Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
059780
Nº Convencional: JSTJ00002673
Relator: ALBERTO TOSCANO
Descritores: LICENÇA DE ESTABELECIMENTO COMERCIAL E INDUSTRIAL
ORGANISMO CORPORATIVO
UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Nº do Documento: SJ196407280597801
Data do Acordão: 07/28/1964
Votação: MAIORIA COM 1 DEC VOT E 1 VOT VENC
Referência de Publicação: DG Nº 236, S-I DE 1964-10-08, PÁG. 521 ; BMJ 139, 103
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PARA O PLENO
Decisão: UNIFORMIZADA JURISPRUDÊNCIA
Indicações Eventuais: ASSENTO 8/1964
Área Temática: DIR TRIBUT - DIR FISC.
DIR PROC CIV.
Legislação Nacional: CADM40 ARTIGO 710 PARUNICO.
CPC61 ARTIGO 63 N2 ARTIGO 763 ARTIGO 764.
DL 45248 DE 1963/09/16 ARTIGO 11.
DL 26106 DE 1935/11/23.
DL 26806 DE 1936/07/18 ARTIGO 1 ARTIGO 2 N3.
CCOM888 ARTIGO 13 ARTIGO 230.
D 45676 DE 1964/04/24.
L 2111 DE 1961/12/21 ARTIGO 7 PARUNICO.
CCI63 ARTIGO 28.
D 44172 DE 1962/02/01.
Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃO RL PROC59780 DE 1963/03/01.
Sumário :
Os organismos corporativos que estavam sujeitos a contribuição industrial estavam tambem sujeitos a licença de estabelecimento comercial e industrial.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

O A recorreu para o Tribunal Pleno do acordão da Relação de Lisboa, de 1 de Março de 1963, com fundamento de oposição com o acordão do mesmo Tribunal, de 18 de Fevereiro de 1959, sobre a mesma questão fundamental de direito, relativa as condições de aplicabilidade do artigo 710 e seu paragrafo unico do Codigo Administrativo, na redacção então vigente.
O acordão recorrido decidiu que o disposto nestes preceitos e aplicavel a todos os gremios sobre os quais incide contribuição industrial; o acordão invocado decidiu que aquelas disposições so eram aplicaveis quando a entidade passiva exercesse qualquer ramo de comercio ou industria.
A secção considerou verificados os pressupostos legais para prosseguimento do recurso.
Alegaram as partes e deu parecer o Ministerio Publico.
Decidindo:
A Camara recorrida deduziu a incompetencia deste Tribunal e pediu a remessa do processo ao Supremo Tribunal Administrativo, nos termos do artigo 63, n. 2, do Codigo de Processo Civil, com fundamento no disposto no artigo 11 do Decreto-Lei n. 45248, de 16 de Setembro de 1963.
Esta questão provocou doutas considerações do Ministerio Publico, a que damos plena concordancia.
Limitamo-nos a afirmar que o Supremo Tribunal de Justiça mantem-se como orgão judiciario com competencia para conhecer dos recursos previstos no artigo 764 do Codigo de Processo Civil, e que o Supremo Tribunal Administrativo carece de competencia para solucionar os conflitos de jurisprudencia que se consideram nos artigos 763 e 764 do citado Codigo.
Fica assim desatendida esta questão suscitada pela Camara recorrida.
Quanto ao conflito de jurisprudencia.
A recorrente pretende não ser passivel do imposto em causa, pelas seguintes razões: a) E um organismo de interesse publico, criado ao abrigo do Decreto-Lei n.26106, de 23 de Novembro de 1935; b) Não e uma empresa singular ou colectiva, na acepcão tecnico-juridica; c) Não pratica actividade comercial ou industrial; d) Esta sujeita a contribuição industrial, mas nos termos do artigo 1 e do n. 3 do artigo 2 do Decreto- -Lei n. 26 806, de 18 de Julho de 1936, não devendo considerar-se como provenientes do exercicio de qualquer ramo de comercio ou industria as percentagens ou taxas legais para o fundo corporativo Vejamos:
Dispunha o artigo 710 do Codigo Administrativo, na parte que interessa:
"A licença de estabelecimento comercial ou industrial e devida pelas empresas..." "que exerçam qualquer ramo de comercio ou de industria".
