Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
1644/20.0T8BRR.L1.S1
Nº Convencional: 4.ª SECÇÃO
Relator: DOMINGOS JOSÉ DE MORAIS
Descritores: NULIDADE DE ACÓRDÃO
TRANSMISSÃO DE ESTABELECIMENTO
ATIVIDADE DE SEGURANÇA PRIVADA
Data do Acordão: 03/08/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA A REVISTA.
Sumário :

I - A contradição geradora de nulidade prevista no artigo 615º, nº 1, al. c) do CPC verifica-se quando os fundamentos aduzidos pelo Juiz conduziriam necessariamente a uma decisão de sentido oposto ou, pelo menos, de sentido diferente.


II - Para que se verifique transmissão do estabelecimento para efeitos do disposto no artigo 285.º do CT, é essencial que o negócio ou atividade transmitida constitua uma unidade económica autónoma na esfera do transmitente.


III - Inexiste transmissão de estabelecimento quando uma empresa deixa de prestar serviços de vigilância e segurança junto de determinado cliente, na sequência de adjudicação, por este, de tais serviços de vigilância a outra empresa, sem que se tivesse verificado a assunção de qualquer trabalhador da anterior empresa e tão pouco qualquer transferência de bens ou equipamentos de prossecução da actividade susceptível de consubstanciar uma “unidade económica” do estabelecimento.

Decisão Texto Integral:

Processo n.º 1644/20.0T8BRR.L1.S1


Origem: Tribunal Relação Lisboa


Recurso de revista


Relator: Conselheiro Domingos Morais


Adjuntos: Conselheiro Mário Belo Morgado


Conselheiro Júlio Gomes


Acordam os Juízes na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça


I.Relatório


1. - AA intentou acção de processo comum, contra


Securitas - Serviços e Tecnologia de Segurança, S.A. e


PSG - Segurança Privada, alegando, em resumo, que:


As Rés são ambas sociedades comerciais que se dedicam, nomeadamente, à actividade de segurança privada, e ocasionam, por vezes, situações de sucessão de prestação de serviços no mesmo cliente;


A Autora trabalhou como vigilante desde ... de ... de 1994, primeiro para a primeira Ré, desempenhando, ultimamente, as suas funções no cliente sito no ...; até ... de ... de 2019 a empreitada foi explorada pela Ré Securitas, tendo a Ré PSG obtido a empreitada do seu local de trabalho com efeitos a ... de ... de 2020; embora lhe tenha sido transmitido pela Ré Securitas que o seu contrato de trabalho se transmitiria para a nova adjudicatária, nenhuma das Rés a aceitou como trabalhadora; a falta de disponibilidade para a receber redunda num despedimento ilícito.


Terminou, pedindo:


a) Declarar-se que o despedimento da A. foi ilícito, e consequentemente, condenar-se as RR, em regime de responsabilidade solidária;


b) Pagar à A. a quantia já vencida de €35 670, 27 (trinta e cinco mil, seiscentos e setenta euros e 27 cêntimos) a título de indemnização por danos não patrimoniais, (€4 000); a título de indemnização de antiguidade (€ 28 435,16), a título de férias e de subsídio de férias, vencidas em ........2020 (€1 438,00); a título de partes proporcionais de férias, subsídio de férias e 13º mês relativas a 2...; a título de prestação referentes aos trinta dias antecedentes ao ajuizamento da presente acção;


c) Pagar à A. as prestações vincendas atá à decisão final;


d) Pagar à A. juros de mora a partir da citação.


2. - As Rés contestaram, pedindo a sua absolvição do pedido.


3. - Na 1.ª instância foi decidido:


1. Absolver a Ré PSG – Segurança Privada, S.A. do pedido;


2. Declarar ilícito o despedimento que a Autora foi alvo e consequentemente condenar a Ré Securitas - Serviços e Tecnologia de Segurança, S.A.:


i) A pagar à Autora a quantia de € 18.956,86 a título de indemnização por antiguidade em substituição da reintegração quantia calculada desde o despedimento até à presente data, mas à qual acrescem valores devidos até ao trânsito em julgado da presente decisão;


ii) A pagar à A. a quantia que se vier a liquidar em execução de sentença a título de compensação pelo despedimento ilícito, correspondente às retribuições que deixou de auferir, quantia calculada desde 30 dias antes da entrada da ação– .../.../2020 acrescida das quantias que se vencerem a este título até ao trânsito em julgado da presente sentença, às quais acrescem os juros legais desde a data da citação até efetivo e integral pagamento, e descontadas as quantias auferidas a título de subsídio de desemprego ou a outro título legalmente estabelecidas no art. 390º nº 2 do CT


iii) Condenar a Ré a pagar à Autora a quantia de € 1.458,22 a título de férias e subsídio de férias que se venceriam 1 de janeiro de 2020.


iv) Juros de mora vencidos desde a data do vencimento de cada prestação e os vincendos até integral pagamento;


3. Absolver a Ré do mais peticionado.”


4. - A 1.ª Ré Securitas apelou e o Tribunal da Relação acordou:


“julgar procedente o recurso de apelação interposto por Securitas - Serviços e Tecnologia de Segurança, S.A., revogando-se a sentença recorrida, e, em consequência,


l. Declara-se que o contrato de trabalho da Autora se transmitiu, por força da transmissão parcial do estabelecimento, para a Ré, PSG -Segurança Privada.


