Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01658/15
Data do Acordão:02/22/2017
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ARAGÃO SEIA
Descritores:IMPOSTO MUNICIPAL SOBRE IMÓVEIS
BENEFÍCIOS FISCAIS
PESSOA COLECTIVA DE UTILIDADE PÚBLICA
PRÉDIO URBANO
AFECTAÇÃO
FIM ESTATUTARIO
Sumário:I - A isenção a que alude o artigo 44º, n.º 1, al. e) do EBF, apenas respeita aos prédios que estão directamente afectos aos fins estatutários da pessoa colectiva de utilidade pública, v.g., os necessários à instalação da sua sede, delegações e serviços indispensáveis aos fins estatutários, sendo o seu reconhecimento oficioso nos termos do disposto no artigo 44º, n.º 4 do mesmo EBF.
II - A isenção prevista no artigo 1º, al. d) da Lei n.º 151/99 mantém-se presentemente em vigor e abrange apenas os prédios urbanos que pertençam às pessoas colectivas de utilidade pública, que se encontrem destinados à realização dos fins estatutários e carece de reconhecimento por parte do órgão competente, dependente de pedido expressamente formulado nesse sentido pela interessada.
Nº Convencional:JSTA00070046
Nº do Documento:SA22017022201658
Data de Entrada:04/29/2016
Recorrente:CAIXA ECONÓMICA MONTEPIO GERAL
Recorrido 1:AT-AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC REVISTA EXCEPC.
Objecto:AC TCAN
Decisão:PROVIDO PARCIALMENTE
Área Temática 1:DIR FISC - IMI.
Legislação Nacional:CIMI.
L 151/99 ART1
EBF ART44.
CCIV66 ART7 ART9.
CCPIIA ART10 ART7 ART8.
DL 260-D/81.
L 2/78.
DL 287/2003 ART28.
CPPT ART65.
CPC ART 609.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam os juízes da secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, em julgamento ampliado:

A CAIXA ECONÓMICA MONTEPIO GERAL (CEMG), inconformada, interpôs recurso de revista nos termos do artº 150º do CPTA, da decisão do TCA Norte datada de 3 de Julho de 2015, que concedeu provimento ao recurso então deduzido, pela AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro (TAF de Aveiro) datada de 30 de Dezembro de 2014, que julgou procedente a acção administrativa especial, deduzida pela ora recorrente contra a ora recorrida, no seguimento do pedido de anulação do acto de indeferimento de recurso hierárquico, praticado pela Subdirectora-Geral dos Impostos, relativo a benefício fiscal consistente na isenção de IMI de prédio urbano.

