Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
064892
Nº Convencional: JSTJ00004091
Relator: JOÃO MOURA
Descritores: AGRAVO
PODERES DA RELAÇÃO
CONHECIMENTO NO SANEADOR
UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Nº do Documento: SJ197502190648921
Data do Acordão: 02/19/1975
Votação: MAIORIA COM 1 VOT VENC
Referência de Publicação: BMJ Nº 244 ANO 1975, PÁG. 149 - DR IS 1975/03/21, PÁG. 429
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PARA O PLENO.
Decisão: TIRADO ASSENTO.
Indicações Eventuais: ASSENTO DO STJ.
Área Temática: DIR PROC CIV.
Legislação Nacional: CPC67 ARTIGO 753.
CCIV66 ARTIGO 9 N3 ARTIGO 11.
Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃO STJ PROC64408 DE 1973/03/20.
ACÓRDÃO STJ DE 1972/06/30 IN BMJ N218 PAG244.
Sumário :
O artigo 753 do Codigo de Processo Civil não e aplicavel quando o agravo tenha sido interposto do despacho saneador que não pos termo ao processo.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça,em Tribunal Pleno:

Por reputarem o acordão deste Supremo Tribunal, de 20 de Março de 1973, certificado a folhas 17 e seguintes, em oposição com outro ja transitado em julgado, tambem deste mesmo Tribunal, com a data de 30 de Junho de 1972, publicado no Boletim do Ministerio da Justiça, n. 218, pagina 244, os prejudicados com o primeiro dos citados arestos - os menores A, B, C, D e E, todos Strlzwicz Portal, devidamente representados por seu pai F - interpuseram o presente recurso, alegando que a oposição incide sobre a mesma questão fundamental de direito, pois, enquanto que no acordão recorrido se decidiu que o artigo 753 do Codigo de Processo Civil e aplicavel quando o agravo e interposto para a Relação de despacho que não põe termo ao processo, no acordão invocado em oposição, contrariamente, ficou decidido que a aplicação da citada disposição legal, portanto o conhecimento do pedido pelo referido Tribunal, so pode ser tomado, em recurso de agravo, quando a decisão recorrida tiver acabado com a lide, assim sendo uma decisão final.
Os recorridos G e marido rebateram a tese da existencia da invocada oposição, mas esta foi reconhecida por acordão da Secção - folhas 49 -, que ordenou a sequencia dos ulteriores termos do recurso.
E, efectivamente, verifica-se tal oposição, isto e, ha conflito sobre a questão fundamental de direito decidida pelos dois acordãos, os quais foram proferidos no dominio da mesma legislação, e tendo o anterior transitado em julgado. E que, proferidos eles sobre agravo de despachos que não puseram termo a causa, e, portanto, não traduziam decisão final, enquanto que o acordão anterior decidiu que não se pode, exactamente por não se tratar de decisão final, aplicar o preceito excepcional do artigo 753 do Codigo de Processo Civil a despacho que mande prosseguir o processo, o acordão recorrido, reconhecendo que o saneador não conheceu da viabilidade da acção, e assim, não constituia decisão final, resolveu que era de conhecer dessa inviabilidade, como vinha pedido nos articulados e no recurso, e, por isso, confirmou o acordão da Relação que conheceu do merito da causa, absolvendo os reus do pedido, argumentando que "ate por analogia" com o mencionado artigo 753, era licito a Relação conhecer da alegada inviabilidade.
A oposição e, pois, evidente, motivo por que ha que decidir se o citado artigo 753 so e aplicavel, quando o recurso e interposto do despacho saneador que põe termo ao processo, ou se e sempre aplicavel, isto e, mesmo que a decisão decretada no saneador não seja uma decisão final.
E, portanto, posta em causa não so a interpretação da citada disposição legal, mas tambem e no caso de se concluir que a mesma so abrange o recurso de decisões finais, se a sua aplicação analogica sera legitima as decisões que não ponham termo ao processo.
