Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
98P894
Nº Convencional: JSTJ00034902
Relator: ANDRADE SARAIVA
Descritores: INTERNAMENTO DE INIMPUTÁVEL
MEDIDA DE SEGURANÇA
PERIGOSIDADE
PRAZO
Nº do Documento: SJ199810280008943
Data do Acordão: 10/28/1998
Votação: UNANIMIDADE
Referência de Publicação: BMJ N480 ANO1998 PAG99
Tribunal Recurso: T CIRC PAREDES
Processo no Tribunal Recurso: 57/97
Data: 03/18/1998
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC PENAL.
Decisão: PROVIDO.
Área Temática: DIR CRIM - TEORIA GERAL.
Legislação Nacional: CONST97 ARTIGO 32.
CP95 ARTIGO 92.
Sumário : I - Sendo o internamento de inimputável um meio de tratamento a que o internado vai ser submetido deveria ele, em tese, cessar apenas quando se alcançasse cessada a perigosidade criminal que lhe deu origem; contudo, o legislador fixou como regra um prazo máximo de internamento, findo o qual o internado tem de ser posto em liberdade tenha ou não cessado o estado de perigosidade criminal (artigo 32, da Constituição da República Portuguesa).
II - Atento o disposto no n. 2 do artigo 92, do CP, o prazo máximo de internamento não pode exceder o limite máximo da pena correspondente ao tipo do crime cometido pelo inimputável.
III - Tendo o arguido inimputável cometido vários crimes, deve entender-se que o internamento não pode exceder o limite máximo da pena correspondente ao crime mais grave cometido.
Decisão Texto Integral: Acordam os juízes que compõem a secção criminal do Supremo Tribunal de Justiça:
No processo comum colectivo 57/97, do Tribunal de Círculo de Paredes, por douto acórdão proferido em 18 de Março de 1998, o Tribunal Colectivo decidiu: a) julgar a acusação parcialmente improcedente, por não provada no que se refere aos factos imputados ao Arguido, A, solteiro, desempregado, nascido a 12 de Novembro de 1976, em Ribeiro, Eiriz, Paços de Ferreira, alegadamente ocorridos a 24 de Setembro de 1996, na parte em que se lhe atribui a apropriação de um vale para pagamento de uma reforma no montante de 25160 escudos, bem como dos alegadamente ocorridos de 12 para 13 de Setembro de 1996, relativamente às quantias excedentes às referidas nos pontos 5) a 7) da matéria de facto; b) julgar a acusação parcialmente procedente, por provada na parte restante e, em consequência:
1 - declarar o Arguido A inimputável perigoso;
2 - aplicar-lhe a medida de segurança de internamento em estabelecimento psiquiátrico de vigilância e tratamento, com a duração máxima de quatro anos.
Inconformado interpôs recurso o Ministério Público, que motivou concluindo:
1 - recorre-se do douto acórdão do Tribunal de Círculo de Paredes, proferido a 18 de Março de 1998 nos autos com processo comum criminal em epígrafe, constante de folhas 193 a 214;
2 - aí, além do mais, impôs-se ao Arguido A a medida de segurança de internamento em estabelecimento psiquiátrico de vigilância e tratamento com a duração máxima de quatro anos;
3 - tal reacção foi tirada com relação à prática de oito factos ilícitos típicos enquadráveis na previsão do furto, sendo três com referência aos artigos 203, n. 1 e 204, n. 1 alínea f), dois aos artigos 203, n. 1, 204, n. 2, alínea e) e 202 alínea f), um aos artigos 203, n. 1 e 204, ns. 1 alínea f) e 4, um aos artigos 203, n. 1, 204,, ns. 2 alínea e) e 4 e 202 alínea f) e, finalmente, um aos artigos 203, n. 1, 204, ns. 2 alínea e) e 4 e 202 alínea d), todos do Código Penal na versão do Decreto-Lei 48/95, de 15 de Março;
4 - só não concordamos com o deliberado acerca da fixação da duração máxima da medida de Segurança; por isso que a tanto limitamos o recurso, conforme o consentido pelo artigo 403, n. 1 do Código de Processo Penal;
5 - o recurso é restrito à matéria de direito - artigo 433 do Código de Processo Penal;
6 - inexistem vícios dos enumerados no artigo 410, n. 2 do Código de Processo Penal e não se detecta nulidade insanável (n. 3 do preceito); a matéria de facto apurada em 1. instância está, por isso, definitivamente fixada;
7 - resultando dos factos provados que o A é inimputável em razão de anomalia psíquica - artigo 20, n. 1 do Código Penal - e que, em consequência, oferece probabilidade séria de repetição de actos da mesma espécie dos praticados, bem se justifica que se lhe imponha uma medida de segurança da natureza da que lhe foi determinada no douto acórdão recorrido - artigo 91, n. 1 do Código Penal;