Alegou, tendo concluído como se segue:
I. O douto aresto recorrido parte de lapso manifesto para considerar que a alínea d) do artigo 1º da Lei 151/99 de 14.09 não se sobrepõe às alíneas e) e f) do nº 1 do actual artigo 44º do EBF e para considerar que a Lei versa sobre CA e o EBF sobre IMI;
II. Tal asserção atentará contra o nº 1 do artigo 31º do Decreto-Lei 287/2003, de 12.11 e ainda muito mais acentuadamente contra a letra do nº 1 do artigo 28º do Decreto-Lei 287/2003, de 12.11 (remissões);
III. A contar de 01.12.2003 (data da revogação da CA e do CCA) a alínea d) do artigo 1º da Lei 151/99 de 14.09 passou a ter, na prática, a seguinte redacção: “Imposto municipal sobre imóveis de prédios destinados à realização dos seus fins estatutários”.
IV. Partindo o douto acórdão recorrido deste lapso manifesto não pode manter-se a douta conclusão de que, in casu, apenas se aplica o regime da alínea e) do nº 1 do actual artigo 44º do EBF, nem poderá ainda afirmar-se que a alínea d) do artigo 1º da Lei 151/99, de 14.09 consagra actualmente uma isenção de CA e não a isenção de IMI para as PCUP e IPSS, uma vez que estas são todas ope legis PCUP;
V. Aplicar-se-ão as duas normas, como consta do pedido de isenção apresentado à AT, sendo que, uma vez que estamos perante matéria da competência relativa da Assembleia da República (AR), regulada pela Lei 151/99, de 14.09, a norma da alínea e) do nº 1 do actual artigo 44º do EBF, não pode considerar-se em vigor na parte em que usa o termo ou expressão “directamente”, porquanto:
VI. Foi a AR, o poder legislativo, que pretendeu suprimir a expressão “directamente”, naturalmente permitindo uma amplitude maior ao benefício fiscal, que antes poderia discutir-se;
VII. Esta norma isentiva tem como antecedentes os benefícios das PCUP em sede de contribuição predial (alínea c) do artigo 1º da Lei 2/78, de 17.01 e a alínea c) do artigo 1º do Decreto-Lei 260-D/81 de 02.09 que mandava aplicar o seu artigo 3º e que remetia para o nº 4 do artigo 7º e artigo 10º do Código da Contribuição Predial);
VIII. Benefício este que tinha uma amplitude igual à que se defende nestes autos, sendo que na vigência do Decreto-Lei 260-D/81 de 02.09 já se isentava de imposto os imóveis cujos “rendimentos se destinam à realização dos fins” das PCUP;
IX. Pelo que já no âmbito da norma isentiva ao nível da Contribuição Predial se abrangiam os bens imóveis cujos rendimentos, por eles produzidos, se destinavam a financiar os fins constantes dos estatutos.
X. A norma isentiva contida na alínea d) do artigo 1º da Lei 151/99 e a norma isentiva contida na alínea e) do nº 1 do actual artigo 44º do EBF, haverá que ser vista como tendo o mesmo alcance, sob pena de se considerar que afinal a norma da alínea d) do nº 1 da Lei 151/99, de 14.09 não tem qualquer âmbito de aplicação, o que seria uma conclusão juridicamente insustentável, até pela desconsideração face à voluntas legislatoris da Assembleia da República reveladora da vontade da lei;
XI. Mesmo que se concluísse que às isenções de IMI das PCUP (aqui incluídas as IPSS) se aplica apenas a alínea e) do nº 1 do actual artigo 44º do EBF, não poderia concluir-se como se conclui no douto aresto ora em apreciação quanto à integração da expressão “directamente”.
XII. Constituirá ainda lapso manifesto esgrimir-se que se não for limitada a amplitude da isenção de IMI apenas aos imóveis de uso como instalações pelas PCUP, aqui incluídas as IPSS (o que a lei não diz), inutilizar-se-ia a segunda parte da norma isentiva que se considera o pressuposto objectivo do benefício fiscal.
XIII. Haverá que ter em conta o regime fiscal aplicável no seu todo, quer às PCUP quer às IPSS (alíneas e) e f) do nº 1 do artigo 44º do EBF) porque, actualmente, todas as IPSS ganham automaticamente a qualificação de PCUP por força do Estatuto das IPSS.
XIV. O que resulta claro do artigo 8º do Estatuto das IPSS aprovado pelo Decreto-Lei 119/83 de 14.11.
XV. O legislador ao consagrar um regime diferente para as PCUP (aqui englobando as IPSS) do que é aplicável às Misericórdias (que também são IPSS e PCUP) não quis dar mais benefícios a estas do que àquelas entidades, nem com amplitudes diferentes, até porque os fins e acções das misericórdias, de cariz solidário e assistencial, são levados a efeito, hoje, também por muitos milhares de PCUP e IPSS.
XVI. O que pretendeu foi apenas diferentes mecanismos de controlo: para as Misericórdias não criou nenhum mecanismo de controlo (por força da parte final da alínea f) do nº 1 do artigo 44º do EBF), para as PCUP (aqui incluídas as IPSS que não as Misericórdias) criou os que constam da alínea b) do nº 2 e nº 4, ambos do artigo 44º do EBF.
XVII. Este tipo de benefícios subjectivos e de reconhecimento oficioso (a isenção de IMI das PCUP incluindo as IPSS) têm que respeitar a norma substantiva ínsita no nº 2 do artigo 5º do Estatuto dos Benefícios Fiscais.
XVIII. No caso, o benefício fiscal não carece de acto administrativo de mero reconhecimento. Ou seja, não é a AT que tem o poder para dizer o que cabe ou não no âmbito do benefício fiscal. Essa amplitude só pode dimanar da lei da AR, neste caso a Lei 151/99, de 14.12, uma vez que o acto de reconhecimento tem sempre efeito meramente declarativo, porque o benefício é de reconhecimento oficioso.
XIX. Pelo que os mecanismos previstos na lei, neste caso no EBF, são de mero CONTROLO do benefício fiscal, mas nunca podem permitir não o reconhecer, tendo em conta o princípio da legalidade ínsito na CRP.
XX. Por outro lado haverá ainda que ter em conta que as normas sobre benefícios fiscais admitem interpretação extensiva (artigo 10º do EBF).
XXI. Não confere com a realidade o argumento plasmado no douto aresto recorrido tem a ver com esta passagem: “Se o legislador tivesse pretendido relevar a afectação à utilidade pública dos rendimentos dos imóveis, o mais adequado seria isentar de imposto esses rendimentos em si mesmos e não a propriedade e posse desses bens”.
XXII. Tal argumento não fará sentido ao nível dos rendimentos das PCUP, uma vez que estão isentas de IRC, como se infere da alínea c) do nº 1 do artigo 10º do CIRC e a recorrente tem um despacho publicado no DR que lhe confere esse benefício (que por isso é do domínio público).
XXIII. A interpretação da lei plasmada no aresto recorrido, ao invés do que refere, fere o que denomina de “coerência interna”, pela razão de que existe uma norma idêntica - ou melhor, aparentemente mais restritiva - que é aplicada com a amplitude defendida pela recorrente.
XXIV. Em sede de IMT, a Administração Fiscal, considera que integra o conceito do destino, directo e imediato, de uma PCUP (como consta do parecer da própria AT, sancionado pelo SEAF, citado na PI) não só o facto de um prédio se destinar a instalações da entidade, mas também quando se destine a obter rendimentos para financiar a PCUP, aceitando a mera alegação da PCUP nesse sentido constante em acta do órgão de direcção.
XXV. Nesta linha de pensamento uniforme de aplicação de normas fiscais com redacções similares, a isenção de IMI deverá sempre ser considerada a estas entidades desde que: aleguem que o prédio se destina às suas instalações; aleguem que o prédio se destina a obter rendimentos, desde que estes sejam para financiar exclusivamente a PCUP de acordo com os estatutos.
XXVI. É exactamente o que ocorre em sede de isenção de IMT quanto às PCUP (aqui incluídas as IPSS) como resulta do disposto no artigo 6º alíneas d) e e) do CIMT e do artigo 10º nº 2 alínea b) do CIMT.
XXVII. Foi alegado na PI e não foi colocado em causa pela AT que o parecer sobre a interpretação da norma isentiva das PCUP e IPSS em sede de IMT não era aplicado a todas as entidades na dimensão que o mesmo comporta. Por isso deve ter-se por assente esse desiderato.
XXVIII. É com base na declaração do destino dos bens constante da deliberação de aquisição que é conferida a isenção de IMT. Tal mecanismo, de mero controlo de benefícios, será de aplicar em sede de IMI.
XXIX. A expressão “directamente” constante da alínea e) do nº 1 do actual artigo 44º (antigo artigo 40º) do EBF, provinda da versão original do EBF, de 1989, a considerar-se que tem algum conteúdo, visa obrigar as PCUP (aqui incluídas as IPSS) a consignarem expressamente perante o Fisco o destino dos imóveis (instalações ou obtenção de rendimentos), ficando, assim responsabilizados os seus responsáveis pelo uso do bem no âmbito do escopo da entidade, com a correlativa responsabilidade nos termos gerais de direito.
XXX. Atentará contra a coerência do sistema fiscal que uma norma isentiva em sede de IMT aparentemente mais restritiva em termos de literalidade, seja aplicada com uma amplitude total (prédios de uso em instalações e prédios de rendimento) e uma norma literalmente menos restritiva, em sede de IMI, seja aplicada de forma muitíssimo mais restritiva em termos de amplitude.
XXXI. Em conclusão, os benefícios fiscais em sede de IMI das PCUP (aqui englobadas as IPSS, salvo as Misericórdias): iniciam-se a partir do ano inclusive em que se constitua o direito de propriedade; são reconhecidos oficiosamente; desde que se verifique a inscrição da matriz em nome da PCUP; e seja feita a prova da natureza jurídica da PCUP; desde que os prédios se destinem à realização dos seus fins (devendo a exigência, quanto à amplitude do “directamente” considerar-se afastada pela Lei 151/99, de 14.09, que é lei posterior à redacção inicial do EBF) aqui incluídos os que produzam rendimentos cujo destino exclusivo seja o financiamento dos fins estatutários da entidade, o que se materializa por declaração do interessado; devendo, à falta de outro regime de controlo, exigir-se os mesmos documentos prescritos para o benefício em sede de IMT, uma vez que a expressão literal do benefício de IMI é menos restritiva que em IMT.
XXXII. Seria absurdo que para efeitos de IMT um prédio fosse considerado que se destina “directa e imediatamente à realização dos seus fins estatutários” de uma PCUP ou IPSS (as normas ao nível do IMT e do IMI têm a mesma literalidade e o mesmo regime de operacionalização) e depois para efeitos de IMI onde as normas são literalmente menos restritivas (quer a norma da Lei 151/99, quer a norma isentiva do EBF) se viesse a adoptar entendimento mais restritivo.
XXXIII. Por outro lado, a aplicação do regime da alínea b) do nº 2 do artigo 10º do CIMT ao caso em discussão (procedimento de controlo do benefício em sede de IMI de PCUP e IPSS) não corporiza integração analógica da lei, mas apenas a sua aplicação extensiva partindo de um raciocínio por paridade de razão ou até por maioria de razão, uma vez que a norma isentiva em sede de IMI é literalmente menos restritiva.
XXXIV. O douto acórdão recorrido na leitura implícita que faz da lei fiscal viola a CRP, mormente o princípio da legalidade, o que se aduz, para além de violar as normas expressas nestas alegações quando lidas no sentido expresso no douto aresto recorrido ou na leitura da lei propugnada pela AT.
Termos em que, com o douto suprimento e os melhores de direito, deve a revista ser admitida e na procedência das conclusões supra deve substituir-se o douto aresto recorrido por outro que acolha a tese propugnada pela recorrente, em defesa dos superiores interesses de milhares e milhares de PCUP e de IPSS, entidades já de si muito débeis economicamente, assim se fazendo, como se espera a costumada Justiça!
