Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 4ª SECÇÃO | ||
Relator: | FERREIRA PINTO | ||
Descritores: | ACIDENTE DE TRABALHO VIOLAÇÃO DE REGRAS DE SEGURANÇA NEXO DE CAUSALIDADE CULPA DO EMPREGADOR RESPONSABILIDADE AGRAVADA ÓNUS DA PROVA | ||
Data do Acordão: | 03/01/2018 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
Meio Processual: | REVISTA | ||
Decisão: | NEGADA | ||
Área Temática: | DIREITO CIVIL – RELAÇÕES JURÍDICAS / EXERCÍCIO E TUTELA DOS DIREITOS / PROVAS – DIREITO DAS OBRIGAÇÕES / MODALIDADES DAS OBRIGAÇÕES / OBRIGAÇÃO DE INDEMNIZAÇÃO. DIREITO DO TRABALHO – CONTRATO DE TRABALHO / DIREITOS, DEVERES E GARANTIAS DAS PARTES / PREVENÇÃO E REPARAÇÃO DE ACIDENTE DE TRABALHO E DOENÇAS PROFISSIONAIS. | ||
Legislação Nacional: | CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 342.º, N.ºS 1 E 2 E 563.º. CÓDIGO DO TRABALHO (CT): - ARTIGOS 127.º, N.º 1, ALÍNEA H), 281.º, N.ºS 1, 2 E 5 E 284.º. REGIME DE REPARAÇÃO DE ACIDENTES DE TRABALHO E DE DOENÇAS PROFISSIONAIS, APROVADO PELA LEI N.º 98/2009, DE 04 DE SETEMBRO: - ARTIGOS 18.º E 79.º, N.º 3. REGULAMENTO GERAL DE SEGURANÇA E HIGIENE DO TRABALHO NOS ESTABELECIMENTOS INDUSTRIAIS: - ARTIGO 40.º, N.º 2. | ||
Referências Internacionais: | DIRETIVA N.º 89/655/CEE, DO CONSELHO, DE 30 DE NOVEMBRO. DIRETIVA N.º 95/63/CE, DO CONSELHO, DE 5 DE DEZEMBRO. DIRETIVA N.º 2001/45/CE, DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO, DE 27 DE JUNHO. | ||
Jurisprudência Nacional: | ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: - DE 14-03-2007, PROCESSO N.º 06S1957; - DE 19-06-2013, PROCESSO N.º 3529/04.8TTLSB.L2.S1; - DE 19-06-2013, PROCESSO N.º 1294/04.8TTLRA.C1.S1; - DE 29-10-2013, PROCESSO N.º 402/07.1TTCLD.L1.S1; - DE 06-05-2015, PROCESSO N.º 220/11.2TTTVD.L1.S1; - DE 27-04-2017, N.º 1523/13.7T2AVR.P1.S1, TODOS IN WWW.DGSI.PT. | ||
Sumário : | I. O agravamento da responsabilidade acidentária sucede quando o acidente se deve à culpa do empregador ou que seja consequência da inobservância de regras de segurança, higiene e saúde que lhe seja imputável. II. A diferença entre os dois fundamentos reside na prova da culpa, que tem que ser necessariamente feita no primeiro caso e que é desnecessária no segundo. III. Em ambas as situações, resulta um agravamento da responsabilidade que se traduz no facto da responsabilidade pela indemnização incluir a totalidade dos prejuízos (patrimoniais e não patrimoniais) sofridos pelo trabalhador, nos termos gerais da responsabilidade civil e em a responsabilidade infortunística caber ao empregador. IV. O ónus da alegação e da prova dos factos que constituem a violação das regras de segurança incumbe aos beneficiários do direito à reparação e à seguradora, por, relativamente aos primeiros (quando peticionada esta reparação especial) serem factos constitutivos do direito invocado, e por, relativamente à segunda (quando pretenda ver desonerada a sua responsabilidade) por serem factos modificativos/extintivos da sua responsabilidade. V. A Portaria n.º 53/71, de 03 de fevereiro, que aprovou o Regulamento Geral de Segurança e Higiene do Trabalho em Estabelecimentos Industriais, no seu artigo 40º, n.