Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
174/13.0YYPRT-A.P1.S1
Nº Convencional: 6ª. SECÇÃO
Relator: FERNANDES DO VALE
Descritores: GARANTIA BANCÁRIA
GARANTIA AUTÓNOMA
TRANSMISSÃO
CESSÃO DE CRÉDITOS
PRAZO
Data do Acordão: 09/27/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO BANCÁRIO - GARANTIAS NO DIREITO BANCÁRIO / GARANTIAS BANCÁRIAS.
DIREITO CIVIL - RELAÇÕES JURÍDICAS / FACTOS JURÍDICOS / NEGÓCIO JURÍDICO - DIREITO DAS OBRIGAÇÕES / TRANSMISÃO DE CRÉDITOS / CESSÃO DE CRÉDITOS.
Doutrina:
- Almeida Costa e Pinto Monteiro, “Garantias bancárias. O contrato de garantia à 1ª solicitação”, Col. Jur. 1986 – 5.º/17 e ss..
- Cláudia Trindade, in “Estudos em Homenagem ao Prof. Dr. José Lebre de Freitas”, Vol. II, 1ª Ed., Coimbra Editora, 68 a 76.
- Galvão Telles, Manual dos Contratos em Geral, Refundido e Actualizado, 506 e ss.; “Garantia bancária autónoma”, O Direito, Ano 120º (1988), III-IV (Julho-Dezembro), 275-293 (reproduzido em Edições Cosmos, Livraria Arco-Íris, Lisboa, 1991)
- Jorge Duarte Pinheiro, “Garantia bancária autónoma”, na ROA, 52.º, 448.
- José Maria Pires, Direito Bancário, Vol. II, 285/286.
- Luís Manuel Teles de Menezes Leitão, Garantias das Obrigações, 2012, 4.ª Ed., Almedina, 130.
- Manuel Castelo Branco, “A garantia bancária autónoma no âmbito das garantias especiais das obrigações”, na ROA, 53.º, 80.
- Miguel Brito Bastos, in “Estudos em Homenagem ao Prof. Dr. Sérvulo Correia”, Vol. III, FDUL, 2010, 533 a 555.
- Pedro Romano Martínez, in “Estudos em Homenagem ao Prof. Dr. I. Galvão Telles”, Vol. II, Direito Bancário, Almedina, 280 a 285.
- Pestana de Vasconcelos, Direito das Garantias, 2015 – 2.ª Ed., Almedina, 137/138.
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 217.º, N.º1, 224.º, 236.º, 238.º, N.º1, 582.º, N.º1.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

-DE 05.06.2003, ACESSÍVEL EM WWW.DGSI.PT ;
-DE 31.03.2004, ACESSÍVEL EM WWW.DGSI.PT ;
-DE 24.05.2007, ACESSÍVEL EM WWW.DGSI.PT .

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ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA:
-DE 11.12.2002 (COL. 5.º/97).
Sumário :
I - A garantia bancária autónoma não é, em princípio, prestada “intuitu personae” e não é inseparável da pessoa do cedente de créditos, transmitindo-se, pois, salvo convenção em contrário, para o cessionário daqueles, nos termos previstos no art. 582º, nº1 do CC.

II - Não assim no que toca ao devedor/ordenante da prestação da garantia, cuja solvabilidade e empenhamento no cumprimento da obrigação abarcada pelo contrato-base deverá interessar sobremaneira ao garante e de quem este diligenciará obter, desde logo, garantias adequadas de reembolso, no caso de contra o mesmo ter de exercer o correspondente direito de regresso.

III - Não operando a transmissão “automática” prevista no art. 582º, nº1 do CC, pode a mesma decorrer de declaração expressa ou tácita do garante, nos termos gerais previstos no art. 217º do CC.

IV - Quando tenha sido acordado um prazo de vigência da garantia bancária autónoma, o seu significado determina-se por interpretação do respetivo contrato, devendo, na dúvida, entender-se que se a garantia assegurar um conjunto de obrigações futuras, ela abrange todas as obrigações constituídas nesse período de tempo, quer se vençam dentro dele, quer já depois do seu decurso, com prevalência, em princípio, da data da execução da garantia (reclamação por parte do garantido) sobre a da respetiva receção ou chegada ao conhecimento do garante.

Decisão Texto Integral:

Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça

1 - Em 11.02.13, por apenso à ação executiva, sob a forma comum e para pagamento de quantia certa, com o nº supra epigrafado, pendente ma 3ª Secção do 1º Juízo de Execução da comarca do Porto, instaurada por “BANCO AA - Factoring, S. A.” contra (a então) “BANCO BB, S. A.”, veio esta deduzir oposição à execução, requerendo também a intervenção principal de “CC, S. A”, representada pelo AI (Administrador de Insolvência), Dr. DD, ou, entendendo-se diferentemente, a intervenção acessória da mesma sociedade, terminando por pedir a sua absolvição do pedido exequendo e requerer a suspensão da ação executiva, contra a sua prestação de caução.

O banco opoente impugnou parte da factualidade alegada no requerimento executivo, fundamentando, por outro lado, as suas pretensões na alegação, em síntese, do seguinte:

                                                         /

--- “Ensil Meci, S. A.”, insolvente no Proc. nº 484/12.4TYLSB, do 1º Juízo do Tribunal de Comércio de Lisboa, é ordenante da garantia bancária autónoma exequenda, sendo beneficiária da mesma garantia “EE, S. A.”, que, alegadamente, terá cedido à exequente o crédito exequendo;

--- O opoente garantiu o valor de € 221 000,00, no caso de “CC, S. A.” “vir a dever alguma quantia no âmbito do contrato de fornecimento”;

--- A garantia exequenda, autónoma e à primeira solicitação, pretendia acautelar o pagamento dos fornecimentos efetuados no âmbito do “contrato referente ao fornecimento de cabo de aço ACSR 595 Zambeze para a empreitada da linha de ...”;

--- Nunca foi alterado o beneficiário da garantia prestada pelo opoente, sob pena de extinção da garantia bancária;

--- Ainda que assim não fosse, aquando da interpelação efetuada pela exequente (03.04.12), a garantia bancária já havia caducado, pois que apenas era válida até 31.03.12.

A oposição foi liminarmente recebida, sendo a exequente notificada para, querendo, contestar e, nesse prazo, pronunciar-se sobre a requerida intervenção, tendo-se também indeferido a, igualmente, requerida suspensão da ação executiva.

A exequente contestou e apresentou um parecer da autoria de insigne Mestre civilista e sintonizado com a respetiva postura processual, emergindo do mesmo articulado as seguintes posições da contestante:

--- Opôs-se ao deferimento do mencionado incidente de intervenção deduzido pela opoente;

--- Pugnou pela improcedência da oposição à execução, alegando que:

- Notificou a opoente de que todos os direitos emergentes da garantia bancária haviam sido sub-rogados na exequente em virtude da cessão dos créditos garantidos, tendo a opoente dado o seu acordo a que fosse emitido um novo documento a titular a garantia em que se suprimiu a referência, constante do primitivo, no sentido de que a garantia não era endossável ou transmissível;

- A opoente, não obstante a “vasta” correspondência trocada com a exequente, nunca questionou a transmissão da garantia;

- Mesmo que não se entenda ter havido consentimento na transmissão da garantia para a exequente ou abuso de direito da opoente na invocação apenas em sede de execução de tal questão, deve entender-se que a cessão dos créditos à exequente importou a transmissão, de forma automática, da garantia bancária prestada pela opoente;

- Interpelou a opoente para proceder ao pagamento da quantia de € 198 762,63, por carta registada com aviso de receção expedida antes de 31.03.12 e recebida pela opoente, em circunstâncias que suscitam algumas dúvidas, em 03.04.12, sendo certo que a garantia cobre todas as obrigações constituídas até 31.03.12, como sucede relativamente às obrigações exequendas, devendo a reclamação para a execução da garantia efetuar-se até 31.03.12 apenas no que concerne às obrigações vencidas até essa data;

- Exigir que a carta contendo a reclamação da exequente fosse recebida num dia em que os serviços postais se encontravam encerrados constitui um abuso de direito, por excesso manifesto dos limites da boa fé;

- De todo o modo, a carta só não foi recebida no dia 02.04.12 por culpa da opoente.

Apresentou a opoente articulado de resposta em que se pronunciou sobre a litigância de má fé a si imputada pela exequente, bem como sobre a exceção perentória de abuso de direito.

Após indeferimento da requerida intervenção, foi proferido despacho saneador tabelar, tendo-se dispensado a seleção da matéria de facto.

Prosseguindo os autos a sua tramitação, veio, a final, a ser proferida (em 18.07.14) sentença que, julgando procedente a oposição, declarou extinta “a ação executiva”.

Por seu acórdão de 15.06.15 e na procedência da apelação interposta pela exequente, a Relação do Porto revogou a sentença recorrida, julgando totalmente improcedente a oposição deduzida à execução.