Contra-alegou a recorrida, tendo concluído:
A) A Recorrente interpôs o presente recurso mas nem sequer demonstra que se encontram preenchidos os requisitos exigidos pelo art. 150º do CPTA, pelo que o presente recurso de revista não deve ser admitido.
B) A questão que a Recorrente pretende seja considerada pelo Tribunal “ad quem” no presente recurso de revista é, pois, a de que: “As questões em discussão, s.m.o. subsumíveis a erros de direito, estão clarificadas no douto acórdão do TCA Norte recorrido, a saber a) Às isenções de IMI das PCUP, a partir de 01.12.2003 (data da introdução do CIMI em substituição do CCA) aplica-se a alínea d) do artigo 1° da Lei 151/99 de 14/09 e/ou a alínea e) do n° 1 do actual artigo 44° do EBF? b) Caso se conclua que se aplica apenas a alínea e) do n° 1 do actual artigo 44° do EBF, o que deve entender-se por “prédios destinados directamente à realização dos seus fins”? O douto acórdão aplica a lei de forma manifestamente errada ou juridicamente insustentável
C) Como se viu, a questão apresentada pelo Recorrente não assume relevância jurídica ou social aferida em termos da utilidade jurídica, com capacidade de expansão da controvérsia que ultrapasse os limites da situação singular pois o Acórdão recorrido limitou-se a aplicar as normas adequadamente, cumprindo todos os princípios constitucionais.
D) Além do que, nem decorre, da interposição do presente recurso, a possibilidade de melhor aplicação do direito, dado que o Acórdão recorrido nada mais fez do que, aplicar correctamente as normas legais aplicáveis, à situação em concreto, não se vislumbrando a necessidade de uniformização do mesmo direito.
E) Aliás, a jurisprudência tem sido unânime quanto à excepcionalidade deste tipo de recurso, sendo a sua admissibilidade como refere, entre outros, o Acórdão n° 0400/15 de 09/09/2015 do STA: “...sendo a sua admissibilidade condicionada não por critérios quantitativos mas por um critério qualitativo — o de que em causa esteja a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito — devendo este recurso funcionar como uma válvula de segurança do sistema e não como uma instância generalizada de recurso.”
F) E, prossegue o douto Acórdão: “E, na interpretação dos conceitos a que o legislador recorre na definição do critério qualitativo de admissibilidade deste recurso, constitui jurisprudência pacífica deste Supremo Tribunal Administrativo - cfr., por todos, o recente Acórdão deste STA de 2 de abril de 2014, rec. n.° 1853/13-, que «(...) o preenchimento do conceito indeterminado de relevância jurídica fundamental verificar-se-á, designadamente, quando a questão a apreciar seja de elevada complexidade ou, pelo menos, de complexidade jurídica superior ao comum, seja por força da dificuldade das operações exegéticas a efectuar, de um enquadramento normativo especialmente intricado ou da necessidade de concatenação de diversos regimes legais e institutos jurídicos, ou quando o tratamento da matéria tem suscitado dúvidas sérias quer ao nível da jurisprudência quer ao nível da doutrina. Já relevância social fundamental verificar-se-á quando a situação apresente contornos indiciadores de que a solução pode constituir uma orientação para a apreciação de outros casos, ou quando esteja em causa questão que revele especial capacidade de repercussão social, em que a utilidade da decisão extravasa os limites do caso concreto das partes envolvidas no litígio. Por outro lado, a clara necessidade da admissão da revista para melhor aplicação do direito há-de resultar da possibilidade de repetição num número indeterminado de casos futuros e consequente necessidade de garantir a uniformização do direito em matérias importantes tratadas pelas instâncias de forma pouco consistente ou contraditória - nomeadamente por se verificar a divisão de correntes jurisprudenciais ou doutrinais e se ter gerado incerteza e instabilidade na sua resolução a impor a intervenção do órgão de Cúpula da justiça administrativa e tributária como condição para dissipar dúvidas - ou por as instâncias terem tratado a matéria de forma ostensivamente errada ou juridicamente insustentável, sendo objectivamente útil a intervenção do STA na qualidade de órgão de regulação do sistema
G) Pelo que, não deve ser admitido o presente recurso de revista, uma vez que a Questão objecto do mesmo não preenche os requisitos previstos no artigo 150° do CPTA.
H) Aliás, limita-se, no recurso de revista, a reiterar a posição antes assumida, não fazendo sequer referência à verificação dos pressupostos de admissibilidade do Recurso.
I) Impunha que a Recorrente ao lançar mão deste meio de recurso, que fundamentasse as razões pelas quais entendia que o recurso deveria ser admitido.
J) Na verdade, da leitura das alegações de recurso, apenas manifesta discordância com o teor do acórdão recorrido.
K) A Recorrente, nem sequer faz qualquer alusão nas conclusões de recurso quanto à verificação dos pressupostos da admissão da revista.
L) Ora, tal como impõe o artigo 639° do CPC são as conclusões de recurso que delimitam e definem o seu objecto, razão pela qual, se nada foi alegado neste sentido não deve recurso ser admitido.
M) Por tudo o supra exposto, e uma vez que a Recorrente incumpriu o ónus imposto pelo n.° 2, do artigo 672°, do CPC aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA, aplicável ex vi n.° 2, do artigo 279°, do CPPT o recurso de revista interposto pela Recorrente deve ser rejeitado;
N) Ainda que se admitisse que tal ónus havia sido observado - o que por mera hipótese de raciocínio se concede -, não se verifica in casu qualquer dos requisitos elencados pelo artigo 150°, do CPTA para que a revista seja admitida;
O) Em causa não está uma questão jurídica fundamental, porquanto a apreciação de uma isenção de IMI, ou o preenchimento de pressupostos objectivos da concessão de benefícios, não reveste de elevada complexidade jurídica, não exigindo, para ser solucionada, de difíceis operações exegéticas, nem um enquadramento jurídico especialmente intricado, nem, ainda, a concatenação de diversos regimes legais ou institutos jurídicos;
P) Como se retira, aliás, da jurisprudência unânime, pacifica e recentemente proferida pelo TCA Norte, e que vem interpretando e aplicando de forma adequada a legislação em causa nos presentes autos.
Q) Assim, se reafirma que, não existindo divergência do acórdão recorrido relativamente à jurisprudência do TCA Norte proferida em inúmeras situações idênticas à dos autos, não estamos perante uma questão jurídica fundamental, porquanto não reveste de elevada complexidade jurídica, nem complexidade jurídica superior ao comum.
R) Não se trata, igualmente, de uma questão de relevância social fundamental, nem com qualquer repercussão social, pelo que não se vislumbra a necessidade de intervenção do STA;
S) Acresce que a admissão da revista não se afigura claramente necessária, dado que, a jurisprudência do TCA norte veio consolidar uma única corrente de decisão razão pela qual se nos afigura que a motivação do presente recurso, salvo o devido respeito, se prende unicamente com a discordância da recorrente com o acórdão recorrido, conforme se retira das alegações de recurso.
T) Pelo exposto, não deve ser admitido o presente recurso de revista, uma vez que a questão objecto do mesmo não preenche os requisitos previstos no artigo 150º do CPTA.
U) Salvo o devido respeito, também quanto ao mérito do recurso, a Recorrente não tem razão nos argumentos que aduz, desde logo, porque contrariamente ao que defende, o Acórdão recorrido fez uma correcta aplicação e interpretação da lei, nomeadamente das disposições indicadas pelo Recorrente, a Lei n° 151/99 de 14/09 e o artigo 44°/1 al. e) do EBF, aos factos, pelo que se deve manter nos seus precisos termos.
V) À questão que considerou fundamental, o Acórdão recorrido vem referir o seguinte: “a questão fundamental do presente recurso é a de saber se a sentença recorrida padece de erro de julgamento de direito. Para a resolução desta questão identificamos dois problemas jurídicos fundamentais: o problema se saber qual a lei aplicável [ou seja, o de saber se é aplicável a alínea d) do artigo 1° da Lei n° 151/99 de 14 de Setembro, ou a alínea e) do n° 1 do artigo 44° do Estatuto dos Benefícios Fiscais redacção em vigor - ou ambas] e o problema de saber se, a ser aplicável (apenas) a alínea e) do n° 1 do artigo 44° do Estatuto dos Benefícios Fiscais, o que se deve entender por «prédios destinados directamente à realização dos seus fins» para efeitos deste normativo
W) Tendo concluído aquele Acórdão “...decorre que a alínea d) do n° 1 do artigo 1° da Lei n° 151/99 de 14 de Setembro não se aplica ao caso, ficando assente que ao mesmo se aplica o disposto no artigo 44°, n° 1, alínea e) do Estatuto dos Benefícios Fiscais, conforme defende a Recorrente e resulta aplicado no acto impugnado [cfr. conclusão hh) das alegações de recurso]
X) Quanto à interpretação da alínea e) do n° 1 do artigo 44° do EBF, considerou o Acórdão recorrido estarmos perante uma isenção mista (subjectivo e objectivo), sendo que o pressuposto subjectivo deste benefício fiscal nunca esteve em causa.
Y) O litígio centrou-se no pressuposto objectivo — na questão do destino do imóvel em causa à directa realização dos seus fins, nos termos da parte final da alínea e) do n° 1 do artigo 44° do EBF.
Z) Refere o Acórdão: “...a interpretação que fazemos deste segmento do dispositivo é a de que só se verifica o pressuposto objectivo do benefício se os próprios prédios forem destinados à realização dos fins prosseguidos pelas pessoas colectivas de utilidade pública. E já não assim quando as pessoas colectivas de utilidade pública destinem à realização desses fins os rendimentos obtidos com a alienação ou oneração desses prédios.” (...) Ora, do teor da lei resulta que tem que existir uma relação directa entre o destino dos prédios e os fins prosseguidos pela pessoa colectiva. Sendo que essa relação só é directa quando resulta da própria afectação ou utilização do prédio. Já quando são os rendimentos do prédio que estão afectos a utilidade pública da pessoa colectiva, a relação entre o prédio e os fins de utilidade pública não é directa, mas indirecta.”
AA) A Recorrente ao invocar como fundamento do seu direito, não a afectação do imóvel a fins de utilidade pública, mas a afectação a esses fins dos rendimentos eventuais que consiga extrair da afectação desse imóvel a outros fins, é motivo justificativo para que a isenção em causa não lhe seja concedida.
BB) Por tudo o supra exposto, verifica-se que o Acórdão ora recorrido fez uma correcta interpretação e aplicação da lei, nomeadamente das disposições indicadas pelo Recorrente, o artigo 44°/1 al. e) do EBF e o artigo 1°, alínea d) da Lei n° 151/99 de 14/09, aos factos, pelo que, se deve manter nos seus precisos termos.
Termos pelos quais e, com o douto suprimento de V. Exas., não deve ser admitido o presente recurso de revista, por não se encontrarem preenchidos os requisitos do artigo 150° do CPTA, e caso assim não se entenda, não deve ser dado provimento ao mesmo, mantendo-se o Acórdão recorrido, com todas as legais consequências.