º 2, dispõe que as máquinas antigas, construídas e instaladas sem dispositivos de segurança eficientes, devem ser modificadas ou protegidas sempre que o risco existente o justifique. VI. A Empregadora que tinha, à data do acidente, em funcionamento uma prensa antiga sem a ter modificado ou transformado, apesar de haver alta probabilidade de originar acidentes, por não ter qualquer dispositivo de segurança, nomeadamente uma proteção em grade ou de outro tipo, de forma a envolver completamente toda a ferramenta e torná-la inacessível às mãos do trabalhador quando a punção desce, é responsável pela reparação dos danos derivados do acidente ocorrido com o trabalhador que com ela operava, quando se encontrava a retirar uma peça proveniente da fundição, que estava a ser limpa dos excessos/películas, o linguete não parou a rotação da engrenagem no final do 1º ciclo de rotação, o que lhe provocou o entalamento/esmagamento dos dedos da mão direita que se encontravam entre os seus elementos móveis. | ||
Decisão Texto Integral: | Processo n.º 750/15.7T8MTS.P1.S1[1] (Revista) – 4ª Secção[2]
Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:
I
- Relatório[3]:
Frustrada a conciliação, na fase conciliatória, cuja instância se havia iniciado em 13.02.2015, AA, com o patrocínio do Ministério Público, intentou no Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Matosinhos – Instância Central - Juízo do Tribunal do Trabalho - Juiz 3, a presente ação declarativa de condenação, com processo especial, para efetivação de responsabilidade civil emergente de acidente de trabalho, contra “BB, S. A.” e “CC, S. A.”, pedindo que se reconheça e declare que o sinistro em causa constitui acidente de trabalho e que se condene as rés, na medida das responsabilidades que forem apuradas, a pagarem-lhe: Pede, ainda, a condenação da seguradora a pagar-lhe, nos termos do artigo 79º, nºs 3 e 5, da Lei n.º 89/09, de 04/09: i). Para o efeito, alegou, em resumo, que no dia 26.02.2014, quando se encontrava no exercício das suas funções inerentes à categoria profissional de Operador de tratamento de materiais Grau 10, ao serviço da Ré “CC, S. A.”, dentro do seu horário de trabalho e nas instalações daquela, a trabalhar no equipamento de trabalho designado «B...», com o n.º interno 2 (utilizado para limpar os excessos/películas de peças provenientes da fundição), ao retirar a peça da máquina, o linguete não parou a rotação da engrenagem no final do 1º ciclo de rotação, e provocou-lhe o entalamento/esmagamento dos dedos da mão direita entre os elementos móveis do referido equipamento de trabalho. Em consequência sofreu traumatismo da mão direita, com amputação do 2º, 3º e 4º dedos. À data do acidente auferia uma retribuição anual de € 8 100,40 (retribuição base € 506,00 x 14 meses + alimentação em espécie com o valor de € 4,20 x 22 dias x 11 meses). A 2.ª Ré, empregadora, tinha a sua responsabilidade transferida para a 1.ª Ré através da apólice n.º ..., pelo salário anual de € 7.084,00. Como consequência direta e imediata do sinistro, ficou com as sequelas descritas no auto de exame médico, em face das quais foi-lhe atribuída uma IPP de 37,50%, com fator de bonificação de 1,5. Esteve com uma I.T.A. de 27.02.2014 a 08.01.2015 (316 dias) e com ITP de 75% de 09.01.2015 a 8.02.2015 (31 dias), dia em que foi considerado clinicamente curado. Despendeu em deslocações obrigatórias ao INML e ao Tribunal a quantia de € 33,30.
ii). Na tentativa de conciliação, no fim da fase conciliatória, as partes acordaram quanto à existência do acidente, ao salário auferido pelo sinistrado e à existência e validade do contrato de seguro.