2. Que ocorreu o despedimento ilícito da Autora.


3. A condenação da Ré, PSG - Segurança Privada, a pagar à Autora as quantias referidas no ponto 2. i), ii), iii) e iv) do dispositivo da sentença.


4. Absolve-se a Ré, Securitas - Serviços e Tecnologia de Segurança, S.A., do pedido.”


5. - A Ré PSG interpôs recurso de revista, concluindo, em síntese, que:


d. analisada a matéria de facto e os fundamentos jurídicos que entende o julgador mobilizar, era
razoavelmente expectável que a decisão seria em sentido oposto, nomeadamente pela não
verificação, no caso concreto, dos pressupostos do artigo 285.º do CT.



f. o acórdão recorrido viola a sua própria jurisprudência e entendimento reiteradamente assumido, em processos com as mesmas Rés e referentes à mesma situação da contratação pública do “G.... ........., designadamente através dos acórdãos proferidos nos processos n.ºs 5319/20.1T8LSB.L1 (de 30 de junho de 2021, com trânsito em julgado), 612/20.6T8BRR.L1 (de 13 de
outubro de 2021, com trânsito em julgado), 802/20.1T8BRR.L1 (de 10 de novembro de 2021, com
trânsito em julgado), 384/20.4T8BRR.l1 (de 27 de abril de 2022, com trânsito em julgado) e
3846/20.0T8SNT.L1 (de 25 de maio de 2022, este último posterior ao acórdão recorrido, pelo que ainda
não transitado em julgado).



g. viola os princípios da segurança jurídica e da confiança, consagrados no artigo 2.º da CRP, o
prolatar de decisões, pela mesma secção do tribunal da relação de lisboa, completamente
díspares quanto a argumentos que têm subjacente factualidade comum, consubstanciando a
manutenção da decisão em recurso, na sequência daqueles acórdãos transitados em julgado, uma
violação da certeza e segurança e das expectativas juridicamente criadas.



l. da conjugação dos factos n.º 16 e 30, conclui-se que a ora recorrente disponibilizou aos trabalhadores, para o exercício de suas funções, equipamentos da sua propriedade, como rádios, chaveiros e lanternas, não estando provado que a ré recorrida teria disponibilizado meios semelhantes, quando prestava serviços de segurança privada naquele local.


m. é impercetível como o douto acórdão em recurso, considerando a matéria de facto fixada, pôde concluir, como fez, que a identidade do posto foi mantida, quando não resulta provado quais as funções que os vigilantes, alocados pela recorrente no posto de trabalho denominado terminal de ..., passaram a exercer, qual era o número de trabalhadores alocados, muito menos se tal foi mantido, bem como não se apurou qualquer especificada ou método de organização inerente àquele posto.


r. a análise jurídica que é efetivamente encetada no acórdão recorrido demonstra-se violadora do disposto no artigo 285.º, n.º 5, do CT, por inerência ao verdadeiro descaso do conceito legal de «unidade económica» e, intrinsecamente, do conceito inerente plasmado no artigo 1.º, n.º 1, alínea b), da diretiva n.º 2001/23/CE.


s. o critério que, primeiramente, se deve aferir, para a asserção da existência de uma unidade económica, nos termos do n.º 5 do artigo 285.º do CT, é o da autonomia, só adicional e consequentemente à aferência de tal conceito, se terá que conceder e aferir dos demais elementos indiciários inerentes à figura de transmissão, por forma a se apurar a sua identidade.


u. no caso em concreto, a subordinação jurídica implícita ao vínculo em querela reveste contornos tão mais exigente face o grau de especificação e de relevância dos serviços prestados e da atividade em causa, que se vê amplamente regulada no regime da segurança privada, que importa fortes condicionalismos, quer á índole pessoal do vigilante, quer face o relacionamento daquele perante a entidade empregadora.


v. atento ao regime legal da segurança privada, não se pode afirmar que os vigilantes têm autonomia técnica, estando impossibilitados de exercer suas funções à margem das diretrizes e estrutura organizativa da própria empresa de segurança privada, em virtude da natureza e orgânica legal da sociedade em si.


y. em nenhum momento se observou, no exercício da prestação dos serviços de segurança privada a favor da adjudicante, uma liberdade e independência do grupo de trabalhadores alocados a prestar funções no posto em referência, no sentido de aqueles poderem, livre e independentemente, alterar o modus operandi do serviço e/ou gerir e organizar o serviço conforme seu entendimento.


z. resulta insofismável que os trabalhadores se vêm absolutamente sujeitos às diretrizes emanadas por parte de outros elementos da organização da entidade empregadora, perante os quais respondem, observando-se uma verdadeira “linha de poder” que se inicia com parte de outra estrutura da organização da sociedade empregadora e culmina na execução praticada pelos vigilantes.


ddd. a factualidade apurada não preenche os requisitos indiciadores da autonomia da entidade económica, condição sine qua non para o reconhecimento da transmissão da titularidade ou da exploração de uma unidade económica, para efeitos de aplicação do regime jurídico consagrado no artigo 285º do CT, nem é apta a configurar uma hipotética identidade ao posto em querela.


eee. a mera sucessão de prestação de serviços em local propriedade da cliente, desacompanhada, como in casu ocorre, de quaisquer outros elementos, não consubstancia, de modo algum, uma transmissão de empresa ou estabelecimento.