Por acórdão de 31 de Março de 2016, este Supremo Tribunal admitiu o recurso de revista.

O Ministério Público, notificado, pronunciou-se pela improcedência do recurso. No essencial o Ministério Público entendeu que, “(…) aderimos ao entendimento sufragado no acórdão recorrido quando refere: “que só se verifica o pressuposto objectivo do benefício se os próprios prédios forem destinados à realização dos fins prosseguidos pelas pessoas coletivas de utilidade pública. E não se verifica quando as pessoas coletivas de utilidade pública destinem à realização desses fins os rendimentos obtidos com a alienação ou oneração desses prédios”. E acrescenta-se: “do teor da lei resulta que tem que existir uma relação direta entre o destino dos prédios e os fins prosseguidos pela pessoa coletiva. Sendo que essa relação só é directa quando resulta da própria afetação ou utilização do prédio”.
Doutro modo, como se refere no acórdão recorrido, o benefício seria de natureza subjetiva, abrangendo qualquer prédio titulado pelo Recorrente, o que manifestamente é arredado pelo espírito da norma. Tanto assim, que no segmento final da alínea f) do nº 1 do mesmo artigo 44º do EBF, quando se refere ao benefício concedido às Misericórdias, o legislador já o alarga a “todos os prédios de que as mesmas sejam proprietárias”.

Colhidos os vistos legais cumpre decidir.