iii). A ré seguradora “BB, S. A” contestou alegando, em síntese, que o acidente em apreço nos autos foi consequência da inobservância das regras sobre a segurança, higiene e saúde no trabalho por parte da empregadora que não colocou ao dispor do Autor a formação e equipamento adequado ao trabalho a efetuar, uma vez que a máquina em que laborava não reunia as condições e requisitos mínimos de segurança, pelas razões constantes na petição inicial. Acresce que essa falta de segurança encontrava-se em desobediência aos artigos 11.º, 12.º, 13.º, 14.º, 15.º e 16.º do DL n.º 50/2005 de 25 de fevereiro, que estipula os “Requisitos mínimos gerais aplicáveis a equipamentos de trabalho” e que “a prensa” não respeitava o estabelecido no n.º 4, do artigo 56.º-A, da Portaria 53/71, de 03 de fevereiro. Concluiu pugnando pela improcedência da ação na parte a ela atinente.
iv). Contestou, também, a ré empregadora, “CC, S. A.”, alegando que a máquina, em causa, está de acordo com as exigências de segurança e que o acidente ocorreu, por pura e simples, incúria do A., que não cuidou de aguardar que a máquina fizesse a operação até ao seu final, apesar de para tanto ter sido alertado pelos seus colegas e superiores hierárquicos. Ora, o A. colocou a mão sob a parte superior da máquina – que é a que faz um movimento “de prensa” e “de cima para baixo” - sem aguardar que a máquina parasse o seu movimento completo, pelo que só a sua imprudência é que causou o acidente. Os movimentos da máquina eram ordenados pelo próprio A., que fazia a mesma operação, tal e qual e consecutivamente, há mais de um ano. Não tem, pois, o Autor direito a qualquer indemnização ou pensão.
Concluiu pedindo a sua absolvição dos pedidos.
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1). Deferindo-se o seu pedido de fixação de uma pensão provisória, foi-lhe fixada a pensão de € 194,40, tendo por referência uma IPP de 37,5% que lhe havia sido atribuída pelo INML, proferiu-se despacho saneador no qual se afirmou a validade e regularidade da instância e se procedeu à seleção da matéria de facto e foi ordenado o desdobramento do processo, com a abertura do apenso de fixação de incapacidade.
2). Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença, em 16 de março de 2017, que julgou a ação parcialmente procedente por parcialmente provada, e, em consequência, condenou as rés no pagamento ao autor, AA, sem prejuízo dos juros que se mostrem devidos (artigo 135.º do CPT), das seguintes quantias: Foi fixada à ação o valor de € 82.070,94 - artigo 120º do CPT.
II
Inconformada com esta decisão, a Ré Empregadora dela interpôs recurso de apelação, impugnando a decisão da 1.ª instância quanto à matéria de facto, ínsita nos pontos 20.º e 21.º, e invocando a não verificação dos pressupostos da sua responsabilidade agravada a que aludem os artigos 18º, n.º 1 e 79º, n.º 3, ambos da Lei n.º 98/2008, de 04.09.
Ora, mantida que foi a decisão sobre a matéria de facto, por não ter sido conhecida a sua impugnação, dado que a recorrente não observou os ónus legalmente exigidos, por acórdão proferido, em 11 de setembro de 2017[5], o recurso foi julgado improcedente e, em consequência, mantida a sentença recorrida.
III
Irresignada, mais uma vez, a Ré “CC, S. A.” interpôs recurso de revista[6], concluindo a sua alegação da seguinte forma:
Terminou dizendo que o presente recurso de revista deve ser provido e, em consequência deve revogar-se o acórdão recorrido e ser substituído por outro que a absolva do pedido contra si formulado.
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A Ré “BB, S.A.” contra-alegou manifestando a sua adesão e total concordância à decisão recorrida.
