Questionário.
Com efeito,
5ª Foi a TAP, detentora maioritária do capital social da AIA, quem decidiu o encerramento desta última; e, tal como em 1985 decidiu formar a AIA e entregar-lhe a exploração de um ramo de actividade até aí explorado por si, em 1993, decidiu voltar a deter a exploração do transporte aéreo não regular.
6ª Na verdade, o despedimento colectivo e a dissolução da AIA não passaram de meios desencadeados pela própria TAP para receber uma actividade já anteriormente assegurada por si.
7ª Razão porque não podemos aceitar a conclusão da Veneranda Relação de que “a deliberação de dissolução imediata da AIA tomada pelos seus sócios, não acompanhada de qualquer outra deliberação em sentido contrário acarretava inexoravelmente o encerramento da empresa, com a consequente desintegração da organização produtiva”, pelo que “com a dissolução e subsequente liquidação da AIA não subsistiu um estabelecimento que pudesse ser transmitido.”
8ª Até porque, a existência de um processo de liquidação, voluntária ou judicial, da empresa não obsta à aplicação do regime jurídico da transmissão da empresa ou do estabelecimento, acontecendo que há transmissão mesmo quando ocorre o encerramento de uma empresa; para tanto basta que alguém continue a actividade ou parte da actividade que tal empresa vinha desenvolvendo.
Foi o que aconteceu no caso em apreço!
Com efeito,
9ª Está provada a continuidade, pela TAP, da actividade desenvolvida pela AIA (pelo menos, em parte), empresa que também adquiriu bens e equipamentos (loiças e outro material de catering, 4 aviões, material de escritório, viaturas) que lhe foram transferidas para o património independentemente do título a que o foram (seja ao abrigo de alegada compensação de créditos seja ao abrigo de cumprimento de contratos leasing onde a TAP era avalista).
10ª Daí que, após o encerramento da AIA,
a. se verificou o retorno à TAP da capacidade de realização de voos charters;
b. foram transferidos para a TAP e postos em utilização a quase totalidade dos meios materiais (software e computadores, equipamento básico, material de catering, centrais telefónicas, material de escritório, material de carga e transportes, incluindo viaturas) e aviões que suportavam a actividade da AIA;
c. mantiveram-se a trabalhar na TAP, com as mesmas funções, alguns dos anteriores trabalhadores da AIA (“alguns funcionários que exerciam funções de direcção comercial passaram a exercer funções de direcção comercial na TAP” nº 14 da especificação);
d. foram utilizados, pela TAP, durante um determinado período de tempo, os logótipos e as cores da AIA.
11ª Ou seja, a AIA cedeu à TAP bens e equipamentos que se integram no conceito de estabelecimento, ainda que esta operação tenha sido realizada à sombra de uma alegada “venda do imobilizado pelo respectivo valor contabilístico” ; e, por outro lado, parte dos voos antes realizados pela AIA, passaram a ser assegurados pela TAP - sendo certo que, se alguns deles correspondiam a compromissos antes assumidos pela AIA, outros resultaram de negociação directa pela TAP com os operadores turísticos, uma vez que os respectivos contratos podiam ou não ser renovados anualmente - o que é bem revelador da transmissão da posição de possuidor do estabelecimento e da existência de “identidade de actividade charter”.
12ª Acresce que as razões de ordem subjectiva (evitar maiores prejuízos) que levaram a TAP a assegurar tal continuidade, com os mesmos aviões e as mesmas rotas, não podem obstar à qualificação da situação em apreço como transmissão, pois, tendo sido a TAP, enquanto accionista maioritária da AIA, que convocou a assembleia extraordinária cujo único ponto da ordem de trabalhos consistia na deliberação de dissolução da AIA, terá que ser ela a responsabilizar-se pelas consequências que sabia estarem inerentes a tal deliberação.
13ª Sendo ainda certo que, a manutenção das rotas e da actividade de charter constituem um inequívoco indício que se manteve a clientela, que in casu, não serão exactamente “os mesmos passageiros”, mas o público-alvo dos voos charter e, mais concretamente, os operadores turísticos que recorrem a este tipo de voos.
14ª Por outro lado, o facto de não ter sido possível a transmissão para a TAP da licença da AIA para operar voos não regulares, não pode conduzir à conclusão a que chegou a Veneranda Relação, pois são as Recorridas que afirmam que a “TAP sempre teve, e continua a ter, a sua própria licença para operar o transporte aéreo regular e não regular...”.
Ou seja, a TAP já dispunha da autorização necessária para poder dar continuidade à actividade de voos charter...
15ª E o argumento de que o facto do estabelecimento estar vinculado a uma licença, impossibilitava o trespasse do mesmo, não pode ser relevante, porque a transmissão do estabelecimento, para efeitos laborais, não se confunde com o trespasse. O conceito de transmissão de estabelecimento é muito mais genérico, abrangendo situações de mera cessão de exploração, ou até de mera assunção de facto da exploração do estabelecimento.
16ª A manutenção dos aviões e de outros bens corpóreos, a continuação da realização das mesmas rotas e destinos e da clientela, a manutenção de trabalhadores que desempenhavam funções de direcção, o aproveitamento de elementos como os de catering e os logótipos da AIA, constituem indícios bastantes para nos permitirem afirmar que não subsistem dúvidas quanto à efectiva transmissão do estabelecimento, com a inerente transmissão da posição activa e passiva dos contratos de trabalho para o adquirente (TAP), não estando afectada portanto, a subsistência desses contratos nem o respectivo conteúdo, e tendo os trabalhadores direito à sua categoria, à sua antiguidade, às suas retribuições e a todas as demais regalias adquiridas.
17ª Indícios que vão de encontro ao que se defende no douto acórdão recorrido quando, a fls. 52, se afirma: “… o que releva é que a transmissão traduza uma situação de continuidade do estabelecimento, o que envolve a conservação da sua identidade e a prossecução da sua actividade.”
18ª Daí que, e salvo melhor entendimento, ao decidir a inexistência de transmissão de estabelecimento, o douto aresto, contrariou a legislação vigente, as directivas comunitárias, a jurisprudência nacional e a jurisprudência do TJCE. pois não considerou que a transmissão do estabelecimento pode ocorrer em várias fases, interessando sobretudo a conservação da identidade do mesmo e não o meio pelo qual se procedeu à transmissão.
Efectivamente,
19ª Para efeitos do art. 37º da LCT, o conceito jurídico de estabelecimento tem um sentido lato, abrangendo a transmissão de “partes” do estabelecimento: o que releva é que a parte destacada e transmitida constitua uma unidade produtiva autónoma com organização específica - sendo esse também o entendimento consagrado no vigente Código do Trabalho, que, no seu art. 318º, define transmissão de estabelecimento ainda que se trate de parte da empresa.
20ª Nesse sentido ainda, veja-se o douto Acordão da Relação de Coimbra de 13/10/2005 (Rec. Nº1839/05, disponível em www.trc.pt/trc):
“Na expressão «transmissão de estabelecimento» constante no art. 37º da LCT, quis o legislador consagrar uma noção ampla para ambos esses vocábulos, desde logo ao usar na letra da norma o termo «por qualquer título», de modo a abranger todas as hipóteses em que a titularidade do estabelecimento se transfere de um sujeito para outro.”;
E vide ainda:
- Acórdão de Supremo Tribunal de Justiça nº 03S2467, de 27 de Maio de 2004;
- Acórdão de Supremo Tribunal de Justiça nº 05S164, de 29 de Junho de 2005
- Acórdão de Supremo Tribunal de Justiça nº 99S330, de 06 de Abril de 2000,
Cujos resumos vêm enunciados nas alegações atrás produzidas, para lá se remetendo.
21ª É esta ainda a orientação do direito comunitário, maxime, nas Directivas nº 98/50/CE de 29 de Junho; e nº 2001/23/CE de 12 de Março.
22ª Na verdade, os tribunais dos Estados-membros estão vinculados a interpretar as leis nacionais de acordo, não apenas com as directivas comunitárias, mas também com a interpretação das mesmas realizadas pelo Tribunal de Justiça da Comunidade Europeia.
Assim, a interpretação do art. 37.º da LCT terá de ser realizada em harmonia com o diploma comunitário e com a interpretação do mesmo realizada pelo TJCE.
O douto acórdão recorrido entra em conflito directo com a jurisprudência do TJCE, pois não atribui relevância ao facto da transmissão do estabelecimento poder ocorrer em várias fases, interessando sobretudo a conservação da identidade do mesmo e não o meio pelo qual se deu a transmissão.
23ª Em face do exposto, resulta inequívoca a transmissão do estabelecimento, sendo pacífico que a mesma implica a transmissão da posição activa e passiva dos contratos de trabalho dos AA. para a adquirente TAP , com todas as consequências legais.
Ora,
24ª Havendo transmissão de estabelecimento, cairá por terra o argumento invocado pela Veneranda Relação para não dar relevância ao erro em que assentou a formação da vontade dos AA. quando aceitaram a compensação por despedimento colectivo (à excepção do A. A 17).
25ª Concluiu-se em 1ª Instância que, in casu, estamos “perante um erro- vício (falsa representação de encerramento da empresa) que interveio entre os motivos determinantes da vontade e que afecta a declaração negocial de aceitação da compensação e consequentemente de aceitação do despedimento. Ou seja, os AA. declaravam aceitar o despedimento ao receber as compensações por um motivo que afinal vieram a saber ser falso: o encerramento da empresa onde trabalhavam até ali.”
26ª E, na verdade, perante os factos apurados, maxime no nº 7 da Especificação e nas respostas aos Quesitos 14º, 29º, 72º, 30º,73º, teremos de concluir que constituiu erro relevante “os AA. encararem como inevitável o despedimento colectivo, face à alegada situação económica, financeira e operacional invocada pela AIA; entenderem como inevitável o despedimento colectivo, decorrente da situação vivida no transporte aéreo internacional após a conhecida liberalização da exploração de linhas comerciais e também em resultado da crise geral derivada da Guerra do Golfo”;
Factos determinantes para acreditarem na necessidade de encerramento da empresa, aceitando, por todas essas razões, a compensação indemnizatória, convictos de que a extinção da AIA era uma realidade inultrapassável.
27ª No caso sub judice, o motivo concreto existente à data em que os AA. receberam a compensação, era o de que a actividade desenvolvida pela AIA não teria continuidade (vd. Resposta ao quesito 51º).
Ou seja, o erro traduziu-se no desconhecimento absoluto de que a TAP iria prosseguir essa actividade, ficando com vários bens móveis da AIA, com os aviões da AIA e com as rotas que até então eram asseguradas pela AIA!!
Factos que esta Empresa omitiu aos tripulantes, sabendo ou não devendo ignorar que os mesmos eram essenciais para a formação da sua vontade.
28ª Razão porque também não compreendemos como no douto acórdão recorrido esta situação é tratada no domínio de uma “previsão do futuro”.
É certo que só no futuro os AA./ Recorrentes vieram a tomar conhecimento desses factos, mas eles existiam e correspondiam à vontade e interesse das Rés AIA e TAP ao tempo em que foi paga a compensação aos trabalhadores.
29ª Assim, entendemos que esta questão se enquadra perfeitamente no âmbito do nº 2 do art. 252º do Código Civil: erro sobre as circunstâncias que constituem a base do negócio (a cessação do contrato de trabalho com fundamento em despedimento colectivo e consequente pagamento/recebimento da compensação).
Tratava-se de circunstâncias que, sendo o suporte do negócio, estavam necessariamente pressupostas por ambas as partes e que integravam a determinante do “negócio”.
30ª Acresce que “o erro-motivo ou erro-vício inquina a própria formação da vontade negocial, quer a falsa ou inexacta representação de alguma circunstância decisiva para essa formação se refira a factos passados, quer se reporte a circunstâncias futuras” ( Ac. RP8-5-1986: CJ, 1986, 3º-190).
31ª Os AA. agiram na ignorância ou numa falsa ideia acerca de circunstâncias de facto e de direito que foram decisivas na formação da vontade.
32ª Como avaliar então este erro à luz da presunção iuris et de iure estabelecida no art. 23.º, n.º 3, do DL n.º 64-A/89, de 27 /Fev. na redacção então vigente?
Concluindo que o regime dos vícios da vontade nunca poderia ser afastado por tal presunção, a qual só valeria se a formação da vontade não tivesse sido manchada por deturpações ou circunstâncias erróneas!
33ª Assim sendo, o mero recebimento da compensação colocada à disposição dos AA., não podia constituir impedimento para que, posteriormente, procedessem à impugnação do despedimento de que foram objecto.
Ademais, importa não esquecer que, tendo-se verificado a transmissão do estabelecimento, os dinheiros por estes recebidos nunca podem ter a qualificação que se pretende.
34ª Eis porque é forçoso concluir que o erro na formação da vontade dos tripulantes que aceitaram a compensação é determinante para a anulação desse acto, assistindo-lhes o direito de impugnar o despedimento.
35ª Acontecendo até que, cabendo esse direito ao A. A 17, que o exerceu, os respectivos efeitos sempre teriam de se repercutir na esfera jurídica dos demais AA., uma vez que não se trata de uma causa pessoal.
Efectivamente, ao decidir-se a ilicitude do despedimento colectivo, esta não pode produzir efeitos só em relação a um dos trabalhadores abrangidos, mas à universalidade desses trabalhadores.
36ª Valendo, aliás, este mesmo princípio para contrariar o entendimento perfilhado pela Veneranda Relação quando defende que só os AA. dos procs. Nº 194/94 e 196/94 poderiam invocar esse erro para ver declarado que a aceitação da compensação estava viciada.
Estabelece o art. 683º, nº2, al. c) do CPC que o recurso interposto por uma das partes aproveita aos seus compartes se estes tiverem um interesse que dependa essencialmente do interesse do recorrente.
Sempre seria o caso dos autos, pois, o interesse de ver declarado o vício na formação da vontade é comum a todos os AA.
37ª O que quer significar que o erro na formação da vontade é, no caso em apreço, relevante, não podendo a aceitação da compensação indemnizatória obstar a que os mesmos impugnem o despedimento colectivo.
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A recorrente A 110 apresentou as seguintes conclusões do recurso que interpôs:
1. Verifica-se que a Recorrente, tendo sido chamada a intervir nos autos no âmbito do Processo 246/93, associou-se, a fls. 2762 e 2763, como Autora, fazendo seus os articulados dos Autores e ratificando todo o processado.
2. A acção 246/93 deu entrada em tribunal no dia 15.09.1993, sendo que o despedimento produziu os seus efeitos em 30.04.1993.
3. Face aos factos provados, a acção 246/93 foi interposta dentro do prazo dos 90 dias, pelo que, a ora Recorrente, como Interveniente que aderiu a essa acção, accionou dentro do prazo legal o direito de impugnação do despedimento colectivo.
4. Nos termos do n.º 3 do art. 23° do Decreto-lei 64-A/89, de 27/02, na redacção anterior à Lei 32/99, de 18/05, o recebimento pelo trabalhador da compensação vale como aceitação do despedimento.
5. Tal efeito apenas poderá ser atribuído nos casos da aceitação ser fruto de uma vontade bem formada e sem vícios, situação que não se verificou nos presentes autos.
6. A Recorrente aceitou receber a compensação no convencimento de que a extinção da AIA era inelutável, em resultado da liberação do tráfego aéreo internacional e da crise geral da Guerra do Golfo, desconhecendo que a TAP iria assegurar parte das operações de voos charter com o equipamento daquela, mantendo em uso os logótipos e cores da AIA, e também as rotas e contactos negociais com agentes de viagens, após a cessação do contrato de trabalho.
7. Pelo que, o efeito presuntivo não se aplica ao caso em apreço, no qual existe uma imperfeição negocial que afecta o objecto essencial da declaração e que impede a presunção de produzir os seus efeitos normais.
8. Todavia, o douto acórdão ora recorrido exclui desta análise os processos 246/93 e 1263/94, uma vez que não arguíram a anulabilidade da declaração negocial viciada, não reconhecendo o direito destes Autores impugnarem o despedimento colectivo.
9. Contudo, tal não poderá ser a interpretação correcta desta questão jurídica.
10. Ao contrário do processo comum civil, na jurisdição do trabalho os termos de interposição da acção não constituem os precisos limites dentro dos quais se mantém a decisão.
11. O art. 69º do Código de Processo de Trabalho na redacção do Decreto-Lei n.º 272-A/81 de 30/09 dispõe que o juiz deve condenar em quantidade superior ao pedido ou em objecto diverso dele quando isso resulte de aplicação à matéria provada, de preceitos inderrogáveis de leis ou instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho.
12. Se bem que os Autores não arguíram especificamente a anulabilidade, a verdade é que tal pedido resulta claramente da causa de pedir.
13. Os Autores invocaram uma situação de erro, enquanto desconhecimento da verdade de um facto que foi determinante na sua decisão, manifestada através da declaração de aceitação da compensação.
14. A entidade patronal transmitiu aos trabalhadores que o encerramento da empresa era uma realidade iminente e inevitável, para a qual a única solução benéfica seria o despedimento colectivo.
15. Os Autores assumiram essa realidade como verdadeira e com base na qual exteriorizaram uma declaração.
16. Pelo que, ao invocarem o erro da declaração como causa de pedir para fundamentar a ilicitude e improcedência dos fundamentos invocados pela Ré AIA para o despedimento colectivo, os Autores arguíram, ainda que implicitamente, a anulabilidade.
17. Em termos objectivos, dos factos invocados resulta claramente que foi arguido o erro na formação da vontade.
18. Nos termos da lei civil, o erro que recaia nos motivos determinantes da vontade é causa da anulação, pelo que a mera arguição do erro funciona como arguição da própria anulabilidade, nos termos e para os efeitos do art. 287º do CC.
19. Os Autores formularam o pedido de que os fundamentos invocados pelos Réus fossem declarados improcedentes.
20. Entre a causa de pedir e o pedido estabelece-se uma conexão por via da anulabilidade da declaração negocial.
21. Resulta, tanto da causa de pedir, como do próprio pedido, a arguição da anulabilidade, na medida em que apenas poderia ser alcançado o efeito pretendido através da aplicação da lei civil enquanto reguladora desta matéria, logo, a aplicação do regime da anulabilidade.
22. A aceitação do despedimento entende-se como declaração negocial, pelo que é aplicável o regime respeitante aos vícios da vontade.
23. A arguição da nulidade resulta do pedido e da causa de pedir.
24. Ao abrigo do princípio de condenação extra vel ultra petitum, o juiz está necessariamente obrigado a fazer coincidir o direito com o pedido.
25. Se o pedido não coincidir com a pretensão substantiva, o juiz pode, se entender que procede a pretensão substantiva, condenar, apesar de não ter sido adjectivada.
26. Em oposição ao entendimento do acórdão ora recorrido, o juiz deve sempre atingir a verdade substantiva, mecanismo que, ao contrário do que se verifica no direito civil, está ao seu alcance quando estão em causa direitos dos trabalhadores.
27. Dos factos expostos decorre que foram invocados factos suficientes para que o regime da anulabilidade seja aplicado e produza os seus efeitos quanto à ora Recorrente.
28. Afirma o acórdão recorrido que não se verificaram os requisitos necessários para desencadear a aplicação do art. 252 n.º 1 do CC.
29. A Recorrente entende que o acórdão recorrido não fez uma interpretação e aplicação correctas daquele preceito legal.
30. A invalidade da situação em causa tem que ser analisada de um ponto de vista mais amplo, caindo na aplicação do n.º 2 do art. 252 do CC, que prevê o erro sobre as circunstâncias que constituem a base do negócio.
31. O vício previsto no n.º 2, erro sobre as circunstâncias que constituem a base do negócio, é relevante independentemente do reconhecimento expresso da essencialidade dessas circunstâncias como motivo determinante da vontade, porque constituindo elas a base do negócio, estão necessariamente pressupostas por ambas as partes.
32. Não é necessário que as partes tenham reconhecido por acordo a essencialidade dessas circunstâncias como motivo determinante da declaração negocial, embora seja indispensável o conhecimento recíproco da essencialidade do erro.
33. O despedimento colectivo é um processo muito vasto, que se destina a regular em concreto a situação de cada trabalhador, face a determinadas circunstâncias conjunturais que iriam, ainda que de qualquer outra forma, levar sempre à cessação do contrato de trabalho.
34. O que as partes fazem é constatar as circunstâncias que levariam a uma inelutável extinção ou cessação do contrato, antecipar essa vicissitude e, de comum acordo, regular as condições de forma a minimizar os seus efeitos.
35. De onde resulta que o encerramento da empresa é parte do conteúdo do acordo de revogação, integrando o objecto da declaração negocial.
36. Existiu no caso em apreço um erro sobre o objecto da declaração negocial e esse erro apenas pode ser verificado após a data da declaração.
37. Sendo parte integrante da declaração negocial, este erro não podia deixar de ser reconhecido como essencial, pois, sem o encerramento, certamente, não haveria lugar a qualquer procedimento de despedimento colectivo.
38. A essencialidade do erro in casu não necessita de ser reconhecida por acordo, uma vez que é apenas a existência do encerramento da empresa como condição sine qua non que justifica a própria negociação de despedimento colectivo e a aceitação pelos trabalhadores.
39. Sem esse erro, não se tinha verificado o despedimento colectivo, uma vez que foi apenas com base nessas circunstâncias que a Recorrente declarou aceitar o despedimento, aceitando a compensação.
40. Existindo erro que determina a anulação da aceitação da compensação, temos que admitir que foi devidamente impugnado o despedimento.
41. A consideração de todos estes aspectos remete-nos para uma outra vaexata quaestio fundamental analisada pelos Juízes Desembargadores do Tribunal da Relação de Lisboa: a transmissão do estabelecimento da Ré Recorrida AIA para a Ré Recorrida TAP.
42. Não assiste razão aos Mmos. Juízes Desembargadores no raciocínio efectuado.
43. No douto acórdão, pouca ou nenhuma relevância são dadas aos seguintes factos, provados:
a) Alguns funcionários que exerciam funções de direcção comercial passaram a exercer funções de direcção comercial na Ré Recorrida TAP;
b) Foram transferidos da AIA para a TAP equipamento de escritório, loiças de bordo e quatro aviões;
c) Mantiveram-se em uso (pela Ré Recorrida TAP) os logótipos e cores da AIA, só passado algum tempo substituídos;
d) Foram realizados pela TAP voos charter já contratados pela AIA;
e) Foram mantidas rotas e contactos negociais com agentes de viagens.
44. Factos estes, que, como se demonstrará infra, são, precisamente, a base determinante de uma decisão em sentido contrário à defendida no acórdão de 16.01.2008.
45. Em primeiro lugar, há que deixar assente a circunstância de o cerne da questão da transmissão se prender com a averiguação da manutenção, ou não, de facto, da identidade da entidade transmitente.
46. São os próprios Desembargadores que reconhecem estarem abrangidas todas as hipóteses de transmissão, o que, desde logo, põe em causa a argumentação expendida na parte em que se descaracteriza a transmissão a propósito, nomeadamente, dos seguintes elementos:
a) A vinculação do estabelecimento de que a AIA era titular a uma licença, o que, alegadamente, impedia o trespasse do estabelecimento e, consequentemente, a transmissão do mesmo;
b) A inexistência de deliberação dos sócios da AIA no sentido de autorizar os liquidatários da AIA a continuar a actividade, a entregar globalmente o património da sociedade a um sócio ou a autorizar o trespasse do estabelecimento.
47. Atente-se na circunstância de não interessar a vinculação do estabelecimento de que a AIA era titular a uma licença, porquanto a noção de transmissão de estabelecimento (nos termos da lei do trabalho) não se confunde com a do trespasse - mera operação comercial.
48. Embora invoquem a interpretação do TJCE e a Directiva n.º 77/187/CEE, de 14.02.1977, não logram os Mmos. Juízes Desembargadores alcançar a perspectiva menos formal e mais prática que se deve fazer – de acordo com a doutrina e jurisprudência comunitárias – do conceito de transmissão de estabelecimento.
49. O âmbito de aplicação daquela Directiva inclui tendencialmente todos os casos em que se esteja perante uma alteração da pessoa singular ou colectiva encarregada de explorar o estabelecimento, sem que se revele necessário atender à transferência da propriedade dos elementos "físicos".
50. É, pois, teleologicamente que deve ser interpretada a norma do art. 37.º da LCT.
51. É aos efeitos que a transmissão produz, às circunstâncias fácticas que a delimitam e sustentam que se deve atender na averiguação da sua existência.
52. O que importa é que a exploração da mesma entidade económica seja assumida por outrem e não as relações existentes entre transmitente e transmissário, a forma como se opera a transmissão e/ou os bens corpóreos que são efectivamente transferidos.
53. O conceito que há que relevar é o de entidade económica; o TJCE é claro ao defini--la como um conjunto organizado de pessoas e de elementos que permitam o exercício de uma actividade económica, na prossecução de um objectivo próprio.
54. Para aferir da existência de uma entidade económica, há que adoptar um método indiciário pelo qual seja possível determinar, entre outros, os seguintes elementos:
a) Tipo de empresa ou de estabelecimento;
b) Transferência de elementos físicos (sejam eles móveis ou imóveis);
c) Valor dos elementos incorpóreos no momento da transmissão;
d) Reintegração dos efectivos pelo transmissário;
e) Transferência de clientela;
f) Grau de semelhança entre as actividades exercidas antes e depois da transmissão.
55. Tais elementos devem ser considerados, naturalmente, no seu conjunto, sob pena de, isoladamente, não serem passíveis de caracterizar a transmissão.
56. O que interessa averiguar é se se manteve, ou não, a identidade de uma entidade económica, para que possamos aferir da existência de transmissão.
57. E, in casu, existiu, de facto, uma transmissão de estabelecimento da Ré Recorrida AIA para a Ré Recorrida TAP.
58. O que tem de verificar-se na transmissão de estabelecimento (para efeitos do direito laboral) é a reconstituição - no transmissário -, como unidade económica, dos elementos que compõem a actividade económica do transmitente.
59. A tal não obsta que os elementos que compõem a unidade sejam transmitidos isoladamente, nem tão-pouco a existência de um processo, voluntário ou judicial, de liquidação da empresa.
60. O que interessa é averiguar o efeito prático atingido, e não os trâmites que se percorreram para o atingir, nada impedindo que uma pessoa colectiva se dissolva, e que uma outra pessoa, singular ou colectiva, prossiga com a exploração do estabelecimento, de tal modo que a unidade económica permaneça.
61. Tal é, aliás, o entendimento do TJCE, citado pelos Mmos. Juízes Desembargadores.
62. Pode, portanto, falar-se em transmissão, mesmo quando está em causa uma pessoa colectiva que tenha sido dissolvida.
63. Por força do princípio fraus omnia corrumpit uma situação destas não pode ter por efeito o prejuízo dos direitos dos trabalhadores.
64. O TJCE admite que a transmissão de um estabelecimento se verifique, não só após este ter sido encerrado, mas também tendo decorrido um lapso de tempo sobre a cessação da sua actividade.
65. Ora, no caso dos autos, não existiu qualquer lapso temporal entre o encerramento da AIA e a transmissão, para a TAP, da actividade da AIA, pelo que, é manifesto não ser a dissolução e consequente liquidação da AIA factor impeditivo da transmissão do estabelecimento para a Ré Recorrida TAP.
66. Outro dos argumentos usados pelos Mmos. Juízes Desembargadores para afastar a verificação da transmissão de estabelecimento, é a circunstância de a realização pela TAP de voos charter contratados pela AIA visar evitar o incumprimento dos contratos de trabalho, o que, por sua vez, faria incorrer a AIA em pesadas indemnizações.
67. Sendo manifesta a continuação da actividade da AIA pela TAP, não vislumbramos como a existência de créditos desta última sobre aquela poderá afastar a verificação da transmissão de estabelecimento.
68. Não é admissível que a racionalidade económica inerentes a este comportamento faça precludir a consideração de um dos mais relevantes indícios de se ter verificado uma transmissão de estabelecimento.
69. Verificou-se, efectivamente, a transferência de quatro aviões e mantiveram-se as rotas já contratadas pela Ré Recorrida AIA, a que acresce a circunstância (supra assinalada) de não terem sido suprimidos ab initio os logótipos e as cores da AIA - sinais distintivos daquela no comércio.
70. Por outro lado, não podemos olvidar o facto de ter sido a própria TAP (na qualidade de accionista maioritária) a convocar a Assembleia-Geral Extraordinária da Ré Recorrida AIA, cujo ponto único da ordem de trabalhos era, precisamente, a deliberação da dissolução desta última.
71. O qual foi aprovado, ipsis verbis, como a Ré Recorrida TAP o tinha proposto.
72. Não pode senão caber agora à Ré Recorrida TAP suportar as consequências da aprovação da sua proposta (em Assembleia-Geral), porquanto a eventual impossibilidade de cumprimento dos voos charter contratados - e consequente agravamento da situação patrimonial da AIA - se deveu a uma decisão, voluntária, consciente e legítima, daquela.
73. Nos termos do disposto no art. 334.º do Código Civil, «É ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito».
74. Pelo que, é manifesto que a invocação da referida causa impeditiva do direito em causa revela abuso de direito na vertente de venire contra factum proprium, imputável à Ré Recorrida TAP (cfr. art. 334º do C. Civil).
7S. Não podendo, nem devendo, consequentemente, ser atendida por esse douto Tribunal.
76. Afirmam, ainda, os Mmos. Juízes Desembargadores não se poder falar em passagem de clientela, mas não podemos, porém, corroborar esse entendimento.
77. Tendo sido, como foi, mantida pela Ré Recorrida TAP a actividade de charter, a acrescer à subsistência da imagem (pelos logótipos e cores da AIA) e à utilização das mesmas rotas utilizadas pela Ré Recorrida AIA, não podemos senão concluir, igualmente, pela manutenção da clientela.
78. O que neste domínio é relevante, não é tanto a verificação de transferência de passageiros individualizados e concretos, que poderão até não ser os mesmos, mas sim o segmento de utilizadores deste tipo de voos.
79. E, quanto a isto, assumem uma expressão não despicienda as agências de viagens com as quais as companhias aéreas deste sector - como a Ré Recorrida AIA - contractualizam as condições a oferecer aos passageiros.
80.A variabilidade de operadores turísticos é, significativamente, menor, o que reforça a ideia de transmissão do estabelecimento.
81.Foi dada como provada em sede de especificação que alguns funcionários que exerciam funções de direcção comercial da AIA passaram a exercer funções de direcção comercial na TAP.
82. Tal indício reveste particular acuidade para a aferição da existência de transmissão do estabelecimento, não só pela relevância do tipo de actividade desenvolvida - de direcção -, mas também para efeitos da aferição da existência, ou não, de transmissão de estabelecimento.
83. É que, a transmissão de estabelecimento, como é bom de ver, afectou não apenas os contratos daqueles que passaram a estar, de facto, ao serviço da Ré Recorrida TAP, mas também o de todos os trabalhadores, inclusive o da ora Recorrente.
84. A este título, não colhe a argumentação - alicerçada no art. 37º da LCT - segundo a qual a posição que dos contratos de trabalho resulta para o empregador não se transfere, caso, em momento anterior ao da transmissão, se tenha verificado a cessação dos mesmos.
85. De facto, e salvo melhor opinião, mal andariam o legislador nacional e comunitário se, no espírito das normas jurídicas relativas à transmissão de estabelecimento, quisessem permitir que o empregador pudesse fazer cessar contratos de trabalho (ainda que em momento anterior) por ocasião da transmissão de estabelecimento.
86. Daí que, in casu, se tivesse revelado necessário proceder-se a uma sindicância dos verdadeiros e reais motivos (objectivos) que sustentaram as cessações dos contratos de trabalho dos trabalhadores - entre eles a ora Recorrente - e, principalmente, a sua relação com a transmissão do estabelecimento.
87. É manifesto estarem verificados os indícios necessários à qualificação da actuação concertada das Rés Recorridas AIA e TAP como uma verdadeira transmissão de estabelecimento.
88. Transmissão essa encapotada sob a forma de dissolução da Ré Recorrida AIA - alegadamente, por motivações de ordem económica e outras - por proposta da Ré Recorrida TAP.
89. Que, por sua vez, conduziu à cessação dos contratos de trabalho dos trabalhadores da AIA, entre eles a ora Recorrente.
90. E que não teve senão o fito de frustrar os direitos e legítimas expectativas dos trabalhadores da AIA.
91. Os quais, de boa-fé, se viram na contingência de aceitar as revogações dos seus contratos de trabalho.
92. Para, mais tarde, verificarem que, afinal:
a) Alguns funcionários que exerciam funções de direcção comercial passaram a exercer funções de direcção comercial na Ré Recorrida TAP;
b) Foram transferidos da AIA para a TAP equipamento de escritório, loiças de bordo e quatro aviões;
c) Mantiveram-se em uso (pela Ré Recorrida TAP) os logótipos e cores da AIA, só passado algum tempo substituídos;
d) Foram realizados pela TAP voos charter já contratados pela AIA;
e) Verificou-se a transferência de clientela da AIA para a TAP;
f) Foram mantidas rotas e contactos negociais com agentes de viagens.
93. Nos termos do disposto no art. 4.º, n.º 1 da Directiva n.º 77/187/CEE, de 14.02.1977, relativa à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transmissão de empresa, proíbem-se os despedimentos ocasionados por motivo de transmissão do estabelecimento.
94. As normas relativas à protecção dos trabalhadores neste particular revestem carácter imperativo, no sentido de não poderem ser derrogadas quando dessa solução advier um efeito desfavorável ao trabalhador.
95. É, pois, manifesto ter sido violada a norma ínsita no referido artigo.
96. Pelo que, por violação do disposto no art. 37.º da LCT, na interpretação dada pelo art. 4.º, n.º 1 da Directiva n.º 77/187/CEE, de 14.02.1977, devem os trabalhadores – e, consequentemente, a ora Recorrida – ser considerados como continuando ao serviço da Ré Recorrida AIA na data da transmissão.
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A recorrente A 100 concluiu as suas alegações com a seguinte síntese conclusiva:
1 - a situação sub-judice não constitui uma típica e padronizada impugnação de despedimento colectivo.
2 - estando em causa também uma alegada transmissão de estabelecimento e as intervenientes nesta.
3 - pelo que não estavam os AA. vinculados ao prazo então previsto no art. 25-2 da LCCT.
4 - sendo certo que a ora recorrente aderiu à acção interposta dentro desse prazo.
5 - da factualidade provada nestes autos resulta que a ora recorrente e os restantes envolvidos receberam a compensação e deram quitação na convicção que lhes foi criada que havia efectiva e definitiva cessação da actividade empresarial a que estavam adstrito.
6 - a qual foi assumida (bem como parte substancial do activo disponível da recorrida AIA) pela recorrida TAP.
7 - pelo que se verifica, in casu, erro da recorrente quer sobre o objecto do negócio quer sobre os motivos.
8 - sendo certo também que, face à matéria provada nos autos, ocorreu uma transferência de activo identificado adstrito à actividade da recorrida AIA para a recorrida TAP pelo que, atenta até a concepção ampla com que era acolhida na melhor doutrina e na jurisprudência dominante, se verifica no caso dos autos uma efectiva transmissão de estabelecimento.
9 - daí que, ao assim não entender, tenha a douta decisão recorrida violado o art 37° do RJCIT, aprovado pelo D.L. 49408, de 23.11.1969 e os arts 251°, 252°, 287° e 289° do Código Civil.
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A recorrente TAP - ..., SA, que não se conformou com o acórdão da Relação na parte em que, relativamente a A 17(um dos AA. no Proc. n.º 246/93), julgou que “a acção procede, tal como consta da decisão recorrida”, apresentou as seguintes conclusões:
1. Como foi decidido no douto Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, o A. A 17 nunca foi trabalhador da TAP, mas sim e unicamente da AIR ..., em cujo quadro de pessoal esteve sempre integrado até ter sido abrangido pelo despedimento colectivo que produziu efeitos a 30 de Abril de 1993.
2. Também, em exacta conformidade com a verdade dos factos, no mesmo Acórdão foi doutamente demonstrado e decidido que o estabelecimento da AIR ... não foi transmitido para a TAP, seja no seu todo, seja em parte, nem mesmo a respectiva exploração passou, a qualquer título e por qualquer forma, para a TAP.
3. Assim resulta, aliás, da prova produzida na 1ª Instância.
4. Ora, quer a 1ª Instância, quer o Tribunal da Relação, apesar dos fundamentos acima invocados, estenderam indevidamente a sentença condenatória à TAP, a qual não está obrigada a reintegrar o A. A 17, nem a pagar-lhe o somatório dos salários intercalares com os respectivos juros, pela razão simples de, conforme já se referiu, não ter havido qualquer transmissão do estabelecimento da AIR ..., ou de parte dele, para a co-R. TAP.
5. Por consequência, o Tribunal da 1ª Instância devia ter absolvido a R. TAP dos pedidos formulados pelo A. A 17; não o tendo feito, devia o douto Acórdão do Tribunal da Relação ter coerentemente revogado a douta sentença na parte em que nesta foi indevidamente condenada a TAP.
6. Decidindo como decidiu, o Tribunal a quo violou, entre outras normas, o disposto no artº 37º da LCT, diploma em vigor ao tempo em que a AIR ... promoveu e consumou o despedimento colectivo que abrangeu o A.
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Os recorrentes A 58 e restantes Autores do processo n° 1263/94, concluiram as suas alegações nos seguintes termos:
a) O objecto do presente recurso está relacionado com a melhor interpretação do Artigo 37° da LCT face às Directivas nº 77/187 CEE, de 14 de Fevereiro e nº 2001/23 CE, de 12 de Março de 2001, e da interpretação das mesmas realizada pelo TJCE, bem como com a interpretação do Artigo 23°, nº 3, do Decreto-Lei nº 54-A/89, de 27 de Fevereiro face ao disposto no Artigo 4°, nº 1, das referidas directivas e a sua não aplicação por incompatibilidade com a referida norma de direito comunitário directamente aplicável.
b) Com vista a uma correcta interpretação e aplicação das normas jurídicas aplicáveis ao caso, dever-se-á proceder ao reenvio a título prejudicial ao TJCE, nos termos do Artigo 234° do TCE.
c) O Acórdão recorrido entende que a ilicitude do despedimento foi objecto de apreciação no saneador e estando pendente de recurso no STJ não se pronuncia quanto a esta, mas acerca da transmissão do estabelecimento, refere que a deliberação de dissolução da AIA acarretava o encerramento da empresa, com a consequente desintegração da organização produtiva.
d) Foi proferido despacho saneador, onde se decidiu logo de mérito sobre os fundamentos do despedimento, tendo esses sido declarados improcedentes e o despedimento colectivo ilícito.
e) Entendeu-se neste, que, na Assembleia-Geral de 19 de Fevereiro de 1993, o que se deliberou foi a dissolução da AIA e não o encerramento definitivo da empresa.
f) A AIA interpôs recurso de apelação da decisão que, no despacho saneador, julgou improcedentes os fundamentos do despedimento, suscitando as seguintes questões: nulidade do despacho saneador/sentença, nos termos do Artigo 668°, nº 1, d), do CPC, por não se haver o julgador pronunciado sobre as excepções dilatórias deduzidas pela recorrente, que impediriam o mérito da causa e nulidade do despacho saneador/sentença, com base no mesmo preceito legal, bem como nos artigos 167°-F, nº1, b) e nº3 do CPT, por se haver decidido da nulidade do despedimento colectivo, sem prévia apreciação da excepção de caducidade do direito da sua impugnação.
g) A AIA não arguiu as nulidades referidas no requerimento de interposição de recurso, como estipulava o Artigo 72° do CPT, tendo sido proferido Acórdão que não conheceu daquelas questões por extemporâneas.
h) A AIA interpôs recurso de revista para o STJ tendo sido proferido Acórdão no sentido de o recurso de revista da decisão que decretara improcedentes os fundamentos de despedimento e a respectiva ilicitude só subirá a final, não conhecendo do objecto da revista.
i) Não pode apreciar-se a questão da ilicitude do despedimento no presente recurso, devendo aguardar que seja proferido Acórdão por este Venerando Tribunal, no aludido recurso.
j) Contrariamente ao referido no douto Acórdão recorrido, não se verificou o encerramento da empresa, mas a dissolução da AIA.
k) No dia 19 de Fevereiro de 1993, foi deliberado em Assembleia-Geral Extraordinária dissolver a AIA - alínea a) da Especificação.
l) Em 26 de Fevereiro de 1993, a Administração da AIA enviou a todos os ex-trabalhadores a comunicação do despedimento a que se refere o Artigo 20º do DL 64-A/89, (quesito 146-A do Questionário) dizendo e cita-se: «a cessação do contrato de trabalho baseia-se no encerramento definitivo da Empresa, decidido em Assembleia-Geral de Accionistas de 19 de Fevereiro».
m) O pressuposto do despedimento foi o encerramento definitivo da empresa. Uma coisa é a sociedade - entidade jurídica - outra coisa é a empresa - universalidade composta de um conjunto unitário e autónomo de elementos materiais e imateriais, ordenados em vista à prossecução de finalidades económicas, como bem sustenta o Professor Menezes Cordeiro no seu douto Parecer de 28 de Março de 1993, junto com a p.i. a fls.- dos autos.
n) O que está no poder dispositivo da Assembleia Geral é, não o encerramento da empresa - acto que é da competência exclusiva das comissões liquidatárias, que, nos termos do Artigo 152º do CSC, podem dar destinos diferentes à empresa no seu conjunto e aos bens que a compõem - mas unicamente a dissolução da sociedade.
o) É assim que a comissão liquidatária pode continuar temporariamente com a actividade da sociedade, pode proceder ao trespasse de estabelecimentos, entre outros actos previstos no artigo 152°, nº 2 do CSC.
p) O que a Assembleia-geral da AIA deliberou foi, não a extinção da Empresa, mas sim a dissolução da sociedade, o que não é motivo de despedimento colectivo, como bem sustenta o Professor Menezes Cordeiro no seu Parecer de 25 de Outubro de 2007, junto aos autos a fls.-
q) Demonstrativo da plena aplicação de direito da referida distinção entre dissolução da sociedade e extinção de empresa e poderes que num e noutro caso assistem em exclusivo, respectivamente às Assembleias Gerais e às comissões liquidatárias é a realidade de facto em que se traduz o processo de liquidação da AIA.
r) A Comissão liquidatária nomeada pela TAP procedeu à transferência de grande parte do estabelecimento em que se constituía a AIA para a TAP, salvo no que se refere aos contratos de trabalho dos Recorrentes, como de seguida se demonstrará.
s) A ilicitude do despedimento decidida no saneador-sentença mantém-se; a AIA foi dissolvida sem que tenha ficado provado o seu encerramento.
t) Entende o douto Acórdão recorrido que não se verificou a transmissão de qualquer estabelecimento ou de parte dele da TAP para a AIA.
u) À data do despedimento estava em vigor o Artigo 37° da LCT. Actualmente, é jurisprudência pacífica, que o regime jurídico a que se encontra sujeita a transmissão de estabelecimento, bem como as consequências que dela decorrem para a posição jurídica dos trabalhadores, decorre do artigo 37º da LCT, a nível interno, havendo, no entanto, que recorrer ainda à Directiva nº 77/187 CEE, de 14 de Fevereiro, e à Directiva nº 2001/23 CE, de 12 de Março de 2001, respeitante à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas, estabelecimentos ou parte de estabelecimentos.
v) A Directiva nº 77/187 CEE, de 14 de Fevereiro, não foi transposta para o direito interno mas tal falta de transposição não implica que não deva atender-se à aludida directiva na resolução do caso dos autos. Neste sentido pronunciou-se o Ac. do STJ de 26/02/2003, proc. 0382467, in www.dgsi.pt.
w) Quer a doutrina, quer a jurisprudência recentes aceitam o entendimento do TJCE relativamente à teoria do efeito directo das directivas - quer o efeito vertical, quer o efeito horizontal - não transpostas que contenham regras pormenorizadas e precisas.
x) Os tribunais nacionais devem ter em conta a natureza normativa da jurisprudência do TJCE, natureza que se extrai do estipulado nos Artigos 5°, 220°, 227° e 228° do Tratado de Roma.
y) Para além da directiva acima referida, é ainda aplicável a actual Directiva nº 2001/23 CE, de 12 de Março de 2001, uma vez que esta directiva é um esclarecimento da anterior Directiva n077/187 CEE, de 14 de Fevereiro como decorre, com clareza, do seu considerando oitavo.
z) O TJCE, na sua jurisprudência nesta matéria, consagrou um conceito amplo de transmissão de estabelecimento, estipulando que as condições fundamentais para que este se verifique são que este constitua à partida uma entidade económica e que haja conservação da identidade do estabelecimento e prossecução da sua actividade após a passagem de um possuidor para outro.
aa) O que é relevante não é o conceito de empresa ou de estabelecimento mas o de unidade económica que surge, nos termos do artigo 1.º, nº 1 da referida Directiva, como «um conjunto de meios organizados, com o objectivo de prosseguir uma actividade económica, seja ela essencial ou acessória».
bb) Há que analisar, em concreto, o conjunto de circunstâncias de facto presentes neste processo e ponderar o peso relativo de cada uma delas.
cc) Saliente-se que no Artigo 318° do novo Código do Trabalho, que corresponde, com alterações, ao Artigo 37° da LCT, define-se unidade económica como o conjunto de meios organizados com o objectivo de exercer uma actividade económica principal ou acessória, em consonância com as alterações impostas pela Directiva nº 2001/23/CE, transposta para a ordem interna.
dd) Os critérios enunciados pelo TJCE mostram uma crescente independência face a critérios próprios do direito comercial, bem como a superação de uma perspectiva predominantemente material do estabelecimento e que corresponde a uma visão clássica da empresa.
ee) O meio pelo qual opera a transmissão é irrelevante, englobando-se na noção ampla de transmissão de estabelecimento todas as situações em que a titularidade de estabelecimento se transfere de um sujeito para o outro, seja a que título for, mesmo a aquisição por transmissão inválida.
ff) A teleologia da regulamentação comunitária acima identificada é a da protecção dos trabalhadores e de manutenção dos seus direitos no caso de transmissão de estabelecimento.
gg) Com relevância para a transmissão do estabelecimento ficaram provados os factos constantes da alínea c) da Especificação e os quesitos 4°, 5°, 6°, 7°, 11°, 12°, 13°, 15°, 17°,18°, 37°, 38, 75°, 76°, 77°, 78º, 79º, 80º, 81º, 82º, 95°, 96°, 100°, 105°, 106°, 107°, 108°, 109°, 111°, 112°, 114°, 115°, 116°, 117° e 145°- A, que se dão por integralmente reproduzidos.
hh) A prova dos factos não foi alterada pela Relação.
ii) Refere-se no douto Acórdão recorrido que «com a dissolução e subsequente liquidação da AIA não subsistiu um estabelecimento que pudesse ser transmitido».
jj) De acordo com a jurisprudência do TJCE, o facto de existir um processo de liquidação da empresa, quer voluntária, quer judicial, não é impeditivo da aplicação do regime jurídico da transmissão.
kk) Invoca-se, no Acórdão que está provado que o equipamento de escritório, loiças de bordo e quatro aviões e que essas transmissões ocorreram no decurso do processo de liquidação em diferentes momentos e em circunstâncias diversas, para concluir que como os referidos bens foram adquiridos como elementos isolados, resultantes do desmembramento da organização empresarial que era a AIA, falta-lhes o elemento organizatório e funcional.
ll) O facto de se transmitirem isoladamente os elementos que compõem o estabelecimento e não este como universalidade, não constitui qualquer obstáculo à transmissão, desde que esses elementos permitam a sua reconstituição como unidade económica no destinatário.
mm) Como consta da douta sentença decidiu-se, na sequência dos factos provados –
37° e 38° - que «Há uma completa situação de continuidade da actividade sem interrupção no tempo, pois que a Ré TAP logo no Verão IATA 1993 assegurou a realização de voos contratados pela ré AIA. Além desta continuidade prova-se ainda, que cumpre contratos que não são seus, bem revelador da transmissão da posição de possuidor do estabelecimento» .
nn) Mesmo que se entendesse que tinha havido uma interrupção da actividade da AIA, o que não se aceita e apenas se equaciona, sempre teria havido transmissão do estabelecimento para a TAP, como se pronunciou o Acórdão do TJCE, de 15 de Junho de 1998, processo 101/87, in http.Icuria.europa.eu/jurisp/pt.
oo) A actividade exercida pela AIA era a de voos charter ou voos irregulares. A TAP tal como resulta da resposta ao questionário, nomeadamente, dos quesitos 4°,5°,6°,12°,18°-8 e 99°, assegurou, nomeadamente, as operações de voo no Verão IATA 1993, utilizando parte do equipamento que a AIA utilizava nas sua operações, designadamente, os referidos quatro aviões, que mantiveram durante algum tempo as cores e o logótipo da AIA e, em menor frequência, por vezes, os seus próprios aviões.
pp) Acresce que, «a partir de 1 de Maio de 1993, a TAP, que se dedicava quase em exclusivo à actividade de transportes aéreos regulares, além de realizar parte dos voos já contratados pela Ré AIA no Verão IATA 1993, passou a assegurar também operações no mercado charter, que até ali não assegurava por constituirem rotas tradicionais da AIA» - quesitos 37° e 108°- tendo, em 1994, realizado e programado por si própria, após também por si própria terem sido contratados junto dos operadores turísticos do mercado – quesitos 38, 82, 109, 111, 112 e 114 e 145 -A.
qq) No que se refere à realização dos voos charter realizados em 1993, o douto acórdão recorrido começa por afirmar que à primeira vista seria um forte indício da transmissão do estabelecimento, para concluir que afinal os referidos voos foram realizados no interesse que a TAP tinha como credora e accionista da AIA para evitar que esta incorresse em pesadas indemnizações. Assim, os referidos voos deixavam de ter qualquer [valor] indiciário.
rr) A Relação de Lisboa usa argumentação que encerra uma justificação da TAP baseada em óbvio "venire contra facto próprio."
ss) Qualquer que tenha sido o motivo pelo qual a TAP ficou com os aviões que eram da AIA e realizou os voos charter do Verão IATA 1993, a verdade é que manteve os aviões, equipamentos essenciais à actividade e com eles realizou os aludidos voos.
tt) Acresce que, foi a TAP, como accionista maioritária da AIA – 65, 86% do capital social – fez a proposta de dissolução da AIA e fez aprovar essa proposta na Assembleia Geral extraordinária de 19 de Fevereiro de 1993 e que, na data em que cessou os contratos de trabalho com os trabalhadores, o domínio da TAP era absoluto - detinha 99,76% do capital social da AIA -como consta do Relatório e Contas do período de Janeiro a Abril de 1993, junto aos autos a fls.-
uu) Neste quadro, sob pena de manifesta violação do princípio da boa fé, não pode ora, a TAP utilizar tal argumento, uma vez que foi com base na sua decisão acima referida que a AIA ficou impossibilitada de cumprir a programação do Verão IATA 1993, nem tão pouco o Acórdão recorrido pode absorver este "venire contra factum próprium".
vv) O argumento utilizado de que os voos charter realizados pela TAP em 1994, por si contratados e realizados, não constituem uma continuação da actividade antes prosseguida pela AIA, não tem qualquer relevância.
ww) Os voos charter são contratados junto dos operadores turísticos, à época. Muito embora a entidade económica não se confunda com a sua actividade, o tipo de actividade desenvolvido é relevante, sendo delineada em relação às peculiaridades do caso concreto, o que é aplicável ao presente caso.
xx) O que se verificou foi que os mesmos operadores turísticos que contratavam a AIA, na sequência da sua dissolução passaram a contratar a TAP.
yy) Como se constata – quesitos 108°, 109°, 111º, 112°, 113°, 114° e 155º –, na programação de voos de Verão de 1994, mostra-se que a TAP programou os voos charter que eram efectuados pela AIA, o que revela que lhe foram encomendados pela anterior clientela dela.
zz) Sendo certo que, como consta da matéria provada – quesito 103º – a TAP não assegurava até ali voos charter de médio curso e mesmo no longo curso só fazia esporadicamente voos isolados.
aaa) Outro dos elementos relevantes a ter em consideração e não levado em conta pelo Acórdão recorrido é o que consta da resposta ao artigo 105° do questionário.
bbb) Com efeito, a manutenção de funcionários é um indício de manutenção da identidade da entidade económica como consta do Acórdão do TJCE, de 11 de Março de1997, Processo C-13/95, in http./curia.europa.eu/jurisp/pt..
ccc) Invoca-se, ainda, no douto Acórdão recorrido que o «estabelecimento de que a AIA era titular era um estabelecimento vinculado a um certo bem que era uma licença, a qual nem sequer era transmissível nos termos do DL 19/82, de 28.01, o que impossibilitava o trespasse do estabelecimento, podendo apenas ser objecto do negócio os bens singulares e não o próprio estabelecimento».
ddd) É irrelevante a forma pela qual foi efectuada essa transmissão e a sua validade ou invalidade, as quais dizem respeito às relações entre o transmitente do estabelecimento e o adquirente e não às relações destes com os trabalhadores, como se decidiu no Acórdão da Relação de Évora, de 7 de Dezembro de 1993, publicado in CJ, Ano XVIII, 1993, V vol., pág. 308 e segs.
eee) Em face do acima invocado, constata-se que se encontra provada a transmissão de estabelecimento da AIA para a TAP.
fff) Em síntese: passagem dos elementos corpóreos, essencialmente dos aviões imprescindíveis à prossecução da actividade; identidade da actividade charter prosseguida pela TAP - nomeadamente, realizando as mesmas rotas e destinos até ali realizados pela AIA; continuidade da actividade sem interrupção temporal e manutenção de alguns trabalhadores.
ggg) Pelo que, [face] ao disposto no citado Artigo 37° da LCT e da Directiva nº 77/187 CEE, de 14 de Fevereiro, é de concluir que ocorreu transmissão de estabelecimento, porque se mantém a sua identidade e a prossecução da mesma actividade.
hhh) Ao não decidir assim, o douto acórdão recorrido violou Artigo 37° da LCT, a Directiva nº 77/187 CEE, de 14 de Fevereiro, a Directiva nº 2001/23 CE, de 12 de Março de 2001, bem com a interpretação conforme a jurisprudência comunitária.
iii) Estes actos comunitários bastam para desencadear a competência interpretativa, uma vez que subsistem aqui as razões acima referidas que a justificam, tal poderá não ser evidente para este Venerando Tribunal.
jjj) A douta sentença de fls.- decidiu que pelo facto de os AA. terem aceite receber a compensação não ficam impedidos de impugnar o despedimento colectivo, uma vez que essa aceitação corresponde a uma declaração negocial viciada em erro sobre os motivos, nos termos do artigo 252°, nº 1, do CC, o que faria ressurgir o direito a impugnarem o despedimento.
kkk) Entende o douto Acórdão recorrido que não se verificam os requisitos necessários para desencadear a aplicação do Artigo 252°, nº 1, do CC.
lll) Dispunha o Artigo 23°, nº 3, do Decreto-Lei 64-A/99, de 27 de Fevereiro: «O recebimento pelo trabalhador da compensação a que se refere o presente artigo vale como aceitação do despedimento», entendendo a doutrina e a jurisprudência maioritárias que a presunção contida neste preceito era uma presunção “Juris et jure”, não podendo ser elidida por prova em contrário, por força do disposto no Artigo 350° do CC.
mmm) De acordo com o artigo 4°, nº 1, da Directiva 77/187 CEE, de 14 de Fevereiro, os contratos cuja cessação, anterior à transmissão, venha a ser judicialmente declarada ilícita consideram-se como continuando ao serviço da empresa e transmitem-se para o respectivo adquirente.
nnn) É jurisprudência comunitária constante que as normas da directiva e, designadamente as relativas à protecção dos direitos dos trabalhadores contra o despedimento em consequência da transferência, devem ser consideradas imperativas, no sentido de que não podem ser derrogadas de forma desfavorável para o trabalhador, como se decidiu, no Acórdão do TJCE, de 12 de Março de 1998, Caso Jules Dethier Equipement SAI Jules Dassy, Processo C- 319/94, In http./curia.europa.eu/jurisp/pt.
ooo) No quadro da aplicação do Artigo 234° TCE, o TJCE não é competente para se pronunciar sobre a compatibilidade de uma disposição nacional com o Direito Comunitário nem para interpretar disposições legislativas ou regulamentares nacionais, como se decidiu no Acórdão do TJCE de 30 de Abril de 1986, Caso ASJES e outros, Processo 209/84, Colectânea, pág. 1425.
ppp) No entanto, é competente para fornecer ao órgão jurisdicional nacional todos os elementos de interpretação que se prendem com o Direito Comunitário e que possam permitir-lhe apreciar essa compatibilidade para julgar o processo que lhe é submetido, como se decidiu no Acórdão do TJCE de 28 de Janeiro de 1992, Caso Bachmanm, Processo C- 204/90, Colectânea, pág. 249.
qqq) É este o motivo pelo qual o TJCE exige que o tribunal nacional esclareça qual é o enquadramento concreto, quer jurídico, quer factual, em que se incluem as questões prejudiciais que lhe são colocadas, sob pena de não as admitir.
rrr) De acordo com a jurisprudência comunitária, quando a legislação nacional se adequa, para as soluções que dá a situações puramente internas, às soluções acolhidas em Direito Comunitário, há um manifesto interesse comunitário em que para evitar divergências de interpretação, as disposições que se forem buscar ao Direito Comunitário sejam aplicadas de forma uniforme.
sss) As directivas, de acordo com a interpretação do TJCE, têm efeito directo na ordem interna desde que sejam claras e precisas e incondicionais.
ttt) Relativamente à posição hierárquica do direito comunitário em face do direito nacional, de acordo com o Artigo 8°, nº 4, da CRP, tem-se entendido que as normas comunitárias gozam de primazia sobre o direito interno.
uuu) O TJCE tem, também, o entendimento do primado do direito comunitário sobre o direito nacional, o que leva a que uma norma de direito interno que colida com uma norma comunitária ceda perante esta. O juiz nacional tem obrigação de respeitar esse primado, garantindo o efeito das normas comunitárias, devendo aplicar e interpretar o direito nacional de acordo com as disposições comunitárias.
vvv) Em síntese, podemos afirmar que de acordo com a jurisprudência uniforme do TJCE, as directivas são invocáveis em juízo contra o Estado-membro, tanto por via de excepção, como por via de acção, quando não tenham sido transpostas atempadamente, desde que sejam claras, precisas e incondicionais e criem direitos a favor dos particulares, como é o caso da directiva questionada nos presentes autos.
www) O papel do juiz nacional como juiz de direito comunitário implica a não aplicação duma norma nacional incompatível com uma norma de direito comunitário directamente aplicável, como é o caso da presunção estabelecida no Artigo 23°, nº 3, da LCCT perante o Artigo 4° da Directiva 77/187/CEE, de 14 de Fevereiro.
xxx) A "interpretação conforme" constitui uma obrigação que impende sobre os tribunais nacionais, cujo fundamento decorre nomeadamente do Artigo 10° do TCE. Se a interpretação conforme não é possível deve aplicar-se o direito comunitário e proteger os direitos que este concede aos particulares, assim como abster-se de aplicar qualquer disposição, na medida em que tal aplicação conduza, no processo em análise, a um resultado contrário ao direito comunitário.
yyy) O TJCE não fez qualquer distinção entre relações verticais e horizontais quando implementou a obrigatoriedade de interpretar o direito nacional de acordo com as directivas.
zzz) No Caso Marleasing acima referido impôs-se, na prática, uma obrigação de não aplicação de uma norma prevista no Código Civil espanhol, por contrária a uma directiva comunitária, sem se fazer qualquer referência a relação vertical ou horizontal. Tal critério é seguido pela Jurisprudência Comunitária desde então. Neste sentido, entre outros, os Acórdãos do TJCE de 14 de Julho de 1994, Caso Faccini Dori, C-91/92; de 27 de Junho de 2000, Caso Murciano Quintero, C-240/98 e C-244/98; de 26 de Setembro de 2000, Caso Engelbrecht, C-262/97, in http./cúria.europa.eu/jurísp/pt.
aaaa) Em face do que fica exposto a presunção estabelecida no Artigo 23°, nº 3, da LCCT não pode ser aplicada.
bbbb) Pelo que o douto Acórdão recorrido violou o Artigo 4° da Directiva nº 77/187 CEE, de 14 de Fevereiro.
cccc) Mas mesmo que assim não se entenda, o que não se aceita e apenas se equaciona, com relevância neste domínio ficaram provados os factos constantes da alínea b) da Especificação e os quesitos 14° e 143°, 72°, 30° e 73°, 74°, 50° e 93°, 51° e 94°, 129°, 130° e 147° que se dão por integralmente reproduzidos.
dddd) Ou seja, os trabalhadores receberam uma declaração de despedimento da AIA em que esta invocou como fundamento para esse despedimento o encerramento da empresa. Porém, posteriormente, constatam que não só não encerrou, como houve uma transferência de estabelecimento. Sendo certo que foi a actuação da AIA, ao comunicar aos recorrentes um facto falso que sabia que não se estava a verificar, que levou à aceitação destes.
eeee) Como sustenta o Professor Menezes Cordeiro no seu douto parecer de 25 de Outubro de 2007, junto aos autos a fls.-, estamos perante uma nulidade de aceitação por impossibilidade jurídica, nos termos do Artigo 280°, nº 1, do CC, o que conduz à nulidade por força do Artigo 286° do CC.
ffff) Mesmo que assim não se entenda, o que não se aceita e apenas se equaciona, a referida situação configuraria uma situação de anulação por erro sobre o objecto da declaração, nos termos do Artigo 251°, do CC., sendo evidente, quer a essencialidade do ponto em que recaiu o erro, quer a sua cognoscibilidade.
gggg) Poder-se-ia, ainda, configurar a existência de um erro sobre o objecto do negócio, nos temos do Artigo 252°, nº 1, do CC., uma vez que os Recorrentes receberam a compensação de que a AIA ia encerrar quando afinal se verificou a transmissão do estabelecimento.
hhhh) Mas, mesmo que fosse esta a situação, manter-se-ia a anulabilidade, uma vez que o acordo sobre a essencialidade dos motivos, é, neste caso, tácito.
iiii) O acordo exigido para a relevância dos motivos pode ser tácito, como se refere no douto Acórdão do STJ, de 22 de Fevereiro de 1994 ou pode consistir num "recíproco reconhecimento" sobre a relevância dos motivos.
jjjj) Pelo que o douto Acórdão recorrido violou os Artigos 23°, nº 2 da LCCT, 280°, 286°, 251° e 252°, nº 1, todos do CC.
kkkk) Pronunciou-se o douto Acórdão recorrido pela procedência da excepção de caducidade, nomeadamente, em relação à acção nº1263/94, estando, assim, precludido o direito desses Autores.
llll) Como ficou provado, nomeadamente da resposta aos quesitos nºs 50°, 51°, 93°, 94° e 143°, os Recorrentes aceitaram como verdadeiros os factos motivos invocados pela AIA, i.é., o encerramento da empresa e apenas tomaram conhecimento de um conjunto de factos donde extraíram a conclusão que houve transmissão de estabelecimento, algum tempo depois de terem recebido a comunicação do despedimento.
mmmm) Como acima se invoca, não houve encerramento definitivo da empresa, tendo-se transmitido a posição de empregador da AIA para a TAP. Consequentemente, os contratos de trabalho não cessaram tendo passado legalmente para a TAP.
nnnn) Dá-se aqui por integralmente reproduzido, o acima referido nos nºs 30 e 31 das presentes alegações.
oooo) Assim, não há qualquer caducidade por impossibilidade jurídica que conduz à nulidade por força do Artigo 286° do CC e que é invocável a todo o tempo.
pppp) Caso se entenda que existe erro sobre o objecto ou sobre os motivos, com acordo tácito quanto à sua essencialidade, tal conduz à anulabilidade "ex vi do Artigo 251° ou 252°, nº 1 do CC, respectivamente.
qqqq) Neste caso, o prazo de impugnação de despedimento terá de contar-se a partir do conhecimento do facto gerador do direito à obtenção da declaração de nulidade do despedimento por insubsistência do fundamento invocado, ou seja, o prazo de um ano por aplicação do regime geral previsto no Artigo 287° do CC.
rrrr) Pelo que, o douto Acórdão recorrido violou os Artigos 25°, nº 2 da LCCT e 280°, 286°, 251°, 252°, nº 1 e 287°, todos do CC.
ssss) No caso dos autos, a Administração da AIA, em 26 de Fevereiro de 1993, enviou a todos os ex-trabalhadores a comunicação do despedimento, a que se refere o Artigo 20° do DL 64-A/89, de 27 de Fevereiro, invocando que a cessação do contrato de trabalho se baseava no encerramento definitivo da Empresa, decidido em Assembleia-Geral de Accionistas de 19 de Fevereiro.
tttt) O encerramento definitivo da empresa permite o despedimento colectivo, desde que reunidos os demais requisitos, nos termos do Artigo 16° do Decreto- Lei nº 64-A/89, de 27 de Fevereiro.
uuuu) A extinção da sociedade implica a caducidade do contrato de trabalho, nos termos do Artigo 6°, nº 3, Decreto Lei nº 64-A/89, de 27 de Fevereiro, excepto se se verificar a transmissão do estabelecimento, caso em que se aplica o disposto no Artigo 37° da LCT.
vvvv) Mesmo que não se colocasse a questão da transmissão do estabelecimento para a TAP e consequentemente dos contratos de trabalho, o regime aplicável sempre seria o regime da cessação do contrato de trabalho resultante do despedimento colectivo.
wwww) Uma vez que se verificou a transmissão do estabelecimento, a questão nem sequer se coloca. Com efeito, os contratos de trabalho dos Recorrentes transferiram-se para a TAP, não se verificando a caducidade dos contratos de trabalho, nos termos do Artigo 6°, nº 3, do Decreto-Lei nº 64-A/89, de 27 de Fevereiro.
xxxx) Pelo que o douto Acórdão recorrido violou os Artigos 6°, nº 3 e 16° da LCCT e o Artigo 37° da LCT.
yyyy) Como refere o Professor Menezes Cordeiro, no seus doutos pareceres juntos aos autos a fls., para além das razões de direito - o não encerramento da empresa - há que ter em consideração as exigências da boa fé.
zzzz) Como aí se expõe, a AIA não era mais do que um prolongamento da TAP. Esta ao extingui-la e transferindo para si o estabelecimento, nomeadamente, os aviões – todos BOEING 737 – e clientela valeu-se do «levantamento de personalidade» para atingir os seus objectivos não permitidos por lei, ou seja, os despedimentos.
aaaaa) É contrário à boa fé o apelo feito pela TAP à diferenciação de pessoas colectivas para se eximir aos compromissos laborais da AIA.
bbbbb) A Relação de Lisboa sem prejuízo de validar um "venire contra factum próprio" branqueia a argumentação da TAP associada aos argumentos de personalidade jurídica da TAP. No mesmo texto usa dois argumentos de sinal absolutamente contrários.
ccccc) Esta situação é ainda agravada pelo facto de a TAP ter mantido e organizado cursos de BOEING 737, como decorre da matéria de facto provada, nomeadamente dos quesitos 118° a 128°.
ddddd) Pelo que, também por esta via, se impõe que a TAP assuma os contratos de trabalho dos Recorrentes.
eeeee) Os recorrentes aderiram ao recurso interposto pelos AA. A 49 e outros, nos termos do Artigo 683° do CPC que tinha como objecto a quantificação dos salários intercalares devidos aos Recorrentes, tendo sido tempestivamente arguida a nulidade da sentença, nos termos do Artigo 77°, nº 1, do CPT.
fffff) O douto Acórdão recorrido não tomou conhecimento do objecto do referido recurso, uma vez que o conhecimento dessa questão pressupunha a manutenção da condenação das RR., o que não se verificou. Assim, os recorrentes vêm ora retomar a referida questão.
ggggg) Decidiu-se na douta sentença de fls. 5059 e seguintes dos autos e cita-se: «Têm assim os AA. direito à reintegração na TAP e recebimento dos salários intercalares, desde 30 dias antes da propositura da acção e até ao trânsito em julgado, descontando-se as quantias relativas a rendimentos de trabalho que entretanto tenham auferido, nos termos do art. 13° da LCCT».
hhhhh) As Recorridas nas suas contestações não formularam o pedido de dedução das remunerações que os M., ora recorrentes, terão auferido em actividades exercidas após o despedimento.
iiiii) Não efectuaram diligências com vista a apurar se os Recorrentes auferiram quaisquer rendimentos após o despedimento, nem solicitaram ao tribunal, a notificação, da Segurança Social e dos Serviços de Finanças, a fim de estas informarem quais os montantes que os Recorrentes teriam eventualmente auferido após o despedimento.
jjjjj) Nos termos do Artigo 661°, do CPC, aplicável ex vi do Artigo 1°, nº 2, a) do CPT, a sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido, sob pena de nulidade por excesso de pronúncia.
kkkkk) No caso dos autos não é possível aplicar a condenação extra vel ultra petitum, prevista no Artigo 74° do CPT, apenas estatuída em benefício do trabalhador.
lllll) Por outro lado, face ao disposto no Artigo 264°, nº2, do CPC, aplicável ex vi do Artigo 1°, nº 2, a) do CPT, o juiz só pode basear a decisão em factos alegados pelas partes.
mmmmm) Nos termos do Artigo 668°, n01, d) e e) do CPC, aplicável ex vi do Artigo 1°, nº2, a) do CPT, a sentença é nula «quando o juiz ... conheça de questões de que não podia tomar conhecimento» ou «quando condene em quantidade superior ou em objecto superior ao pedido».
nnnnn) Pelo que a sentença é nula na parte em que ordenou que as Recorridas deduzissem aos montantes a pagar aos Recorrentes, as quantias auferidas após o despedimento, nos termos do Artigo 13°, nº 2, b) da LCCT.
ooooo) A douta sentença não podia ter relegado para execução de sentença o apuramento das quantias ora questionadas.
ppppp) A sentença apenas pode relegar para liquidação em execução de sentença a exacta quantificação do pedido quando tenha sido deduzido um pedido genérico, nos termos do Artigo 471° do CPC ou quando o autor faça apelo ao estipulado no Artigo 569° do CC.
qqqqq) A douta sentença apenas podia ter relegado para execução de sentença o apuramento dessas remunerações, caso as Recorridas tivessem pedido a compensação dos créditos reconhecidos aos Recorrentes com a remunerações que estes eventualmente tivessem auferido após o despedimento, com dedução destas no montante daquelas e tivessem provado que, após o despedimento, os recorrentes exerceram actividades remuneradas.
rrrrr) Pelo que a douta sentença violou o disposto nos Artigos 471° e 661°, do CPC, aplicáveis ex vi do Artigo 1°, nº 2, a) do CPT.
sssss) Encontram-se preenchidos os pressupostos de reenvio prejudicial nos termos do Artigo 234.° CE.
ttttt) Trata-se de uma directiva, acto previsto no Artigo 249.° CE, e o TJCE é competente para a «interpretação».
uuuuu) Se, por um lado, se reconhece aos tribunais nacionais, no julgamento dos casos concretos, a plena liberdade de interpretação e aplicação do Direito Comunitário, por outro, assegurou-se através da introdução do Artigo 234° CE que a uniformidade deste é respeitada, atribuindo ao Tribunal de Justiça a sua interpretação definitiva.
vvvvv) Com referência ao acórdão, competirá ao TJCE, a título prejudicial, decidir sobre a interpretação da Directiva 77/187/CEE, de 14 de Fevereiro, nomeadamente sobre o conceito de transmissão de estabelecimento, perante a matéria jurídica e factual do presente processo.
wwwww) O papel do juiz nacional como juiz de direito comunitário implica a não aplicação duma norma nacional incompatível com uma norma de direito comunitário directamente aplicável, como é o caso da presunção estabelecida no Artigo 23°, nº 3, da LCCT perante o Artigo 4° da Directiva nº 77/187/CEE, de 14 de Fevereiro.
xxxxx) No caso dos autos estamos perante um reenvio prejudicial obrigatório uma vez que é suscitado em processo pendente, cuja decisão não é susceptível de recurso judicial de direito interno.
yyyyy) A obrigatoriedade do reenvio comporta excepções, apreciadas pelo TJCE e, posteriormente, consagradas no Regulamento de Processo do TJCE, no artigo 104°, n.º 3. Assim: falta de pertinência da questão suscitada no processo; existência de prévia decisão do TJCE de interpretação da norma em causa ou de apreciação da validade do acto comunitário impugnado; clareza objectiva da norma em causa.
zzzzz) Caso se entenda que a interpretação correcta do direito comunitário e da sua aplicação à situação factual deve ser efectuada pelo TJCE, devem ser colocadas as seguintes questões a título prejudicial ao T JCE:
- O disposto na Directiva 77/187/CEE do Conselho, de 14 de Fevereiro de 1977, aplica-se quando a transferência for feita por uma empresa em processo de liquidação voluntária, cuja principal finalidade, é proceder à partilha dos bens entre sócios?
- Para determinar a existência de uma transferência de estabelecimento é necessário haver identidade entre as empresas da Cedente e da Cessionária ou, pelo contrário, a identidade terá de ser aferida em termos de actividade, nomeadamente, pelo facto de a empresa Cessionária continuar, de forma efectiva, a exploração da actividade da empresa Cedente?
- Constitui indício relevante de transmissão de estabelecimento:
a) a ocupação de uma quota de mercado na realização de voos charter, deixada livre por uma empresa dissolvida, caracterizada pela contratação com os mesmos operadores turísticos, a realização de voos com as mesmas rotas e utilização dos aviões da sociedade dissolvida;
b) o facto de, após a dissolução da Cedente, as funcionárias pertencentes à sua Direcção Comercial serem reintegradas na Direcção Comercial da Cessionária, precisamente com as mesmas funções na área de voos não regulares ad hoc e nos contratos de voos charter;
c) a prossecução, pela Cessionária, da actividade contratada e programada pela Cedente, após a sua dissolução, com fundamento no especial interesse que representa para a Cessionária, enquanto accionista e principal credora, pois o incumprimento dos contratos, agravavam as possibilidades de reembolso dos seus créditos, bem como o seu saldo de liquidação;
d) o facto de a clientela no mercado de realização de voos charter ser muito volátil mesmo que a Cessionária mantenha a clientela da Cedente;
e) o facto de o estabelecimento da sociedade dissolvida requerer uma licença administrativa e esta ser intransmissível.
- O Artigo 4.°, nº 1, da Directiva 77/187/CEE do Conselho, de 14 de Fevereiro de 1977, que não foi transposta para o ordenamento nacional português, aplica-se directamente no sentido de derrogar, com um intuito mais favorável para os trabalhadores, a presunção iuris et de iure da norma prevista no revogado Artigo 23.°, n.º 3 do Decreto-Lei nº 64-A/89, de 27 de Fevereiro, que dispõe que o recebimento pelo trabalhador da compensação a que se refere o presente artigo vale como aceitação do despedimento, e tem como consequência a impossibilidade legal de o trabalhador requerer a suspensão judicial do despedimento, tal como a sua impugnação?
Terminam pedindo a revogação do acórdão recorrido.
*
Os intervenientes A 127, A 134, A 91, A 87, 124, A 98, A 138, A 132, A 94, A 143, A 90, A 101, A 89, A 128, A 145, A 147, A 86, A 88, A 92, A 129, A 123, A 136, A 130, A 151, A 150, A 93, A 133, A 146, A 117 e A 97 (intervenientes), apresentaram um núcleo conclusivo praticamente idêntico ao dos anteriores recorrentes autores do processo n° 1263/94 com a especificidade de questionarem também a questão da quantificação dos salários intercalares, e a condenação das RR. nas retribuições vencidas desde 30 dias antes da entrada dos respectivos requerimentos de intervenção (vide as alegações a fls. 7121 e ss.)
São as seguintes, as conclusões, no que de específico têm relativamente aqueles recorrentes:
(...)
fffff) Os Recorrentes aderiram ao recurso interposto pelos intervenientes A 118 e outros, nos termos do Artigo 683° do CPC que tinha como objecto, quer a quantificação dos salários intercalares devidos aos Recorrentes, quer a condenação das RR., ora Recorridas, nas retribuições vencidas 30 dias antes da entrada dos respectivos requerimentos de intervenção, tendo sido tempestivamente arguida a nulidade da sentença, nos termos do Artigo 77°, nº 1, do CPT.
(...)
ttttt) As recorridas foram [condenadas] a pagar aos intervenientes o montante dos salários vencidos, incluindo férias, subsídios de férias e de Natal intercalares, a contar desde 30 dias antes da data da entrada dos respectivos requerimentos de intervenção.
uuuuu) De acordo com o disposto no Artigo 156-A do CPT, na sua anterior redacção: «Nas acções de impugnação de despedimento colectivo deve o réu requerer, dentro do prazo para a contestação, o chamamento para intervenção dos trabalhadores com legitimidade processual, nos termos do regime jurídico aprovado pelo Decreto-Lei nº 64-A/89, de 27 de Fevereiro, não se aplicando, neste caso, o disposto no nº 2 do artigo 357º do Código do Processo Civil.».
vvvvv) As recorridas não deram cumprimento ao estabelecido neste preceito legal, razão pela qual o chamamento dos intervenientes só veio a ocorrer muito depois, quer por via espontânea, quer de forma provocada.
wwwww) A douta sentença devia, no mínimo, ter condenado as Recorridas ao pagamento das retribuições a contar da data em que terminou o prazo da contestação destas, uma vez que os intervenientes deviam ter tido intervenção na sequência desta.
xxxxx) Pelo que, a douta sentença ao condenar as recorridas no pagamento às intervenientes que estes auferiram a partir de 30 dias antes da entrada dos respectivos requerimentos de intervenção violou, nomeadamente, o Artigo 13°, nº 2, a) do Decreto-Lei 64-A/89, de 27 de Fevereiro e o Artigo 156°-A, do CPT, na sua anterior redacção.
(...)
*
8º Os recorrentes A 118, A 105, A 108 e A 148 apresentaram as seguintes conclusões:
Quanto à aceitação do despedimento
1. É irrelevante a aceitação das compensações, pelo erro em que os ex-trabalhadores da AIA incorreram ao recebê-las, tendo sido inteiramente acolhida pela douta sentença da 1 ª instância a argumentação por eles nesta matéria expendida.
2. O acórdão ora em recurso, porém, adoptou, no que respeita ao erro, tese oposta, cuja crítica abaixo se abordará. Para aí se remete.
3. O então nº 3 do artigo 23º da LCCT limitava-se a estabelecer uma mera presunção "juris tantum", admitindo prova em contrário, tese que as instâncias não aceitaram.
4. A Lei 32/99, de 18/5, veio revogar, pura e simplesmente, tal preceito e o Código do Trabalho, entretanto entrado em vigor, veio a consagrar a posição que doutrinariamente se impunha: a de que o recebimento da indemnização é mera presunção "juris tantum" de aceitação do despedimento.
5. Ao contrário do que decidiram as instâncias, já então devia interpretar-se o nº 3 do artigo 23º da LCCT como estabelecendo uma mera presunção "juris tantum", sendo certo que, no caso sub analise, uma tal presunção deve ter-se por exuberantemente ilidida e mesmo prejudicada, ainda, pela procedência da invocação do erro como vício de vontade referido ao acto do recebimento da indemnização.
Da insconstitucionalidade orgânica e material do artigo 23º nº3 do DL 64-A/89, de 27 de Fevereiro
1. Ao contrário do que decidiram as instâncias, o disposto no nº 3 do artº 23º da LCCT não podia ser aplicado por ser norma ferida de inconstitucionalidade.
2. O legislador ordinário confiscou, ao trabalhador que recebeu a compensação, o direito de impugnar judicialmente o despedimento, ou seja, confiscou-lhe o respectivo direito de acção.
3. A lei 107/88, de 17 de Setembro, lei habilitante, não autorizou o governo a estabelecer na lei ordinária um tal confisco do direito de acção, sendo certo que se trata de matéria da competência reservada da Assembleia da República.
4. A norma em apreço constitui inesperada e ilícita redução do quadro de garantias dos trabalhadores em caso de despedimento colectivo sendo desconhecida do ordenamento vigente à data da lei de autorização.
5. Está assim o preceito em causa ferido de inconstitucionalidade orgânica por violação do disposto no artigo 165º da Constituição da República Portuguesa.
6. Enquanto injustificada constrição do direito de acesso aos tribunais o preceito em causa (artigo 23º nº 3 do DL 64-A/891 de 27 de Fevereiro) viola o disposto no artigo 20º nº 1 da CRP, sendo materialmente inconstitucional.
7. Por outro lado, o referido normativo estabelece uma condição económica como condição de acesso à Justiça.
8. Se o trabalhador não receber a compensação pelo seu despedimento pode impugná-lo judicialmente; se receber tal compensação já não pode donde resulta que o apontado preceito faz afinal depender o acesso à Justiça da situação económica do trabalhador.
9. Com efeito se o trabalhador e/ou o seu agregado familiar não tem recursos económicos para enfrentar o desemprego sem receber a respectiva indemnização não tem o direito de impugnar o despedimento.
10. Afinal o direito de acção depende de "condição de recursos": é só para quem tem suficiente poder económico, privilegiando o ter em detrimento do ser.
11. Denega-se, pois, o direito de acesso aos tribunais ao trabalhador economicamente carenciado, do mesmo passo que se institui uma intolerável discriminação entre trabalhadores, entre cidadãos.
12. Nesta justa medida o artigo 23º nº 3 do DL 64-A/89 viola os artigos 13º nº 2 e 20º nº 1 da Constituição da República Portuguesa, pelo que está inexoravelmente ferido de inconstitucionalidade material.
Da caducidade do direito de acção
1. As então RR. AIA e TAP não cumpriram o disposto no artigo 156º-A do então CPT e só mais tarde foi ordenado, pelo Tribunal da Relação e por esse Supremo Tribunal o chamamento de todos os ex-trabalhadores da AIA, que foram objecto do despedimento colectivo.
2. Não se operou, pois, quanto a nenhum dos Recorrentes, a caducidade do direito de acção de impugnação do despedimento colectivo.
3. Na verdade, se a primeira acção entrou em tempo em juízo no prazo de 90 dias e se, pelo regime processual aplicável sempre os demais ex-trabalhadores abrangidos pelo despedimento colectivo teriam que ser chamados ao processo, então não se vê como possa ter operado a caducidade do direito de acção destes.
4. E também não se perceberia muito bem que o Tribunal da Relação e esse Supremo Tribunal tivessem ordenado o chamamento de todos os ex-trabalhadores da AIA a intervir no processo, se estivesse quanto a eles caducado o direito de acção.
5. Finalmente, ainda quanto à pretensa caducidade do direito de acção, dir-se-á, com a M.ma Juíza da 1 ª Instância, que "a aplicação do prazo de caducidade do direito de acção pressupõe um quadro normal no que respeita aos motivos revelados pela entidade empregadora para o despedimento, isto é, que aquela dá a conhecer aos trabalhadores a realidade dos factos e que, na sua posse, estes, se forem diligentes, logo o podem impugnar caso não aceitem aquela realidade ou a sua suficiência como fundamento lícito do despedimento".
6. Porém, foi trazida aos autos uma realidade muito especial, tendo sido invocada uma situação de erro no recebimento das indemnizações e uma situação de erro com respeito aos motivos invocados pela R. AIA para fundar o despedimento colectivo.
7. Não se afigura razoável sustentar que o prazo de caducidade do direito de acção estaria a correr mesmo antes de os AA. terem tomado conhecimento de todos os factos atinentes à transmissão do negócio e do "estabelecimento" da AIA para a TAP.
8. Nem lhes seria possível exercer o direito enquanto se mantivessem em erro no que respeita à real motivação da AIA e da TAP.
9. Assim, sempre disporiam os AA. do prazo de um ano que a lei estabelece para ser suscitada a anulabilidade dos negócios jurídicos viciados de erro, prazo esse contado da cessação do vício (momento em que o declarante se apercebe do erro).
10. Ao contrário do que decidiu o tribunal “a quo”, não se verificou, pois, a caducidade do direito de acção.
11. Ao decidir como decidiu, o Tribunal “a quo” violou designadamente o disposto no artigo 156º-A do então CPT e o artigo 287º do Código Civil.
Do erro
1.. Os Recorrentes dos procs. 194 e 196/94 alegaram, e provaram, que
(a) entenderam como inevitável o despedimento colectivo, e decorrente da situação vivida no transporte aéreo internacional após a conhecida liberalização da exploração das linhas comerciais, e também em resultado da crise geral derivada da Guerra do Golfo (artº 72º Proc. 196/94 e artº 29º Proc. 194/94);
(b) situação que consideraram como causa da necessidade de encerramento da AIA (73º Proc. 196/94 e 30º Proc. 194/94);
(c) aceitaram receber a compensação no convencimento de que a extinção da 1ª Recorrida era inelutável e resultante das indicadas causas (93º Proc. 196/94 e 50º Proc. 194/94);
(d) no momento do despedimento, nunca perspectivaram a possibilidade de a TAP poder continuar a actividade de voos "charter" até então prosseguida pela 1ª Recorrida (74º Proc.196/94);
(e) nessa altura, os Recorrentes não tinham conhecimento de que, após a cessação dos seus contratos de trabalho, a Recorrida TAP realizaria pelo menos parte das operações de voos “charter” até ali assegurados pela Recorrida AIA, nem tão pouco que a TAP ficaria com parte do equipamento daquela, incluindo aviões (94º Proc. 196/94 e 51º Proc. 194/94);
2. O Aresto sob recurso desde logo inadequadamente afasta a jurisprudência decorrente do douto Acórdão desse Supremo Tribunal de Justiça junto pelos ora Recorrentes aos autos.
Na verdade,
3. O encerramento de secção apreciado naquele Acórdão não difere, na sua natureza, do encerramento da AIA sendo, como são, num caso e noutro, encerramento de estabelecimento em que laboravam os trabalhadores envolvidos;
4. Por outro lado, como bem se decidiu naquele Acórdão, são distintos os planos de intervenção dos artºs 287º, 1 do Cód. Civil e 25º, 2 da LCCT, inexistindo entre ambos os normativos uma relação de “lex generalis / lex specialis";
5. Embora qualificando o erro dos Recorrentes como erro sobre o objecto do negócio, o certo é que o Acórdão recorrido reconhece a relevância do mesmo desde que se tenha por verificada a transmissão do estabelecimento da Recorrida AIA.
6. Contrariamente ao decidido no Acórdão sob recurso, não se verifica um “error in futurum”.
Na realidade,
7. Os Recorrentes entenderam o despedimento colectivo e aceitaram a respectiva compensação no convencimento de que a cessação dos seus contratos de trabalho era uma inelutável decorrência da liberalização do espaço aéreo e da crise económica subsequente à Guerra do Golfo;
8. A falsa representação da realidade existia já no momento da concretização do negócio rescisório;
9. O erro sobre as circunstâncias do negócio gera a anulabilidade do negócio, devendo a remissão para o artº 437º do Cód. Civil ser entendida com o sentido de indicar apenas os pressupostos respectivos (Mota Pinto, "Teoria Geral do Direito Civil", pág. 385), isto é, que a "exigência das obrigações assumidas pelo errante afecte gravemente os princípios da boa fé e não esteja coberta pelos riscos próprios do contrato";
10. A "base do negócio" consiste numa "representação de uma das partes, conhecida pela outra e relativa a certa circunstância basilar atinente ao próprio contrato e que foi essencial para a decisão de contratar" (Menezes Cordeiro, "Tratado de Direito Civil Português", 1ª ed. Parte Geral Tomo I, pág. 546);
11. A falsa representação das circunstâncias que constituem a base do negócio não carece de ser bilateral igualmente se não exigindo o acordo quanto à essencialidade (Pedro Pais Vasconcelos, "Teoria Geral", pág. 669 e Menezes Cordeiro, "Tratado" pág. 547);
12. A falsa representação dos elementos essenciais para a formação de vontade torna a exigência do cumprimento do negócio concluído gravemente contrária aos princípios da boa fé (Menezes Cordeiro, "Tratado", pág. 547);
13. No sentido da não exigência de reconhecimento, por acordo, da essencialidade das circunstâncias, se pronunciou já esse Supremo Tribunal em Acórdão de 10.12.85, Proc. 073026, Solano Viana, in www.dgsi.pt);
14. A falsa representação dos elementos essenciais que motivaram os Recorrentes à celebração do negócio é causa de anulabilidade, como requerida atempadamente;
15. O douto Acórdão recorrido violou o disposto no nº 2, do artº 252º do Cód. Civil devendo, no que à relevância do erro diz respeito, ser substituído por Acórdão desse Supremo Tribunal que, reconhecendo a relevância do erro dos Recorrentes, anule a aceitação do despedimento colectivo e a subsequente aceitação da compensação.
Até porque, ocorreu a transmissão de estabelecimento.
Da transmissão do estabelecimento - Pedido de reenvio prejudicial
1. Sobre a matéria da transmissão do estabelecimento regia ao tempo a Directiva 77/187 /CEE, de 14/02/77 (hoje a a Directiva 2001/23).
2. O TJCE tem vindo a pronunciar-se em diversos acórdãos sobre a aplicação da Directiva 77/187 /CEE, hoje 2001/23, cabendo sublinhar que esta última representa um mero esclarecimento da anterior, que entretanto fôra já objecto de alteração pela Directiva 98/50/CE, sendo, por isso, aplicável ao caso dos autos, ainda que haja sido publicada posteriormente.
3. Pelo menos uma parte da argumentação expendida pelo Tribunal da Relação de Lisboa (mormente quando olvida que a transmissão do estabelecimento pode fazer-se em várias fases, quando menciona que o estabelecimento implicava uma licença e seria por isso intransmissível, quando afirma que só foram transmitidos elementos soltos do estabelecimento, recusando a análise global de todos os índices usualmente apontados pelo TJCE para indagar da transmissão, etc.) contraria o sentido da jurisprudência do TJCE (vide por exemplo acórdão Nurten Güney-Gõrres e Gul Demir, de 15 de Dezembro de 2005, processos apensos C-232/04 e C-233/04, CJ, 2005, págs. 11237 e ss.).
4. É patente que o TJCE privilegia o resultado prático das operações que têm por objecto a transmissão do estabelecimento, dando relevância a índices factuais e não a aspectos formais que o Tribunal da Relação de Lisboa e outra jurisprudência nacional vêm valorizando.
5. Sobre a matéria ora em apreço se pronunciou o Sr. Prof. Júlio Gomes, em extenso artigo, já referido na sentença da 1 ª Instância, publicado na RDES 1996, com o título "O conflito entre a jurisprudência nacional e a jurisprudência do tribunal das Comunidades Europeias em matéria de transmissão do estabelecimento".
6. Pelo exposto e dada a importância desta parte da problemática "sub judice", os Recorrentes requerem a esse Supremo Tribunal que, considerando a matéria-de-facto acima referenciada, submeta ao Tribunal de Justiça, em reenvio prejudicial, a decisão sobre a questão de saber se a interpretação das referidas Directivas, efectuada por aquele Tribunal de Justiça, se mostra consentânea com a interpretação e aplicação do artigo 37º da LCT, a que procedeu o Tribunal da Relação de Lisboa, no caso em apreço.
Da transmissão do estabelecimento, propriamente dita
1. Ao tempo em que se verificou a decisão de dissolução da Recorrida Air ..., adiante apenas AIA, a transmissão do estabelecimento regia-se pelo artigo 37º da LCT.
2. Havia que ter então também já em conta quanto dispunha a Directiva 77/187/CEE, de 14/02/77.
3. A doutrina da Directiva foi, porém, interpretada e aplicada de forma restritiva e tecnicamente incorrecta pelo acórdão "sub judice".
4. Se bem aplicarmos a sua doutrina, forçoso será concluir pela transmissão do estabelecimento e dos contratos de trabalho da AIA para a TAP, sendo certo que a jurisprudência do TJCE tem insistentemente afirmado um conceito amplo de transmissão do estabelecimento, bastando-se para o efeito com exigências mínimas de identidade do estabelecimento ou parte dele e de continuidade da actividade após a mudança de titular.
5. Como resulta da matéria de facto provada, a Recorrida AIA decidiu dissolver-se.
6. Mas o negócio que a AIA prosseguia - o transporte aéreo não regular - foi, todo ele, transmitido pela comissão liquidatária da AIA à Recorrida TAP, que, sem qualquer quebra ou descontinuidade, o fez seu.
7. E, como se verificou a transmissão, para a TAP, da totalidade do estabelecimento e do negócio da AIA, não há necessidade de longas dissertações ou indagações sobre questões como a da preservação da identidade do estabelecimento.
8. De resto, a TAP passou a utilizar parte do equipamento de voo da AIA, tendo-lhe mudado, passado algum tempo, as cores e o logotipo, que passaram a ser as da TAP.
9. Aliás, com a M.ma juíza, sublinhamos, em síntese, que:
i. A actividade da AIA era desenvolvida numa unidade económica susceptível de transmissão;
ii. verifica-se identidade da actividade "charter" que a AIA desenvolvia e da actividade "charter" que a TAP herdou e continuou a desenvolver;
iii. Há uma completa situação de continuidade da actividade sem interrupção no tempo;
iv. Verifica-se também a passagem de elementos corpóreos, como equipamentos de mobiliário, "loiças" de avião e, acima de tudo, 4 aeronaves.
10. É manifestamente indiferente para a problemática da transmissão do estabelecimento saber a que título se verificou a transmissão das aeronaves e dos demais bens.
11. Afigura-se de todo evidente aos Recorrentes que o complexo jurídico-económico - para utilizar a linguagem do acórdão do STJ de 29/4/99, in BMJ nº 386, pág. 36 - onde os mesmos prestavam o seu trabalho foi transmitido à TAP.
12. Ao decidir como decidiu, o acórdão sob censura violou, designadamente, o artigo 37º da LCT e a Directiva 77/187/CEE, de 14/02/77, com as alterações da Directiva 98/50/CE e da Directiva 2001/23.
Da preclusão da possibilidade de alterar o saneador-sentença quanto à declaração de ilicitude do despedimento colectivo
1. O saneador-sentença não pode já ser alterado, na parte em que declarou a ilicitude do despedimento colectivo.
2. Desta decisão foi interposto recurso de apelação pela R. AIA em que, entre outras, foram suscitadas as seguintes questões:
i. a nulidade do saneador-sentença nos termos do disposto no artº 668º, 1, d), do CPC, por não se haver o julgador pronunciado sobre as excepções dilatórias deduzidas pela recorrente, que impediriam o conhecimento do mérito da causa.
ii. a nulidade do saneador-sentença, com base no mesmo dispositivo como nos artºs 167-F, 1, b) e 3º do CPT, por se haver decidido da nulidade do despedimento colectivo, sem prévia apreciação da excepção da caducidade do direito da sua impugnação.
3. Sucede que a Apelante não arguiu as nulidades referidas no requerimento de interposição do recurso, expressa e separadamente, como determinava que o tivesse feito o artº 72º do CPT.
4. Deste modo, por extemporâneas, não foram aquelas questões sequer conhecidas pelo douto Acórdão da Relação.
5. Deste Acórdão, foi pedida revista pela R. AIA.
6. A interposta Revista não foi ainda, julgada, uma vez que o Supremo Tribunal de Justiça entendeu que "O presente recurso de revista apenas deverá subir a final".
7. As apontadas supostas nulidades não poderão ser conhecidas pelo Supremo Tribunal de Justiça, com as consequências daí decorrentes quanto ao trânsito em julgado do Saneador-Sentença, nessa parte.
Das retribuições intercalares
1. Percorrendo a contestação que as RR. oportunamente apresentaram, nela não se descortina o pedido de dedução das remunerações que os Recorrentes terão auferido em actividades iniciadas posteriormente ao despedimento.
2. As RR., ora Recorridas, nada articularam de que pudesse resultar o desconto de quaisquer remunerações auferidas pelos Recorrentes, posteriormente ao despedimento.
3. As RR. não efectuaram quaisquer diligências no sentido de averiguarem se os Recorrentes auferiram rendimentos após o despedimento.
4. De harmonia com o disposto no artigo 661º do CPC, a sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objecto diverso do que se pedir.
5. Por outra via, o juiz só pode fundar a decisão em factos alegados pelas partes, como flui do disposto no artigo 264º nº 2 do CPC.