Daí a presente revista interposta pela opoente-apelada, visando a revogação do acórdão recorrido, conforme alegações culminadas com a formulação das seguintes conclusões:

                                                    /

1ª - Não se provou que o recorrente tenha aceite a transmissão da posição de beneficiário da garantia bancária, da beneficiária originária “EE, S. A.” para o recorrido, pelo que essa garantia não se transmitiu para este;

2ª - Uma vez que a garantia bancária em que se baseia a execução prestada pelo banco recorrente não se transmitiu para o recorrido este não dispõe de título executivo que lhe permita exigir do banco recorrente a quantia exequenda;

3ª - Quer o documento anexo à carta de 9.11.2011, quer o documento anexo à carta de 22.11.2011 (nos quais se fundamenta), são datados de 3.11.2011, ou seja, momento anterior àquele em que o ora recorrido alega ter dado conhecimento à recorrente da transmissão da dita garantia;

4ª - Relativamente às cartas aludidas, o FF nunca sequer acusou a recepção de tais missivas - muito menos tendo aceite a suposta transmissão da garantia, face à alegada cessão de créditos entre a beneficiária original e o recorrido;

5ª - O silêncio do recorrente não pode valer como meio declarativo, ou sequer pode do mesmo extrair-se uma aceitação tácita daquela transmissão da garantia bancária;

6ª - A eliminação do parágrafo, que retirou a blindagem à não transmissão da garantia, abrindo a porta à possibilidade de transmissão, não significou que o FF tenha autorizado a transmissão da garantia para a ora recorrida BANCO AA - CRÉDITO, S.A.;

7ª - A eliminação do parágrafo onde se afirmava que «Esta garantia não é endossável nem transmissível» ocorreu a solicitação da cliente do recorrente, ou seja, da CC, não tendo havido qualquer negociação com a ora recorrida;

8ª - Não é possível retirar uma "declaração tácita de aceitação ou consentimento de transmissão de garantia da esfera jurídica da primitiva beneficiária, para a sociedade recorrente" da simples retirada do texto da garantia da frase que proibia o seu endosso ou transmissão (genericamente);

9ª - Mesmo com a retirada de tal parágrafo qualquer transmissão da garantia, ficava sempre dependente - conforme ficou demonstrado - da avaliação e aceitação do banco (uma vez que não está em causa uma transmissão automática);

10ª - Nunca foi vontade das partes determinar a transmissão automática da garantia ou afastar o banco garante de uma eventual transmissão;

11ª - No caso dos autos não existem circunstâncias concludentes no sentido dessa vontade negocial de aceitar tacitamente tal cessão, por parte do recorrente, porquanto os documentos juntos pelo recorrido, não comprovam a notificação exigida na lei e não constituem, por si só, elementos suficientes para se afirmar que houve aceitação da parte do recorrente;

12ª - Quem procura retirar uma determinada interpretação daquele texto (ou da alteração ao mesmo) nem sequer foi parte naquele contrato, não fazendo mais do tentar extrair das declarações daquelas que foram as partes do contrato (a recorrente e a EE, S.A.) o significado que lhe é mais conveniente;

13ª - Em momento algum, foi alegado e muito menos demonstrada a existência de quaisquer negociações entre o recorrente e o recorrido;

14ª - Provou-se que o recorrente jamais teve intenção de aceitar a cessão alegadamente operada entre o recorrido e EE, S.A., bem como, foi provada e demonstrada nos autos a existência e tramitação do especifico procedimento de alteração de beneficiário, sempre idêntico e sempre levado a cabo em situações de alteração de beneficiários de garantias, devidamente comunicadas ao banco recorrente;

15ª - Não é credível a presunção por parte do recorrido que o recorrente aceitou a cessão de créditos, quando bem sabia, porque também é uma instituição financeira, que existem trâmites a seguir - que não cumpriu -, que há uma aprovação a ser feita - que nunca foi sequer requerida -, que a alteração de beneficiário de uma garantia tem consequências e formalidades próprias;

16ª - Ainda que se entenda que foi dado conhecimento ao Banco Recorrente daquela cessão, tal não equivale à aceitação de tal negócio por parte deste, porquanto inexiste qualquer manifestação nesse sentido;

17ª - Não foi feito qualquer pedido ao recorrente para dar acordo a qualquer cessão - e o recorrido nem sequer alega tê-lo feito...

18ª - Depende de parecer do banco a posição de beneficiário da garantia ser alterada e ser aceite a cessão, face ao contrato de alto risco em causa, no âmbito do qual se encontra estipulada uma clara cláusula intuitu personae (a clausula "on first demand");

18ª - Como instituição bancária não é defensável que o recorrido pretenda que se aceite que desconhecia os procedimentos, dificuldades e implicações inerentes a uma suposta cessão de garantia na qual não teve intervenção o banco garante, à qual este jamais expressou a sua aceitação, pelo contrário;

19ª - As presunções em que o douto Tribunal da Relação do Porto baseia a sua decisão, salvo o devido respeito, não têm qualquer apego na prova que existe nos autos, nem tampouco na Jurisprudência dos Tribunais Superiores;

20ª - Aquando da reclamação supostamente efectuada pelo recorrido a garantia havia já caducado;

21ª - Face à matéria de facto provada e ao ónus de prova, podemos ter por certo que se verificou a caducidade, procedendo este alegado fundamento de recusa de pagamento das garantias bancárias;

22ª - A aceitar a tese do recorrido, ora sufragada pelo Tribunal da Relação do Porto, de nada serviria apor data de validade/caducidade no contrato de garantia e abrir-se-ia a porta à possibilidade de interpelações ad eternum ao abrigo daquela - mesmo em situações em que estejam em causa facturas que, como ficou provado ser o caso dos autos, há muito se encontravam vencidas;

23ª - Tal entendimento, põe em causa o próprio instituto das garantias bancárias autónomas, pela insegurança que cria no comércio jurídico e nas relações entre empresas e instituições bancárias, e a própria liberdade e vontade negocial - e repare-se que tudo isto é posto em causa por uma entidade que não foi sequer parte neste contrato;

24ª - Ao desconsiderar o prazo de caducidade acordado pelas partes todo o contrato fica em causa, ficando completamente desprotegido o interesse do garante - curiosamente, a única parte efectiva e originária do contrato que se encontra nestes autos;

25ª - Face ao entendimento do Tribunal da Relação do Porto fica por explicar a exigência constante do texto da garantia no sentido de que a interpelação para pagamento seja realizada através de carta com aviso de recepção;

26ª -  O aviso de recepção é elemento importante e relevante apenas e só nos casos em que existe interesse em verificar a data em que a missiva remetida é efectivamente recebida pelo destinatário;

27ª - O facto de ser exigido aviso de recepção na carta de interpelação para honrar a garantia é claramente demonstrativo do facto de se tratar de declaração receptícia;

28ª - O prazo de interpelação em causa consubstancia um prazo de caducidade (art.º 298º, nº 2 do Cód. Civil), veja-se que o próprio texto da garantia o refere;

29ª - A reclamação aqui em discussão, representando a forma pela qual o titular (?) do direito exprime a intenção de exercício do direito - que, como vimos, não era sequer legitimo, face à intransmissibilidade da garantia - é uma declaração receptícia, que só produz efeitos quando é recebida pelo destinatário, pelo que a data relevante para aferir da caducidade é a data de recepção da comunicação e não a data de envio;

30ª - Face à prova produzida, nomeadamente, aos elementos constantes dos autos, e ao teor do texto da garantia não pode ser outra a conclusão senão a de que a obrigação de cumprir só se tornaria efectiva com a recepção, pelo Banco recorrente, da carta expedida pelo beneficiário - que por mera hipótese académica se assume a exequente - e que apenas foi recepcionada em 03.04.2012;

31ª - Se as partes tivessem optado por outra data de caducidade ou outra forma de reclamação ou de delimitação da validade da garantia, certamente que o teriam feito constar expressamente do contrato...

32ª - Assim, estando aposto, como está, na garantia, um termo final certo, a verificação de tal termo desobriga o banco, caducando, naturalmente a garantia;

33ª - O acórdão recorrido não podia interpretar o contrato de garantia em causa nos autos no sentido de que, mesmo depois daquela data, de 31.03.2012, o recorrido ainda podia reclamar o pagamento da garantia;

34ª - O acórdão recorrido faz, assim, uma errada e não fundamentada aplicação do Direito, violando o disposto nos arts. 236º, 238º, 217º, 218º, 405º, 406º do Código Civil, pelo que deverá ser revogado e substituído por outro que procedendo a uma correcta apreciação dos factos provados e Direito aplicável, declare a procedência da oposição à execução deduzida pelo recorrente e, consequentemente, determine a extinção da acção executiva movida pelo recorrido, improcedendo o pedido formulado nos autos;

Termos em que, e nos demais que V. Exas. se dignarão suprir, deverá ser concedido provimento ao presente recurso e, consequentemente, revogado o acórdão proferido, ordenando-se a sua substituição por outro que considere totalmente procedente a oposição à execução deduzida pela recorrente, e consequentemente, extinga a acção executiva movida pelo recorrido, para todos os legais e devidos efeitos,

Assim se fazendo a costumada Justiça.

