Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
029517
Nº Convencional: JSTJ00004120
Relator: GONÇALVES PEREIRA
Descritores: ATENUAÇÃO EXTRAORDINARIA
SUBSTITUIÇÃO DA PENA DE PRISÃO
FIXAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Nº do Documento: SJ195707230295173
Data do Acordão: 07/23/1957
Votação: MAIORIA COM 3 VOT VENC
Referência de Publicação: DR IºS DE 06-08-1957 ; BMJ 69, 486
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PARA O PLENO
Decisão: FIXADA JURISPRUDÊNCIA
Indicações Eventuais: ASSENTO 3/1957
Área Temática: DIR CRIM - TEORIA GERAL.
Legislação Nacional: DL 39688 DE 1954/06/05.
CP886 ARTIGO 55 N4 N5 ARTIGO 94 N2 N4.
D 1 DE 1892/09/15 ARTIGO 22.
Jurisprudência Nacional: ASSENTO STJ DE 1943/06/25.
ACÓRDÃO STJ DE 1955/11/16 IN BMJ N52 PAG424.
ASSENTO STJ DE 1952/05/20.
ACÓRDÃO STJ DE 1956/07/24 IN BMJ N59 PAG463.
Sumário :
O uso da faculdade concedida pelo n. 2 do artigo 94 do Codigo Penal e compativel com o do seu n. 4.
Decisão Texto Integral: Acordam, os do Supremo Tribunal de Justiça, em Tribunal Pleno:

Na 3 vara do Porto, foi julgado pelo crime de quebra fraudulenta - A - identificado nos autos, sendo condenado, para o que o tribunal usou da faculdade do artigo 94 do Codigo Penal, na pena de um ano de prisão, tres meses de multa a razão de 10 escudos por dia, no imposto de justiça minimo e no pagamento de 500 escudos ao seu defensor oficioso.
Desta decisão recorreu o arguido e a Relação do Porto, por seu acordão de folhas 255, substituiu-lhe a pena de um ano de prisão, por igual tempo de multa a razão de 15 escudos por dia e alterou o quantitativo da multa de tres meses para 30 escudos diarios, confirmando-a no restante.
Deste acordão, mas so da parte que substituiu a pena de prisão por multa, recorreu o Ministerio Publico para este Supemo Tribunal de Justiça, pois entendo que o n. 4 daquele artigo 94 na nova redacção do Decreto-Lei n. 39688, de 5 de Junho de 1954, não autoriza essa substituição, por se referir a pena de prisão correspondente ao crime praticado.
Este Supremo Tribunal de Justiça, por seu acordão de folhas 293, decidiu que não são incompativeis, e antes podem aplicar-se cumulativamente, os poderes extraordinarios conferidos aos juizes pelos ns. 2 e 4 do artigo 94 do Codigo Penal, actualizados pelo Decreto-Lei n. 39688 e, por isso, tendo em atenção as atenuantes a favor do arguido e a não existencia de qualquer agravante, confirmou o decidido pela Relação.
Como este acordão esta em oposição, sob o mesmo ponto de direito e no dominio da mesma legislação com o acordão deste Supremo Tribunal de Justiça, de 16 de Novembro de 1955, publicado no Boletim do Ministerio da Justiça, n. 52, pagina 424, foi levado recurso pelo Ministerio Publico para o Tribunal Pleno, o qual foi admitido pelo acordão de folhas 311.
Nas suas alegações, o excelentissimo representante do Ministerio Publico junto deste alto tribunal, emite o seu douto parecer, de que deve respeitar-se o acordão recorrido na parte de que se recorreu, lavrando-se assento nesse sentido.
Não houve contra-alegação.
O que tudo visto:
Antes da publicação do Decreto-Lei n. 39 688, de 5 de Junho de 1954, estabelecia o assento de 25 de Junho de 1943 que "o uso da faculdade concedida pelo artigo 94 do Codigo Penal, e compativel com a do artigo 22 do Decreto n. 1, de 15 de Setembro de 1892", isto e, a pena variavel de prisão maior, podia ser substituida por prisão não inferior a 18 meses
- assento de 20 de Maio de 1952 - e esta podia ainda ser substituida por multa - artigo 22 daquele Decreto.
Apos a publicação do Decreto-Lei n. 39688, decidiu o citado acordão deste Supremo Tribunal de Justiça, de 16 de Novembro de 1955, que, apenas a primeira substituição e possivel, podendo descer a prisão ao minimo de um ano, e decidiu agora o acordão recorrido, como se relatou, que são cumulaveis as duas substituições, pelo que ha evidente oposição entre os dois, sob o mesmo ponto de direito e no dominio da mesma legislação.
Salvo sempre o devido respeito, entendemos que a boa doutrina, e a constante do acordão recorrido.
O acordão em contrario de 1955, para firmar a sua doutrina, em face da nova redacção dada aos ns. 2 e 4 do artigo 94 do Codigo Penal, pelo Decreto n. 39688, baseia-se em que: a) O n. 2 do artigo 94, expressamente preceitua que, se podera reduzir a um ano, o minimo da pena do n. 5 do artigo 55 do Codigo Penal, ou substitui-la por prisão não inferior a um ano; b) O n. 4 do mesmo artigo não se refere a substituição da simples prisão, nessas condições, por multa, mas a faculdade que o Tribunal tem de reduzir o minimo especial da pena de prisão, ao seu minimo geral, ao substituir a pena de prisão - mas quando esta corresponda ao crime praticado - pela de desterro ou pela de multa.
Apreciando estes argumentos, verifica-se que o primeiro, nenhuma vantagem traz para a resolução do problema, pois limita-se a conferir aos juizes os mesmos poderes que anteriormente ja tinham; o segundo, teria efectivamente eficacia, se no seu texto estivessem as palavras de que o acordão se serviu para assim decidir "mas, quando esta, (pena) corresponda ao crime praticado"; tais palavras, porem, não estão la e assim o texto deste numero não faz qualquer restrição, não se refere "a pena correspondente ao crime praticado", não distingue entre a pena de prisão que cabe ao crime praticado e a pena de prisão que resulta da substituição da pena maior que caiba ao crime praticado. E onde a lei não distingue, não pode o interprete distinguir.
Os poderes que ali se atribuem aos Juizes, quanto a substituição da pena de prisão correccional pela pena de multa, são genericos, talqualmente acontecia com o artigo 22 do Decreto de 1892, que o novo Decreto n. 39688 vem tornar insubsistente.
Nenhuma disposição da lei nova, a nosso ver, existe que possa fazer mudar a doutrina do assento de 1943, que deve considerar-se revogado, em virtude de ter sido alterada a letra dos textos por ele interpretados.
Mas, como bem diz o digno magistrado recorrente,
"esta conclusão, alias exacta, funda-se apenas numa razão de tecnica juridica. A razão de decidir, a essencia do problema, não foram modificadas em coisa alguma por esse diploma e antes ele e favoravel a doutrina do assento, pois ampliou os poderes atribuidos aos Juizes, para que possa ser levada a efeito a individualização das penas e e assim que permite a redução de prisão maior temporaria ate um ano, a substituição da prisão maior temporaria por um ano de prisão correccional, a substituição da pena fixa da suspensão dos direitos politicos, etc".
"Acresce ainda que, conhecendo o legislador de 1954, a doutrina do Supremo Tribunal de Justiça de permitir o uso simultaneo das duas substituições, certamente, se quisesse por termo a essa pratica, te-lo-ia feito expressamente ao actualizar o artigo 94".
"E sendo certo, que a tendencia dominante no direito penal e no sentido de maior maleabilidade no sistema da aplicação das penas, que tem de adaptar-se a personalidade do delinquente e de harmonizar-se com a infinita variedade das circunstancias peculiares a cada um dos casos concretos, não e de admitir um sistema penal de caracter rigido" como se adoptou no acordão de 1955.
Por estas razões, confirmando o acordão recorrido, formulam o seguinte assento:
"O uso da faculdade concedida pelo n. 2 do artigo
94 do Codigo Penal, e compativel com o do seu n. 4".

Não ha lugar a imposto.

Lisboa, 23 de Julho de 1957

A. Gonçalves Pereira (Relator) - Mario Cardoso
A. Baltasar Pereira - Lencastre da Veiga - Agostinho Fontes - A. Sampaio Duarte - Sousa Carvalho - Eduardo Coimbra - Carlos Saavedra - Lopes Cardoso - Sousa Pinto - Julio M. de Lemos (Vencido por entender que a faculdade consignada nos ns. 2 e 4 do artigo 94 do Codigo Penal, não e de usar simultaneamente, pois que, conhecendo o legislador a doutrina do assento de
25 de Julho de 1943, se quisesse que esta subsistisse outra orientação teria seguido, e não teria indicado para cada uma das especies mencionadas nos diferentes numeros do artigo 94 maneira propria de usar dessa faculdade; e, se não entendesse que por esse modo as duvidas que antes se levantaram se achavam suficientemente esclarecidas, certamente com mais clareza se teria exprimido) - Piedade Rebelo (Vencido por entender que as penas cuja substituição e autorizada pelo artigo 94 do Codigo Penal, são somente as penas aplicaveis a cada tipo legal, isto e, as penas em abstracto) - Perestrelo Botelheiro (Vencido pelos mesmos fundamentos).