Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01057/13
Data do Acordão:04/02/2014
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ASCENSÃO LOPES
Descritores:CONTRA-ORDENAÇÃO FISCAL
COIMA ÚNICA
CÚMULO JURÍDICO
CUMULO MATERIAL
Sumário:I - Considerando o conteúdo justificativo da decisão de aplicação da coima a que se referem os autos entende-se que apesar de sintético não foi violado o disposto no artº 79º nº 1 al. b) do RGIT.
II - Mas, ainda que o fosse como o considerou a decisão de 1ª instância, sempre o facto de ter sido aplicada uma coima única em cúmulo jurídico pelo valor mínimo determina que não ocorra nulidade insuprível (vide ac. do STA de 16/04/1997 proferido no recurso nº 21221 citado na sentença recorrida, pelo que falece por completo a pretensão da recorrente.
Nº Convencional:JSTA00068641
Nº do Documento:SA22014040201057
Data de Entrada:06/07/2013
Recorrente:A..., LDA
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF LEIRIA
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR FISC - CONTRA ORDENAÇÃO TRIB
Legislação Nacional:RGIT01 ART2 ART3 ART19 ART63 N1 D ART67 ART79 N1 B ART114 N2.
CPTRIB91 ART195 N1 D.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC021221 DE 1997/04/16.; AC STA PROC0855/11 DE 2011/11/23.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em conferência, nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1 – RELATÓRIO

A……………….., Lda, arguida nos processos de contra-ordenação nºs 1350200906007040, 1350200906007058, 1350200906033520; 1350201006002366; 1350201006002560; 13502010060226621, 1350201006026710, 1350201006026702 e 1350201006026630, por requerimento de 17/9/2010, requereu a realização de cúmulo jurídico em relação às coimas aplicadas nestes processos.

Por despacho de 6/11/2010 foi aplicada coima única em relação aos processos n.° 1350200906007040, 1350200906007058; 1350200906033520; 1350201006026702; 1350201006002560; 1350201006026621 e 1350201006026710, no montante de € 9.674,69 mas não levou em consideração o processo de contra-ordenação n.° 1350201006002366.

A………………., Lda, recorreu para o TAF de Leiria peticionando o arquivamento do processo, ou subsidiariamente, ser efectuado o cúmulo em que se considerasse também o processo de contra-ordenação n.° 1350201006002366.

Por sentença de 22 de Janeiro de 2013, o TAF de Leiria, julgou parcialmente procedente o recurso e em consequência absolveu a arguida da contra-ordenação que lhe é imputada no processo n.° 1350200906033520.
Mantendo em tudo o mais, cúmulo jurídico realizado na DF de Leiria.

Reagiu a ora recorrente A………………, Lda, interpondo o presente recurso cujas alegações integram as seguintes conclusões:

1. A descrição sumária dos factos prevista no artigo 79.°, n.° 1, alínea b) do RGIT como requisito da decisão administrativa da aplicação da coima visa assegurar ao arguido a possibilidade do exercício efectivo dos seus direitos de defesa, no pressuposto de um conhecimento perfeito dos factos que lhe são imputados.
2. O facto tipificado como contra-ordenação no n.,° 2 do artigo 114.° do RGIT reporta-se à tipificação constante do n.° 1 do mesmo preceito legal, mas cometido de forma negligente, sendo seu pressuposto essencial a prévia dedução da prestação tributária não entregue.
3. Neste sentido, a falta de entrega da prestação tributária de IVA não preenche o tipo legal de contra-ordenação acima referido, uma vez que no IVA a prestação a entregar não é a prestação tributária deduzida, mas sim a diferença positiva entre o imposto suportado pelo sujeito passivo e o imposto a cuja dedução tem direito.

Nesta conformidade, impõe-se conceder provimento recurso, revogar a sentença recorrida e julgar procedente o recurso judicial interposto contra a decisão que aplicou a coima à arguida.

Respondeu o Ministério Público concluindo da seguinte forma:

1. O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões.
2. Das conclusões constantes do presente recurso não se compreende o exacto alcance do mesmo, uma vez que aparenta pôr em causa uma decisão que lhe foi favorável (proc.. 1350200906033520)
3. Por outro lado e quanto ao processo que foi excluído do cúmulo pela autoridade administrativa e assim mantido, os factos a que se reporta foram objecto de acusação pelo Ministério Público, pelo também aí bem andou a sentença recorrida.
4. Quanto à manutenção da coima única, a respectiva decisão contém os requisitos mínimos exigíveis, atendendo a que o montante aplicado foi o mínimo, na esteira do decidido por esse Colendo Supremo Tribunal (Ac. de 16/4/1997, proc. 21221).
5. Não merece pois censura a douta sentença recorrida, pelo que deve ser mantida.
VOSSAS EXCELÊNCIAS, PORÉM, COMO SEMPRE, MELHOR DECIDIRÃO FAZENDO JUSTIÇA