Refere que “como bem entendeu e decidiu o acórdão, aqui posto em crise pela Recorrente, e desde já se diga sem razão, "Os factos evidenciam, diremos mesmo à exuberância, que a Ré não observou os deveres que lhe são impostos por Lei". “Nenhuma duvida se coloca em concluir que a R. atuou com elevado grau de culpa e que existe o necessário nexo causal entre esta conduta e a produção do sinistro, significando isso que há prova plena dos factos necessários para concluir, como concluiu o tribunal a quo pela sua responsabilidade agravada."
Finalizou, dizendo que a causa foi bem decidida e que a ela adere inteiramente.
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Por sua vez, o recorrido AA, patrocinado pelo Ministério Público, apresentou contra-alegações, em que pugna pela improcedência do recurso, e alegando que recaía sobre a Recorrente/ Empregadora o dever de observar as normas do n.º 1, artigo 16° do Decreto-Lei n.º 50/2005, de 25.02, do n.º 2, do artigo 281º, do Código do Trabalho[7], da alínea a), do n.º 3, do artigo 3º, do Decreto-Lei n.º 50/2005, de 25.02, e do artigo 15º, nºs 1 e 2, alínea c), da Lei 102/2009, de 10.09.
Mais aduziu que, como decorre da matéria de facto provada, nomeadamente dos factos 2º, 12 a 19°, 21º a 26º e 29º, a Empregadora não observou as referidas normas.
Assim sendo, concluiu que “[e]ntre essa conduta omissiva da recorrente e o acidente ocorre o necessário nexo de causalidade adequada, atento o teor dos factos provados 29° e 12° a 19°, já que se provou que «o acidente ocorreu porque o linguete não travou a rotação da engrenagem no final do 1.° ciclo de rotação, quando o autor retirava a peça da máquina»".
Finalmente, alegou que não lhe competia fazer a prova de que a máquina não estava em condições de operar, que era proibida a sua utilização, que não era possível promover a sua alteração de modo a impedir o contato mecânico ou a aplicação de mecanismo de bloqueio na zona de desligado e de demonstrar que se fossem implementadas, eventuais, medidas de segurança, impediriam o acidente, porque por não serem factos constitutivos do direito que invocara.
Com efeito, alega que essas circunstâncias, invocadas pela Empregadora, consubstanciam meras hipóteses, não constitutivas do direito invocado, mas incluídas no dever que lhe pertence “de garantir a segurança do trabalhador, nomeadamente através da utilização de máquinas equipadas com dispositivos de proteção”.
Terminou pedindo que a revista seja julgada improcedente porque provou, como lhe competia, que a máquina em causa não dispunha de protetores e/ou dispositivos de segurança, razão pela qual ocorreu o acidente de que foi vítima, e que a Recorrente não assegurou, como lhe competia, as condições de segurança daquele equipamento.
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O Ministério Público não emitiu parecer por, nos termos do artigo 87º, n.º 3, do CPT, lhe estar vedado, dado exercer o patrocínio do Autor/sinistrado.
IV
- Revista:
Nestes autos a instância iniciou-se em 13 de fevereiro de 2015 e o acórdão recorrido foi proferido em 11 de setembro de 2017.
Nessa medida, é aqui aplicável:
· O Código de Processo Civil (CPC), anexo e aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho; · O Código de Processo do Trabalho (CPT) aprovado pelo Decreto-Lei n.º 480/99, de 9 de novembro, e alterado pelos Decretos-Leis n.ºs 323/2001, de 17 de dezembro, 38/2003, de 8 de março (retificado pela Declaração de Retificação n.º 5-C/2003, de 30 de abril) e 295/2009, de 13 de outubro (retificado pela Declaração de Retificação n.º 86/2009, de 23 de novembro). · A Lei n.º 98/2009, de 04 de setembro, que regulamenta o regime de reparação de acidentes de trabalho e de doenças profissionais.
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Estão colocadas duas questões e que são:
- Se houve, por parte da Ré/recorrida, inobservância de normas de segurança; - Em caso afirmativo, se existiu nexo de causalidade entre essa omissão e o acidente sofrido pelo Autor/trabalhador.