6. - A Ré Securitas contra-alegou, concluindo pela improcedência da revista.


7. - O Ministério Público emitiu parecer no sentido da procedência da revista, por considerar que “Verifica-se, assim, e salvo melhor opinião, um mera sucessão da prestação daquele serviço de vigilância e segurança nas instalações do «G.... .........», não existindo indícios que permitam concluir que existiu uma transmissão de estabelecimento para os efeitos do art. 285.º, n.º1, do CT.”.


8. - Cumprido o disposto no artigo 657.º, n.º 2, ex vi do artigo 679.º, ambos do CPC, cumpre apreciar e decidir.


II. - Fundamentação de facto


1. – A 2.ª instância decidiu sobre a matéria de facto:


A - Matéria de Facto Provada


1. - A Autora foi admitida ao serviço da U Ré, em 16 de Junho de 1994, para exercer as funções inerentes à categoria profissional de vigilante.


2. - A Autora cumpria ordens e directrizes da Ré e actuava sob sua directa direcção e autoridade recebendo como contrapartida o salário mensal que ultimamente era de €729,11.


3. - A Autora, estando ao serviço da 1.ª Ré, tinha o seu local de trabalho, desde J...... .. ...., no ....


4. - A Autora, enquanto ao serviço 1.ª Ré, ficou de baixa por doença a partir de ... de ... de 2019, a qual veio a ser renovada, sucessivamente, até à data da alta em 29/01/2020.


5. - Por carta de ...1.../10, a 1.ª Ré comunicou à Autora que terminaria em ... de ... de 2019 o contrato de prestação de serviços celebrado com os clientes T........, SA e S......, SA, tendo o respectivo serviço de vigilância sido adjudicado à PSG -Segurança Privada, SA.


6. - Terminada a baixa, e considerada medicamente apta para o trabalho, em .../.../2020, a Autora dirigiu-se à T........ . ........... ..... .., no ..., para se apresentar ao serviço, no dia 30/01/2020.


7. - Tendo-lhe sido recusada a entrada nas instalações da Empresa.


8. - No dia seguinte, em .../.../2020, pela mesma hora do dia anterior (08H30) voltou a apresentar-se no seu local de trabalho na empresa T........ . ........... ..... .., tendo-lhe sido, novamente, vedada a entrada.


9. - Não foi instaurado qualquer procedimento disciplinar contra a Autora.


10. - O "G.... ........." abriu concurso público para "aquisição de serviços de vigilância e segurança humana", pelo período de 18 meses, com início em 01 de janeiro de 2020.


11. - O concurso incluía os Terminais fluviais da ... e ... em ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ... e ... e nos quais a Ré Securitas tinha colocado vigilantes a prestar serviço.


12. - A proposta do júri, publicada no D.R., 2.ª série, n^ 137, a 19 de julho de 2019, foi a de adjudicação à Ré PSG - Segurança Privada, S.A. de todos os serviços objecto do referido concurso.


13. - A duração do contrato de prestação de serviços objecto da adjudicação foi, nos termos da proposta do júri, para 18 meses com início a 01 de Janeiro de 2020.


14. - Os vigilantes da Ré Securitas que desempenhavam funções no cliente G.... ......... faziam o controlo de acessos aos ..., controlo de passageiros (limite de passageiros, verificação e validação de bilhetes), visitantes e fornecedores, controlo de torniquetes, controlo de parques de estacionamento (reservado à Administração e funcionários da T........ e forças da autoridade), prestavam informações e davam orientação aos utentes que demandavam aqueles terminais, efectuavam relatórios de turnos e prestavam toda a segurança para que quer os funcionários que trabalhavam nas instalações adjudicadas e os utentes o pudessem fazer com tranquilidade bem como a protecção de bens.


15. - As instalações e os meios utilizados pertenciam ao "G.... ........." constituído
pelas empresas T........, S... e S......, S..., nomeadamente, mobiliário (mesa,
secretária, cadeira), telefone fixo, pórticos de acesso e validação de bilhetes,
extintores, e os mesmos passaram a ser utilizados a partir de ........2020 pela PSG
nos mesmos termos em que eram utilizados pela Securitas. -
Alterado conforme
decisão infra.


16. - A Autora usava no desempenho das suas funções, farda da Ré com placa
identificativa, canetas e impressos em papel para registos com o timbre da Securitas.



17. - Cada empresa de segurança tem o seu próprio alvará, modelo de uniforme, bem como distintivos, símbolos e marcas os quais não podem ser utilizados pelas outras empresas.


