Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
5223/05.3TBOER.L1.S1
Nº Convencional: 1.ª SECÇÃO
Relator: ANTÓNIO JOAQUIM PIÇARA
Descritores: VONTADE DOS CONTRAENTES
ERRO VICIO
ERRO ESSENCIAL
VÍCIOS DA VONTADE
CONHECIMENTO
DECLARATÁRIO
CONTRATO DE MEDIAÇÃO
CONTRATO DE MEDIAÇÃO IMOBILIÁRIA
Data do Acordão: 05/15/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática: DIREITO CIVIL - RELAÇÕES JURÍDICAS/ NEGÓCIO JURÍDICO/ PROVAS - DIREITO DAS OBRIGAÇÕES/ REPONSABILIDADE CIVIL
DIREITO COMERCIAL - CONTRATOS COMERCIAIS
Doutrina: - António Menezes Cordeiro, “Do contrato de mediação, “O Direito”, ano 139º, 2007, Tomo III, pág. 517; Tratado de Direito Civil Português, I, Parte Geral, Tomo I, 3ª ed., Coimbra, 2005, pág. 807.
- António Pinto Monteiro, Contratos de Distribuição Comercial, Almedina, 2002, pág. 102.
- Carlos Alberto da Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, Coimbra Editora, 1976, págs. 386, 387.
- Fernando Andrade Pires de Lima e João de Matos Antunes Varela, Código Civil anotado, Volume I, 1967, págs. 159 e 162.
- Heinrich Ewald Horster, A Parte Geral do Código Civil Português, Teoria Geral do Direito Civil, 6ª reimpressão, Almedina, págs. 567 a 570.
- Inocêncio Galvão Telles, Direito das Obrigações, 7ª edição, Reimpressão, Coimbra Editora, pág. 195.
- João de Castro Mendes, Teoria Geral do Direito Civil, Vol. II, AAFDL, 1995, págs. 106, 108, 109, 121, 134, 138.
- José de Oliveira Ascensão, Direito Civil Teoria Geral, Volume II, 2ª edição, Coimbra Editora, págs. 135, 136, 144.
- J. Dias Marques, Noções Elementares de Direito Civil, 6ª edição, 1977, pág. 84.
- Luís A. Carvalho Fernandes, Teoria Geral do Direito Civil, II, 4ª ed., Lisboa, 2007, págs. 151/154, 199.
- Luís Manuel Teles de Menezes Leitão, o enriquecimento sem causa no Código Civil de 1966, in Comemorações dos 35 anos do Código Civil, Volume III, Coimbra Editora, 2007, págs. 15 e 16.
- Manuel A. Domingues de Andrade, Teoria Geral da Relação Jurídica, vol. II, 9ª reimpressão, Coimbra, 2003, pág. 233.
- Mário Júlio de Almeida Costa, Direito das Obrigações, 12ª edição, Almedina, pág. 491.
- Pedro Pais de Vasconcelos, Direito Comercial, Volume I, 2011, Parte Geral, Contratos Mercantis, Almedina, pág. 197; Teoria Geral do Direito Civil, Almedina, 2010, 6ª edição, págs. 658/661.
Legislação Nacional: CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 247.º, 251.º, 342.º, N.º 1, 410.º, N.º1, 473º, N.ºS 1 E 2.
DL N.º 77/99, DE 16-3, COM AS ALTERAÇÕES INTRODUZIDAS PELO DL N.º 258/2001, DE 25-9.
Sumário :
I - A vontade negocial deve ser livre, esclarecida, ponderada e formada de um modo julgado normal e são.

II - O erro-vício ou erro-motivo, que se traduz num erro na formação da vontade e do processo de decisão, existe quando ocorre uma falsa representação da realidade ou a ignorância de circunstâncias de facto ou de direito que intervieram nos motivos da declaração negocial, de modo que, se o declarante tivesse perfeito conhecimento das circunstâncias falsas ou inexactamente representadas, não teria realizado o negócio ou tê-lo-ia realizado em termos diferentes.

III - É relevante saber se o erro foi factor determinante da declaração negocial emitida – essencialidade do elemento sobre que incidiu o erro – e se o destinatário da declaração conhecia ou devia conhecer essa essencialidade.

IV - A demonstração dos factos integradores da essencialidade e respectiva cognoscibilidade, por constituírem requisitos de relevância do erro e fundamento da anulabilidade do negócio (arts. 251.º e 247.º, ambos do CC), constitui ónus de quem invoca o erro (art.º 342.º, n.º 1, do CC).

V - O enriquecimento sem causa, como fonte de obrigação, supõe a verificação cumulativa de três requisitos: existência de um enriquecimento; enriquecimento esse obtido à custa de alguém; e falta de causa justificativa.

VI - O mediador é um intermediário que aproxima as partes no negócio, põe-nas em presença e facilita o negócio, mas não actua por conta de nenhuma das partes e nunca representa qualquer delas no negócio que vem a ser celebrado.
Decisão Texto Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

Relatório

I – AA e BB intentaram, no 2º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Oeiras, acção declarativa, sob a forma ordinária, contra CC, DD e a sociedade S...M...dos A... – Sociedade de Mediação Imobiliária Lda., alegando, em síntese, o seguinte:

As Rés LL e DD são respectivamente dona e usufrutuária do prédio urbano sito na Rua ..., denominado Casa A, em Paços de Arcos, que é uma moradia geminada com a denominada Casa B, sita no nº ... da referida artéria.