Deu-se como assente no acórdão recorrido a seguinte factualidade concreta:
A) Em 29-05-2012 a Autora requereu ao Chefe do Serviço de Finanças de Anadia o reconhecimento oficioso da isenção de Imposto Municipal sobre Imóveis, com efeitos a partir do ano de aquisição do imóvel, relativamente ao prédio urbano inscrito na matriz da freguesia de ……….., Concelho de Anadia sob o artigo n° 430 e do prédio rústico inscrito na matriz da freguesia de ……….., Concelho de Anadia sob o artigo n° 424 (fls. 13 a 15 dos autos);
B) Por ofício de 14-06-2012 do Serviço de Finanças de Anadia a Autora foi notificada do projecto de decisão de indeferimento do pedido de isenção, com os seguintes fundamentos: “A alínea e) do n° 1 do art° 44° do EBF, apenas permite isenção no caso de prédios destinados directamente à realização dos fins da pessoa colectiva de utilidade pública. No caso, não foi efectuada prova concreta da afectação do imóvel aos ditos fins.” (fls. 16 dos autos);
C) Por requerimento datado de 25-06-2012 a Autora exerceu o seu direito de audição, invocando que não tinha qualquer dívida tributária e ainda que o imóvel se destina directa e imediatamente aos fins da CEMG, dado que as mais-valias realizáveis com a alienação do imóvel, bem como eventuais rendimentos resultantes de arrendamento temporário são transferidos, como resultados da Caixa, para o Montepio, bem como que a alínea d) do art. 1.º da Lei 151/99, de 04-09 não obriga a que os prédios se destinem “directamente” à realização dos fins das IPSS e PCUP e que o entendimento da DGI vai no sentido de que as entidades referidas no actual artigo 44° do EBF poderão beneficiar de CA (actual IMI) desde que os prédios de que são proprietários e os respectivos rendimentos sejam afectos directa e imediatamente aos seus fins estatutários (fls. 17 e 18 dos autos);
D) Por ofício de 04-07-2012 do Serviço de Finanças de Anadia a Autora foi notificada da decisão de indeferimento do pedido de isenção proferida em 04-07-2012, convertendo em definitivo o projecto de decisão, por o imóvel não terem sido trazidos novos elementos que permitissem alterar o projecto de decisão (fls. 24 dos autos);
E) Em 06-07-2012 a Autora recorreu hierarquicamente da decisão de indeferimento da isenção de IMI a que se refere o ponto anterior, reproduzindo os argumentos utilizados em sede da audição prévia antecedente (fls. 29 e 30 dos autos);
F) Por decisão proferida em 19-10-2012 pela Subdirectora-Geral dos Impostos foi indeferido o recurso hierárquico com os seguintes fundamentos: “ (...) O prédio em causa não pode considerar-se directamente afecto à realização dos fins estatutários da recorrente mesmo que o produto da eventual realização de mais valias venha a ser aplicado na prossecução dos seus fins.” (fls. 32 a 36 dos autos);
H) Por despacho concordante de 08-10-1991, proferido pelo Primeiro-Ministro, foi deferido o pedido à Caixa Económica de Lisboa, anterior designação da actual Caixa Económica Montepio Geral, formulado em 31-05-1990, de concessão de declaração de utilidade pública nos termos do Decreto-Lei n° 460/77, de 7 de Novembro (fls. 39 a 44 dos Autos, DR n.° 243, II Série, de 22/10/1991, e DR n.° 205, III Série, de 06/09/1991);
I) Nos termos dos artigos 4° e 5° dos Estatutos da Caixa Económica Montepio Geral vigentes desde 01-08-1999, a mesma foi constituída com a finalidade de pôr à disposição do Montepio Geral os resultados dos seus exercícios, feitas as deduções estatutariamente previstas, para que este os aplique na satisfação dos seus fins, estando anexa ao Montepio Geral, seu fundador, o que se traduz na afetação de resultados e na comunhão, por ambas as instituições, dos titulares dos correspondentes Órgãos Institucionais (publicação disponível em https:/ /www.montepio.pt/iwov
resources/SitePublico/documentos/pt _PT/ institucional/estatutos-montepio/Estatutos-CaixaEconomicaMontepioGeral.pdf);
J) Nos termos do artigo 36° dos Estatutos referidos, os resultados da Caixa Económica apurados em cada exercício terão a seguinte afectação: Um mínimo de 20% para a reserva legal, um mínimo de 5% para a reserva especial, as importâncias necessárias para outras reservas e o remanescente para o Montepio Geral (publicação disponível em https://www.montepio.pt/iwov-resources/SitePublico/documentos/pt_ PT/ institucional / estatutos-montepio/Estatutos-CaixaEconomicaMontepioGeral.pdf);
K) Nos termos do artigo 2° dos Estatutos do Montepio Geral - Associação Mutualista, vigentes desde 1998, são, designadamente, fins do Montepio Geral:
a) Conceder e garantir, através de modalidades individuais e colectivas, benefícios de segurança social e de saúde destinados a prevenir ou a reparar as consequências da verificação de factos contingentes relativos à vida e à saúde dos associados e seus familiares e dos beneficiários por aqueles designados;
b) Prosseguir outras formas de protecção social e de promoção da melhoria da qualidade de vida, através da organização e gestão de equipamentos, serviços e obras sociais e outras actividades que visem principalmente o desenvolvimento cultural, moral, intelectual e físico dos associados e seus familiares, e dos beneficiários por aqueles designados, em especial das crianças, jovens, idosos e deficientes;
c) Contribuir para a resolução dos problemas habitacionais dos associados;
d) Gerir regimes profissionais complementares das prestações garantidas pela segurança social e outras formas colectivas de protecção social.” (publicação disponível em https://www.montepio.pt/iwov-resources/SitePublico/documentos/pt_PT/ institucional/estatutos montepio/associação-mutualista-estatutos.pdf);
L) Nos termos do artigo 3° n° 1 dos Estatutos do Montepio Geral - Associação Mutualista, o Montepio Geral, para auxiliar a realização dos seus fins;
a) Dispõe de uma caixa económica anexa, com personalidade jurídica e estatutos próprios, denominada Caixa Económica Montepio Geral;
b) Pode criar estabelecimentos dele dependentes;
c) Pode constituir rendas vitalícias;
d) Pode deter participações financeiras” (publicação disponível em https://www.montepio.pt/iwovresources/SitePublico/documentos/pt_PT/institucional/estatutos-montepio/associacao-mutualista-estatutos.pdf);
M) Nos termos do artigo 3° n° 2 dos Estatutos do Montepio Geral - Associação Mutualista, o Montepio Geral, e para a prossecução dos seus fins pode, designadamente:
a) Fazer aplicações mobiliárias e imobiliárias;
b) Contrair empréstimos;
c) Desenvolver outras iniciativas e realizar todos os actos e contratos legalmente permitidos.” (publicação disponível em https://www.montepio.pt/iwov-resources/ SitePublico/documentos/pt_PT/institucional/estatutos-montepio/associacao-mutualistaestatutos.pdf);
Nada mais se levou ao probatório.

Há agora que conhecer do recurso que nos vem dirigido.
O presente recurso de revista foi admitido para que se reaprecie as seguintes questões:
-saber se à isenção de IMI relativa a pessoas colectivas de utilidade pública (PCUP) se aplica, a partir de 1/12/2003 (data do início da vigência do CIMI, em substituição do CCA), o disposto na al. d) do art. 1º, da Lei nº 151/99, de 14/9, ou se aplica o disposto na al. e) do art. 44º do EBF ou, ainda, se ambos os regimes serão aplicáveis;
- saber que realidades estão subsumidas na expressão legal «prédios destinados directamente à realização dos seus fins», prevista na al. e) do nº 1 do art. 44º do EBF, [isto, caso se entenda que é aplicável o disposto nesse normativo, em exclusividade ou em conjunto com o regime da Lei 151/99].
Portanto, a questão que se coloca nestes autos consiste em saber se os imóveis de que a recorrente é proprietária estão, todos eles, isentos do Imposto Municipal sobre Imóveis, vulgo IMI, ou apenas beneficiam de tal isenção os que sejam destinados directamente à realização dos seus fins estatutários.
No sentido de todos os prédios beneficiarem de tal isenção, argumenta a recorrente com o disposto nos artigos 1º, al. d) da Lei 151/99 de 14.09 e 44º, n.º 1, als. e) e f) do EBF, em sentido contrário contrapõe-se que no caso apenas se aplica o disposto no artigo 44º, n.º 1, al. e) do EBF, uma vez que não é aplicável o disposto no artigo 1º, al. d) da Lei 151/99 de 14.09.

Vejamos então.
Dispõe o artigo 44º, n.º 1, al. e) do EBF, sob a epígrafe “Isenções” (relativas a bens imóveis) que, estão isentas de imposto municipal sobre imóveis as pessoas colectivas de utilidade pública administrativa e as de mera utilidade pública, quanto aos prédios ou parte de prédios destinados directamente à realização dos seus fins.
Por sua vez dispõem os n.ºs. 2, al. b) e 4, do mesmo inciso legal, que as isenções se iniciam a partir do ano, inclusive, em que se constitua o direito de propriedade e são reconhecidas oficiosamente, desde que se verifique a inscrição na matriz em nome das entidades beneficiárias, que os prédios se destinem directamente à realização dos seus fins e que seja feita prova da respectiva natureza jurídica.
Também dispõe o artigo 1º, al. d) da Lei n.º 151/99 (Actualiza o regime de regalias e isenções fiscais das pessoas colectivas de utilidade pública) que, sem prejuízo de outros benefícios previstos na restante legislação aplicável, pode ser concedida às pessoas colectivas de utilidade pública isenção de contribuição autárquica de prédios urbanos destinados à realização dos seus fins estatutários.
As instâncias tiveram como certo, e não vem agora posto em causa pelas partes, que se verifica o elemento subjectivo das previsões legais.