18. - Não existiu qualquer contrato ou negócio jurídico entre a PSG e a Securitas.


19. - A Ré Securitas comunicou à A. e ao STAD, em ........2019, por cartas registadas com aviso de recepção, a transmissão do seu contrato de trabalho para a PSG -Segurança Privada, S.A. por transmissão da prestação de serviços nos clientes T........ -Transportes Tejo, S.A. e S...... - S........ ....... .. ............ ...., e que a referida transmissão se verificaria em ... de ... de 2020, procedendo a Securitas ao pagamento das retribuições correspondentes aos dias trabalhados até ........2019.


20. - À nova adjudicatária PSG, a Securitas enviou também uma carta registada, com aviso de recepção, em ........2019, a invocar a transmissão do estabelecimento com a relação, em anexo, dos trabalhadores cujos contratos de trabalho se transmitiam para a adquirente, indicando os locais em que prestam a actividade de segurança privada nos clientes, o nome, a data de nascimento, o NIF, o NISS, a morada, a antiguidade contratual, o telemóvel, a categoria profissional, o tipo de contrato de trabalho, a filiação sindical e o número de cartão profissional, a remuneração mensal, o subsídio de férias já pago e férias já gozadas ambos em 2019.


21. - Na mesma data de ........2019, a Securitas enviou à A.. - C..... ..... .. ......... .. ....... a comunicação da transmissão do estabelecimento em causa nos autos.


22. - Por carta de ........2019, a PSG respondeu à carta enviada pela Ré Securitas em ........2019, na qual refere "que não se verificam os critérios inerentes à transmissão de empresa, (...), facto peio qual se nega, expressamente, a transmissão dos trabalhadores em questão."


23. - Dos 30 trabalhadores que constavam da lista enviada à PSG, a Securitas chegou a acordo com os seguintes 11 (onze) trabalhadores, que estavam colocados nos vários ... e ... para serem transferidos para outros estabelecimentos da Securitas: 1 - BB; 2 - CC; 3 - DD; 4 - EE; 5 - FF; 6 - GG; 7 - HH; 8 - II; 9 - JJ; 10 - KK; 11 - LL.


24. - O contrato de trabalho celebrado com o trabalhador MM caducou pela reforma.


25. - A Ré, Securitas, pagou à Autora os valores relativos ao mês de dezembro de 2019.


26. - Nenhuma das R.. lhe atribuiu funções, local de trabalho nem procedeu ao pagamento da retribuição da Autora.


27. - A Ré, PSG, contactou os trabalhadores alocados ao posto propriedade da "T......../S......", por forma a transmitir-lhes que, em face da cessação do contrato entre aqueles e a 1.ª Ré, se encontrava na disponibilidade de contratar os mesmos, caso estes tivessem interesse, mediante a celebração de contrato de trabalho nos termos gerais.


28. - A Ré, PSG, é filiada na Associação Nacional das Empresas de Segurança - AESIRF.


29. - A Ré, PSG, aquando do início da exploração dos postos da cliente, forneceu equipamentos da sua propriedade a favor dos trabalhadores, como rádios, formulários, chaveiros, lanternas, etc. aos trabalhadores, não tendo adquirido/recebido nenhum daqueles por parte da sociedade que explorava o posto em momento antecedente.


30. - Os serviços prestados nos postos em questão pelos trabalhadores que a eles se encontram alocados são ordenados, coordenados, e vigiados pela central da Ré PSG, sita na sede, tendo os trabalhadores a obrigação de dar conhecimento quer ao supervisor, quer à sede, dos registos de entrada e saída, bem como das demais questões que se coloquem no âmbito da prestação de serviço.


B - Matéria de Facto Não Provada


A primeira instância considerou não provado que a A. ficou muito transtornada e psicologicamente afectada, o que lhe causou intenso sofrimento moral e até físico, pois que passou a padecer de insónias severas, obrigando-a a procurar ajuda médica c medicamentosa.


III. – Fundamentação de direito


1. - Do objeto do recurso de revista


- Da nulidade do acórdão, por oposição entre a factualidade provada e a decisão proferida no acórdão recorrido nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alínea c) do CPC; e


- Da (não) transmissão da unidade económica.


2. – Da nulidade do acórdão recorrido


A recorrente entende que o acórdão recorrido encerra uma nulidade por oposição entre os factos dados como provados - n.ºs. 1.º, 3.º e 4.º - e a decisão na parte em que conclui que «Do exposto resulta que a Autora, desde 1..., prestava a sua actividade de vigilância no âmbito de um contrato celebrado entre a Ré Securitas e a T........ . ........... ...., nas mesmas instalações, com os mesmos meios e nos mesmos moldes em que o veio a fazer a Ré P............ ....... a partir de ........2020.».


No acórdão Conferência que conheceu da invocada nulidade, pode ler-se:


“(O) terminal onde a Autora prestava serviço não era o único onde a 1.ª Ré operava, pelo que não ocorre qualquer contradição.