O paragrafo unico dispunha: "Para os efeitos do disposto neste artigo considera-se comercio ou industria toda a actividade sobre que incida contribuição industrial ou imposto de natureza especial que a substitua".
O Decreto-Lei n. 26806, de 18 de Julho de 1936, sujeitara os organismos corporativos do comercio e industria e agricultura ao pagamento da contribuição industrial.
Dai o problema. Os ditos organismos corporativos, mesmo que não exerçam "qualquer ramo de comercio ou de industria" em sentido tecnico, exercem actividade sobre que incide contribuição industrial.
Tudo estava no alcance a atribuir ao transcrito paragrafo unico.
A jurisprudencia dividiu-se. Certa corrente doutrinou que para haver lugar a licença municipal eram necessarias duas condições: a) Exercicio de actividade comercial ou industrial; b) Ser essa actividade passivel de contribuição industrial.
Ainda se dizia que os organismos corporativos não eram empresas, por não terem nenhum dos fins previstos no artigo 230 do Codigo Comercial e que o artigo 710 do Codigo Administrativo so sujeitava as empresas e suas dependencias ao imposto em causa.
Este argumento carecia de toda a validade, posto que o artigo 230 não define empresas mas determina apenas quais, de entre elas, devem haver-se por comerciais.
E a letra dos preceitos do Codigo Administrativo tambem não autorizava a interpretação que lhe dava essa corrente jurisprudencial.
Com mais razão, a outra em que se inclui o acordão em recurso entendia literalmente o paragrafo unico do artigo 710, considerando-o explicativo do corpo do artigo, no sentido de esclarecer o que, para efeitos de incidencia do imposto, o artigo queria dizer, quando se referia a comercio ou industria.
Para esses efeitos, comercio ou industria devia considerar-se qualquer actividade passivel de contribuição industrial, ainda que, em perfeita tecnica, comercio ou industria não fosse.
Este entendimento veio a ser confirmado por interpretação legislativa e veio a ser corroborado pela alteração que o Decreto n. 45676, de 24 de Abril ultimo fez ao dito artigo 710 e seu paragrafo unico.
A Lei n. 2111, de 21 de Dezembro de 1961, ao autorizar que organismos corporativos de natureza identica ao organismo ora recorrente pudessem ser isentados de contribuição industrial, disse, por claro, no paragrafo unico do seu artigo 7 que a isenção de contribuição industrial, quando concedida, importava isenção de licença de estabelecimento comercial ou industrial.
Isto representa interpretação autentica no sentido de que os organismos corporativos eram passiveis de tal licença.
Mais recentemente o Decreto n. 45676, quando substituiu o nome do imposto camarario em questão, passando a denomina-lo "imposto de comercio e industria" substituiu todo o texto do artigo 710 e seu paragrafo, revelando a mesma orientação que fora afirmada pela Lei n. 2111. A expressão então empregada "qualquer ramo de comercio ou industria" foi substituida por esta "qualquer actividade passivel de contribuição industrial" - em relação ao exercicio das actividades das empresas.
Pelo exposto se nega provimento ao recurso com custas pelo recorrente e firma-se o seguinte Assento:
"Os organismos corporativos que estavam sujeitos a contribuição industrial estavam tambem sujeitos a licença de estabelecimento comercial ou industrial".


Lisboa, 28 de Julho de 1964

Alberto Toscano (Relator) - Gonçalves Pereira - Jose Meneses - Albino Resende Gomes de Almeida - Albuquerque Rocha - Jose Abrantes Tinoco - Eduardo Tovar de Lemos (segue a declaração de vencido).