6. A sentença é nula "quando o juiz...conheça de questões de que não podia tomar conhecimento" ou "quando condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido" [artigo 668º nº 1 d) e e) do CPC].
7. Em sede de recurso subordinado para o Tribunal da Relação, os ora Recorrentes arguiram tal nulidade, no requerimento de interposição.
8. O Tribunal da Relação não chegou a debruçar-se sobre a matéria.
9. De resto, a senhora juíza "a quo" não podia relegar para execução de sentença o apuramento das importâncias que os Recorrentes terão auferido em actividades porventura iniciadas após o despedimento.
10. Contra todas as regras, oferecer-se-ia a quem não teve o cuidado de alegar e provar certos factos, uma segunda oportunidade de o fazer.
11. Nesta matéria, importa ter presente o disposto nos artigos 471 º e 661º, ambos do CPC, na redacção anterior à actualmente vigente, única aplicável "in casu".
12. A sentença só pode relegar para liquidação em execução a exacta quantificação do pedido, nos seguintes casos:
Quando tenha sido deduzido um pedido genérico, nos termos do disposto no artigo 471 º do CPC;
Quando o autor se socorra do direito consignado no artigo 569º do Código Civil.
13. Face ao exposto, não podia a sentença do tribunal “a quo" ter relegado para execução a liquidação das remunerações que os Recorrentes auferiram em actividades iniciadas após o despedimento.
14. Ao decidir como decidiu, a M.ma Juíza violou, designadamente, o disposto nos artigos 471º e 661º, ambos do CPC.
A condenação das RR. nas retribuições a contar desde 30 dias antes da data de entrada dos requerimentos de intervenção
1. As RR. não deram cumprimento ao disposto no artigo 156º-A do CPT, na redacção então vigente, razão por que o chamamento dos intervenientes só veio a ocorrer muito depois desse momento, ou por via espontânea ou de forma provocada.
2. Foram as RR. quem omitiu o dever legal de, até ao termo do prazo de contestação, requerer o chamamento dos trabalhadores que haviam sido abrangidos pelo despedimento colectivo e não tinham instaurado acção de impugnação do mesmo.
3. Seria absurdo que da omissão de tal dever pudesse o infractor - as RR. - colher benefício
4. Face ao exposto, improcede a douta sentença em apreço, também na parte em que condena as RR., apenas, nas retribuições vencidas a partir de 30 dias antes da entrada dos respectivos requerimentos de intervenção.
5. Na verdade, as RR. deveriam ter sido condenadas nas retribuições contadas a partir, pelo menos, da data em que terminou o prazo para as RR. contestarem, já que era suposto que os ora Recorrentes tivessem intervindo nos autos logo a seguir.
6. A M.ma Juíza violou, pois, designadamente o artigo 13º nº 2 a) do DL 64-A/89, de 27 de Fevereiro, e o artigo 156º-A do CPT, na redacção então vigente.
Nestes termos e nos mais de direito, deve o presente recurso ser julgado procedente, deferindo-se o requerido reenvio prejudicial para o TJCE, revogando-se a final o acórdão sob censura e confirmando-se, no que aos Recorrentes respeita, a douta sentença da 1 ª instância salvo quanto às remunerações intercalares, a que não devem ser deduzidas as quantias a que se reporta o nº 2 alínea b) do artº 13º do DL 64-A/89, de 27/2, e salvo quanto ao momento a partir do qual devem julgar-se devidas as mesmas remunerações intercalares, com as legais consequências.
*
Os recorrentes A 49, A 50, A 51, A 52, A 53, A 54, A 55, A 56 e A 57 (autores nas acções n.º 194/94 e n.º 196/94) remataram as suas alegações com conclusões em tudo idênticas às antecedentes, diferindo na exclusão da parte relativa à condenação das RR. nas retribuições a contar desde 30 dias antes da data de entrada dos requerimentos de intervenção e no excerto que se reporta ao alegado erro, aí sublinhando, em suma:
Do erro
1. Os ora Recorrentes são os Autores dos processos nºs 194/94 e 196/94.
2.Assiste-lhes, por conseguinte, o direito de, perante Vossas Excelências, suscitarem a questão do erro que a 1 ª instância julgou verificado.
Com efeito,
3. Os ora Recorrentes alegaram - e provaram - factos que, em seu entender, são suficientes para demonstrar a ocorrência e relevância daquele vício na formação da vontade que os levou a concluir o negócio cuja anulabilidade pretendem.
De resto,
4. As próprias Recorridas, os Pareceres dos Profs. Carvalho Fernandes e Lobo Xavier e o próprio Acórdão recorrido, igualmente constatam a legitimidade e o direito dos Recorrentes a verem apreciada e decidida esta questão.
5. O douto Acórdão "sub judicio", revogando a sentença de 1ª instância, desatendeu a pretensão dos aqui Recorrentes nesta matéria, incorrectamente procedendo à aplicação das normas legais à factualidade apurada.
*
A recorrente A 95 apresentou as seguintes conclusões:
1. Dão-se por reproduzidos todos os articulados apresentados pelas partes e intervenientes, sejam eles os do processo principal, sejam os contidos em todos os apensos, todos os documentos juntos aos autos e toda a prova produzida, bem como a douta Sentença da Primeira lnstância, as alegações de recurso das Rés Apelantes e respectivas conclusões, o douto Aresto recorrido da Relação de Lisboa e toda a doutrina e jurisprudência citadas nas presentes alegações.
Para apurar da (in)existência da transmissão do estabelecimento temos de analisar o artigo 37° da LCT em diálogo com o direito comunitário, interpretar teleologicamente a Directiva n.º 77/187/CEE e, sobretudo, seguir o percurso trilhado pelo TJCE e não tanto as regras contidas no Código das Sociedades Comerciais.
3. Até porque o direito laboral está a autonomizar-se cada vez mais dos critérios próprios do Direito Comercial, superando-os, em clara defesa dos direitos dos trabalhadores e da continuidade das relações de trabalho existentes no quadro de uma entidade económica.
4. Contrariamente aos acórdãos que o douto Aresto recorrido cita, o facto de uma sociedade se encontrar em fase de liquidação não permite concluir pela não continuidade de um estabelecimento comercial.
5. Isto porque o estabelecimento comercial de uma empresa pode subsistir e ser transmitido, ainda que parcialmente, mesmo que a sociedade tenha sido dissolvida e se encontre em liquidação.
6. Aliás, o encerramento definitivo da empresa social (AIA) não se reconduz ao encerramento deste ou daquele concreto estabelecimento comercial.
7. E é também por isso que a dissolução da AIA não comportou o encerramento (total) do estabelecimento comercial.
8. No artigo 37° da LCT, o legislador laboral consagrou um conceito amplo de transmissão de estabelecimento ao dizer que a transmissão se pode efectuar por "qualquer título".
9. Também a Directiva 77/187 ICEE consagra um regime benfazejo para os trabalhadores ao manter, mesmo contra a vontade do cessionário, os contratos de trabalho dos trabalhadores do cedente, em caso de transmissão da empresa, do estabelecimento ou de parte do estabelecimento.
10. O Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, em atenção à Directiva, ampliou consideravelmente o conceito de "transferência”, que interpreta teleologicamente e de forma ampla e generosa, e entende que para se transmitir o estabelecimento basta que se mantenha a identidade, prescindindo-se de qualquer definição do que seja uma empresa, um estabelecimento ou parte de estabelecimento.
11. O Tribunal de Justiça indica exemplificadamente como factores ou indícios de uma transmissão, em concreto, da entidade económica (empresa, estabelecimento ou parte de estabelecimento): a) O tipo de empresa ou de estabelecimento; b) A transferência de elementos corpóreos (edifícios, bens móveis, imóveis...); c) A transmissão de elementos do activo; d) O valor dos bens incorpóreos / imateriais no momento da transferência; e) A manutenção do pessoal; f) A transferência de clientela; g) O grau de similitude das actividades exercidas antes e depois da transferência; h) A duração de uma eventual interrupção da actividade;
12. E interpreta com flexibilidade a Directiva tendo em conta as preocupações de ordem social que lhe estão subjacentes, mormente acautelando os direitos dos trabalhadores.
13. É que são frequentes as fraudes por parte das entidades empregadoras!
14. Por detrás de uma aparência de licitude de um despedimento colectivo, o que existe as mais das vezes é uma transmissão camuflada de um estabelecimento para outra sociedade, com o fito de contornar normas laborais imperativas e esvaziar os direitos dos trabalhadores.
15. Os factos provados denunciam a existência de uma verdadeira transmissão do estabelecimento comercial da AIA para a TAP. a) A actividade charter - único objecto social da AIA - constitui uma actividade económica; b) A identidade da actividade: a TAP continuou a contratar com os operadores turísticos que operavam com a AIA, a realizar as mesmas rotas e destinos, não converteu em regulares os voos charters, entre outros; c) A continuidade pela TAP da actividade da AIA sem qualquer interrupção temporal; d) A passagem para a TAP de elementos corpóreos da AIA: equipamentos de escritórios, loiças de bordo, quatro aeronaves, algum pessoal; e) A passagem de clientela (os operadores turísticos no mercado são os mesmos); f) A assunção pela TAP dos compromissos contratuais da AIA.
16. Os factos provados espelham também a existência de uma verdadeira relação de “grupo " entre ambas as Recorridas.
17. Por isso, temos de analisar o caso dos autos com referência ao quadro empresarial correspondente à globalidade do grupo de empresas, tomando em consideração, quer o momento da cessação dos contratos de trabalho, quer as posteriores alterações na estrutura e na organização do grupo.
18. Pois embora não tenha sido contratualmente estabelecida, a relação entre as Recorridas é de grupo de facto: de domínio e de dependência entre as duas sociedades. sendo a TAP a sociedade dominante, enquanto accionista maioritária da AIA.
19. Nas relações de grupos de sociedades há autonomia jurídica das sociedades integrantes (cada qual com a sua personalidade jurídica, quer a TAP, quer a AIA) e há também a unidade de direcção económica, em que prepondera uma das entidades do grupo (a TAP).
20. E como uma das sociedades do grupo (a AIA) extinguiu a sua personalidade jurídica, existiu uma fusão - uma coligação de sociedades mediante a aquisição pela TAP das participações sociais da AIA.
21. Pois com a aquisição da totalidade ou da maioria das participações sociais da AIA, a TAP obteve o controlo societário da AIA e, consequentemente, o poder de determinar a gestão desta empresa social.
22. Ora, a TAP, ao adquirir participações sociais da AIA e ao se transformar sua accionista maioritária, quis assumir o controlo e ter poderes para dissolver a AIA quando achasse oportuno - o que fez, através da convocação da Assembleia Geral que dissolveu a AIA.
23. E assim se extinguiu a sociedade AIA, para causar a caducidade dos contratos de trabalho e efectuar um verdadeiro despedimento colectivo.
24. E a actividade da AIA passou a ser desenvolvida pela TAP. que passou a desempenhar sozinha as actividades económicas e comerciais do grupo, até aí desempenhadas exclusivamente pela AIA.
25. Contudo, não quis assumir toda a transmissão do lastro ostensivo do estabelecimento comercial da AIA, nomeadamente, não quis reintegrar os trabalhadores da dissolvida AIA no seu estabelecimento comercial.
26. Ora, esta situação configura uma verdadeira FRAUDE À LEI e é regulada actualmente como transmissão do estabelecimento.
27. Para combater estas situações de fraude (lesivas dos trabalhadores) temos de considerar ineficaz a posteriori o despedimento dos autos que, no momento em que foi praticado, parecia revestido de licitude, mas que é materialmente ilícito, a posteriori.
28. Existe, como se disse, uma situação de coligação (fusão), ou seja, de relação de grupo (de facto) das duas empresas - AIA e TAP - que envolve, com a dissolução de uma delas (AIA) a transmissão do estabelecimento (artigo 37.º da LCT) para a TAP e a necessária reintegração dos trabalhadores - Autores e Intervenientes.
29. Até porque. nestes casos, e em rigor, a entidade EMPREGADORA VERDADEIRAMENTE NÃO MUDA, por isso há que manter os contratos de trabalho e os direitos dos trabalhadores.
30. Acresce que houve um vício da vontade dos trabalhadores, quer quanto ao objecto do negócio, quer sobre os motivos/fundamentos do despedimento.
31. Erro esse que foi essencial e determinou a aceitação pelos mesmos da compensação, no errado convencimento de que o estabelecimento da AIA e a própria empresa iriam encerrar (alegadamente por causa da conjuntura económica recessiva), quando, afinal, foi transferido para a TAP, ainda que parcialmente.
32. E ERRO que está provado nos autos e não pode ser obnubilado, nem encoberto com o pretexto de se aplicar a “presunção inilidivel” do artigo 23°/3 da LCCT.
33. Além disso, este n.º 3 do artigo 23° da LCCT não preclude a aplicação do regime geral respeitante aos vícios da vontade e a possibilidade de os trabalhadores impugnarem o despedimento colectivo com fundamento em erro.
34. Até porque a lei especial só derroga e prevalece sobre a lei geral quando regular expressamente a situação, e o certo é que o artigo 23°/3 da LCCT é omisso quanto às hipóteses de erro, que foram inequivocamente provadas nos autos.
35. Nos termos do artigo 251° do Código Civil, "o erro que atinja os motivos determinantes da vontade, quando se refira à pessoa do declaratário ou ao objecto do negócio, torna este anulável”
36. A anulabilidade é também a consequência das situações de erro sobre os motivos (artigo 252º CC).
37. As Recorridas induziram os trabalhadores em ERRO, que só por via deste aceitaram como irreversível e necessário o seu despedimento colectivo.
38. As Recorridas fizeram os Trabalhadores LABORAR EM ERRO ao utilizarem. manipulando-o, um instrumento legítimo (a convocação regular da Assembleia Geral para dissolver a AIA e o consequente despedimento colectivo) para obterem um fim ilegítimo – que é a não reintegração dos trabalhadores por força da transmissão do estabelecimento.
39. Como a declaração de anulação tem efeito retroactivo e importa a cessação do vício, ter-se-á de considerar que a aceitação da compensação verdadeiramente não pode produzir efeitos e os trabalhadores têm de ser reintegrados na TAP, em cumprimento do artigo 37º da LCT.
40. Será ainda de referir que as Recorridas contornaram a legalidade e ofenderam princípios fundamentais do direito, nomeadamente os princípios do “favor laboratoris” protegidos pelo Direito Comunitário, veiculados pela jurisprudência do Tribunal de Justiça, consagrados na Constituição da República Portuguesa e nas demais leis laborais internas.
41. O que constitui NULIDADE por MANIFESTO ABUSO DE DIREITO das Recorridas, que violaram os limites impostos pela boa fé, bons costumes e o fim social e económico desse direito ao despedimento colectivo.
42. Diga-se, por último, que os trabalhadores podem impugnar o despedimento já depois de decorrido o prazo legal.
43. Até porque o legislador dá primazia ao princípio do favor laboratoris, relativamente à necessidade da rápida estabilização das situações jurídicas recíprocas entre trabalhadores e empregador.
44. O Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias (TJCE) e própria Jurisprudência Espanhola se referem a uma "ressurreição do contrato de trabalho” e a "ressurreição da acção de impugnação do despedimento colectivo", como formas de combate às situações em fraude à lei do contrato de trabalho e, mais propriamente, às situações em que se defrauda a continuidade dos contratos de trabalho nas hipóteses de sucessão de empresas.
45. "Ressurreição" da relação laboral que tem cabimento sempre que os trabalhadores despedidos provem - COMO LOGRARAM PROVAR - que a empresa continuou a sua actividade depois do decurso do prazo para a impugnação, seja por via da transmissão da empresa, estabelecimento ou parte de estabelecimento.
46. E como houve transmissão do estabelecimento para a TAP, a mesma tem de ser condenada a reintegrar os trabalhadores (logo, a ora Recorrente) se os mesmos assim o desejarem, mantendo os contratos de trabalho e pagando-lhes todos os salários intercalares desde os 30 dias antes da propositura da acção até ao trânsito em julgado da decisão.
47. Por tudo o antes exposto, caso os mesmos não venham a ser reintegrados, ter-se-á de considerar o despedimento colectivo dos autos como ILÍCITO, sendo as Recorridas obrigadas a indemnizar cada um dos trabalhadores por todos os danos patrimoniais e não patrimoniais que lhes causaram.
48. Assim não tendo decidido, o douto Acórdão recorrido violou, entre outras, as normas de direito comunitário, nomeadamente as Directivas n.º 77/187/CEE, n.º 98/50/CE e n.º 2001/23/CE, os artigos 58° e 59° da Constituição da República Portuguesa, o artigo 37° da LCT (aprovado pelo DL 49408, de 24/11/69), os artigos 6°/3, 13°/3, 16°, 17º, 18° e 23° da LCCT (DL n.º 64-A/89, de 27/02), os artigos 251°, 252°, 287° e 334° do Código Civil e o artigo 659° do Código de Processo Civil.
*
A recorrente A 102, terminou as alegações que produziu concluindo que:
1ª - Conforme se pode constatar das respostas dadas à matéria de facto, maxime as relativas aos Arts. 14, 50, 51, 72 a 74, 93, 94, 129 e 130 da douta base instrutória, todos os AA. e intervenientes tomaram como verdadeiros os motivos invocados pela co-ré AIA, ou seja, que o encerramento da empresa se deveu à conjuntura recessiva, desconhecendo, porém, todos aqueles, que a co-ré TAP continuaria, afinal, a actividade "charter", até ali desenvolvida pela 1ª R. AIA;
2ª - O prazo de 90 dias a que se alude no nº 2 do Art° 25° do RJCIT, para instauração das competentes acções de impugnação de despedimento colectivo, de que se fala no douto acórdão recorrido, pressupõe um quadro normal no que respeita aos motivos revelados pela entidade patronal para despedimento. O que não é o caso dos autos;
3ª - Representando falsamente a ré AIA os motivos para o despedimento sempre teria de concluir-se que a AIA procedera ao despedimento colectivo sem organizar o respectivo processo negocial previsto nos Arts. 17° e 23° do Regime Jurídico da Cessação do Contrato Individual de Trabalho (RJCCIT) sendo que, nesse caso, a acção de impugnação de despedimento colectivo, de que se fala nos Arts. 156° e ss. do CPT poderia ter sido instaurada no prazo de UM ANO ex vi do disposto no nº 1 do Art° 38° do DL. 49.408 de 24.11.69 (RJCIT);
4ª - A questão da caducidade do direito de impugnação do despedimento colectivo, seja relativamente aos AA. seja em relação aos intervenientes, deve ser tida como caso julgado na sequência de acórdão do tribunal aqui recorrido (fls. 1922 - Vol. 6), decisão essa confirmada mais tarde por esse Venerando Supremo Tribunal de Justiça (fls. 2029 - Vol. 6) ao determinar-se a baixa do processo à 1ª instância tendo em vista o CHAMAMENTO de todos os trabalhadores.
5ª - Os AA. e intervenientes, ao receberem as compensações de que se fala nos autos, tomaram como boas as razões invocadas para o despedimento colectivo, tendo constatado mais tarde ter sido FALSO O MOTIVO INVOCADO para o encerramento da empresa AIA, uma vez que não foi a sua situação financeiramente deficitária o motivo determinante do despedimento colectivo mas sim o facto de a AIA ter transferido bens e serviços, clientela e trabalhadores para a co-ré TAP;
6ª - A aceitação da compensação por parte da aqui interveniente e demais trabalhadores da AIA, interpretada à luz do critério legal fixado no Art° 236° do CC leva à conclusão de que os AA. e INTERVENIENTES não teriam querido o que quiseram (negocialmente falando) se conhecessem a realidade que lhes foi conscientemente ocultada pelos RR, ou seja, se soubessem que, pelo menos uma boa parte do ACTIVO incorpóreo da AIA, fora objecto de cessão à co-ré TAP, não tendo assim aquela encerrado definitivamente.
7ª - No Art° 37° da LCT o legislador laboral consagrou um conceito amplo de transmissão de estabelecimento ao dizer que a transmissão se pode efectuar por qualquer título sendo que da factualidade tida por provada na 1ª instância - e que não foi verdadeiramente posta em causa, em sede de recurso - terá se de inferir pela existência de uma verdadeira transmissão de estabelecimento comercial, da AIA para a TAP.
São disso indícios suficientes e bem reveladores:
a) A actividade charter - único objecto social da AIA - constitui uma actividade económica;
b) A TAP continuou a contratar com os operadores turísticos que operavam com a AIA, a realizar as mesmas rotas e destinos, não converteu em regulares os voos charters, entre outros;
c) A continuidade pela TAP da actividade da AIA sem qualquer interrupção temporal;
d) A passagem para a TAP de elementos corpóreos da AIA: equipamentos de escritórios, loiças de bordo, quatro aeronaves, algum pessoal;
e) A passagem de clientela (os operadores turísticos no mercado são os mesmos);
f) A assunção pela TAP dos compromissos contratuais da AIA;
8ª - O Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias indica exemplificadamente como factores ou indícios de uma transmissão, em concreto, da entidade económica (empresa, estabelecimento ou parte de estabelecimento):
a) O tipo de empresa ou de estabelecimento;
b) A transferência de elementos corpóreos (edifícios, bens móveis, imóveis ... );
c) A transmissão de elementos do activo;
d) O valor dos bens incorpóreos / imateriais no momento da transferência;
e) A manutenção do pessoal;
f) A transferência de clientela;
g) O grau de similitude das actividades exercidas antes e depois da transferência;
h) A duração de uma eventual interrupção da actividade;
9ª - Contrariamente aos acórdãos que o douto acórdão recorrido cita, o facto de uma sociedade se encontrar em fase de liquidação não permite concluir pela não continuidade de um estabelecimento comercial. E isto porque o estabelecimento comercial de uma empresa pode subsistir e ser transmitido, ainda que parcialmente, mesmo que a sociedade tenha sido dissolvida e se encontre em liquidação;
10ª - Por isso que a dissolução da AIA não comportou o encerramento (total) do estabelecimento comercial;
11ª - A TAP, ao adquirir participações sociais da AIA e ao se transformar sua accionista maioritária, quis assumir o controlo e ter poderes para dissolver a AIA quando achasse oportuno - o que fez, através da convocação da Assembleia Geral que dissolveu a AIA;
12ª - Assim se extinguindo a sociedade AIA, para causar a caducidade dos contratos de trabalho e efectuar um verdadeiro despedimento colectivo tendo a actividade da AIA passado a ser desenvolvida pela TAP, que por sua vez passou a desempenhar sozinha as actividades económicas e comerciais do grupo, até aí desempenhadas exclusivamente pela AIA;
13ª - E, tendo havido consequentemente transmissão do estabelecimento para a TAP, a mesma tem de ser condenada a reintegrar os trabalhadores (e, no caso, a aqui recorrente), se os mesmos assim o desejarem, mantendo os contratos de trabalho e pagando-lhes todos os salários intercalares desde os 30 dias antes da propositura da acção até ao trânsito em julgado da decisão;
14ª - Para a eventualidade de não se verificar a reintegração deverá considerar-se o despedimento colectivo dos autos como ILÍCITO, sendo as rés-recorridas condenadas a indemnizar cada um dos AA. e intervenientes - nestes se incluindo a aqui recorrente - de todos os danos patrimoniais e não patrimoniais que lhes causaram;
15ª - Em suma, o douto acórdão recorrido violou, entre outras, as normas de direito comunitário, nomeadamente as Directivas n.º 77/187/CEE, n.º 98/50/CE e n.º 2001/23/CE, os artigos 58° e 59° da Constituição da República Portuguesa, o artigo 37° da LCT (aprovado pelo DL 49408, de 24/11/69), os artigos 6°/3, 13°/3, 16°, 17°, 18° e 23° da LCCT (DL n.º 64-A/89, de 27/02), os artigos 251°, 252°, 287° e 334° do Código Civil e o artigo 659° do Código de Processo Civil.
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Por seu turno os recorrentes A 104, A 107, A 144, A 99, A 103, A 121 , A 141 e A 174, concluiram do seguinte modo:
1° - O Tribunal da Relação de Lisboa ao decidir favoravelmente pela procedência da excepção da caducidade do direito de impugnação do despedimento colectivo relativamente aos autores das acções nºs 194/94, 196/94 e 1263/94 e intervenientes, fê-lo a nosso ver erradamente, pois não ponderou antecipadamente, como deveria ter feito, a questão fundamental referente à obrigação que assistia às RR de cumprir com o disposto no artigo 156° do Código de Processo Trabalho. Ou seja, com a interposição da primeira acção de impugnação do despedimento colectivo (e com a entrada na petição inicial no âmbito do Proc. 246/93) deveriam as R.R, dentro do prazo para a contestação, ter chamado ao processo todos os trabalhadores não intervenientes. o que não fizeram.
2°- Motivo pelo qual, praticaram as RR, ao longo de todo o processo, uma irregularidade processual, que só viria a ser sanada através das decisões do Tribunal da Relação e, posteriormente, por este próprio Supremo Tribunal de Justiça (tendo este confirmado a decisão daquele) ordenando a intervenção de todos os trabalhadores por forma a que respeitando o espírito e "intenção do legislador" fosse "...proferida decisão que vincule todos".
3° - Na realidade, os doutos Acórdãos do Tribunal da Relação e deste S.T.J. ao decidir pela intervenção de todos os trabalhadores, fizeram "retroagir" os efeitos das suas decisões ao momento em que as RR deveriam ter cumprido com o disposto no Art. 156° do Código de Processo de Trabalho e não o fizeram, ou seja, dentro do prazo para a contestação do Proc. 246/93.
4°- E a referida obrigação de intervenção de todos os trabalhadores, abrange não só aqueles que foram chamados por ordem deste Tribunal da Relação e S.T.J., bem como os que interpuseram as acções nºs 194/94, 196/94 e 1263/94, pois na realidade só o fizeram porque as RR não cumpriram com [o disposto] no artigo 156° do Código de Processo de Trabalho.
5°- Efectivamente, se as RR tivessem cumprido com o disposto no artigo 156° do Código de Processo de Trabalho, possibilitando o direito dos trabalhadores a manifestarem-se pela intervenção ou não no processo, desnecessário seria que os mesmos tivessem que interpor as acções que originaram os Processos 194/94, 196/94 e 1263/94 que, posteriormente, viriam a ser apensados, bem como o posteriormente ordenado quanto ao chamamento dos Intervenientes.
6°- Esqueceram os Mmos. Juízes deste Tribunal da Relação, não só os efeitos da decisão que antes proferiram quanto à necessidade e obrigação de intervenção de todos os trabalhadores, como não tomaram em consideração que os intervenientes neste processo, nos termos do disposto no art. 321 ° do Código de Processo Civil fazem valer um direito próprio paralelo ao dos A.A., neste caso aos do Proc. 246/93, ocupando as suas respectivas posições no processo, inclusivamente desde o momento em que a petição inicial deu entrada em Juízo em 15/09/1993.
7°- Faz o Tribunal da Relação "tábua rasa" dos princípios que enformam o despedimento colectivo, pois é disso que efectivamente se trata neste processo, "atropelando" os direitos dos trabalhadores a intervir legitimamente num processo, que só não sucedeu em tempo, por exclusiva responsabilidade das RR a quem pertencia essa obrigação, nos termos do disposto no artigo 156° do Código de Processo de Trabalho.
8°- Não pode este Tribunal procurar, posteriormente, dividir aquilo que não é divisível, ou seja, invocar o prazo de 90 dias contido no artigo 25°, n° 2 da LCCT para considerar caducados os direitos de uns trabalhadores e não o de outros a "impugnarem o despedimento colectivo", quando todos, por douto Acórdão da Relação e STJ, foram anteriormente chamados a intervir e a ocupar "em bloco unitário" a posição idêntica à dos autores do Proc. 246/93.
9°- Estamos perante um litisconsórcio necessário, conforme dispõe o artigo 28° do C.P.C., pelo que não faz qualquer sentido que o Tribunal da Relação venha agora procurar diferenciar e tratar de forma desigual trabalhadores que se encontram com os mesmos direitos dos que interpuseram o Proc. 246/1993 e respectivos processos apensos.
10° - Deste modo, tendo a ilegalidade de obrigação de chamamento de todos os trabalhadores vítimas de despedimento colectivo decorrido única e exclusivamente da conduta das RR não podia o Tribunal da Relação decidir, como decidiu, pela caducidade do direito de acção dos trabalhadores dos Processos 194/94, 196/94 e 1263/94 e intervenientes chamados, que como vítimas da omissão das R.R não podem ver os seus direitos "apagados".
11° - Ao decidir como decidiu, o Tribunal da Relação premiou a actuação ilícita das R.R. ao não cumprir com a obrigação de chamamento de todos os trabalhadores no prazo para a contestação do Proc. 246/93.
12° - Acrescendo que o Tribunal da Relação, ao vir a considerar caducados os direitos de acção dos trabalhadores dos Processos 194/94, 196/94 e 1263/94 e intervenientes chamados, decidiu sobre matéria que já havia sido decidida, não só em contradição com a sua própria decisão anterior, bem como por Tribunal de Jurisdição superior que é o S.T.J.
13° - Quanto à caducidade do direito de acção por via da aceitação do despedimento pelo recebimento da compensação, entendemos que o Tribunal da Relação também não ponderou adequadamente a matéria de facto provada e o devido enquadramento jurídico, pois ficou claramente provado, conforme resulta da resposta ao questionário - (vd. entre outros Arts. 14, 50, 51, 72 a 74, 93, 94,129 e 130): que todos os AA tomaram como verdadeiros os motivos invocados pela ré AIA, ou seja, o encerramento da empresa que atribuíram à conjuntura recessiva, desconhecendo que a 2ª ré continuaria afinal a actividade charter até ali desenvolvida pela co-ré, servindo-se de equipamento (aviões e mobiliário) que esta utilizava antes, o que fez sem interrupção logo no Verão lATA 93, verificando-se, portanto, no entendimento da Mmo. Juiz do Tribunal de 1ª Instância, a falsidade do motivo invocado.
14° - Daí que os trabalhadores, laborando em erro sobre os motivos do despedimento comunicado nesses termos não verdadeiros pela própria entidade patronal, e sendo certo que, sem estarem na posse desses dados concretos, não poderiam impugnar judicialmente o mesmo.
15° - O Tribunal da Relação, ao decidir como decidiu e caso o seu entendimento revestisse forma de Lei, terminariam todas as possibilidades de impugnação de despedimento colectivo na legislação laboral, pois conhecendo posteriormente os trabalhadores a verdade dos factos quanto à ilicitude do seu despedimento, nunca o poderiam impugnar, resignando-se a aceitar que tinham sido enganados e que nenhuma Justiça poderia ser feita, pois é disso que efectivamente estamos a falar.
16° - E ao contrário do que decidiu o Tribunal da Relação, ficou efectivamente provado que os trabalhadores tomaram conhecimento da verdadeira realidade após a cessação dos contratos (30.04.93) e recebimento das invocadas compensações, sendo aplicável de facto e de direito o regime respeitante aos vícios da vontade.
17° - Carece o Tribunal da Relação de razão quando afirma que só os A.A. dos Processos nºs 194/94 e 196/94 invocaram esse específico erro, quando na realidade esses mesmos trabalhadores, enquanto vítimas de um despedimento colectivo, compõem e fazem parte integrante, em litisconsórcio necessário, de um só único processo ao qual foram apensos outros em face da omissão das R.R., estendendo-se necessariamente a legitimidade de arguição a todos o que o compõem, intervenientes inclusive.
18° - Incorre o Tribunal da Relação em grave equívoco quando procura provar a inexistência de erro dos trabalhadores, admitindo que não ocorreu o encerramento definitivo da empresa AIA e tratando-se este de um facto futuro e incerto à data em que os trabalhadores prestam consentimento, não poder falar-se em erro sobre os motivos.
19° - Ao contrário do entendimento expresso pelo Tribunal da Relação, ficou efectivamente provado que houve transmissão do estabelecimento, logo outra não poderia ser a conclusão retirada quanto ao verificado erro sobre os motivos. E como se pode impugnar um despedimento sem antes saber que o mesmo é ilícito.
20° - Ora, os autores vieram efectivamente invocar nos autos uma situação de erro enquanto desconhecimento da realidade de um facto que foi determinante no seu processo volitivo, posteriormente exteriorizada pela declaração de aceitação da compensação e, consequentemente, do despedimento.
21° - Essa ignorância sobre uma realidade factual, já na altura em desenvolvimento, mas pelos autores desconhecida, reporta-se aos actos de transmissão do estabelecimento por parte da comissão liquidatária da ré AIA para a ré TAP. Consistiram eles desde logo na passagem de todo equipamento (mobiliário e outro), parte dos aviões (4 Boeing), e continuação da actividade charter exclusiva da AIA que passou a ser assumida pela TAP logo através do cumprimento dos contratos de fretamento que, apesar de firmados pela AIA para o verão IAT /93, foram realizados pela AIA, substituindo aquela claramente a esta, o que, aliás, continuou no ano seguinte, assegurando a realização de rotas e destinos charter médio curso que até nitidamente não fazia. Toda esta matéria ficou provada.
22° - Verifica-se efectivamente um erro VICIO (falsa representação de encerramento da empresa) que interveio entre os motivos determinantes da vontade e que afecta a declaração negocial de aceitação da compensação e, consequentemente, de aceitação do despedimento.
23° - Em resumo, os autores declaravam aceitar o despedimento ao receber as compensações por um motivo que afinal vieram a saber ser falso: o encerramento da empresa onde trabalhavam até ali. Este erro encontra-se sujeito ao regime do art. 252°, 1 do Cód. Civil: é relevante e permite ao declarante pedir a sua anulação caso as partes hajam reconhecido, por acordo, a essencialidade do motivo, o que sucedeu efectivamente, pois para a ré AIA era claro que o encerramento do estabelecimento era causa essencial e determinante da aceitação do despedimento por parte dos trabalhadores, razão pela qual o erro dos autores é relevante e confere-lhes legitimidade para arguírem a respectiva anulabilidade – artº 289° do CC, o que fizeram em litisconsórcio necessário.
24° - E como pode o Tribunal da Relação, em face da matéria considerada por ele próprio provada, defender a ideia "peregrina" que:
"Quanto a factos futuros não pode haver erro, se, no momento da celebração do negócio, o declarante admite a sua verificação e esta se dá em sentido diferente, quando ocorrerem, ou se não se atende à sua verificação e eles ocorrerem, então dá-se uma previsão deficiente ou imprevisão", quando na realidade nenhum dos trabalhadores concebeu ou considerou que aquilo que as R.R. lhe disseram para o seu despedimento não fosse verdade e que só viriam a conhecer e comprovar como sendo falso posteriormente, ou seja no futuro, pelo que só aí o poderiam ter invocado, precisamente: só no futuro.
25º - Quanto à douta decisão do Tribunal da Relação em considerar que não ocorreu a transmissão do estabelecimento, cumpre mencionar que o mesmo esquece deliberadamente o facto de estarmos perante um processo de despedimento colectivo, pois a saída dos trabalhadores foi motivada por um acto voluntário da ré AIA que lhes comunicou expressamente que pretendia cessar o vínculo destes com a empresa, e mesmo que não se colocasse a questão da transmissão do estabelecimento para a TAP, e portanto dos contratos de trabalho, nem isso impediria que se aplicasse à ré AIA o regime da cessação do contrato resultante de despedimentos colectivos.
26° - E tratando-se de um processo de despedimento colectivo está sobretudo em causa a necessidade de protecção do trabalhador e a segurança do emprego, nomeadamente quando ele ocorre em caso de transmissão de um estabelecimento, sendo relevante apenas a conservação da identidade do estabelecimento ou exploração, independentemente da validade do negócio subjacente à sua passagem, ou mesmo da inexistência de relação contratual directa entre os dois possuidores sucessivos.
27° - Como indicadores de conservação de identidade temos os factos provados nos autos e demonstrativos das seguintes ocorrências: a) a exploração em causa foi continuada ou recomeçada pelo novo empregador com a mesma actividade económica ou actividade económica similar; b) o tipo de empresa em causa; c) os bens corpóreos (vg edifícios, móveis, equipamento) e incorpóreos (v.g. clientela) foram transferidos; d) uma parte do pessoal continuou a trabalhar agora ao serviço do novo empregador; e) se houve encerramento temporário da actividade aquando da transferência ou se, ao invés, houve continuação da exploração sem interrupção.
28° - E nos termos da Lei, basta que a transmissão de estabelecimento seja parcial, o que em face das referidas ocorrências consideradas provadas efectivamente ocorreu.
29° - Deste modo, consideramos abusiva a conduta do Tribunal da Relação em desconsiderar a matéria de facto dada como provada e que reflecte a aceite pela Mma Juiz do Tribunal de 1ª Instância, revelando a mesma que: a) A actividade em causa - voos irregulares ou charter constituía uma unidade com autonomia, com meios organizativos próprios com vista ao seu funcionamento, aliás a mesma era precisamente o único objecto social da ré AIA. Logo, sendo uma unidade económica é susceptível de transmissão; b) A Identidade de actividade charter prosseguida pela ré TAP que continuou a assegurar, contratando junto dos operadores turísticos que operava no mercado, realizando as mesmas rotas e destinos até ali assegurados pela ré AIA, e que continuaram a ser charter e não se converterem em regulares, esses sim diferentes e próprios da ré TAP; c) ao contrário do alegado pelas R. TAP, esta não assegurava até ali voos charter de médio curso, e mesmo longo curso só fazia esporadicamente voos isolados, acrescendo efectivamente à sua actividade de voos regulares a de fretamentos dos voos Charter; d) bastando a manutenção do núcleo principal da actividade Charter, ainda que mais reduzida; e) Há uma completa situação de continuidade da actividade sem interrupção no tempo, pois que a ré TAP logo no Verão IATA passou a iniciar a actividade charter. f) Além desta continuidade, prova-se ainda que cumpre contratos que não são seus, bem revelador da transmissão da posição de possuidor do estabelecimento e carecendo de fundamento a suposta preocupação com possíveis incumprimentos que sempre estariam salvaguardados através do processo de liquidação da AIA; g) Verifica-se a passagem de elementos corpóreos, como equipamentos de mobiliário, "loiças" de avião, e acima de tudo quatro aeronaves, sendo irrelevante que estas não sejam propriedade da AIA, mas sim locados ou sub locados, o que aliás é normal nesta actividade, sendo apenas importante que a AIA os utilizasse até ali e que a ré TAP os passasse também a utilizar.
30°- É também irrelevante que o Tribunal da Relação considere que, na referida transmissão, teria que existir um elemento organizatório e funcional, quando na realidade as R.R. tudo fizeram para dar a entender que se trataria de um despedimento colectivo lícito em face da suposta extinção da AIA, o que, na realidade, não ocorreu.
31°- Como pode o Tribunal da Relação pretender atribuir legalidade aos actos de extinção da AIA, quando na sua génese ficou provado que os mesmos apenas procuraram enganar os trabalhadores.
32°- E que natureza tem a preocupação revelada pelo Tribunal da Relação quanto às "pesadas indemnizações" que a TAP teria que suportar quando na realidade elas nunca seriam assacadas à própria TAP, pois derivavam da AIA e estariam sempre asseguradas pelo processo de liquidação em curso.
33° - Por tudo se conclui, ao contrário do Tribunal da Relação, que se manteve por parte da TAP a prossecução da actividade da AIA, conservando-se na TAP a identidade do estabelecimento da AIA, que a TAP antes da dissolução da AIA não possuía, tendo ocorrido efectiva transmissão de estabelecimento.
34° - Deve, por isso, ser revogado o douto Acórdão da Relação de Lisboa e considerar-se válida a decisão da 1ª instância, excepto na parte que foi desfavorável ao Intervenientes chamados pelo STJ, nomeadamente na alínea H) do Ponto III da Decisão da Sentença de 1.ª Instância, fls 84 e 85 da sentença e 5101 v. e 5102 dos autos (As Rés foram condenadas a pagar aos intervenientes principais "o valor correspondente às retribuições, incluindo férias, subsídios e férias e de Natal, a contar de 30 dias antes da entrada dos respectivos requerimentos de intervenção ... " até trânsito em julgado e acrescidos juros de mora, à taxa legal também a contar do trânsito em julgado", "A estas quantias serão no entanto deduzidas as "que reporta o n° 2 alínea b) do art. 13° do DL 64-A/89, de 27.02 a liquidar em execução de sentença".
35° - Não se conformam os Intervenientes, e ora recorrentes, porquanto a decisão para além de ter sido considerada indevidamente prejudicada pelo Tribunal da Relação, não se encontra devidamente fundamentada pela 1ª Instância quanto ao porquê dos intervenientes principais apenas terem direito a receberem as retribuições a contar de 30 dias antes da entrada dos respectivos requerimentos de intervenção.
36° - Tal constitui um tratamento diferenciado dos intervenientes principais relativamente aos AA, tanto mais que, nos termos do disposto no art. 321 do CPC, o interveniente principal faz valer um direito próprio, paralelo ao dos AA. Sendo certo que os intervenientes e ora recorrentes aderiram ao articulado apresentado pela parte a que se associaram.
37° - Por outro lado, existia e existe na nossa Legislação a obrigatoriedade dos RR chamarem a intervir nos autos no prazo da contestação todos os trabalhadores abrangidos pelo despedimento colectivo. E as RR não chamaram todos os trabalhadores a intervir, violando claramente a Lei, não podendo as RR ser beneficiadas pelo incumprimento das regras processuais, nomeadamente as estipuladas no artº 156° do C.P.T.
38° - Acrescendo que, neste sentido, se pronunciou favoravelmente e anteriormente o Tribunal da Relação, bem como este STJ que veio então dar razão à pretensão dos ora recorrentes serem todos admitidos a intervir nos autos.
39° - Está-se perante um litisconsórcio necessário – artº 28° do CPC pelo que não faz qualquer sentido diferenciarem-se e dar-se tratamento desigual aos trabalhadores abrangidos pelo mesmo despedimento colectivo.
40° - Por outro lado, a dedução das quantias a que se reporta o nº 2 da alínea b) do artº 13° do DL 64-A/89, de 27.02, a liquidar em execução de sentença, no que respeita aos intervenientes principais bem como aos AA, não tem qualquer cabimento dado que extrapola o objecto da discussão da causa, não tendo sido alegado por nenhuma das partes. E não tinha a Meritíssima Senhora Dra Juiz da 1ª Instância de se pronunciar sobre esta matéria, considerada agora prejudicada pelo Tribunal da Relação de Lisboa, o que se discorda completamente.
41° - Motivo pelo qual a sentença de 1ª Instância e o Acórdão da Relação que vê prejudicada aquela questão essencial dos Intervenientes deve ser considerado nula, nos termos e para os efeitos da alínea c) do nº 1 do artº 668° do CPC, porquanto se debruça e conhece de questões de que não podia tomar conhecimento.
42° - O Acórdão da Relação deve ser alterado quanto a considerar prejudicada a questão dos intervenientes principais por apenas terem direito a receber as retribuições a contar de 30 dias antes da entrada dos respectivos requerimentos de intervenção e a deduzir as quantias a que se reporta o nº 2 da alínea b) do art. 13° do DL 64-A/89, de 27.02, a liquidar em execução de sentença, devendo passar a considerar-se como efectivamente devidos todos aqueles montantes desde 15/08/93 até ao trânsito em julgado.
43° - O Acórdão e, consequentemente, a sentença de 1ª Instância deve ser alterado nas partes a que respeita o invocando no ponto anterior porquanto viola as regras estipuladas nos art. 28° do CPC, 156° do CPT e 321° do CPT.
44° - Mais viola o princípio da legalidade e o dever de cooperação entre as partes ao beneficiar as RR por incumprimento do art. 156° do CPT.
45° - Bem como viola o principio de igualdade estipulado no art. 13° do CRP, na interpretação que faz relativamente aos intervenientes principais no que respeita à aplicação dos Arts. 28° e 321° do CPC, nomeadamente quanto à obrigatoriedade do litisconsórcio necessário e à validação do direito paralelo ao dos AA.
46° - O douto Acórdão recorrido, contra o disposto no art. 659° do CPC, não fez uma correcta subsunção dos factos ao direito e violou, entre outras normas jurídicas aplicáveis ao caso sub judice, os normativos seguintes: do Código Processo Civil - os art.ºs 28° e 321°; o Regime Jurídico da Cessação do Contrato de Trabalho respeitante ao despedimento colectivo e o Art. 158° do Código de Processo de Trabalho.
Termos em que, e nos mais de direito, deverá ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se inteiramente o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa e decidindo este Supremo Tribunal nos mesmos termos da Sentença de 1ª Instância, com excepção das questões referentes às limitações das retribuições a pagar aos Intervenientes a contar de 30 dias da entrada do respectivo requerimento de intervenção e a dedução das quantias a que se reporta o n° 2, alínea b) do art. 13° do D.L. 64-A/89, de 27.2, a liquidar em execução de Sentença, decidindo-se que as retribuições devem remontar à data de interposição do Proc. 246/1993 e que não são deduzidos quaisquer montantes.
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A recorrente A 131 terminou as suas alegações com as conclusões que se seguem:
1 - O tribunal a quo, relativamente à excepção de caducidade do direito de impugnação do despedimento colectivo quanto aos AA. e intervenientes que a eles aderiram, veio, além de outros, estatuir a especialidade da norma prevista no art. 25, n.º 2 da LCCT face ao prazo geral previsto no art. 287, n.º 1 do CC.
2 - Porém, olvidou a, aliás, douta decisão de que ora se recorre que e tal como resulta da resposta ao questionário, todos os AA. e intervenientes tomaram como verdadeiros os motivos invocados pela R. AIA (o encerramento da empresa), sendo certo que só posteriormente tomaram conhecimento que a segunda R. continuaria a actividade até ali desenvolvida pela primeira R., o que conduziu à inevitável conclusão da falsidade do motivo invocado.
3 - Ora, só na posse do conhecimento sobre os reais motivos, os AA. puderam impugnar judicialmente o despedimento, i.é, tem plena aplicação ao caso o disposto no art. 287º, n.º 1 do CC, pela situação de erro sobre os motivos do despedimento tal como comunicado pela entidade patronal.
4 - Ao decidir como decidiu, o douto Acordão violou o art. 287º do CC., como, aliás, bem sustenta o Ac. do STJ de 29/09/91, publicado em Acórdãos Doutrinais do STJ, ano XXXIX, n.º 460, págs. 419 e seguintes, aquele prazo “pressupõe um quadro normal no que respeita aos motivos revelados pela entidade patronal para despedimento…”, uma vez que foi plenamente provada a situação de erro em que laboraram os AA., pelo que não se entende, salvo melhor opinião, a aplicação que a douta decisão de que ora se recorre, fez da lei.
5 - Ao que acresce o facto de os intervenientes terem sido chamados por Acórdão da Relação de Lisboa (fls. 1922, vol. 6), decisão confirmada posteriormente pelo STJ ( fls. 2029, volume 6) quando ordenou a baixa do processo para continuação com o chamamento de todos os trabalhadores.
6 - O que conduzirá necessariamente à não caducidade do direito de acção dos AA e, consequentemente, dos Intervenientes aderentes.
7 - Também a douta decisão de que ora se recorre considera que a aceitação da compensação é facto impeditivo dos AA. impugnarem o despedimento colectivo, alegando, em suma, que apenas os AA. dos procs. n.ºs 194/94 e 196/94 invocaram erro sobre os motivos, mas que, de qualquer forma, não se encontra preenchido o art. 252º, n.º 1 do CC, pelo que todos os AA, à excepção de um, ficaram impossibilitados de impugnar o despedimento.
8 - Novamente, não tem em conta a douta decisão de que ora se recorre que, não obstante, a presunção da aceitação do despedimento, novamente os AA. alegaram e provaram a situação de erro sobre a vontade e que, obviamente afectou a aceitação da compensação. Sendo certo que o encerramento do estabelecimento – condição comunicada pela entidade patronal para o despedimento – era essencial para a aceitação do mesmo despedimento e agindo, afinal, os trabalhadores em erro, faculta-lhes a lei a possibilidade de arguirem a respectiva anulabilidade, o que, novamente, só pode levar à conclusão que a aceitação do despedimento derivada da compensação não produziu quaisquer efeitos, podendo os AA. impugnar o seu despedimento, bem como os Intervenientes aderentes, o que o douto Acordão não considera, violando, assim, claramente, o art. 252º, n.º 1 do CC.
9 - Manifesta-se o douto Acórdão pela não transferência parcial do mesmo da AIA para a TAP; no entanto, não leva em linha de conta que, além de outros, verificou-se que, temporalmente, a R. TAP continuou a assegurar a actividade charter tal como prosseguida pela R. AIA, não convertendo os voos em regulares, pelo contrário, mantendo as mesmas rotas e com total identidade, actividade essa que a R. TAP iniciou logo, sem qualquer interrupção, além da passagem de elementos corpóreos, o que obriga, necessariamente, à conclusão da transmissão do estabelecimento.
10 - Nestes termos, deveria o douto Acórdão ora recorrido ter confirmado a decisão proferida em primeira instância, à excepção da parte da mesma em que esta decidiu limitar a 30 dias antes da interposição do requerimento de intervenção a contagem das retribuições, incluindo salários mensais, férias, subsídios de férias e de Natal aos intervenientes e deduzir-lhe naquelas as quantias a que se reporta o art. 13º, n.º 2, al. b) do DL 64-A/89 de 27/02.
11 - Ao contrário, tal parte da decisão proferida em primeira instância deveria ter sido declarada ferida de nulidade, nos termos do art. 668º, n.º 1, al. d) do CPC, uma vez que tal questão não foi suscitada pelas RR., encontrando-se assim vedado ao juiz conhecê-la, violando, desta forma, os arts. 28º e 321º do CPC e 156º do CPT.
12 - Por tudo o que antecede, deverá o, aliás, douto Acordão ser revogado, confirmando-se a decisão tal como proferida em primeira instância, anulando-se desta, apenas a parte da mesma que limitou a 30 dias antes da interposição do requerimento de intervenção a contagem das retribuições a que os intervenientes têm direito, bem como a dedução das quantias a que alude o art. 13º, n.º 2, b) do DL 64-A/89, de 27/02.
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Os recorrentes intervenientes A 155 e Outros, intervenientes principais, e A 20, autor, todos identificados a fls. 6887, apresentaram as seguintes conclusões:
1 - O Recurso de apelação dos recorrentes intervenientes principais no Proc. 246/93 do 2º Juízo, 1ª do Tribunal de Trabalho de Lisboa não foi julgado pelo Tribunal da Relação de Lisboa por ter sido julgado prejudicado o conhecimento do seu objecto em função da Decisão A), B), e C) do Processo de Apelação 6748/07-4 do Tribunal da Relação de Lisboa.
2 - O citado Acórdão, ao julgar procedente a excepção da caducidade do direito de impugnação do despedimento colectivo, relativamente aos Autores das acções 192/94, 196/94 e 1263/94 e intervenientes que a ela aderiram e ao alterar a decisão recorrida, com o Acórdão Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça, Revista 592/01- 4ª, de Fevereiro de 2002, transitado em julgado, que ordena que seja proferida na 1ª Instância decisão que vincule todos os trabalhadores, atento o nº 3 do Art.º 156º do Cód. Proc. Trabalho, então em vigor, ao prescrever que “…no prazo referido no nº 1 ( para contestar ) deve ainda o Réu requerer o chamamento para intervenção dos trabalhadores que, não sendo autores, tenham sido abrangidos pelo despedimento.”.
3 - A decisão deste Acórdão 592/01- 4ª, vem no seguimento do Acórdão da Relação de Lisboa, transitado em julgado, que ordenou o chamamento de todos os trabalhadores ainda não intervenientes ( pag. 2033 dos autos ).
4 - A decisão recorrida, para além de estar em contradição com o citado acórdão do STJ, viola o estipulado no n.º 3 do art. 156.º do C.P.Trabalho então em vigor e a alínea d) do art. 668.ºdo C.P.C., bem como
5 - não acata Acórdãos transitados em julgado, quer da Relação de Lisboa, quer do Supremo Tribunal de Justiça, o que viola o art. 671.º do C.P.C..
6 - Daqui ocorre uma clara situação de má fé por parte das rés Air ... e TAP, que não podem alegar desconhecimento da lei e que não será de justiça saírem beneficiadas com a sua violação.
7 - O acórdão recorrido é omisso quanto à harmonização que deveria, em nosso entender, ter feito entre os acórdãos transitados em julgado, a má fé e violação da lei por parte da Air ... e TAP quanto ao chamamento de todos os trabalhadores aos autos e demais acções conexas intentadas para além do proc. 246/93.
8 - O acórdão recorrido constitui decisão contraditória aos citados acórdãos da Relação de Lisboa e S.T.J., violando o art. 675.º do C.P.C., que estabelece que se cumprirá a decisão que passou em julgado em primeiro lugar.
9 - As rés Air ... e TAP estão a ser indevidamente beneficiadas por violarem a lei, ao não chamarem aos autos todos os trabalhadores abrangidos pelo despedimento colectivo que desencadearam – n.º 3 do art. 156.º do C.P.T.
10 - Às rés Air ... e TAP deve ser imputado o não cumprimento dos deveres de boa fé, nomeadamente da lealdade e de informação, que levaram a induzir os trabalhadores que aceitaram a indemnização por extinção da Air ... em erro na formação da vontade (erro-vício).
11 - A omissão por parte das Rés da transmissão de estabelecimento da Air ... para a TAP constitui erro essencial, causal e determinante na aceitação da indemnização pelos trabalhadores, que é determinante na formação da sua vontade, o que acarreta a nulidade desse negócio jurídico.
12 - Existindo erro e, consequentemente, viciação da vontade dos trabalhadores por parte das Rés Air ... e Tap, afigura-se a existência de dolo por parte destas, como pressuposto ou condição do negócio jurídico realizado, sendo este consequentemente objecto de nulidade.
A mencionada “Decisão da Comissão” 94/698/CE anexa aos autos pelas Rés reflecte claramente esta situação ao referir:
“O novo Conselho de Administração da TAP, nomeado no final de 1992, adoptou já diversas medidas com vista a iniciar o processo de recuperação da companhia.
Nomeadamente…após a liquidação da filial ...…
Tudo indica um plano de «engenharia financeira» por parte da TAP, principal accionista da Air ..., já traçado antes do despedimento colectivo da Air ..., dado que no mesmo documento se pode ler:
“Segundo o plano, tais objectivos deverão ser alcançados mediante a:
a)(…)
-concentração na actividade principal da TAP, ou seja, o transporte aéreo
- (…)
-implementação de uma gestão integrada de todas as companhias possuídas pela TAP.”.
Ora ocorrendo a dissolução da Air ... em Fevereiro de 1993. nada disto se afigura não ter sido planeado no interesse exclusivo do maior accionista da Air ..., a TAP.
13 - Existindo a violação da aplicação da lei de processo, nomeadamente do Art.º 675º do C.P.C. quanto à decisão recorrida no referente a A) da Decisão do Acórdão da Relação de Lisboa, deve esta ser anulada e modificada a alínea C) dessa Decisão.
14 - O mesmo se diga em relação à alínea B) dessa Decisão e
15 - consequentemente deve o S.T.J. ordenar a modificação do Acórdão recorrido, dando razão à decisão de 1ª Instância,
16 - com excepção da matéria dos recursos referidos na alínea D) da Decisão recorrida, que deverá ser objecto de conhecimento e decisão.
17 - As regras violadas deveriam ser interpretadas no sentido próprio que o legislador lhes e não da forma como o fez o Acórdão recorrido.
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Não apresentaram recurso de revista os seguintes intervenientes:
16. A 96 - Técnico qualificado
37. A 107- Comissário de bordo
39. A 109- Comissário de bordo
42. A 111- Assistente de bordo
44. A 112 e A 113 - Comissário/Assistente de bordo
52. A 119 - Comissário de bordo
60. A 122 - Assistente de tráfego
64. A 125 - Técnica administrativa
85. A 137- Assistente de tráfego
89. A 139 - Motorista
90. A 140 - Assistente de tráfego
93. A 142 - Assistente de tráfego
111. A 149 - Empregada de escritório
122. A 152 - Assistente de tráfego
129. A 153 - Assistente de tráfego
132. A 154 - Assistente de tráfego
14. A 168 - Assistente de tráfego
15. A 169- Assistente de bordo
17. A 171 - Técnica qualificada
18. A 172 - Técnica qualificada
19. A 173 - Programador.
21. A 175 (vol XXI a fls. 5921 e 5926)
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Houve contra-alegações das RR. TAP e AIA (fls. 7301 e ss. XXVII volume), nelas se concluindo do seguinte modo:
1. Entenderam os Ilustres Desembargadores, quando passaram ao “enquadramento jurídico” dos factos, que “Todas estas questões estão interligadas entre si, pelo que as apreciaremos em conjunto seguindo, no entanto, o iter argumentativo da decisão recorrida”, ou seja, da sentença da 1ª Instância.
2. O douto critério será seguido nesta exposição final e daí que, repetidas vezes, se faça referência à sentença revogada, muito embora sempre ao abrigo do grande mérito e rigor jurídico dos fundamentos do acórdão em revista.
3. Acrescente-se, ainda, que a explanação que se segue tem principalmente em vista apontar para a argumentação produzida ao longo da presente contra-alegação, amplamente baseada nas opiniões de autorizados jurisconsultos e, acima de tudo, confortada – como já se confessou – com os ensinamentos do douto acórdão.
4. O artº 234º, § 3º do TE estabelece a obrigação de o Juiz nacional suscitar a questão prejudicial quando, segundo o direito interno, a respectiva decisão não seja susceptível de recurso judicial.
5. Tal obrigação, porém, não é absoluta, sendo dominante o entendimento de que o processo não carece de ser enviado ao TJ em 3 circunstâncias:
a) a questão colocada ser desnecessária ou não pertinente para o julgamento do litígio principal.
b) haver uma identidade material entre a questão colocada e outra já decidida pelo TJ.
c) a interpretação da norma nacional, em conformidade com o direito comunitário, não suscite dúvidas (teoria do acto claro).
Neste sentido são de referir os Acórdãos de 23/3/63, Da Costa, proc. 28 a 30/62, Rec. 1963, pág. 73 a 76; de 6/10/82, Cilfit, cit., pág. 3415.
6. Conforme referem Fausto de Quadros e Ana Martins (in «Contencioso da União Europeia», 2ª ed., pág. 93) « mais recentemente, o Tribunal de Justiça retoma esta jurisprudência, indeferindo liminarmente questões prejudiciais em que não há lugar a nenhuma dúvida razoável e em que a resposta pode ser claramente deduzida da jurisprudência anterior por se tratar de questões manifestamente idênticas».
7. No caso concreto, trata-se de duas questões suscitadas pelos AA., relativas a interpretação do Direito Comunitário (artº 234º, a) do TCE), a saber:
7.1. Como deve ser interpretado o artº 37º da LCT à luz do Direito Comunitário, designadamente se a Directiva sobre a transmissão do estabelecimento pode aplicar-se no âmbito de uma liquidação societária extrajudicial;
7.2. Se o artº 23º, nº 3 da LCT é contrário ao artº 4º, nº 1, da Directiva 201/23.
8. Relativamente à questão referida em 7.1 e interpretando o artº 4º, nº 1, na versão da Directiva 201/23/CE o advogado-geral C.O. Lenz escreveu o seguinte: «O liquidatário obtém a possibilidade de, mesmo antes da cessão [do estabelecimento], levar a cabo medidas de racionalização. Um possível comprador ficará, assim, em melhores condições para adquirir a empresa. Dando-se ao cedente a possibilidade de despedir por razões económicas, técnicas ou de organização, permite-se que a liquidação se faça de modo mais fácil, que os postos de trabalho da empresa em liquidação fiquem assegurados e que, assim, a protecção dos trabalhadores seja aumentada» (cfr. Colectânea, 1998, p. 1076, nº 58).
9. Relativamente à questão referida em 7.2., não se trata da interpretação do Direito Comunitário mas de Direito Nacional, pelo que não é admissível que, a tal propósito, seja suscitada uma questão prejudicial. Além disso, estando o artº 23, nº 3, da LCT já revogado, a questão suscitada não só é impertinente e desnecessária como também é absurda na medida em que está suscitada nos autos a sua pretensa inconstitucionalidade.
10. Perante a abundante jurisprudência do TJCE relativa à noção de “transmissão de estabelecimento” e à clareza que o conceito hoje apresenta em termos nacionais e comunitários, ao contrário do entendimento de parte dos Recorrentes, o STJ não se encontra obrigado a proceder ao reenvio prejudicial nos termos e para os efeitos do artigo 234º TCE.
11. É bem conhecida a jurisprudência dos Tribunais, em especial do Supremo Tribunal de Justiça e dos Tribunais das Relações, relativamente a várias questões suscitadas neste processo, em especial no que respeita à interpretação e aplicação das normas internas e Directivas comunitárias aplicáveis e, bem assim, à respectiva jurisprudência do TJCE, sempre no sentido de uma actuação harmónica e justa, uma vez que o artº 234º do TE “... prevê a cooperação entre o juiz comunitário e o juiz nacional, e a relação estabelece-se entre o tribunal nacional e o TJ, o que conduz ao apagamento das partes no processo principal” (FAUSTO DE QUADROS, ob. cit., pág. 67).
12. As partes apresentam sugestões e argumentos, mas para efeitos do chamado “reenvio prejudicial” previsto no artº 234º do TE não têm legitimidade para se substituir ao juiz da causa e, muito menos, para ir ao ponto de requerer o reenvio obrigatório, visto que, como bem observa o autor que se acaba de citar, o juíz só “... é obrigado a suscitar a questão prejudicial, se tiver dúvidas sobre a interpretação ou sobre a validade de uma norma comunitária” (o sublinhado é nosso).
13. Concretamente e salvo melhor opinião, os tribunais nacionais (com raras excepções, como é o caso da sentença da 1ª instância), em especial o STJ e as Relações, têm evidenciado uma grande clarividência e segurança nesta matéria e assim se espera que continue a acontecer, obstando a eventuais “manobras dilatórias” que o TJCE repudia (V. FAUSTO DE QUADROS, ob. cit., pág. 93).
14. As Recorridas AIA e TAP, embora tenham acolhido toda a factualidade dada como provada na alínea A) dos “Factos Provados” (fls. 5068 a 5090 dos autos), cuidaram de deixar aqui alinhados exclusivamente aqueles factos que o Tribunal da Relação (de fls 6616 a fls 6618 verso dos autos) considerou relevantes para a correcta apreciação e decisão das questões suscitadas no processo e que constituem objecto da presente revista, os quais aqui se dão por reproduzidos.
15. Na vigência da LCCT, o encerramento definitivo da empresa constituía, por si, justificação suficiente para o despedimento colectivo (artº 16º).
16. O encerramento definitivo da empresa, vista como organização produtiva afecta à prossecução do objecto social, é matéria da competência exclusiva da assembleia geral dos sócios (neste caso, dos accionistas da AIA, por se tratar de uma sociedade anónima), e excedia o campo da mera gestão da sociedade comercial reservado ao respectivo conselho de administração ou à comissão liquidatária.
17. A decisão de encerrar a empresa social, se tomada pelo conselho de administração ou pela comissão liquidatária, envolveria a ultrapassagem dos seus poderes de gestão, importando invasão da esfera de decisão reservada aos accionistas (estamos a considerar a sociedade anónima), aos quais compete decidir se a actividade empresarial pode continuar ou deve ser abandonada e qual o destino a dar ao substrato organizativo que a suporta (art. 373°, nº 2, do CSC).
18. Ao entender que o encerramento definitivo da AIA não poderia ter sido deliberado pela sua assembleia geral, por se tratar de uma decisão de gestão reservada ao respectivo conselho de administração ou à comissão liquidatária, o douto despacho saneador errou, violando as correspondentes normas de Direito Societário que adiante serão referidas.
19. Ao contrário do entendimento vazado no saneador, o encerramento definitivo da empresa social não se reconduz ao encerramento deste ou daquele concreto estabelecimento comercial [art. 406°, aI. g), do CSC].
20. Assim não fora, e o facto de o conselho de administração da AIA haver sempre actuado em plena consonância com a assembleia geral não poderia deixar de implicar a assunção total, pelo conselho de administração, das deliberações tomadas pelo colectivo dos accionistas, o que obstaria à invalidação do que pelo conselho de administração tivesse sido assumido.
21. O douto despacho saneador voltou a errar ao decidir que a assembleia geral da AIA, de 19.02.1993, deliberou a dissolução da sociedade, mas nada decidiu quanto ao destino da empresa social.
22. Na verdade, a deliberação de dissolução de uma sociedade anónima por vontade dos sócios [ao abrigo do artº 141º, nº 1, al b), do CSC], contém ínsita, por via de regra, a decisão do termo imediato da respectiva actividade e o encerramento definitivo da empresa social, excepto se os accionistas deliberarem expressamente em sentido contrário ou se, durante a liquidação, for submetida ao colectivo dos accionistas, e por estes autorizada, a transmissão da empresa através da alienação em globo do património da sociedade ou de trespasse do estabelecimento da sociedade [arts. 148° e 152°, nº 2, aI. c), do CSC].
23. No caso da AIA – em que a própria deliberação dos accionistas foi determinada pela verificação de causas objectivas de falência –, inexistindo deliberação da assembleia geral a autorizar a alienação global do património da sociedade ou o trespasse da totalidade ou de parte da respectiva empresa, entrou-se num processo comum de liquidação, em que toda a actividade do liquidatário é legalmente orientada tão só para a concretização efectiva do encerramento da actividade e da empresa social que a dissolução determinou.
24. A competência funcional do liquidatário, no caso dos autos, circunscreveu-se à condução do processo desencadeado pela deliberação da assembleia geral de 19.02.1993, não pertencendo aos administradores (então agindo já como liquidatários) a decisão de encerramento, cujo sustentáculo só pode ser encontrado na mencionada decisão do colectivo dos accionistas. Torna-se isto ainda mais claro quando se atente no facto de só o colectivo dos sócios poder decidir a continuação da actividade e, até, a própria cedência do estabelecimento (artº 152º, nº 2, do CSC).
25. De modo que uma hipotética transmissão da AIA para a TAP, a ter-se verificado, ainda que parcialmente, não podia deixar de ser havida como nula, por violar o imperativo contido no art. 152°, nº 2, aI. d), do CSC, o qual impede que o liquidatário a efectue sem a imprescindível autorização dos accionistas, que não foi dada.
26. A decisão de encerrar a empresa social não é, nos seus fundamentos, sindicável pelos tribunais; e os factos adquiridos para este processo evidenciam um efectivo encerramento definitivo da empresa de que a AIA era titular, no seguimento da dissolução da sociedade deliberada pela assembleia geral de 19.02.1993, verificando-se, assim, o fundamento invocado para o despedimento colectivo dos AA (artº 16º da LCCT), o qual, por isso, foi séria, válida e licitamente efectuado.
27. De qualquer modo, os contratos de trabalho dos AA sempre teriam caducado, nos termos do art. 6.°, nº 3, do DL nº 64-A/89, atenta a impossibilidade da prestação laborativa decorrente da desagregação do substrato organizativo/produtivo que a vinha suportando.
28. Nem a esta caducidade obstaria a circunstância de a AIA ter, no caso, lançado mão do procedimento de despedimento colectivo, previsto nos arts. 16° e segs. do DL nº 64-A/89, visto como a via escolhida se traduziu até num efectivo reforço da tutela dos trabalhadores.
29. A sentença recorrida fez uma errada aplicação do art. 37° da LCT (em vigor ao tempo dos factos) e da Directiva nº 77/87/CEE (revista pela Directiva nº 2001/23/CE), ao considerar verificada uma transmissão, ainda que parcial, do estabelecimento da AIA para a TAP. Falha que, depois, veio a ser esclarecidamente rectificada pelo douto acórdão ora em crise.
30. Na apreciação do caso sub judice, a 1ª instância desviou-se das noções amplas de “transmissão” e de “estabelecimento”, comuns tanto ao regime da lei portuguesa como ao das citadas Directivas Comunitárias.
31. Acresce que a douta sentença vem desvirtuar o método indiciário que disse ir seguir, enquanto atribuiu valor quase absoluto a factos pouco significativos, procurando neles indícios da «transmissão do estabelecimento», e menosprezou certos outros factos ao não ponderar circunstâncias que claramente afastariam aquele pretenso valor indiciário. Procedimento retomado pelos AA. no presente recurso de revista.
32. No que respeita ao primeiro indício de “transmissão” invocado pela sentença – a actividade charter em causa – é incorrecta a assimilação feita pela sentença entre tal actividade económica e a entidade económica, porquanto induz a conclusão de que a mera prossecução, por um sujeito, de uma actividade económica antes a cargo de outro, envolve sucessão numa entidade económica, e logo “transmissão” de parte do estabelecimento – o que não faz sentido, e tem sido expressa e consistentemente repudiado pelo TJCE.
33. Depois, e contrariamente ao que afirmam os AA., na peugada da sentença da 1ª instância, a pretensa continuação da actividade charter da AIA pela TAP, não indicia qualquer «transmissão de estabelecimento» no cenário factual retratado no processo.
34. A realização pela TAP de parte dos voos charter contratados pela AIA para o Verão lATA 93 ocorreu numa circunstância – a TAP dispor-se, a solicitação do liquidatário, a minorar os prejuízos/evitar indemnizações – não ponderada pela Mmª Juiz, mas que lhe retira qualquer peso indiciário.
35. Estando o processo de liquidação em curso e verificando-se a impossibilidade de a AIA efectuar tais voos (a cuja realização já ela se tinha vinculado), a decisão da comissão liquidatária de cometer à TAP a respectiva realização encontra plena justificação no art. 152°, nº 3, als. a) e b) do CSC, que a sentença ignorou.
36. Acresce que a argumentação da sentença prova demais: se a mera assunção de alguns voos já contratados pela AIA para o Verão de 1993 implicasse «transmissão de estabelecimento», sempre caberia perguntar quantas transmissões teriam ocorrido se a AIA tivesse, antes, contratado tais voos com várias outras companhias aéreas, designadamente estrangeiras.
37. Nem a identidade da actividade charter levada a efeito pela TAP no ano de 1994 indicia «transmissão de estabelecimento»: segundo as orientações convergentes dos ordenamentos interno e comunitário, a assunção de tal actividade pela TAP só poderia configurar «transmissão de estabelecimento», se acompanhada da transmissão de um conjunto significativo de elementos corpóreos e incorpóreos, organizados como um todo, em termos de conservar uma identidade de estabelecimento (identidade da entidade) visando o seu desempenho – o que claramente não sucedeu no caso vertente.
38. Nos poucos voos charter que a TAP contratou e, após, programou para o ano de 1994, não fez ela uso da identidade da “entidade” económica que antes pertencera à AIA. A TAP fez uso, isto sim, do seu próprio instrumento de intervenção no mercado em causa, que era a empresa TAP dela mesma, e não do instrumento de intervenção nesse mesmo mercado que antes havia sido da defunta AIA.
39. Ao contrário do que – procurando sempre suporte na sentença da 1ª instância –afirmam os AA., não houve, no presente caso, passagem da clientela da AIA para a TAP, lá pelo simples facto de a TAP passar a actuar no mesmo mercado em que antes actuava a AIA. Obstam a tal conclusão a natureza muito concorrencial do mercado charter e a volatilidade da respectiva clientela. Aliás, nem se concebe uma transmissão da clientela quando não permanece a identidade das duas entidades.
40. Qualquer eventual aproveitamento pela TAP da quota de mercado deixada vaga pela AIA não se qualifica como «transmissão de estabelecimento», pois, ao abrigo da autonomia privada, reconduz-se, sempre e só, ao exercício da liberdade de iniciativa económica e de livre concorrência. Não há «transmissão de estabelecimento» só porque uma empresa cessa a sua actividade e outra passa a desempenhar a mesma actividade.
41. Quanto ao último indício reputado decisivo pela sentença – a passagem de alguns elementos corpóreos da AIA para a TAP – duas razões há que determinam a sua irrelevância: a ausência de qualquer organização desses bens (como um conjunto completo, que não mero somatório das partes) e a sua não essencialidade para o desempenho da actividade charter pela TAP.
42. Ademais, a passagem desses poucos e singulares elementos corpóreos, separados do todo de que haviam feito parte (e separados também uns dos outros), verificou-se durante o processo de liquidação da AIA e analisou-se em sucessivas transmissões avulsas de bens isolados (i.e., desenquadrados da organização produtiva cujo desmantelamento estava então em curso), e obedecendo a diferentes finalidades – tanto mais que não se manteve nenhuma das relações individuais de trabalho necessárias para qualquer unidade organizacional ter continuidade no futuro.
43. No momento em que alguns bens desgarrados do conjunto passaram para a TAP, eles já não estavam organizados nem afectos autonomamente à prossecução da actividade económica charter, não integrando, pois, uma unidade económica, com identidade própria, cuja continuação em funcionamento poderia porventura justificar a continuação dos vínculos de trabalho que a um todo organizado estivessem ligados.
44. Depois, e ao contrário do que diz a sentença, há alguns bens inteiramente irrelevantes para servirem de suporte à actividade charter da TAP: é manifestamente o caso das loiças de bordo, como o é também de algum mobiliário de escritório (solto do conjunto), cuja afectação à actividade charter nem sequer ficou provada nos autos, antes se tendo provado que cada coisa foi para seu lado.
45. Quanto aos 4 Boeing 737 (de 1 dos quais a TAP era locatária, sendo avalista dos contratos de locação dos outros 3), provou-se terem sido usados em alguns voos charter da AIA contratados para o Verão de 1993, mas igualmente se provou terem eles efectuado também voos regulares ao serviço da TAP, e mais se provou que alguns daqueles voos charter foram de igual modo realizados por aviões da própria TAP. Numa palavra: não constituíam tais 4 Boeing 737 suporte decisivo da actividade charter da TAP, a qual sempre poderia tê-la exercido sem eles, como podia nunca a ter exercido, dando a tais 4 Boeing 737 um diverso uso (v.g., utilizando-os nos seus voos regulares ou até sublocando-os a outras companhias aéreas).
46. Se, por hipótese que não se admite, tivesse ocorrido «transmissão do estabelecimento» da AIA para a TAP, os actos pretensamente consubstanciadores dessa «transmissão do estabelecimento» teriam ocorrido depois de 30 de Abril de 1993.
47. Ora, demonstrado que foi lícito (nº 19 supra das presentes Notas Finais) o despedimento colectivo concretizado pela AIA com efeitos a 30 de Abril de 1993, extinguiu-se em tal data a relação laboral de todos os trabalhadores da AIA (maxime, dos AA e dos Intervenientes). E, nos termos do artº 37º, nº 1, 2ª parte, da LCT, não se verifica transferência para a suposta adquirente (TAP) dos trabalhadores cujos contratos deixaram de vigorar, nos termos legais, antes da data em que o estabelecimento tivesse, por hipótese, sido transmitido.
48. É muito grave a contradição em que incorre a douta sentença recorrida quando afirma que ocorreu "pelo menos em parte" «transmissão de estabelecimento» da AIA para a TAP, mas declara ilícito o despedimento de todos os AA e Intervenientes e condena a TAP na reintegração de todos eles.
49. Na verdade, ou a douta sentença dava como provada a transmissão total do estabelecimento da AIA para a TAP, do que resultaria a transmissão de todos os contratos de trabalho (opção inviabilizada pela factualidade dada como provada) ou então considerava ter ocorrido transmissão parcial, mas aí teria, coerentemente, de identificar, um a um, cada contrato de trabalho vinculado à concreta parte transmitida (reconhecendo que todos os demais contratos de trabalho não vinculados à parcela transmitida haviam cessado).
50. Decidindo como decidiu, a douta sentença ignorou que os regimes nacional e comunitário de tutela dos trabalhadores em caso de «transmissão do estabelecimento» só se aplicam aos vínculos laborais existentes, exceptuando expressamente aqueles que já tenham regularmente cessado em momento anterior à transmissão.
51. Tais regimes obstam a que um trabalhador cujo vínculo se extinguiu venha depois exigir a sua transmissão para o adquirente, desde logo pela invocação de argumentos que propiciem a "ressurreição" de contrato de trabalho já morto.
52. Por maioria de razão, isto vale para o caso em apreço: se num contexto de transmissão de uma organização produtiva em funcionamento se exceptuam os contratos de trabalho já extintos, o mesmo não pode deixar de suceder num cenário de desmembramento ou desmantelamento dessa mesma organização, em que só podem ser transmitidos, vendidos ou liquidados, elementos patrimoniais soltos. Notar-se-á que, in casu, se trata de uma empresa em que a totalidade do pessoal é despedida e em que, em substituição, não ingressa ninguém para accionar o substrato material pretensamente subsistente.
53. A mera ocorrência de tais alienações isoladas não tem aptidão para justificar a pretensão de trabalhadores já legitimamente despedidos (maxime, com fundamento num encerramento definitivo da empresa que realmente ocorreu), de virem questionar a validade da anterior cessação dos contratos de trabalho e exigir a sua transmissão para o adquirente de bens isolados e destituídos de qualquer organização que os fizesse interagir como um todo.
54. Contrariamente ao decidido na sentença recorrida, não ocorreu no presente caso qualquer erro-vício, nem – a admitir-se tal hipótese – este preencheria os requisitos de relevância enunciados no art. 252°, nº 1, do Cód. Civ.
55. O erro invocado por alguns AA e acolhido pela sentença da 1ª instância reconduz-
-se ao (indevidamente) designado error in futurum, que não constitui erro-vício verdadeiro e próprio, podendo, quando muito, ser abrangido pela alteração das circunstâncias, que na hipótese sub judice não foi invocada.
56. Segundo a sentença, os AA aceitaram a compensação no desconhecimento do que viria a suceder: que (em seu entender) a empresa AIA não encerrou, antes tendo parte do seu estabelecimento sido transferida para a TAP.
57. Contudo, na própria versão dos AA, esses alegados eventos teriam curiosamente ocorrido já após a cessação dos contratos dos AA. E, porque assim, admitindo-se mesmo, como hipótese académica, que não se trata de meras fantasias dos AA, sempre tais eventos constituiriam desenvolvimentos com que os AA não contavam e não haviam sequer perspectivado – o que manifestamente afasta a qualificação como erro desta situação.
58. Ao erigir em motivo determinante do recebimento da compensação uma suposta convicção dos AA de que não haveria «transmissão do estabelecimento», a sentença violou o regime do erro, qualificando como essencial um motivo cuja verificação e relevância não são suportadas pelos factos – que indiciam serem outras as motivações que em tal decisão pesaram.
59. O acordo entre declarante e declaratário previsto no nº 1 do art. 252.° do Cód. Civ. implica o aceitar por este da essencialidade de dado motivo (porventura irrelevante em geral mas decisivo para o declarante), assumindo o risco da anulação do negócio, caso se revele que aquele nunca existiu – o que patentemente não sucedeu no presente caso.
60. Tendo julgado preenchido tal requisito a partir da precipitada e simplista ideia de que "temos como normal e patente que para a ré AIA era claro que o encerramento do estabelecimento era causa essencial e determinante da aceitação do despedimento", a douta sentença recorrida violou o art. 252°, nº 1, do Cód. Civ.
61. De acordo com o artº 25º, nº 2, da LCCT (em vigor ao tempo dos factos), o direito de impugnar o despedimento colectivo só era reconhecido aos trabalhadores que não tivessem aceitado o despedimento. E a aceitação pelos trabalhadores da compensação a que se refere o artº 23º, nº 1 da LCCT, era havida como declaração ficta da aceitação do despedimento (artºs 23º, nº 3, e 13º, nº 3 da LCCT).
62. Aceita-se e perfilha-se tanto a decisão como a fundamentação das instâncias relativamente à inconstitucionalidade orgânica (falta de autorização expressa da AR ao Governo sobre a possibilidade de de reduzir o direito de acção) e à inconstitucionalidade material (denegação do direito de acesso aos tribunais – artº 20º da CRP – e do princípio da igualdade – artº 13º da CRP), invocada pelos AA. do Procº nº 194/94.
63. A aceitação do despedimento decorrente da aceitação da compensação não tem a natureza e o alcance que a sentença recorrida lhe veio conferir (declaração negocial verdadeira e própria, anulável por erro nos termos gerais), nem a eventual procedência do erro invocado seria de molde a descaracterizar o valor do recebimento como aceitação do despedimento, fazendo renascer o direito de impugnar o despedimento colectivo.
64. O recebimento da compensação por todos os AA (excepto um) exprime, objectivamente, a vontade deles de se conformarem com o despedimento e seus efeitos, a que, ao tempo, a nossa lei associava, ainda, a preclusão da impugnação do despedimento colectivo, o que equivale a dizer que os AA não eram titulares do direito de impugnar o despedimento colectivo (artº 23º, nº 3 da LCCT).
65. Ao contrário do que afirma a sentença, não há que falar aqui de uma declaração negocial de aceitação do despedimento, através de outra declaração, de aceitação do pagamento, em termos de se poder anular aquela, atacando esta.
66. Acresce que a motivação do despedimento colectivo tem um elevado carácter de prognóstico, cuja pertinência e validade não podem ser destruídas pelo facto de a antevisão não vir a ser confirmada pelos factos. As falsas indicações dos motivos do despedimento colectivo apenas relevam eventualmente para averiguar da licitude desse mesmo despedimento, não se aplicando ao trabalhador (declaratário num negócio unilateral como o despedimento) a doutrina do erro do Cód. Civ. Ao Direito interessa a existência objectiva de situações, a plausibilidade de um discurso sobre estas e o eventual prejuízo dos trabalhadores – e não a correcta formação da vontade de decisão.
67. Quando a questão é deslocada para eventual relevância do erro no recebimento da compensação, tal deslocação é indevida por ter o efeito perverso de atacar a motivação patronal para o despedimento colectivo, não através da correcta avaliação da procedência ou improcedência do discurso fundamentador apresentado pelo empresário, mas através das representações variáveis, subjectivas e sem especial consistência, de cada um dos trabalhadores.
68. Quanto ao recebimento da compensação, este apenas será anulável com base em erro-vício na formação da vontade, se respeitante ao próprio acto de recebimento qua tale, enquanto aceitação dos quantitativos compensatórios do despedimento.
69. Anulando por erro sobre os motivos a aceitação (ficta) do despedimento relativamente a todos os AA., a sentença recorrida viola frontalmente o art° 287° do Cód. Civ., porquanto só os AA dos Processos nºs 194/94 e 196/94 invocaram esse vício e pediram a anulação do tal negócio jurídico. Mas, mesmo em relação aos AA destes dois mencionados processos, a sentença não podia ser mantida, como o não foi pela Relação, porquanto:
- não se tendo provado que o despedimento colectivo teve causas diferentes das invocadas pela AIA, não ocorreu a falsa representação da realidade que possa ser havida como erro na formação da vontade, em qualquer das suas modalidades;
- ainda que houvesse erro sobre os motivos, não foi feita prova da sua essencialidade;
- e, mesmo que houvesse essencialidade, não ficou provado terem as partes reconhecido, por acordo, a essencialidade do motivo, não bastando, para o efeito, o conhecimento ou a cognoscibilidade da essencialidade pelo declaratário.
70. A acção de impugnação judicial do despedimento colectivo deve ser intentada no prazo (de caducidade) de 90 dias, a contar da data de cessação do contrato de trabalho feita constar da comunicação da decisão de despedimento emitida pela entidade patronal (artº 25º, nº 2 da LCCT).
71. No caso do despedimento colectivo operado pela AIA, só o trabalhador A 17 (e não os restantes AA e intervenientes) teria o direito de o impugnar. Acontece que nenhum dos 4 processos (Procs. nºs 246/93, 194/94, 196/94 e 1263/94), incluindo portanto aquele em que é A. o trabalhador A 17, foi intentado dentro do aludido prazo-limite de 90 dias, estando, por conseguinte, extinto, por caducidade, e quanto a todos e cada um dos AA e intervenientes, o direito (potestativo) de accionar a AIA, entidade que promoveu o despedimento colectivo.
72. A sentença recorrida errou ao julgar improcedente a excepção de caducidade do direito dos AA de impugnar o despedimento colectivo nos Procs. nºs 246/93, 194/94,196/94 e 1263/94, instaurados já depois de decorrido o prazo de 90 dias (contados desde 30 de Abril de 1993) do art. 25°, nº 2, do DL nº 64-A/89, por considerar aplicável, não este, mas o prazo de um ano previsto no art. 287°, nº 1, do Cód. Civ.
73. Tal solução, que afasta uma norma especial para aplicar um regime comum (contrariando o princípio lex specialis legi generali derrogat, art. 7.°, nº 3, do Cód. Civ.) compromete, sem motivo, o desígnio de estabilizar as situações das partes que a inspira, para além de gerar o absurdo de, em sede de despedimento colectivo, a violação de lei, causa de nulidade, estar submetida ao prazo de 90 dias, mas não já a anulabilidade fundada em vícios na formação da vontade relativa ao acto de percebimento da compensação devida.
74. Ainda a sentença recorrida decidiu mal, quando, de forma incongruente e contrária à lei, julgou todas aquelas quatro acções tempestivamente propostas. A Relação julgou procedente a excepção de caducidade relativamente às acções nº 194/94, 196/94 e 1263/94, declarando precludido o direito desses AA. e dos Intervenientes que aderiram a essas acções a impugnarem o despedimento colectivo. Sucede que também a acção nº 246/93 deu entrada em juízo em 15 de Setembro de 1993, quando o prazo de 90 dias já tinha terminado em 29 de Julho de 1993. Tal prazo é de caducidade e esta é oficiosamente apreciada pelo Tribunal (artº 333º do Código Civil), pelo que confiadamente se espera que o STJ estenda aos AA. da acção nº 246/93 a preclusão do direito a impugnar o despedimento colectivo.
75. Além disso, e este é também um facto deveras importante, nem todos os AA invocaram o erro-vício como fundamento de anulação da aceitação da compensação, logo (no entender da 1ª instância) do próprio despedimento. Concretizando: o erro-vício não foi invocado pelos AA dos Procs. nº 246/93 e nº 1263/94 e, todavia, a magnânima sentença a todos beneficiou. Não fora o acórdão recorrido, e este efeito perverso haveria de verificar-se.
76. Ora, gerando o erro anulabilidade e dependendo esta de invocação pelo errante, só poderia valer-se dos seus eventuais efeitos favoráveis (como o alargamento do prazo de impugnação do despedimento colectivo) aquele mais reduzido núcleo de AA que a tivessem invocado. Pelo que, decidindo com a amplitude com que decidiu, a sentença recorrida violou ainda o art. 287°, nº 1, do Cód. Civ.
77. A 1ª instância também errou quando se baseou no disposto no artº 406º, al.g), do Código das Sociedades Comerciais, para infirmar que a extinção da AIA por deliberação da respectiva assembleia geral dos accionistas não teve como consequência a cessação da empresa de que a AIA era titular e ignorou, contra o disposto no artº 373º, nº 2 do mesmo Código que tal matéria é da competência exclusiva da assembleia geral dos accionistas.
78. Uma vez que, no caso concreto, não houve deliberação alguma da assembleia geral a autorizar o liquidatário a proceder nos termos previstos nas al. c) ou d) do nº 2 do artº 152º do CSC, a 1ª instância mais errou quando entendeu que a extinção da AIA não tinha como consequência necessária o encerramento da empresa.
79. A conclusão correcta e que não foi assumida pela Mmª Juiz da 1ª instância face aos normativos do Código das Sociedades Comerciais aplicáveis ao caso concreto, era a de que o encerramento da empresa decorreu da extinção da sociedade, pessoa colectiva, por deliberação única e decisiva da assembleia geral dos accionistas, orgão exclusivamente competente para o efeito.
80. A comunicação feita aos trabalhadores de que o despedimento colectivo tinha por fundamento o encerramento definitivo da empresa constituiu, portanto, um acto lícito e conforme aos citados dispositivos legais e às normas expressas nos artºs 16º, 17º e 18º do DL nº 64-A/89, de 27 de Fevereiro.
81. Por via dessa comunicação foi transmitida aos trabalhadores abrangidos pela intenção de despedimento, de forma autêntica e suficientemente clara, que era vontade do colectivo dos accionistas, legalmente expressa em assembleia geral da AIA, que a empresa encerrasse definitivamente em consequência da sua extinção e que o despedimento colectivo viesse a concretizar-se.
82. Aliás, tal procedimento tutelador nem carecia de ter sido tomado uma vez que, como já se disse atrás, o disposto no nº 3, do artº 6º, do citado DL 64-A/89, configura uma situação de caducidade dos contratos de trabalho.
83. Confrontada com estas evidências e, ainda mais, com as consequências do regime instituído nos artºs 23º, nº 3 e 13º, nº 3 da LCCT, a douta sentença recorrida lançou mão do conceito de erro sobre os motivos e, nessa ansiedade começou logo por violar o disposto no artº 287º do Código Civil visto que, nem todos os trabalhadores, mas só os identificados nos Proc. nºs 194/94 e 196/94 pediram a anulação do negócio jurídico que consistiu na aceitação por todos eles (com a excepção de um só) da compensação que lhes era devida.
84. Depois, ignorou que para a impugnação do despedimento colectivo havia um prazo de caducidade – o prazo estabelecido no artº 25º, nº 2, da LCCT – que não foi observado por nenhum dos trabalhadores que aceitaram o despedimento colectivo.
85. Enfim, a Mmª Juiz da 1ª instância não conseguiu enquadrar a situação no conceito de erro sobre os motivos, posto que não foi feita prova de falsa representação da realidade, nem da essencialidade dos motivos, nem do acordo quanto a essa pretensa essencialidade, o que obviamente afasta a aplicação do artº 252º do Código Civil.
86. Restaria, assim, configurar a «transmissão do estabelecimento», ideia que notoriamente subjaz em toda a sentença, à qual agora os AA. desesperadamente se agarram como única bóia de salvação.
87. Porém, nem a lei portuguesa, nem as directivas comunitárias, nem a jurisprudência do TJCE, dão, nesta matéria, cobertura aos factos parcamente provados e de modo algum relevantes para o efeito, como já se demonstrou clara e exaustivamente, pelo que o douto acórdão recorrido fez uma brilhante, lúcida e certeira aplicação do artº 37º da LCCT, interpretado em rigorosa sintonia com as Directivas e a jurisprudência comunitárias.
88. Sem conceder, mesmo que por absurdo se admitisse a verificação de uma transmissão parcial do estabelecimento, como vem expressamente afirmado na sentença da 1ª instância, esta termina por um grave erro de julgamento na medida em que tal pretensa transmissão parcial não podia abranger – precisamente por ser parciala totalidade dos trabalhadores. Os AA., sentindo que nesta parte a sentença da 1ª instância é para eles um grande empecilho, mudaram de estratégia e passaram simplesmente a dizer que a transmissão do estabelecimento da AIA para a TAP foi total.
89. A manifesta desorientação dos AA. levou-os à verdadeira fuga para a frente, afirmando, com ousadia (e para além do que a Mmª Juiz havia decidido), que o negócio que a AIA prosseguia “foi, todo ele, transmitido pela comissão liquidatária da AIA à Recorrida TAP, que, sem qualquer quebra ou descontinuidade, o fez seu” (V. por exemplo, fls. 6963 a 6965 dos autos).
90. A douta sentença recorrida, contra o disposto no artº 659º do CPC, não fez uma correcta subsunção dos factos ao direito e violou, entre outras normas jurídicas aplicáveis ao caso «sub iudice», os normativos seguintes: do Código Civil – artºs 7º nº 3, 252º nº 1 e 287º nº1; do Código das Sociedade Comerciais – artºs 141º nº 1 al. b), 146º nº 1, 148º, 152º, nº 2, al. a), c) e d), nº 3 al. a), b) e d), 160º nº 2, 363º nº 2, 373º nº 2 e 406º al. g); do Regime Jurídico da Cessação do Contrato de Trabalho (LCCT aprovada pelo DL nº 64-A/89, de 27/2) – artºs 6º nº 3, 13º nº 3, 16º, 17º, 18º, 23º nºs 1 e 3, 25º nº 2 e 37º; Directiva Comunitária nº 77/87/CEE; do DL 19/82, 28 de Janeiro – artº 11º (intransmissibilidade das licenças concedidas para o exercício da indústria do transporte aéreo não regular).
91. Assim não aconteceu com o Tribunal da Relação de Lisboa quando doutamente revogou a dita sentença aplicando correctamente as normas nacionais e comunitárias que haviam sido violadas, e assim se espera também da alta competência desse Venerando Tribunal.
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Também o A. A 17 apresentou contra-alegações ao recurso interposto pela ré TAP, nelas concluindo nos seguintes termos:
1ª A Recorrente TAP nas suas doutas alegações, vem, por forma escamoteada, arguir uma nulidade do douto acordão recorrido, assim violando o disposto no nº 1 art. 77º do CPT onde se consagra que a arguição de nulidades da sentença é feita expressa e separadamente no requerimento de interposição de recurso.
Com efeito,
2ª Alega a Recorrente que a Veneranda Relação, ao dar como assente que “o estabelecimento da AIR ... não foi transmitido para a TAP”, nunca poderia concluir pela sua condenação na reintegração do A. A 17 e no pagamento das retribuições a que este tem direito desde 15.08.1993;
3ª Alega ainda a Recorrente que tal fundamento de direito a coloca como terceiro em relação ao ora Recorrido, pelo que, a Veneranda Relação estendeu indevidamente a sentença condenatória à TAP.
Ou seja,
4ª Alega claramente que existe no acórdão em apreço «oposição dos fundamentos com a decisão», sendo certo que este vício afecta a estrutura lógica da sentença, por contradição entre as suas premissas, de facto e de direito, e a conclusão.
5ª Alega inequivocamente que os fundamentos em que assenta o acórdão não conduziriam ao resultado expresso na decisão, antes conduzindo logicamente a caminho oposto: a absolvição da TAP.
Contudo,
6ª Pelas razões expostas, o que é forçoso concluir é que, sem o invocar expressamente –
alegando até a final que “ decidindo como decidiu o Tribunal a quo violou, entre outras normas, o disposto no art. 37º da LCT…” – a Recorrente acaba por arguir a nulidade do acordão ora em crise , quer por falta de fundamentos (al. b) do nº 1 do art. 668º do CPC) quer pela contradição dos fundamentos de direito e a decisão proferida neste domínio (al. c) do mesmo preceito legal).
7ª Fá-lo, porém, extemporaneamente, pois, em harmonia com o aludido art. 77º do CPT, essa nulidade deveria ter sido suscitada no requerimento de interposição de recurso.
8ª Consequentemente, não pode o STJ tomar conhecimento da pretensa nulidade, por não estarmos perante matéria de conhecimento oficioso.
9ª É esta, aliás, a posição unânime adoptada pela jurisprudência (Cf., entre outros, Acs. do STJ de 14/12/2004, in www.dgsi.pt/jst, com o nº04S2169, de 1/6/1994, 19/10/1994 e 23/4/1998, respectivamente na Colectânea de Jurisprudência 1994, Tomo III/274, BMJ 440/242 e BMJ 476/297).
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A Exma. Magistrada do Ministério Público emitiu o seu parecer no sentido de considerar que, no caso concreto, não se verificou a transmissão de qualquer estabelecimento nos termos e para os efeitos previstos no art. 37.º da LCT e nas Directivas Comunitárias n.ºs 77/187/CEE e 2001/23/CE e que não se justifica o reenvio prejudicial, não se pronunciando sobre as demais questões suscitadas pelos recorrentes, por entender que a sua apreciação está dependente da decisão sobre a licitude do despedimento colectivo suscitada no primeiro recurso de revista interposto nestes autos, tendo o MP emitido parecer oportunamente sobre a questão nele colocada.
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Foram juntos aos autos, pelas partes, doutos pareceres de ilustres jurisconsultos.