Contra-alegando, defende a recorrida a manutenção do julgado, tendo, ainda e sob invocação do preceituado no art. 636º, nº1 do CPC[2], requerido a ampliação do âmbito do recurso, conforme alegações culminadas com a formulação das seguintes conclusões:

                                                        /

I - A cessão dos créditos importa a transmissão, para si e de forma automática, da garantia bancária prestada pela opoente/recorrente, nos termos do disposto no art. 582º, nº1 do CC (assim vêm entendendo, de forma unânime, a Jurisprudência dos Tribunais superiores e, de forma claramente maioritária, a Doutrina), sendo assim que tal preceito legal deveria ter sido aplicado ao caso dos autos. Esta questão nada tem que ver com a de situações, totalmente distintas, de cessão da posição contratual (sendo certo que todos (sublinhe-se, todos) os acórdãos citados pela opoente/recorrente dizem apenas respeito a esta figura jurídica da cessão contratual e não à figura que, de facto, se discute nos autos (i. é, a da cessão de créditos), pelo que, salvo o devido respeito, nem se entende bem o objetivo da sua citação por parte da opoente/recorrida, que, conscientemente, quer confundir ”a beira da estrada com a estrada da  Beira”);

II - É a própria lei, no nº1 do art. 582º do CC, que esclarece logo a questão da transmissibilidade automática das garantias bancárias em caso de transmissão do crédito garantido, ao prever que “Na falta de convenção em contrário, a cessão do crédito importa a transmissão, para o cessionário, das garantias e outros acessórios do direito transmitido, que não sejam inseparáveis da pessoa do cedente, incluindo esta norma as garantias bancárias autónomas (e não apenas, atenta a técnica legislativa utilizada de enunciação legal e não taxativa, as garantias especiais das obrigações previstas especificamente no CC);

III - Assim e conforme entendeu este Supremo, em Ac. de que foi relator o Ex. mo Sr. Juiz Conselheiro OLIVEIRA BARROS, numa situação em tudo semelhante à ora posta em crise, em que também estava em causa a cessão de créditos ao abrigo de um contrato de factoring, garantidos por garantia bancária “Sem apoio na letra ou texto da lei, simplesmente referido a garantias, a interpretação restritiva propugnada pelo Banco demandado para o nº 1 do art. 582º briga, desde logo, de óbvio modo, com bem conhecida máxima segundo a qual «ubi lex non distinguit nec nos distinguere  habemus». Da mesma forma havia entendido já o Ac. da Rel. de Lx, de 11.12.02 (confirmado pelo supracitado Ac. do STJ): “A garantia bancária autónoma deve considerar-se incluída nas garantias a que se refere o art. 582º, nº1 do CC, pelo que segue, por força da lei - salvo convenção em contrário - o crédito principal sem necessidade de a transmissão de créditos ser notificada ao garante;

IV - Não se devem aplicar normas nem recorrer a decisões jurisprudenciais relativas à cessão da posição contratual para fundamentar uma decisão - no caso dos presentes autos - que diz respeito, indubitavelmente, a uma cessão de créditos;

V - Não é correto afirmar-se que as garantias prestadas pelo banco recorrente são inseparáveis da pessoa do cedente, para efeitos do art. 582º do CC, porquanto, embora se conceda que a um banco não é indiferente a identificação da entidade garantida (que, normalmente, é um seu cliente), o mesmo já não se poderá dizer quanto à entidade beneficiária. Com efeito, o banco recorrente assumiu uma obrigação de pagamento até ao limite da importância garantida, sendo-lhe indiferente a quem a pagará. Apenas lhe interessa quem é a ordenante e conhecer a respetiva solvabilidade, uma vez que é a esta que terá de exigir o reembolso daquilo que, eventualmente, tiver de pagar por força do acionamento da garantia. Não há uma razão pessoal, de confiança, que seja fundamental - entenda-se, sem a qual a opoente/recorrente não contrataria - na relação do banco com a beneficiária (que é o que, neste caso, releva);

VI - A opoente/recorrente, em momento algum, questionou a aceitação da transmissão da garantia para a exequente/recorrida, tendo, aliás, trocado vasta correspondência com a exequente, a propósito da garantia bancária, após ter sido notificada da cessão de créditos e consequente transmissão da garantia à exequente: a única “justificação”, ainda que inválida e ilegítima, que a opoente/recorrente sempre - saliente-se, sempre - utilizou para se recusar a fazer o pagamento foi a alegada (mas inexistente) caducidade da garantia bancária e jamais a sua intransmissibilidade;

VII - Ao fazê-lo, única e exclusivamente, neste caso e apenas já em sede de oposição à execução, após 11 meses de troca de vasta correspondência entre as partes a propósito da reclamação do pagamento devido, não pode senão ser entendido como um manifesto abuso de direito por parte da opoente/recorrente, nas modalidades de venire contra factum proprium e supressio (Cfr. art. 334º do CC), por exceder, de forma clamorosa, os limites que à opoente/recorrente cumpria observar, em respeito e observância do princípio da tutela da confiança (boa fé), sendo manifesta a situação injusta a que a procedência da oposição, com fundamento neste argumento aduzido pela recorrente, conduziria, sendo assim que essa disposição legal deveria ter sido interpretada e aplicada ao caso dos autos;

VIII - A conduta da opoente/recorrente, ao não questionar jamais a transmissão da garantia bancária, deu causa ao financiamento efetuado pela exequente à cedente dos créditos (beneficiária originária da garantia) e criou na exequente a (legítima) convicção segura da garantia dos créditos em causa, integrando, por conseguinte, uma tomada de posição vinculante de constituição, perante a exequente, da obrigação de lhe pagar o valor previsto na garantia bancária dada à execução em caso de incumprimento por parte do ordenante da garantia.

Nestes termos, e subsidiariamente para o caso de procedência da revista, sempre se deveria considerar que a garantia bancária se transmitiu validamente para a esfera jurídica da exequente/recorrida, em virtude da procedência dos demais fundamentos por esta apresentados na presente resposta à alegação de recurso de revista em sede de ampliação do objeto do recurso, revogando-se a sentença da 1ª instância na parte respeitante a esses mesmos fundamentos e mantendo-se, consequentemente, a improcedência total da oposição à execução, mais se determinando a prossecução dos ulteriores termos legais da ação executiva.

Corridos os vistos e nada obstando ao conhecimento do recurso, cumpre decidir.

                                                          *

2 - A Relação teve por provados os seguintes factos:

                                                          /

1 - A acção executiva à qual está apensa a presente oposição tem por base o documento intitulado «GARANTIA BANCÁRIA N00000007», subscrito por duas pessoas agindo em representação de “BANCO BB, S. A.”, com o seguinte teor:

“Em nome e a pedido da “CC – GESTÃO DE PROJECTOS DE ENGENHARIA, S. A.”, com o capital social de Eur. 10 500 000,00, “BANCO BB, S. A.”, sociedade aberta, com sede em Lisboa e matriculado na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa, declara que oferece uma garantia bancária no valor de Eur. 221 000,00 (Duzentos e vinte e um mil euros), referente ao “Fornecimento de Cabo de Aço ACSR 595 Zambeze” para a empreitada de “Linha de ...”, através da qual se constitui principal pagador de quaisquer importâncias, incluindo juros e demais encargos legalmente exigíveis, até ao montante máximo de Eur. 221 000,000 (Duzentos e vinte e um mil euros), que venha a dever a “EE-CONDUTORES ELÉCTRICOS, S. A.”, com sede em  , resultantes do fornecimento acima mencionado. Compromete-se o Banco, na qualidade de principal pagador, a reembolsar, de forma incondicional e irrevogável, ao primeiro pedido, a “EE-CONDUTORES ELÉCTRICOS, S. A.” todas as importâncias acima identificadas que lhe sejam exigidas até ao referido limite, no prazo de 8 (oito) dias úteis, depois de para tal ter sido notificado por essa entidade, por carta registada com aviso de recepção, invocando o incumprimento pela ORDENADORA das obrigações para com a mesma assumidas. É, pois, de até Eur. 221 000,00 (Duzentos e vinte e um mil euros), o valor da presente garantia e é válida até 31 de Março de 2012, data esta que limitamos para apresentação de qualquer eventual reclamação ao seu abrigo. Findo este prazo, será automaticamente considerada como nula e de nenhum efeito e nada por força dela nos poderá ser reclamado. O Banco não poderá discutir o pagamento nem opor à BENEFICIÁRIA quaisquer meios de defesa ou excepções de que a ORDENADORA possa vir eventualmente a prevalecer-se”;

2 - Entre “BANCO AA Crédito, S. A.” e “EE – Condutores Eléctricos, S. A.”, com data de 14 de Fevereiro de 2006, foi celebrado um acordo intitulado «CONTRATO DE FACTORING Nº 00/00001/01», com o seguinte teor (omite-se a parte que se reputa irrelevante para a apreciação e decisão do recurso)

“CONTRATO DE FACTORING Nº 00/00001/01

Entre:

 “AA – Companhia Internacional de Aquisição de Créditos, S. A.”, com sede no …, representada por GG e HH, agindo na qualidade de administradores, adiante designada apenas por “Factor”; e “EE – CONDUTORES ELÉCTRICOS, S. A.”, com sede em ..., representada por II agindo na qualidade de administrador, adiante designada por “aderente”; É celebrado um CONTRATO DE FACTORING, nos termos da lei aplicável, das competentes instruções do Banco de Portugal e das condições a seguir estipuladas:

Artigo 1º

(Objecto)

1. Para permitir ao aderente realizar, nas melhores condições, o produto das suas vendas firmes e de prestações efectivas de serviços, com maior eficiência administrativa e financeira, relativamente à cobrança dos seus créditos, a Factor compromete-se a:

a) Adquirir créditos do aderente sobre os seus devedores, até aos montantes a todo o tempo acordados;

b) Efectuar adiantamentos ao aderente sobre os créditos por este cedidos;

c) Assumir a responsabilidade da cobrança dos referidos créditos, podendo renunciar a exigi-los do aderente no caso de ser declarada a falência ou insolvência de devedores, nos termos fixados no Art.º 14º;

d) Proceder ao acompanhamento, vigilância, controlo e análise de risco de cada um dos devedores.

2. O aderente compromete-se a:

a) Ceder à Factor todos os créditos constituídos sobre os devedores abrangidos pelo presente contrato;

b) Comunicar à Factor a eventual celebração de qualquer contrato de factoring ou outro contrato de efeito semelhante com outra empresa.

Artigo 2º …;

Artigo 3º …;

Artigo 4º …;

Artigo 5º …;

Artigo 6º

(Cessão de Créditos)

1. A cessão concretiza-se com a aceitação expressa, pela Factor, da Proposta de Cessão de Créditos do aderente apresentada nos termos do Art.º 4º e de cada um dos créditos nela identificados, produzindo todos os efeitos a partir da data da comunicação dessa aceitação.