O EMMP neste STA pronunciou-se emitindo o seguinte parecer:

A………… recorreu, invocando já o que alega com base na violação do disposto no art. 79 nº1 al. b) do RGIT quanto aos vários processos de contra-ordenação de que foi aplicada uma coima única em cúmulo jurídico.
Pese embora o que se alega em resposta, quer parecer que terá ainda interesse na apreciação do recurso para o STA, uma vez que foi mantida a condenação quanto às contra-ordenações previstas no artº 114º nº 2 do RGIT.
Assim e de acordo com a jurisprudência do STA que cita é de decidir o recurso que se montra interposto.

2 – FUNDAMENTAÇÃO

O Tribunal “a quo” deu como provada a seguinte factualidade:

1. Por requerimento de 17/9/2010, a recorrente requereu a realização de cúmulo jurídico em relação às coimas aplicadas nos processos n.°s 1350200906007040, 1350200906007058, 1350200906033520; 1350201006002366; 1350201006002560; 13502010060226621, 1350201006026710, 1350201006026702 e 1350201006026630 (fls. 27 cujo conteúdo se dá por reproduzido).
2. Por despacho de 6/11/2010 foi aplicada coima única em relação aos processos n.° 1350200906007040, 1350200906007058; 1350200906033520; 1350201006026702; 1350201006002560; 1350201006026621 e 1350201006026710
3. No despacho escreveu-se:
Soma das coimas concretamente aplicadas - € 40.348,26 (nº 1 do artigo 25° do RGIT)
Limite mínimo da coima a aplicar - € 9.674,69 (n° 3 do artigo 25.º do RGIT)
Coima aplicada - € 9.674,69 (fls. 33 cujo conteúdo se dá por reproduzido)
4. A soma das contra-ordenações em concurso totalizavam € 40.348,26 (fls. 77 cujo conteúdo se dá por reproduzido).
5. Sendo a coima mais elevada no montante de € 9.674,69 (fls. 77 cujo conteúdo se dá por reproduzido)
6. O processo n.° 1350201006002366 não integrou o cúmulo jurídico realizado; os factos referentes a este processo foram, entretanto, objecto de acusação pelo MP (informação de fls. 78 cujo conteúdo se dá por reproduzido)
7. O processo de contra ordenação n.° 1350200906033520 foi instaurado contra a recorrente por falta de entrega da prestação tributária no prazo legal. Sendo o montante em dívida de €31.359,72, a recorrente apenas entregou € 10.000,00 ficando em falta € 21.359,72 (fls. 10 cujo conteúdo se dá por reproduzido).
8. A coima aplicada foi de €4.271,95, correspondente ao valor mínimo legal (fls. 32 cujo conteúdo se dá por reproduzido).

3 – DO DIREITO

O meritíssimo juiz do TAF de Leiria, julgou parcialmente procedente o recurso e em consequência absolveu a arguida da contra-ordenação que lhe é imputada no processo n.° 1350200906033520.
Mantendo em tudo o mais, cúmulo jurídico realizado na DF de Leiria, por entender que:

“I RELATÓRIO.
RECURSO DE APLICAÇÃO DE COIMAS N.° 79/11.
RECORRENTE.
A…………….., Lda.
PEDIDO FORMULADO - Síntese.
Arquivamento do processo de contra ordenação ou, subsidiariamente, ser efectuado o cúmulo legal com as demais coimas que se encontram recorridas.
FUNDAMENTOS DO RECURSO.
A recorrente solicitou ao SF a aplicação de coima única; face a tal requerimento o SF fixou coima no montante de € 9.674,69 mas não levou em consideração o processo de contra ordenação n.° 1350201006002366. A decisão recorrida é omissa quanto às razões ou circunstâncias que devem contribuir para a fixação de coima em concreto.
RESPOSTA.
Não houve.
PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO.
Não houve.