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Cumpre, pois, julgar o objeto do recurso. IV
Da matéria de facto:
As instâncias deram como provada a seguinte factualidade[8]:
1. “Em 03.09.2013 o autor foi admitido ao serviço da 2ª Ré «CC, SA» para, sob as ordens, direção e fiscalização desta, desempenhar as funções inerentes à categoria profissional de Operador de Tratamento de materiais Grau 10.
2. No dia 26.02.2014, pelas 8H30, quando o A. se encontrava no exercício das suas funções, dentro do seu horário de trabalho, nas instalações da 2ª Ré, a trabalhar no equipamento de trabalho designado «B...», com o n.º interno 2 (utilizado para limpar os excessos/películas de peças provenientes da fundição), ao retirar a peça da máquina, o linguete não parou a rotação da engrenagem no final do 1º ciclo de rotação, provocando o entalamento/esmagamento dos dedos da mão direita do trabalhador entre os elementos móveis do referido equipamento de trabalho.
3. Do acidente supra descrito resultou traumatismo da mão direita, com amputação do 2º, 3º e 4º dedo.
4. À data do acidente o autor auferia uma retribuição anual de € 8.100,40 (retribuição base 506,00 x 14 meses + alimentação em espécie com o valor de € 4,20 x 22 dias x 11 meses). 5. A 2ª Ré Entidade Empregadora tinha a sua responsabilidade transferida para a 1.ª Ré através da apólice n.º ..., pelo salário anual de € 7.084,00.
6. Na tentativa de conciliação realizada em 09.03.2016 as Rés reconheceram o acidente supra descrito como de trabalho, o nexo de causalidade entre as lesões descritas no auto de exame médico do INML e o acidente, a transferência da responsabilidade por acidentes de trabalho através da apólice n.º ..., pelo vencimento anual de € 7.084,00.
7. A Ré seguradora aceita o resultado do exame médico do INML que atribuiu a IPP de 37,5% com a bonificação de 1,5 e o período de ITA de 27.02.2014 a 08.01.2015, Contudo não aceita a responsabilidade pela reparação do acidente por entender que o mesmo se ficou a dever à inobservância das regras de segurança por parte da 2ª Ré, entidade empregadora, que permitia que o sinistrado laborasse numa máquina sem que estivessem reunidos os requisitos mínimos de segurança e a 2º Ré entidade empregadora aceitou o vencimento reclamado pelo A. contudo não aceita o resultado e a IPP atribuída e os períodos e graus de IT’s atribuídos pelo INML, não aceitando, igualmente, responsabilizar-se pela reparação do acidente de trabalho supra descrito, uma vez que entende que o sinistrado teve culpa na produção do acidente.
8. O autor recebeu da seguradora a título de indemnização por IT’s a quantia de € 5.144,87.
9. O Autor nasceu no dia ……..1957.
10. Como consequência do sinistro, o autor apresenta as seguintes sequelas:
11. O Autor esteve com uma I.T.A. de 27.02.2014 a 08.02.2015.
12. No momento do acidente o referido equipamento de trabalho «B...» não possuía proteção coletiva que prevenisse ou impedisse o risco de contacto mecânico ou entalamento/esmagamento da mão do sinistrado pelos elementos móveis.
13. O referido equipamento de trabalho não dispunha de qualquer proteção a limitar o acesso à zona operativa.
14. A referida máquina permite o acesso ao volante, cambota, biela e corrediça.
15. 15. A ferramenta/cabeçote/punção está desprotegida e acessível a qualquer operador.
16. O referido equipamento de trabalho dispõe de um dispositivo de comando bimanual (funcionamento síncrono simultâneo e contínuo).
17. Devido ao tipo de acionamento, se o linguete estiver “solto” quando se liga o motor a prensa dá um golpe.
18. Após paragem ou interrupção da energia, a máquina pode executar golpes, devido à inércia do volante.
19. Na referida máquina inexiste um dispositivo de corte geral da energia pneumática, com possibilidade de bloqueio na zona de desligado.