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Colhidos os vistos legais cumpre decidir.
2. Fundamentação de facto
O Tribunal da Relação começou por considerar reproduzida toda a matéria de facto constante da decisão da 1ª Instância – art. 713º nº 6 do CPC - por não ter sido impugnada nem haver lugar a qualquer alteração, consideração que aqui se reitera.
Elencar-se-á, todavia (aqui se seguindo também o método adoptado pela Relação), a matéria de facto provada mais relevante para a apreciação das questões jurídicas suscitadas nos recursos de revista que ao Supremo incumbe apreciar, com referência às alíneas da Especificação, aos quesitos ou aos documentos de que emergem.
Estão provados os seguintes factos:
- A 1.ª Ré, AIR ..., SA (AIA) criada em 1985, dedicava-se à indústria de transporte aéreo não regular e serviços complementares com ela relacionados [al. d) da especificação].
- No dia 19.02.93, foi deliberado em Assembleia-Geral Extraordinária dissolver a Ré AIA, conforme acta documentada a fls. 182-197 do Proc.º 1263/94 apenso, da qual consta, designadamente, a seguinte proposta de dissolução:
“Considerando que a AIR ..., SA vem apresentando resultados negativos desde 1990 (…);
Considerando que se antevê um resultado negativo do exercício de 1992 da ordem de 1.300.000 contos;
Considerando que a operação da AIR ..., SA tem vindo a ser financiada pela TAP através da prestação de inúmeros serviços, facturados em cerca de 2.800.000 contos, em dívida a esta última;
Considerando que a actual conjuntura recessiva da aviação comercial, indubitavelmente influenciada pela liberalização do transporte aéreo intracomunitário, tem demonstrado a inviabilidade de companhias aéreas vocacionadas para tráfego não regular sediadas em pólos receptores de turismo;
Considerando que, neste contexto, a recuperação de inúmeros serviços não se crê viável;
A TAP, AIR PORTUGAL propõe a dissolução da AIR ..., SA por simples vontade dos accionistas, nos termos da alínea b) do n.º 1 do art. 141.º do Código das Sociedades Comerciais, como forma de obstar a que a Empresa, pela acumulação de resultados negativos, entre, sem retorno, num degradante processo de falência” [al. a) da especificação]- (1).
- A 1.ª Ré, na sequência da deliberação tomada pela sua assembleia geral de 19 de Fevereiro de 1993, foi dissolvida por escritura pública de 19 de Abril de 1993 (doc. n.º 1), dissolução que foi efectiva e definitivamente registada no registo comercial de Faro, local da sua sede, em 26 de Maio de 1993 [al. e) da especificação e certidão de fls. 202 e ss. ].
- Em 26.02.93, a ré AIA enviou a todos os ex-trabalhadores a comunicação de despedimento (com efeitos a partir de 30.04.93) a que se refere o artº 20 do D.L. 64-A/89, conforme doc. Fls.3217, vol. 13, na qual fazia saber que, decorrido o prazo do aviso prévio de 60 dias, os respectivos contratos cessariam a 30 de Abril de 1993. De tal comunicação consta, designadamente, que “[a] cessação do contrato de trabalho baseia-se no encerramento definitivo da Empresa, decidido em Assembleia Geral de Accionistas de 19 de Fevereiro de 1993” [146º-A] - (2).
- Todos os AA, à excepção de A 17 (Proc.º 246/93) receberam a compensação que a Ré AIA pôs à sua disposição [al. b) da especificação e 18.º-D].
- Os autores encararam como inevitável o despedimento colectivo face à alegada situação económica, financeira e operacional invocada pela ré AIA [14º e 143º].
- Os AA. e a generalidade dos colegas, entenderam como inevitável o despedimento colectivo, e decorrente da situação vivida no transporte aéreo internacional, após a conhecida liberalização da exploração de linhas comerciais, e também em resultado da crise geral derivada da Guerra do Golfo e no momento tomaram como verdadeiros os motivos adiantados nas cartas dos documentos n.ºs 169 a 222 do processo n.º 1263/94, de que a ré AIA iria encerrar [29.º, 72º]-(3) .
- Situação que consideraram como causa da necessidade de encerramento da 1.ª Ré [30.º e 73º].
- Os AA aceitaram receber a compensação no convencimento de que a extinção da 1.ª Ré era inelutável resultante da liberalização do tráfego aéreo internacional e da crise geral da Guerra do Golfo, tomando no momento como verdadeiros os motivos adiantados nas cartas dos doc. Nº 169 a 222, de que a ré AIA iria encerrar [50º, 93º e 129º].
- Nessa altura os AA não tinham conhecimento de que, após a cessação dos seus contratos de trabalho, a 2.ª Ré TAP realizaria pelo menos parte das operações de voos “charter” até ali assegurados pela AIA, nem tão pouco que a ré TAP ficaria com parte do equipamento daquela, incluindo aviões [51.º e 94º e 130º].
- Os AA, no momento do seu despedimento, nunca perspectivaram a possibilidade de a 2.ª Ré poder continuar a actividade de voos “charter” até ali prosseguida pela 1.ª Ré [74.º ].
- A partir de 93.05.01, a 2.ª Ré TAP passou a realizar pelo menos parte das operações dos voos de fretamento (charter) já contratados pela 1.ª Ré AIA para o período de 93.05.01 a 93.10.31, Verão IATA de 93, contratos firmados antes da sua dissolução [4.º ].
- Utilizando, para tal, pelo menos parte do equipamento que à ré AIA até ali utilizava nas suas operações [5.º ].
- Designadamente 3 aviões B 737/300 com as matrículas ..., ... e ..., e 1 avião B 737/200, com a matrícula ... [6.º].
- Igualmente passou a ser utilizado pela 2.ª Ré equipamento de escritório (mobiliário e computadores) que a 1.ª Ré possuía e utilizava nas suas instalações em Lisboa e em Faro, e outro equipamento tal como as “ loiças “ utilizadas nos aviões [7.º].
- A ré TAP assegurou as operações de voo no Verão IATA, mencionadas na respostas ao art. 4, decisão que, pelo menos em parte, visou evitar os prejuízos decorrentes do não cumprimento dos contratos já celebrados entre a AIA e os operadores turísticos, que implicavam o pagamento de elevadas indemnizações por parte da ré AIA [11º].
- A TAP passou a utilizar os aviões mencionados em 6, os quais se encontravam locados (3) e sublocado (1) à ré AIA, e passou também a utilizar parte do equipamento de voo da AIA, aviões esses cuja devolução antes de esgotados os prazos dos contratos de aluguer implicava o pagamento pela ré AIA à entidade locadora (lessors) de todas as rendas vincendas até ao final do prazo do contrato de locação [12.º].
- A ré AIA, por intermédio da comissão liquidatária, entregou à ora ré TAP equipamento de escritório e outro, entrega que posteriormente foi tida em conta no âmbito da liquidação da ré AIA, considerando a posição de principal accionista e credora por parte da ré TAP [13.º].
- Os aviões ao serviço da 1.ª Ré encontravam-se na seguinte situação:
. O avião B737/200 ... tinha sido alugado (leasing) pela TAP ao respectivo proprietário/lessor (a W...)), tendo a ré TAP posteriormente subalugado o mesmo à Ré AIA, terminando o contrato de aluguer em Novembro de 1998, com opção de rescisão em Novembro de 1995, mediante o pagamento da quantia de 517.500 dólares norte-americanos.
. O avião B737/300 ... havia sido alugado pelo proprietário/lessor (a B...) à Ré AIA, assumindo a 2.ª Ré TAP a posição de garante do cumprimento das obrigações contratuais, terminando o contrato em Novembro de l998, com opção da rescisão em Março de 1994, mediante o pagamento adicional de 350.000 dólares norte-americanos.
. Os aviões B737/300 ... e ... haviam igualmente sido alugados pela 1.ª Ré ao proprietário/lessor (B...), também com garantia de pagamento dada pela 2.ª Ré, terminando os respectivos contratos em Novembro de 1999, com opção de rescisão mediante pagamento adicional de 480.000 dólares norte- americanos - [15.º].
- Por acordo entre as duas rés e o “lessor”, após a dissolução da ré AIA, a ré TAP passou a utilizá-los, assumindo o pagamento das respectivas rendas nos “ leasing” contratados tomando a posição de locatária nos respectivos contratos [17.º ].
- Para a realização dos fretamentos previamente contratados pela 1.ª Ré, a 2.ª Ré utilizou fundamentalmente os 4 aviões que a AIR ... tinha ao seu dispor (referidos em 6), e em menor frequência, por vezes, os próprios aviões da TAP, além de tripulação própria da 2.ª Ré TAP [18.º-B].
- A partir de 1 de Maio de 1993, a 2.ª Ré, que se dedicava quase em exclusivo à actividade de transportes aéreos regulares, além de realizar parte dos voos já contratados pela ré AIA no período referidos em 4, passou a assegurar também operações no mercado “charter” que até ali não assegurava por constituírem rotas tradicionais da ré AIA [37.º].
- Em Março/Abril de 1994, a 2.ª Ré efectuou os seguintes voos “charter”:
DIA VOO DESTINO
31 ... Barcelona/Funchal
... Faro/Bristol
02 ... Lisboa/Tunes
04 ... Funchal/BHX
... Funchal/Barcelona
07 ... Faro/Bristol
09 ... Lisboa/Tunes
... Lisboa/SVQ
11 ... Funchal/BHX
[38.º e 82.º ].
- O equipamento locado pela AIA em regime de locação financeira constituído pelos 4 aviões foi devolvido pela TAP progressivamente aos locadores em datas incertas entre 1998 e 2000 [64.º-A].
- A ré TAP não estava vocacionada para o mercado charter à data da dissolução da ré AIA, por a sua estrutura estar fundamentalmente montada para o voo regular (leva carga, correio, duas classes, etc) [83.º]..
- A Ré TAP passou a utilizar parte do equipamento de voo da 1.ª Ré supra referido, mudando-lhe, passado algum tempo, as cores e logótipo, que passaram a ser as da 2.ª Ré [99.º].
- Desde que a AIA se constituiu, a Ré nunca mais teve uma actividade de voos “charters”, como actividade própria, dedicando-se apenas a actividade de voos regulares, salvo em casos excepcionais em voos ad hoc de longo curso, ou a pedido da AIA por incapacidade de resposta desta, designadamente quando havia grande procura pontual para finais futebolísticas no estrangeiro [103.º].
- As funcionárias A 176 e A 177, até então destacadas pela TAP para exercerem funções na Direcção Comercial da AIA, após a dissolução desta, foram colocadas pela ré TAP na sua Direcção Comercial com funções na área de voos não regulares ad hoc e dos contratos de voos “charter” do Verão IATA 93 [105.º].
- A Ré fez circular um telex pelos serviços operacionais, em que dava a conhecer os indicativos atribuídos aos voos não regulares, isto é voos “charters”, sendo que eram os seguintes:
Para o ano de 1993 – voos ... – ....
Para o ano de 1994 – voos ... – ... [106.º].
- Para o período de Verão 94, a Ré TAP contratou e após programou voos charter que até ali não assegurava, e que correspondiam a rotas/destinos tradicionais da ré AIA por esta efectuados anteriormente à sua dissolução [108.º].
- A que corresponderam os seguintes voos:
“ TP ..., no período de 27 de Março a 25 de Abril, B737, 132 passageiros em classe turística - Funchal (FNC) Birmingham (BHX).
“ TP ... - sentido contrário, isto é, Birmingham Funchal.
“ TP ..., no período de 27 de Março a 28 de Abril, A 320, 156 passageiros em classe turística - Faro (FAO) Bristol (BRS).
“ TP ... - sentido inverso, isto é, Bristol Faro.
“ TP ..., no período de 2 de Abril a 29 de Outubro, B 737 300, 119 passageiros em classe turística - Faro Dublin.
“ TP ... – sentido inverso, isto é Dublin Faro, conforme doc. 224, fls 592, 2º vol., proc 1263/94 [109.º].
- Para o período de Verão de 1994, os voos TP ... e TP ..., que constavam da programação de doc. 224 (proc. Apenso 1263, vol. 2, fls 592) estavam confirmados e constavam do Guia de programação de Horários [111.º].
- A ré TAP programou também os voos TPP ..., Cork Faro, neste período de Verão IATA 1994 [112.º]..
- Para além destes voos acima identificados, a Ré programou ainda voos “charters” soltos, nomeadamente e entre outros:
-TP..., 27 de Julho de 1994, Porto Luxemburgo.
-TP..., 27 de Julho, Luxemburgo Porto.
-TP..., 28 de Julho, Porto Luxemburgo.
-TP..., 28 de Julho, Luxemburgo Porto.
-TP..., 29 de Julho, Porto Luxemburgo.
-TP..., 29 de Julho, Luxemburgo Porto.
-TP..., 20 de Agosto, Porto Luxemburgo e
-TP..., 21 de Agosto, Luxemburgo Porto [112.º].
- Todos esses voos “charters” correspondem a destinos/rotas que até à data da dissolução da ré AIA eram por esta contratados junto dos operadores turísticos do mercado, e após também por si programados e efectuados [115.º].
- A Ré TAP ficou em seu poder com quatro BOEING 737 mencionados no art. 6.º, nas seguintes condições:
. tomando o lugar de locatária em substituição da AIA nos três Boing 737/300 (..., ..., ...), por acordo celebrado em 30.04.93 entre estas duas rés e o lessor (B...), conforme documento incluído em pasta Apensa, B 24 ;
. acordando com a ré AIA o cancelamento da sublocação existente entre ambas no que se refere à aeronave B 737/200 (o ...), voltando a TAP a assumir o papel de locatária no contrato inicial com o lessor (W...) [116.º].
- Os intervenientes A 87, A 132, A 129, e A 102, na data em que declararam rescindir o contrato desconheciam que a ré TAP passaria a realizar voos charter que até ali correspondiam a destinos assegurados pela AIA, e que a ré TAP passaria a utilizar os 4 aviões nas condições supra referidas [147.º].
- Os intervenientes na altura abordaram o director de pessoal da AIA – A 178 inquirindo-os sobre as consequências de rescindirem os contratos durante a fase de aviso prévio, dado que tinham propostas de empregos, tendo aquele informado os mesmos que não perderiam os seus direitos de indemnização, e que a rescisão agilizaria o processo [148.º].
- A acção 246/93 deu entrada em tribunal no dia 15 de Setembro de 1993.
- A acção 194/94 deu entrada em tribunal no dia 20 de Abril de 1994.
- A acção 196/94 deu entrada em tribunal no dia 20 de Abril de 1994.
- A acção 1263/94 deu entrada em tribunal no dia 26 de Abril de 1994.
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3. Fundamentação de Direito
3.1. Enunciação das questões a decidir
Sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões dos recorrentes – arts. 690º, nº 1 e 684º, nº 3 do Código de Processo Civil, aplicáveis “ex vi” do art. 1º, nº 2, al. a) do Código de Processo de Trabalho – as questões que se colocam à apreciação deste tribunal são, essencialmente, e atenta a ordem lógica da sua apreciação, as seguintes:
1.ª - Da arguição de nulidades relativamente ao acórdão de 16 de Janeiro de 2008;
2.ª - Se o saneador-sentença, na parte em que declarou a ilicitude do despedimento por não verificação do fundamento invocado (encerramento definitivo da empresa), transitou em julgado, não podendo, consequentemente, ser alterado;
3.ª - Se ocorreu a caducidade do direito de acção relativamente aos Autores das acções n.ºs 194/94, 196/94 e 1263/94 e intervenientes que a elas aderiram (revistas interpostas pelos AA. e intervenientes), bem como relativamente aos AA. da acção n.º 246/93 e intervenientes que à mesma aderiram (ampliação do objecto da revista por parte das RR.);
4.ª - Dos fundamentos invocados para o despedimento colectivo a que procedeu a R. AIA;
5.ª - Se ocorreu transmissão da empresa explorada pela ré AIA para a ré TAP;
6.ª - Se o Supremo Tribunal de Justiça deve submeter ao Tribunal de Justiça das Comunidades Europeia (TJCE), em reenvio prejudicial, a interpretação da Directiva 77/187/CEE, de 14 de Fevereiro de 1977;
7.ª Se a posição contratual que a Ré AIA detinha no contrato de trabalho que a vinculava ao Autor A 17 se transmitiu para a Ré TAP;
8.ª - Da constitucionalidade do art. 23.º, n.º 3 da LCCT e da sua compatibilidade com o direito comunitário;
9.ª - Se se verificou a aceitação do despedimento pelo recebimento da compensação;
10.ª - Se a inerente declaração negocial é anulável por erro;
11.ª - Se todos os AA. e intervenientes podem beneficiar da anulação da declaração negocial de aceitação (designadamente por via da condenação extra vel ultra petitum prevista no art. 69.º do CPT), ou só os que invocaram o respectivo vício da vontade (ou aderiram às petições iniciais em que o mesmo é invocado);
12.ª - Se a sentença podia deduzir aos salários intercalares devidos aos AA. e intervenientes as quantias a que se reporta o nº 2 da al. b) do art. 13º do DL 64-A/89 de 27.02, em termos de liquidação em execução de sentença;
13.ª - Se, quanto aos intervenientes, os salários intercalares são devidos apenas desde 30 dias antes da dedução da intervenção, ou desde 15 de Agosto de 1993;
14.ª - Do abuso do direito ao despedimento colectivo e da desconsideração da personalidade colectiva em atenção às exigências da boa fé.