8 - todavia, a tal medida deveria ter sido fixada a duração máxima abastracta (legal) de oito anos - que é o limite máximo da pena de prisão correspondente ao mais grave dos tipos de crime praticados pelo Arguido, o de furto qualificado, previsto e punido pelos artigos 203, n. 1 e 204, n. 2 alínea e) do Código Penal, conforme o imposto pelo artigo 12, n. 2 do Código Penal;
9 - deliberando como deliberaram - fixando, primeiramente, oito medidas de segurança parcelares (uma para cada facto ilícito típico) e, apurando, depois, a medida unitária com quatro anos de duração máxima;
10 - levaram os Meritíssimos Juizes a quo em linha de conta considerações atinentes à culpa - que aqui não têm cabimento - e esqueceram as relativas à prevenção especial - que aqui avultam - e à função legalmente reservada ao Tribunal de Execução de Penas;
11 - desse modo, violaram os normativos dos artigos 92, n. 2 e 77 do Código Penal, 501 a 506 do Código de Processo Penal, por erro de interpretação (todos) e de aplicação (os dois primeiros);
12 - o douto acórdão recorrido carece, de ser reformado mas apenas no ponto em que curou da indicação do limite máximo da medida de segurança - devendo esse doutíssimo Tribunal determinar que ela tenha a duração máxima (abstracta) de 8 anos - mas confirmado em tudo o mais.
Deve ser provido o recurso, e o douto acórdão recorrido ser revogado e substituído conforme o pretendido nas conclusões 4, 8 e 12.
O recurso foi admitido para subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito suspensivo.
Não houve resposta.
A Excelentíssima Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto parecer.
Após exame preliminar, foram colhidos os vistos e, realizada a audiência, cumpre decidir.
Factos provados pelo Tribunal Colectivo
1 - no dia 11 de Agosto de 1996, cerca das 16 horas, o A dirigiu-se à residência de B, sita em, Paços de Ferreira;
2 - aí chegado, abriu a porta daquela residência, que não estava fechada à chave, por ali entrou no seu interior e dirigiu-se ao quarto de dormir do ofendido;
3 - dali retirou a quantia de 80000 escudos em notas do Banco de Portugal, pertencente àquele B e que se encontrava no interior de uma gaveta da mesinha de cabeceira;
4 - aquela quantia em dinheiro foi mais tarde recuperada pela G.N.R. de Paços de Ferreira que a devolveu ao seu legítimo dono;
5 - na noite de 12 para 13 de Setembro de 1996, o A dirigiu-se ao estabelecimento de cabeleireira pertencente a C, sito em Paços de Ferreira;
6 - aí o A, aproveitando-se da circunstância de a porta de entrada daquele estabelecimento se encontrar entreaberta, entrou no mesmo;
7 - de seguida rebentou com o fecho de uma gaveta de um móvel ali existente e do seu interior retirou a quantia de 4000 escudos em notas do Banco de Portugal e cerca de 1000 escudos em moedas, pertencente àquele C, que integrou no seu património, gastando-a em proveito próprio;
8 - no dia 20 de Setembro de 1996, cerca das 16 horas, o A dirigiu-se à residência de D, sita em Paços de Ferreira, com intenção de nela se introduzir e se apropriar de objectos de valor que ali se encontrassem;
9 - ali chegado, introduziu-se numa cozinha anexa àquela residência, através da porta que estava fechada mas não trancada e apoderou-se da chave da residência acima referida, a qual se encontrava sobre um armário ali existente;
10 - na posse daquela chave, o A dirigiu-se para a residência mencionada em 8, usou aquela chave para abrir a porta e por ali entrou na mesma;
11 - já no seu interior o A dirigiu-se ao quarto de dormir do ofendido D e dali retirou a quantia de 80000 escudos em notas do Banco de Portugal, pertencente àquele ofendido e que se encontrava guardada dentro de uma cómoda;
12 - daquela quantia foram recuperados, pelo comandante da G.N.R. de Paços de Ferreira, 75000 escudos;
13 - em data indeterminada do mês de Junho de 1996, durante o dia, o A introduziu-se, através de uma porta que dava para o exterior e que se encontrava aberta, no quarto de dormir de E, parte integrante da sua residência, sita em Paços de Ferreira;
14 - dali o A apoderou-se de um porta moedas que se encontrava sobre uma mesa ali existente;
15 - esse porta moedas que era pertença da ofendida E continha a quantia de 15000 escudos em notas do Banco de Portugal, pertencente à mesma ofendida, que foi gasta pelo Arguido em seu proveito próprio;
16 - no dia 24 de Setembro de 1996, cerca das 15 horas, o A dirigiu-se novamente à residência da ofendida E;
