Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0659/14
Data do Acordão:09/10/2014
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:CASIMIRO GONÇALVES
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
PRESSUPOSTOS
Sumário:Atenta a natureza excepcional do recurso de revista previsto no art. 150º do CPTA, (quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito), não se verificam os respectivos pressupostos se a questão suscitada se reconduz à aferição do julgamento da matéria de facto (sem que se verifiquem os pressupostos previstos no nº 4 do art. 150º do CPTA) e a uma estrita questão de inconstitucionalidade normativa, que pode discutir-se em recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade.
Nº Convencional:JSTA000P17859
Nº do Documento:SA2201409100659
Data de Entrada:06/04/2014
Recorrente:A...
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

RELATÓRIO
1.1. A………………, com os demais sinais dos autos, vem interpor recurso de revista excepcional, nos termos do artigo 150º do CPTA, do acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul em 27/2/2014, no processo que aí correu termos sob o nº 07301/14.

1.2. Termina as alegações formulando as Conclusões seguintes:
1.ª - O referente normativo da questão que o RECORRENTE pretende suscitar no âmbito do presente recurso circunscreve-se ao regime de dispensa de prestação de garantia previsto no n° 4 do artigo 52° da Lei Geral Tributária e, dentro deste, ao requisito consubstanciado na irresponsabilidade do executado na falta de meios económicos para o pagamento da dívida exequenda e acrescido.
2.ª - Em particular, a questão que o RECORRENTE pretende suscitar situa-se a jusante de ónus probatório que sobre si impende quanto à demonstração da (sua) irresponsabilidade na falta de meios económicos para o pagamento da dívida exequenda e acrescido, relacionando-se já com os elementos probatórios ao dispor dos executados para demonstrar a indicada irresponsabilidade e com a questão de saber - parafraseando, neste ponto, o SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO - quando se deve considerar demonstrada a existência de alguma causa de insuficiência ou inexistência de bens que não seja imputável ao executado.
3.ª - Estabelece o n° 4 do artigo 52° da Lei Geral Tributária que “A administração tributária pode, a requerimento do executado, isentá-lo da prestação de garantia nos casos de a sua prestação lhe causar prejuízo irreparável ou manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido, desde que em qualquer dos casos a insuficiência ou inexistência de bens não seja da responsabilidade do executado”. A propósito desta norma legal, observam DIOGO LEITE DE CAMPOS, BENJAMIM SILVA RODRIGUES e JORGE LOPES DE SOUSA, fixando o escopo dos requisitos probatórios ali previstos, que “A responsabilidade do executado, prevista na parte final do número 4, deve entender-se em termos de dissipação dos bens com o intuito de diminuir a garantia dos credores. E não mero nexo de causalidade desprovido de carga de censura ou simples má gestão dos seus bens” (cf. Lei Geral Tributária Anotada, e comentada, 4.ª Edição, 2012, encontro da escrita, p. 424).
4.ª - Desta singela, mas preclara, observação, permite-se concluir que os requisitos de que é feita depender a dispensa de prestação de garantia visam limitar a aplicação do respetivo regime aos casos em que o executado não tenha contribuído dolosamente para a situação de falta de meios económicos para o pagamento da dívida exequenda e acrescido. Dito de outro modo: os requisitos de que depende a dispensa de prestação de garantia prevista no n° 4 do artigo 52° da Lei Geral Tributária têm por finalidade assegurar que o executado não dissipou dolosamente o seu património, colocando-se artificialmente numa situação de insuficiência patrimonial.
5.ª - Do elemento racional do regime que se analisa infere-se, adicionalmente, um outro pressuposto, desta feita implícito, relativo à hipótese factualprefigurada pelo legislador: a acautelada possibilidade de dissipação patrimonial por parte do executado exige, em termos lógicos, a subsistência de um juízo prévio quanto à suficiência do respetivo acervo patrimonial (suscetível, portanto, de ser dolosamente dissipado). Ora, um tal juízo verificar-se-á, somente, na hipótese em que o executado é o devedor originário do tributo exequendo: com efeito, a suficiência patrimonial do devedor originário é confirmada no momento do surgimento da respetiva obrigação tributária, manifestando-se, essencialmente, na capacidade contributiva, revelada, nos termos da lei, através do rendimento ou da sua utilização e do património (cf. artigo 4°, n° 1, da Lei Geral Tributária). Por outras palavras, a qualidade de devedor originário do executado tem implícita a assunção de que o respetivo património é - ou foi - suficiente para o pagamento da dívida exequenda e acrescido. Por conseguinte, justifica-se que a subsequente alegação da falta de meios económicos seja acompanhada da demonstração da irresponsabilidade do executado em tal insuficiência, na medida em que esta corresponderá, em termos lógico-formais, à degradação de uma suficiência patrimonial pré-existente numa insuficiência patrimonial.
6.ª - É, pois, neste contexto teleológico - de acautelamento dos casos em que a degradação patrimonial do executado devedor originário tenha sido artificialmente causada -que se inscreve o ónus de prova quanto à irresponsabilidade do executado na falta de meios económicos para o pagamento da dívida exequenda e acrescido. Perante esta premissa - que se dá por assente -, pretende o RECORRENTE analisar a hipótese - estatisticamente menos relevante - em que o executado é chamado à execução, não na qualidade de devedor originário, mas na qualidade de responsável subsidiário (em virtude, v.g; de ter contribuído culposamente para a situação de insuficiência patrimonial do primitivo devedor - cf. artigo 24° da Lei Geral Tributária).
7.ª – Ora, nestes casos em que o executado é chamado a realizar o pagamento de obrigações tributárias alheias, o juízo de suficiência patrimonial assente na manifestação de capacidade contributiva reportar-se-á à esfera do respetivo devedor originário, e não à esfera do executado. O mesmo é dizer que, nesta hipótese, não subsistirá qualquer juízo - explícito ou implícito - acerca da suficiência patrimonial do executado responsável subsidiário. Na verdade, ao invés do que se verifica nos casos em que o executado é o devedor originário, em que se parte invariavelmente de uma situação de presumida suficiência patrimonial (ou de suficiência patrimonial genética), nos casos de responsabilidade subsidiária poderá partir-se - de forma totalmente legítima - de uma situação de insuficiência patrimonial pré-existente, ou seja, de uma situação em que o respetivo executado não detém, no momento em que é chamado à execução, património suficiente para o pagamento da dívida exequenda e acrescido. A título de exemplo, refira-se o caso do IRC incidente sobre os lucros de uma sociedade ou o caso do IVA incidente sobre as operações ativas por ela realizadas (caso em que tal sociedade se tornará devedora originária de tais impostos em virtude da manifestação de capacidade contributiva consubstanciada, quer na obtenção de lucros, quer na obtenção de rendimentos de prestações de serviços ou transmissões de bens), sendo tais impostos posteriormente revertidos para a esfera dos respetivos administradores ou gerentes que, na qualidade de responsáveis subsidiários, serão chamados a suportar o pagamento de uma dívida quantificada por referência a um património - o da sociedade - que poderá exceder em dezenas de vezes o seu património pessoal.