Em finais de Março de 2001, manifestaram interesse em adquirir tal prédio, tendo todo processo negocial com vista à sua aquisição sido conduzido pela 3ª Ré, em nome daquelas.

Na altura em que visitaram o referido prédio, a denominada Casa B encontrava-se em obras de construção e remodelação e grande parte do terreno da Casa A estava a ser usado como estaleiro das obras da Casa B.

Não conseguiram, em virtude das obras, bem como de diversas construções existentes no terreno, através do exame visual, ter a noção exacta da área do prédio que pretendiam adquirir:

A 3ª Ré forneceu-lhes plantas da Casa B, informando que eram idênticas e entregou-lhes cópia das certidões da Conservatória do Registo Predial e da caderneta predial, constando da primeira que a Casa A se compunha de uma casa com área coberta de 116 m2 e um logradouro com área descoberta de 485 m2.

Foi com base nestas informações sobre a área coberta e descoberta que apresentaram a sua proposta de aquisição do imóvel, sendo ambas relevantes e determinantes para a decisão de aquisição e proposta de preço.

Em 9 de Maio de 2001 assinaram com as Rés LL e DD contrato-promessa de compra e venda da denominada Casa A, tendo pago a quantia de 13.600.000$00, a título de sinal e princípio de pagamento, ficando acordado que o contrato definitivo devia ser celebrado até 9 de Agosto de 2002.

Após a assinatura do contrato foram contactados pelo proprietário da casa B no sentido de comparticiparem em 50% das despesas com a reparação do muro existente entre a casa A e a Casa B e, convictos de que se tratava de um muro divisório das duas casa, acederam e enviaram a quantia pedida de 3 851,72 €. 

Subsequentemente deram início às diligências necessárias ao licenciamento e execução das obras de renovação e reconstrução do imóvel, entre as quais um levantamento topográfico e, perante este, constataram que o prédio tinha apenas a área de 501,1 m2, faltando 97,9 m2 de área descoberta.

Com tais fundamentos, pediram a anulação do contrato-promessa de compra e venda celebrado, pelo erro em que foram induzidos pelas Rés, e a condenação solidária destas a pagar-lhes a importância de 77 932,30 €, acrescida de juros vencidos, no montante de 17 849,75 €, e vincendos até integral pagamento.

As Rés LL e DD ofereceram contestação conjunta, arguindo a sua ilegitimidade e contrapondo versão factual diferente da delineada pelos Autores, pugnando, desse modo, pela sua absolvição da instância ou improcedência da acção e condenação destes em multa e indemnização a seu favor, por litigância de má fé.

Por sua vez, a Ré mediadora contestou autonomamente, apresentando versão factual similar à das outras Rés e refutando também que os Autores tenham sido induzidos em erro, pugnando, assim, pela improcedência da acção.

Os Autores responderam à excepção arguida pelas Rés LL e DD, batendo-se pela sua inverificação.

Foi proferido saneador a refutar a pretensa ilegitimidade dessas Rés e condensou-se a matéria de facto, com selecção da já assente e organização da base instrutória.

O processo seguiu seus termos e, a final, foi proferida sentença a julgar a acção totalmente improcedente, com a absolvição das Rés do pedido, e a não reconhecer a invocada litigância de má fé.

Os Autores apelaram, mas a Relação de Lisboa confirmou essa decisão e, de novo inconformados, interpuseram recurso de revista, rematando a sua alegação, com as seguintes conclusões:

1. Encontra-se demonstrada a essencialidade para os declarantes, ora Recorrentes, do elemento sobre o qual recaiu o erro;

2. A lei não exige o conhecimento ou a cognoscibilidade do erro por parte do declaratário, bastando-se com o conhecimento ou cognoscibilidade da essencialidade do elemento sobre que incidiu o erro;

3. As Recorridas declaratárias deviam saber - intui-se facilmente por critérios de normalidade social objectivos - que perante as repetidas solicitações e prestações de informação relacionadas com a área ou dimensão do imóvel que este era um elemento essencial da definição identitária do imóvel para os declarantes, ora Recorrentes;

4. Em face de uma tão significativa diferença de área de um prédio destinado à habitação, que se traduz em cerca de menos 97 m2 de área descoberta do que aquela que havia sido informada aos declarantes, ora Recorrentes, representando uma percentagem de cerca de 20% menor relativamente à área da realidade espacial definida no contrato-promessa, não podiam as Recorridas declaratárias deixar de reconhecer o carácter essencial para os declarantes da percepção da verdadeira área do terreno;

5. Os Recorrentes lograram provar (ponto 30 dos factos considerados provados) que a proposta contratual apresentada às Recorridas se fundou na área do prédio e que este factor influiu no próprio preço proposto (enquanto elemento essencial do contrato promessa e do contrato prometido - cfr. artigos 410° n° 1 e 874°, ambos do Código Civil);

6. As Recorridas, não obstante poderem ignorar a discrepância de áreas (o elemento em que assenta o erro), conheciam ou não podiam ignorar a essencialidade deste elemento para os Recorrentes na emissão da respectiva declaração negocial, até pela diferença de área verificada;

7. A 3ª R. actuou como representante das 1ª e 2ª RR. pelo que os actos jurídicos praticados por aquela em nome destas produzem os seus efeitos na esfera jurídica das representadas;

8. De modo que, o acto de conhecimento ou cognoscibilidade da essencialidade do elemento sobre que recaiu o erro pela 3ª R., produz os seus efeitos na esfera jurídica das 1ª e 2ª RR. suas representadas;

9. Salvo melhor opinião, não subsistem dúvidas de que se está perante um erro sobre as qualidades do objecto (cfr. artigo 251° do Código Civil), cuja essencialidade para os declarantes (ora Recorrentes) as declaratárias (Recorridas) não podiam ignorar.