17 - com a ajuda de uma chave, não própria daquela residência, mas que o Arguido trazia consigo, abriu a porta que dá acesso ao interior daquela residência e nela se introduziu;
18 - dali apoderou-se de quantia em dinheiro de 1000 escudos, pertencente à ofendida E e que se encontrava guardada dentro da gaveta de uma cómoda;
19 - quando o A ainda se encontrava dentro daquela residência, foi surpreendido pela ofendida e por uma sua irmã, mas conseguiu pôr-se em fuga;
20 - no dia 10 de Outubro de 1996, cerca das 15 horas e 30 minutos, o A dirigiu-se à residência do ofendido F, com intenção de na mesma se introduzir e se apropriar de objectos de valor que ali encontrasse;
21 - ali chegado, o Arguido retirou do bolso de um casaco, pertencente ao ofendido e que se encontrava pendurado numa escada existente no exterior, a chave da porta daquela residência;
22 - na posse desta chave o Arguido abriu a porta da residência e por ali entrou numa loja anexa ao quarto ocupado pelo ofendido;
23 - no quarto deste ofendido, o Arguido retirou de uma gaveta do guarda-fatos um envelope que continha a quantia de 25000 escudos, pertencente ao F, a qual gastou em proveito próprio;
24 - no dia 11 de Novembro de 1996, cerca das 12 horas, o A dirigiu-se à residência de G, sita em Paços de Ferreira, com intenção de nela se introduzir e se apropriar de objectos de valor que aí existissem;
25 - quando ali chegou, o A apercebeu-se que a esposa do Arguido se encontrava a trabalhar num tanque existente junto da sua residência e então entrou na cozinha, através da porta que estava fechada, mas não trancada e, após entrar nesta, dirigiu-se a um dos quartos e escondeu-se de baixo de uma cama;
26 - ali esperou que a esposa do ofendido saísse para o trabalho, o que aconteceu ao fim de cerca de duas horas depois de o Arguido ali ter entrado e quando ficou sozinho dirigiu-se a uma cómoda existente naquele quarto e das gavetas retirou a quantia de 225000 escudos em notas do Banco Portugal e uma pistola, no valor de 15000 escudos, pertencentes ao ofendido G, que integrou no seu património;
27 - na posse daquela arma o A vendeu-a a H, pelo preço de 2000 escudos, a qual já foi recuperada pelo seu legítimo dono;
28 - na noite de 19 para 20 de Novembro de 1996, a hora indeterminada, o A dirigiu-se para junto das instalações do Banco Melo, sito na cidade de Paços de Ferreira, com intenção de se introduzir nas mesmas e daí se apropriar dos valores ali existentes;
29 - então forçou o fecho de uma das janelas que dá para a rua Antero Chaves e abriu-a;
30 - por ali entrou nas referidas instalações bancárias, dirigiu-se para a zona das caixas e de uma delas retirou 6000 escudos em notas do Banco de Portugal;
31 - quando retirou aquelas notas, que estavam presas por uma mola, accionou o alarme o que o levou a pôr-se em fuga;
32 - o Arguido sabia que todas as quantias, o porta moedas e a pistola que retirou não lhe pertenciam e quis fazê-las suas mesmo contra a vontade dos seus donos;
33 - desde a adolescência o arguido vem apresentando um tipo de comportamento profundamente desajustado;
34 - ainda criança habituou-se a furtar dinheiro à família e vizinhos, conduta que tem mantido e aprofundado através do tempo;
35 - o A já esteve internado no Instituto Navarro de Paiva, até finais de 1994, onde lhe foi diagnosticada uma Esquizofrenia;
36 - o Arguido apresenta: a) Q.I. verbal ................. 69% b) Q.I. execução ............... 61% c) Q.I. global ................. 64% d) nível intelectual ........... atraso mental ligeiro e) deterioração ................ sem significado
37 - o Arguido apresenta um "distúrbio anti-social da personalidade com possível esquizofrenia simples associada";
38 - por outro lado a patologia detectada é marcadamente limitativa da capacidade de discernimento do Arguido;
39 - o delito cometido insere-se numa expressão comportamental do distúrbio psicopatológico detectado, permitindo assim estabelecer uma relação de causalidade doença/crime;
40 - verifica-se todo um circunstancionalismo susceptível de evidenciar a probabilidade do examinando poder vir a cometer outros graves ilícitos, havendo a necessidade do Arguido ser submetido a tratamento psiquiátrico prolongado;
41 - tendo sido proposto no relatório de exame pericial junto a folhas 82 e seguintes, que o Arguido fosse considerado inimputável perigoso e mandado internar em estabelecimento psiquiátrico de vigilância e tratamento.