8.ª - Tendo esta última situação por referencial, pretende o RECORRENTE demonstrar que a distinção entre devedor originário e responsável subsidiário, até aqui exclusivamente assente em considerações teóricas, assume incontornáveis implicações práticas por força da prova de facto negativo imposta pelo nº 4 do artigo 52° da Lei Geral Tributária a propósito do requisito da irresponsabilidade do executado na falta de meios económicos para o pagamento da dívida exequenda e acrescido; a saber: i) enquanto o executado devedor originário, partindo de uma situação de suficiência patrimonial genética, poderá realizar a demonstração da sua irresponsabilidade - facto negativo - mediante justificação dos subsequentes atos de disposição patrimonial - factos positivos -, demonstrando que os mesmos não foram realizados com qualquer intuito de dissipação de património; n) o executado responsável subsidiário que se encontre numa situação de insuficiência patrimonial pré-existente apenas poderá demonstrar a sua irresponsabilidade - facto negativo - através da prova de outros factos negativos - v.g., que não obteve, nem poderia ter obtido, qualquer putativo ingresso patrimonial suscetível de incrementar o seu património até ao nível em que pudesse satisfazer uma dívida exequenda e acrescido que, até esse momento, desconhecia.
9.ª - Por outras palavras: no primeiro caso, a demonstração da irresponsabilidade do executado (devedor originário) na passagem de uma situação de suficiência patrimonial para uma situação de insuficiência patrimonial é justificável por atos - positivos - de disposição patrimonial praticados sem qualquer intuito dissipatório; já no segundo caso, a justificação da irresponsabilidade do executado (responsável subsidiário) na manutenção de uma situação de insuficiência patrimonial genética apenas poderá ser realizada mediante justificação da ausência de - putativos - incrementos patrimoniais suscetíveis de tornar o respetivo acervo patrimonial suficiente para satisfazer uma dívida exequenda até esse momento - i.e., o do seu chamamento para a execução - desconhecida.
10.ª - Resulta do que antecede, portanto, que a circunstância de o executado ser chamado à execução na qualidade de responsável subsidiário tem por singelo efeito onerá-lo, de forma agravada, com a necessidade de realização de uma dupla prova de facto negativo com vista a demonstrar o requisito da irresponsabilidade na falta de meios económicos para o pagamento da dívida exequenda e acrescido.
11.ª - Sucede, porém, que o identificado agravamento do ónus probatório que impende sobre o executado responsável subsidiário não se reflete somente no plano da dupla prova de facto negativo, manifestando-se, ainda - de forma porventura mais gravosa -, no leque de elementos probatórios ao seu dispor para realizar a sobredita prova, na medida em que: i) ao executado devedor originário bastará juntar a prova atinente aos atos de disposição patrimonial que hajam sido praticados e que tenham determinado a respetiva degradação patrimonial (atos que, por maioria de razão, constituirão um universo de factos positivos pré-determinados); ao passo que, ii) o executado responsável subsidiário deverá carrear para os autos elementos probatórios relativos a todas as opções pessoais e profissionais que foram sendo tomadas ao longo da sua vida e que tenham contribuído causalmente para a indicada situação de insuficiência patrimonial (na medida em que bastará a subsistência de uma opção tomada com intuito dissipatório para obstar à aplicação do indicado regime de dispensa de prestação de garantia); e iii) por fim, o executado responsável subsidiário verá ainda as suas opções pessoais e profissionais escrutinadas à luz de juízos de oportunidade realizados por referência a uma dívida exequenda até então desconhecida, sindicando-se, v.g., no domínio profissional, se o executado deveria ter procurado outro emprego mais bem remunerado, ou, no domínio pessoal, se deveria ter tido filhos (de forma a evitar sujeitar-se ao pagamento de futuras pensões de alimentos) ou se deveria ter ido de férias ou adquirido determinado bem em detrimento de outro (porventura mais económico).
12.ª - Perante o que antecede, considera-se que interpretar o n° 4 do artigo 52° da Lei Geral Tributária no sentido de que impõe agravadamente aos executados que sejam chamados à execução na qualidade de responsáveis subsidiários o ónus de prova de um duplo facto negativo para poderem beneficiar o regime de dispensa de prestação de garantia, é passível de violar: i) desde logo, o princípio da proibição da indefesa ínsito no artigo 20° da CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA, na medida que implicaria que a demonstração da irresponsabilidade do executado na falta de meios económicos para o pagamento da dívida exequenda e acrescido – enquanto facto negativo - pudesse ser realizada, somente, com recurso à prova de outro(s) facto(s) negativo(s) - i.e., mediante a demonstração da sua irresponsabilidade na ausência de putativos incrementos patrimoniais suscetíveis de tornar o respetivo acervo patrimonial suficiente -, prova que é virtualmente impossível de realizar; ii) o princípio da igualdade consagrado no artigo 13° da CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA, na medida em que promoveria uma discriminação manifestamente injustificada entre os executados na qualidade de devedores originários e os executados na qualidade de responsáveis subsidiários; e, bem assim, iii) o princípio da reserva da intimidade da vida privada positivado pelo artigo 26° da CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA, na medida em determinaria a necessidade de sindicar publicamente todas as opções pessoais e profissionais do executado que tenham eventualmente contribuído para a respetiva situação de insuficiência patrimonial.
13.ª - As apontadas desconformidades constitucionais resultantes da adoção do mesmo sentido interpretativo do n° 4 do artigo 52° da Lei Geral Tributária para os casos - comprovadamente distintos - de executados devedores originários e de executados responsáveis subsidiários, justificam, de per se, a necessidade de averiguar, para estes últimos, um novo sentido aplicativo que seja coerente com a ratio legis subjacente. É o que o RECORRENTE fará no ponto seguinte.
14.ª - Recapitulando o iter probatório imposto pelo n° 4 do artigo 52° da Lei Geral Tributária, sublinha-se que: i) em primeiro lugar, exige-se que o executado faça prova da falta de meios económicos para o pagamento da dívida exequenda e acrescido; e ii) de seguida, comprovada aquela, exige-se que o executado faça prova da sua irresponsabilidade na respetiva insuficiência ou inexistência de bens.
15.ª - A primeira prova exigida será idêntica em ambos os casos - i.e., tanto no caso de executados devedores originários, como no caso de executados responsáveis subsidiários -, recortando-se em torno de uma análise patrimonial objetiva que revelará a suficiência do acervo do executado para fazer face ao pagamento da dívida exequenda e acrescido.
16.ª - Já a segunda prova reclamada pelo n° 4 do artigo 52° da Lei Geral Tributária/ tendo por escopo assegurar que o executado não dissipou dolosamente o seu património, colocando-se artificialmente numa situação de insuficiência patrimonial, assume, conforme oportunamente observado, implicações distintas consoante o executado seja devedor originário ou responsável subsidiário. Com efeito, o executado devedor originário deverá, nesta sede, fazer prova de que a degradação da sua presumida suficiência patrimonial (decorrente da capacidade contributiva revelada no momento da constituição da respetiva obrigação tributária) se deveu a atos de disposição patrimonial praticados sem intuito dissipatório. No entanto, verifica-se que o responsável subsidiário não manifesta, em momento anterior ao do seu chamamento para a execução, qualquer suficiência patrimonial para o pagamento da dívida exequenda e acrescido passível de subsequente dissipação. Mais: até ao momento do seu chamamento para a execução na qualidade de responsável subsidiário, o executado desconhece o montante da dívida exequenda e acrescido que o seu património será chamado a satisfazer.
17.ª - Neste contexto, permite-se concluir, com mediana evidência, que a comprovação de uma situação de insuficiência patrimonial pré-existente relativamente ao momento do chamamento do responsável subsidiário para a execução, é passível de demonstrar, ipso facto, que a respetiva falta de meios económicos não resulta de qualquer ato dissipatório (desde logo por ausência do respetivo animus dissipatório, na medida em que o montante da dívida exequenda e acrescido apenas se torna conhecido do executado no momento do seu chamamento para a execução). Quer isto dizer, por outras palavras, que a demonstração de uma situação de insuficiência patrimonial pré-existente é, no caso de executados responsáveis subsidiários, suficiente para acautelar o risco de dissipação patrimonial que o ónus probatório imposto pelo n° 4 do artigo 52° da Lei Geral Tributária visa prevenir.