2. …;

3. …;

4. …;

5. …;

Artigo 7º …;

Artigo 8º…;

Artigo 9º…;

Artigo 10º…;

Artigo 11º…;

Artigo 12º…;

Artigo 13º…;

Artigo 14º…;

Artigo 15º

(Duração e Denúncia do Contrato)

1. Este contrato vigorará até 30 de Junho de 2006. Decorrido este período, será automaticamente prorrogado por períodos sucessivos de 12 meses, podendo ser denunciado por qualquer das partes, através de carta registada com aviso de recepção, enviada com pelo menos 60 dias de antecedência sobre o termo de cada período contratual.

2…;

 Artigo 16º…;

Artigo 17º…;

Artigo 18º…;

Artigo 19º…;

3 - BANCO AA Crédito, S .A. remeteu ao BANCO BB, S. A. uma carta datada de 11.11.11, acompanhada de uma declaração e de cópia de uma garantia bancária, tudo com o teor que segue:

- carta endereçada pela BANCO AA Crédito, S.A. ao “BANCO BB, Dep. Garantias Bancárias .., …”, datada de 00 de … de 2011, referenciando como assunto “GARANTIA BANCÁRIA Nº 00000007 EMITIDA A PEDIDO DE CC-GESTÃO DE PROJECTOS DE EMGENHARIA, SA.” com o seguinte teor, na parte pertinente: “EXMOºS. SENHORES, Servimo-nos da presente para solicitar a V.Exªs. o favor de procederem à subrogação, a nosso favor, da Garantia acima identificada no valor de EUR 221.000,00 emitida por esse Instituição Financeira em 03/11/2011 a favor da Firma EE-CONDUTORES ELÉCTRICOS, SA., conforme declaração anexa subscrita por nós e pela beneficiária. Agradecendo acusem a recepção da presente e nos informem se da Vossa parte existe qualquer objecção à referida subrogação apresentamos os nossos respeitosos cumprimentos.”

- carta endereçada pela BANCO AA Crédito, S.A. ao “BANCO BB, S. A.” Dep. Garantias Bancárias …, …”, datada de 00 de … de 2011, referenciando como assunto “GARANTIA BANCÁRIA Nº 00000007”, subscrita com uma rubrica sob um carimbo identificando a ora recorrente (aqui recorrida) e com duas assinaturas sob um carimbo de “EE-Condutores Eléctricos, SA., Administração”, com o seguinte teor, na parte pertinente: “EXMºS. SENHORES, No âmbito do Contrato de Factoring celebrado, a Firma EE-CONDUTORES ELÉCTRICOS, SA., beneficiária da Garantia acima identificada emitida por essa Instituição Financeira em 03/11/2011 com validade até 31/03/2012 no valor de EUR 221.000,00 (duzentos e vinte e um mil euros) em nome e a pedido de CC-GESTÃO DE PROJECTOS DE ENGENHARIA, SA., referente ao “Fornecimento de Cabo de Aço ACSR 595 Zambeze” para a empreitada de “Linha de ...”, subroga todos os direitos emergentes da mesma à BANCO AA - CRÉDITO, SA., cujo original se encontra em seu poder. Nestes termos, vimos pela presente dar conhecimento formal a V. Exªas. de tal subrogação e, consequentemente, de que aquela Instituição Financeira BANCO AA - CRÉDITO, SA., é parte directamente interessada nos direitos dos créditos garantidos.”

- documento com o logótipo e o timbre do BANCO BB, referenciado a “EE-CONDUTORES ELÉCTRICOS, SA. ...”, intitulado “GARANTIA BANCÁRIA N00000007”, datado de 00 de … de 2011 constando no lugar destinado à subscrição, sob os dizeres “BANCO BB, S.A.” duas assinaturas e sob uma delas o nº 00004, e com o seguinte teor: “Em nome e a pedido da CC – GESTÃO DE PROJECTOS DE ENGENHARIA, S.A., matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Almada, com o número único de matrícula e pessoa colectiva 000 000 004, com o capital social de Eur. 10.500.000,00, o BANCO BB, S.A., sociedade aberta, com sede em Lisboa, na …, com o capital social integralmente realizado de Eur. 3.499.999.998,00, e matriculado na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa, com o número único de matrícula e de pessoa colectiva 000 000 007, declara que oferece uma garantia bancária no valor de Eur. 221.000,00 (Duzentos e vinte e um mil euros), referente ao “Fornecimento de Cabo de Aço ACSR 595 Zambeze” para a empreitada de “Linha de ...”, através da qual se constitui principal pagador de quaisquer importâncias incluindo juros e demais encargos legalmente exigíveis até ao montante máximo de Eur. 221.000,000 (Duzentos e vinte e um mil euros), que venha a dever a EE-CONDUTORES ELÉCTRICOS, SA., NIPC 000 000 009, com sede em ..., resultantes do fornecimento cima mencionado.

Compromete-se o Banco, na qualidade de principal pagador, a reembolsar, de forma incondicional e irrevogável, ao primeiro pedido, a EE-CONDUTORES ELÉCTRICOS, SA. todas as importâncias acima identificadas que lhe sejam exigidas até ao referido limite, no prazo de 8 (oito) dias úteis, depois de para tal ter sido notificado por essa entidade, por carta registada com aviso de recepção, invocando o incumprimento pela ORDENADORA das obrigações para com a mesma assumidas.

É, pois, de até Eur. 221.000,00 (Duzentos e vinte e um mil euros), o valor da presente garantia e é válida até 31 de Março de 2012, data esta que limitamos para apresentação de qualquer eventual reclamação ao seu abrigo. Findo este prazo, será automaticamente considerada como nula e de nenhum efeito e nada por força dela nos poderá ser reclamado.

O Banco não poderá discutir o pagamento nem opor à BENEFICIÁRIA quaisquer meios de defesa ou excepções de que a ORDENADORA possa vir eventualmente a prevalecer-se.

Esta garantia não é endossável nem transmissível”;

4 - Carta essa que foi recebida pelo BANCO BB, S.A., em 15/11/2011;

5 - BANCO AA - Crédito, S.A. remeteu a EE – Condutores Eléctricos, S.A. uma carta datada de 16/11/2011, acompanhada de uma garantia bancária, tudo com o seguinte teor:

- carta datada de 16 de Novembro de 2011, referenciando como assunto “GARANTIA BANCÁRIA Nº 00000007 EMITIDA PELO BANCO BB A PEDIDO DE CC, SA.”, com o seguinte conteúdo: “EXMºS. SENHORES, De acordo com os contactos havidos, junto devolvemos a V.Exªs. o original da Garantia Bancária acima identificada. Sem outro assunto, apresentamos os nossos respeitosos cumprimentos”;         documento com o logótipo e o timbre do BANCO BB, referenciado a “EE-CONDUTORES ELÉCTRICOS, SA. ...”, intitulado “GARANTIA BANCÁRIA N00000007”, datado de 00 de … de 2011 constando no lugar destinado à subscrição, sob os dizeres “BANCO BB, S.A.” duas assinaturas e sob uma delas o nº 00004, e com o seguinte teor: “Em nome e a pedido da CC – GESTÃO DE PROJECTOS DE ENGENHARIA, S.A., matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Almada, com o número único de matrícula e pessoa colectiva 000 000 004, com o capital social de Eur. 10.500.000,00, o BANCO BB, S.A., sociedade aberta, com sede em Lisboa, na …, com o capital social integralmente realizado de Eur. 3.499.999.998,00, e matriculado na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa, com o número único de matrícula e de pessoa colectiva 000 000 007, declara que oferece uma garantia bancária no valor de Eur. 221.000,00 (Duzentos e vinte e um mil euros), referente ao “Fornecimento de Cabo de Aço ACSR 595 Zambeze” para a empreitada de “Linha de ...”, através da qual se constitui principal pagador de quaisquer importâncias incluindo juros e demais encargos legalmente exigíveis até ao montante máximo de Eur. 221.000,000 (Duzentos e vinte e um mil euros), que venha a dever a EE-CONDUTORES ELÉCTRICOS, SA., NIPC 504 084 569, com sede em ..., resultantes do fornecimento cima mencionado.

Compromete-se o Banco, na qualidade de principal pagador, a reembolsar, de forma incondicional e irrevogável, ao primeiro pedido, a EE-CONDUTORES ELÉCTRICOS, SA. todas as importâncias acima identificadas que lhe sejam exigidas até ao referido limite, no prazo de 8 (oito) dias úteis, depois de para tal ter sido notificado por essa entidade, por carta registada com aviso de recepção, invocando o incumprimento pela ORDENADORA das obrigações para com a mesma assumidas.

É, pois, de até Eur. 221.000,00 (Duzentos e vinte e um mil euros), o valor da presente garantia e é válida até 31 de Março de 2012, data esta que limitamos para apresentação de qualquer eventual reclamação ao seu abrigo. Findo este prazo, será automaticamente considerada como nula e de nenhum efeito e nada por força dela nos poderá ser reclamado.

O Banco não poderá discutir o pagamento nem opor à BENEFICIÁRIA quaisquer meios de defesa ou excepções de que a ORDENADORA possa vir eventualmente a prevalecer-se.