A primeira questão que importa resolver passa por saber, face aos termos em que se fundamentou o acórdão recorrido, se a norma da Lei n.º 151/99 se mantém ou não em vigor.
Desde já se pode dizer que o disposto nesta Lei, relativamente à isenção prevista na alínea d) do n.º 1, não foi expressamente revogado por qualquer Lei posterior de igual valor nos termos do disposto no artigo 7º, n.º 1 do Código Civil, nem se deve considerar revogado nos termos do disposto no n.º 2 do mesmo preceito legal (A revogação pode resultar de declaração expressa, da incompatibilidade entre as novas disposições e as regras precedentes ou da circunstância de a nova lei regular toda a matéria da lei anterior) tal como vem referido no acórdão recorrido.
A este propósito escreveu-se no acórdão recorrido, por remissão para anterior acórdão do mesmo Tribunal Central:
Para a resolução desta matéria identificamos duas questões jurídicas fundamentais: saber qual a lei aplicável [ou seja, o de saber se é aplicável a alínea d) do artigo 1.º da Lei n.º 151/99, de 14 de Setembro, ou a alínea e) do n.º 1 do artigo 44.° do Estatuto dos Benefícios Fiscais - redacção em vigor - ou ambas] e saber se, a ser aplicável (apenas) a alínea e) do n.º 1 do artigo 44.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, o que devemos entender por «prédios destinados directamente à realização dos seus fins» (sublinhado nosso) para efeitos deste normativo.
Comecemos pela primeira questão.
Dos elementos dos autos resulta que a isenção foi requerida pela Recorrida a coberto das duas disposições. E foi indeferida por não estarem reunidos os pressupostos legais exigidos pela alínea e) do n.º 1 do artigo 44.° do Estatuto dos Benefícios Fiscais (ou seja, a coberto apenas desta última disposição).
O Recorrente não aceita a conclusão constante do acórdão recorrido, de que é irrelevante a aplicação da alínea d) do artigo 1.° da Lei n.º 151/99, ou da alínea c) do n.º 1 do artigo 44.º do EBF, uma vez que conduzem à mesma solução jurídica: o deferimento do pedido de isenção. Isto porque, embora ambas as normas tenham conteúdos e alcances diferentes, como aliás, o mesmo acórdão o admite, a norma que rege a isenção só pode ser a que consta do EBF.
Na acção administrativa especial, a ora Recorrida insistiu que a isenção é devida porque se lhe aplica a alínea d) do artigo 1º da Lei n.º 151/99, de 14 de Setembro, estando em causa determinar o alcance do que se deve entender por prédio "destinado à realização dos fins" das pessoas colectivas de utilidade pública e saber se se aplica a Lei n.º 151/99, de 14/09 ou a alínea e) do n.º 1 do artigo 44.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais.
Efectivamente no acórdão recorrido considerou-se que, independentemente de ser apenas aplicável ao caso dos autos esta última norma, e portanto, com a aparente limitação da destinação "directa” do prédio à realização dos fins estatutários, ou de se considerar alternativamente aplicável a Lei n.º 151/99, de 14/09, onde o texto não revela tal aparente limitação, a autora deve beneficiar da requerida isenção.
Como se decidiu no acórdão deste TCAN proferido no processo n.º 699/13.8BECBR, observa-se, a título introdutório, que os pressupostos objectivos da concessão do beneficio contido em cada uma dessas normas não são totalmente sobreponíveis: enquanto a alínea d) do artigo 1º da Lei n.º 151/99, de 14 de Setembro tem em vista prédios urbanos e pressupõe que sejam destinados à realização dos seus fins estatutários, o artigo 44.°, n.° 1, alínea e), do Estatuto dos Benefícios Fiscais (na redacção do Decreto-Lei n.º 108/2008. de 16 de Junho, que sucedeu ao artigo 40.°, n.º 1 alínea e), na redacção anterior, sem alteração do seu teor) tem em vista prédios ou parte de prédios e pressupõe que sejam destinados directamente à realização dos seus fins.
Não existe - desde a reforma da tributação do património - nenhuma antinomia entre as duas normas. É que a disposição correspondente da Lei n.° 151/99, de 14 de Setembro não consagra nenhuma isenção de imposto municipal sobre imóveis: consagra - isso sim - uma isenção de contribuição autárquica. E o artigo 44.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais não consagra nenhuma isenção de contribuição autárquica: consagra - isso sim - uma isenção de imposto municipal sobre imóveis.
Pelo que as disposições em causa têm âmbitos de aplicação distintos.
É incontroverso que a Recorrida não pediu o reconhecimento oficioso de isenção ele contribuição autárquica sobre os prédios em causa. Aliás, o Código de Contribuição Autárquica já tinha sido revogado na data em que a Recorrida adquiriu o prédio em causa.
Pelo que o benefício em causa só poderia ser concedido ao abrigo do artigo 44.°, n. ° 1. alínea e), do Estatuto dos Benefícios Fiscais.
E não se diga que o imposto municipal sobre imóveis sucedeu à contribuição autárquica e que os benefícios consagrados na lei para aquele se transferem para este.
Isso não é assim porque a extinção do tributo importa a supressão da isenção respectiva do sistema tributário. Sem prejuízo, naturalmente, do direito à isenção adquirido na vigência do tributo extinto (como decorre do artigo 3.°, n.º 2, do Estatuto dos Benefícios Fiscais - que não vem ao caso, porque não está em causa nenhum direito adquirido na vigência da contribuição autárquica a coberto do regime transitório consagrado no artigo 11.°, nºs 3 e 4, e no artigo 31.°, nºs 5 e 6, ambos do Decreto-Lei n.° 287/2003, de 12 de Novembro).
É o que decorre do facto de os benefícios fiscais serem medidas de desagravamento fiscal que incidem sobre normas de incidência fiscal: se a norma de incidência desaparece do ordenamento jurídico, a norma de desagravamento desaparece concomitantemente. Não se transfere para outra norma de incidência. A menos que a lei o determine especialmente, designadamente no seu regime transitório.
A lei confirma esta interpretação, ao referir que os benefícios fiscais são medidas fiscais de carácter excepcional, relacionadas com a própria tributação que impedem - artigo 2.°. n.° 1, do Estatuto dos Benefícios Fiscais.
(…)
Do exposto decorre que a alínea d) do n.º artigo 1.º da Lei n.º 151/99 de 14 de Setembro não se aplica ao caso, ficando assente que ao mesmo se aplica o disposto no artigo 44.°, n.º 1 alínea e) do Estatuto dos Benefícios Fiscais, conforme defende o Recorrente e resulta aplicado no acto impugnado [cfr. conclusão t) das alegações de recurso].".