18.ª - Ora, no contexto do ónus probatório imposto ao devedor originário, vem entendendo o SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO "dever-se considerar provada a falta de culpa quando o executado demonstrar a existência de alguma causa da insuficiência ou inexistência de bens que não lhe seja imputável e não se fizer prova positiva da concorrência da sua atuação para a verificação daquele resultado" (cf. cit Acórdão proferido pelo PLENO DA SECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO). Transpondo este entendimento para as hipóteses aplicativas em que o executado seja chamado à execução na qualidade de responsável subsidiário, deverá considerar-se provada a falta de culpa quando o executado demonstre uma situação de insuficiência patrimonial pré-existente (a qual será, por esse singelo motivo, alheia a qualquer intuito dissipatório).
19.ª - De igual forma, atendendo a que qualquer prova exigida ao executado de que o seu património não foi positivamente incrementado por força da frustração não dolosa de um - putativo - influxo patrimonial constituirá uma dupla prova de facto negativo (manifestamente impossível e, por esse motivo, desconforme com o artigo 20° da CONSTITUIÇÃO), impor-se-á igualmente concluir, à luz da transcrita jurisprudência, que deverá ser a Autoridade tributária a realizar prova positiva de que o executado frustrou dolosamente um ingresso patrimonial positivo suscetível de tornar o seu património suficiente para o pagamento da dívida exequenda e acrescido. Em suma: a única interpretação coerente com o escopo do regime consagrado no n° 4 do artigo 52° da Lei Geral Tributária e conforme com a CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA será a de se considerar provada a falta de culpa do executado responsável subsidiário quando este demonstre uma situação de insuficiência patrimonial pré-existente e não se realize prova positiva de que o executado frustrou dolosamente um ingresso patrimonial positivo suscetível de tornar o seu património suficiente para o pagamento da dívida exequenda e acrescido.
20.ª - O Acórdão recorrido entendeu, neste domínio, que "Do conjunto da matéria de facto provada e resultando que o ora recorrente aufere uma remuneração mensal líquida de € 1.688,85 e atendendo às despesas que suporta com as pensões de alimentos devidas aos filhos só lhe resta mensalmente € 641,85, único rendimento disponível para satisfação das suas despesas essenciais, tais como alimentação, vestuário e saúde. Não lhe são conhecidos outros bens móveis ou imóveis. Só esta quantia de que dispõe (€ 641,85) que terá que ser afeta, na sua maior parte para satisfazer as suas necessidades básicas, revela-se, pois, manifestamente insuficiente para pagamento da dívida exequenda e respetivo acrescido, sendo que a garantia a prestar, para suspender a execução, ascende a € 12.876,88, o que, nos termos do disposto no art. 52° n° 4 da LGT revela a sua manifesta - e inequívoca - falta de meios económicos para efeitos de prestação da garantia" (o destacado é do RECORRENTE).
21.ª - Do transcrito trecho do Acórdão recorrido resulta, inelutavelmente, que o ora RECORRENTE, chamado à execução em causa na qualidade de responsável subsidiário, demonstrou cabalmente a sua falta de meios económicos para o pagamento da dívida exequenda e acrescido, consubstanciada numa situação de insuficiência patrimonial pré-existente ao seu chamamento para a execução. Consequentemente, e sem necessidade de maiores desenvolvimentos, o Acórdão recorrido deveria ter considerado a sobredita prova idónea para demonstrar a falta de culpa do RECORRENTE na evidenciada situação de insuficiência patrimonial, com a consequente anulação do despacho que indeferiu o pedido de dispensa de prestação de garantia oportunamente apresentado.
22.ª - Não o tendo feito, o Acórdão recorrido fez uma aplicação do n° 4 do artigo 52° da Lei Geral Tributária que é desconforme com os artigos 13°, 20° e 26° da CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA, devendo, por esse motivo, ser anulado, o que se peticiona.
23.ª - Por fim, A admissibilidade do presente recurso excecional de revista depende, em síntese, da verificação de qualquer um dos seguintes requisitos: i) que a questão a resolver seja de importância fundamental por via da sua relevância jurídica [entendida "não num plano meramente teórico, mas em termos práticos da utilidade jurídica da revista no contexto da causa e do estado da questão no contencioso" (cf. Acórdão do SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO, de 25 de fevereiro de 2009, processo n.° 112/09)]; ou ii) que a questão a resolver seja de importância fundamental por via da sua relevância social [entendida como "capacidade de expansão da controvérsia, de modo a ultrapassar os limites da questão singular" (cf. Acórdão de 25 de fevereiro de 2009, processo n.° 112/09)]; ou, ainda, iii) que a intervenção do SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito [o que se considera verificado nos casos em que "a possibilidade de melhor aplicação do direito resultará da repetição num número indeterminado de casos futuros, tendo como escopo a uniformização do direito", o que equivale a dizer que não devem ser admitidos os casos em que "as questões postas dependem primacialmente da formulação de juízos de facto, insuscetíveis de repetição futura" (cf. Acórdão do SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO, de 17 de junho de 2009, processo n° 411/09)].
24.ª - Quanto ao primeiro requisito, sublinha-se que a questão suscitada pelo RECORRENTE, assentando na distinção teórica entre as diversas tipologias de executados abrangidas pelo n° 4 do artigo 52° da Lei Geral Tributária - e que têm vindo a ser analisadas conjuntamente até ao presente momento -, contribui, salvo melhor opinião, para uma melhor aplicação do n° 4 do artigo 52° da Lei Geral Tributária, evitando a sua aplicação indiferenciada – e, por essa razão, desconforme com os artigos 13°, 20° e 26° da CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA - aos casos em que o executado assuma natureza de devedor originário e aos casos em que seja chamado à execução na qualidade de responsável subsidiário.
25.ª - A respeito do segundo requisito, destaca-se que o RECORRENTE pretende ver clarificado o alcance do requisito da irresponsabilidade na falta de meios económicos para o pagamento da dívida exequenda e acrescido, prescrito pelo n° 4 do artigo 52° da Lei Geral Tributária, sempre que esta norma seja aplicável a executados chamados à execução na qualidade de responsáveis subsidiários (e não apenas, portanto, no caso concreto do RECORRENTE), constituindo a aplicabilidade transversal desta norma, de resto, um dos fundamentos determinativos da necessidade de clarificação do seu alcance.
26.ª - Acerca do terceiro requisito, limita-se o RECORRENTE a reiterar a necessidade de uma intervenção clarificadora deste SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO, uniformizando a interpretação do n° 4 do artigo 52° da Lei Geral Tributária, no sentido de proscrever a interpretação que imputa aos executados responsáveis subsidiários, de forma agravada, a necessidade de realização de uma dupla prova de facto negativo com vista a demonstrar o requisito da sua irresponsabilidade na falta de meios económicos para o pagamento da dívida exequenda e acrescido, e que, por esse motivo, consubstancia um sentido interpretativo manifestamente discriminatório e desconforme com os artigos 13º, 20° e 26° da CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA.
27.ª - Por fim, naturalmente, a admissibilidade do presente recurso reveste ainda uma importância fundamental para o ora RECORRENTE, garantindo-lhe, numa situação de manifesta falta de meios económicos para o pagamento da dívida exequenda e acrescido que não lhe é imputável, ser dispensado da prestação de garantia enquanto discute judicialmente a (i)legalidade do respetivo despacho de reversão.