20. Na referida máquina existem aberturas no quadro elétrico permitindo a entrada de poeiras e outras partículas.
21. No momento do acidente a máquina não se encontrava identificada, nem possuía placa identificativa.
22. E não possuía Certificado CE.
23. A máquina possuía um quadro com botões, comandos e sinalizadores, sem qualquer identificação, relativamente à função que desempenham.
24. Nas instalações da Ré – EE inexistiam instruções de segurança para prevenção dos riscos a que se está exposto durante o trabalho com máquina, bem como procedimentos de trabalho seguros.
25. O movimento de descida do cabeçote/punção realiza-se em poucos segundos.
26. Para operar a referida máquina o operador tem que utilizar, simultaneamente, as duas mãos para “dar ordens” à máquina, o que faz através das “botoneiras” (que estão colocadas em ambos os lados da máquina), e faz com que tenha, obrigatoriamente, que estar afastado da máquina, maxime, da zona de potencial esmagamento.
27. O autor sabia que a máquina, mesmo depois de fazer um movimento de prensa, num mau funcionamento do linguete poderia fazer um outro imediatamente a seguir.
28. Os movimentos da máquina eram ordenados pelo próprio autor, que fazia a mesma operação, tal e qual, consecutivamente, há mais de um ano.
29. O acidente ocorreu porque o linguete não travou a rotação da engrenagem no final do 1º ciclo de rotação, quando o autor retirava a peça da máquina.
30. Na sequência das sequelas de que sofre, o autor ficou a padecer de uma IPP de 37,5% com IPATH.
31. A consolidação médico-legal das lesões sofridas pelo autor ocorreu a 08.02.2015.”
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Do direito:
- Inobservância de normas de segurança pela Empregadora:
Neste recurso, as partes não estão de acordo quanto a saber se, face à factualidade provada, houve inobservância de regras de segurança pela Ré/empregadora e, em caso afirmativo, se existiu nexo causal entre essa inobservância e a ocorrência do acidente,
Para a Empregadora, não se provou que não observou qualquer norma de segurança e também não se provou que existiu nexo causal entre essa não observância e o sinistro em causa.
Para o Sinistrado e para a Ré/seguradora, o acidente ficou a dever-se, necessária e diretamente, à inobservância de normas de segurança por parte da Empregadora. De acordo com o previsto no artigo 284º, do CT, a Lei n.º 102/2009, de 10 de setembro[15], veio estabelecer o regime jurídico da promoção e prevenção da segurança e da saúde no trabalho. De acordo com o seu artigo 5º, n.º 1, o trabalhador tem direito à prestação de trabalho em condições que respeitem a sua segurança e a sua saúde, asseguradas pelo empregador. Acresce que o seu artigo 15º, impõe que o empregador deve assegurar ao trabalhador condições de segurança e de saúde em todos os aspetos do seu trabalho (n.º 1) e deve, igualmente, zelar, de forma continuada e permanente, pelo exercício da atividade em condições de segurança e de saúde para o trabalhador, tendo em conta, nomeadamente, os seguintes princípios gerais de prevenção (n.º 2).
a). O Decreto-Lei n.º 50/2005, de 28 de fevereiro, transpõe para a ordem jurídica interna a Diretiva n.º 89/655/CEE, do Conselho, de 30 de novembro, alterada pela Diretiva n.º 95/63/CE, do Conselho, de 5 de dezembro, e pela Diretiva n.º 2001/45/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de junho, relativa às prescrições mínimas de segurança e de saúde para a utilização pelos trabalhadores de equipamentos de trabalho. É aplicável, exceto na medida em que regimes especiais disponham diversamente, a todos os ramos de atividade, nos sectores privado, cooperativo e social, e ao trabalhador por conta de outrem e respetivo empregador.