Esta garantia não é endossável nem transmissível”;

6 - Carta essa que foi recebida por EE – Condutores Eléctricos, S.A. em 18/11/2011;

7 - BANCO AA - Crédito, S.A. remeteu ao BANCO BB, S.A. uma carta datada de 22/11/2011, acompanhada de uma cópia de uma garantia bancária, tudo com o teor que segue:

- carta datada de 22 de Novembro de 2011, endereçada pela BANCO AA - Crédito, S.A. ao “BANCO BB, Att: Dep. Garantias Bancárias …” subordinada ao assunto “GARANTIA BANCÁRIA Nº 00000007 EMITIDA A PEDIDO DE CC-GESTÃO DE PROJECTOS DE ENGENHARIA, SA”, com o seguinte teor, na parte pertinente: “EXMºS. SENHORES, Referimo-nos à nossa correspondência do passado dia 11, da qual juntamos fotocópia, sobre a subrogação, a nosso favor, da Garantia acima identificada. Tendo-se verificado que houve uma alteração ao seu texto, nomeadamente exclusão do último parágrafo, anexamos fotocópia da nova garantia que se destina a substituir a anteriormente enviada com aquela nossa correspondência. Na expectativa de prezadas notícias, apresentamos os nossos respeitosos cumprimentos”;

- documento com o logótipo e o timbre do BANCO BB, referenciado a “EE-CONDUTORES ELÉCTRICOS, SA. ...”, intitulado “GARANTIA BANCÁRIA N00000007”, datado de 00 de … de 2011 constando no lugar destinado à subscrição, sob os dizeres “BANCO BB, S.A.” duas assinaturas e sob uma delas o nº 00004, e com o seguinte teor: “Em nome e a pedido da CC – GESTÃO DE PROJECTOS DE ENGENHARIA, S.A., matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Almada, com o número único de matrícula e pessoa colectiva 000 000 004, com o capital social de Eur. 10.500.000,00, o BANCO BB, S.A., sociedade aberta, com sede em Lisboa, na …, com o capital social integralmente realizado de Eur. 3.499.999.998,00, e matriculado na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa, com o número único de matrícula e de pessoa colectiva 000 000 007, declara que oferece uma garantia bancária no valor de Eur. 221.000,00 (Duzentos e vinte e um mil euros), referente ao “Fornecimento de Cabo de Aço ACSR 595 Zambeze” para a empreitada de “Linha de ...”, através da qual se constitui principal pagador de quaisquer importâncias incluindo juros e demais encargos legalmente exigíveis até ao montante máximo de Eur. 221.000,000 (Duzentos e vinte e um mil euros), que venha a dever a EE-CONDUTORES ELÉCTRICOS, SA., NIPC 000 000 009, com sede em ..., resultantes do fornecimento cima mencionado.

Compromete-se o Banco, na qualidade de principal pagador, a reembolsar, de forma incondicional e irrevogável, ao primeiro pedido, a EE-CONDUTORES ELÉCTRICOS, SA. todas as importâncias acima identificadas que lhe sejam exigidas até ao referido limite, no prazo de 8 (oito) dias úteis, depois de para tal ter sido notificado por essa entidade, por carta registada com aviso de recepção, invocando o incumprimento pela ORDENADORA das obrigações para com a mesma assumidas.

É, pois, de até Eur. 221.000,00 (Duzentos e vinte e um mil euros), o valor da presente garantia e é válida até 31 de Março de 2012, data esta que limitamos para apresentação de qualquer eventual reclamação ao seu abrigo. Findo este prazo, será automaticamente considerada como nula e de nenhum efeito e nada por força dela nos poderá ser reclamado.

O Banco não poderá discutir o pagamento nem opor à BENEFICIÁRIA quaisquer meios de defesa ou excepções de que a ORDENADORA possa vir eventualmente a prevalecer-se”;

8 - Carta essa que foi recebida pelo BANCO BB, S.A. em 25/11/2011;

9 - BANCO AA - Crédito, S.A. remeteu ao BANCO BB, S. A. uma carta datada de 29/03/2012, acompanhada de três anexos, tudo com o teor que segue:

- carta datada de 29 de Março de 2012, endereçada pela aqui recorrente (ora recorrida)ao “BANCO BB, Att: Dep. Garantias Bancárias …” subordinada ao assunto “Garantia Bancária nº 00000007 emitida a pedido de CC-Gestão de Projectos de Engenharia, SA”, com o seguinte teor, na parte pertinente: “Exmos. Senhores, Por Garantia Bancária outorgada em 03/11/2011 essa Instituição Financeira constituiu-se fiadora e principal pagadora de CC-GESTÃO DE PROJECTOS DE ENGENHARIA, SA. pela obrigação de pagamento de quaisquer importâncias legalmente exigíveis até ao montante máximo de EUR 221.000,00 (duzentos e vinte e um mil euros) que aquela ficasse a dever à Firma EE-CONDUTORES ELÉCTRICOS, SA.. em virtude do “Fornecimento de Cabo de Aço ACSR 595 Zambeze para a Empreitada de Linha de ...” que lhe viesse a ser feito por esta e a reembolsá-la de todas as importâncias que lhe fossem devidas até ao indicado montante de EUR 221.000,00. Posteriormente, a EE, SA.. ao abrigo de um Contrato de Factoring, cedeu-nos os créditos que detinha sobre a afiançada CC-GESTÃO DE PROJECTOS DE ENGENHARIA, SA. a seguir indicados, e esta cedência importou a transmissão para esta Instituição da posição que a referida Garantia resultava para aquela Firma:- Fact .nº. 0000000007 emitida em 00/00/2011 c/ venctº. em 00/00/12 de EUR 62.225,70[;] – Fact. nº. 0000000009 emitida em 00/00/2011 c/ venctº. em 00/00/12 de EUR 62.127,30[;] - Fact .nº. 0000000001, emitida em 00/00/2011 c/ venctº. em 00/00/12 de EUR 24.876,75[;] - Fact nº. 0000000003, emitida em 00/00/2011 c/ venctº. em 00/00/12 de EUR 62.133,45[;] 211.363,20[;] Valor das N/C nºs. 0000000006/007/008/009/002 a deduzir ………… 12.580,57[;] EM DÍVIDA ……………….. 198.782,63[.] Não nos tendo a referida CC-GESTÃO DE PROJECTOS DE ENGENHARIA, SA. pago as facturas acima referidas, nas datas dos seus vencimentos deduzidas das Notas de Crédito indicadas, ficou a mesma a dever-nos o respectivo valor, pelo que nos termos daquela Fiança Bancária vimos avisar V. Exªs. para no prazo de -8-(oito) dias após a recepção desta carta, nos reembolsarem pelo valor da dívida no montante de EUR 198.782,63 (cento e noventa e oito mil setecentos e oitenta e dois euros e sessenta e três cêntimos)”;

- carta endereçada pela aqui recorrente (ora recorrida) ao “BANCO BB, Dep. Garantias Bancárias …”, datada de 00 de … de 2011, referenciando como assunto “GARANTIA BANCÁRIA Nº 00000007 EMITIDA A PEDIDO DE CC-GESTÃO DE PROJECTOS DE EMGENHARIA, SA.” com o seguinte teor, na parte pertinente: “EXMOºS. SENHORES, Servimo-nos da presente para solicitar a V.Exªs. o favor de procederem à subrogação, a nosso favor, da Garantia acima identificada no valor de EUR 221.000,00 emitida por esse Instituição Financeira em 03/11/2011 a favor da Firma EE-CONDUTORES ELÉCTRICOS, SA., conforme declaração anexa subscrita por nós e pela beneficiária. Agradecendo acusem a recepção da presente e nos informem se da Vossa parte existe qualquer objecção à referida subrogação apresentamos os nossos respeitosos cumprimentos”;

- carta endereçada pela aqui recorrente (ora recorrida) ao “BANCO BB, Dep. Garantias Bancárias …”, datada de 00 de … de 2011, referenciando como assunto “GARANTIA BANCÁRIA Nº 00000007”, subscrita com uma rubrica sob um carimbo identificando a ora recorrente (aqui recorrida) e com duas assinaturas sob um carimbo de “EE-Condutores Eléctricos, SA., Administração”, com o seguinte teor, na parte pertinente: “EXMºS. SENHORES, No âmbito do Contrato de Factoring celebrado, a Firma EE-CONDUTORES ELÉCTRICOS, SA., beneficiária da Garantia acima identificada emitida por essa Instituição Financeira em 03/11/2011 com validade até 31/03/2012 no valor de EUR 221.000,00 (duzentos e vinte e um mil euros) em nome e a pedido de CC-GESTÃO DE PROJECTOS DE ENGENHARIA, SA., referente ao “Fornecimento de Cabo de Aço ACSR 595 Zambeze” para a empreitada de “Linha de ...”, subroga todos os direitos emergentes da mesma à BANCO AA - CRÉDITO, SA., cujo original se encontra em seu poder. Nestes termos, vimos pela presente dar conhecimento formal a V. Exªas. de tal subrogação e, consequentemente, de que aquela Instituição Financeira BANCO AA - CRÉDITO, SA., é parte directamente interessada nos direitos dos créditos garantidos”;

- documento com o logótipo e o timbre do BANCO BB, referenciado a “EE-CONDUTORES ELÉCTRICOS, SA. ...”, intitulado “GARANTIA BANCÁRIA N00371297”, datado de 03 de Novembro de 2011 constando no lugar destinado à subscrição, sob os dizeres “BANCO BB, S.A.” duas assinaturas e sob uma delas o nº 00004, e com o seguinte teor: “Em nome e a pedido da CC – GESTÃO DE PROJECTOS DE ENGENHARIA, S.A., matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Almada, com o número único de matrícula e pessoa colectiva 000 000 004, com o capital social de Eur. 10.500.000,00, o BANCO BB, S.A., sociedade aberta, com sede em Lisboa, na …, com o capital social integralmente realizado de Eur. 3.499.999.998,00, e matriculado na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa, com o número único de matrícula e de pessoa colectiva 000 000 007, declara que oferece uma garantia bancária no valor de Eur. 221.000,00 (Duzentos e vinte e um mil euros), referente ao “Fornecimento de Cabo de Aço ACSR 595 Zambeze” para a empreitada de “Linha de ...”, através da qual se constitui principal pagador de quaisquer importâncias incluindo juros e demais encargos legalmente exigíveis até ao montante máximo de Eur. 221.000,000 (Duzentos e vinte e um mil euros), que venha a dever a EE-CONDUTORES ELÉCTRICOS, SA., NIPC 504 084 569, com sede em ..., resultantes do fornecimento cima mencionado.