28.ª - Encontram-se, portanto, preenchidos todos os requisitos de que depende a admissibilidade do presente recurso excecional de revista, o que demonstra, inelutavelmente, a necessidade da sua apreciação.
Termina pedindo que o recurso seja admitido e, procedendo, seja revogado o acórdão recorrido.

1.3. Não foram apresentadas contra-alegações.

1.4. O MP emite Parecer, nos termos seguintes:
«1. O presente recurso vem interposto ao abrigo do artigo 150° do CPTA, com o fundamento de que o recurso se mostra necessário para uma melhor aplicação do direito.
Para o efeito alega que a questão por si suscitada "assenta na distinção teórica entre as diversas tipologias de executados abrangidas pelo n° 4 do artigo 52° da Lei Geral Tributária", a qual, no seu entendimento, contribui para uma melhor aplicação do n° 4 do artigo 52° da Lei Geral Tributária, evitando a sua aplicação indiferenciada.
Alega o Recorrente que "pretende ver clarificado o alcance do requisito da irresponsabilidade na falta de meios económicos para o pagamento da dívida exequenda e acrescido, prescrito pelo n° 4 do artigo 52° da Lei Geral Tributária, sempre que esta norma seja aplicável a executados chamados à execução na qualidade de responsáveis subsidiários... constituindo a aplicabilidade transversal desta norma, de resto, um dos fundamentos determinativos da necessidade de clarificação do seu alcance".
Invoca igualmente "a necessidade de uma intervenção clarificadora deste Supremo Tribunal Administrativo, uniformizando a interpretação do n° 4 do artigo 52° da Lei Geral Tributária, no sentido de proscrever a interpretação que imputa aos executados responsáveis subsidiários, de forma agravada, a necessidade de realização de uma dupla prova de facto negativo com vista a demonstrar o requisito da sua irresponsabilidade na falta de meios económicos para o pagamento da dívida exequenda e acrescido, e que, por esse motivo, consubstancia um sentido interpretativo manifestamente discriminatório e desconforme com os artigos 13°, 20° e 26° da Constituição da República Portuguesa".
3. No acórdão recorrido elegeu-se como questão decidenda a de saber "se se verificam os pressupostos para a dispensa da prestação de garantia..." e que segundo o TCA são «a existência de prejuízo irreparável que seja causado pela prestação de garantia e a manifesta falta de meios económicos para a prestar».
E sobre essa questão considerou-se que «há ... que provar os pressupostos legais da dispensa de garantia, sendo que sobre o reclamante, ... impende o ónus da prova do prejuízo irreparável ou da insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da quantia exequenda e acrescido e de que não houve dissipação de bens com intuito de diminuir a garantia dos credores», prova essa que no entendimento dos senhores desembargadores «recai, nos termos gerais, sobre o executado, já que é sabido que o ónus consiste na necessidade de observância de determinado comportamento, não para satisfação do interesse de outrem, mas como pressuposto de uma vantagem para o próprio».
Para o efeito no acórdão recorrido conclui-se que o recorrente aufere uma remuneração mensal líquida de 1.688,85 euros e que em face das despesas que tem que suportar com pensões de alimentos devidas aos filhos o rendimento mensal fica reduzido ao montante de 641,85 euros, com o qual tem que fazer face às suas despesas essenciais, motivo pelo qual, no entender do TCA Sul, o mesmo se revela manifestamente insuficiente para pagamento da quantia exequenda e acrescido.
Conclui, assim, o TCA Sul que o recorrente "revela a sua manifesta e inequívoca falta de meios económicos para efeitos de prestação de garantia".
Prossegue o mesmo acórdão recorrido que embora o recorrente tenha alegado que "sempre viveu de rendimentos gerados pelo seu próprio trabalho" e que "a insuficiência de meios económicos do requerente não se deve a qualquer acto de dissipação de património comum com o intuito de diminuir a garantia dos credores mas, tão somente à identificada e inalterada situação patrimonial do requerente", certo é que "na matéria de facto constante no probatório da sentença recorrida nada se mostra provado relativamente à invocada insuficiência de bens penhoráveis não ser da responsabilidade do ora recorrente", requisito que segundo o TCA igualmente lhe cabia provar para lhe ser deferida a dispensa de prestação de garantia.
Tendo concluído o TCA que «não provando, o ora recorrente, como era seu ónus, para obter a dispensa da prestação de garantia, a sua irresponsabilidade na génese da situação de insuficiência de bens, não se mostram verificados, pois, os requisitos contidos no n° 4 do art. 52° da Lei Geral Tributária para que a pretensão do recorrente possa ser deferida».
E nessa medida o acórdão recorrido julgou improcedente o recurso.
4. Nos termos do art. 150°, n° 1, do CPTA, das decisões proferidas em 2ª instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excepcionalmente, recurso de revista para o Supremo Tribunal Administrativo, "quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental" ou "quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito".
A jurisprudência do STA, largamente referenciada pelo Recorrente e que aqui nos dispensamos de citar, interpretando o comando legal, tem reiteradamente sublinhado a excepcionalidade deste recurso, referindo que o mesmo só pode ser admitido nos estritos limites fixados neste preceito. E como a mesma jurisprudência tem realçado, trata-se não de um recurso ordinário de revista, mas antes, como de resto o legislador cuidou de sublinhar na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nºs. 92/VIII e 93/VIII, de uma «válvula de segurança do sistema» que apenas deve ser accionada naqueles precisos termos.
A questão que se coloca é pois de saber se no caso concreto se mostram reunidos os requisitos legais de tal recurso. E designadamente se se justifica, como o Recorrente invoca, a intervenção do STA em termos de uma melhoria na aplicação do direito.
E afigura-se-nos que de facto há necessidade de circunscrever o âmbito do ónus da prova que recai sobre o responsável subsidiário que é chamado a responder pelo pagamento de uma dívida de outra pessoa, de forma a aquilatar do cumprimento ou não desse ónus no caso concreto.
E como subjaz ao recurso interposto, essa operação de interpretação não só reveste alguma complexidade, como se reveste de especial importância na apreciação dos inúmeros casos que são colocados à administração tributária e aos tribunais, ou seja, a solução a dar à questão não só se repercute no caso concreto como tem aptidão de expansão para outros casos.
Entendemos, assim, que a intervenção do Supremo Tribunal Administrativo não só se aconselha, como se impõe, de forma a minorar a potencial litigância derivada das diversas interpretações que o texto legal proporciona.
Afigura-se-nos, pois, que se mostram reunidos os requisitos de admissibilidade do recurso de revista.
5. A questão que se coloca consiste em saber qual o âmbito do ónus da prova que recai sobre o responsável subsidiário, que é chamado à execução para responder por determinada dívida da executada originária, para efeitos de isenção de prestação de garantia, nos casos em que manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido.
Dispõe a este propósito o artigo 52°, n° 4, da LGT que a isenção de prestação de garantia pode ser concedida ao executado no caso de «manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido, desde que em qualquer dos casos a insuficiência ou inexistência de bens não seja da responsabilidade do executado».
Como referem Diogo Leite de Campos e outros (in LGT, Anotada e Comentada, 4ª edição, 2012, pág. 424), em citação já constante dos autos, «A responsabilidade do executado, prevista na parte final ao n° 4 deve entender-se em termos de dissipação de bens com intuito de diminuir a garantia dos credores, e não como mero nexo de causalidade desprovido de carga de censura ou simples má gestão dos seus bens».
Para o Recorrente "a acautelada possibilidade de dissipação patrimonial por parte do executado exige, em termos lógicos, a subsistência de um juízo prévio quanto à suficiência do respectivo acervo patrimonial (susceptível, portanto, de ser dolosamente dissipado).