10. Este erro torna o contrato-promessa de compra e venda celebrado retroactivamente anulável, devendo ser restituído aos Recorrentes pelas Recorridas o sinal por aqueles prestado ao abrigo do aludido contrato, no valor de EUR 67.836,51 (equivalente a ESC 13.600.000$00) bem como as despesas que os ora Recorrentes suportaram com o levantamento topográfico que levou à rectificação da área do imóvel, e com a comparticipação na construção do muro divisório do imóvel prometido vender, no valor, respectivamente, de € 6.234,97 e € 3.851,72.

11. Em qualquer caso, sem conceder, ainda que não se mostrassem preenchidos os requisitos do erro sobre o objecto, sempre os Recorrentes teriam direito à devolução por parte das 1ª e 2ª RR., ora Recorridas, dos valores que despenderam com o levantamento topográfico que levou à rectificação da área do imóvel e na construção do aludido muro, por aplicação subsidiária do instituto do enriquecimento sem causa (cfr. artigo 473° do Código Civil);

12. O acórdão recorrido fez uma incorrecta interpretação do artigo 247° do Código Civil (aplicável ex vi artigo 251° do Código Civil), sobretudo face à factualidade dada como provada e que não foi atendida, como devia, pelo julgador.

Pedem, em consequência, a revogação do acórdão recorrido e a subsequente condenação das Rés no pedido.

Foram oferecidas contra-alegações que, posteriormente, vieram a ser desentranhadas.

Colhidos os vistos, cumpre, agora, apreciar e decidir.

II -  Fundamentação de facto

A factualidade dada como provada, nas instâncias, é a seguinte:

1. A 1ª R. CC é a proprietária do prédio urbano, sito na Rua ..., denominado “Casa A”, freguesia de Paço de Arcos, concelho de Oeiras, descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de Oeiras, sob o nº 03148, inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o nº 1387.

2. A 2ª R. DD é a usufrutuária de prédio indicado no número anterior.

3. A 3ª R. “S...M...dos A... – Sociedade de Mediação Imobiliária, Ldª” é uma empresa de mediação imobiliária.

4. Todo o processo negocial com vista à aquisição pelos AA. do imóvel identificado em 1. foi conduzido pela 3ª R., em nome das 1ª e 2ª RR., no exercício da sua actividade de mediação imobiliária.

5. Apenas no dia da assinatura do contrato-promessa de compra e venda, os AA. contactaram com as 1ª e 2ª RR..

6. Os AA. apresentaram à 3ª R. a sua proposta de aquisição do imóvel, tendo recebido desta a contraproposta que constitui documento 2, junto com a petição inicial a fls. 13, e cujo teor se dá aqui por reproduzido.

7. O prédio identificado em 1. encontrava-se, e encontra-se ainda (com referência à data da propositura da acção, em estado bastante degradado, uma vez que está desocupado há vários anos, período durante o qual foi ocupado por marginais que sucessivamente o vandalizaram, tendo anteriormente sido utilizado como Colégio de Ensino Especial, denominado “A Bússola”.

8. O imóvel identificado em 1. corresponde a uma moradia geminada com a denominada “Casa B”, sita no nº ... da mesma Rua ....

9. Na altura em que os AA. Visitaram o prédio identificado em 1., o prédio que corresponde à “Casa B” encontrava-se em fase de obras de remodelação.

10. A 3ª R. forneceu aos AA. as plantas correspondentes à Casa B que constituem o documento 4 junto com a p. i., em 10/04/2001, cópia da certidão da Conservatória do Registo Predial e da Caderneta Predial do imóvel identificado em 1. que constituem os documentos nºs 5 e 6 da p. i., cujo teor se dá por reproduzido.

11. Na certidão da Conservatória do Registo Predial com referência à descrição do imóvel identificado em 1. facultada pela 3ª R. aos AA. consta:

- a casa com a área coberta de 116 m2

- logradouro com a área descoberta de 485 m2

Total                                                601 m2.

12. Em 9 de Maio de 2001, os AA. e as 1ª e 2º RR. assinaram o contrato-promessa de compra e venda que constitui o documento nº 7 junto com a p. i..

13. Tendo nessa mesma data, e nos termos contratuais, os AA. efectuado o pagamento às 1ª e 2ª RR. da quantia de Esc. 13.600.000$00 (treze milhões e seiscentos mil escudos), a título de sinal e princípio de pagamento.

14. O contrato definitivo devia ser celebrado até 9 de Agosto de 2002.

15. Com referência ao imóvel identificado em 1., por ap. 20, de 2004/12/21 foi averbada a rectificação nos seguintes termos “área coberta 116 m2, área descoberta 387,78 m2.

16. Os AA. apresentaram junto da Câmara Municipal de Oeiras a exposição com data de 03 de Julho de 2001, com referência ao processo 295/67 e que constitui o documento nº 10 junto com a p. i. e cujo teor se dá aqui por reproduzido.