Tem voto de conformidade dos Conselheiros - Lopes Cardoso,
Simões de Carvalho, Torres Paulo, Barbosa Viana, Toscano Pessoa, Fragoso de Almeida, João Caldeira e Teixeira Botelho.
Eduardo Tovar de Lemos (Vencido quanto ao fundo:
1 - Trata-se aqui de saber, tão-so, se o A, era passivel, em 1961, de licença de estabelecimento comercial ou industrial.
2 - Para a sujeição a licença exigia o artigo 710 e seu paragrafo unico do Codigo Administrativo duas condições simultaneamente: existencia de empresa singular ou colectiva que exercesse qualquer ramo de comercio ou industria e que ela pagasse contribuição industrial ou imposto que a substituisse.
Assim a empresa não era qualquer, mas a que exercesse qualquer ramo de comercio ou industria.
3 - Os Gremios, não estando nessas condições, não pagavam tal contribuição; mas porque realizavam certas operações, embora tecnica e juridicamente não comerciais ou industriais, concedeu-se, para que a pagassem, que assim se considerassem - Decreto-Lei n. 26806, de 18 de Julho de 1936, e seu relatorio.
Dai o terem as Camaras, como estando autorizadas, mas mal, a cobrar-lhes a licença.
4 - E obvio que o legislador visava os comerciantes (ou industriais) e os Gremios não o são, artigo 13 do Codigo Comercial.
Nem procuram o lucro propriamente dito, nem são empresas como tal, como não buscam os fins do artigo 230 desse diploma. E repugna que se exija licença de estabelecimento comercial ou industrial a organismos do Estado, os Gremios, bases da organização corporativa da Nação, que são verdadeiros institutos publicos, pagina 17 das Lições de Direito Corporativo, de Marcelo Caetano.
5 - E de notar que o Gremio em causa pagou contribuição industrial, consta dos autos, tão-so pela "arrecadação de taxas para o fundo corporativo", n. 3 do artigo 2 do citado Decreto-Lei n. 26 806.
6 - O Decreto n. 45676, de 24 de Abril de 1964, não trouxe, a nosso ver achega pelo menos substancial, para a solução do problema pois continua a referir-se a empresas e os Gremios não o são.
7 - Merece serias reservas a pretendida conclusão tirada do paragrafo unico do artigo 7 da Lei n. 2111, de 21 de Dezembro de 1961 (concretizada no Decreto n. 44172, de 1 de Fevereiro de 1962) no sentido de que os organismos corporativos, todos, eram passiveis da falada licença.
Alem do preceito so se aplicar aos Gremios da Lavoura, que não e o caso daqui, foi o mesmo uma mera providencia de momento e transitoria: so vigorou em 1962 e a licença em questão e de 1961, sendo o acordão recorrido de 1963.
De resto, trata-se de materia restritiva (impostos) e ainda excepcional, o que impõe totais reservas na sua aplicação, maximamente quanto a eventuais ilações a contrario sensu.
8 - E de notar tambem que o recente Codigo da Contribuição Industrial reconhece que os Gremios não exercem uma actividade comercial ou industrial e, quando a exercem, em regra, não obtem lucros tributaveis, pois que visam principalmente fins de interesse publico (n. 10 do relatorio); e o seu artigo 28 dispõe que o lucro tributavel dos organismos corporativos determina-se tendo apenas em conta os proveitos ou ganhos de operações de natureza comercial ou industrial. Apenas se conclui, sem mais comentarios, que o Gremio recorrente , se fosse hoje, nem pagaria contribuição industrial, menos portanto a dita licença.
9 - Em suma: foi por decreto que os Gremios passaram a pagar contribuição industrial, parece que tambem so por diploma expresso deveriam pagar a falada licença. A materia dos impostos, ate por odiosa, e sempre mais de restringir que de ampliar. Sera aliciante a alias simpleza do criterio de que os Gremios paguem a licença tão-so por pagarem contribuição industrial, sera, mas não basta para gerar um imposto).

Este acordão transitou em 1 de Outubro de 1964.