O seu artigo 2º, alíneas a), b), e e), define, para efeitos do diploma, «Equipamento de trabalho» [qualquer máquina, aparelho, ferramenta ou instalação utilizado no trabalho], «Utilização de um equipamento de trabalho» [qualquer atividade em que o trabalhador contacte com um equipamento de trabalho, nomeadamente a colocação em serviço ou fora dele, o uso, o transporte, a reparação, a transformação, a manutenção e a conservação, incluindo a limpeza] e por «Operador» [qualquer trabalhador incumbido da utilização de um equipamento de trabalho].
O artigo 3º, estipula, por sua vez, que para assegurar a segurança e a saúde dos trabalhadores na utilização de equipamentos de trabalho, além do mais, o empregador deve assegurar que os equipamentos de trabalho são adequados ou convenientemente adaptados ao trabalho a efetuar e garantem a segurança e a saúde dos trabalhadores durante a sua utilização, e o artigo 8º, n.º 1, determina que o empregador deve prestar aos trabalhadores e seus representantes para a segurança, higiene e saúde no trabalho a informação adequada sobre os equipamentos de trabalho utilizados.
Assim:
- Os requisitos mínimos previstos nos artigos 11º a 29º, são aplicáveis na medida em que o correspondente risco exista no equipamento de trabalho considerado [artigo 8º, n.º 1]; - Os sistemas de comando de um equipamento de trabalho que tenham incidência sobre a segurança devem ser claramente visíveis e identificáveis e ter, se for caso disso, uma marcação apropriada [artigo 11º]; - Os equipamentos de trabalho devem estar providos de um sistema de comando de modo que seja necessária uma ação voluntária sobre um comando com essa finalidade para que possam [artigo 12º]: - O equipamento de trabalho deve estar provido de um sistema de comando que permita a sua paragem geral em condições de segurança, bem como de um dispositivo de paragem de emergência se for necessário em função dos perigos inerentes ao equipamento e ao tempo normal de paragem [artigo 13º, n.º 2]; - Os elementos móveis de um equipamento de trabalho que possam causar acidentes por contacto mecânico devem dispor de protetores que impeçam o acesso às zonas perigosas ou de dispositivos que interrompam o movimento dos elementos móveis antes do acesso a essas zonas [artigo 16º, n.º 2]. b). Por sua vez, a Portaria n.º 53/71, de 03 de fevereiro [alterada pela Portaria n.º 702/80 - Diário da República n.º 219/1980, Série I de 22.03.1980], aprovou o Regulamento Geral de Segurança e Higiene do Trabalho nos Estabelecimentos Industriais. Esta Portaria aplica-se a todos os estabelecimentos industriais públicos, cooperativos ou privados onde se exerça atividade constante da tabela anexa ao Decreto n.º 46924, de 28 de março de 1966, e suas alterações. A atividade exercida pela Empregadora consta naquela tabela.
Dispõe-se no artigo 3º, que são obrigações gerais da entidade patronal, cumprir as disposições do presente Regulamento, demais preceitos legais e regulamentares aplicáveis, bem como as diretivas das entidades competentes no que se refere à higiene e segurança do trabalho e adotar as medidas necessárias, de forma a obter uma correta organização e uma eficaz prevenção dos riscos que podem afetar a vida, integridade física e saúde dos trabalhadores ao seu serviço; - No artigo 42º: - Os órgãos para a transformação do movimento rotativo em alternativo, ou vice-versa, tais como cruzetas, bielas, excêntricos, manivelas e similares, devem estar convenientemente protegidos, a menos que se encontrem em posição inacessível. - No artigo 44º: - Os protetores e os resguardos devem ser concebidos, construídos e utilizados de modo a assegurar uma proteção eficaz que interdite o acesso à zona perigosa durante as operações; não causar embaraço ao operador, nem prejudicar a produção; funcionar automaticamente ou com um mínimo de esforço; estar bem-adaptados à máquina e ao trabalho a executar, fazendo, de preferência, parte daquela; permitir a lubrificação, a inspeção, a afinação e a reparação da máquina. - Todos os protetores devem ser solidamente fixados à máquina, pavimento, parede ou teto e manter-se aplicados enquanto a máquina estiver em serviço. - No artigo 56º-A, n.º 4: - As prensas devem ter proteções em grade ou de outro tipo, de forma a envolverem completamente a ferramenta e a torná-la inacessível às mãos do trabalhador quando a punção desce e que os comandos devem ser de preferência bimanuais para que as mãos do trabalhador estejam sempre afastadas da ferramenta quando esta desce.