Seja como for, o fundamento do acórdão, não reside no facto de a Autora prestar a sua actividade nas mesmas instalações - que o exercia efectivamente, embora no ... não desde 1994, mas sim noutros locais onde a 1.ª Ré prestava serviço - mas porque existe identidade de unidade económica, o que resulta claramente do acórdão, e essa identidade económica não passa pela identidade do local de trabalho, como também resulta do acórdão.


Assim sendo, cumpre concluir que improcede a arguida nulidade.


Conforme dispõe o artigo 615.º, n.º 1, al. c) do CPC, “É nula a sentença quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão”.


Esta nulidade respeita à estrutura da sentença, não podendo haver “contradição lógica” entre os fundamentos e a decisão, isto é, quando o raciocínio expresso na fundamentação aponta para determinada consequência jurídica e, em vez de a tirar, o tribunal decidir noutro sentido, oposto ou divergente, ainda que juridicamente correcto.


A sentença é nula “oposição com a decisão quando os fundamentos estejam em”, isto é, quando os fundamentos invocados devessem, logicamente, conduzir a uma decisão diferente da que a sentença expressa – cf. Alberto dos Reis, Cód. Proc. Civil anotado, 5.º/141.


Dado que o fundamento do acórdão recorrido assenta na existência de identidade de unidade económica, a qual não passa pela identidade do local de trabalho, propriamente dito, inexiste a nulidade invocada pela recorrente.


3. - Da (não) transmissão da unidade económica.


3.1. - Na sentença da 1.ª Instância foi consignado:


“(…), nada foi alegado, para além da mera sucessão na prestação de serviço, que permita concluir por uma manutenção da mesma unidade económica. Sem prejuízo da provada disponibilidade da Ré PSG em admitir vigilantes da Ré Securitas não foi alegado, nem demonstrado se foram admitidos e em que número.


Por outra via, e ainda que a forma concreta de exploração do serviço (número de vigilantes por postos, horários de cada posto, número de rondas etc.) se mantenha idêntico entre os dois prestadores, a sua definição resultou dos termos contratados com o próprio cliente e não da transmissão ou assunção de know-how.


No que se refere a equipamento transmitido (ainda que não por negócio entre R..) cumpre notar que inexiste equipamento especificamente afeto à operação de segurança que seja transmitido. De facto, os torniquetes, estação da T........, máquinas de bilheteira e demais instalações do cliente são equipamentos da própria atividade do cliente e não da atividade de vigilância humana.


(…).


A mera existência de comunicações da Ré Securitas a dar conta aos trabalhadores da sua transferência é insuficiente para se considerar a transferência de empresa ou estabelecimento.


Não existiu qualquer transmissão de estabelecimento, mas antes uma empresa que ocupava um espaço para prestar um serviço, deixa de o fazer, e passa a estar outra no seu lugar a ocupar esse espaço. Cada uma delas leva os seus equipamentos, materiais, elementos organizados, estrutura financeira, e apenas o espaço físico deixa de ser ocupado por uma para passar a ser ocupada por outro. Inexistindo uma transmissão não pode pretender-se aplicar o art. 285º do CT e ver a posição de entidade empregadora passar para a Ré PSG.


Concluímos assim que a entidade patronal da A. mantinha-se a Ré Securitas que nunca deixou de o ser.” – fim de citação.


3.2. - No Acórdão da Relação pode ler-se:


“O elemento fundamental para a existência de uma transferência de estabelecimento, é que a entidade económica que este representa, mantenha a sua identidade, podendo acontecer que ocorra transmissão mesmo quando há sucessivos concessionários que não têm qualquer relação contratual entre si.


Tal como decidido no processo desta Secção 362/19.6T8VPV.L1, na qual as ora relatora e primeira adjunta intervieram como adjuntas, e que aqui seguimos de muito perto, é de afirmar que a Autora "integrava uma unidade económica constituída, essencialmente, por meios humanos, organizada de modo duradouro e dotada de autonomia, com vista à prossecução de uma actividade económica - a vigilância - cujos meios indispensáveis à actividade eram fornecidos pela entidade adjudicante e sendo os meios humanos ou a força de trabalho os únicos que, no caso, eram passíveis de serem transferidos.


Com efeito, considerando as especificidades da actividade de segurança e vigilância reguladas na Lei n.? 34/2013, de 1. .. .... (Lei da Segurança Privada), o único bem que, no caso, era susceptível de ser transferido resumia-se à mão de obra, sendo certo que os equipamentos facultados pela entidade adjudicante, em conjunto com a mão-de-obra, são a base para que, autonomamente, se realize a actividade de vigilância e segurança do local em questão.


Por fim e tal como decorre da interpretação feita pelo T..., no seu Acórdão de ... de ... de 2017, do conceito de transferência e que vem citado na sentença recorrida, também no caso em análise, "os equipamentos indispensáveis ao exercício da referida prestação foram retomados pela segunda empresa", retoma que se verificou no dia imediatamente seguinte, sem quebra de continuidade da actividade que antes vinha exercendo a Ré Securitas."