II FUNDAMENTOS DE FACTO.
1. Por requerimento de 17/9/2010, a recorrente requereu a realização de cúmulo jurídico em relação às coimas aplicadas nos processos n.°s 1350200906007040, 1350200906007058, 1350200906033520; 1350201006002366; 1350201006002560; 13502010060226621, 1350201006026710, 1350201006026702 e 1350201006026630 (fls. 27 cujo conteúdo se dá por reproduzido).
2. Por despacho de 6/11/2010 foi aplicada coima única em relação aos processos n.° 1350200906007040, 1350200906007058; 1350200906033520; 1350201006026702; 1350201006002560; 1350201006026621 e 1350201006026710
3. No despacho escreveu-se:
Soma das coimas concretamente aplicadas - € 40.348,26 (nº 1 do artigo 25° do RGIT)
Limite mínimo da coima a aplicar - € 9.674,69 (n° 3 do artigo 25.º do RGIT)
Coima aplicada - € 9.674,69 (fls. 33 cujo conteúdo se dá por reproduzido)
4. A soma das contra-ordenações em concurso totalizavam € 40.348,26 (fls. 77 cujo conteúdo se dá por reproduzido).
5. Sendo a coima mais elevada no montante de € 9.674,69 (fls. 77 cujo conteúdo se dá por reproduzido)
6. O processo n.° 1350201006002366 não integrou o cúmulo jurídico realizado; os factos referentes a este processo foram, entretanto, objecto de acusação pelo MP (informação de fls. 78 cujo conteúdo se dá por reproduzido)
7. O processo de contra ordenação n.° 1350200906033520 foi instaurado contra a recorrente por falta de entrega da prestação tributária no prazo legal. Sendo o montante em dívida de €31.359,72, a recorrente apenas entregou € 10.000,00 ficando em falta € 21.359,72 (fls. 10 cujo conteúdo se dá por reproduzido).
8. A coima aplicada foi de €4.271,95, correspondente ao valor mínimo legal (fls. 32 cujo conteúdo se dá por reproduzido).

FACTOS NÃO PROVADOS.
Com interesse para a decisão da causa nada mais se provou.
MOTIVAÇÃO.
A convicção do tribunal baseou-se nos documentos juntos aos autos, referidos nos «factos provados» com remissão para as folhas do processo onde se encontram.

III O DIREITO.
O processo n.° 1350201006002366 não integrou o cúmulo jurídico realizado na DF, sendo esta omissão um dos fundamentos do presente recurso.
Porém, os factos que integravam aquele processo foram objecto de acusação pelo MP, pelo que, nestas circunstâncias, não pode ser punido a título de contra ordenação, conforme dispõe o Art.º 2º/3 RGIT.
Como tal, não tinha de integrar o cúmulo jurídico realizado pela AT.

Quanto ao recurso de contra ordenação referente ao processo n.° 1350200906033520.
Neste recurso, a recorrente alega a nulidade da decisão administrativa, e defende também que a coima não pode ser aplicada.
Com efeito, foi aplicada coima por falta de entrega no prazo legal da prestação tributária exigível.
Mas esta conduta não é punível, como tem sido jurisprudência do STA ¹ (Ac do STA nº 0855/11 de 23-11-2011: II - O facto tipificado como contra-ordenação no nº 2 do artigo 114.º do RGlT reporta-se à tipificação constante do nº 1 do mesmo preceito legal, mas cometido de forma negligente, sendo seu pressuposto essencial a prévia dedução da prestação (tributária não entregue.
III - Neste sentido, a falta de entrega da prestação tributária de IVA, não preenche o tipo legal de contra-ordenação acima referido, uma vez que no IVA a prestação a entregar não é a prestação tributária deduzida, mas sim a diferença positiva entre o imposto suportado pelo sujeito passivo e o imposto a cuja dedução tem direito.).
Quanto ao cúmulo Jurídico.
No caso do concurso de contra-ordenações, o agente é punido com uma coima única cujo limite máximo resulta da soma das coimas concretamente aplicadas.
A coima aplicada não pode exceder o dobro do limite máximo mais elevado das contra-ordenações em concurso.
A coima a aplicar não pode, assim, ser inferior à mais elevada das coimas concretamente aplicadas (Art.° 19º do Regime Geral das Contra-Ordenações e Coimas)
A soma dos valores das coimas em concurso era de € 40.348,26.
O valor da coima mais elevada foi aplicada no procedimento contra-ordenacional n.° 1350201006002560, no montante de €9.674,69.
O montante da coima única aplicada em concurso foi € 9.674,69, sem que se ponderassem as circunstâncias concretas que determinaram a aplicação da pena, exigência prevista no Art.° 79°/c) RGIT, constituindo nulidade da decisão (Art.° 63°/l, d) RGIT).
Mas tem-se entendido que aplicada uma coima pelo montante mínimo e constando dos autos os elementos que permitem o controlo judicial da sua aplicação, não constitui nulidade insuprível, nos termos da alínea d) do n.° 1 do artigo 195 do CPT a omissão da indicação dos elementos que contribuíram para afixação da coima” (Ac. do STA de 16/4/1997, proferido no recurso n.º 21221).
No caso em apreço, foi aplicada coima única pelo valor mínimo, pelo que colhe inteira aplicação a doutrina deste acórdão.
E note-se que não obstante a absolvição da coima aplicada no processo n.° 1350200906033520 tal não altera o cúmulo jurídico, uma vez que a coima (mínima) aplicada foi a coima mais elevada.