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3.2. Da nulidade do acórdão recorrido de 16 de Janeiro de 2008
Os recorrentes A 104, A 170, A 144, A 99, A 103, A 121, A 141 e A 174, com alegações a fls. 6764 e ss., invocaram que deve ser considerado nulo, nos termos e para os efeitos da alínea c) do nº 1 do artº 668° do CPC, o Acórdão da Relação que vê prejudicada a questão essencial da dedução das quantias a que se reporta o art. 13.º, n.º 2, al. b) da LCCT (conclusão 41.ª).
Também os recorrentes A 155 e Outros, intervenientes principais, e A 20, autor, todos identificados a fls. 6887, com alegações a fls. 6810 e ss., pedem a anulação da decisão recorrida, invocando, além do mais, que a mesma viola a al. d) do art. 668.º do CPC (conclusões 4.ª e 13.ª).
Verifica-se, todavia, que, nos requerimentos de interposição de recurso que formularam junto do Tribunal da Relação – respectivamente a fls. 6706 e 6810 – os recorrentes se limitaram a interpôr recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, do acórdão da Relação, não fazendo qualquer referência à nulidade do acórdão e vindo apenas a arguir esta nas alegações que subsequentemente apresentam.
Ora, tem constituído jurisprudência reiterada do STJ a de que o fundamento do recurso que consista na nulidade da sentença ou acórdão tem que ser indicado no requerimento de interposição do recurso, não bastando a sua ulterior explanação nas alegações de recurso em face do preceituado no art. 72º, nº 1 do CPT de 1981 (aplicável ao caso “sub-judice” por virtude do disposto no art.º 3º do D.L. nº 480/99 de 9 de Novembro, atenta a data da entrada da petição inicial em juízo).
Como se salientou no Acórdão do STJ de 2005.01.27, a medida legislativa que impõe a arguição de nulidades no requerimento de interposição do recurso – art. 72.º, n.º 1, do CPT/81 e art. 77.º do CPT/99 – é justificada por razões de economia processual, destinando-se a evitar que o processo tenha de subir ao tribunal superior, quando o juiz entenda que se verifica efectivamente a nulidade; mas se o juiz decide não intervir, por considerar que a nulidade se não verifica ou que a questão é duvidosa, o processo deverá ser remetido ao tribunal superior para dela conhecer, sendo que a decisão quanto a tomar ou não conhecimento da nulidade deverá pautar-se pelos critérios processuais legalmente definidos quanto à sua arguição.
Assim, e considerando que o regime legal fixado pelo n.º 1 do art. 72.º do CPT quanto à arguição é igualmente aplicável à invocação de nulidades do acórdão da Relação, face ao preceituado no art. 716.º, n.º 1 do CPC, devendo a remissão feita para o art. 668.º do mesmo código ser considerada, também, como realizada para o citado n.º 1 do art. 72.º, tem o STJ decidido que não deve ser conhecida pelo tribunal “ad quem” a nulidade da sentença em processo laboral que não foi arguida no requerimento de interposição de recurso, mas apenas nas respectivas alegações, por extemporânea- (4) .
É, pois, de concluir que, por não terem estes recorrentes cumprido o disposto no art. 72.º, n.º 1 do CPT, não pode o STJ conhecer das arguidas nulidades.
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O recorrido A 17 nas contra-alegações apresentadas ao recurso interposto pela R. TAP, veio invocar tão-só que a Recorrente arguiu a nulidade do acordão ora em crise, quer por falta de fundamentos (al. b) do nº 1 do art. 668º do CPC) quer pela contradição dos fundamentos de direito e a decisão proferida neste domínio (al. c) do mesmo preceito legal), embora o não faça expressamente – alegando até a final que “decidindo como decidiu o Tribunal a quo violou, entre outras normas, o disposto no art. 37º da LCT…”.
Invoca, também que esta invocação é extemporânea, pois, em harmonia com o aludido art. 77º do CPT, essa nulidade deveria ter sido suscitada no requerimento de interposição de recurso.
Compulsadas as alegações de revista da R. TAP verifica-se, contudo, que a mesma as estrutura de modo a imputar ao acórdão da Relação um erro de julgamento: a Veneranda Relação, ao dar como assente que “o estabelecimento da AIR ... não foi transmitido para a TAP”, nunca poderia concluir pela sua condenação na reintegração do A. A 17 e no pagamento das retribuições a que este tem direito desde 15.08.1993 e vem, a final, a pugnar pela sua absolvição nesta acção.
Não se trata, pois, da imputação de uma nulidade, mas de um erro de julgamento cuja procedência, na sede própria deste texto, será apreciada.
Improcede, assim, esta questão prévia suscitada nas contra-alegações do recorrido A 17.
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3.3. Do trânsito em julgado do saneador-sentença, na parte em que declarou a ilicitude do despedimento por não verificação do fundamento invocado
3.3.1. Alguns dos autores e intervenientes – os recorrentes A 58 e restantes Autores do processo n° 1263/94, A 127 e restantes intervenientes indicados a fls. 6674 , A 118, A 105, A 108 e A 148, e A 49, A 50, A 51, A 52, A 53, A 54, A 55, A 56 e A 57 – vieram invocar que este Supremo Tribunal está impedido de apreciar a questão da ilicitude do despedimento no presente recurso.
Para tanto, sustentam uns que, tendo sido proferido pelo STJ acórdão no sentido de o recurso de revista da decisão que decretara improcedentes os fundamentos de despedimento e a respectiva ilicitude só subir a final, não conhecendo do objecto da revista, não pode apreciar-se a questão da ilicitude do despedimento no presente recurso, devendo “aguardar” que seja proferido Acórdão por este Tribunal, “no aludido recurso”.
Sustentam outros que as supostas nulidades apontadas pela recorrente AIA ao despacho saneador, indevidamente arguidas perante a Relação, não poderão ser conhecidas pelo Supremo Tribunal de Justiça, com as consequências daí decorrentes quanto ao trânsito em julgado do despacho saneador-sentença, nessa parte.