Não vemos razão para alterar este entendimento, pelo que cumpre concluir que, à luz da Directiva n- 2001/23/CE do Conselho de 1. .. ..... e do artigo 285.º n.ºs 1 e 5 do Código do Trabalho, ocorreu a transferência para a Ré PSG - Segurança Privada da posição do empregador no contrato de trabalho da Autora a partir de ... de ... de 2020, assumindo esta Ré a qualidade de empregadora daquela.” – fim de citação.


3.3. – Apreciemos.


A questão da transmissão de estabelecimento/unidade económica no sector da vigilância e segurança privada vem sendo apreciada em vários acórdãos dos Tribunais Superiores, incluindo do Supremo Tribunal de Justiça, que, recentemente - Acórdão de 15 de setembro de 2021, Processo n.º 445/19.2T8VLG.P1.S1 -, formulou pedido de decisão prejudicial ao Tribunal de Justiça da União Europeia, processo C-675/21.


À primeira questão do reenvio, se, em substância, a Diretiva 2001/23 deve ser interpretada no sentido de que a inexistência de vínculo contratual entre o cedente e o cessionário de uma empresa ou de um estabelecimento ou de uma parte de empresa ou de estabelecimento é relevante para a experiência da existência de uma transferência na adesão desta diretiva, o Tribunal de Justiça (Sétima Secção), por acórdão de 16 de fevereiro de 2023, respondeu “que a Diretiva 2001/23 deve ser interpretada no sentido de que a inexistência de vínculo contratual entre o cedente e o cessionário de uma empresa ou de um estabelecimento ou de uma parte de empresa ou de estabelecimento é irrelevante para a experiência da existência de uma transferência na adesão desta diretiva.”.


Quanto à segunda questão, pode ler-se no mencionado acórdão do Tribunal de Justiça:


“46 Com a sua segunda questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 1.°, n.° 1, da Diretiva 2001/23 deve ser interpretado no sentido de que é suscetível de ser abrangida pelo âmbito de aplicação desta dirigir uma situação em que uma empresa prestadora de serviços que, para as necessidades de um dos seus clientes, tinha afetado a este último uma equipa composta por um certo número de trabalhadores é substituída, por esse cliente, para prestar os mesmos serviços, por uma nova empresa prestadora e em que, por um lado, esta última assume apenas um número muito limitado dos trabalhadores que integravam essa equipa, sem que os trabalhadores reintegrados tenham competências e conhecimentos específicos indispensáveis ​​para a prestação dos serviços ao referido cliente, e, por outro, não se suportou a transmissão para a nova prestadora de bens corpóreos ou incorpóreos necessários para a continuidade desses serviços.


47 A título preliminar, há que recordar que o Tribunal de Justiça declarou que o âmbito de aplicação da Diretiva 2001/23 se estende a todas as situações de mudança, no âmbito de relações contratuais, da pessoa singular ou coletiva responsável pela exploração da empresa, que, por esse facto, contrai as obrigações de entidade patronal relativamente aos empregados da empresa, sem que tenha importância saber se a propriedade dos elementos corpóreos é transmitida (Acórdão de 7 de agosto de 2018, Colino Sigüenza, C‑472/16, EU :C:2018:646, n.° 28 e jurisprudência referida).


48 Segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, a Directiva 2001/23 visa assegurar a continuidade das relações de trabalho existentes no quadro de uma entidade económica, independentemente de uma mudança de proprietário. Como resultado do n.º 42 do presente acórdão, o escolhido decisivo para demonstrar a existência de uma transferência, na aceção dessa diretiva, consiste, portanto, na circunstância de a entidade em questão preservar a sua identidade, o que resulta, designadamente, da prossecução efetiva da exploração ou da sua retomada (Acórdãos de 7 de agosto de 2018, Colino Sigüenza, C‑472/16, EU:C:2018:646, n.° 29 e jurisprudência referida, e de 24 de junho de 2021, Obras y Servicios Públicos e Acciona Agua, C‑550/19, EU:C:2021:514, n.° 89 e jurisprudência referida).


49 Para determinar se este requisito está preenchido, importa levar em consideração o conjunto das circunstâncias de fato que caracterizam a operação em causa, entre as quais figuram, designadamente, o tipo de empresa ou de estabelecimento em questão, a transferência ou não de elementos corpóreos, como os edifícios e os bens móveis, o valor dos elementos incorpóreos no momento da transferência, a reintegração ou não, por parte do novo empresário, do essencial dos efetivos, a transferência ou não da clientela, bem como o grau de similitude das atividades exercidas antes e depois da transferência e duração de uma eventual suspensão dessas atividades. Estes elementos constituem, contudo, apenas aspectos parciais da avaliação de conjunto que se impõem e não podem, por isso, ser apreciados com atenção (Acórdão de 24 de junho de 2021,


50 Em particular, o Tribunal de Justiça considerou que o juiz nacional, na sua experiência das circunstâncias de fato que caracterizam a operação em questão, deve especialmente ter em conta o tipo de empresa ou de estabelecimento em causa. Daqui resulta que a importância a atribuir, respetivamente, aos diferentes critérios da existência de uma transferência, na aceção da Diretiva 2001/23, varia necessariamente em função da atividade exercida, ou mesmo dos métodos de produção ou de exploração utilizados na empresa, no estabelecimento ou na parte do estabelecimento em questão (Acórdão de 24 de junho de 2021, Obras y Servicios Públicos e Acciona Agua, C‑550/19, EU:C:2021:514, n.° 91 e jurisprudência referida).