Factos não provados:
Não se provaram outros factos com relevo para a causa, para além do que antecede e, nomeadamente: no circunstancionalismo descrito sob o n. 7, a quantia que o Arguido retirou da gaveta do móvel existente no salão de cabeleireira, fosse de valor superior a 5000 escudos; no dia 24 de Setembro de 1996, quando entrou na residência da ofendida E, o Arguido, para além da quantia de 1000 escudos em notas do Banco de Portugal, tivesse também retirado um vale para pagamento da reforma desta ofendida, no valor de 25160 escudos; no dia 4 de Outubro de 1996, o Arguido tivesse voltado a colocar o referido vale em casa da ofendida E.
O recurso interposto para o Supremo Tribunal de Justiça visa, sem prejuízo do disposto nos ns. 2 e 3 do artigo 410 do Código de Processo Penal, exclusivamente o reexame de matéria de direito.
A delimitação do âmbito do recurso é feita pelas conclusões da motivação do recorrente, não podendo o tribunal de recurso conhecer de matéria nelas não inserida, salvo se o seu conhecimento for oficioso.
Questão a resolver:
Duração máxima da medida de segurança - oito anos e não os quatro aplicados.
O Tribunal Colectivo declarou o Arguido A inimputável perigoso e aplicou-lhe a medida de segurança de internamento em estabelecimento psiquiátrico de vigilância e tratamento com a duração máxima de quatro anos.
O mesmo Tribunal Colectivo considerou que o Arguido cometeu os seguintes crimes:
1 - um de furto qualificado dos artigos 203, n. 1 e 204, n. 1 alínea f), cometido em 11 de Agosto de 1996, punível com a pena de prisão até cinco anos ou com pena de multa até seiscentos dias, do Código Penal de 1995;
2 - um de furto simples dos artigos 203, n. 1, 204, ns. 1 alínea f) e 4 do Código Penal de 1995, praticados em 12/13 de Setembro de 1996, punível com a pena da prisão até três anos ou com pena de multa;
3 - um de furto qualificado dos artigos 203, n. 1 e 204, n. 2 alínea e) e 202 alínea f) do código Penal de 1995, praticado em 20 de Setembro de 1996, punível com a pena de prisão de dois a oito anos;
4 - um de furto simples dos artigos 202 alínea f), 203 n. 1 e 204, ns. 2 alínea e) e 4 do Código Penal de 1995, praticado em 24 de Setembro de 1996, punível com a pena de prisão até três anos ou com pena de multa;
5 - um de furto qualificado dos artigos 203 e 204, n. 1 alínea f) do Código Penal de 1995, praticado em data indeterminada de Junho de 1996, punível com pena de prisão até 5 anos ou com pena de multa até 600 dias;
6 - um de furto qualificado dos artigos 203, n. 1 e 204, n. 2 alínea e) e 202 alínea f) do Código Penal de 1995, praticado em 10 de Outubro de 1996, punível com a pena de prisão de 2 a 8 anos;
7 - um de furto qualificado dos artigos 203, n. 1 e 204, n. 1 alínea f) do Código Penal de 1995, praticado em 11 de Novembro de 1996, punível com a pena de prisão até cinco anos ou com pena de multa até 600 dias;
8 - um de furto simples dos artigos 203, n. 1, 202 alínea d) e 204, ns. 2 alínea e) e 4 do Código Penal de 1995, praticado em 19/20 de Novembro de 1996, punível com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa.
Tendo sido dado como provado verificar-se, em relação ao Arguido, inimputável perigoso, todo um circunstancionalismo susceptível de evidenciar a probabilidade de poder vir a cometer outros graves ilícitos, nos termos do artigo 91, n. 1 do Código Penal de 1995 bem andou o Tribunal Colectivo em aplicar-lhe a medida de segurança de internamento em estabelecimento psiquiátrico de vigilância e tratamento.