3.3.2. Quanto ao primeiro impedimento apontado, não se vê como podem os recorrentes sustentá-lo.
Se o Supremo não conheceu da revista interposta do acórdão da Relação que negou provimento à apelação do despacho saneador que declarou ilícito o despedimento por não verificado o fundamento invocado e determinou que a mesma subisse a final, é óbvio que chegou agora o momento de conhecer tal recurso.
Já se procedeu aos actos necessários à intervenção de todos os trabalhadores despedidos, conforme determinado pelo acórdão deste tribunal proferido em 10 de Abril de 2002, e o processo já foi instruído e julgado, estando pendentes de apreciação os recursos de revista nele interpostos, entre os quais se inclui a revista relativa ao despacho saneador que conheceu parcialmente do mérito da causa, que assim subiu “a final” nos exactos termos prescritos no art. 695.º, n.º 1 do CPC, conforme ordenado pelo STJ (acórdãos de fls. 2029 e ss. e 2041 e ss.).

3.3.3. Quanto ao segundo impedimento que os recorrentes apontam à possibilidade de o Supremo alterar o saneador-sentença no que diz respeito à declaração de ilicitude do despedimento colectivo (as nulidades não poderem ser conhecidas pelo STJ), não pode igualmente proceder.
Com efeito, no despacho saneador, onde se decidiu logo de mérito sobre os fundamentos do despedimento, concluiu-se que se não verifica o fundamento invocado para o despedimento colectivo, sendo este ilícito, em suma, por se entender que, na Assembleia-Geral de 19 de Fevereiro de 1993, o que se deliberou foi a dissolução da AIA e não o encerramento definitivo da empresa, sendo uma e outro realidades diferentes.
A AIA interpôs recurso de apelação desta decisão suscitando, além do mais, nulidades que entendeu viciarem o despacho saneador, vindo o acórdão da Relação a decidir ser extemporânea a arguição de tais nulidades por não terem sido invocadas no requerimento de interposição de recurso, como estipulava o Artigo 72° do CPT/81.
Consideramos que o fez com acerto, como resulta das considerações já aqui expendidas a propósito das nulidades que os recorrentes agora imputaram ao acórdão da Relação de 16 de Janeiro de 2008.
Contudo, a alegação da apelação da AIA não se quedou pela arguição de nulidades (vide fls. 851 e ss.), o mesmo sucedendo com a subsequente revista (vide fls. 1944 e ss.) que incide sobre o acórdão da Relação proferido.
Com efeito, a recorrente sustentou na alegação da apelação, em suma:
- a nulidade do despacho saneador/sentença por excesso de pronúncia, nos termos do artigo 668°, nº1, alínea d), segunda parte do CPC, porque a verificação da existência de transferência de estabelecimento só poderia ser objecto de processo comum, não podendo esta acção especial prosseguir para o efeito, nem para nela intervir a TAP;
- que os fundamentos do despedimento operado são as razões económicas que levaram à dissolução da sociedade (constantes da “acta de dissolução” e da “descrição dos fundamentos” do despedimento colectivo de fls. 606 e ss.), e não a dissolução em si;
- que a dissolução determinou a caducidade dos contratos de trabalho;
- a nulidade do despacho saneador/sentença por omissão de pronúncia, com base no artigo 668°, nº 1, alínea d), primeira parte do CPC, por se haver decidido da ilicitude do despedimento colectivo, sem prévia apreciação da excepção de caducidade do direito da sua impugnação e da sua renúncia por força da aceitação da compensação legal.
O acórdão da Relação declarou extemporânea a arguição de nulidades e considerou, além do mais, que o processo deve prosseguir para apurar a factualidade necessária à decisão das questões que o saneador não apreciou, negando provimento à apelação e confirmando o despacho saneador recorrido.
A ré AIA voltou a não se conformar com esta decisão e dela interpôs revista nos termos já enunciados.
Das conclusões das alegações da revista supra transcritas, que cabe agora apreciar, resulta que a recorrente, não questionando a decisão do tribunal a quo que julgou intempestiva a arguição de nulidades, continua a sustentar:
- que este processo não pode prosseguir para verificação da alegada e eventual transferência de estabelecimento e dos contratos de trabalho para a TAP, que dele deve ser excluída, configurando agora o vício assacado ao saneador como um erro de julgamento (conclusões 1.ª a 13.ª e 22.ª);
- que se verifica fundamento para o despedimento colectivo porque o encerramento definitivo se verificou, tendo-se extinto os postos de trabalho (conclusões 14.ª e 16.ª que correspondem aos pontos 55 a 86 das alegações p. ditas);
- que o despacho saneador devia conhecer da caducidade antes de conhecer da licitude do despedimento, mais uma vez configurando como nulidade este vício (conclusões 15.ª a 17.ª a 20.ª);
- que o despacho saneador devia conhecer dos efeitos da aceitação da compensação (conclusão 21.ª).
Ora, se quanto às questões que a recorrente suscitou sob a capa da arguição de nulidades na apelação (da prossecução do processo para averiguação da alegada transferência de estabelecimento e da opção do julgador de conhecer dos fundamentos do despedimento no saneador relegando para final o conhecimento de excepções arguidas na defesa), se nos afigura que a decisão da Relação que julgou extemporânea a arguição de nulidades adrede invocada transitou em julgado, quanto à questão da licitude ou ilicitude do despedimento operado, o problema mantém-se em aberto.
O saneador-sentença, que a Relação confirmou, considerou que “se não verifica o fundamento invocado para o despedimento colectivo, sendo este ilícito”.
Na apelação, a recorrente sustentou que as razões do despedimento são as razões económicas que levaram à dissolução da sociedade e, na revista, reafirma que se verifica fundamento para o despedimento colectivo.
Assim, e uma vez que este Supremo Tribunal, no acórdão proferido a fls. 2029, determinou que o recurso de revista da decisão parcial do mérito só subiria a final, não conhecendo, assim, do objecto da revista, a questão relativa à verificação ou inverificação do fundamento invocado para o despedimento colectivo e a licitude ou ilicitude deste, pode e deve, agora, ser reapreciada por este Supremo Tribunal.
Em suma, o saneador-sentença, no segmento em que julgou ilícito o despedimento por inexistência do fundamento invocado, não transitou em julgado, não se mostrando precludida a possibilidade de alterar a decisão das instâncias quanto à declaração de ilicitude do despedimento colectivo

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3.4. Da caducidade do direito de impugnar o despedimento colectivo
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3.4.1. A disciplina legal do despedimento colectivo aplicável ao caso "sub judice" encontra-se nos arts. 16.º e ss. do Regime Jurídico da Cessação do Contrato Individual do Trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro (LCCT), na versão original, que antecedeu as alterações introduzidas pelo art.º 1.º da Lei n.º 32/99, de 18 de Maio.
O art.º 25.º da LCCT, a propósito do recurso ao tribunal com vista à impugnação do despedimento colectivo, dispõe nos seguintes termos:
“1 - Os trabalhadores que não aceitarem o despedimento podem requerer a suspensão judicial do mesmo, com fundamento em qualquer das situações previstas nas alíneas a) a d) do n.º 1 do artigo anterior, no prazo de cinco dias úteis contados da data da cessação do contrato de trabalho constante da comunicação a que se refere o n.º 1 do artigo 20.º
2 - No prazo de 90 dias contados da data referida no número anterior podem os mesmos trabalhadores impugnar o despedimento, com fundamento em qualquer dos factos referidos no n.º 1 do artigo anterior, sem prejuízo do disposto no n.º 3 do mesmo artigo.
3 - (…)”.