51 O Tribunal de Justiça salientou que uma entidade económica pode, nalguns sectoriais, funcionar sem elementos do activo, corpóreos ou incorpóreos, experimentar, de tal forma que a manutenção da sua identidade além da operação de que é objecto não pode, por suposto, depender da cessão de tais elementos (Acórdão de 24 de junho de 2021, Obras y Servicios Públicos e Acciona Agua, C‑550/19, EU:C:2021:514, n.° 92 e jurisprudência referida).


52 Assim, o Tribunal de Justiça declarou que, na medida em que, nalguns setores em que a atividade assenta essencialmente na mão de obra, o que sucede nomeadamente no caso de uma atividade que não necessita de utilizar elementos materiais específicos, um conjunto de trabalhadores que executar de forma duradoura uma atividade comum pode corresponder a uma entidade econômica, essa entidade é suscetível de manter a sua identidade além da sua transferência quando o novo empresário não se limita a desenvolver a atividade em causa, assumindo também uma parte essencial, em termos de número e de competências, dos efetivos que o seu antecessor afetava especialmente a essa tarefa. Nesta hipótese, o novo empresário adquire, com efeito, um conjunto organizado de elementos que lhe permitirá prosseguir de forma estável as atividades ou parte das atividades da empresa cedente (Acórdão de 24 de junho de 2021, Obras y Servicios Públicos e Acciona Agua, C‑550/19, EU:C:2021:514, n.° 93 e jurisprudência referida).


53 A este respeito, o Tribunal de Justiça declarou, no contexto de um processo comparável ao do processo principal, que uma atividade de vigilância de um museu que não exige a utilização de elementos materiais específicos pode ser considerada uma atividade que assenta essencialmente na mão de obra e, por consequência, um conjunto de trabalhadores que executa de forma duradoura uma atividade comum de vigilância pode, na falta de outros fatores de produção, corresponder a uma entidade económica. É ainda necessário, porém, como resulta do número anterior, que a identidade desta última seja mantida além da operação em causa, o que pode ser o caso quando a entidade económica em questão pertence a um setor que assenta essencialmente na mão de obra e o essencial dos efetivos dessa entidade, em termos de número e de competência, for integrado pelo alegado cessionário (v., neste sentido, Acórdão de 11 de julho de 2018, Somoza Hermo e Ilunión Seguridad, C‑60/17, EU:C:2018:559, n.os 35 e 37 e jurisprudência referida). Por conseguinte, nesse setor, a identidade de uma entidade económica não pode ser mantida além da operação em causa se o essencial dos seus efetivos, em termos de número e de competência, não for integrado pelo presumido cessionário (v., neste sentido, Acórdão de 7 de agosto de 2018, Colino Sigüenza, C‑472/16, EU:C:2018:646, n.° 32 e jurisprudência referida).


54 Em contrapartida, num setor em que a atividade assenta essencialmente nos equipamentos, o facto de o novo empresário não ter integrado os efetivos que o seu antecessor empregava na execução da mesma atividade não basta para excluir a existência de transferência de uma entidade que mantém a sua identidade na aceção da Diretiva 2001/23 (Acórdão de 7 de agosto de 2018, Colino Sigüenza, C‑472/16, EU:C:2018:646, n.° 33 e jurisprudência referida).


55 Resultado do que precede que a qualificação de transferência admitida que seja apurada um determinado número de factos, devendo esta questão ser apreciada in concreto pelo órgão jurisdicional nacional à luz dos critérios estabelecidos pelo Tribunal de Justiça, bem como dos objetivos prosseguidos pela Diretiva 2001/23, conforme enunciados, nomeadamente, no seu considerando 3 (Acórdão de 24 de junho de 2021, Obras y Servicios Públicos e Acciona Agua, C‑550/19, EU:C:2021:514, n.° 94 e jurisprudência referida) .


56 A este respeito, os autos de que o Tribunal de Justiça contém elementos que sugerem que, por um lado, a 2045 – Empresa prossegue a mesma atividade económica que a Strong Charon, prestando os mesmos serviços de vigilância que esta última assegurava no mesmo local, para o mesmo cliente, empregando o mesmo número de vigilantes e utilizando o mesmo equipamento disponibilizado por esse cliente. Por outro lado, no caso em apreço, a prestação desses serviços em benefício do cliente não parece ter suportado nenhum hiato significativo, uma vez que a 2045 – Empresa manteve imediatamente as atividades da Strong Charon no local em questão.


57 Tais circunstâncias de facto, que cabe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar, são emocionantes de corroborar a manutenção da identidade da entidade económica em questão e, por conseguinte, a existência de uma «transferência» na aceção do artigo 1.°, n. ° 1, alínea b), da Diretiva 2001/23.