17. A... Arquitectura elaborou o documento que constitui o documento nº 8 junto com a p. i., no qual, além do mais, escreve “Levantamento topográfico” – Hab. Unifamiliar na Rua ..., P. Arcos-Oeiras, “com data de Junho de 2001”, e no qual escreve ainda, além do mais, “Planta geral da propriedade (área total: 503,100m2).

18. A Câmara Municipal de Oeiras, com data de 2003/03/21, elaborou a seguinte informação “Assunto: cálculo da área referente às parcelas A e B – Processo 295/67. As parcelas estão definidas com muros, e feito o levantamento topopgráfico, encontram-se as seguintes áreas Casa A=494,78 m2; Casa B=615,86 m2…”.

19. A sociedade URBRU – Construção Civil, Ldª emitiu em nome do A. A factura nº 0055, com data de 25 de Julho de 2001, no valor de € 3.851,72, com a seguinte descrição “valor referente à construção de muro correspondente parcela do nº 13 da Rua ..., conforme adjudicação por fax datado de 14/05/2001”.

20. A 3ª R. enviou às 1ª e 2ª RR. o fax que constitui o documento nº 5 junto com a contestação da 3ª R. a fls. 92 e cujo teor se dá aqui por reproduzido.

21. Encontra-se registado, por ap. 89 de 2005-06-09, a favor de EE e mulher FF a aquisição com referência ao imóvel descrito sob o nº 3148120000523, freguesia de Paço de Arcos, da Conservatória de Registo Predial de Oeiras.

22. Em finais de Março de 2001, os AA. manifestaram interesse em adquirir o imóvel identificado em 1..

23. Para além das obras referidas em 9., no logradouro da “Casa B” decorriam obras de construção, nomeadamente uma piscina.

24. Grande parte do terreno do prédio identificado em 1. esteve a ser utilizado como estaleiro de obras, nomeadamente para colocação de diversos materiais e andaimes relativos às obras da Casa B.

25. Os operários que trabalhavam na “Casa B” ocupavam mesmo algumas das várias construções existentes no prédio identificado em 1. que utilizavam para dormir e guardar material de construção.

26. Os AA. não conseguiram em virtude das obras supra descritas, bem como das diversas construções existentes no terreno, ter, através do exame visual, a noção exacta da área do prédio que pretendiam adquirir.

27. A 3ª R. informou os AA. sobre as dimensões do terreno e casa, tal como consta do ponto 11..

28. Aquando da entrega das plantas identificadas em 10., a 3ª R. informou os AA. que as duas casas eram idênticas e com as mesmas dimensões.

29. Foi com base nas informações a que se refere o ponto 28. e ainda as que resultam dos pontos 10. e 11. que os AA. apresentaram a sua proposta de aquisição do referido imóvel.

30. A área coberta e descoberta do imóvel foram relevantes para a decisão de aquisição por parte dos AA. e proposta de preço.

31. Foi a 3ª R. quem apresentou aos AA. a minuta de contrato-promessa de compra que após discussão foi aceite.

32. Os AA. deram início às diligências necessárias ao licenciamento e execução das obras de renovação e reconstrução do imóvel identificado em 1..

33. Os AA. solicitaram a A... – Arquitecturas, Ldª a execução dos projectos e trabalhos preparatórios necessários à renovação do imóvel identificado em 1. entre os quais se incluía o levantamento topográfico do terreno.

34. Os AA. receberam o documento descrito em 17 de Junho de 2001.

35. Foram as RR. que requereram a rectificação do registo do imóvel nos termos que constam em 15..

36. Os AA. pagaram a A... – Arquitecturas Arquitecto FF a quantia de € 6.234,97.

37. Existia no imóvel identificado em 1. um muro que o separava da “Casa B”.

38. Após a assinatura do contrato-promessa de compra e venda, os AA. foram contactados pelo proprietário da “Casa B” no sentido de comparticiparem em 50% das despesas com a reparação do muro existente na propriedade.

39.  Os AA. acederam em comparticipar em 50% das despesas de reconstrução do muro em questão, não tendo pago qualquer importância em virtude da divergência de área detectada.

40. Convencidos que o muro em questão fazia a divisão das duas propriedades.

41. Convicção que foi reforçada pela circunstância de o proprietário da “Casa B” ter construído uma piscina junto ao referido muro.

42. Os AA. visitaram o imóvel, por diversas vezes, com a 3ª R..

43. Os AA. tomaram conhecimento quanto às construções e terreno que o compõem e ao respectivo estado de conservação.

44. Entre 01 de Abril de 2001 e 09 de Maio de 2001, foram acertados os pormenores sobre a legalização da cave e a realização das obras de remodelação.

45. A 3ª R. diligenciou no sentido de obter todas as informações relevantes a respeito da legalização da referida cave e comunicou tais factos aos AA. e às 1ª e 2ª RR..

46. A 3ª R. acordou com os AA. que todas as despesas de legalização da cave correriam por conta das 1ª e 2ª RR..

47. A 3ª R. facultou o acesso ao imóvel aos AA. sempre que solicitado por estes.

48. Em momento não concretamente apurado, mas entre Março e Julho de 2001, a 3ª R. disponibilizou uma cópia da chave para facilitar o início das obras de remodelação do referido imóvel dos AA..