Vejamos, então.
Aquando da publicação da Lei n.º 151/99, de 14/09, já há muito se encontrava em vigor o Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF) -DL n.º 215/89, de 01/07/1989-, que consagrava no seu artigo 50º, n.º 1, al. e), hoje artigo 44º, n.º 1, al. e), a isenção de contribuição autárquica das pessoas colectivas de utilidade pública administrativa e as de mera utilidade pública relativamente aos prédios, ou parte de prédios, destinados directamente à realização dos seus fins.
Este preceito do EBF tem as suas raízes nos artigos 7º, n.ºs. 3º e 4º, 8º, 8º § único e 10º do Código da Contribuição Predial (CPP) e do Imposto sobre a Indústria Agrícola. O regime das isenções fiscais prediais das pessoas colectivas de utilidade pública e de utilidade pública administrativa encontrava-se regulado não só naquele Código da Contribuição Predial mas ainda na Lei n.º 2/78, de 17/01 e DL n.º 260-D/81, de 02/09 (este veio revogar a Lei 2/78 e introduzir alterações aos artigos acima referidos do CPP).
Esta isenção esteve condicionada à afectação directa dos prédios à realização dos fins da pessoa colectiva de utilidade pública (como no caso dos autos) como bem se percebe do Preâmbulo do Projecto de Lei n.º 599/VII (apresentado pelo PCP em Janeiro de 1999 e que veio a dar origem à Lei n.º 151/99).
Aí se referiu expressamente que, “O mesmo decreto-Lei (DL n.º 460/77, de 07/11,que aprovou o estatuto das pessoas colectivas de utilidade pública) atribuiu às pessoas colectivas de utilidade pública um conjunto de regalias…e remeteu para legislação futura as isenções fiscais, que viriam a ser definidas pela Lei n.º 2/78 de 17 de Janeiro.
Aí se estabeleceu que as pessoas colectivas de utilidade pública poderiam beneficiar das seguintes isenções: imposto do selo, imposto sobre as sucessões e doações e de sisa pela aquisição de edifícios necessários à instalação da sua sede, delegações e serviços indispensáveis aos seus fins estatutários, contribuição predial pelo rendimento colectável de prédios urbanos onde se encontrem instalados a sede, delegações e serviços indispensáveis aos fins estatutários… Estas isenções, que poderiam ser totais ou parciais, ficavam dependentes de despacho conjunto dos Ministros da Administração Interna, das Finanças e da Tutela. após parecer favorável da câmara municipal do concelho da sede da pessoa colectiva interessada.
Em 1981, a lei n.º 2/78, de 17 de Janeiro, viria a ser revogada pelo Decreto-Lei n.º 260-D/81, de 2 de Setembro, que regulou o estatuto de utilidade pública de forma um tanto diversa: as isenções fiscais passaram a depender apenas de despacho do Ministro das finanças e alterou-se a tramitação necessária para o requerimento das isenções, que passaram a ser as seguintes: imposto do selo, sisa e imposto sobre as sucessões e doações, contribuição predial…
Passados que foram mais de 20 anos sobre a lei n.º 2/78 e quase 17 sobre o Decreto-Lei n.º 260-D/81, é hoje manifesta a sua desactualização. Não apenas porque os impostos sobre que incidiam as isenções foram sendo substituídos por outros sem que as isenções acompanhassem tais substituições, mas também porque o quadro legal não acompanhou a realidade associativa.
Assim, o que hoje se verifica é que a concessão do estatuto de utilidade pública a uma associação, sendo uma honra e representando um reconhecimento público do mérito da sua acção social, tem um efeito meramente simbólico, não representando, em termos práticos, qualquer benefício real para a associação em causa.
Estando assim desvirtuado o sentido que inicialmente foi dado à declaração de utilidade pública, que fazia corresponder a esse reconhecimento um conjunto de regalias, importa revalorizar de alguma forma esse estatuto, actualizando a legislação que lhe é aplicável. É esse o objectivo do presente projecto de lei do PCP.
Como tal, não se propõe qualquer alteração no regime de reconhecimento do estatuto de utilidade pública nem no regime de concessão de isenções, propondo-se, porém, o seguinte:
A actualização das isenções fiscais de acordo com os impostos actualmente existentes: imposto do selo, imposto municipal de sisa pela aquisição de imóveis, imposto sobre as sucessões e doações relativo à transmissão de imóveis e contribuição autárquica pelo rendimento colectável de prédios urbanos, desde que, em todos os casos, sejam destinados à realização dos fins estatutários das associações…”, cfr. Diário da Assembleia da República, 08-01-1999, II Série-A, n.º 27, págs. 742 e 743.
O debate parlamentar deste Projecto de Lei não foi consensual, tendo o deputado do PS, que interveio nesse mesmo debate, formulado as seguintes objecções, além de outras suscitadas pelos restantes deputados intervenientes, no que respeita à isenção de contribuição autárquica, cfr. Diário da Assembleia da República, 01/07/1999, I Série, n.º 100, págs. 23 e 24:
O projecto de lei n.º 599/Vll tem, em nosso entender, um mérito, que reconhecemos, mas também um erro de concepção, que criticamos.
Tem o mérito de pretender actualizar o Decreto-Lei n.º 260-D/81, de 2 de Setembro, cuja aplicação é actualmente dificultada pelas reformas fiscais que se registaram, nos últimos 18 anos, em Portugal.
Cai, ao arrepio da prática e das preocupações recentes, no erro de, implicitamente, voltar a disseminar normas e regras dos impostos por diplomas avulsos, quer em termos de produção legislativa quer de coerência do sistema e até de aplicação dos diplomas no dia-a-dia.
É hoje consensualmente defendido que deverá ser no código de cada imposto ou em legislação que abranja todo o sistema fiscal, como, por exemplo, a lei geral tributária, que devem estar contidas as regras e as excepções, as incidências e as isenções.
Por outro lado, se algumas das medidas avançadas no projecto de lei n.º 599/VII podem ser apreciadas em termos políticos globais ou enquadradas na actual conjuntura, outras há que devem ser afastadas, pelas seguintes razões: por violarem directivas comunitárias (alínea f) do artigo 1.º); por terem sido matéria de legislação recente (por exemplo, o artigo 3.°); por nada trazerem de novo e terem um efeito inverso ao esperado (por exemplo, o artigo 4.°).
Mas analisemos mais em pormenor os aspectos apreciados neste projecto de lei.
O artigo 1.° diz respeito às isenções fiscais que podem ser concedidas às pessoas colectivas públicas, mas, em nosso entender, é pouco inovador.
(…)
De igual modo a alínea e) do artigo 50.° dos Estatuto dos Benefícios Fiscais é mais abrangente do que o agora proposto pelo PCP na alínea d), que pretende limitar a isenção apenas aos prédios urbanos. A formulação apresentada pelo PCP é, para além do mais, tecnicamente incorrecta, porque a contribuição autárquica incide sobre os prédios e não sobre o seu eventual rendimento.
(…)
Por outro lado, as regras para a concessão de isenções já se encontram previstas nos diversos códigos.
Em matéria de contribuição autárquica, o regime proposto é mais burocrático que o vigente, uma vez que se prevê que o despacho de concessão pertença ao Ministro das Finanças e o Estatuto dos Benefícios Fiscais estabelece que a isenção é reconhecida oficiosamente, logo, é da competência do Chefe da Repartição de Finanças, o que permite maior celeridade no procedimento.
(…)
Terceira, as pessoas colectivas de utilidade pública, desde a entrada em vigor da contribuição autárquica, sempre beneficiaram de isenções deste tributo em termos mais abrangentes do que os propostos, uma vez que permite o reconhecimento de isenção para todos os tipos de prédios.
Quarta, tais benefícios encontram-se devidamente regulados nos respectivos códigos, regulamentos e Estatuto dos Benefícios Fiscais, pelo que não faz sentido criar uma regulamentação autónoma, sobretudo se a regulamentação a criar for mais burocratizante do que a que já existe, como parece ser o caso…”.
Apesar destas objecções a Lei n.º 151/99 veio a ser aprovada com o texto final, de iniciativa do grupo parlamentar do PS, tal como hoje o conhecemos.
Não há dúvida, assim, que a Assembleia da República pretendeu estabelecer um regime “especial” para as pessoas colectivas de utilidade pública, no tocante à isenção de contribuição autárquica, diferente daquele que se encontrava estabelecido no artigo 50º, n.º 1, al. e) do EBF.
Como já vimos, este regime perdurou até à entrada em vigor do CIMI - aprovado pelo DL n.º 287/2003, de 12/11-, ou seja, esteve vigente na pendência do Código da Contribuição Autárquica e mantém-se em vigor na vigência deste novo código do IMI por força do disposto no artigo 28º, n.º 1 daquele diploma legal - Todos os textos legais que mencionam Código da Contribuição Autárquica ou contribuição autárquica consideram-se referidos ao Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI) ou ao imposto municipal sobre imóveis (IMI).
Sendo certo, também, que a redacção do EBF respeitante à isenção de IMI respeitante às pessoas colectivas de utilidade pública, -actualmente artigo 44º, n.º 1, al. e)- mantém inalterada a redacção inicial que havia sido dada ao artigo 50º, n.º 1, al. e), pelo que, também agora não há qualquer contradição entre o texto do EBF e o texto da Lei 151/99, como anteriormente não havia à data da edição desta Lei.
Na verdade as situações abrangidas por este artigo 44º, n.º 1, al. e) do EBF respeitam àqueles prédios que estão directamente afectos aos fins estatutários da pessoa colectiva, v.g., no dizer da Lei 2/78, de 17/01, os necessários à instalação da sua sede, delegações e serviços indispensáveis aos fins estatutários e por essa razão é que presentemente o seu reconhecimento é oficioso nos termos do disposto no artigo 44º, n.º 4 do EBF.
Só esta interpretação da norma, com apoio expresso no elemento literal, é que respeita o disposto no artigo 9º, n.º 1 do Código Civil, caso contrário, estar-se-ia a fazer uma interpretação em violação do disposto no n.º 2 do mesmo preceito legal..
E tal reconhecimento já era oficioso à data da edição da dita Lei 151/99, uma vez que idêntico preceito do artigo 50º foi alterado para uma redacção próxima da actual por via da Lei do Orçamento de Estado de 1998.
Portanto, o regime de isenção estabelecido pela Lei n.º 151/99, tratou-se de um regime de isenção diverso daquele que se encontrava previsto no EBF, destinado a abranger (1)somente os prédios urbanos, (2)que se encontrem destinados à realização dos fins estatutários e (3)que carece de reconhecimento por parte do órgão competente, dependente de pedido expressamente formulado nesse sentido pelo interessado (como resulta do preâmbulo do projecto de lei acima mencionado não foi intenção do legislador introduzir qualquer alteração no regime de concessão das isenções, pelo que, não cabendo o reconhecimento desta isenção na categoria daquelas que são reconhecidas oficiosamente apenas pode ser incluída na regra geral), ou seja, no dizer do corpo do artigo 1º “Sem prejuízo de outros benefícios previstos na restante legislação aplicável, podem ser concedidas às pessoas colectivas de utilidade pública as seguintes isenções”, cfr. artigo 65º, n.º 1 do CPPT.
Temos, assim, que concluir que o regime dos benefícios fiscais respeitantes a IMI de que usufruem as pessoas colectivas de utilidade pública tem duas vertentes, uma, e que respeita aos prédios directamente afectos à realização dos seus fins estatutários, encontra-se regulada no EBF, outra, e que respeita aos prédios urbanos destinados à realização dos fins estatutários, encontra-se regulada na Lei n.º 151/99.