IV DECISÃO.
Termos em que:
a) Julgo parcialmente procedente o recurso e em consequência absolvo a arguida da contra ordenação que lhe é imputada no processo n.° 1350200906033520.
b) Mantendo em tudo o mais cúmulo jurídico realizado na DF de Leiria.”


DECIDINDO NESTE STA:
Questiona a recorrente a sua condenação em cúmulo jurídico nos termos em que foi efectuada.
Suscita só agora no recurso para este STA questões atinentes à interpretação do disposto no artº 114º nº 2 do RGIT defendendo que a falta de entrega da prestação tributária de IVA não preenche o tipo legal de contra-ordenação acima referido, uma vez que no IVA a prestação a entregar não é a prestação tributária deduzida, mas sim a diferença positiva entre o imposto suportado pelo sujeito passivo e o imposto a cuja dedução tem direito.

Vejamos:
A questão da melhor interpretação do disposto no artº 114º do RGIT é questão nova introduzida pelo recorrente na peça processual que apresentou a fls. 80 a 88 relativa exclusivamente ao processo de contra-ordenação 13502009060023520 e que o Mº Juiz de 1ª Instância apreciou dando razão à recorrente sem que alguém tenha reagido pelo que em relação à absolvição da prática da contra-ordenação no mencionado recurso esta decisão transitou em julgado e nada mais há a acrescentar.
Perante o mesmo juiz suscitou a recorrente a questão da inclusão ou não do processo de contra-ordenação 1350201006002366 a qual foi decidida, no sentido de que não devia integrar o cúmulo e que agora não vem questionada pelo que a decisão judicial nesta parte também se mostra assente na ordem jurídica.

Resta a questão de saber se no cúmulo efectuado ocorre falta de descrição sumária dos factos puníveis, na decisão administrativa.
Cremos que o probatório espelha bem essa descrição sumária descrevendo as condutas tipificadas na lei sancionatória desde logo com a indicação individualizada e com datas dos casos em que a declaração periódica de IVA foi entregue com o meio de pagamento fora do prazo legal ou foi entregue sem o meio de pagamento fora do prazo legal ou dentro do prazo legal mas sem meio de pagamento (vide fls. 75 a 78).

O artº 79º do RGIT estipula:
1 - A decisão que aplica a coima contém:

a) A identificação do infractor e eventuais comparticipantes;
b) A descrição sumária dos factos e indicação das normas violadas e punitivas;
c) A coima e sanções acessórias, com indicação dos elementos que contribuíram para a sua fixação;
d) A indicação de que vigora o princípio da proibição da reformatio in pejus, sem prejuízo da possibilidade de agravamento da coima, sempre que a situação económica e financeira do infractor tiver entretanto melhorado de forma sensível;
e) A indicação do destino das mercadorias apreendidas;
f) A condenação em custas.

2 - A notificação da decisão que aplicou a coima contém, além dos termos da decisão e do montante das custas, a advertência expressa de que, no prazo de 20 dias, o infractor deve efectuar o pagamento ou recorrer judicialmente, sob pena de se proceder à sua cobrança coerciva.

3 - A notificação referida no número anterior é sempre da competência do serviço tributário referido no artigo 67.º


Considerando o conteúdo justificativo da decisão de aplicação da coima supra referido entende-se que apesar de sintético não foi violado o disposto no artº 79º nº 1 al. b) do RGIT. Mas ainda que o fosse como o considerou a decisão de 1ª instância, sempre o facto de ter sido aplicada uma coima única em cumulo jurídico pelo valor mínimo determina que não ocorra nulidade insuprível (vide ac. do STA de 16/04/1997 proferido no recurso nº 21221 citado na sentença recorrida.
Assim sendo falece por completo a pretensão da recorrente.

4-DECISÃO:
Nestes termos, e pelo exposto acordam os Juízes deste STA em negar provimento ao recurso e em confirmar a decisão recorrida.

Custas a cargo da recorrente.

Lisboa, 2 de Abril de 2014. - Ascensão Lopes (relator) - Casimiro Gonçalves - Dulce Neto.