49. Tendo os AA. continuado a visitar, por diversas vezes, o imóvel.

50. Apenas após a elaboração do levantamento topográfico referido em 17., a 3ª R. tomou conhecimento do referido, em que os AA. alegavam que a área do logradouro do imóvel constante da certidão do registo predial e da caderneta predial era superior à área real do logradouro.

51. Facto que, até àquela data, era totalmente desconhecido tanto das 1ª e 2ª Rés como da 3ª R.

52. A 3ª R. tentou então obter informação sobre o motivo de tal disparidade.

53. Em Maio de 2001, encontrava-se no logradouro do imóvel identificado em 1. material diverso relativo às obras de remodelação da “Casa B” e eram utilizados alguns dos seus anexos para o mesmo efeito, por parte do proprietário da “Casa B”.

54. Apenas a habitação do imóvel identificado em 1. dispõe de uma cave.

55. A 3ª R. forneceu aos AA. a planta da “Casa B” para facilitar a estes o planeamento inicial e sem rigor das obras que pretendiam realizar.

56. Os AA. não diligenciaram pela marcação da prometida escritura de compra e venda.

57. O levantamento topográfico do imóvel identificado em 1. foi a única diligência desencadeada pelos AA. para obterem o licenciamento de obras no prédio.

III – Fundamentação de direito

A apreciação e decisão do presente recurso de revista, delimitado pelas conclusões da alegação dos Recorrentes (art.ºs 684º, n.º 3 e 690º, n.º 1 do Cód. Proc. Civil[1]) passam pela análise e resolução da única questão jurídica por eles colocada a este tribunal e que consiste em dilucidar se o contrato-promessa de compra e venda que, com a mediação da sociedade Ré, celebraram com as Rés LL e DD é anulável por erro incidente sobre a área do logradouro do prédio objecto da promessa.

Como se sabe, o negócio jurídico, como acto de autonomia privada e acção que gera e põe em vigor uma regulação interprivada, com o inerente carácter criador de direito, supõe e exige da parte dos seus autores liberdade e discernimento. Contudo, na impossibilidade destes serem absolutos e ilimitados, a ordem jurídica contenta-se com a liberdade e discernimento normais, isto é, que são próprios das pessoas comuns ou da normalidade das pessoas e, nessa medida, para celebrar negócios jurídicos não é preciso ser dotado de excepcional inteligência ou ter formação superior. Basta ter o discernimento suficiente para se compreender o que se está a fazer e a liberdade suficiente para se poder optar entre celebrar, ou não, o negócio.

A este propósito, diz João de Castro Mendes (Teoria Geral do Direito Civil, Vol. II, AAFDL, 1995, pág. 106) «a ordem jurídica exige que a vontade se haja formado de um modo julgado normal e são, ou seja, livre, esclarecida e ponderada. Ao esclarecimento opõe-se o erro, um dos principais vícios na formação da vontade, a par do medo ou coacção moral e da incapacidade acidental”.

Por seu turno, Pedro Pais de Vasconcelos (Teoria Geral do Direito Civil, Almedina, 2010, 6ª edição, págs. 658/659) escreve que «a vontade negocial pode estar viciada na sua formação, no processo de volição e de decisão, por deficiência de esclarecimento ou de liberdade……e a parte cuja vontade tenha sido perturbada pode, se assim o desejar, libertar-se do negócio viciado, procedendo à sua anulação».

Ainda sobre a exigência do necessário esclarecimento, Heinrich Ewald Horster refere (A Parte Geral do Código Civil Português, Teoria Geral do Direito Civil, 6ª reimpressão, Almedina, pág. 567) que «o negócio jurídico apenas pode desempenhar as suas funções quando a vontade, que se manifesta através da declaração negocial, se formou de uma maneira esclarecida, assente em bases correctas, e livre, sem deformações provindas de influências exteriores. Se a vontade não se formou esclarecida e livremente, ela está viciada. Na sequência do vício, que fere a vontade, também a declaração negocial em que esta se manifesta fica viciada».

O vício da vontade negocial que se traduza ou envolva uma deficiência de discernimento do seu autor constitui, assim, erro que corresponde à ignorância ou falsa representação de uma realidade (a ignorância do que se ignora)[2] que poderia ter intervindo ou interveio entre os motivos da declaração negocial.

O erro, particularmente no quadro dos desvalores de um negócio jurídico, equivale sempre à ignorância de algo e implica, em geral, «uma avaliação falsa da realidade: seja por carência de elementos, seja por má apreciação destes»[3]. Fala-se a este respeito «no desconhecimento ou na falsa representação da realidade que determinou ou podia ter determinado a celebração do negócio»[4].

O erro situa-se, assim, na formação do negócio jurídico, portanto em momento logicamente anterior a este. E deve notar-se que «só existe erro quando falta um elemento ou a representação mental está em desacordo com um elemento da realidade existente no momento da formação do negócio jurídico.

Se o caso consiste na falsa representação duma realidade futura, que não chega a verificar-se este caso é chamado inexactamente error in futurum, mas não é de erro é de uma outra figura jurídica, a chamada pressuposição, e que poderá determinar a resolução ou modificação do contrato por alteração das circunstâncias (art.ºs 437º a  439º do Cód. Civil)»[5].