Na medida em que a impugnação do despedimento colectivo pode pôr em causa a cessação de vários contratos de trabalho, justifica-se que o período de incerteza para as partes seja reduzido, objectivo este que inspirou o legislador a estabelecer o prazo de 90 dias para a impugnação – art. 25.º da LCCT – e ressalta de várias outras normas que regulam a impugnação deste tipo de despedimentos (como sucede, por exemplo, com o carácter urgente do processo de impugnação, estabelecido no art. 27.º-A do CPT/81 e reiterado no art. 26.º, n.º 1 do CPT/99).
O Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 99/2003 de 27 de Agosto, embora tenha alargado este prazo para 6 meses (cfr. o seu art. 435.º), continua a estabelecer um período de tempo mais curto para a impugnação do despedimento colectivo do que para a impugnação da generalidade dos despedimentos - (5).
Assim também ocorre no contexto das legislações europeias em matéria de despedimento colectivo, onde a lei estabelece geralmente um prazo curto para a possibilidade de desencadear o controlo judicial do despedimento, com o objectivo de estabilizar, o mais brevemente possível, as situações jurídicas recíprocas das partes envolvidas num processo deste cariz -(6) .

3.4.2. No caso que nos ocupa, os factos relevantes para a resolução da questão da caducidade do direito de impugnar o despedimento colectivo são os seguintes:
- Em 26 de Fevereiro de 1993, a ré AIA enviou aos autores e intervenientes a comunicação de despedimento a que se refere o artº 20 do D.L. n.º 64-A/89, na qual fazia saber que, decorrido o prazo do aviso prévio de 60 dias, os respectivos contratos cessariam a 30 de Abril de 1993.
- A acção n.º 246/93 deu entrada em tribunal no dia 15 de Setembro de 1993.
- A acção nº 1263/94 deu entrada no tribunal em 26 de Abril de 1994, e as acções nº 194/94 e 196/94 em 20 de Abril de 1994.
- As acções nºs 1263/94, 194/94 e 196/94 foram apensadas à acção n.º 246/93, respectivamente, em 15 de Novembro de 1994, em 21 de Outubro de 1994 e em 10 de Março de 1995 (fls. 680 do II volume da acção n.º 1263/94, fls. 145 verso e 153 da acção n.º 194/94), por ordem judicial, proferida com fundamento no disposto no nº 2 do art. 36º do Cód. Processo Trabalho (apensação obrigatória de outras acções emergentes do mesmo despedimento colectivo).
- Todos os intervenientes deduziram as suas pretensões em datas posteriores às antecedentes.
- O acórdão da Relação de Lisboa que ordenou o chamamento de todos os trabalhadores ainda não intervenientes, foi proferido em 4 de Outubro de 2000 (fls. 1922 e ss. – VI volume).

3.4.3. No despacho saneador foi relegado o conhecimento desta excepção para decisão final.
A sentença de 1.ª instância começou por afirmar que a acção n.º 246/93 é tempestiva, já que, terminando o prazo de 90 dias em 1 de Agosto de 1993, o mesmo se transferiu para 15 de Setembro seguinte, data em que entrou no tribunal a petição inicial - arts. 279.º, als. b) e c) do CC. e 267.º, n.º 1 do CPC.
E considerou, também, que não ocorreu a caducidade do direito de acção quanto às demais acções, em suma, por entender que os autores trazem aos autos uma realidade não padronizada, invocando uma situação de erro sobre os motivos e com base na qual atacam o despedimento. Assim, seria em função desta situação invocada e deste pedido que deveria analisar-se a tempestividade da acção, e não em sede da caducidade do art. 25º, 2, da LCCT, razão pela qual aplicou ao caso o prazo de um ano previsto no art. 287º nº 1 do C. Civil afastando assim a aplicabilidade do prazo de 90 dias previsto no art. 25º nº 2 da LCCT. Em abono deste entendimento, invocou um acórdão do STJ de 29 de Setembro de 1991 (publicado em Acórdãos Doutrinais do Supremo Tribunal de Justiça, ano XXXIX, nº 460, pp. 419 e ss.), onde se refere, a dado passo, que a aplicação do prazo de 90 dias “pressupõe um quadro normal no que respeita aos motivos revelados pela entidade empregadora para despedimento, isto é, que aquela dá a conhecer aos trabalhadores a realidade dos factos e que, na sua posse, estes, se forem diligentes, logo o podem impugnar caso não aceitem aquela realidade ou a sua suficiência como fundamento licito de despedimento”.
O acórdão da Relação, por seu turno, considerou que a acção n.º 246/93 é tempestiva, mas veio a concluir que procede a excepção da caducidade relativamente às acções nº 194/94, 196/94 e 1263/94, estando precludido o direito desses autores e dos intervenientes que aderiram a essas acções a impugnarem o despedimento colectivo.
Para tanto, e quanto a estas acções nºs 194/94, 196/94 e 1263/94, considerou que não podia lançar-se mão do prazo de um ano previsto no art. 287.º, n.º 1 do CC, em suma, pelas seguintes razões:
- porque a situação prevista no citado acórdão do STJ não é idêntica à dos presentes autos, pois, no caso apreciado nesse aresto, tratava-se de um despedimento colectivo que foi promovido com alegação da extinção de uma secção da empresa, vindo a verificar-se mais tarde que essa secção continuava a laborar, caso bem diferente do que é apreciado nestes autos em que o despedimento colectivo foi promovido com a alegação do encerramento definitivo da empresa (AIA), que, como adiante melhor explica, encerrou mesmo;
- porque o art. 25º, nº 2 da LCCT não permite fazer a distinção que foi feita nesse douto aresto entre os fundamentos do despedimento colectivo previstos nas al. a) a d) e na al. e) do art. 24º da mesma lei;
- porque o prazo previsto no art. 25º, nº 2 da LCCT é uma norma especial face à norma geral do art. 287º nº 1 do Cód. Civil e, nos termos do art. 7º, nº 3 do Cód. Civil, a lei especial derroga a lei geral, pelo que qualquer eventual vício gerador de anulabilidade, nos casos de despedimento colectivo, deverá ser invocado dentro do referido prazo de 90 dias previsto no art. 25º, nº 2 da LCCT;
- porque não faria sentido que em matéria de despedimento colectivo, a violação da lei, que, nos termos gerais, gera nulidade e é invocável a todo o tempo, esteja submetida ao referido prazo de 90 dias, mas a anulabilidade resultante da ocorrência de vício na formação da vontade já não esteja submetida a esse prazo;
- porque, com este prazo curto de 90 dias, o legislador pretendeu estabilizar rapidamente as situações jurídicas recíprocas do trabalhador e do empregador, considerando os efeitos gravosos que normalmente resultam de um despedimento que envolve simultaneamente vários trabalhadores.
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3.4.4. Atendendo à sua precedência lógica e cronológica, comecemos pela acção n.º 246/93, a primeira que foi instaurada.
Apesar de o acórdão recorrido a ter considerado tempestiva, cabe igualmente apreciar se se verificou a caducidade do direito de impugnar o despedimento, uma vez que as recorridas, nas contra-alegações, vieram ampliar o objecto do recurso, invocando que também a acção nº 246/93 deu entrada em juízo em 15 de Setembro de 1993, quando o prazo de 90 dias já tinha terminado em 29 de Julho de 1993, que tal prazo é de caducidade e esta é oficiosamente apreciada pelo Tribunal (artº 333º do Código Civil) e que espera que o STJ estenda aos AA. da acção nº 246/93 a preclusão do direito a impugnar o despedimento colectivo (conclusão 74.ª).
Prefigura-se, assim, uma ampliação do objecto do recurso nos exactos termos previstos no art. 684.º-A do CPC.
A questão que se coloca a este propósito é a de saber se à contagem deste prazo de 90 dias para impugnar o despedimento se aplica o disposto no art. 144.º do CPC, caso em que, tratando-se de prazo de propositura de uma acção, não se suspenderia durante as férias judiciais por força do que estabelece a primeira parte do n.º 4 deste preceito, ou se se lhe aplica o disposto no art. 279.º do CC, caso em que o prazo apenas se completa no 1.º dia útil após férias [artigo 279.º, alínea e), do Código Civil].

3.4.4.1. Quanto ao primeiro aspecto desta questão – saber se à contagem deste prazo de 90 dias para impugnar o despedimento se aplica o disposto no art. 144.º do CPC –, há que atentar no que dispunha o art. 144.º do CPC na versão em vigor à data da propositura da presente acção (versão do Decreto-Lei n.º 381-A/85, de 28 de Setembro):
1. O prazo judicial é marcado por lei ou fixado por despacho do juiz.
2. O prazo judicial é contínuo, começando a correr independentemente de assinação ou outra formalidade e correndo seguidamente.
3. O prazo judicial suspende-se, no entanto, durante as férias, sábados, domingos e dias feriados.
4. O disposto no número anterior não se aplica aos prazos de propositura das acções, com excepção dos embargos de terceiro, nem aos prazos de interposição dos recursos extraordinários.”

Na vigência deste preceito, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 457/80, de 10 de Outubro (reposta pelo Decreto-Lei n.º 381-A/85) foi proferido pelo STJ o Assento n.º 8/94, de acordo com o qual “[a] suspensão dos prazos judiciais, estabelecida no artigo 144.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, não é aplicável ao prazo judicial de propositura de acção previsto no artigo 382.º, n.º 1, alínea a), do mesmo Código” (DR 102/94, Série I-A, de 1994-05-03).
Este aresto precisou que o art. 144.º do CPC, em todos os seus números, contempla apenas prazos de natureza judicial, sendo que o seu n.º 4 se reporta aos prazos judiciais de propositura da acção - (7).
Quanto aos prazos de natureza substantiva, afirmou que o respectivo cômputo está submetido às regras consignadas no artigo 279.º do Código Civil.
Ora, o prazo de 90 dias para impugnar o despedimento é um prazo de caducidade (cfr. o n.º 2 do art. 298.º do Código Civil) e tem natureza substantiva.
Na verdade, os prazos judiciais destinam-se a determinar o período de tempo “para se produzir um determinado efeito processual”, ou seja, a “regular a distância entre os actos do processo”, e, dada essa função específica, pressupõem, necessariamente, a prévia propositura de uma acção, a existência de um processo - (8).
Os prazos substantivos, por seu turno, respeitam ao período de tempo exigido para o exercício de direitos materiais e são-lhes “aplicáveis as regras da caducidade, a menos que a lei se refira expressamente à prescrição” (artigo 298.º, n.º 2, do CC), tendo o seu decurso, em princípio, sem prejuízo das regras respeitantes à necessidade da sua invocação em juízo, a consequência de extinção do respectivo direito.
Os prazos de propositura de acção são geralmente qualificados como prazos substantivos de caducidade, mas podem ser também prazos judiciais, o que ocorre quando o prazo esteja directamente relacionado com uma outra acção e o seu decurso tenha um mero efeito de natureza processual e não o de extinção de direito material.
Por se revestir de tal natureza, o prazo de propositura da acção previsto no citado artigo 382.º, n.º 1, alínea a) do CPC, uma vez que funciona como simples condição de subsistência da providência cautelar, sem qualquer interferência no direito que constitua o fundamento da respectiva acção, considerou o assento n.º 8/94 que tal prazo era um prazo judicial, razão por que o julgou incluído na excepção constante do n.º 4 do art. 144.º do CPC, o que determinava que corresse seus termos em férias, não beneficiando da suspensão prevista no n.º 3 do mesmo preceito.
Destas considerações resulta que o prazo de 90 dias para impugnar o despedimento colectivo tem natureza substantiva, na medida em que não pressupõe, necessariamente, a prévia propositura de uma acção, ou a existência de um processo.
E, por esse motivo, não se aplica à sua contagem o disposto no art. 144.º do CPC.
O trabalhador que é alvo de um despedimento colectivo deve propor a acção de impugnação no prazo de 90 dias nos termos do disposto no art. 25.º, n.º 2 da LCCT, sob pena de se extinguir, por caducidade, o seu direito material de impugnar esse mesmo despedimento, não se submetendo a contagem deste prazo ao disposto no art. 144.º do CPC.

3.4.4.2. Quanto ao segundo aspecto da enunciada questão, invocam as recorridas que o prazo de caducidade em análise não se suspende nem se interrompe de acordo com o que estabelece o art. 328.º do CC, funcionando a secretaria nas férias judiciais, daqui retirando que a acção nº 246/93 deu entrada em juízo fora do prazo.
Com esta invocação, pretendem afastar a aplicação a este prazo substantivo das regras do cômputo do termo previstas na al. e) do art. 279º do CC, que tem o seguinte teor: “O prazo que termine em domingo ou dia feriado transfere-se para o primeiro dia útil; aos domingos e dias feriados são equiparadas as férias judiciais, se o acto sujeito a prazo tiver de ser praticado em juízo.”
Nos termos do disposto no art. 328.º do CC, “[o] prazo de caducidade não se suspende nem se interrompe senão nos casos em que a lei o determine”.
A este propósito, entendemos que é importante distinguir a suspensão do prazo de caducidade da transferência do termo do prazo de caducidade.
Como escreveu Antunes Varela, em anotação ao Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11 de Julho de 1989 -(9):
«Em primeiro lugar, não é de uma questão de suspensão da caducidade que se trata na alínea e) do artigo 279.º do Código Civil, mas de dilação ou transferência do termo de um prazo, verificado em férias, domingo ou dia feriado, para o 1.º dia útil subsequente.
Os casos de verdadeira suspensão, seja da prescrição, seja da caducidade, têm quase sempre na sua base, como se verifica pelo simples exame das situações contempladas nos artigos 318.º e seguintes do Código Civil, situações subjectivas, de carácter pessoal, que tornam natural o não exercício do direito, afastando a ideia da negligência ou da renúncia do seu titular, ao passo que a solução ditada na alínea e) do artigo 279.º tem na sua raiz uma situação puramente objectiva, aplicável à generalidade das pessoas.
Aliás, se porventura assim não fosse e se essa dilação para a prática de um acto de exercício do direito, depois de findo o prazo da sua caducidade, tal como a alínea e) do artigo 279.º do Código Civil a prevê na sua estatuição, constituísse uma verdadeira suspensão da caducidade do direito, então aí teríamos nós um dos casos ressalvados na parte final do artigo 323.º, em que o prazo de caducidade se suspenderia, por determinação especial da lei.
Em terceiro lugar, é inquestionável que a ratio legis da norma contida na alínea e) do artigo 279.º do Código Civil e em cujo texto nenhuma discriminação se faz entre prazos de prescrição e de caducidade, se estende realmente aos próprios prazos de caducidade do direito, desde que, para afastá-la, se torne necessária a prática de qualquer acto em juízo.
Com efeito, no caso de caducidade (...), o acto que pode considerar-se essencial para afastá-la, como logo se depreende do disposto no artigo 267.º do Código de Processo Civil, conjugado com o preceito do artigo 331.º, n.º 1, do Código Civil, é a proposição da acção pelo titular do direito - e não, por exemplo, o acto da citação ou da notificação do réu (artigo 323.º do mesmo Código), que são actos já muito dependentes da actividade da secretaria judicial.
Trata-se, por conseguinte, de uma situação manifestamente compreendida na parte final do texto da alínea e) do artigo 279.º do Código Civil. E que cabe, ao mesmo tempo, sem margem para dúvidas, dentro do seu espírito.
Quais são, na verdade, as razões que induzem a lei a deslocar para o 1.º dia útil o termo (oficial) do prazo substantivo que termine de facto em qualquer dia das férias judiciais, sempre que o acto (de exercício de direito, poder ou faculdade) prestes a cair tem de ser praticado em juízo?
Primeiro, porque estando os juízes em férias, ausentes do tribunal em que exercem a sua actividade, não vale a pena (não faz sentido, não se justifica) obrigar a parte inutilmente (cegamente, abstractamente) a realizar o acto (essencial à obtenção de uma vantagem ou à prevenção de uma desvantagem) até o termo (contabilístico) do respectivo prazo, quando de antemão se sabe que o acto (não considerado urgente) nenhum seguimento prático vai ter até ao 1.º dia útil.
E esta consideração, que tanto procede para os prazos de prescrição, como para os de caducidade, pode mesmo dizer-se que vale de modo especial para os prazos de caducidade, porque em relação à prescrição há sempre a necessidade do acto posterior de citação ou notificação do réu devedor para que o prazo prescricional em curso se interrompa (artigo 267.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, e artigo 323.º do Código Civil).
Em segundo lugar, aproveitando o período de férias judiciais tanto a juízes como a advogados (que têm o mesmo direito a repouso e igual necessidade de restauração periódica de forças), pode bem suceder que a pessoa necessitada de praticar em juízo o acto destinado a impedir a caducidade do seu direito não encontre disponível, no decurso das férias judiciais, advogado que, na sua comarca, mereça a sua plena confiança no patrocínio que pretende obter.
E para quê forçar o interessado a recorrer a um advogado diferente do que ele escolheria em condições normais, se o acto não vai prosseguir regularmente, por virtude da ausência dos titulares do tribunal?
E também esta consideração, tal como a anterior, colhe, não só para os prazos de prescrição, mas também (talvez por maioria de razão) para os prazos de caducidade

Em suma, tratando-se de um prazo substantivo, está submetido às regras do art. 279.º do CC, em nada colidindo a transferência do termo do prazo de caducidade prescrita na alínea e) deste preceito com a insusceptibilidade de suspensão do prazo de caducidade prescrita no art. 328.º do CC.
Não procede, pois, o argumento das recorridas de que, tratando-se de um prazo de caducidade, vigora a regra da não suspensão em férias do prazo de proposição das acções por força do disposto no art. 328.º do CC.
A acção nº 246/93 foi interposta dentro do prazo de 90 dias a que alude o art. 25.º, n.º 2 da LCCT, pois, considerando a data da cessação do contrato constante da comunicação do despedimento (30 de Abril de 1993), o termo desse prazo ocorria nas férias judiciais (29 de Julho de 1993), pelo que se transferiu para o primeiro dia útil seguinte, 15 de Setembro de 1993, data em que a acção foi proposta (10)..
Deve, assim, afirmar-se a tempestividade da acção n.º 263/94 e a consequente não caducidade do direito de impugnar o despedimento colectivo por parte dos autores que a intentaram.

3.4.5. E que dizer quanto às acções nºs 194/94, 196/94 e 1263/94 e aos requerimentos dos intervenientes?
As acções nºs 194/94, 196/94 e 1263/94, foram instaurados em 20 (as duas primeiras) e 26 (a terceira) de Abril de 1994, ou seja, manifestamente depois de decorrido o prazo de 90 dias contados desde 30 de Abril de 1993: data da cessação do contrato de trabalho constante da comunicação a que se refere o n.º 1 do artigo 20.º da LCCT.
O mesmo se diga quanto aos requerimentos dos intervenientes, o primeiro formulado em 17 de Junho de 1999 (fls. 1456-vol IV) e o último em 29 de Maio de 2007 (fls. 5921-vol XXII).

3.4.5.1. Invocam os recorrentes autores destas acções apensas que, pelo facto de haver um vício da vontade na aceitação da compensação paga pelo despedimento, deve lançar-se mão do prazo de um ano previsto no art. 287°, nº 1, do CC para a instauração da acção de impugnação de despedimento colectivo.
Ora, nada justifica esta solução que, por um lado, afasta uma norma especial (o art. 25.º, n.º 2 da LCCT) para aplicar um regime comum, contrariando o princípio lex specialis legi generali derrogat, previsto no art. 7.°, nº 3, do CC, como bem referem as recorridas, e, por outro, compromete, sem motivo relevante, o desígnio que inspira a referida norma especial de estabilizar as situações das partes. Admitir que o erro faz renascer o direito de impugnação do despedimento colectivo ou alarga o prazo para essa impugnação, traduzir-se-ía em viabilizar o que o legislador quis evitar: a estabilização rápida das situações jurídicas recíprocas dos trabalhadores e empregadores envolvidos num processo de despedimento colectivo.
Finalmente, e como sublinha o acórdão recorrido, gerar-se-ia deste modo o absurdo de, em sede de despedimento colectivo, a violação de lei, causa de nulidade, estar submetida ao prazo de 90 dias, mas não já a mera anulabilidade fundada em vícios na formação da vontade relativa ao acto de percebimento da compensação devida.

3.4.5.2. Tal não significa, contudo, que deva afirmar-se a caducidade do direito de impugnar o despedimento colectivo relativamente aos recorrentes autores das acções nº 194/94, 196/94 e 1263/94 e aos recorrentes intervenientes.
Apesar de transcurso o prazo de 90 dias previsto no art. 25.º, n.º 2 da LCCT quando qualquer deles tomou a iniciativa de fazer valer o seu direito à impugnação do despedimento colectivo, afigura-se-nos que, em face do modo específico como o legislador delineou o regime da acção especial de impugnação de despedimento colectivo, quer os autores das acções nº 194/94, 196/94 e 1263/94 que foram apensadas à acção n.º 246/93, quer os intervenientes que, nesta mesma acção, deduziram a sua pretensão no sentido da impugnação do despedimento colectivo de que todos foram alvo com efeitos em 30 de Abril de 1993, devem beneficiar da tempestividade da acção n.º 246/93.
O processo de impugnação do despedimento colectivo, como forma processual especialmente dirigida ao controle jurisdicional da legalidade do despedimento colectivo, adoptou soluções processuais que visam, além do mais, o reforço dos poderes jurisdicionais de apuramento da factualidade relevante e um controle célere e uniforme da avaliação da legalidade do despedimento e do procedimento patronal que o precede.
Como salienta Luís Miguel Monteiro - (11), “[o] primeiro dos traços característicos do processo em análise é a especial configuração da legitimidade activa, tendencialmente plural atenta a natureza supra individual da decisão de despedimento que é impugnada. Um mesmo procedimento culmina, em regra, na cessação de várias relações de trabalho; o exercício dos direitos de acção inerentes pode determinar outras tantas apreciações judiciais, não coincidentes, nem quanto aos aspectos unitários do despedimento – maxime, o cumprimento das regras procedimentais e a motivação subjacente à decisão de despedir. Consciente do facto, o legislador pretendeu, através de diversas soluções, assegurar a uniformidade de julgados quanto ao cumprimento das formalidades do despedimento e à realidade e eficácia extintiva dos motivos que o justificam.”

Relembremos o que estabelecem os arts. 36.º e 156.º-A do CPT/81, com a redacção do DL n.º 315/89, de 21 de Setembro, ao abrigo dos quais foram, respectivamente, proferidas as determinações judiciais de apensação das acções nºs 194/94, 196/94 e 1263/94 e de chamamento dos trabalhadores intervenientes.
Nos termos do preceituado no art. 36.º:
“1 - ...
2 - A apensação de acções emergentes de despedimento colectivo é obrigatória até ao despacho saneador, sendo ordenada oficiosamente logo que conhecida a sua existência.”
E, nos termos do preceituado no art. 156.º-A do mesmo diploma, sob a epígrafe Intervenção principal:
“Nas acções de impugnação do despedimento colectivo deve o réu requerer, dentro do prazo para a contestação, o chamamento para intervenção dos trabalhadores com legitimidade processual, nos termos do regime jurídico aprovado pelo Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro, não se aplicando, neste caso, o disposto no n.º 2 do artigo 357.º do Código de Processo Civil”.

Neste quadro legal, embora não ocorra uma situação de litisconsórcio necessário entre os autores da acção principal, os autores das acções apensas e os intervenientes, deve concluir-se que o legislador consagrou um regime que muito dele se aproxima, e que tem uma forte componente de oficiosidade.

Com efeito, e por um lado, a lei prescreve ser “obrigatória” até ao despacho saneador a apensação das acções emergentes do mesmo despedimento colectivo, para que numa só acção, e com um só julgamento, se aprecie a licitude daquele despedimento, quer no que concerne à regularidade formal do procedimento que antecedeu a decisão do despedimento, quer no que concerne à motivação económica invocada pelo empregador para justificar o despedimento colectivo.
E isto porque, tal como ocorre relativamente à figura do litisconsórcio necessário, há um núcleo objectivo que é comum a todos os demandantes: um processo patronal único, com uma motivação objectiva unívoca, que conduziu ao despedimento de todos eles.
Perante um despedimento com fundamentação una, tudo aconselha a que se apensem as acções separadamente instauradas pelos trabalhadores inconformados com o mesmo despedimento, passando elas a constituir uma unidade processual com vista à uniformidade de julgamento - (12).
Neste contexto, a lei é clara e compreensivelmente avessa à possibilidade de o mesmo despedimento colectivo ser objecto de decisões diversas, proferidas em diferentes processos.

Por outro lado, e certamente animada pelo mesmo propósito, a lei estabelece ainda nesta acção especial, o dever de o réu requerer o chamamento para intervenção na acção dos trabalhadores com legitimidade processual.
Trata-se de uma intervenção principal (provocada), como resulta da própria epígrafe do preceito.
Qualquer dos trabalhadores com legitimidade deve ser chamado e pode intervir como autor, solicitando para o seu direito a mesma medida jurisdicional que os autores primitivos solicitaram ao tribunal.
Gera-se, assim, uma situação de litisconsórcio, uma vez que em relação a todos os trabalhadores há identidade da relação jurídica material, quer dizer, uma vez que o pedido se fundamenta numa relação material que é comum a todos eles: o despedimento colectivo.
Litisconsórcio que é voluntário, já que, embora seja obrigatório o chamamento à acção de todos os trabalhadores que foram objecto do despedimento e estão em condições de o impugnar, a cumulação subjectiva depende, num segundo momento, da vontade destes - (13).
E, como escreve Leite Ferreira -(14), a intervenção dos outros trabalhadores é uma “providência normal imposta ao réu por exigência da lei e que, por isso, faz parte, por sua própria natureza, do processo, como um acto natural seu”.
Não se trata, pois, de um incidente, mas de um elemento que integra a estrutura do processo, tal como o legislador o concebeu.
Por isso se compreende a decisão proferida nestes autos pelo Tribunal da Relação de Lisboa, em 4 de Outubro de 2000, e transitada em julgado, no sentido de se determinar o chamamento a esta acção de todos os trabalhadores, ainda não intervenientes.
Como, ulteriormente, se referiu no Acórdão do STJ de 28 de Fevereiro de 2002, que sobre ele incidiu, “[i]mporta seja proferida na 1ª instância decisão que vincule todos os trabalhadores”.
Assim, embora a lei não exija a intervenção de todos os interessados para o exercício do direito –caso em que se poderia falar, com propriedade, de litisconsórcio necessário (art. 28.º do CPC) –, exige, sem dúvida, que todos sejam convocados para o exercer e pretende que tal exercício ocorra na mesma acção.

Em suma, sendo a situação processual dos autores das diversas acções e dos intervenientes uma situação de litisconsórcio voluntário, mas com características que muito a aproximam do litisconsórcio necessário activo, sendo a instância una e iniciando-se a mesma com a propositura da primeira acção, deve concluir-se que:
- os autores que intentaram as acções n.ºs 194/94, 196/94 e 1263/94, que vieram a ser apensadas a esta acção n.º 246/93 por força do disposto no art. 36.º, n.º 2 do CPT/81, devem beneficiar do acto jurídico praticado pelos autores da presente acção n.º 246/93, com a propositura desta;
- os trabalhadores intervenientes que formularam os seus requerimentos de intervenção nestes autos, a grande maioria deles depois de terem sido notificados para o fazer, por força do que estabelece o art. 156.º-A do CPT/81, devem igualmente beneficiar do acto jurídico da propositura da acção praticado pelos autores a que se associam.
Só assim será possível prosseguir a almejada uniformidade de julgados.
Cremos poder afirmar-se que a primeira acção instaurada – esta acção principal com o n.º 246/93 – é a matriz que marca, verdadeiramente, a abertura da instância de avaliação da licitude ou ilicitude do despedimento colectivo de que foram alvo todos os autores e os intervenientes, sendo a sua propositura apta a obstar à caducidade do direito de impugnar o despedimento colectivo por parte de todos os recorrentes autores e intervenientes.
*
Deve ainda acrescentar-se, no que diz respeito aos intervenientes, que nenhum deles circunscreveu a sua intervenção à associação aos demandantes de uma, ou várias, das acções apensas, pelo que nunca poderia subscrever-se a posição do acórdão recorrido de que também caducou o direito de impugnação dos intervenientes que aderiram às acções n.ºs 194/94, 196/94 e 1263/94, por terem estas caducado.
Com efeito, compulsados os requerimentos de intervenção formulados nestes autos, verifica-se que nenhum dos intervenientes se limitou a aderir aos articulados dos AA. que instauraram estas acções, nenhum deles tendo nesses termos limitado o âmbito da sua intervenção.
Se é certo que alguns não são claros quanto aos autores a que se reportam, fazendo a maior parte deles a referência genérica a que “faz seus os articulados dos AA.”, ou de que se “associa” aos mesmos, é também certo que em nenhum dos requerimentos de intervenção a adesão se circunscreveu às acções apensas a estes autos (n.ºs 194/94, 196/94 e 1263/94).
Além disso, todos os intervenientes formularam o respectivo requerimento de intervenção nesta acção n.º 263/94 (à qual as demais foram apensas), identificando o número desta acção “principal” na parte inicial do seu pedido de intervenção, e declarando a generalidade deles que aderiam aos articulados dos autores, sem qualquer outras especificação.
Quer quanto a estes intervenientes, quer quanto aos que referiram que faziam seus os articulados dos autores e especificavam que também faziam seus os articulados de uma ou várias das acções apensas, quer quanto aos que expressamente referiram que faziam seus os articulados dos “AA. A 1e outros”, considerar-se-á que beneficiam da tempestividade da acção n.º 263/94 e de quanto nela foi alegado pelos respectivos AA.
Na verdade, por força do que estabelece o n.º 2 do art. 353.º do CPC na versão em vigor à data da propositura da acção – que prevê a dinâmica processual subsequente à intervenção – o interveniente aceita a causa no estado em que se encontrar.
Como escreve o Cons. Salvador da Costa(15), “[d]ir-se-á, em síntese, que o interveniente se sujeita ao processado ocorrido antes da sua intervenção, e que, em relação ao posterior a ela, fica na mesma posição do autor ou do réu, conforme a um ou a outro se associe”.
Em face destas considerações, uma vez que nenhum dos intervenientes se limitou a fazer seus articulados apresentados numa ou em várias das acções apensas, nem optou por excluir a adesão à petição inicial apresentada na acção principal em que formulou o seu requerimento – a acção n.º 263/94 -, é de considerar que, em relação a nenhum deles, se verificou a caducidade do direito de accionar, ao invés do que é afirmado no acórdão recorrido.
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Julga-se assim improcedente a excepção da caducidade do direito de impugnar o despedimento colectivo, relativamente a todos os autores e intervenientes recorrentes.

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3.5. Dos fundamentos do despedimento colectivo – a decisão do saneador-sentença, sufragada pelo acórdão da Relação de 4 de Outubro de 2000
3.5.1. A disciplina legal do despedimento colectivo
O art.º 16.º da LCCT dá a noção de despedimento colectivo nos seguintes termos:
“Considera-se despedimento colectivo a cessação de contratos individuais de trabalho promovida pela entidade empregadora operada simultânea ou sucessivamente no período de três meses, que abranja, pelo menos, dois ou cinco trabalhadores, conforme se trate, respectivamente, de empresas com 2 a 50 ou mais de 50 trabalhadores, sempre que aquela ocorrência se fundamente em encerramento definitivo da empresa, encerramento de uma ou várias secções ou redução do pessoal determinada por motivos estruturais, tecnológicos ou conjunturais.”- (16).
Desta noção resulta que o despedimento colectivo é um acto jurídico que tem como principal efeito a extinção de uma pluralidade de contratos de trabalho e cujo pressuposto material é um motivo de natureza económica que se situa na esfera da empresa- (17). .
Assim, o despedimento colectivo pressupõe, em primeiro lugar, a cessação de um conjunto de contratos de trabalho com uma motivação determinante comum, estando em causa a mão-de-obra da empresa, com vista à sua redução ou à sua supressão (no caso do encerramento da empresa), e não um trabalhador individualmente considerado-(18).
Mas o que caracteriza esta forma de cessação contratual é, essencialmente, a “localização” do motivo e a sua “natureza”, distinguindo-a do despedimento com invocação de justa causa em que o pressuposto material se traduz na verificação de uma justa causa, imputável a título de culpa à pessoa do trabalhador e apurada em processo disciplinar (arts. 9.º e ss. da LCCT). No despedimento colectivo, o motivo situa-se na área da empresa (é inerente à organização produtiva e exterior às relações de trabalho) e a sua natureza é essencialmente económica.

A questão de saber até onde deve ir o conhecimento do tribunal quando tem que apreciar os fundamentos invocados para o despedimento colectivo por força do disposto no art. 24.º, n.º 1, al. e) da LCCT coloca-se, precisamente, na medida em que a sua fundamentação é de natureza económica e estão geralmente em causa aspectos de gestão empresarial.
O despedimento colectivo é, basicamente, uma decisão de gestão.
Como refere Cruz de Carvalho-(19), não se pode conceber a intervenção do tribunal “como verdadeira acção tutelar dos actos de gestão empresarial, sob pena de se imiscuir numa área para a qual não se mostra naturalmente vocacionado. E se é certo que o tribunal se pode socorrer de assessores técnicos qualificados, também é evidente que nem sempre um acto de gestão é pautado exclusivamente por considerações de ordem técnica”.
Também de acordo com os ensinamentos do Prof. Monteiro Fernandes, -(20) “a natureza dos fundamentos da decisão de romper os contratos torna-os de muito difícil julgamento pelos tribunais: tratar-se-á de pré-decisões de gestão, de ponderações de natureza técnica ou económica, relacionáveis, estas mesmas, com factores subjectivos como as expectativas, as previsões, e as tendências, percepcionadas pelos empresários e gestores (…). Tudo isto aponta para que a decisão judicial sobre um despedimento colectivo tenda a incidir, quase invariavelmente, sobre aspectos formais, processuais, isto é, sobre eventuais deficiências do procedimento seguido face à tramitação legalmente imposta”.
Igualmente Bernardo Xavier, reconhecendo que cabe ao juiz controlar a fundamentação da decisão patronal, sustenta que não lhe cabe substituir-se à entidade empregadora, transformar-se em gestor, e impor-lhe a decisão que ele próprio juiz tomaria se estivesse na posição empresarial, seguindo os seus critérios pessoais. Há uma ampla margem de decisão que deve ser consentida ao empresário que decide, assume os riscos e suporta os encargos da sua empresa, desde que se não conclua, de acordo com um juízo de equidade, pela falta de presença de uma motivação clara e, portanto sustentável. Segundo este autor, “apenas nos casos de gestão inteiramente inadmissível ou grosseiramente errónea” poderão ser postos em causa os critérios de gestão observados (como ocorre nos casos de discricionariedade técnica nos tribunais administrativos, que só agem quando denotam erro manifesto de apreciação) - (22).
Especificamente nos casos em que é decidido o encerramento da empresa, que corresponde a uma motivação expressamente prevista no art. 16.º da LCCT, “insistir muito em averiguar a motivação da qual emerge o encerramento supõe que o julgador se pode imiscuir na própria organização da empresa e em liberdades primárias quanto ao seu exercício. Os próprios casos de encerramento parcial não propiciam um controlo de motivações quando correspondam a uma objectividade ou materialidade demonstrável” - Vide Bernardo Lobo Xavier, in “O Despedimento Colectivo no Dimensionamento da Empresa”, já citado, pp. 200 e 418..
Também Mário Pinto e Furtado Martins - (23) sustentam que o juiz deve apenas, em princípio, assegurar-se “da existência dos motivos alegados e da relação entre estes e o despedimento, por forma a evitar a realização de despedimentos patentemente arbitrários ou fundados em motivos manifestamente falsos ou inconsistentes. Mas já não lhe caberá substituir-se ao empresário e determinar a improcedência do despedimento porque, p. ex., entende que existem outras soluções alternativas”.
Não deve, pois, o julgador, na apreciação dos factos, desrespeitar os critérios de gestão da empresa (na medida em que sejam razoáveis e consequentes), não lhe competindo substituir-se ao empregador e vir a concluir pela improcedência do despedimento, por entender que deveriam ter sido outras as medidas a tomar perante os motivos económicos invocados.
Traduzindo-se a decisão judicial numa intervenção na gestão da empresa (com relevo no próprio dimensionamento desta, já que se trata de um despedimento que abrange uma pluralidade de trabalhadores), só se justificará um juízo de improcedência se a conduta da empresa for abusiva, simulada ou de má fé, ou seja, se o juiz constata que a motivação invocada para o despedimento é manifestamente inaceitável e susceptível de indiciar um intuito fraudulento do empregador - (24).
Trata-se de averiguar se a extinção dos contratos individuais de trabalho não é uma consequência da estratégia de gestão da empresa, mas um fim do empresário em si mesmo, pretendendo encobrir despedimentos individuais irregulares.

Expostas estas considerações, vejamos o caso “sub-judice”.

*
3.5.2. Os fundamentos da declaração de ilicitude constante do saneador-sentença
O saneador-sentença, que o acórdão recorrido confirmou, declarou que foram cumpridas as formalidades legais do despedimento colectivo, descreveu os fundamentos invocados pela AIA na sua comunicação e referenciou a conclusão dos Assessores nomeados pelo tribunal e do Técnico nomeado pelos autores, não sem antes elencar a matéria de facto que resulta do relatório dos assessores, o que fez do modo que segue:

Foi elaborado o relatório pelo Exms. Srs. Assessores nomeados pelo tribunal, nos termos do art.156° 3 do CPT.
Estes concluíram que em 1985 o mercado charter era aliciante pelo que a TAP decidiu criar a AIA, sob pena de perder importantes segmentos de mercado.
Face aos bons resultados dos primeiros anos em finais 88 deu-se início ao processo de privatização duma parcela do capital social da AIA, tendo-se iniciado o primeiro de 3 contratos de leasing directo de aviões e continuado o recrutamento de pessoal.
Em 1989 iniciou-se a progressiva liberalização das tarifas de transporte aéreo, o que tornou difícil a sobrevivência das transportadoras não regulares, face à concorrência de transportadoras regulares tornada possível pela sua regulamentação.
A AIA possuía uma estrutura de custos fixos demasiado rígida que não lhe permitia a flexibilidade para se adaptar às novas condições do mercado.
A situação da AIA veio a degradar-se, apresentando no 2° semestre de 92 uma situação de falência técnica.
A TAP, como accionista maioritária optou pelo não prosseguimento da actividade do AIA, e propôs a dissolução da sua filiada como forma de obstar que a empresa pela acumulação de resultados negativos entrasse sem retorno, num processo de falência.
O Conselho de Administração da AIA, logo que teve conhecimento da intenção da TAP, despoletou um conjunto de medidas e decisões, entre as quais o desencadeamento imediato do despedimento dos trabalhadores.
A dissolução da AIA foi aprovada na Assembleia-Geral de 19.02.93.
Em 20.04.93 foi realizada uma Assembleia-Geral na qual foram nomeados os novos liquidatários e aprovadas as contas de 92.
Os 234 trabalhadores da AIA foram, assim, objecto de despedimento colectivo, tendo todos recebido, à excepção de um, as compensações postas à sua disposição.
No seu parecer os Exmos Srs. Assessores concluem que os factos enunciados pela AIA como fundamento para o despedimento colectivo apresentam consistência, tendo sido determinantes na opção da TAP em propor a dissolução da sua afiliada.
O técnico dos AA fez juntar aos autos a declaração de discordância de fls 401 - 407 na qual em síntese alega que: A Assembleia-Geral da AIA de 19.02.93 apenas dissolveu esta, não tendo competência para decidir o encerramento definitivo da empresa. A comunicação efectuada pelo C.A. da AIA aos trabalhadores, dando início ao despedimento colectivo é extemporânea visto ter referido encerramento da empresa quando o que estava em causa era a dissolução da sociedade; referiu despedimento colectivo quando o que se tratava era de caducidade dos contratos de trabalho. Conclui, por isso, que a declaração de despedimento comunicado em 26.02.93, é nula por impossibilidade jurídica.”

Após, apreciando a factualidade que emerge deste relato e pronunciando-se quanto aos fundamentos do despedimento colectivo, fê-lo nos seguintes termos:
“Constitui matéria delicada decidir sobre a procedência dos fundamentos económicos do despedimento colectivo, a que acresce a circunstância de na apreciação dos factos dever o Juiz respeitar os critérios de gestão da empresa - vd. n.º 4 do art. 156 do C.P.T.
Por força desse imperativo legal, vários autores sustentam a propósito que apenas uma parte manifestamente irrazoável poderá ser objecto de censura pelo tribunal - vd. José João Abrantes, "O Despedimento Colectivo, in Prontuário do Direito do Trabalho" pág 36 - 38 e Ac. do S.T.J. de 13.1.93 in CJ 93, Tomo I, pág 222.
Quanto a nós entendemos que aquilo que a referida disposição legal pretendeu consignar foi o respeito pelo poder de decisão da entidade empregadora na condução da sua gestão – desde que o faça de forma séria e adequada à sua viabilidade económica.
No caso em apreço o fundamento do despedimento colectivo perpetrado na pessoa dos AA foi o encerramento definitivo da empresa.
Foi nesse sentido que a ré AIA comunicou aos mesmos AA a sua intenção de os despedir.
Sucede, porém, que na Ass. Geral de 19.2.93 o que se deliberou foi a dissolução da AIA (e não o encerramento da empresa).
Ora, conforme bem sustentou o Prof. Menezes Cordeiro em parecer junto aos autos pelos AA. a dissolução de uma sociedade não se confunde com a extinção da empresa.
Esta, tal como o texto legal o inculca - art. 16º do D.L. 64-A/89 e a doutrina o define, traduz-se numa “estrutura produtiva dotada de racionalidade organizativa, tecnológica e económica, vocacionada para gerar lucros e resultados socialmente positivos, condição do seu próprio sucesso, num sistema de economia de mercado” vd. Dr. Manuel Cavaleiro Brandão, in Apreciação Judicial da Fundamentação económica dos despedimentos, Rev. Direito e Estudos Sociais, Ano XXXIV - 1992. pág 146 e ss.
A empresa é assim encarada como um estabelecimento com elemento organizatório.
E por isso as duas realidades se não compreendem. Podendo haver empresas que pertençam a pessoas singulares ou colectivas, bem como uma empresa repartida por uma ou várias pessoas juridicamente distintas.
A Assembleia-Geral referida nada deliberou pois sobre o destino da empresa, no sentido exposto.
Por outro lado, traduzindo-se o encerramento da empresa numa decisão gestão, a mesma está reservada ao C.A. ou à comissão liquidatária - cfr. art. 405 do C.S.C.
No caso vertente não se retira dos autos que se tenha verificado o encerramento definitivo da empresa aquando do despedimento dos seus trabalhadores, indiciando-se, pelo contrário, eventualmente, no todo ou em parte terá sido transmitido para a ré TAP.
Do enunciado resulta, assim, que se não verifica o fundamento invocado para o despedimento colectivo, sendo este ilícito.” (Fim de transcrição).