58 Todavia, resulta da decisão de reenvio que só um dos quatro vigilantes que a Strong Charon empregava para assegurar os serviços de vigilância em causa no processo principal foi reintegrado pela 2045 – Empresa, sem que se possa deduzir dessa decisão que o vigilante em questão tinha competências e conhecimentos específicos necessários para assegurar a prestação desse serviço. Se se verificar que o referido vigilante não tinha essas competências ou conhecimentos específicos, há que concluir que não se pode considerar que a 2045 – Empresa tenha reintegrado o essencial dos efetivos, em termos de número ou de competências, da eventual entidade económica composta por esses quatro vigilantes. Por outro lado, resulta da referida decisão que a atividade em causa no processo principal consiste na vigilância das instalações do cliente, atividade que não parece necessitar da utilização de equipamentos específicos e que parece assim assentar essencialmente na mão de obra, à luz dos critérios recordados nos n.ºs 53 e 54 do presente acórdão. Tais circunstâncias factuais, admitindo que se verificaram, indicam que a identidade da entidade económica composta pelos quatro vigilantes que a Strong Charon tinha afetado à vigilância das instalações do cliente não foi mantida e, portanto, corroboram a inexistência de transferência de empresa na aceção do artigo 1.º, n.º 1, da Diretiva 2001/23.


59 Em definitivo, caberá ao órgão jurisdicional de reenvio apreciar, à luz das considerações que precedem e tendo em conta todas as circunstâncias de fato que caracterizam a operação em causa no processo principal, se existe ou não uma transferência de empresa na aceção da Diretiva 2001 /23.


60 Tendo em conta as considerações precedentes, há que responder à segunda questão que o artigo 1.°, n.º 1, da Directiva 2001/23 deve ser interpretado no sentido de que não é suscetível de ser abrangida pelo âmbito de aplicação desta Directiva uma situação em que uma empresa prestadora de serviços que, para as necessidades de um dos seus clientes, tinha afetado a este último uma equipa composta por um certo número de trabalhadores é substituída, por esse cliente, para prestar os mesmos serviços, por uma nova empresa prestador e em que, por um lado, esta última assume apenas um número muito limitado dos trabalhadores que integravam essa equipa, sem que os trabalhadores reintegrados tenham competências e conhecimentos específicos indispensáveis ​​para a prestação dos serviços ao referido cliente, e, por outro, não se suportou a transmissão para a nova prestadora de bens corpóreos ou incorpóreos necessários para a continuidade desses serviços.


E o Tribunal de Justiça declarou:


1) A Diretiva 2001/23/CE do Conselho, de 12 de março de 2001, relativa à aproximação das legislações dos EstadosMembros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas ou de estabelecimentos, ou de partes de empresas ou de estabelecimentos, deve ser interpretado no sentido de que:


a inexistência de vínculo contratual entre o cedente e o cessionário de uma empresa ou de um estabelecimento ou de uma parte de empresa ou de estabelecimento é irrelevante para a construção da existência de uma transferência na aceção desta diretiva.


2) O artigo 1.º, n.º 1, da Diretiva 2001/23 deve ser interpretado no sentido de que:


não é suscetível de ser abrangida pelo âmbito de aplicação desta diretiva uma situação em que uma empresa prestadora de serviços que, para as necessidades de um dos seus clientes, tinha afetado a este último uma equipa composta por um certo número de trabalhadores é substituído, por esse cliente, para prestar os mesmos serviços, por uma nova empresa prestadora e em que, por um lado, esta última assume apenas um número muito limitado dos trabalhadores que integravam essa equipa, sem que os trabalhadores reintegrados tenham competências e conhecimentos específicos indispensáveis ​​para a prestação dos serviços ao referido cliente, e, por outro, não se prestou assistência à transmissão para a nova prestadora de bens corpóreos ou incorpóreos necessários para a continuidade desses serviços.” – fim de citação


3.4. – No caso dos autos, e considerando o declarado no acórdão de 16 de fevereiro de 2023 do Tribunal de Justiça, a Ré Securitas não só não provou, como era seu ónus, quais “Dos 30 trabalhadores que constavam da lista enviada à PSG” – cf. pontos 20) e 23) dos factos provados – foram reintegrados pela Ré PSG para o exercício de funções de vigilância e segurança no “G.... .........”, como também não provou que bens corpóreos ou incorpóreos, necessários para a continuidade desse serviço de vigilância privada, transferiu para a Ré PSG.


Deste modo, faltam elementos de facto essenciais para se concluir, como concluiu o Tribunal da Relação, pela transmissão de estabelecimento.


Procede, pois, o recurso de revista e, revogando-se o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, repristina-se o decidido na sentença da 1.ª Instância.


IV. - Decisão


Atento o exposto, acordam os Juízes que compõem a Secção Social julgar procedente o recurso de revista, revogar o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa e repristinar o decidido na sentença da 1.ª Instância.


Custas a cargo da Ré Securitas.


Lisboa 08 de março de 2023


Domingos José de Morais (Relator)


Mário Belo Morgado


Júlio Gomes