A interpretação da lei tem de respeitar em obdiencia as regras prevenidas no artigo 9 do Codigo Civil e so a elas, as quais se limitam a reconstituição do pensamento legislativo a partir dos textos, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema juridico, as circunstancias em que a lei foi elaborada e as condições especificas do tempo em que e aplicada. Todavia, para se poder considerar na interpretação o pensamento legislativo tem o mesmo de ter um minimo de correspondencia verbal com a letra da lei, ainda que imperfeitamente expresso. Quer dizer, o pensamento legislativo, que não tenha um minimo de correspondencia verbal no texto, não deve ser considerado para efeitos de interpretação, e, porque o citado artigo 753 claramente preceitua "sendo o agravo interposto de decisão final", não teria aquele minimo de correspondencia, antes lhe era absolutamente contrario, o resultado da interpretação que conduzisse a aplicar a mesma disposição a agravos interpostos de decisões não finais. Não ha, portanto, e para o sobredito fim, que fazer, neste caso, a indagação do pensamento legislativo, pois, fosse qual fosse, nunca poderia conduzir ao resultado de contrariar o que esta claramente expresso no artigo 753 do Codigo de Processo Civil, ou seja, de que a mesma disposição abrange apenas as decisões finais.
Fixando-se, como se fixa, desta forma o sentido da lei, não se contraria o elemento do n. 3 do artigo 9 do Codigo Civil; quer dizer, com este sentido presume-se que o legislador consagrou a solução mais acertada. Com efeito, a devolução do julgamento a segunda instancia implica, como e evidente, a abolição dum grau de jurisdição, o que nunca deve ir alem dos casos que a lei consente, isto porque a finalidade do recurso de agravo, traduzida no rapido exame das decisões interlocutorias, não e compativel, por principio geral, com a apreciação e julgamento das questões que põem fim ao processo, com que tal julgamento houvesse sido efectuado no Tribunal de que se recorre, e sem mesmo que as partes tivessem possibilidade de alegar, expondo as razões do direito que dizem existir-lhe. Por isso, a abolição do duplo grau de jurisdição, não deve ir alem dos casos que a lei consente. E, pois, mais acertada a solução que limita a devolução so ao agravo das decisões finais, cujo objectivo e o da celeridade e economia processual, assim evitando que o processo baixe a primeira instancia, quando a Relação encontre no processo os elementos necessarios a decisão de fundo.
Todavia, tal objectivo, que sem duvida diminui as garantias processuais, tem de ser considerado como excepcional, pois que o principio geral e o da existencia de dois graus de jurisdição que melhor garante os direitos dos litigantes.
Ora, tanto basta para concluir que a disposição do artigo 753 do Codigo de Processo Civil e excepcional e que, portanto, nos termos do artigo 11 do Codigo Civil, não pode ser aplicada por analogia.
Nestes termos, concedendo provimento ao recurso, revogam o acordão recorrido e determinam que a primeira instancia conheça do pedido formulado na acção.
E, em consequencia, tiram o seguinte assento:
"O artigo 753 do Codigo de Processo Civil não e aplivavel, quando o agravo tenha sido interposto do despacho saneador que não pos termo ao processo".
Custas pelos recorridos.


Lisboa, 19 de Fevereiro de 1975.


João Moura (Relator) - Eduardo Arala Chaves - Bruto da Costa - Rodrigues Bastos - Abel de Campos - Manuel Arelo Ferreira Manso - Jose Garcia da Fonseca - Jose Montenegro-
- Albuquerque Bettencourt - Almeida Borges - Oliveira Carvalho - Adriano Vera Jardim - Jose Antonio Fernandes -
- Eduardo Correia Guedes (Vencido por considerar aplicavel por analogia o artigo 753 do Codigo de Processo Civil, visto que se tratava dum caso em que a Relação para suprir a circunstancia do Senhor Juiz da primeira instancia não se ter referido a inviabilidade ou viabilidade da acção para julgar em harmonia com o requerido pelos reus, tinha de apreciar uma questão, e para decidir tinha de dizer porque, que e como quem diz, tinha de declarar o direito aplicavel, e seria perfeitamente curial que desde logo o aplicasse, tal como no caso do artigo 753 citado sucede).