Como resulta com clareza deste texto, o tribunal aceitou a bondade e suficiência dos fundamentos económicos invocados para a decisão de gestão adoptada, nada adiantando que demonstre discordância em relação à conclusão dos Assessores nomeados pelo tribunal – que reproduz –, no sentido de que “os factos enunciados pela AIA como fundamento para o despedimento colectivo apresentam consistência, tendo sido determinantes na opção da TAP em propor a dissolução da sua afiliada”.
Aliás, bem se compreende que assim seja, na medida em que a lei processual laboral – arts. 156.º-C a 156.º-E do CPT – confere grande relevância ao relatório dos Assessores nomeados pelo tribunal - (25), atenta a sua maior competência para apreciar a razoabilidade de uma medida de gestão e efectuar juízos de prognose quanto à evolução da actividade da empresa no contexto do mercado em que opera.
O saneador-sentença apenas veio a concluir pela ilicitude do despedimento por considerar que a Assembleia-Geral da AIA não deliberou sobre o destino da empresa (encarada esta como um estabelecimento com elemento organizatório) e que esta mesma assembleia não tinha competência para deliberar o encerramento da empresa (por ser uma decisão reservada ao Conselho de Administração – art. 405.º do CSC), daqui retirando não estar demonstrado que se tenha verificado o encerramento definitivo da empresa aquando do despedimento dos seus trabalhadores.
Em momento algum, pôs em causa que se verificassem os fundamentos económicos que estiveram na base da decisão gestionária em questão.
Aliás, o próprio Técnico nomeado pelos AA. que apresentou declaração de discordância relativamente ao relatório dos Assessores do tribunal, não questionou a verificação da situação económico-financeira de falência técnica da AIA em 1993, por alteração substancial e fundamental nas condições de exploração dos mercados de transporte aéreo – ponto 5 da declaração de discordância a fls. 403 –, apenas concluindo que a declaração de despedimento colectivo é nula por impossibilidade jurídica e que é abusivo por parte da TAP invocar a personalidade jurídica da AIA para se esquivar ao cumprimento de obrigações laborais que materialmente lhe dizem respeito. Além disso, ainda acrescenta que não há caducidade dos contratos porque se verifica a transmissão do estabelecimento, e que os trabalhadores da AIA passaram para a TAP quando esta retomou o objectivo social da AIA.
O despacho saneador não foi tão longe quanto à afirmação da situação de transferência da empresa, limitando-se a referenciá-la em termos hipotéticos (“indiciando-se, pelo contrário, eventualmente, no todo ou em parte terá sido transmitido para a ré TAP”), em consonância, aliás, com o despacho de condensação processual que se segue ao saneador, onde são quesitados múltiplos factos alegados pelos autores, então ainda controvertidos, em fundamento da tese de que se verificou uma transmissão do estabelecimento comercial da AIA para a TAP.
O fundamento da decisão constante do saneador de que não se verifica o fundamento invocado para o despedimento colectivo por não se ter verificado o encerramento da empresa é estritamente técnico-jurídico e assenta nos seguintes argumentos:
- a Assembleia-Geral da AIA deliberou a dissolução desta sociedade, e esta é realidade jurídica diferente do encerramento da empresa;
- a Assembleia-Geral não tinha competência para deliberar o encerramento da empresa (por ser uma decisão reservada ao Conselho de Administração – art. 405.º do CSC).
A questão que permanece é, pois, esta: a deliberação da Assembleia-Geral da AIA a que aludem as comunicações de despedimento efectuadas aos trabalhadores, implicava, ou não, o encerramento da empresa de que a sociedade era titular, este por sua vez indicado nas mesmas comunicações como fundamento para o despedimento colectivo a que a ré AIA procedia - (26).
E, como se verá da subsequente análise do nexo necessário entre a dissolução da AIA e o encerramento da sua empresa e da competência para a decisão do encerramento definitivo da empresa social, a resposta a dar-lhe é afirmativa.
*
3.5.3. O nexo necessário entre a dissolução da AIA e o encerramento da sua empresa
Com efeito, e em primeiro lugar, resulta da factualidade apurada que a AIA foi dissolvida por deliberação dos seus sócios reunidos em Assembleia-Geral que teve lugar no dia 19 de Fevereiro de 1993 – al. a) da especificação.
A decisão de dissolução de uma sociedade anónima é matéria da competência exclusiva dos sócios (da Assembleia-Geral) bastando, para o efeito, a simples vontade destes em lhe porem fim – art. 141.º, n.º 1, al. b) do Código das Sociedades Comerciais (CSC).
No caso "sub judice" a dissolução encontrava-se justificada, além do mais, pelo “resultado negativo do exercício de 1992 da ordem de 1.300.000 contos”, pela “conjuntura recessiva da aviação comercial, indubitavelmente influenciada pela liberalização do transporte aéreo intracomunitário”, pela “inviabilidade de companhias aéreas vocacionadas para tráfego não regular” e “como forma de obstar a que a Empresa, pela acumulação de resultados negativos, entre, sem retorno, num degradante processo de falência” [vide a acta a que se reporta a alínea a) da especificação].
Nos termos do preceituado no art. 146º, nº 1 do CSC, a sociedade dissolvida entra imediatamente em liquidação e esta obedece aos termos dos artigos que se lhe seguem.
Uma vez que os sócios não deliberaram a partilha imediata (art. 147º) nem a liquidação por transmissão global (art. 148º), procedeu-se à liquidação normal, passando os membros da administração da sociedade a ser os liquidatários (art. 151.º, n.º1, do CSC) .
A AIA considera-se dissolvida em 19 de Abril de 1993 - data da escritura pública da dissolução - e iniciou a liquidação em 30 de Abril de 1993, data a que se reportam os documentos de prestação de contas, conforme resulta do relatório dos assessores (art. 149º do CSC).
A partir desta data, os administradores da sociedade assumiram a veste de liquidatários, com os deveres e poderes constantes do art. 152º do CSC.
Nos termos do n.º 3 do art. 152º do CSC, os liquidatários devem:
a) Ultimar os negócios pendentes;
b) Cumprir as obrigações da sociedade;
c) Cobrar os créditos da sociedade;
d) Reduzir a dinheiro o património residual, salvo o disposto no artigo 156.º, n.º 1;
e) Propor a partilha dos haveres sociais.
Deste preceito resulta que o fim de uma sociedade em liquidação consiste na extinção das relações jurídicas que estabeleceu no decurso da sua vida e na redução a dinheiro e partilha entre os sócios do património residual, estando os poderes de gestão dos liquidatários limitados pelas necessidades próprias da liquidação – art. 151.º, n.º 1 do CSC.
Por força do que estabelece o n.º 2 deste mesmo art. 151º, só por deliberação dos sócios “pode o liquidatário ser autorizado” a continuar a actividade da sociedade, a alienar em globo o património, ou a proceder ao trespasse do estabelecimento da sociedade - als. a), c) e d).
Deste modo, há que distinguir:
- quando a par da deliberação de dissolução há uma deliberação da Assembleia-Geral a autorizar a alienação em globo do património social ou o trespasse do estabelecimento da sociedade [als. a), c) e d) do n.º 2 do art. 151.º], o destino do estabelecimento ou empresa torna-se independente do destino da sociedade;
- quando a par da deliberação de dissolução não há qualquer outra deliberação da Assembleia-Geral a atribuir aos liquidatários aquelas competências, o destino do estabelecimento ou empresa ficou dependente do destino da sociedade: a extinção desta acarreta o encerramento da empresa em que se materializava o exercício comum da actividade económica da sociedade.

Ora, no caso vertente, não resulta dos factos provados que houvesse qualquer deliberação dos sócios da AIA a autorizar os liquidatários, quer a continuar a actividade, quer a autorizar a entrega global do património da sociedade a um sócio, quer a autorizar o trespasse do estabelecimento, conforme possibilitava o n.º 2 do art. 152.º do CSC.
Assim, a deliberação de dissolução imediata da AIA, tomada pelos seus sócios, não acompanhada de qualquer outra deliberação com aquele teor, acarretou inexoravelmente o encerramento da empresa, estando os poderes de gestão dos liquidatários limitados aos actos enunciados no n.º 3 do art. 151.º do CSC.
É certo que a dissolução de uma sociedade (pessoa jurídica) não se confunde com o encerramento da empresa ou estabelecimento (bem por aquela pessoa explorado), mas com a concreta deliberação de 19 de Fevereiro de 1993, o destino do bem que a empresa é, ficou necessariamente ligado ao destino do sujeito seu titular: a deliberação de dissolução da sociedade implicou o encerramento da empresa através da qual a sociedade exercia a sua actividade económica.

Neste contexto (e sem curar para já de saber se, no plano dos factos efectivamente sucedidos, a TAP assumiu a empresa da AIA a partir de 1 de Maio de 1993) se compreende que a administração da Ré tenha procedido ao despedimento colectivo de todos os trabalhadores com efeitos reportados à data em que a AIA suspendeu definitivamente toda a sua actividade e em que se iniciou a liquidação: 30 de Abril de 1993.
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3.5.4. A competência para a decisão do encerramento definitivo da empresa social
Em segundo lugar, não pode acompanhar-se a posição sufragada no saneador de que, perante o art. 405.º do CSC, o encerramento da empresa é uma decisão de gestão que está reservada à administração ou à comissão liquidatária.
Na verdade, o encerramento definitivo da empresa, vista como organização produtiva afecta à prossecução do objecto social, excede o campo da mera gestão da sociedade comercial que a lei atribui ao respectivo conselho de administração ou à comissão liquidatária.
Como vimos, a decisão sobre o encerramento da empresa social, implicando a cessação da actividade para cujo exercício em comum a sociedade foi constituída e que dá sentido à sua existência, é da competência da Assembleia-Geral a quem cabe decidir sobre a dissolução da própria sociedade
Os arts. 405.º a 407.º do CSC reportam-se à gestão das “actividades da sociedade” (n.º 1 do art. 405.º), ou seja, reportam-se ao exercício gestionário inerente ao pleno exercício da actividade social, no âmbito do qual – mas sempre na perspectiva da actividade social com vista à obtenção de lucros (art. 980.º do CC) –, o conselho de administração pode decidir sobre a “abertura ou encerramento de estabelecimentos ou de parte destes” [art. 406°, al. g), do CSC].
O encerramento definitivo da empresa social não se reconduz à decisão sobre o destino deste ou daquele concreto estabelecimento comercial que o órgão gestor da sociedade entenda encerrar no decurso da vida desta e ao abrigo das competências que a lei (arts. 405.º e ss. do CSC) lhe atribui para deliberar sobre assuntos da gestão da sociedade.
Quando a Assembleia-Geral delibera a dissolução da sociedade e não autoriza a continuação da exploração da empresa pelos liquidatários – ou seja, não delibera nos termos do n.º 2 do art. 152.º do CSC –, a sua vontade soberana é a de que a empresa não sobreviva à sociedade, ficando a competência dos liquidatários circunscrita aos actos previstos no n.º 3 do art. 152.º do CSC.
Nunca poderiam, pois, os liquidatários decidir, eles próprios, o encerramento da empresa ou a sua transferência.
A deliberação de dissolução de uma sociedade anónima que explora uma determinada empresa por vontade dos sócios [ao abrigo do artº 141º, nº 1, al b), do CSC], contém ínsita a decisão do termo imediato da respectiva actividade e o encerramento definitivo da empresa social, excepto se os accionistas deliberarem expressamente em sentido contrário ou se, em sede de liquidação, for submetida ao colectivo dos accionistas, e por estes autorizada, a transmissão da empresa através da alienação em globo do património da sociedade ou de trespasse do estabelecimento da sociedade [arts. 148° e 152°, nº 2, al. c), do CSC].
No caso da AIA – em que a própria deliberação dos accionistas foi determinada pela verificação de dificuldades económicas da empresa –, inexistindo deliberação da assembleia geral a autorizar a alienação global do património da sociedade ou o trespasse da totalidade ou de parte da respectiva empresa, a actividade dos liquidatários encontrava-se legalmente orientada, tão só, para a concretização efectiva do encerramento da actividade e da empresa social que a dissolução determinou.
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3.5.5. Conclusão
Assim, apesar de serem realidades distintas o encerramento da empresa e a dissolução de uma sociedade comercial, o certo é que, no caso “sub judice”, a deliberação da Assembleia-Geral que aprovou a dissolução da sociedade comercial implica, necessariamente, o encerramento da empresa.
Não pode sufragar-se a tese acolhida no saneador-sentença de que não se verifica o fundamento invocado para o despedimento colectivo apenas porque a deliberação de 19 de Fevereiro de 1993 deliberou a dissolução da AIA e esta é realidade distinta da do encerramento da empresa, muito menos podendo afirmar-se, como aí também se faz, que a competência para deliberar o encerramento da empresa estava reservada ao conselho de administração ou à comissão liquidatária, não cabendo à Assembleia-Geral.
Estas objecções de cariz técnico-jurídico à verificação do fundamento invocado para o despedimento colectivo, que os recorrentes retomam nas suas alegações, não procedem em face do regime jurídico da dissolução e liquidação das sociedades anónimas que nos rege.
Tanto basta para que não possa manter-se a decisão do acórdão da Relação de 4 de Outubro de 2000, na parte em que confirma o saneador-sentença recorrido.

Esta conclusão não nos autoriza, contudo a, desde já, declarar materialmente verificado o fundamento para o despedimento colectivo em análise nos presentes autos.
Com efeito, apesar de ultrapassado o argumento formal em que o saneador-sentença alicerçou a sua afirmação de que não se verifica o encerramento da empresa (não ter a Assembleia-Geral deliberado o encerramento e ser a decisão respectiva da competência do Conselho de Administração ou da comissão liquidatária nos termos da lei), persiste a questão de saber se se verificou, ou não, a alegada transferência de empresa da AIA para a TAP.
Na medida em que, como se verá, basta a verificação de uma situação de transferência de facto (ainda que “de iure”, a comissão liquidatária da AIA não tivesse poderes para efectuar tal transmissão) para fazer operar o efeito transmissivo dos contratos de trabalho que o art. 37.º da LCT estabelece, se vier a concluir-se que a empresa foi desde logo transmitida para a TAP, não poderá dar-se como verificado o encerramento invocado em fundamento do despedimento colectivo.
Assim, da resposta afirmativa a esta questão de saber se a empresa explorada pela AIA se transferiu para a TAP, resulta a impossibilidade de se afirmar a verificação do encerramento da empresa que é pressuposto da licitude do despedimento colectivo, apesar de a AIA, S.A. ter cessado a sua actividade.
A resposta negativa à mesma traz, como necessária consequência, a afirmação de que se verifica o fundamento enunciado no art. 16.º da LCCT para o despedimento colectivo a que a ré AIA procedeu: além de a AIA ter cessado definitivamente a sua actividade em 30 de Abril de 1993, a sua empresa não subsistiu após tal data.
*
3.6. Da transferência do estabelecimento
A questão de saber se a empresa explorada pela AIA se transmitiu, ao menos parcialmente, para a TAP, como é defendido na sentença de 1.ª instância – e os autores e intervenientes recorrentes vêm reiterar na revista –, é, afinal, a questão fundamental a dar resposta nas revistas e, por isso, se enfrenta desde já.
Com efeito, dela depende a solução a dar a quase todas as outras questões suscitadas na presente acção, sendo a controvérsia dos factos alegados em seu fundamento que justificou a decisão do saneador de relegar para final a decisão das excepções a que se reporta (a caducidade do direito de propor a acção dependeria da cessação dos contratos e esta não ocorreria se houvesse transmissão, a aceitação do despedimento e anulabilidade da aceitação com base em erro dependeria da verificação da transmissão, a caducidade dos contratos de trabalho não se verificaria se houvesse transmissão, o mesmo sucedendo com a prescrição extintiva dos créditos peticionados).
Além disso, uma vez afastadas as objecções de natureza jurídico-formal que o despacho saneador considerou impedirem a afirmação de que a deliberação da Assembleia-Geral da AIA implicava o encerramento da empresa, também a própria resposta à questão de saber se se verificam, ou não, os fundamentos para o despedimento colectivo ficou dependente da resposta a dar ao problema de saber se pode, ou não, considerar-se que, no caso vertente, o estabelecimento ou empresa em que os autores e intervenientes laboravam se transferiu para a TAP ou se, ao invés, encerrou definitivamente, cessando a sua actividade.
Há, pois, que dar especial atenção ao problema da qualificação da sucessão de actos que teve lugar por ocasião da dissolução da AIA e da posterior liquidação dos seus activos, para efeitos de saber se tais actos configuraram um caso de transmissão da empresa ou do estabelecimento.
Em caso de resposta afirmativa, os recorrentes AA. e intervenientes foram objecto de um despedimento colectivo ilícito porque falece a respectiva motivação (no sentido em que a empresa não encerrou definitivamente, antes foi transmitida), cabendo, então, decidir se os AA. da acção n.º 264/93 e intervenientes podem beneficiar da invocação do “erro” que, alegadamente, viciou a sua vontade quando receberam a compensação e aceitaram o despedimento, para recuperarem a possibilidade de impugnar este e verem declarada a respectiva ilicitude, e apreciar a relevância da aceitação da compensação e a constitucionalidade do art. 23.º da LCCT.
No caso de se considerar que a sucessão de actos em causa não configura um caso de transmissão da empresa ou do estabelecimento, terá que se concluir no sentido da licitude do despedimento colectivo por consistência do respectivo fundamento legal, o que torna prejudicada a apreciação das problemáticas inerentes à aceitação do despedimento, à viciação da mesma por erro e à constitucionalidade do art. 23.º, n.º 3 da LCCT na versão em vigor à data dos factos.
Por isso se compreende que, desde já, se aborde tal questão.
*
3.6.1. Enquadramento normativo da transmissão da posição contratual do empregador nos casos de transmissão de estabelecimento -(27).
*
À data em que se verificaram os factos em análise nestes autos, dispunha o art. 37º do Regime Jurídico do Contrato de Individual de Trabalho aprovado pelo D.L. nº 49.408 de 24 de Novembro de 1969 (LCT) que:
1- A posição que dos contratos de trabalho decorre para a entidade patronal transmite-se ao adquirente, por qualquer título, do estabelecimento onde os trabalhadores exerçam a sua actividade, salvo se, antes da transmissão, o contrato de trabalho houver deixado de vigorar nos termos legais, ou se tiver havido acordo entre o transmitente e o adquirente, no sentido de os trabalhadores continuarem ao serviço daquele noutro estabelecimento sem prejuízo do disposto no art. 24º.
2 – (...)
3 – (...)
4 – O disposto no presente artigo é aplicável, com as necessárias adaptações, a quaisquer actos ou factos que envolvam a transmissão da exploração do estabelecimento.”
Decorre do disposto neste preceito que, nos casos de transmissão da titularidade do estabelecimento ou da ocorrência de quaisquer actos ou factos que envolvam a transmissão da sua exploração, não é afectada, em princípio, a subsistência dos contratos de trabalho, nem o respectivo conteúdo, de tal modo que, em relação ao trabalhador, tudo se passa como se a transmissão não houvera tido lugar (nºs 1 e 4 ) -(28).
Com este regime teve-se em vista, fundamentalmente, proteger os trabalhadores do risco de verem cortada a sua ligação à comunidade de trabalho a que pertencem, garantindo o direito à manutenção do posto de trabalho, que constitui uma das vertentes do direito constitucional consagrado no art. 53º da Constituição da República, nos casos de transmissão do estabelecimento ou da sua exploração, por um lado, e, por outro, tutelar o próprio estabelecimento (a continuidade do funcionamento da empresa que é objecto da transmissão) - (29).
*
Neste âmbito da influência da mudança dos titulares das empresas nos contratos de trabalho vigentes com os trabalhadores que nas mesmas prestam serviço, foram também emitidas normas de direito comunitário, concretamente a Directiva nº 77/187/CEE do Conselho, de 14 de Fevereiro de 1977, relativa à aproximação das legislações dos Estados-membros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas, estabelecimentos ou partes de estabelecimentos (Jornal Oficial L 61 de 5 de Março de 1977, p. 26), diploma que foi alterado pela Directiva nº 98/50/CE do Conselho, de 29 de Junho de 1998 (JO L 20 de 17 de Julho de 1998, p. 13), e pela Directiva nº 2001/23/CE do Conselho, de 12 de Março de 2001 (JO L 20 de 22 de Março de 2001, p. 16).

A Directiva nº 77/187/CEE não chegou a ser transposta para o direito interno.
Apenas o art.º 2º da Lei n.º 99/2003 de 27 de Agosto, que aprovou o Código do Trabalho (não aplicável ao caso dos autos por força das regras de aplicação no tempo contidas nos respectivos arts. 8º e 9º), refere no seu art.º 2 que:
Com a aprovação do Código do Trabalho é efectuada a transposição, parcial ou total, das seguintes directivas comunitárias:
(...)
q) Directiva nº 2001/23/CE do Conselho de 12 de Março, relativa à aproximação das legislações dos Estados membros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas ou de estabelecimentos, ou de partes de empresas ou de estabelecimentos, que codifica e revoga a Directiva nº 77/187/CEE do Conselho de 14 de Fevereiro, com a redacção que lhe foi dada pela Directiva nº 98/50/CE do Conselho de 29 de Junho” (...)”.
A mesma referência é feita na alínea l) do art. 2.º da Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro, que aprova o Código do Trabalho actualmente em vigor.

Aquela Directiva n.º 2001/23/CE, do Conselho, de 12 de Março de 2001 dispõe, no que aqui interessa:
Art. 1º
«1.a) A presente directiva é aplicável à transferência para outra entidade patronal de uma empresa, estabelecimento ou parte de empresa ou estabelecimento, quer essa transferência resulte de uma cessão convencional, quer de uma fusão.
b) Sob reserva do disposto na alínea a) e das disposições seguintes do presente artigo, é considerada transferência, na acepção da presente directiva, a transferência de uma entidade económica que mantém a sua identidade, entendida como um conjunto de meios organizados, com o objectivo de prosseguir uma actividade económica, seja ela principal ou acessória.
(...).»
Art. 2º
«1. Na acepção da presente directiva, entende-se por:
a) «Cedente»: qualquer pessoa, singular ou colectiva que, em consequência de uma transferência, prevista no n° 1 do art. 1º, perca a qualidade de entidade patronal em relação à empresa ou estabelecimento ou à parte de empresa ou estabelecimento.
b) «Cessionário»: qualquer pessoa singular ou colectiva que, em consequência de uma transferência, prevista no n° 1 do art. 1º, adquira a qualidade de entidade patronal em relação à empresa ou estabelecimento ou à parte de empresa ou estabelecimento.
(...)»
Art. 3º
«1. Os direitos e obrigações do cedente emergentes de um contrato de trabalho ou de uma relação de trabalho existentes à data da transferência são, por esse facto, transferidos para o cessionário.
(...)»
Art. 4º
«1. A transferência de uma empresa ou estabelecimento ou de uma parte de empresa ou estabelecimento não constitui em si mesma fundamento de despedimento por parte do cedente ou do cessionário. Esta disposição não constitui obstáculo aos despedimentos efectuados por razões económicas, técnicas ou de organização que impliquem mudanças da força de trabalho.
(...)»
Art. 5º
«1. Salvo determinação em contrário dos Estados Membros, os arts. 3º e 4º não se aplicam a uma transferência de empresa, estabelecimento ou parte de empresa ou estabelecimento quando o cedente for objecto de um processo de falência ou de um processo análogo por insolvência promovido com vista à liquidação do seu património e que esteja sob o controlo de uma entidade oficial competente (que pode ser um administrador de falências, autorizado por uma entidade competente).
(...)»

Poder-se-ia, desde logo, pôr a questão de considerar a Directiva em causa como referente normativo comunitário para a interpretação do art. 37° da LCT, apesar de ser posterior aos factos em análise nestes autos, por se tratar de uma directiva de revisão e de consolidação da jurisprudência que o TJ emitiu ao longo dos anos sobre a Directiva n.º 77/187 (vide os seus considerandos iniciais, nos quais se refere que esta directiva é de codificação da Directiva n.º 77/187 e vg. o seu considerando 8.º em que se referencia a conveniência de esclarecer o conceito jurídico de transferência à luz da jurisprudência do TJ e se expressa que o esclarecimento não alterou o âmbito da Directiva n.º 77/187, tal como é interpretado pelo TJ).
Porém, como à frente melhor se verá, a interpretação desse art. 37.º, só por si, torna prejudicada a apreciação desta questão.
*
O art. 37º da LCT não refere o que deve entender-se por “estabelecimento”, nem o que deva entender-se por “transmissão”.
Concretizemos, brevemente, cada uma destas realidades.

Quanto à noção de “empresa” ou “estabelecimento” – ou seja, o bem a transmitir – o art. 37.º nada adianta.
Segundo a doutrina mais comum - (30), a noção de estabelecimento comercial coincide com a noção de empresa, sendo também indistintamente usadas as duas expressões com o mesmo significado no âmbito das lei do trabalho.
De acordo com as directivas comunitárias relevantes na matéria e com a jurisprudência comunitária, o bem objecto de transmissão, para efeitos da sujeição ao regime laboral da transmissão do estabelecimento, deve constituir uma unidade económica.
O conceito de unidade económica, para este efeito, é definido no direito comunitário (em termos que ficaram no essencial a constar do art. 318° n° 4 do Código do Trabalho de 2003 e do art. 285.º, n.º 5 do Código do Trabalho de 2009) como um conjunto de meios materiais e humanos organizados para o exercício de uma actividade económica, principal ou acessória, que mantém a sua identidade [art. 1.º, n° 1 b) da Dir. 2001/23].
Adoptou-se com esta definição um critério material em que avultam dois elementos -(31) :
- um organizatório - a entidade económica apresenta-se como um complexo organizado de bens e/ou de pessoas;
- um funcional - esse complexo organizado de meios visa prosseguir uma actividade económica.
A jurisprudência deste Supremo Tribunal, emitida à luz do art. 37.º da LCT, tem entendido que o conceito de estabelecimento (ou empresa) abrange, quer a organização afecta ao exercício de um comércio ou indústria, quer os conjuntos subalternos que correspondem a uma unidade técnica de venda, de produção de bens, ou de fornecimento de serviços, desde que a unidade destacada do estabelecimento global seja dotada de autonomia técnico-organizativa própria, constituindo uma entidade produtiva autónoma, com organização específica -(32).
Como bem se refere no acórdão recorrido, da aplicação do critério material da “unidade económica” “resulta a irrelevância quer da transmissão de elementos patrimoniais isolados, não agregados entre si, quer da transmissão de bens, interligados ou não, mas não essenciais ou não destinados à prossecução de determinada actividade económica.”

Quanto ao conceito de “transmissão”, os termos que o art. 37.º usa para a ele aludir – explicitando que a transmissão se pode operar “por qualquer título” (n.º 1) e que o seu regime se aplica a “quaisquer actos ou factos que envolvam a transmissão da exploração do estabelecimento” (n.º 4) –, demonstram que se pretendeu consagrar um conceito amplo de transmissão do estabelecimento nele se englobando todas as situações em que se verifique a passagem do complexo jurídico-económico em que o trabalhador está empregado para outrem, seja a que título fôr -(33).
Nesta sequência, tem a jurisprudência entendido que se abarcam até os casos de transmissão ou cessão da exploração inválidos, na medida em que a destruição do negócio pelo qual o estabelecimento foi transmitido ou passou a ser explorado por outrem a qualquer título não obsta à eficácia dos contratos de trabalho com o transmissário relativamente ao tempo em que os mesmos foram executados -(34).
O conceito de transmissão para este efeito é especialmente amplo, podendo corresponder a um negócio relativo à transmissão do direito de propriedade sobre o bem, mas também à transmissão (formal ou de facto) dos direitos de exploração desse bem, abrangendo todas as alterações estáveis (mas não necessariamente definitivas) na gestão do estabelecimento ou da empresa -(35), mesmo que inexista um vínculo obrigacional directo entre transmitente e transmissário.

Por outro lado, a simples transmissão parcial de um estabelecimento é relevante para efeitos de se afirmar a manutenção dos contratos de trabalho dos trabalhadores que laboravam na parte do estabelecimento cedida à data da transmissão - (36).
Embora o art. 37º o não refira expressamente (ao invés do que veio a suceder com o art. 318.º do Código do Trabalho de 2003 e com o art. 285.º do Código do Trabalho de 2009), o art. 9º do D.L. nº 519-C1/79 de 29 de Dezembro regulava temporalmente no ordenamento jurídico nacional a obrigação da entidade patronal cessionária observar o instrumento de regulamentação colectiva que vincula a entidade patronal cedente “em caso de cessão, total ou parcial, de uma empresa ou estabelecimento”.
Também já ensinava o Prof. Orlando de Carvalho - (37) que, por força do disposto no art. 37º da LCT, os trabalhadores de um estabelecimento como que "inerem" ou "aderem" a esse estabelecimento, entendido este como "organização afectada ao exercício de um comércio ou indústria" que pode até "compreender mais do que uma unidade técnica".
Igualmente as directivas comunitárias, desde a Directiva nº 77/187/CEE, se reportam especificamente à manutenção dos direitos dos trabalhadores “em caso de transferência de empresas, estabelecimentos ou partes de estabelecimentos”, referindo-se expressamente na al. b) do art. 1º da Directiva nº 2001/23/CE, -(38), que é considerada “transferência, na acepção da presente directiva, a transferência de uma entidade económica que mantém a sua identidade, entendida como um conjunto de meios organizados, com o objectivo de prosseguir uma actividade económica, seja ela essencial ou acessória(sublinhados nossos).

De acordo com a jurisprudência do TJCE, o critério fundamental para a aplicação da directiva comunitária nº 77/187 é, assim, o de saber:
- se há uma entidade que desenvolve uma actividade económica de modo estável e
- se essa entidade, depois de mudar de titular (ainda que sem vínculo negocial entre o transmitente e o transmissário), manteve a sua identidade -(39).
Ou seja, e no fundo, a verificação da existência de uma transferência depende da constatação da existência de uma empresa ou estabelecimento (conjunto de meios organizados, com o objectivo de prosseguir uma actividade económica), que se transmitiu (mudou de titular) e manteve a sua identidade.
Determinar se a entidade económica subsiste na esfera do transmissário como “um conjunto de bens organizados com suficiente autonomia para poder funcionar independentemente no mercado”, é tarefa que, como refere Júlio Vieira Gomes, “exige a ponderação, no caso concreto, de uma série de factores, entre os quais se contam o tipo de estabelecimento, a transmissão ou não de elementos do activo, tais como edifícios e bens corpóreos, mas também o valor dos elementos imateriais no momento da transmissão, a continuidade da clientela, a manutenção do pessoal (ou do essencial deste), o grau de semelhança entre a actividade exercida antes e depois e a duração de uma eventual interrupção da actividade” - (40).
O TJ tem utilizado este método indiciário, que postula a ponderação de “todas as circunstâncias de facto que caracterizam a operação em causa” - (41) .
Há que apreciar em concreto o conjunto de circunstâncias de facto presentes no caso em análise e, efectuando uma apreciação global, ponderar o peso relativo de cada uma delas, tendo em conta o tipo de actividade desenvolvida.
É, contudo, essencial que a transferência tenha por objecto uma entidade económica organizada de modo estável, ou seja, deve haver um conjunto de elementos que permitam a prossecução, de modo estável, de todas ou de parte das actividades da empresa cedente e deve ser possível identificar essa unidade económica na esfera do transmissário -(42) .
*
3.6.2. O caso"sub judice"
Situando-nos neste cenário normativo, e assentes os critérios que resultam do direito nacional e comunitário (e perante a interpretação que a jurisprudência deles vem fazendo) quanto à integração do conceito de estabelecimento, à noção da sua transmissão e à possibilidade da sua transmissão parcial, verifiquemos então se ocorreu no caso “sub-judice” uma transmissão, ainda que parcial, da empresa que a AIA explorava para a TAP, nos termos e para os efeitos previstos no art. 37º da LCT, visto este preceito à luz do direito comunitário.

3.6.2.1. Segundo a alegação dos recorrentes, após a dissolução da AIA, verificou-se uma transmissão da empresa para a TAP, o que é demonstrado pela utilização pela TAP dos mesmos aviões da AIA, pela transferência para a TAP de equipamento de voo e de material de escritório e de alguns trabalhadores, e ainda pelo facto de a TAP ter mantido as rotas charter em que até então a AIA operava, transmissão esta que determinaria a assunção da qualidade de empregador pela TAP em relação aos trabalhadores da AIA, nos termos do art. 37° da LCT, pelo que, não havendo fundamento para o despedimento colectivo – a AIA não teria encerrado mas teria, antes, sido transmitida –, a aceitação pelos trabalhadores da compensação teria sido feita em erro e deveria ser anulada, com a inerente consequência de os trabalhadores serem reintegrados na TAP e terem direito a auferir os salários intercalares.

3.6.2.2. O acórdão recorrido a este propósito discorreu nos seguintes termos:
« Posto isto, passemos à análise do caso concreto.
Os factos provados são muitos, porque se repetem nas várias acções, mas no essencial resumem-se no seguinte:
A TAP a partir de 1 de Maio de 1993 passou a realizar pelo menos parte dos voos charter já contratados pela AIA – os relativos ao Verão IATA 1993 – utilizando, para o efeito, parte do equipamento antes usado por esta, nomeadamente 4 aviões, e equipamento de escritório e algumas louças de bordo.
Importa antes de mais contextualizar e esclarecer estes factos, com outros que também estão provados ou que resultam dos autos:
- No dia 19.02.93 foi deliberado em Assembleia-Geral Extraordinária dissolver a Ré AIA, dissolução essa que foi efectuada por escritura pública de 19 de Abril de 1993 e que foi efectiva e definitivamente registada no registo comercial de Faro, local da sua sede.
- Em 26.02.93, a ré AIA enviou a todos os ex-trabalhadores a comunicação de despedimento, a que se refere o artº 20 do D.L. 64-A/89, na qual fazia saber que, decorrido o prazo do aviso prévio de 60 dias, os respectivos contratos cessariam a 30 de Abril de 1993.
- Do relatório dos assessores resulta que a liquidação da AIA se iniciou em 30.04.93, data a que foram reportados os documentos de prestação de contas da sociedade.
- E desse relatório resulta ainda que a AIA operava com oito aviões, dois dos quais foram devolvidos ao lessor e outros dois sublocados a outra companhia. E os restantes quatro aviões que passaram para a TAP, um deles tinha sido sublocado pela TAP à AIA e dos outros três a TAP era garante do pagamento das obrigações dos contratos de leasing celebrados pela AIA.
- Estes quatro aviões que passaram para a TAP foram devolvidos por esta empresa aos respectivos locadores entre os anos de 1998 e 2000.
- Do relatório dos assessores resulta ainda que os contratos de arrendamento dos imóveis onde a AIA operava foram denunciados e os imóveis entregues à ANA, sua proprietária. E resulta ainda que outros bens, como automóveis foram adquiridos por terceiros e não pela TAP.
Perante este complexo factual, importa desde logo ponderar que a AIA foi dissolvida por deliberação legítima dos seus sócios reunidos em Assembleia-Geral para o efeito regularmente convocada. A decisão de dissolução de uma sociedade anónima é matéria da competência exclusiva dos sócios bastando, para o efeito, a simples vontade destes em lhe porem fim, o que emana da liberdade de iniciativa económica constitucionalmente consagrada, a qual encerra a dúplice dimensão de liberdade de investimento e de liberdade de desinvestimento.
No caso concreto, porém, a dissolução até encontrava fundamento justificativo nos maus resultados da empresa, estando à beira da falência, fruto da conjuntura económica que afectava o sector dos voos charter, em resultado da guerra do Golfo.
(...) a deliberação de dissolução imediata da AIA, tomada pelos seus sócios, não acompanhada de qualquer outra deliberação em sentido contrário, acarretava inexoravelmente o encerramento da empresa, com a consequente desintegração da organização produtiva.
E em obediência a esse desiderato que a administração da Ré procedeu ao despedimento colectivo de todos os trabalhadores da empresa e, no decurso do processo de liquidação, foi dando um destino aos bens patrimoniais desta com vista ao encerramento definitivo da empresa, que suspendeu toda a actividade a partir de 30.04.93.
Daqui resulta que com a dissolução e subsequente liquidação da AIA não subsistiu um estabelecimento que pudesse ser transmitido.
Mas vejamos se, ao nível dos factos, os concretos bens que foram transmitidos para a TAP podem configurar uma transferência de estabelecimento ou de parte dele.
Está provado que passou da AIA para a TAP “equipamento de escritório, loiças de bordo e quatro aviões”.
Antes de mais essas transmissões ocorreram no decurso do processo de liquidação, em diferentes momentos e por circunstâncias diversas: dação em cumprimento no caso do mobiliário de escritório e das louças de bordo e, quanto aos aviões, a TAP já era locatária em um deles e nos três restantes era avalista nos contratos de leasing.
Tais bens quando transmitidos já não estavam afectos autonomamente à actividade de charter, nem tinham directamente afectos quaisquer trabalhadores, não constituindo um conjunto qualificável como unidade económica, com identidade própria, que pudesse ser enquadrável, ainda, como estabelecimento da AIA.
Na verdade, tais bens foram adquiridos pela TAP como elementos isolados, resultantes do desmembramento da organização empresarial que era a AIA, não dotados de organização própria susceptível de os qualificar como unidade económica capaz de operar no mercado por si mesma, faltando-lhe, para isso, o elemento organizatório e funcional a que atrás se referiu.
Por outro lado, nenhum desses elementos por si mesmo ou no seu conjunto é decisivo ou essencial enquanto suporte da actividade charter levada a cabo pela TAP. Com efeito, é manifesto que as louças ou o mobiliário são irrelevantes para a prestação da actividade do transporte aeronáutico não regular e, no que se refere aos aviões, embora resulte dos factos provados que os quatro aviões foram utilizados pela TAP nos voos IATA 1993, já contratados pela AIA, também está provado que alguns desses voos foram realizados por aviões da TAP e ainda que tais aviões também efectuaram voos regulares ao serviço da TAP até serem devolvidos. Estes elementos corpóreos, nomeadamente os aviões transmitidos para a TAP não constituíam, por si mesmos, suporte decisivo para a actividade charter que a TAP passou a desenvolver uma vez extinta a AIA.
Não podia, por isso, a transmissão desses bens, reconduzir-se a uma transferência, ainda que parcial, de estabelecimento.
No que se refere à realização pela TAP de voos charter, logo a partir de 1.04.93, e que já haviam sido contratados pela AIA, nomeadamente os relativos ao verão IATA 1993, à primeira vista poderia dizer-se que configuram uma continuação pela TAP da actividade que era desempenhada pela AIA, o que seria um forte indício de transmissão do estabelecimento. Mas, numa análise mais aprofundada, verifica-se que tais voos foram realizados em circunstâncias que retiram todo o valor indiciário a essa actuação da TAP. Com efeito, o incumprimento desses contratos faria incorrer a AIA em pesadas indemnizações, como aliás está provado. E a TAP enquanto accionista e principal credora tinha especial interesse na situação patrimonial da AIA, pois tal incumprimento agravava as suas possibilidades de reembolso dos seus créditos, bem como o saldo de liquidação da TAP. Acresce que a TAP tinha a possibilidade de por si própria assumir o cumprimento desses compromissos contratuais da AIA, pois dispunha de meios para o efeito, nomeadamente aviões, tripulação, experiência e licença para a realização de voos charter. Assim, atento o processo de liquidação em curso e a impossibilidade de a AIA realizar tais voos, nada obstava a que a comissão liquidatária da AIA cometesse à TAP a realização desses voos, o que se insere plenamente no âmbito de actuação dessa comissão ao abrigo do art. 152º nº 3 al. a) e b) do CSC, o que não envolve a transferência de estabelecimento.
Acresce que à luz da Directiva 77/187/CE, conforme já foi dito, para que haja transmissão de estabelecimento não basta a simples prossecução da actividade, sendo ainda necessário que se verifique a conservação da identidade do estabelecimento, que resulta de elementos, como o pessoal que o compõe, o seu enquadramento, a organização do seu trabalho, os seus métodos de exploração, entre outros.
Ora, no caso vertente, a TAP na realização dos voos relativos ao Verão IATA 1993, não fez uso de uma “entidade” com a mesma identidade da “entidade” que antes pertencera à AIA, antes fez uso do seu próprio instrumento de intervenção no mercado em causa, que era a sua própria empresa, pelo que falecendo a identidade das duas “entidades”, não se concebe a possibilidade de ocorrer uma transmissão de estabelecimento.
No que se refere à realização de voos charter no ano de 1994, estes já contratados pela TAP, verifica-se que essa actuação resultou de uma ocupação pela TAP da quota de mercado deixada livre pelo encerramento da AIA, o que não constitui indício relevante de transmissão de estabelecimento.
No que se refere à clientela, também entendemos que não se verificou passagem de clientela da AIA para a TAP, pois tal não decorre do facto dos “operadores turísticos continuarem a ser os mesmos”. Na verdade, no mercado dos voos charter a clientela é muito volátil alterando-se com muita facilidade de um ano para outro conforme as concretas condições oferecidas pelas companhias aéreas que se dedicam a essa actividade. Aliás, com a dissolução e consequente encerramento da AIA a clientela que antes era dela ficou à solta, à mercê de quem a souber conquistar, nas palavras sugestivas de Nogueira Serens, (pag. 6365 dos autos).
Acresce, ainda, que o estabelecimento de que a AIA era titular era um estabelecimento vinculado a certo bem que era uma licença, a qual nem sequer era transmissível nos termos do art. 11º do DL 19/82 de 28.01, o que impossibilitava o trespasse do estabelecimento, podendo apenas ser objecto do negócio os bens singulares e não o próprio estabelecimento.
Podemos, assim, concluir que a transferência dos citados bens do património da AIA para a TAP, nas circunstâncias concretas em que ocorreu, não é susceptível de configurar uma transmissão (total ou parcial) de um hipotético estabelecimento comercial de que a AIA ainda fosse titular na sua fase de liquidação.
Não se verificou, pois, a transmissão de qualquer estabelecimento ou parte dele da AIA para a TAP.» (Fim de transcrição)

3.6.2.3. Subscrevemos no essencial estas acertadas considerações – e daí a longa transcrição a que se procedeu –, bem como a conclusão que delas extraiu a Relação, apenas discordando do relevo que é dado ao facto de a AIA ser titular de um estabelecimento vinculado a uma licença não transmissível nos termos do art. 11º do DL 19/82 de 28.01, na medida em que, estando a TAP habilitada a operar, quer na área dos voos “regulares”, quer dos “não regulares” (cfr. o art. 4.º do DL n.º 471-A/76, de 14 de Junho que aprovou os Estatutos da TAP), a vinculação do estabelecimento de transporte aéreo não regular a uma licença não constituía óbice a que a TAP pudesse explorar tal estabelecimento.
Assim, e desde que a sucessão de actos ocorrida permitisse a afirmação de que a TAP assumiu da AIA um conjunto de bens organizados com suficiente autonomia para poder funcionar independentemente no mercado (um estabelecimento, entendido este como uma unidade económica nos termos assinalados), aquele factor não obstaria à afirmação da transmissão para efeitos laborais.

Só que não pode efectivamente extraír-se da matéria de facto a conclusão de que foi transferido da AIA para a TAP um conjunto organizado de factores produtivos com relevância suficiente para poder afirmar-se que constitui um suporte autónomo para o desempenho da actividade dos voos não regulares.
Aliás, note-se que, tendo-se expressamente quesitado se “[a] R. criou um departamento de voos não regulares que constitui, precisamente, a reposição da estrutura que antes correspondia à AIA”, (quesito 104.º) este quesito mereceu a resposta de não provado na presente acção (vide fls. 5046 verso).
Analisando a globalidade da matéria de facto apurada, consideramos que não subsistiu efectivamente no âmbito da TAP, após os actos que se sucederam na fase de liquidação do património da AIA, uma entidade económica directa e autonomamente vocacionada para dar continuidade à área de actividade de voos charter anteriormente desenvolvida pela AIA.
Não houve, por um lado, um negócio transmissivo formal da AIA para a TAP (que a haver seria nulo por extrapolar os poderes da comissão liquidatária previstos no art. 152.º, n.º 3 do CSC).
Nem houve, por outro, uma transmissão material ou de facto de vários elementos desconexos que depois se reorganizaram no seio da TAP fazendo ressurgir uma empresa (ou estabelecimento) autónoma. Mesmo admitindo, em tese geral, que os elementos transmitidos de forma desagregada podem permitir em alguns casos a reconstituição do estabelecimento como unidade económica com a mesma identidade no seio do destinatário – possibilitando aquilo que a jurisprudência espanhola denomina de “efeito Lázaro” –, o certo é que, no caso vertente, não há indícios que permitam reconhecer na titularidade da TAP uma unidade de negócio dedicada à actividade de voos charter e autonomamente organizada para esse efeito, não consentindo os factos apurados a afirmação de que se verificou a transmissão material de uma unidade económica da AIA para a TAP, nos termos do art. 37° da LCT e da Dir. n.º 2001/23.
Para alicerçar esta conclusão quanto aos vários indícios ponderados, sublinharemos apenas alguns aspectos, simultaneamente apreciando alguns argumentos a que os recorrrentes dão maior relevância nas revistas interpostas.