De salientar, desde já, que nem todo o erro é considerado juridicamente relevante e origina a anulação do negócio realizado. As necessidades de segurança e estabilidade do tráfico jurídico exigem que a relevância do erro como fundamento da anulação do negócio dependa de determinados pressupostos, ou seja, é necessário que «concorram certos requisitos»[6], sendo que, relativamente ao seu regime de relevância, «cada ordem jurídica está perante um dilema: se não atende ao erro, vale um resultado que o errante não quis, ficando assim violado o seu direito à autodeterminação a realizar por meio do negócio jurídico; se atende ao erro, fica desiludida a expectativa da outra parte que confiou naquilo que entendeu e é perturbada a segurança do comércio jurídico»[7].

Para a solução desse dilema e na falta de uma solução geral tida por correcta, cada ordem jurídica opta, de acordo com a mentalidade dos seus destinatários e dentro do seu sistema, por estabelecer os critérios de relevância do erro[8] que considera ajustados e que o Cód. Civil condensa nos art.ºs 247º a 252º, interessando, para o caso em apreço, o erro vício na formação da vontade, também chamado, por vezes, erro-vício, ou erro-motivo, para o distinguir do erro na declaração, figura de divergência entre a vontade real e a vontade declarada, prevista no art.º 247º do Cód. Civil e a que se chama correspondentemente erro obstativo ou erro-obstáculo.

Este recai apenas sobre o elemento externo da declaração e afecta o comportamento declarativo, isto é, a exteriorização da declaração, produzindo uma divergência entre a vontade, que não está viciada ou deformada, e o que é declarado. Trata-se, portanto, de um erro no processo de formulação ou de manifestação da vontade, enquanto o erro-vício, que, frise-se, é o que está suscitado no caso vertente, incide só sobre a própria vontade (elemento interno) e não gera qualquer divergência entre esta e a declaração, que se apresenta em perfeita conformidade ou consonância com aquela. A vontade é que se encontra mal formada ou viciada na sua formação por erro, logo mal esclarecida, mas coincide com a declaração exteriorizada[9].

Manuel A. Domingues de Andrade[10] caracteriza-o, nos moldes seguintes: “[o] erro-vício consiste na ignorância (falta de representação exacta) ou numa falsa ideia (representação inexacta), por parte do declarante, acerca de qualquer circunstância de facto ou de direito que foi decisiva na formação da sua vontade, por tal maneira que se ele conhecesse o verdadeiro estado das coisas não teria querido o negócio, ou pelo menos não o teria querido nos precisos termos em que o concluiu”.

Fazendo, agora, recair a nossa atenção sobre o caso sub-judice, temos que os Autores/Recorrentes celebraram, com a mediação da sociedade Ré, um contrato-promessa de compra e venda (art.º 410º, n.º 1, do Cód. Civil) com as Rés LL e DD, tendo por objecto um prédio urbano, com um logradouro, cuja área real, como evidenciam os factos provados e elencados sob os n.ºs 10, 11, 15, 17 e 18, não correspondia à que constava dos cadastros tributário e registal.

Sucede, porém, que a diferença de área (menos 97m2), só veio a ser conhecida, posteriormente, por todos os intervenientes no contrato-promessa, como se alcança dos factos provados e elencados sob. os n.ºs 50 e 51, sendo perfeitamente normal e natural que os Autores/Recorrentes, na qualidade de promitentes-compradores, tenham formado a sua vontade, com base na área mencionada nos cadastros tributário e registal, e avançaram para a concretização do contrato-promessa em erro sobre esse ponto.

Esse erro incidente sobre o objecto do negócio, dado que a área, definida como a quantidade de espaço bidimensional correspondente à superfície, apresenta-se como conceito identitário central da realidade espacial correspondente ao prédio e seu logradouro e integra também a identificação do bem prometido comprar pelos Autores/Recorrentes, não confere a estes, ao invés do que sustentam, o direito de, como pretendem, obter a anulação do contrato-promessa.

Com efeito, dispõe o art.º 251.º do Cód. Civil que «o erro que atinja os motivos determinantes da vontade, quando se refira …..ao objecto do negócio, torna este anulável, nos termos do art.º 247.º, que, por seu turno, exige para a respectiva relevância anulatória dois requisitos ou pressupostos: a essencialidade[11] e a cognoscibilidade.

Resulta destes normativos que o negócio jurídico só é anulável por erro sobre o objecto se esse erro for tal que sem ele a parte não teria celebrado o negócio, ou não o teria celebrado com aquele conteúdo. É esse o sentido da essencialidade a que se refere o art.º 247º do Cód. Civil e, concluindo-se que a parte teria celebrado o negócio do mesmo modo, ainda que não tivesse incorrido em erro, não haverá já fundamento para o anular.

Ainda que necessária a essencialidade não é, todavia, suficiente para fazer desencadear o efeito anulatório. Para além da essencialidade é também necessário que o declaratário conhecesse ou não devesse ignorar a essencialidade, para o declarante, do elemento sobre que incidiu o erro.

A parte que errou tem, pois, para obter a anulação do negócio «o ónus de demonstrar este duplo requisito: que se não tivesse ocorrido o erro, não o teria celebrado ou não o teria celebrado desse modo, e que a outra parte sabia ou não devia desconhecer que assim era». De outro, se o negócio jurídico pudesse ser anulado por erro sobre uma qualquer qualidade do objecto, que fosse essencial para a parte que errou, mas cuja essencialidade fosse surpreendente ou imprevisível, a contraparte no negócio ficaria injusta e excessivamente desprotegida e daí que o art.º 247º do Cód. Civil imponha à parte que invoca o erro o ónus de alegar e demonstrar que, nas circunstâncias do negócio, a outra parte conhecia, ou não devia ignorar, que o quid sobre o qual o erro incidiu era para ela essencial» [12].