Compromete-se o Banco, na qualidade de principal pagador, a reembolsar, de forma incondicional e irrevogável, ao primeiro pedido, a EE-CONDUTORES ELÉCTRICOS, SA. todas as importâncias acima identificadas que lhe sejam exigidas até ao referido limite, no prazo de 8 (oito) dias úteis, depois de para tal ter sido notificado por essa entidade, por carta registada com aviso de recepção, invocando o incumprimento pela ORDENADORA das obrigações para com a mesma assumidas.

É, pois, de até Eur. 221.000,00 (Duzentos e vinte e um mil euros), o valor da presente garantia e é válida até 31 de Março de 2012, data esta que limitamos para apresentação de qualquer eventual reclamação ao seu abrigo. Findo este prazo, será automaticamente considerada como nula e de nenhum efeito e nada por força dela nos poderá ser reclamado.

O Banco não poderá discutir o pagamento nem opor à BENEFICIÁRIA quaisquer meios de defesa ou excepções de que a ORDENADORA possa vir eventualmente a prevalecer-se”;

10 - Carta essa que foi entregue e registada no balcão «Garcia de Orta (Porto)» dos CTT no dia 29/03/2012 e que foi recebida pelo BANCO BB, S.A. em 03/04/2012;

11 - Em resposta à carta acabada de referir, o BANCO BB, S.A. remeteu ao BANCO AA - Crédito, S.A. uma carta datada de 04/04/2012, com o seguinte teor:

“Assunto Garantia Bancária N00371297, em nome de CC-GESTÃO DE PROJECTOS DE ENGENHARIA, SA.

Exmo(s). Sr(s). Acusamos a recepção da vossa carta de 29.03.2012, cujo conteúdo mereceu a nossa melhor atenção, e da qual juntamos cópia. Face ao exposto, informamos que não podemos dar seguimento ao solicitado, dado que a garantia bancária em assunto se encontra cancelada nos nossos registos, em virtude da validade da mesma ter expirado em 31 de Março de 2012. Com os nossos melhores cumprimentos, subscrevemo-nos com elevada estima e consideração”;

12 - No âmbito do acordo supra referido em 2, BANCO AA - Crédito, S.A. adquiriu à EE – Condutores Eléctricos, S.A. créditos no valor total de € 211.363,20 que esta detinha sobre a CC – Gestão de Projectos de Engenharia, S.A. (decorrentes do fornecimento por aquela a esta de cabo de aço, nos termos das facturas nºs 0000000007, no montante de € 62.225,70, 0000000009, no montante de € 62.127,30, 0000000001, no montante de € 24.876,75 e 0000000003, no montante de € 62.133,45) aos quais foi deduzido o montante de € 12.580,57 decorrente da emissão de notas de crédito pela CC, pelo que o valor dos créditos ficou circunscrito a € 198.782,63;

13 - O texto original da «GARANTIA BANCÁRIA N00000007» continha um parágrafo onde se afirmava o seguinte: «Esta garantia não é endossável nem transmissível», parágrafo esse que foi eliminado pelo BANCO BB, S.A.

Factos não provados

Em 02/04/2012, foi tentada a entrega ao BANCO BB S. A. da carta referida em 9, não tendo sido possível realizar a entrega pelo seguinte motivo “destinatário mudou-se, reexpedido”.

                                                       *

3 - Perante o teor das conclusões formuladas pela recorrente e não havendo lugar a qualquer conhecimento oficioso, são, essencialmente, duas as questões que, no âmbito da revista, demandam apreciação e decisão por parte deste Tribunal de recurso:

                                                     /

 I - Se ocorreu a transmissão, a favor da recorrida, da garantia prestada pela recorrente a favor da originária beneficiária “EE - Condutores Eléctricos, S. A."; e, no caso afirmativo,

II - Se a execução da garantia por parte da recorrida foi levada a cabo, posteriormente ao termo final do período temporal pela mesma coberto, sendo, pois, inválida e ineficaz por caducidade da mesma garantia.

Apreciando:

                                                     *

4 - I - Preliminarmente, impõe-se acentuar a total irrelevância processual dos factos invocados pela recorrente e que não se mostram acolhidos na enunciação da factualidade provada que nos vem da Relação, uma vez que, não sendo caso de aplicação do preceituado nos arts. 682º, nº2 e 674º, nº3, só esta releva e é atendível, “hic et nunc”.

Assim, as conclusões 7ª, 9ª, 10ª, 13ª, 14ª, 15ª, 17ª e 18ª, designadamente, são, na mencionada perspetiva, totalmente irrelevantes, acrescendo, mesmo, que o invocado na conclusão 17ª se mostra contrariado por aquela factualidade, pelo que será ignorado o que das mesmas poderia, eventualmente, dimanar.

                                                      /

II - Na medida em que tal contribuirá para um melhor e mais fácil entendimento e aproximação à sequente exposição, reputa-se útil uma breve e despretensiosa abordagem da temática da garantia bancária autónoma.

Discreteando a propósito, expendeu o Prof. I. Galvão Telles (in “Manual dos Contratos em Geral”, Refundido e Actualizado, pags. 506 e segs., que seguiremos de muito perto[3]):

Na prática comercial faz-se sentir muitas vezes a necessidade de garantias mais enérgicas do que a fiança, e mesmo do que o aval nos casos em que este tem cabimento.

Entre essas outras garantias conta-se o depósito, nas mãos do credor, de dinheiro ou de outros valores - títulos de crédito, pedras ou metais preciosos.

O depósito, embora seja uma forma segura de garantia, oferece contudo inconvenientes. É desvantajoso para o devedor porque se traduz, para ele, numa imobilização anti-económica de dinheiro ou de outros bens; e poderá ser desvantajoso para o credor quando respeite a dinheiro e haja o risco de este se depreciar. Tais desvantagens levam, com frequência, a preferir ao depósito outros tipos de garantia - designadamente, a garantia bancária autónoma - que ofereçam, pelo menos, tanta segurança como ele e não padeçam dos inconvenientes que lhe são inerentes.

A garantia bancária autónoma, emergente do princípio da liberdade contratual, tornou-se de utilização constante, especialmente em contratos internacionais, sendo também de utilização muito frequente na órbita interna.

A garantia bancária autónoma visa a finalidade prática, que constitui a sua razão de ser, de substituir o depósito - com os assinalados inconvenientes - por outro mecanismo que dê tanta segurança ao garantido como lhe daria o depósito, ou seja, como se ele ficasse em mão com o dinheiro, títulos de créditos, pedras ou metais preciosos: um banco obriga-se, por proposta de um seu cliente habitual ou ocasional e parte em determinado contrato (v.g., dono da obra numa empreitada), a pagar-lhe, logo que ele o solicite por escrito, certa soma em dinheiro ou uma soma em dinheiro até certo limite, como devida pela outra parte (o empreiteiro, no caso) por falta de cumprimento ou mau cumprimento. Ao banco não assiste a faculdade de opor quaisquer meios de defesa relacionados com o contrato em causa, mas tão só os decorrentes do próprio contrato de garantia: a garantia - bancária autónoma - durará pelo tempo convencionado, funcionando como um verdadeiro sucedâneo de um depósito que o banco garante teve conveniência em não efetuar e propiciando, “a posteriori”, ao garantido, sem os incómodos e as demoras inerentes a um procedimento judicial, os fundos que renunciou a receber, “a priori “.

Conquanto unilateral ou não sinalagmático (porquanto cria obrigações apenas para o garante), o acto gerador da garantia autónoma é um verdadeiro contrato, legalmente atípico, com natureza causal [visa, como a fiança, mas de forma autónoma (o seu objeto é distinto do objeto da obrigação decorrente do contrato a que a garantia se reporta, não consubstanciando, pois, uma dívida doutrem) e não acessória, uma função de garantia objectivada no respetivo contrato, mas sempre reportada a uma obrigação de pagamento de dinheiro (obrigação pecuniária), mesmo quando a obrigação garantida não tenha esta natureza, mas, antes, a de prestação de facto (v. g. execução de uma obra) ou de prestação de uma coisa que não espécies monetárias (v. g. entrega de um imóvel)].

A garantia autónoma pode ser simples ou à 1ª solicitação (“on” ou “upon first demand”, “auf erstes Anforden”, “à première demande”, “alla prima richiesta”). Naquela, o credor garantido terá que provar o facto constitutivo do seu direito para o garante cumprir (nos termos estabelecidos nos contratos); nesta, basta a execução da garantia nos termos acordados, podendo estes limitar-se ao pedido “puro e simples”, impor a justificação do pedido (pedido justificado, especificando o incumprimento do dador da ordem), ou o pedido acompanhado de certos documentos, tratando-se, então, de garantia com justificação documental.

Em qualquer dos casos, sendo demandado pelo credor/beneficiário nos termos previstos no contrato de garantia autónoma, o garante terá de cumprir. E, fazendo-o, fica com o direito a ser reembolsado - direito de regresso - da quantia entregue ao garantido pelo devedor/dador da ordem, nos termos definidos no contrato com ele celebrado, sendo certo que o garante se dota, logo aquando da celebração do contrato de mandato (sem representação), de garantias que lhe assegurem o cumprimento, por parte do devedor/dador da ordem, do correspondente crédito, assim, nascido na sua esfera jurídica.

Como bem se refere no douto Parecer que se mostra junto aos autos (da autoria do Ex. mo Prof. Pestana de Vasconcelos), na estrutura negocial da operação que constitui a garantia autónoma, podemos distinguir três relações contratuais (relação triangular ou trilateral) entre sujeitos diversos:

--- O contrato principal, ou seja, aquele donde decorrem as obrigações garantidas e que é concluído entre o credor garantido e o devedor/ordenante;

--- O contrato entre o devedor e o garante, em regra um banco, pelo qual este último se vincula, mediante uma remuneração (comissão do banco) a celebrar com o credor o contrato de garantia autónoma; e

--- O contrato de garantia autónoma em si, celebrado entre o banco/garante e o credor/garantido, do qual decorre a obrigação autónoma.