E continua: "ora, um tal juízo verificar-se-á, somente, na hipótese em que o executado é o devedor originário do tributo exequendo: com efeito, a suficiência patrimonial do devedor originário é confirmada no momento do surgimento da respectiva obrigação tributária, manifestando-se, essencialmente, na capacidade contributiva, revelada, nos termos da lei, através do rendimento ou da sua utilização e do património".
E conclui: "é, pois neste contexto teleológico - de acautelamento dos casos em que a degradação patrimonial do executado devedor originário tenha sido artificialmente causada - que se inscreve o ónus de prova quanto à irresponsabilidade do executado na falta de meios económicos para o pagamento da dívida exequenda e acrescido".
Assim, para o Recorrente, "a justificação da irresponsabilidade do executado (responsável subsidiário) na manutenção de uma situação de insuficiência patrimonial genética apenas poderá ser realizada mediante justificação da ausência de - putativos -incrementos patrimoniais susceptíveis de tornar o respectivo acervo patrimonial suficiente para satisfazer uma dívida exequenda até esse momento - i.e., o do seu chamamento para a execução - desconhecida".
Entende, assim, o Recorrente que o n° 4 do artigo 52° da LGT impõe agravadamente aos executados que sejam chamados à execução fiscal na qualidade de responsáveis subsidiários, o ónus da prova de um duplo facto negativo, para poderem beneficiar do regime de dispensa e nessa medida violador do princípio da proibição de indefesa, previsto no artigo 20° da CRP, do princípio da igualdade, previsto no artigo 13° da CRP, e do princípio da reserva da intimidade da vida privada, previsto no artigo 26° da CRP.
E termina: "A única interpretação coerente com o escopo do regime consagrado no n°4 do artigo 52°da Lei Geral Tributária e conforme com a CRP será a de considerar provada a falta de culpa do executado responsável subsidiário quando este demonstre uma situação de insuficiência patrimonial pré-existente e não se realize prova positiva de que o executado frustou dolosamente um ingresso patrimonial positivo susceptível de tomar o seu património suficiente para o pagamento da dívida exequenda e acrescido".
E, salvo melhor opinião, afigura-se-nos que as alegações do Recorrente se mostram deveras pertinentes.
Com efeito, no caso do responsável subsidiário que é chamado à execução fiscal para responder por dívida alheia, não há fundamento para pressupor a existência de uma situação patrimonial que permita responder pelo pagamento da quantia exequenda, designadamente se essa situação patrimonial já preexistir à data da constituição da dívida originária. Embora não seja pacífico o entendimento sobre a natureza da responsabilidade tributária dos gerentes e administradores das sociedades (ora qualificada como uma fiança legal, uma forma de responsabilidade civil extracontratual ou uma figura sui generis própria do direito tributário - cfr. a este propósito Paulo de Pitta e Cunha e Jorge Costa Santos, in "Responsabilidade Tributária dos Administradores ou Gerentes", LEX, 1999, pág. 26 e seguintes), não decorre do respectivo regime legal a específica obrigação de o seu património assegurar eventual incumprimento de pagamento de dívidas por parte da sociedade de que são gerentes ou administradores. Tal obrigação só se constitui a partir do momento em que o gerente ou administrador praticar actos que dêem origem à sua responsabilidade subsidiária, nos termos do artigo 24° da Lei Geral Tributária, ou seja, derem causa à insuficiência patrimonial da pessoa colectiva para responder pelas dívidas tributárias ou lhes seja imputável a falta de pagamento.
Daí que o juízo de censura decorrente de eventual dissipação de bens com intuito de diminuir a garantia dos credores só possa ser formulado a partir do momento em que o gerente ou administrador tenha consciência que pode ser responsabilizado pelos actos que praticou no seio da pessoa colectiva.
Assim, se desde a data da constituição da dívida por parte da executada originária que dá posteriormente origem à quantia exequenda, o património do responsável subsidiário não sofre alterações significativas, não se pode concluir que houve dissipação de bens. E se não houver dissipação de bens não há responsabilidade pela insuficiência ou inexistência de bens, ou o mesmo é dizer que só a dissipação de bens pode originar a responsabilidade que é imputada ao responsável subsidiário. E só neste caso é que recai sobre o responsável subsidiário o ónus da prova sobre a falta de culpa nessa situação patrimonial.
No acórdão do TCA recorrido concluiu-se que em face dos rendimentos que o executado aufere e dos encargos que suporta é manifesta a falta de meios económicos para efeitos de prestação de garantia. E no que diz respeito ao requisito da parte final do n° 4 do art. 52° da LGT - falta de imputabilidade da insuficiência patrimonial - considerou o Tribunal recorrido que embora o executado tenha invocado que sempre viveu dos rendimentos do seu trabalho e que não dispôs de qualquer património mobiliário ou imobiliário, e que aquela insuficiência patrimonial não se deve a qualquer acto de dissipação de património com o intuito de diminuir a garantia dos credores, na matéria de facto levada ao probatório não se fixou nenhum elemento que permita concluir que essa insuficiência não é da responsabilidade do executado e aqui recorrente. E nesses termos conclui o tribunal recorrido que não tendo satisfeito o ónus da prova que sobre recaía nessa parte, não se mostravam verificados os requisitos do n° 4 do artigo 52° da LGT.
Ora, da matéria de facto assente resulta que a dívida da executada originária diz respeito ao ano de 2009. E que em 2009, 2010 e 2011 o Recorrente declarou rendimentos no valor de € 46.686,00, € 29.863,00 e € 28.808,00 euros, respectivamente, com os quais fez face aos seus encargos familiares. E que nos anos de 2012 e 2013 auferia cerca de 1.680,00 euros mensais, com os quais suportava encargos com alimentos no valor de cerca de 1.047,00 euros. Resulta igualmente que a garantia foi fixada em cerca de 12.876,88 euros.
Em face de tais elementos probatórios não podia o tribunal recorrido concluir que "da matéria de facto levada ao probatório não se fixou nenhum elemento que permita concluir que essa insuficiência não é da responsabilidade do executado e aqui recorrente". Desde logo porque os rendimentos auferidos pelo Recorrente em 2012 e 2013, ou seja, cerca de 23.520,00 euros, não divergiam muito dos auferidos em 2010 e 2011. E porque tratando-se de rendimentos auferidos pelo próprio na sua actividade, não pode a diminuição de rendimentos consubstanciar dissipação de bens. E em face de tais rendimentos e dos encargos provados o tribunal está em condições de concluir pela possibilidade de o Recorrente prestar ou não a garantia fixada no processo.
Tendo o tribunal recorrido concluído pela negativa, não podia concluir, como o fez, pela imputabilidade ao Recorrente dessa impossibilidade.
E como se deixou supra referido, para se formular um juízo de censura pela dissipação de bens com intuito de diminuir a garantia dos credores, não basta a verificação de um nexo de causalidade. Mostra-se necessário que tenha havido uma actuação nesse sentido por parte do devedor.
Entendemos, assim, que o acórdão recorrido merece a censura que o Recorrente lhe formula, motivo pelo qual deve o mesmo ser revogado e substituído por outro que julgue procedente o recurso e julgue verificados os requisitos de dispensa de prestação de garantia no caso concreto.»

1.5. Corridos os vistos legais, cabe apreciar.

FUNDAMENTOS
2. Nas instâncias julgaram-se provados os factos seguintes (sendo que os especificados na al. K) foram assim julgados pelo TCAS e os especificados na al. U) foram aditados pelo TCAS):
A) A Administração Fiscal instaurou o processo de execução fiscal 3522200901030833 e apenso contra a executada B………………, LDA., contribuinte fiscal n° ………………, para cobrança coerciva de dívidas por IRC e de IRS respeitantes ao exercício de 2009, cfr. processo apenso.