Transpondo estas linhas directrizes para o caso vertente, em que os Autores/Recorrentes se batem pela anulação do contrato-promessa celebrado, através da mediação da sociedade Ré, com as Rés LL e DD, cabia àqueles alegar e demonstrar não só a essencialidade, para eles, da área do logradouro e que esse aspecto em que erraram era conhecido ou não devia ser ignorado das promitentes vendedoras.

Ora, como se vê dos factos provados e realça o acórdão recorrido, como, aliás, o fizera já a sentença proferida na 1ª instância, não lograram os Autores/Recorrentes demonstrar que as promitentes vendedoras conhecessem a essencialidade do elemento sobre que recaiu o erro de que todos se aperceberam só posteriormente (cfr. n.ºs 50º e 51º do elenco factual provado), o que implica o inêxito da pretensão anulatória do contrato-promessa (art.º 342º, n.º 1, do Cód. Civil) e a consequente restituição do que foi pago, a título de sinal, e demais despesas reclamadas, ainda que com base no instituto do enriquecimento sem causa (art.º 473º, n.ºs 1 e 2, do Cód. Civil).

Por um lado, parte dessas despesas, as relativas à construção do muro divisório, nem sequer chegaram a ser suportadas pelos Autores/Recorrentes, como se alcança do facto provado sob o n.º 39, e, por outro, as despesas referentes ao levantamento topográfico que mandaram fazer não envolveram nem correspondem a qualquer enriquecimento por banda das Rés, cujos patrimónios, saliente-se, permaneceram imutáveis e não saíram sequer valorizados com essa iniciativa da exclusiva responsabilidade dos Autores/Recorrentes, a quem cabe arcar com o inerente encargo.

Com efeito, o enriquecimento sem causa depende ou supõe, como fonte de obrigação (473º, n.ºs 1 e 2, do Cód. Civil), a verificação cumulativa de três requisitos: existência de um enriquecimento; enriquecimento esse obtido à custa de alguém; e falta de causa justificativa[13], pelo que a falta de um deles, no caso o enriquecimento, faz obviamente cair por terra a pretensão restitutiva formulada pelos Autores/Recorrentes, que nele injustificadamente se alicerçara.

Resta, por fim, dizer que, ainda que o contrato-promessa fosse anulado, nunca a sociedade Ré teria de restituir o sinal pago, na medida em que interveio como mediadora e, ao contrário do que defendem os Autores/Recorrentes, não agiu em representação das Rés LL e DD.

Na verdade, a mediação é, na nossa lei, assumida como objecto de um contrato – o contrato de mediação – de que a imediação imobiliária constitui uma das valências[14] e que, ao tempo em que ocorreram os factos objecto deste processo, era disciplinada pelo DL n.º 77/99, de 16 de Março, com as alterações introduzidas pelo DL n.º 258/2001, de 25 de Setembro[15]. Caracteriza-se, como assinala Pedro Pais de Vasconcelos[16], pela «intermediação entre o comprador e o vendedor, ou entre as partes num outro tipo de negócio, em que o intermediário – o mediador – aproxima as partes no negócio, põe-nas em presença, por vezes até intervém na negociação para o promover, mas não participa no negócio. O mediador é um facilitador……não actua por conta de nenhuma das partes, embora contratado por uma delas…..mas nunca representa qualquer delas no negócio que vem a ser celebrado».

Também António Pinto Monteiro[17] refere que o mediador «limita-se a aproximar as pessoas e a facilitar a celebração do contrato…….e ao contrário do agente, que actua por conta do principal – “representando-o” economicamente – o mediador age com imparcialidade, no interesse de ambos os contraentes, sem estar ligado a qualquer deles por relações….de dependência ou de representação…é tipicamente uma pessoa independente».

E de igual opinião comunga António Menezes Cordeiro[18], quando caracterizando-a, escreve que «em sentido amplo a mediação significa o acto ou efeito de aproximar voluntariamente duas ou mais pessoas, de modo a que, entre elas, se estabeleçam negociações que possam conduzir à celebração de um contrato definitivo. Em sentido técnico ou estrito, a mediação reclama ainda que o mediador não represente nenhuma das partes a aproximar …».

Deste modo, a sociedade Ré, na qualidade de mediadora, nunca pode ser considerada, como sustentam os Autores/Recorrentes, representante das Rés promitentes vendedoras e não poderia de modo algum, mesmo que houvesse lugar à anulação do contrato-promessa, ser-lhe imposta co-responsabilidade solidária pela restituição do sinal pago.

Em suma, não colhe a argumentação tecida pelos Autores/Recorrentes e improcede tudo o que em contrário alegaram e concluíram na sua minuta recursiva, o que determina o consequente inêxito da revista.