Para este mesmo autor[4], a autonomia da garantia à 1ª solicitação “significa que, salvo casos excepcionais e de todo intoleráveis para o Direito, ela deve ser preservada…Por isso aqueles casos em que se admite que o garante pode e deve recusar o pagamento devem ser restritos. Tem que se tratar de casos de abuso do direito por parte do beneficiário ou de fraude por banda deste. (…) Mas mais do que isso, na linha de Almeida Costa e Pinto Monteiro[5], “…é necessário que os casos de abuso ou de fraude sejam verdadeiramente “inequívocos” (…) para que o banco/garante deixe de pagar é necessário que seja colocada à sua disposição prova “líquida e inequívoca” da “má fé patente”, da “fraude evidente”, ao ponto de “entrar pelos olhos dentro”. Caso contrário, estar-se-ia a atentar contra a essência da própria garantia. Havendo causa de discussão sobre os factos que o ordenante avança como demonstrando o abuso do direito, o garante deve pagar. A questão deverá ser discutida depois entre as partes do contrato base.

Em conformidade, a generalidade da Doutrina defende a legitimidade da mencionada recusa de pagamento, apenas nos casos seguintes:

--- Manifesta má fé ou má fé patente, ou seja, que não oferece a menor dúvida, por decorrer com absoluta segurança de prova documental em poder do ordenante ou do garante;

--- Fraude manifesta (“exceptio doli”) ou abuso evidente por parte do beneficiário;

--- Ofensa da ordem pública ou dos bons costumes pelo contrato garantido; e

--- Existência de prova irrefutável de que o contrato-base foi cumprido.[6]

                                                       /

III - A recorrente sustenta que a garantia bancária por si prestada a favor de “EE - Condutores Eléctricos, S. A.” não foi objeto de transmissão a favor da recorrida “BANCO AA - Crédito, S. A.”, apoiando-se no texto constante do último § da garantia prestada, na sua versão originária, ou seja, de que “Esta garantia não é endossável nem transmissível”.

Diversamente, a recorrida defende a ocorrência de tal transmissão, o que, tendo sido acolhido no acórdão recorrido, havia sido rejeitado na sentença apelada.

Perfilhamos o entendimento sustentado pela recorrida e que obteve consagração no acórdão recorrido. Porquanto:

Nos termos do disposto no art. 217º, nº1 do CC, “A declaração negocial pode ser expressa ou tácita: é expressa, quando feita por palavras, escrito ou qualquer outro meio directo de manifestação da vontade, e tácita quando se deduz de factos que, com toda a probabilidade, a revelam”.

Como consta do sumário do Ac. deste Supremo, de 24.05.07, relatado pelo Ex. mo Cons. Alves Velho e acessível em www.dgsi.pt:

--- A declaração tácita é constituída por um “comportamento do qual se deduza com toda a probabilidade a expressão ou a comunicação de algo, embora esse comportamento não tenha sido finalisticamente dirigido à expressão ou à comunicação daquele conteúdo”;

--- Tal comportamento declarativo pode estar contido ou ser integrado por comunicações escritas, verbais ou por quaisquer actos significativos de uma manifestação de vontade, incorporem ou não uma outra declaração expressa;

--- Os comportamentos que podem servir de suporte à declaração negocial tácita integram matéria de facto;

--- Se eles integram ou não uma declaração negocial tácita é questão de direito, a resolver em sede de interpretação, segundo os critérios acolhidos no art. 236ºdo CC;

--- Tratando-se de declaração receptícia, a declaração há-de valer com o sentido que um declaratário razoável (normalmente esclarecido e diligente), colocado na concreta posição do real destinatário, lhe atribuiria (impressão do destinatário);

--- Do mesmo modo, a determinação do comportamento concludente, “que deve ser visto como elemento objectivo da declaração tácita” faz-se, tal como na declaração expressa, por via interpretativa;

--- Na determinação da concludência do comportamento em ordem a apurar o respectivo sentido, nomeadamente enquanto declaração negocial que dele deva deduzir-se com toda a probabilidade, é entendimento geralmente aceite que a inequivocidade dos factos concludentes não exige que a dedução seja forçosa ou necessária, bastando que, conforme os usos do ambiente social, ela possa ter lugar com toda a probabilidade, devendo ser aferida por um “critério prático”, baseada numa “conduta suficientemente significativa” e que não deixe “nenhum fundamento razoável para duvidar” do significado que dos factos se depreende”.

Na versão originária da garantia em apreço - emitida em 03.11.11 -, constava um último § onde se havia feito constar “Esta garantia não é endossável nem transmissível”.

Por outro lado, em 14.02.06, a recorrida havia celebrado, na qualidade de “factor”, com “EE - Condutores Eléctricos, S. A.”, na qualidade de aderente, o contrato de “factoring” mencionado em 2 de 2 supra.

O art. 582º, nº1 do CC estatui que “Na falta de convenção em contrário, a cessão do crédito importa a transmissão para o cessionário, das garantias e outros acessórios do direito transmitido, que não sejam inseparáveis da pessoa do cedente”, o que, como decidido no Ac. da Rel. de Lisboa, de 11.12.02 (Col. 5º/97), confirmado pelo Ac. deste Supremo, de 05.06.03 - relatado pelo Ex. mo Cons. Oliveira Barros e acessível em www.dgsi.pt - deve ser entendido como abrangendo na respetiva previsão a garantia autónoma de que vimos tratando.

No entanto, por via da estipulação da mencionada convenção em contrário, tem de entender-se que, naquela data - 14.02.06 -, a dita garantia autónoma não podia ter sido transmitida, até porque ainda não constituída.

Não poderá, porém, deixar de atentar-se, na senda da doutrina proclamada no supra transcrito Ac. deste Supremo, em determinados comportamentos posteriores da recorrente, os quais, integrando matéria de facto enquanto suporte de declaração negocial tácita, se transfiguram em questão de direito quando contemplados na perspetiva de integrarem, em sede da respetiva interpretação segundo os critérios acolhidos no art. 236ºdo CC, uma declaração negocial tácita (Trata-se, aliás, de jurisprudência uniforme e pacífica deste Supremo).

E tais comportamentos, evidenciados na factualidade que se tem por provada, são, designadamente, os seguintes:

--- Não se mostra provado que a recorrente tenha, por qualquer forma, manifestado qualquer objeção à sub-rogação, na qualidade de entidade beneficiária da garantia em causa, da “EE” pela recorrida, não obstante, na carta que por esta lhe foi endereçada, em 11.11.11, se solicitar o “favor de procederem à sub-rogação, a nosso favor, da garantia … conforme declaração anexa subscrita por nós e pela beneficiária…,agradecendo que nos informem se da Vossa parte existe qualquer objeção à referida sub-rogação…”;

--- Também não se mostra provado que a recorrente tivesse, por qualquer forma, esboçado qualquer reação à carta que lhe foi endereçada, em 22.11.11, pela recorrida e onde, textualmente, consta, além do mais…“Referimo-nos à nossa correspondência do passado dia 11, da qual juntamos fotocópia, sobre a sub-rogação, a nosso favor, da Garantia acima identificada. Tendo-se verificado que houve uma alteração ao seu texto, nomeadamente exclusão do último §” - que estipulava “Esta garantia não é endossável nem transmissível” - “anexamos fotocópia da nova garantia que se destina a substituir a anteriormente enviada com aquela nossa correspondência. Na expectativa de prezadas notícias, apresentamos os nossos respeitosos cumprimentos”;

--- Quando a recorrida se propôs executar, perante a recorrente, a garantia nesta sua última versão, a recorrente não obtemperou, por qualquer modo, com a inverificação da transmissão da mesma para a recorrida, antes se tendo limitado a objetar que o pedido de execução fora, extemporaneamente, formulado;

--- Só na oposição deduzida à execução instaurada pela recorrida foi invocada pela recorrente a falta de transmissão da garantia.

Ora, todos estes comportamentos protagonizados pela recorrente constituem factos que, entre si conjugados e nos termos apontados no supra transcrito sumário do Ac. deste Supremo, de 24.05.07, e dos dimanados do critério interpretativo acolhido no art. 236º do CC revelam, com toda a probabilidade e em termos de concludência, a emissão duma declaração tácita, por parte da recorrente, no sentido da aceitação, por si, da questionada transmissão da garantia.

Não se finalizando sem deixar as seguintes observações:

--- Quando se constituíram os créditos cedidos à recorrida, já tinha sido excluída - sem qualquer objeção da recorrente - do texto da garantia a convenção onde se estipulava que a mesma não era endossável nem transmissível, pelo que poderá sustentar-se que, nos termos expostos e face ao preceituado no art. 582º, nº1 do CC e ao decidido nos sobreditos Acs. deste Supremo, de 05.06.03, e da Rel. de Lisboa, de 11.12.02, a transmissão, a favor da recorrida, da garantia, operaria, automaticamente, com a cessão dos créditos que da mesma beneficiavam - Cfr. 7 e 9 de 2 supra;

--- Não perfilhamos o entendimento, sustentado pela recorrente, de que a questionada garantia era inseparável da pessoa da cedente dos créditos e, bem assim, que à designação do beneficiário da garantia presida o “intuitu personae”: pensa-se que para o garante não constitui um elemento fundamental a identificação do beneficiário da garantia, ao qual, verificados os pressupostos da execução desta, sempre terá de a satisfazer, seja qual for o respetivo credor. Não assim, já, no que toca ao devedor/ordenante da prestação da garantia, cuja solvabilidade e empenhamento no cumprimento da obrigação abarcada pelo contrato-base lhe deverá interessar sobremaneira e de quem diligenciará obter, desde logo, garantias adequadas de reembolso, no caso de, contra o mesmo, ter de exercer o correspondente direito de regresso;

--- A mencionada natureza triangular ou trilateral da relação abarcada pela garantia autónoma retira qualquer consistente apoio à tentativa - operada pela recorrente - de menorização da relevância da interferência da recorrida nas vicissitudes por que passou a garantia em apreço nos autos;

--- O argumento, invocado pela recorrente, de a recorrida, como instituição de crédito, não poder desconsiderar omitidos - na sua versão - procedimentos bancários uniformes em casos análogos não deixa de ser reversível: também ela (recorrente), com similar natureza, não poderia desconhecer a função de garantia do pagamento dos créditos cedidos, exercida pelo instituto em causa, com os inerentes interesses da recorrida em jogo, determinantes, certamente, de uma sua diferente postura quanto à efetuada cessão de créditos, se confrontada tivesse sido com a inexistência de correspondente garantia autónoma.