3.6.2.4. No que diz respeito aos quatro aviões que a TAP passou a utilizar, não obstante ser evidente a importância do investimento em aeronaves no transporte aeronáutico, é muito relevante a circunstância de a sua passagem para a TAP (credora da AIA, locatária de um dos aviões e garante da locação dos outros três) ter resultado de um acordo realizado no âmbito da liquidação entre a comissão liquidatária, a TAP e os locadores e ter-se destinado a minorar os prejuízos para os credores (nos quais se inclui a TAP) decorrrentes da dissolução da AIA.
Estes actos correspondem, assim, a actos de destinação do património de uma empresa dissolvida, em benefício dos respectivos credores e em cumprimento diligente dos deveres legais dos liquidatários: perante as consequências que implicava a devolução dos aviões ao locador antes de esgotados os prazos do aluguer (o pagamento pela AIA, ou pela própria TAP que era locatária de um deles e garante do pagamento das rendas dos outro três, de todas as rendas vincendas até ao final do prazo do contrato de locação), a TAP assumiu o pagamento das rendas, tomou a posição de locatária nos respectivos contratos, e passou a utilizar os aviões na sua actividade.
Atendendo a esta motivação, a que os aviões foram indiferenciadamente utilizados no transporte regular e não regular (não tendo a nosso ver relevo que durante algum tempo tenham voado com as cores e logotipo da AIA) e a que foram sendo devolvidos aos locadores logo que findos os contratos de locação até 1998-2000, permanecendo ao serviço da TAP num horizonte temporal limitado, o facto de a TAP os ter passado a utilizar quando assumiu o pagamento das rendas respectivas em 1993, não revela a intenção de assumir o negócio da aviação charter nem é suficiente para se afirmar que a actividade charter foi desenvolvida com autonomia no seio da TAP.

Quanto aos voos charter realizados em 1993 e 1994, é importante sublinhar que se desconhece o número de voos que a AIA efectuava anualmente, em média, o que dificulta a ponderação do significado da actividade charter desenvolvida pela TAP nestes anos (relativamente à actividade anteriormente desenvolvida pela AIA e no próprio contexto da actividade global da TAP).
De todo o modo, sabe-se que a TAP estava legalmente habilitada a operar no mercado charter e que anteriormente já o fazia, embora pontualmente.
E sabe-se, também, que desenvolveu os voos de 1993 para cumprir obrigações assumidas no processo de liquidação da AIA (e evitar o prejuízo do incumprimento de contratos já celebrados pela AIA com os operadores), que utilizou os aviões que provinham da AIA nas rotas regulares e não regulares e também que utilizou indiferenciadamente o seu pessoal nos voos regulares e não regulares, mais uma vez não se descortinando uma entidade económica independente dedicada à actividade dos voos não regulares no âmbito da TAP.
Como bem aponta o acórdão recorrido, nos voos de 1993, a TAP fez uso do seu próprio instrumento de intervenção no mercado, a sua empresa, para cumprir obrigações assumidas no processo de liquidação da AIA.
Enquanto principal credora da AIA, a TAP tinha especial interesse em obstar ao incumprimento daqueles contratos e às pesadas indemnizações a ele associadas, pois tal incumprimento agravava as possibilidades de reembolso dos seus créditos, sendo certo que a TAP tinha a possibilidade de, por si própria, assumir o cumprimento desses contratos da AIA, pois dispunha de meios para o efeito, nomeadamente aviões, tripulação e licença para a realização de voos charter.
Não se descortina por que razão alguns dos recorrentes invocam, a este propósito da realização dos voos de 1993, que não pode agora a TAP usar o argumento de que realizou os voos para obstar a pesadas indemnizações, uma vez que foi com base na sua decisão que a AIA ficou impossibilitada de cumprir a programação do Verão lATA 1993, nem tão pouco o Acórdão recorrido pode absorver este "venire contra factum proprium".
A actuação da TAP no plano económico é coerente: propôs a dissolução da AIA por ser inviável a exploração económica desta e, no âmbito da liquidação, assumiu realizar voos antes contratados pela AIA para obstar a pesadas indemnizações.
Sendo este o móbil da realização de tais voos – como se provou – e se o mesmo tem relevo para compreender as razões da prática dos factos em análise na acção, não se vê em que é que a TAP contraria a sua anterior actuação ao alegar essas mesmas razões.
Como se tem entendido na jurisprudência do TJ, é necessária a apreciação da globalidade das circunstâncias em que se processaram os factos susceptíveis de indiciar a transferência de estabelecimento para aferir do valor indiciário destes.
Foi isto, e apenas isto – a alegação destas circunstâncias –, que a R. TAP efectuou ao explicitar na acção as razões da realização dos voos charter de 1993.
Já nos voos de 1994 – contratados pela TAP directamente com os operadores turísticos para rotas que até então não assegurava por constituírem rotas tradicionais da AIA –, a TAP exerceu, como qualquer Companhia Aérea podia ter exercido, uma actividade que não representa mais do que a ocupação de um espaço de mercado deixado livre pelo encerramento da AIA.
Deve notar-se que o TJCE, confrontado com situações em que, por diversos motivos, uma empresa prosseguia a actividade até então levada a cabo por outra, considerou que essa “mera circunstância” não permite concluir pela transferência de uma entidade económica entre a primeira e a segunda empresa, uma vez que “uma entidade não pode ser reduzida à actividade de que está encarregada. A sua identidade resulta também de outros elementos, como o pessoal que a compõe, o seu enquadramento, a organização do seu trabalho, os seus métodos de exploração ou ainda, sendo caso disso, os meios de exploração à sua disposição” - (43)..

No que diz respeito à entrega de loiças usadas em aviões e equipamento de escritório da AIA à TAP, a mesma é irrelevante, não só porque foi tida em conta no âmbito da liquidação, como ainda porque não está demonstrado que estas loiças e equipamento tenham sido afectos à actividade charter, o que impossibilita a afirmação de que fazem parte de um complexo organizado de bens e pessoas especificamente dedicado à actividade de voos não regulares.

Finalmente uma palavra quanto ao facto que emerge da resposta ao quesito 105.º, já que os recorrentes sublinham ter este facto um importante valor como indício da transferência de estabelecimento: a manutenção de funcionários, que indicia a manutenção da identidade da entidade económica.
Ora, do facto provado no ponto 105° não resulta que ocorreu a manutenção (ou sequer o despedimento pela AIA e a readmissão posterior pela TAP) de funcionários da AIA no seio da TAP.
No ponto 105° da matéria de facto ficou provado que “as funcionárias A 176 e A 177, até então destacadas pela TAP para exercerem funções na Direcção Comercial da AIA, após a dissolução desta foram colocadas pela TAP na sua Direcção Comercial com funções na área de voos não regulares ad hoc e dos contratos de voos charter do Verão IATA 93”.
Verifica-se, assim, que as referidas funcionárias estavam ligadas à TAP por um contrato de trabalho (sendo por isso trabalhadoras da TAP e não da AIA), tendo sido destacadas pela TAP para exercerem funções na AIA, e vindo a regressar à empresa da sua empregadora, após a dissolução da AIA, o que é realidade bem distinta da invocada "manutenção de trabalhadores".
O regresso de trabalhadoras da TAP à própria empresa, após a dissolução da AIA em que estavam destacadas, decorre do cumprimento dos respectivos contratos de trabalho com a sua empregadora (a TAP), compreendendo-se a sua integração em funções correspondentes à sua categoria e que no Verão de 1993 tenham desenvolvido funções na área dos voos não regulares que a TAP desenvolveu nesse ano (desconhecendo-se, também, se a sua actividade laboral se dirigia apenas a este tipo de voos). Não se identifica, pois, também, com a actividade destas trabalhadores no seio da TAP, a organização de uma entidade económica autónoma dedicada aos voos não regulares.

3.6.2.5. Em suma, nenhum dos indícios apontados é concludente no sentido de que se verificou a transmissão (total ou parcial) da unidade de negócio prosseguida pela AIA para a TAP.
A análise global dos indícios não permite reconhecer no âmbito da TAP um conjunto de meios materiais e humanos que constitua o suporte da actividade de voos charter, organizado autonomamente para esse efeito, ou seja, uma entidade económica que mantém a sua identidade e prossegue com autonomia a actividade de aviação comercial irregular no seio da TAP.
Ao invés, o equipamento da AIA que a TAP passou a utilizar diluiu-se no conjunto do equipamento da TAP e esta efectuou voos regulares e não regulares, neles utilizando indiferenciadamente o seu pessoal e o equipamento da sua Companhia Aérea.
*
3.7. O reenvio prejudicial
Alguns dos recorrentes (os que apresentaram alegações a fls. 6924 e ss. e os que apresentaram alegações a fls. 6997 e ss.) requerem a este Supremo Tribunal que, considerando a matéria de facto provada, submeta ao Tribunal de Justiça, em reenvio prejudicial, a decisão sobre a questão de saber se a interpretação das referidas Directivas, efectuada por aquele Tribunal de Justiça, se mostra consentânea com a interpretação e aplicação do artigo 37º da LCT, a que procedeu o Tribunal da Relação de Lisboa, no caso em apreço.
Outros recorrentes (os que apresentaram alegações a fls. 7085 e ss. e os que apresentaram alegações a fls. 7121 e ss.) defendem que, caso se entenda que a interpretação correcta do direito comunitário e da sua aplicação à situação factual deve ser efectuada pelo TJCE, devem ser colocadas as seguintes questões a título prejudicial ao TJCE:
“- O disposto na Directiva 77/187/CEE do Conselho, de 14 de Fevereiro de 1977, aplica-se quando a transferência for feita por uma empresa em processo de liquidação voluntária, cuja principal finalidade, é proceder à partilha dos bens entre sócios?
- Para determinar a existência de uma transferência de estabelecimento é necessário haver identidade entre as empresas da Cedente e da Cessionária ou, pelo contrário, a identidade terá de ser aferida em termos de actividade, nomeadamente, pelo facto de a empresa Cessionária continuar, de forma efectiva, a exploração da actividade da empresa Cedente?
- Constitui indício relevante de transmissão de estabelecimento:
a) a ocupação de uma quota de mercado na realização de voos charter, deixada livre por uma empresa dissolvida, caracterizada pela contratação com os mesmos operadores turísticos, a realização de voos com as mesmas rotas e utilização dos aviões da sociedade dissolvida;
b) o facto de, após a dissolução da Cedente, as funcionárias pertencentes à sua Direcção Comercial serem reintegradas na Direcção Comercial da Cessionária, precisamente com as mesmas funções na área de voos não regulares ad hoc e nos contratos de voos charter;
c) a prossecução pela Cessionária, da actividade contratada e programada pela Cedente, após a sua dissolução, com fundamento no especial interesse que representa para a Cessionária, enquanto accionista e principal credora, pois o incumprimento dos contratos, agravavam as possibilidades de reembolso dos seus créditos, bem como o seu saldo de liquidação;
d) o facto de a clientela no mercado de realização de voos charter ser muito volátil mesmo que a Cessionária mantenha a clientela da Cedente;
e) o facto de o estabelecimento da sociedade dissolvida requerer uma licença administrativa e esta ser intransmissível.
- O Artigo 4.°, nº 1, da Directiva 77/187/CEE do Conselho, de 14 de Fevereiro de 1977, que não foi transposta para o ordenamento nacional português, aplica-se directamente no sentido de derrogar, com um intuito mais favorável para os trabalhadores, a presunção iuris et de iure da norma prevista no revogado Artigo 23.°, n.º 3 do Decreto-Lei nº 64-A/89, de 27 de Fevereiro, que dispõe que o recebimento pelo trabalhador da compensação a que se refere o presente artigo vale como aceitação do despedimento, e tem como consequência a impossibilidade legal de o trabalhador requerer a suspensão judicial do despedimento, tal como a sua impugnação?”

O artigo 234º do Tratado de Roma permite aos juízes nacionais interrogar o Tribunal de Justiça sobre a interpretação de normas comunitárias por via do designado reenvio prejudicial, com vista à interpretação uniforme do direito comunitário em toda a União Europeia e, em alguns casos, estabelece a obrigação de o fazer.
O Supremo Tribunal de Justiça constitui um dos órgãos jurisdicionais nacionais sobre os quais impende a obrigação de reenvio prejudicial, plasmada no terceiro parágrafo do art. 234.°.
Essa interpelação pressupõe que, suscitando-se uma questão de interpretação do direito comunitário, o Supremo Tribunal de Justiça considere que essa questão é relevante para a solução do litígio, que foi chamado a conhecer, e sobre o qual julgará em última instância.
A obrigação de reenvio prejudicial, que impende sobre os órgãos juris­dicionais nacionais cujas decisões não sejam susceptíveis de recurso judicial previsto no direito interno, só se afirma quando esses mes­mos órgãos jurisdicionais considerem que o recurso ao direito comu­nitário é necessário para a solução do litígio que perante eles corre e, além disso, que se tenha suscitado uma questão de interpretação desse direito.
Mas, mesmo nessas circunstâncias, a referida obrigação não se afirma sem limites.
Pode acontecer que, não obstante ter concluído no sentido da relevância da questão suscitada, o Supremo Tribunal de Justiça não fique obrigado a interpelar os Juízes do Luxemburgo sobre essa mesma questão ou, dizendo de outra forma, seja livre de não efectuar o reenvio prejudicial.
Naturalmente só se justifica que os órgãos jurisdicionais de algum Estado-Membro implementem o referido reenvio quando, como se referiu no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 3 de Outubro de 2007 -(44), ocorra dúvida sobre a interpretação das normas comunitárias.
Este pressuposto essencial do reenvio prejudicial para o Tribunal de Justiça da União Europeia pelos órgãos jurisdicionais dos Estados-Membros determina que, só verificando-se um caso de dúvida quanto à interpretação das normas comunitárias, deva o STJ colocar a questão ao Tribunal de Justiça.
O próprio Tribunal de Justiça, expressamente reconheceu que "a correcta aplicação do direito comunitário pode impor-se com tal evidência que não dê lugar a qualquer dúvida razoável quanto à solução a dar à questão suscitada" - (45), afastando, por conseguinte, também nesta hipótese, a obrigação de reenvio prejudicial.
Nunca a obrigação de reenvio se impõe apenas porque as partes no processo manifestam a vontade de que se faça a interpelação do Tribunal de Justiça, pois de outro modo o referido artigo do Tratado seria transformado numa via de recurso à disposição das partes no processo.

Ora, face ao conteúdo das normas das Directivas Comunitárias referenciadas pelos recorrentes, face à interpretação que das mesmas vem sendo feita pelo TJCE e face aos contornos do caso “sub judice” que foram ponderados no decurso deste aresto, inexiste dúvida relevante na operação interpretativa que implique a necessidade do reenvio prejudicial, não relevando que entre as questões suscitadas nestes autos e as situações que foram submetidas à apreciação do TJ não exista uma estrita identidade.
Como resulta deste próprio texto e da doutrina e jurisprudência que nele se foi citando, o TJ tem uma vasta e já sedimentada jurisprudência sobre a problemática da interpretação das normas comunitárias que se reportam à “transmissão de estabelecimento”, sendo que a última Directiva emitida a propósito traduz já a consolidação dos conceitos nela enunciados por força daquela jurisprudência e estes apresentam-se agora com uma clareza em termos de interpretação jurisprudencial (comunitária e, mesmo, nacional) que dispensa, no caso vertente, a consulta prévia ao Tribunal de Justiça.

Deve acrescentar-se que a questão da compatibilidade do art. 23.º, n.º 3 da LCCT com o art. 4.º da Directiva não poderia igualmente ser objecto de reenvio prejudicial. Uma vez que o objecto do reenvio tem que respeitar as competências do TJCE, o juiz nacional não pode efectuar um reenvio que tenha por objecto a interpretação do direito nacional ou pedir ao TJ que julgue da compatibilidade entre um preceito de direito intermo e outro de direito comunitário. Como refere M. Almeida Andrade - (46), são tarefas que incumbem “em exclusivo” ao juiz nacional, bem como o conhecimento dos factos e a aplicação do direito ao caso concreto.
Finalmente, como se referiu no Ac. deste Supremo Tribunal de 4 de Junho de 2008 (Recurso n.º 1035/08 - 4.ª Secção) não se insere na competência do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias saber se determinado normativo de direito comunitário é, ou não, aplicável (ainda que não directamente) a uma dada situação sobre a qual se debruçam os tribunais nacionais dos vários Estados Membros.
Nunca poderia, pois, ser directamente colocada ao TJ a questão enunciada pelo primeiro grupo de recorrentes de saber se a interpretação das referidas Directivas, efectuada por aquele Tribunal de Justiça, se mostra consentânea com a interpretação e aplicação do artigo 37º da LCT, a que procedeu o Tribunal da Relação de Lisboa, no caso em apreço.

Não se procederá, assim, ao pretendido reenvio prejudicial.
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3.8. A licitude do despedimento
Como decorre do exposto, a sucessão de actos praticados pela AIA, pela TAP e pela comissão liquidatária, após a dissolução da AIA e no contexto da liquidação do seu património, não configura uma transmissão (total ou parcial) de estabelecimento para efeitos do art. 37.º da LCT, interpretado à luz da legislação e da jurisprudência comunitárias, devendo concluir-se que, com a cessação da sua actividade, a empresa explorada pela AIA encerrou definitivamente em 30 de Abril de 1993.
E todos os actos que, entretanto, se desenvolveram se explicam pelos objectivos inerentes à dissolução da AIA: cessar definitivamente a actividade da sociedade, proceder ao encerramento definitivo da empresa que explora e liquidar o seu património.

Nesta conformidade, o despedimento dos recorrentes trabalhadores da AIA, decidido e efectivado, entre Fevereiro e Abril de 1993 como despedimento colectivo, cujo fundamento substancial foi o encerramento definitivo da empresa, fundado numa deliberação da Assembleia-Geral que a ele necessariamente conduz, em virtude da grave situação económica em que se encontrava a sociedade, é lícito por se verificar o fundamento legal enunciado no art. 16.º da LCCT.
Por este motivo, e porque não se configura a factispecie do art. 37.º da LCT, a posição contratual que a R. AIA detinha nos contratos de trabalho que a vinculavam aos seus trabalhadores, incluindo ao A. A 17, não se transmitiu de modo algum para a R. TAP, nada permitindo que se afirme a vinculação laboral desta a qualquer dos AA. ou intervenientes.

Tanto basta para que se julguem improcedentes as pretensões dos recorrentes autores e intervenientes e para que se julguem procedentes as revistas interpostas pelas rés AIA e TAP.

Sempre se dirá, todavia, que não se configurando na sucessão de actos da AIA e da TAP, por ocasião da dissolução da primeira empresa um caso de transmissão do estabelecimento, subsumível ao art. 37° da LCT e à directiva comunitária, não tem aqui aplicação a norma do art. 4.º n° 1 da Directiva, que integra o regime da transmissão, relativa à proibição dos despedimentos com fundamento directo na transmissão, nem o art. 5.º, n.º 1 da mesma, pois que também este pressupõe a verificação de uma transmissão que não ocorreu.
Aliás, o despedimento colectivo a que a AIA procedeu não seria posto em causa pela aplicação de qualquer destas normas na medida em que:
- Quanto à regra do art. 4.º, n.º 1, nada resulta dos autos demonstrativo de que o despedimento se funda directamente num indemonstrado acto de transmissão; o despedimento colectivo fundou-se no encerramento da empresa decorrente da dissolução da AIA e da consequente cessação da sua actividade, tendo a inerente decisão de gestão por base um motivo económico ponderoso;
- quanto à regra do art. 5.º, n.º 1, ainda que tivesse ocorrido a transmissão da empresa no contexto da liquidação, esta mesma situação de liquidação inviabilizaria a transmissão dos contratos de trabalho para a TAP e seria compatível com o despedimento dos trabalhadores da AIA.

É assim de considerar que a R. AIA demonstrou em juízo os fundamentos que invocou para o despedimento colectivo, sendo que o art. 16.º da LCCT lhes confere relevância fundamentadora desta forma de cessação do vínculo contratual laboral: o encerramento da empresa da AIA que cessou definitivamente a sua actividade.
Assim considerando, e não perdendo de vista que a motivação legal do despedimento colectivo é de natureza economicista e que o controlo judicial tem de se harmonizar com a liberdade da empresa e da sua gestão - (47), impõe-se a afirmação de que os fundamentos invocados para o despedimento colectivo dos AA. e dos intervenientes recorrentes são procedentes, não se verificando a hipótese de ilicitude prevista no art. 24.º, n.º 1 al. e) da LCCT.
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3.9. Do abuso do direito e da desconsideração da personalidade colectiva em atenção às exigências da boa fé
De acordo com a alegação de alguns dos recorrentes, as recorridas contornaram a legalidade e ofenderam princípios fundamentais do direito, nomeadamente os princípios do “favor laboratoris” protegidos pelo Direito Comunitário, veiculados pela jurisprudência do Tribunal de Justiça, consagrados na Constituição da República Portuguesa e nas demais leis laborais internas, o que constitui manifesto “abuso do direito” das Recorridas, que violaram os limites impostos pela boa fé, bons costumes e o fim social e económico desse direito ao despedimento colectivo.
Invocam, também, que há que ter em consideração as exigências da boa fé e que a AIA não era mais do que um prolongamento da TAP, sendo que esta, ao extingui-la e transferindo para si o estabelecimento, nomeadamente, os aviões e clientela se valeu do “levantamento de personalidade” para atingir os objectivos não permitidos por lei, ou seja, os despedimentos.
Concluem que é contrário à boa fé o apelo feito pela TAP à diferenciação de pessoas colectivas para se eximir aos compromissos laborais da AIA, que a Relação valida um "venire contra factum proprium" e branqueia a argumentação da TAP associada aos argumentos de personalidade jurídica, situação que é ainda agravada pelo facto de a TAP ter mantido e organizado cursos de BOEING 737, pelo que, também por esta via se impõe que a TAP assuma os contratos de trabalho dos Recorrentes.
Dispõe o art.º 334.º do Cód. Civil, sob a epígrafe “Abuso do direito”, que é “ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito”.
O direito que os recorrentes invocam ter sido abusivamente exercido é o de proceder ao seu despedimento colectivo.
Ora a nosso ver, a matéria apurada não permite a afirmação de que a recorrida AIA tenha abusado do seu direito de proceder àquele despedimento, vg ofendendo os invocados princípios do “favor laboratoris”.
Ao invés, e como decorre do exposto, julgamos que o despedimento encontra justificação no encerramento da empresa e que este foi motivado pela dissolução deliberada na Assembleia-Geral da AIA em razão das graves dificuldades económicas que esta atravessava.
Perante a cessação da actividade da sociedade, por virtude da sua dissolução, e perante o encerramento da empresa que necessariamente estava implicado numa deliberação de dissolução desacompanhada de uma outra deliberação que autorizasse os liquidatários, quer a continuar a actividade, quer a autorizar a entrega global do património da sociedade a um sócio, quer a autorizar o trespasse do estabelecimento, é absolutamente compreensível e legítima a cessação dos contratos de trabalho dos trabalhadores da empresa com efeitos a 30 de Abril de 1993, data em que se consumou o encerramento da empresa.
Além disso, e como se refere no já citado Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 2 de Novembro de 2005, a invocação de abuso do direito relativa aos despedimentos colectivos tem de reportar-se a esses mesmos despedimentos e não permite a apreciação de condutas gestionárias da empresa que lhe sejam alheias.
Perante a factualidade apurada, de forma alguma se pode afirmar que a R. AIA visou apenas ou primacialmente prejudicar os recorrentes com o exercício do direito ao despedimento colectivo, ou que as “utilidades” que para si resultam desse exercício correspondem a “desutilidades” para a outra parte não previstas e cobertas pelo direito exercido, ou que de tal exercício resulte em concreto apenas (ou sobretudo) uma desvantagem para os recorrentes - (48).
Nada indicia, pois, que as recorridas tenham excedido os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico do direito e, muito menos, “manifestamente”, como exige o art. 334º do C.Civil para que se considere ilegítimo o exercício do direito.

No que diz respeito especificamente à atitude da TAP de propor a dissolução da AIA e de, no âmbito do processo de liquidação, ter assumido alguns bens desconexos que passou a afectar à sua actividade nos termos já profusamente analisados, não se descortina na matéria de facto apurada nenhuma circunstância que denote ter-se a TAP valido do facto de ser uma pessoa jurídica distinta da AIA para atingir objectivos não permitidos por lei, ou seja, os despedimentos.
A proposta da TAP de dissolver a AIA encontra-se justificada – nos termos enunciados na acta da dissolução a que se reporta a alínea a) da especificação – e a TAP não havia assumido quaisquer compromissos laborais com os trabalhadores que a AIA admitiu, não podendo afirmar-se que a mesma pretendeu eximir-se a tais inexistentes compromissos. Especificamente no que diz respeito aos concursos de BOEING 737, a matéria de facto não demonstra o que os recorrentes alegam de que foram abertos após a extinção da AIA.
Deve notar-se que os AA. alegaram especificamente factos que poderiam relevar a este propósito e que, uma vez submetidos a prova, não foram demonstrados..
Assim, foi expressamente formulado o seguinte quesito:
“3.º - A dissolução da AIA e o despedimento colectivo de todos os trabalhadores da AIA foram desencadeados pela TAP, e com a conivência da AIA, para com redução de custos, voltar a deter a exploração do transporte aéreo não regular nas condições em que o detinha quando a AIA foi constituída”.
A este quesito foi dada a resposta de “não provado”.
Enfim, nada resulta da matéria fáctica que possibilite a afirmação de que a TAP violou as regras da boa fé na conduta assumida no contexto dos factos em análise nesta acção, não podendo afirmar-se que a TAP, ao propor a dissolução da AIA e ao passar a a utilizar alguns aviões e equipamento que anteriormente esteve afecto à AIA por força das operações de liquidação, estava de algum modo a recorrer à separação de personalidades para conseguir os despedimentos que, de outro modo, a lei não permitiria.
Repare-se que, como se decidiu no Ac. do STJ de 16 de Novembro de 2004, só é possível proceder ao levantamento da personalidade colectiva “quando a personalidade colectiva seja usada de modo ilícito ou abusivo para prejudicar terceiros, existindo uma utilização contrária a normas ou princípios gerais, incluindo a ética dos negócios” - (49), ou seja, e usando agora a expressão do STJ 23 de Março de 2006 “[t]rata-se de casos em que o exercício do direito subjectivo conduz a um resultado clamorosamente divergente do fim para que a lei o concedeu e dos interesses jurídica e socialmente aceitáveis” - (50).
Nenhum destes quadros ressalta da matéria de facto apurada na presente acção.

Improcede, assim, a tese de que as recorridas abusaram do seu direito não se vislumbrando válidas razões para desconsiderar a personalidade colectiva no caso "sub judice".
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Sendo o despedimento colectivo lícito, não se chegam a colocar os problemas do relevo da aceitação, ou não, das compensações que foram pagas aos recorrentes, da constitucionalidade do preceito que associa o percebimento da compensação à aceitação do despedimento, de saber se todos ou alguns dos autores e intervenientes podem invocar a anulabilidade da declaração negocial de aceitação, de aferir do eventual erro sobre os motivos ou sobre o objecto do negócio, sob o qual os trabalhadores teriam formado a decisão de aceitarem a indemnização correspondente, aquiescendo assim no próprio despedimento, bem como as questões relacionadas com a quantificação dos salários intercalares que seriam devidos se o despedimento fosse ilícito.
Em consequência, mostra-se prejudicada a apreciação das demais questões colocadas nos recursos interpostos (art. 660.º, n.º 2 do CPC, aplicável por força do disposto nos arts. 713.º, n.º 2 e 726.º do mesmo diploma legal).


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4. Assim, acorda-se em negar as revistas dos AA. e intervenientes e em conceder as revistas das RR. e, em consequência, absolvem-se as RR. dos pedidos.
Custas das revistas a cargo dos AA. e intervenientes recorrentes e custas nas instâncias a cargo dos AA. e intervenientes, sendo as mesmas na proporção dos respectivos decaimentos.

Lisboa, 25 de Fevereiro de 2009

Mário Pereira (Relator)
Sousa Peixoto
Sousa Grandão

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(1) - Transcreveu-se parte da acta para melhor esclarecimento.
(2) - Transcreveu-se parte da carta para melhor esclarecimento.
(3)- Tais documentos consistem nas cartas remetidas aos autores da acção n.º 1263/94 e constam de fls. 537 e ss. do processo apenso respectivo - II volume. O primeiro grupo de cartas está datado de 14 de Janeiro de 1993 e comunica aos autores a intenção de proceder ao despedimento nos termos do art. 17.º, n.ºs 1 e 4 da LCCT, caso a AG convocada para o dia 19 de Fevereiro decida pelo encerramento da empresa, nelas se relatando que foram “esgotadas as soluções possíveis no sentido de inverter a progressiva degradação económico-financeira da empresa”. O segundo grupo de cartas data de 26 de Fevereiro de 1993 e mostra-se referenciado na resposta ao quesito 146.º-A supra relatada.
(4)- Vide o citado Acórdão de 2005.01.27 (Revista n.º 924/04, da 4.ª Secção) e entre outros, também os Acórdãos do STJ de 2006.10.18 (Revista n.º 1324/06) e de 2006.05.24 (Revista nº 4022/05), todos da 4.ª Secção e sumariados em www.stj.pt, Jurisprudência/Sumários de Acórdãos.
(5) - Vide Pedro Romano Martinez, in “Código do Trabalho anotado”, 5.ª edição, 2007, p. 741. O art. 388.º, n.º 2 do Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro, na sequência da Proposta de Lei n.º 216/10 (Gov.), estabelece o mesmo prazo de seis meses para a impugnação do despedimento colectivo. Neste último diploma, o prazo para oposição ao despedimento individual é mais curto, o que se compreende porque foi substancialmente alterado o modo de oposição do trabalhador ao despedimento, passando-se a fazer impender sobre o empregador o dever de intentar acção de apreciação judicial do despedimento (art. 387.º, n.º 3). Quanto ao trabalhador, basta-lhe apresentar um requerimento em formulário próprio, junto do tribunal competente, no prazo de 60 dias, contados a partir da recepção da comunicação de despedimento ou da data de cessação do contrato, se posterior (art. 387.º, n.º 2).
(6) - P. ex., na Alemanha, se o trabalhador não impugna o despedimento colectivo no prazo de 3 semanas, ele considera-se válido e, na Itália, o prazo é de 60 dias, como noticia Bernardo Lobo Xavier, in “O Despedimento Colectivo no Dimensionamento da Empresa”, Lisboa 2000, pp. 181, 226 e 252.
(7) - As alterações introduzidas pela reforma de 1995-1996 no artigo 144.º do Código de Processo Civil, vieram clarificar, no n.º 4 do preceito, que o regime dos números precedentes só é aplicável aos prazos para a propositura das acções “previstos neste Código” (de Processo Civil). Assim o Acórdão Uniformizador de Jurisprudência n.º 2/2002 (DR n.º 273, Série I-A, de 2002-11-26), considerou inaplicável ao prazo judicial de propositura de acção previsto no art. 45.º do CPT/81 o art. 144.º, n.º 4 do CPC e decidiu que “[t]erminando em período de férias judiciais o prazo de 30 dias para ser proposta acção de impugnação de despedimento individual como condição da manutenção da eficácia de pedido de suspensão de despedimento ou de suspensão já decretada (artigo 45.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 272-A/81, de 30 de Setembro), esse termo transfere-se para o 1.º dia útil após férias [artigo 279.º, alínea e), do Código Civil].”
(8) - Vide o Prof. Alberto dos Reis, in “Comentário ao Código de Processo Civil”, II, pp. 52 e ss.
(9) - No seu artigo “Termo do prazo de caducidade que caia em férias judiciais”, in Revista de Legislação e de Jurisprudência, ano 128.º, n.º 3855, de 1 de Outubro de 1995, pp. 166 e ss.
(10)Cfr. o art. 10.º da Lei n.º 38/87, de 23 de Dezembro
(11)- No seu estudo intitulado “Processo de impugnação de despedimento colectivo”, publicado em “Estudos do Instituto do Direito do Trabalho”, vol V, 2007, pp. 77 e ss., referindo-se ao CPT/99, que, nesta matéria, consagra soluções similares ao CPT aprovado pelo DL n.º 272-A/81,de 30 de Setembro, com a redacção do DL n.º 315/89, de 21 de Setembro, que introduziu no ordenamento jurídico nacional o processo judicial de impugnação do despedimento colectivo.
(12)Vide Alberto Leite Ferreira, in “Código de Processo de Trabalho Anotado”, 4.ª edição, Coimbra, 1996, p. 184.
(13) - Qualificando a situação processual destes trabalhadores como de litisconsórcio voluntário, vide Leite Ferreira, in ob. citada, p. 680 e o Ac. do STJ de 28 de Junho de 2001, in C, Acs. do STJ, tomo II, p. 293.
(14)- In ob. citada, p. 682.
(15)- In “Os Incidentes da Instância”, 5.ª edição, Coimbra, 2008, p. 98, em referência ao actual art. 322., n.º 2, equivalente ao anterior art. 353.º, n.º 2.
(16)- Nas diversas alíneas do n.º 1 do art. 26.º da LCCT, a propósito da cessação do contrato individual de trabalho por extinção do posto de trabalho, o legislador precisa os conceitos de motivos “económicos ou de mercado”, “tecnológicos” e “estruturais”, enunciação esta que deverá ser atendida no âmbito do despedimento colectivo - vide o Ac. do STJ de 2000.03.01, proferido na Rev. n.º 221/99 da 4.ª Secção. No Código do Trabalho de 2003 o despedimento colectivo é definido no respectivo art. 397.º em termos não inteiramente coincidentes, o mesmo sucedendo com o Código do Trabalho de 2009, no seu art. 359.º (nenhum destes compêndios normativos é aplicável ao caso dos autos).
(17)- Vide J. Leite e Coutinho de Almeida in “Colectânea de Leis do Trabalho”, Coimbra, 1985, p. 265 e Cavaleiro Brandão, “Apreciação judicial da fundamentação económica dos despedimentos”, in RDES, ano XXXIV, n.ºs 1-2-3, Jan.-Set. 1992 .
(18)- Vide Bernardo da Gama Lobo Xavier, in “Curso de Direito do Trabalho”, Verbo, 2.ª edição, págs. 526 e ss.
(19)- In Prontuário do Direito do Trabalho, Act., n.º 45, p.27.
(20) - In “Direito do Trabalho”, Almedina, 12.ª edição, p.598.
(21) - No seu estudo “O regime dos despedimentos colectivos e as modificações introduzidas pela Lei n.º 32/99 de 18/05”, in Estudos do IDT, vol. I, Almedina, p. 409. Neste mesmo estudo, a pp.786, o autor situa o fundamento substantivo da obrigatoriedade de ponderação dos critérios da empresa nas regras constitucionais quanto à liberdade de empresa no dimensionamento dos efectivos e, também, no quadro motivacional que a LCCT prevê. Neste contexto se compreende a regra do art. 156.º-F, n.º 4 do CPT/81, que expressamente alude ao respeito pelo juiz dos critérios do gestor da empresa na apreciação dos factos.
(22) - Vide Bernardo Lobo Xavier, in “O Despedimento Colectivo no Dimensionamento da Empresa”, já citado, pp. 200 e 418.
(23) - No seu estudo “Despedimentos colectivos: liberdade de empresa e acção administrativa”, in RDES, ano XXXV, n.ºs 1-2-3-4, Jan.-Dez. 1993, pp.38 e ss.
(24)- Vide o Ac. do STJ de 1993.01.13, in CJ Acs. do STJ, I, p. 223, o citado Ac. do STJ de 2001.02.01 e B. Lobo Xavier, in “Curso de Direito do Trabalho”, 1993, p. 529 e no seu estudo “Regime do despedimento colectivo e as alterações da Lei n.º 32/99”, in Estudos em homenagem ao Prof. Doutor Raul Ventura, II, FDUL, 2003, II, p.774.
(25) - Vide o Ac. do STJ de 2 de Novembro de 2005 (Revista n.º 1458/05, da 4.ª Secção, sumariado em www.stj.pt, Jurisprudência/Sumários de Acórdãos) e Albino Mendes Baptista, in “Código de Processo do Trabalho Anotado”, p. 232. Segundo Alberto Leite Ferreira, in “Código de Processo de Trabalho Anotado”, 4.ª edição, Coimbra 1996, p. 686-687, é um traço fundamental deste regime processual do despedimento colectivo uma acentuada preocupação do legislador em valorizar, dum modo particular, o parecer dos assessores sobre os factos que observarem e os juízos de valor que emitirem, uma vez que a apreciação de tais factos exige conhecimentos que, normalmente, ultrapassam a experiência e a cultura geral dos juízes. Relativamente às consequências da distinção legal entre assessor e técnico, conlui: “Porque nomeado pelo juiz, de que é colaborador directo, o assessor está vinculado à verdade dos factos que apreende e que aprecia ou valoriza, isto é, à verdade dos juízos de valor que emite; mas o técnico, porque nomeado pelas partes, é mais um colaborador destas, uma espécie de mandatário seu. Conclusão que parece resultar também do que dispõe o n.º 4 do art. 156.º-C. É natural, pois, que a perícia do assessor mereça ao juiz uma particular credibilidade e que a perícia do técnico seja acolhida com reserva.”
(26) - Recorde-se que a comunicação de despedimento (com efeitos a partir de 30.04.93) enviada aos trabalhadores referia que “[a] cessação do contrato de trabalho baseia-se no encerramento definitivo da Empresa, decidido em Assembleia Geral de Accionistas de 19 de Fevereiro de 1993”. [146º-A].
(27) - Sobre este enquadramento, e em termos coincidentes com o essencial das considerações que se seguem, vide o Ac. do STJ de 19 de Outubro de 2004, Revista n.º 1788/03, da 4.ª Secção, relatado pelo ora Relator, sumariado em www.stj.pt, Jurisprudência/Sumários de Acórdãos.
(28) - Vide Mário Pinto, Furtado Martins e N. Carvalho, in “Comentário às Leis do Trabalho”, I, pp. 176 e ss. e Abílio Neto, in “Contrato de Trabalho – Notas Práticas”, 15ª edição, p. 253
(29) - Vide Jorge Leite e Coutinho de Almeida (in "Colectânea de Leis do Trabalho", p. 80), Vasco Lobo Xavier (in "Substituição da Empresa Fornecedora de Refeições e Situação Jurídica do Pessoal Utilizado no Local: inaplicabilidade do art.37º da L.C.T.", separata da R.D.E.S.), o Ac. do S.T.J. de 95.5.24 (in Ac. Dout. 408º, p.1384 e ss.), o Ac. do T. Constitucional n.º 392/89 de 17 de Maio, publicado no D.R. II de 89.9.14. e F. de Almeida Henriques (in "Transmissão do estabelecimento e flexibilização das relações de trabalho", Rev. Ordem dos Advogados., ano 61, Abril de 2001, pp. 1008 e ss.). Menezes Cordeiro sustenta que à formulação do art.º 37 presidiu uma lógica predominantemente empresarial, preocupada em salvaguardar a integridade do estabelecimento e a viabilizar a sua subsistência e circulação, embora reconheça que o legislador teve em conta certos valores laborais (in “Manual de Direito do Trabalho”, p 774). O Ac. do STJ de 2007.03.28 (publicado no site da DGSI sob a referência 06S3546) referência uma dúplice justificação do regime jurídico enunciado: por um lado acautelar os interesses do cessionário em receber uma empresa funcionalmente operativa; por outro lado proteger os trabalhadores, garantindo a subsistência dos seus contratos e a manutenção dos seus direitos quando exista uma transferência de estabelecimento.
(30) - Coutinho de Abreu, in “Curso de Direito Comercial”, 1º vol., pp. 213 ss., na tradição de Ferrer Correia.
(31) - Vide Júlio Gomes, in “Direito do Trabalho”, vol I, Coimbra, 2007, p. 810.
(32) - Acórdãos do S.T.J. de 30 de Junho de 1999 (Recurso n.º 390/98), de 9 de Dezembro de 1999 (Recurso n.º 181/99) e de 30 de Outubro de 2002 (Recurso n° 1579/02), todos da 4.ª Secção, sumariados em www.stj.pt, Jurisprudência/Sumários de Acórdãos.
(33) - Vide o Ac. do S.T.J. de 89.4.19 (in BMJ 386/361), de 89.6.22 (in BMJ 388/343), de 94.11.9 (in Ac. Dout. 399º, p.365 e ss.) e de 95.5.24 (in Ac. Dout. 408º, p.1384 e ss.).
(34) - Vide os Acs. do S.T.J. de 90.10.17 (in BMJ 400/480), de 90.11.22 (in BMJ 401/392), o já citado Ac. do S.T.J. de 95.5.24 e o Ac. da Relação de Lisboa de 99.2.24 (in C.J., t. I, p.172).
(35) - Vide Maria do Rosário Palma Ramalho, “Direito do Trabalho”, II, Coimbra, 2005, p. 674
(36) - Vide os citados Acs. do STJ de 27 de Maio de 2004 (Revista n.º 2467/03), de 19 de Outubro de 2004 (Revista n.º 1788/03) e de 29 de Junho de 2005 (Revista n.º 164/05), todos da 4.ª Secção, a propósito de cessão de exploração de uma parte de estabelecimento que constitui uma unidade económica. Já anteriormente o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2000.09.27 decidiu – invocando-se já o critério amplo que a jurisprudência e a doutrina têm vindo a defender na sequência do entendimento do TJ – que é necessário que se mantenha a identidade económica da empresa e a prossecução da respectiva actividade, mesmo que se verifique só a cessão de parte do estabelecimento. Também o Acórdão de 30 de Junho de 1999 (recurso n.º 390/98), decidiu que uma parte da empresa com orçamento próprio, com um espaço próprio e utilização de equipamentos próprios e materiais apenas a ele afectos, tem de se considerar que tem um acentuado grau de autonomia, devendo entender-se como constituindo um estabelecimento próprio. Por seu turno, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2002.10.30 (Revista n.º 1579/02 da 4ª Secção), considerou que por estabelecimento se deve entender “quer a organização afectada ao exercício de um comércio ou indústria”, quer os “conjuntos subalternos”, que correspondem a uma unidade técnica de venda, de produção de bens, ou de fornecimento de serviços, desde que a unidade destacada do estabelecimento global seja dotada de uma autonomia técnico-organizativa própria, constituindo uma unidade produtiva autónoma, com organização específica. Todos estes acórdãos se encontram sumariados em www.stj.pt, Jurisprudência/Sumários de Acórdãos.
(37) - In "Critério e Estrutura do Estabelecimento Comercial", p.717.
(38) - De modo idêntico ao que estabelecia o art.º 1º, n.º 1, al. b) da Directiva n.º 77/187, na redacção que lhe foi conferida pela Directiva n.º 98/50.
(39)- Vide o Ac. do TJCE de 2003.11.20 e a jurisprudência aí citada, publicado na Revista “Sub Judice”, Jan.- Março de 2004, a pp. 163 e ss.
(40) - In “A Jurisprudência Recente do TJ das CE em matéria de transmissão de empresa, estabelecimento, ou parte de estabelecimento- inflexão ou continuidade?” publicado nos Estudos do Instituto do Direito do Trabalho, I, p 493 e “Direito do Trabalho” cit , p. 815 e 821 e ss.
(41) - Ac. Güney-Gorrës e Gul Demir, de 15 de Dezembro de 2005, processos apensos C-232/04 e C-233/04, CJ, 2005, pp. 11237 e ss.
(42)- Ac. TJ de 13 de Setembro de 2007, Proc. C-458/05 (Jouni v. Princess Personal Service GmbH) e na jurisprudência nacional os arestos já citados e o Ac. do STJ de 2008.03.06 (Revista n.º 4386/07, da 4.ª Secção), sumariados em www.stj.pt, Jurisprudência/Sumários de Acórdãos.
(43)- Ac. do TJ de 11 de Março de 1997 (Ayse Süzen), CJ, 1997, p. 1259 e ss
(44)- Disponível na base de dados do ITIJ (www.dgsi.pt) 07S922. No mesmo sentido o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 3 de Maio de 2005, disponível na mesma base sob a referência 05B316.
(45)Acórdão CILFIT, Recueil, 1982, p. 3430.
(46)In “Guia Prático do Reenvio Prejudicial”, p. 31.
(47)Vide o Ac. do STJ de 2003.10.01 (Rev. n.º 4494/02 da 4.ª Secção), sumariado em www.stj.pt, Jurisprudência/Sumários de Acórdãos.
(48)- Vide Coutinho de Abreu, in “Do Abuso do Direito”, Coimbra, 1983, pp. 42 e ss.
(49)- Disponível na base de dados do ITIJ (www.dgsi.pt) 04A3002.
(50) - Disponível na mesma base sob a referência 06B722.