O Tribunal Colectivo fixou uma medida de segurança para cada um dos oito crimes - um ano - e depois aplicou uma medida única de quatro anos de duração máxima.
Salvo o disposto no n. 2 do artigo 91 do Código Penal - não aplicável ao caso dos autos, pois não estamos perante crime contra as pessoas ou crime de perigo comum puníveis com pena de prisão superior a 5 anos - o limite mínimo do internamento não está fixado na lei penal - artigos 91 e seguintes do Código Penal.
O internamento cessa quando o Tribunal de Execução das Penas verificar que findou o estado de perigosidade criminal que lhe deu origem.
A revisão da situação do internado pode ser apreciada a todo o tempo se for invocada a existência de causa justificativa da cessação do internamento, sendo-o obrigatoriamente decorridos dois anos sobre o início do internamento ou sobre a decisão que o tiver mantido.
A lei fixa no entanto o prazo máximo do internamento, e o critério é o limite máximo da pena correspondente ao tipo do crime cometido pelo inimputável - n. 2 do artigo 92 do Código Penal, só excepcionalmente funcionando a prorrogação do internamento por períodos sucessivos de 2 anos até se verificar que cessou o estado de perigosidade criminal que lhe deu origem - n. 3 do artigo 92 do Código Penal.
Do descrito resulta que a fixação do prazo máximo de internamento efectuada pelo Tribunal Colectivo não se pode aceitar, pois viola o disposto no n. 2 do artigo 92 do Código Penal.
Como se referiu já o prazo máximo do internamento corresponde ao limite máximo da pena correspondente ao tipo de crime cometido pelo inimputável, referindo-se pois a pena abstracta.
Apesar de haver um concurso de crimes cometidos pelo inimputável não pode o período máximo de internamento ser determinado de acordo com a punição do concurso, em primeiro lugar porque o Código Penal no seu artigo 77 só prevê o cúmulo de penas parcelares concretas e que sejam ou de prisão e ou de multa, e por outro não pode socorrer-se da analogia para o efectivar - n. 3 do artigo 1 do Código Penal.
O internamento de inimputável perigoso tem em vista por um lado livrar a comunidade da presença dum cidadão que em perigo põe a mesma por não se comportar de acordo com os valores éticos, morais e sociais da mesma, mas por outro e o mais relevante fazer cessar no internado o estado de perigosidade criminal que deu origem ao internamento, fazendo regressar ao convívio da comunidade um cidadão apto a respeitar os direitos dela.
Sendo o internamento um tratamento a que o internado vai ser submetido aquele só deveria terminar quando a perigosidade criminal que lhe deu origem tivesse cessado, mas o legislador fixou, como regra, um prazo máximo de internamento, findo o qual o internado tem de ser posto em liberdade tenha ou não cessado o estado de perigosidade criminal que lhe deu origem, e isto em obediência ao princípio constitucional consignado no artigo 32 da Constituição da República Portuguesa.
Qual o prazo máximo do internamento?
Segundo o n. 2 do artigo 92 do Código Penal corresponde ao limite máximo da pena correspondente ao tipo de crime cometido pelo inimputável. Ora o Arguido cometeu oito crimes de furto, uns simples e outros qualificados e, por isso, entende-se que o internamento não pode exceder o limite máximo da pena correspondente ao crime mais grave do tipo cometido pelo inimputável, ou seja, o prazo de oito anos.
Conclusão
Concede-se provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público e, em consequência, revoga-se o douto acórdão recorrido quanto à duração máxima da medida de segurança de internamento em estabelecimento psiquiátrico de vigilância e tratamento, que se fixa em oito anos.
Sem tributação.
Fixam-se em 10000 escudos os honorários a favor da douta defensora oficiosa nomeada em audiência ao Arguido, a suportar pelos Cofres do Ministério da Justiça.
Lisboa, 28 de Outubro de 1998.
Andrade Saraiva,
Augusto Alves,
Armando Leandro,
Martins Ramires. (Vencido por entender não haver um fixar em concreto, no acórdão, a duração de internamento - conforme também Professor Doutor
Figueiredo Dias, "As consequências jurídicas do crime", página 475 - e, havendo concurso real ou ideal de crimes, é minha opinião que o limite máximo de duração da medida de segurança de internamento corresponde ao limite máximo da pena determinada nos termos do artigo
77 - n. 2 do Código Penal).
Tribunal de Círculo de Paredes - Processo n. 57/97.
Relação - 5. Secção - Acórdão 20 de Novembro de 1996.