Conclui-se, pois e em sintonia com o acórdão recorrido, pela existência e aceitação pela recorrente da transmissão a favor da recorrida da garantia autónoma à 1ª solicitação debatida nos autos, improcedendo, assim, as correspondentes e relevantes conclusões formuladas pela recorrente.

                                                         /

IV - A recorrente sustenta, por outro lado, que foi extemporânea a execução da garantia, porquanto, sendo a mesma válida até 31.03.12, a correspondente reclamação - que faz coincidir com a receção da mesma por si - só foi efetuada em 03.04.12. Ou seja, porque efetuada para além de 31.03.12, a reclamação seria, nos termos constantes da garantia, “automaticamente considerada como nula e de nenhum efeito” e nada por força dela poderia ser reclamado à recorrente.

Diversamente, a recorrida pugna pela tempestividade da efetivação da mesma reclamação, porquanto ocorrida em 29.03.12, data da expedição para o endereço da recorrente da carta que a continha. (Cfr. 10 de 2 supra).

Também aqui perfilhamos o entendimento acolhido no douto acórdão recorrido, o qual, aliás, se encontra em sintonia com o decidido, perante quadro adjectivo e substantivo idêntico no essencial, no Ac. deste Supremo, de 31.03.04, relatado pelo Ex. mo Cons. Azevedo Ramos e acessível em www.dgsi.pt, para um e outro se remetendo, com a devida vénia, no omitido.

Como já acentuado, a interpretação das declarações negociais constitui matéria de facto da exclusiva competência das instâncias, só cabendo ao Supremo, como tribunal de revista, exercer censura sobre o resultado interpretativo sempre que, tratando-se da situação prevista no art. 236º do CC, tal resultado não coincida com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, pudesse deduzir do comportamento do declarante ou, tratando-se da situação contemplada no art. 238º, nº1 do mesmo Cod., não tenha um mínimo de correspondência no texto do documento, ainda que imperfeitamente expresso.

O critério interpretativo a que, no caso, se ateve a Relação obedeceu aos mencionados ditames legais, pelo que, apenas para reforço e consolidação do que, aí, foi considerado e com recurso às conclusões que culminam o douto e já referido parecer junto aos autos, se aditarão os seguintes considerandos:

--- No âmbito do art. 236º do CC, inserem-se nas circunstâncias atendíveis a ter em conta pelo declaratário normal colocado na posição do real declaratário: a finalidade do negócio, os interesses das partes envolvidas e, ainda, “a consideração de qual seja o seu mais razoável tratamento”, sendo este último aspeto imposto por uma interpretação de acordo com a boa fé;

--- O declarante tem o ónus de se exprimir de forma clara, em especial quando, como no caso, o emitente da declaração é uma instituição de crédito, portanto um profissional, devidamente assessorada por profissionais muito qualificados, a quem a lei exige um elevado nível de competência técnica;

--- Quando tenha sido acordado um prazo de vigência da garantia, o seu significado determina-se por interpretação desse contrato;

--- Na dúvida, deve entender-se que se a garantia assegurar um conjunto de obrigações futuras - como no caso -, ela abrange todas as obrigações constituídas nesse período de tempo, quer se vençam dentro dele, quer já depois do seu decurso;

--- A adequada composição de interesses das partes, a incluir no horizonte do destinatário normal colocado na posição do real declaratário, por força do princípio da boa fé, conduz a que as obrigações asseguradas pela garantia autónoma à primeira solicitação sejam todas aquelas constituídas até ao fim do prazo: é por uma garantia com essa extensão que o ordenante, normalmente, paga;

--- Da articulação de todos os elementos a que o declaratário normal colocado na posição do real declaratário atenderia para a determinação do sentido da declaração da outra parte, resulta reforçado o entendimento de que a garantia se estende até 31.03.12, cobrindo todas as obrigações emergentes do contrato de fornecimento a que respeita constituídas até essa data;

--- A reclamação a que o contrato se refere diz simplesmente respeito à data para o exercício do direito de execução da garantia, ou seja, até 31.03.12 para as obrigações constituídas (vencidas e incumpridas) até então;

--- Se se defendesse que a reclamação só produziria os seus efeitos aquando da sua receção ou do conhecimento pelo destinatário, tendo que ser utilizado como meio - imposto pelo contrato - a carta registada com aviso de receção, a garantia nunca poderia ser executada relativamente às obrigações cobertas, vencidas e não pagas no último (e, eventualmente, penúltimo) dia do prazo da sua vigência: a garantia ficaria, afinal, reduzida a uma extensão temporal inferior;

--- Sendo o art. 224º uma norma de natureza supletiva cuja aplicação é arredada se outra solução tiver sido acordada pelas partes, não há qualquer razão para considerar a reclamação uma declaração receptícia, sendo uma questão de interpretação negocial a determinação do momento da produção de efeitos da declaração, o qual, analisados os diversos elementos integrados no horizonte do destinatário normal colocado na posição do real destinatário, coincide com o momento da expedição da declaração, ou seja, no caso dos autos, o dia 29.03.12;

--- Diferente interpretação - sem qualquer apoio no elemento literal e em quaisquer outras das circunstâncias a atender pelo declaratário (função do contrato, interesses em jogo e seu tratamento mais razoável, imposto pela boa fé) - desprotegeria, fortissimamente, os interesses de uma parte sem que servisse interesse relevante do banco/garante.

Tudo confluindo, pois, para que a execução da garantia tenha sido, tempestivamente, efetuada pela recorrida, improcedendo, pois, como bem foi decidido, a correspondente exceção perentória deduzida pela opoente/recorrente, bem como as atinentes conclusões por si formuladas.

                                                  /

V - A requerida ampliação do âmbito do recurso jamais poderia ser atendida, independentemente do sentido da presente decisão.

Com efeito, a recorrida não decaiu nas questões que constituiriam o objeto daquela ampliação, sobre as quais não chegou a haver pronúncia por parte do tribunal recorrido, por ter julgado prejudicada a respetiva apreciação, face ao sentido afirmativo da decisão, aí, proferida quanto à verificação da existência e aceitação da transmissão da garantia a favor da, ora, recorrida.

Caso fosse, aqui, acolhida a correspondente pretensão da recorrente, não haveria que atender ao formulado pedido de ampliação do âmbito da revista, antes se impondo a baixa dos autos à Relação para conhecer das questões sobre que não chegou a pronunciar-se por as haver considerado prejudicadas pelo demais decidido (Cfr. arts. 679º e 665º, nº2).

                                                     *

5 - Na decorrência do exposto, acorda-se em negar a revista.

                                                     /

Custas pela recorrente.

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Sumário (art. 663º, nº7 do CPC):

                                                   / 

Lx     27/09/2016

Fernandes do Vale (Relator)

Ana Paula Boularot

Pinto de Almeida     

_______________________________________________________
[1]  Relator: Fernandes do Vale (52/15)
   Ex. mos Adjuntos
   Cons. Ana Paula Boularot
   Cons. Pinto de Almeida
[2]  Como os demais que, sem menção da respetiva origem, vierem a ser citados.
[3]  Do mesmo ilustre autor pode ver-se “Garantia bancária autónoma”, in “O Direito”, Ano 120º (1988), III-IV (Julho-Dezembro), pags. 275-293 (reproduzido em Edições Cosmos, Livraria Arco-Íris, Lisboa, 1991)
[4]  In “Direito das Garantias”, 2015 - 2ª Ed., Almedina, pags. 137/138.
[5]   In “Garantias bancárias. O contrato de garantia à 1ª solicitação” - Col. Jur. 1986 - 5º/17 e segs.
[6]  Cfr., a este propósito, Jorge Duarte Pinheiro, in “Garantia bancária autónoma”, na ROA, 52º, pags. 448; Manuel Castelo Branco, in “A garantia bancária autónoma no âmbito das garantias especiais das obrigações”, na ROA, 53º, pags. 80; José Maria Pires, in “Direito Bancário”, Vol. II, pags. 285/286; Miguel Brito Bastos, in “Estudos em Homenagem ao Prof. Dr. Sérvulo Correia”, Vol. III, FDUL, 2010, pags. 533 a 555; Pedro Romano Martínez, in “Estudos em Homenagem ao Prof. Dr. I. Galvão Telles”, II Vol. Direito Bancário, Almedina, pags. 280 a 285; Cláudia Trindade, in “Estudos em Homenagem ao Prof. Dr. José Lebre de Freitas”, Vol. II, 1ª Ed., Coimbra Editora, pags. 68 a 76; e Luís Manuel Teles de Menezes Leitão, in “Garantias das Obrigações”, 2012, 4ª Ed., Almedina, pags. 130.