Pode, assim, concluir-se que:
a) A vontade negocial deve ser livre, esclarecida, ponderada e formada de um modo julgado normal e são.
b) O erro-vício ou erro-motivo, que se traduz num erro na formação da vontade e do processo de decisão, existe quando ocorre uma falsa representação da realidade ou a ignorância de circunstâncias de facto ou de direito que intervieram nos motivos da declaração negocial, de modo que, se o declarante tivesse perfeito conhecimento das circunstâncias falsas ou inexactamente representadas, não teria realizado o negócio ou tê-lo-ia realizado em termos diferentes.
c) É relevante saber se o erro foi factor determinante da declaração negocial emitida – essencialidade do elemento sobre que incidiu o erro – e se o destinatário da declaração conhecia ou devia conhecer essa essencialidade.
d) A demonstração dos factos integradores da essencialidade e respectiva cognoscibilidade, por constituírem requisitos de relevância do erro e fundamento da anulabilidade do negócio (art.ºs 251.º e 247.º, ambos do CC), constitui ónus de quem invoca o erro (art.º 342.º, n.º 1, do CC).
e) O enriquecimento sem causa, como fonte de obrigação, supõe a verificação cumulativa de três requisitos: existência de um enriquecimento; enriquecimento esse obtido à custa de alguém; e falta de causa justificativa.
f) O mediador é um intermediário que aproxima as partes no negócio, põe-nas em presença e facilita o negócio, mas não actua por conta de nenhuma das partes e nunca representa qualquer delas no negócio que vem a ser celebrado.

IV – Decisão

Nos termos expostos, decide-se o seguinte:
a) negar a revista;
b) confirmar o acórdão recorrido; e
c) condenar os Recorrentes nas custas.


*

Lisboa, 15 de Maio de 2012


António Joaquim Piçarra (relator)

Sebastião Póvoas

Alves Velho (* com dispensa de visto)

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[1] Na versão anterior à introduzida pelo DL n.º 303/2007, de 24 de Agosto, uma vez que o processo foi instaurado antes de 01 de Janeiro de 2008, data em que entrou em vigor tal diploma legal (cfr. os seus art.ºs 11º, n.º 1, e 12º, n.º 1).
[2] Cfr, a este propósito, J. Dias Marques, Noções Elementares de Direito Civil, 6ª edição, 1977, pág. 84, e José de Oliveira Ascensão, Direito Civil Teoria Geral, Volume II, 2ª edição, Coimbra Editora, pág. 135.  
[3] António Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil Português, I, Parte Geral, Tomo I, 3ª ed., Coimbra, 2005, pág. 807.
[4] Luís A. Carvalho Fernandes, Teoria Geral do Direito Civil, II, 4ª ed., Lisboa, 2007, p. 199.
[5] Cfr, neste sentido e citando Windscheid, João de Castro Mendes, obra citada, págs. 108/109, e Carlos Alberto da Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, Coimbra Editora, 1976, pág. 387.
[6] João de Castro Mendes, obra citada, pág. 109,
[7]Cfr. Heinrich Ewald Horster, obra citada, págs. 568/569.
[8] Cfr. Heinrich Ewald Horster, obra citada, pág. 569, citando, a este propósito, Flume II, e João de Castro Mendes, obra citada, pág. 138, onde realça o afastamento na nossa lei das legislações alemã e francesa, que não atribuem «qualquer relevância ao erro sobre qualquer motivo».
[9] Cfr, neste sentido, Carlos Alberto da Mota Pinto, obra citada, pág. 386, Heinrich Ewald Horster, obra citada, págs. 569/570, Fernando Andrade Pires de Lima e João de Matos Antunes Varela, Código Civil anotado, Volume I, 1967, págs. 159 e 162, Pedro Pais de Vasconcelos, obra citada, pág. 659, e José de Oliveira Ascensão, obra citada, pág. 136.  
[10] Teoria Geral da Relação Jurídica, vol. II, 9ª reimpressão, Coimbra, 2003, pág. 233.
[11] Alguma doutrina designa este requisito de relevância do erro como causalidade (error causam dans) – João de Castro Mendes, obra citada, págs. 109, 121 e 134, Luís A. Carvalho Fernandes, obra citada, págs. 151/154, e José de Oliveira Ascensão, obra citada, pág. 144.
[12] Cfr, neste sentido, Pedro Pais de Vasconcelos, obra citada, págs. 660 e 661.
[13] Cfr, a este propósito, Inocêncio Galvão Telle, Direito das Obrigações, 7ª edição, Reimpressão, Coimbra Editora, pág. 195, Mário Júlio de Almeida Costa, Direito das Obrigações, 12ª edição, Almedina, pág. 491, e Luís Manuel Teles de Menezes Leitão, o enriquecimento sem causa no Código Civil de 1966, in Comemorações dos 35 anos do Código Civil, Volume III, Coimbra Editora, 2007, págs. 15 e 16.
[14] Além desta, encontram-se previstas, nomeadamente, a mediação financeira (art.ºs 289º e sgts. do CVM), a mediação de emprego (DL n.º 124/89, de 14 de Abril), a mediação monetária (DL n.º 110/94, de 28 de Abril) e a mediação de seguros (DL n.º 144/2006, de 31 de Julho) 
[15] Actualmente, vigora o DL n.º 211/2004, de 20 de Agosto, que revogou o DL n.º 77/99, de 16 de Março.
[16] Direito Comercial, Volume I, 2011, Parte Geral, Contratos Mercantis, Almedina, pág. 197.
[17] Contratos de Distribuição Comercial, Almedina, 2002, pág. 102.
[18] Do contrato de mediação, na revista, “o Direito”, ano 139º, 2007, Tomo III, pág. 517.