B) O ora Reclamante, notificado do projecto de reversão, exerceu o direito de audiência, cfr. processo apenso.
C) Por despacho de 4/04/2013, o processo de execução fiscal a que se refere a alínea A), reverteu contra o ora Reclamante, cfr. fls. 44 do apenso.
D) Em dia 18-04-2013, o ora reclamante foi citado, na qualidade de responsável subsidiário, cfr. processo apenso.
E) Por requerimento de 05/06/2013, o ora Reclamante requereu a dispensa da prestação de garantia e a suspensão do processo de execução fiscal, cfr. fls. 30.
F) Em apreciação do requerimento a que se refere a alínea anterior, foi prestada a seguinte informação (fls. 98 do apenso):
«A executada acima indicada entregou neste Serviço um requerimento, indicando ter apresentado oposição à execução pelo que vem solicitar a isenção da prestação da garantia, nos termos Art. 169 e 170 do CPPT e Art. 52 n° 4 da LGT.
Confirma-se que a oposição à execução foi entregue neste Serviço de Finanças em 21-05-2013 com a entrada n° E001603527, e ainda se encontra pendente de instrução.
Da leitura da referida petição, verifica-se o seguinte: (Fundamentos e documentos apresentados)
1 - A executada alega, entre outras circunstâncias, que não tem património suficiente.
- Alega, que não possui bens nem meios financeiros para garantir os PEF, uma vez que se encontra a pagar duas pensões de alimentos no valor de 1.047,00 € assim como uma prestação no âmbito do crédito contraída a Caixa Central de Credito Agrícola Mútuo no valor mensal de 981,31 €)
2 - A executada apresentou a seguinte documentação.
- Cópia do Portal das Finanças em como a informação de Contribuinte sem prédios
- Cópia da declaração Mod. 3 do IRS dos anos 2010, 2011 e 2012
- Cópia do recibo de vencimento
- Cópia processo de Separação de Pessoas e Bens
- Cópia processo de Alimentos a filhos maiores ou emancipados
- Cópia processo compra e venda e mútuo com Hipoteca do imóvel sito Rua …………….. nº …… - ……...
- ANÁLISE
- Após consulta aos documentos acima mencionados verifica-se que o S.P auferiu no ano 2012 um rendimento no valor global no valor de 38.532.77 € e um pagamento de pensão de alimentos no valor de 10.061,28 € e um seguro de saúde no valor de 18,55 €.
- Portanto nas duas deduções apresentadas na Decl. Mod. 3 do ano 2012 a importância que me merece apreciação é o valor 10.061,28 € importância paga em pensão de alimentos.
- Quanto ao valor de (981,31 €) que o S.P. diz pagar mensalmente no âmbito dos créditos contraídos junto da Caixa Central de Crédito Agrícola Mútuo não apresenta documento que comprove o valor que o S. P. diz pagar.
- No que diz respeito ao domicílio fiscal verifica-se que o S.P. acima mencionado reside Rua ………………. n° …..—…………. cuja proprietária é C…………………. com Nif …………… de quem se separou de pessoas e bens por mútuo consentimento em 17-3-2010.
A isenção da prestação de garantia está prevista no n° 4 do artigo 52º da LGT e artigo 170° do CPPT.
Sobre esta matéria a Administração Tributária emitiu o Ofício Circulado n° 60077, de 2010.07.29, com base no despacho do Exmo. Senhor Director Geral dos Impostos da mesma data, veio sancionar o seguinte entendimento:
• Quanto aos pressupostos de cuja verificação depende a dispensa da prestação de garantia, diz o ponto 1 do referido ofício, que deve ser causa de prejuízo irreparável e/ou de manifesta falta de meios económicos, mas desde que qualquer destas situações não resulte da responsabilidade do executado, sendo esta uma condição de verificação necessária.
• Quanto ao prejuízo irreparável, diz o ponto 1.1 do referido ofício, deve traduzir-se numa situação de diminuição dos proveitos resultantes da actividade desenvolvida pelo executado, sendo este provocado pelos encargos financeiros impostos pela prestação da garantia.
• Quanto à falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis, manifesta-se, conforme o ponto 1.2 do referido ofício, no caso em que a garantia gera a existência de uma situação de carência económica do executado, de tal modo que este deixe de ter à sua disposição os meios financeiros necessários à satisfação das necessidades básicas, ou seja, é posta em causa própria subsistência do executado.
• A insuficiência material de bens penhoráveis é um indício de uma possível falta de meios económicos, no entanto, por si só, não determina necessariamente uma situação de manifesta falta de meios económicos, devendo ser estabelecido um nexo de causalidade adequada a cada situação.
• Quanto à não responsabilidade pela insuficiência, estabelece o referido ofício no seu ponto 1.3, que o executado não demostrou a existência de alguma causa de insuficiência ou inexistência de bens que não seja imputável de qualquer forma a sua conduta.
Conclusão
O n° 4 do artigo 52° da LGT estabelece que a dispensa de prestação de garantia depende da verificação dos seguintes pressupostos:
• Prejuízo irreparável causado pela prestação de garantia ou,
• Manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis;
• Na ausência responsabilidade da executada na inexistência ou insuficiência de bens.
Assim, sou de parecer que o S.P., no requerimento de dispensa não apresentou provas documentais da ausência de responsabilidade na inexistência ou insuficiência de bens.
À consideração superior.
Local e data 21-06-2013»
G) Por despacho de 02/07/2013, foi indeferido o pedido de dispensa da prestação de garantia, nos termos seguintes (fls. 26 e segs.):
«1. Introdução
O contribuinte acima identificado, na qualidade de responsável subsidiário no âmbito dos processo executivos acima mencionados, nos quais é executada a firma B……………… LDA, NIF………….., interpôs oposição à execução nos referidos processos, tendo aos 04-06-2013 apresentado requerimento em que solicita a dispensa da prestação da garantia nos termos do artigo 52°/4 da LGT e 170° do CPPT, que vai ser decidido.
2. Análise do Pedido
2.1. De Facto
Em 21-05-2013 foi instaurado neste serviço de finanças o processo oposição 3522201309000186, apresentada aos 20 do mesmo mês nos processos executivos acima mencionados, no qual pretende que se discuta a ausência de responsabilidade subsidiária e a consequente ilegalidade da reversão daquelas dividas.
Para efeitos de suspensão dos autos o valor da garantia a prestar ascende na presente data a € 12.876,88.
No prazo mencionado no n° 7 do art. 169 do CPPT veio requerer a dispensa da prestação da garantia, com base na insuficiência de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis, insuficiência essa que não é imputável ao requerente, alegando que:
não possui quaisquer bens móveis ou imóveis sujeitos a registo;
nem quaisquer outros bens passíveis de garantir a dívida exequenda;
que vive exclusivamente de rendimentos do trabalho, auferindo a remuneração mensal liquida de € 1.688,85, juntando o recibo de vencimento do mês de Abril;
que em resultado da separação de pessoas e bens ocorrida em 2010 encontra-se vinculado ao pagamento de duas pensões de alimentos, no valor mensal total de € 1.066,00;
e ainda ao pagamento de metade da prestação mensal devida no âmbito dos créditos contraídos junto da Caixa Central Crédito Agrícola Mútuo, no valor de € 490,66
pelo que fica com um remanescente de € 151,20 para fazer face a todas as demais despesas essenciais à sua sobrevivência,
2.2. De Direito
a) A Fundamentação
O n° 4 do artigo 52° da LGT estabelece que a dispensa de prestação de garantia depende da verificação dos seguintes pressupostos:
• Prejuízo irreparável causado pela prestação de garantia ou,
• Manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis;
• Ausência de responsabilidade da executada na inexistência ou insuficiência de bens.