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Contudo, como resulta dos pontos 12º a 15º, 17º a 19º, 27º e 28º, da matéria de facto a Empregadora não as observou, tendo-as omitido.
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Sustenta, ainda, a Empregadora, que não se provou que alterações devia fazer na máquina, ou seja, que medidas concretas de segurança devia adotar para a transformar, e se eram possíveis, para que o acesso à zona de corte, ao volante, à cambota, à biela, ou à corrediça fosse limitado, e impedisse o contato mecânico ou a aplicação de mecanismos de bloqueio ou na zona de desligado [factos a que se alude nos pontos 12, 13 e 14, dos factos provados]. Mais alega que também não se provou que se tivessem sido implementadas essas alterações e medidas o acidente não teria ocorrido na mesma.
Todavia, não incumbia ao Autor qualquer ónus de prova sobre as alterações que se deviam fazer na máquina em causa, ou seja, que medidas concretas de segurança se deviam adotar na sua modificação a proteção. O mesmo acontece sobre a possibilidade, ou não, da sua transformação.
Com efeito, a obrigação da implementação das medidas de segurança nesse equipamento cabia ao empregador, nos termos das normas conjugadas dos artigos 3º, alíneas a) e ), e 40º, n.º 2, ambos da Portaria n.º 53/71. Acresce que, caso não houvesse possibilidade de efetuar as alterações necessárias e adequadas no equipamento em questão, ou se este as não comportasse, não podia o empregador utilizá-lo, mesmo estando em condições de operar, pois a segurança dos trabalhadores incumbidos de o usar continuava em risco, desprotegida e não salvaguardada. Continuando a funcionar, como aconteceu, estava a Recorrente a violar quer a Constituição quer a legislação que versa sobre a segurança do trabalhador na prestação do seu trabalho e, especificamente, o disposto no artigo 40º, da Portaria n.º 53/71.
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- Existência nexo de causalidade entre a omissão das medidas de segurança e o acidente sofrido pelo Autor:
Alega a Empregadora que não está identificado o nexo de causalidade entre a ausência de medidas de segurança e o acidente ocorrido, que estando assente que o acidente se deu em virtude do mau funcionamento do linguete, o mesmo não se deu pela ausência dos aludidos protetores e que, mesmo tratando-se de uma zona de perigo e que a mesma estivesse protegida por protetores, o trabalhador sempre teria de aceder àquela parte da máquina com a própria mão por forma a retirar a peça produzida.
Ora, são as instâncias que procedem ao apuramento da matéria de facto relevante para a solução do litígio e somente a Relação pode emitir um juízo de censura sobre o apurado na 1.ª instância. Ora, estes normativos são aplicáveis em processo laboral por força da remissão feita pelo artigo 81º, n.º 5, do Código de Processo do Trabalho. São, assim, os poderes do Supremo Tribunal de Justiça, em sede de alteração e apreciação da matéria de facto, muito restritos. A teoria da causalidade adequada impõe, pois, num primeiro momento, a existência de um facto naturalístico concreto, condicionante de um dano sofrido, para que este seja reparado; e, num segundo momento, que o facto concreto apurado seja, em geral e abstrato, adequado e apropriado para provocar o dano. ~~~~~~~~~ Improcedem, por isso, as conclusões da alegação do recurso de revista.
Pelo exposto, delibera-se negar a revista e, em consequência, manter o acórdão recorrido. Custas pela Ré/Empregadora. Anexa-se o sumário do Acórdão. ~~~~~~~~~ Lisboa, 01 de março de 2018
Ferreira Pinto – (Relator) Chambel Mourisco Pinto Hespanhol __________________ |