Aqui chegados, podemos desde já afirmar que no acórdão recorrido se decidiu correctamente a questão da não aplicação ao caso concreto do disposto no artigo 44º, n.º 1, al. e) do EBF, uma vez que o prédio em causa nestes autos não é enquadrável no grupo daqueles que se encontram directamente afectos aos fins estatutários da autora, mas, por outro lado, decidiu-se menos bem a questão da não aplicação ao caso concreto do disposto na Lei n.º 151/99 por se ter considerado extinto o benefício aí previsto.

E a consideração do disposto em tal Lei era essencial para a decisão da presente acção uma vez que a autora quando formulou o pedido de isenção relativamente ao prédio em questão, junto da entidade tributária competente, invocou expressamente o disposto em tal Lei, que no seu entender lhe concedia o benefício da isenção pretendida.
E relativamente aos prédios rústicos, e à parte rústica dos prédios mistos, é manifesto e evidente não ser de aplicar tal Lei 151/99, por os mesmos terem sido expressamente afastados da sua previsão pelo legislador.
Portanto, não tendo o órgão decisor da AT emitido pronúncia quanto a saber se a situação concreta é subsumível ao disposto na Lei n.º 151/99, estando o mesmo incumbido por lei de o fazer, deve agora emitir tal pronúncia, uma vez que isso lhe foi expressamente pedido pela autora.

A autora pretende com a presente acção que lhe seja reconhecida a isenção de IMI relativamente ao seu prédio com fundamento na Lei 151/99 e/ou com fundamento no EBF; já vimos que a isenção pretendida não cabe na previsão da norma do EBF, mas pode caber na previsão da norma da Lei n.º 151/99, contudo a apreciação “primária” de tal pretensão não cabe ao Tribunal, mas antes à entidade tributária competente, o que, como também já vimos, não o fez e deveria ter feito.
Assim, e porque o pedido não pode ser julgado procedente nos precisos termos em que vinha formulado, o Tribunal condenará a entidade ré a reapreciar o pedido da autora à luz do disposto na Lei n.º 151/99, nos termos do disposto no artigo 609º do CPC.

Face ao exposto, os juízes deste Supremo Tribunal Administrativo, em conferência, acordam em:
-conceder parcial provimento ao recurso e, nessa medida, revogar o acórdão recorrido;
-manter a revogação da sentença proferida pelo TAF de Aveiro;
-julgar a acção parcialmente procedente e condenar a entidade demandada a reapreciar o pedido da autora à luz do disposto na Lei n.º 151/99, nos termos anteriormente apontados.
Custas nas instâncias e neste Supremo Tribunal na proporção de 50% para cada uma das partes.
D.n.

Lisboa, 22 de Fevereiro de 2017. – Aragão Seia (relator) – Dulce Neto – Casimiro Gonçalves – Isabel Marques da Silva – Ascensão Lopes – Francisco Rothes – Pedro Delgado – Ana Paula Lobo.