Em face das regras do ónus da prova previstas no artigo 74° da LGT, incumbe à executada fazer prova de tais pressupostos.
O executado declarou no ano de 2012 à Administração Fiscal rendimento da categoria A no montante total de € 38.532,77, tendo sido igualmente declaradas pensões pagas aos seus filhos no montante total de € 10.061,28 e despesas de saúde no valor de € 18,55.
Dos elementos disponíveis da AT verifica-se igualmente que o executado, tem domicilio fiscal na R ……………., ………., o mesmo que os filhos a quem foi paga a pensão de alimentos.
Deste modo, dos documentos apresentados juntamente com o requerimento de dispensa, não resulta a verificação do pressuposto da irresponsabilidade do requerente na génese da situação de insuficiência ou inexistência de bens, pressuposto este que tem necessariamente que ser demonstrado, quer se verifique prejuízo irreparável causado pela prestação de garantia ou a manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens.
b) O princípio da participação na formação das decisões enunciado no artigo 60° da Lei Geral Tributária.
O referido normativo da LGT regula as situações em que os contribuintes podem participar na formação das decisões que lhe digam respeito no âmbito do procedimento administrativo, razão pela qual vem inserido no Título III da LGT intitulado "Do Procedimento Administrativo".
O pedido em causa - dispensa da prestação da garantia - surge no âmbito do processo de execução fiscal, que possui natureza judicial, por força do disposto no artigo 103° da LGT.
Dada a referida natureza do processo de execução fiscal, os pedidos dos contribuintes aí decididos não se encontram sujeitos ao cumprimento do exercício do direito de audição, previsto como uma formalidade a cumprir no procedimento administrativo, excepção feita à reversão, não por força do disposto no artigo 60° da LGT, mas sim porque tal formalidade se encontra expressamente prevista no n° 4 do artigo 23° do mesmo diploma legal.
Pretendendo reagir de actos materialmente administrativos praticados no processo executivo, o contribuinte deverá lançar mão do recurso previsto no artigo 276° do CPPT.
Acresce que o pedido de dispensa de garantia se encontra especificamente previsto no artigo 170° do CPPT que no seu n° 4 determina que o pedido seja resolvido no prazo de 10 dias após a sua apresentação.
Ora tal prazo de decisão não se compadece com o exercício do direito de audição, na medida em que para este, face ao disposto no n° 6 do artigo 60° da LGT, é obrigatória a concessão de um prazo não inferior.
Além disso, encontrando-se o pedido de dispensa de garantia especificamente regulado no artigo 170° do CPPT no que diz respeito ao prazo para efectuar o pedido, aos elementos de prova e prazo para a decisão, caso o legislador entendesse tratar-se de um acto administrativo praticado no âmbito de um processo de natureza judicial que deveria, mesmo assim obedecer ao formalismo da audição prévia, tal como acontece com a reversão, certamente teria feito constar tal obrigatoriedade do referido artigo.
Por tudo isto, não vai ocorrer a notificação para efeitos da audição prévia.
3. Conclusão
• O executado é parte legítima no presente petitório, efectuou a sua petição forma tempestiva solicitando a isenção/dispensa de garantia nos termos do artigo 52°/4 da LGT, e 170° do CPPT.
• Resulta da prova documental apresentada que não se verifica o pressuposto essencial da ausência de responsabilidade na inexistência ou insuficiência de bens, sendo que o ónus da prova recai sobre quem o invoque (n° 1 do artigo 74° da LGT), nomeadamente a verificação do pressuposto da irresponsabilidade da actuação na génese da situação de insuficiência ou inexistência de bens.
• Ao que se refere ao direito de audição previsto no artigo 60° da LGT, uma vez que estamos em presença de um processo executivo que tem natureza judicial, por força do disposto no artigo 103° da LGT, resulta a inaplicabilidade ao pedido em questão.
• Além disso, o prazo previsto para a decisão deste pedido que é de 10 dias nos termos do número 4 do artigo 170° do CPPT, o que não se compadece com prazo para o exercício do direito de audição referido no numero 6 do artigo 60° da LGT e que varia entre 8 e 15 dias.
• Não sendo abrangido pelo referido artigo 60° da LGT e existindo um regime próprio de dispensa de garantia previsto no artigo 170° do CPPT, caso o legislador pretendesse que essa formalidade fosse cumprida nesse âmbito, tal obrigação constaria especificamente do referido regime.
4. A Decisão
4.1 - Face ao explanado, indefiro a pretensão, com os fundamentos anteriormente referidos.
4.2 - Notifique-se, indicando os meios e prazos de defesa.
Algés, 02-07-2013»
H) A petição inicial da presente reclamação foi apresentada em 02/08/2013, cfr. fls. 39.
J) Em apreciação da douta petição inicial no Serviço de Finanças de Algés, foi prestada a seguinte informação (fls. 41):
«A fim de instruir o processo supra referido, cumpre-me informar V. Exa. do seguinte:
1 - Vem o sujeito passivo acima identificado, em 05.08.2013 (registo dos CTT de 02.08.2013), deduzir reclamação nos termos do art. 276° do CPPT, do despacho proferido pelo Chefe do Serviço de Finanças, relativamente aos processos executivos nºs. 3522200901030833 e ap., 3522201001006428, 352 2200901164201 e 3522201001011243, em 02.07.2013, e no qual indeferiu o pedido de dispensa de prestação de garantia para suspensão dos mesmos em virtude de ter deduzido oposição judicial, na qualidade de revertido da devedora originária B…………….., LDA, NIPC …………...
2 - O mandatário do reclamante foi notificado do referido despacho em 29.07.2013.
3 - A fls. 23 e 24 constam documentos comprovativos do pagamento de custas judiciais no valor de 306,00 €.
4 - O reclamante requer a anulação do despacho supra referido, alegando:
- a comprovada insuficiência de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis que considera ter demonstrado no pedido inicial, nomeadamente devido ao pagamento de duas pensões de alimentos e pagamento de prestação mensal devida no âmbito de créditos contraídos junto da Caixa Central de Crédito Agrícola Mútuo;
- não ser a insuficiência de meios económicos imputável ao próprio, dado que não resulta de qualquer acto de dissipação de património ou irresponsabilidade do mesmo.
Requer a subida imediata dos autos nos termos do n° 3, alínea d) do art. 278°do CPPT, alegando prejuízo irreparável, sendo que o indicado indeferimento do pedido de dispensa de garantia consubstancia a determinação de prestação de garantia indevida.
4 — Consultados os elementos existentes, verificou-se que:
- em 05.07.2013 o reclamante veio requerer a dispensa da prestação de garantia, invocando "insuficiência de meios económicos não imputável ao requerente ";
- pelo despacho de 02.07.2013 ora reclamado, esta pretensão veio a ser indeferida com os fundamentos de que não se verifica o pressuposto essencial da ausência de responsabilidade na inexistência ou insuficiência de bens, sendo que o ónus da prova recai sobre quem o invoque.
5 - O reclamante mais uma vez fundamenta a sua pretensão com a insuficiência de meios económicos e de bens penhoráveis, não acrescentando elementos novos para além da situação económica invocada anteriormente e da inexistência de culpa, salientando mais uma vez os compromissos assumidos no que concerne ao pagamento de pensões e de créditos bancários.
6 - Alega o reclamante o pagamento de pensões de alimentos aos filhos em consequência de separação de pessoas e bens. Para além de não fazer prova do referido pagamento, constata-se que todos os envolvidos (reclamante, ex-cônjuge e filhos) continuam a residir na mesma morada onde residiam anteriormente à referida separação de pessoas e bens, ou seja, Rua ……………., ….. — ……, …… —fls. 42 a 45.
7 - Relativamente às prestações devidas no âmbito de créditos contraídos junto da Caixa Central de Crédito Agrícola Mútuo, de notar que, para além de também não ser efectuada prova do seu pagamento, estas dizem respeito a empréstimos contraídos para aquisição de metade do prédio morada de família, que, segundo a escritura de compra (fls. 92 do PEF), ficou na esfera patrimonial da actual ex-cônjuge, pelo que o ora reclamante, mesmo depois de separado de pessoas e bens, continuaria a pagar empréstimo de um prédio que não lhe pertence.
8 - A fls. 46 consta ofício n° 6064, remetido ao Banco de Portugal, e no qual estes serviços solicitam informação sobre a existência de contas bancárias em nome do reclamante, não se aguardando a resposta dado o carácter urgente dos autos. Esta será remetida ao Tribunal logo que seja recepcionada.
9 - Nos termos da alínea n) do n° l do art. 97° do CPPT com a redacção dada pela Lei n° 66-B/2012, de 31.12, e em apenso, remetem-se fotocópias das partes consideradas essenciais dos processos executivos.
Pelo atrás exposto, e uma vez que não foram acrescentados quaisquer novos elementos aos anteriormente alegados, será de manter o acto reclamado, enviando-se os presentes autos ao Tribunal competente para apreciação e decisão.
No entanto V. Exa. melhor resolverá.
Algés, 09.03.2013»
J) A Chefe do Serviço de Finanças manteve a decisão reclamada e ordenou a remessa dos autos ao Tribunal competente, cfr. fls. 40.
K) No ano de 2009, o Reclamante auferiu rendimentos de trabalho dependente no valor de € 46.686,20 (cfr. fls. 140 a 143 dos autos).
L) No ano de 2010 o Reclamante declarou rendimento do trabalho dependente no valor de € 29.863,45, cfr. declaração mod. 3 de IRS, constante da cópia do processo de execução fiscal em apenso.
M) No ano de 2011 o Reclamante declarou rendimento do trabalho dependente no valor de € 28.808.02, cfr. declaração mod. 3 de IRS, constante da cópia do processo de execução fiscal em apenso.
N) No mês de Junho de 2011 o Reclamante auferiu a remuneração mensal líquida de € l.448,05, cfr. fls. 144.
O) No mês de Junho de 2012 o Reclamante auferiu a remuneração mensal líquida de € l.684,65, cfr. fls. 145.
P) No mês de Abril de 2013 o Reclamante auferiu a remuneração mensal líquida de € 1.688,85, cfr. cópia do processo de execução fiscal em apenso.
Q) Por decisão de 17/03/2010, foi declarada a separação de pessoas e bens entre o Reclamante e C……………….., cfr. cópia do processo de execução fiscal em apenso.
R) O Reclamante encontra-se vinculado ao pagamento de duas pensões de alimentos, de € 514,00 e de € 533,00, cfr. cópia do processo de execução fiscal em apenso.
S) C……………. adquiriu uma primeira metade indivisa do imóvel por doação de seu Avô, ocorrida em 1993, conforme escritura pública de doação de fls. 146 e segs.
T) Posteriormente adquiriu a propriedade plena do dito imóvel por compra da restante metade indivisa a sua irmã, ocorrida no ano de 2004, escritura pública de compra e venda e mútuo com hipoteca de fls. 149 e segs..
U) A parte adquirida e referida em T) reverte para o património próprio da compradora, nos termos do art. 1727 do CC, sem prejuízo da compensação devida ao património comum pelos valores realizados pelo casal com vista à presente aquisição e amortização do empréstimo (cfr. fls. 149 e seguintes escritura de compra e mútuo com hipoteca).

3.1. Aceitando-se que este recurso excepcional de revista previsto no art. 150º do CPTA é também aplicável no processo judicial tributário, importa, antes de mais, apreciar se o recurso dos autos é admissível face aos pressupostos de admissibilidade contidos nesse normativo, em cujos nºs. 1 e 5 se estabelece:
«1 - Das decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.
(…)
5 - A decisão quanto à questão de saber se, no caso concreto, se preenchem os pressupostos do nº 1 compete ao Supremo Tribunal Administrativo, devendo ser objecto de apreciação preliminar sumária, a cargo de uma formação constituída por três juízes de entre os mais antigos da Secção de Contencioso Administrativo».

3.2. Como o recorrente reconhece e indica, interpretando este nº 1, o STA tem vindo a acentuar a excepcionalidade deste recurso (cfr., por exemplo o ac. de 29/6/2011, rec. nº 0569/11) no sentido de que o mesmo «quer pela sua estrutura, quer pelos requisitos que condicionam a sua admissibilidade quer, ainda e principalmente, pela nota de excepcionalidade expressamente estabelecida na lei, não deve ser entendido como um recurso generalizado de revista mas como um recurso que apenas poderá ser admitido num número limitado de casos previstos naquele preceito interpretado a uma luz fortemente restritiva», reconduzindo-se como o próprio legislador sublinha na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nº 92/VII e 93/VIII, a uma “válvula de segurança do sistema” a utilizar apenas e só nos estritos pressupostos que definiu: quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para a melhor aplicação do direito.
Na mesma linha de orientação Mário Aroso de Almeida pondera que «não se pretende generalizar o recurso de revista, com o óbvio inconveniente de dar causa a uma acrescida morosidade na resolução final dos litígios», cabendo ao STA «dosear a sua intervenção, por forma a permitir que esta via funcione como uma válvula de segurança do sistema». (Cfr. O Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos, 2ª ed., p. 323 e Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 2005, p. 150 e ss..)
E no preenchimento dos conceitos indeterminados acolhidos no normativo em causa (relevância jurídica ou social de importância fundamental da questão suscitada e a clara necessidade da admissão do recurso para uma melhor aplicação do direito (Sobre esta matéria, cfr. Miguel Ângelo Oliveira Crespo, O Recurso de Revista no Contencioso Administrativo, Almedina, 2007, pp. 248 a 296.), também a jurisprudência deste STA vem sublinhando que:
- (i) só se verifica aquela relevância jurídica ou social quando a questão a apreciar for de complexidade superior ao comum em razão da dificuldade das operações exegéticas a efectuar, de enquadramento normativo especialmente complexo, ou da necessidade de compatibilizar diferentes regimes potencialmente aplicáveis, ou quando esteja em causa questão que revele especial capacidade de repercussão social, em que a utilidade da decisão extravasa os limites do caso concreto das partes envolvidas no litígio.
- e (ii) só ocorre clara necessidade da admissão deste recurso para a melhor aplicação do direito quando se verifique capacidade de expansão da controvérsia de modo a ultrapassar os limites da situação singular, designadamente quando o caso concreto revele seguramente a possibilidade de ser visto como um tipo, contendo uma questão bem caracterizada, passível de se repetir em casos futuros e cuja decisão nas instâncias seja ostensivamente errada ou juridicamente insustentável, ou suscite fundadas dúvidas, nomeadamente por se verificar divisão de correntes jurisprudenciais ou doutrinais, gerando incerteza e instabilidade na resolução dos litígios.
Não se trata, portanto, de uma relevância teórica medida pelo exercício intelectual, mais ou menos complexo, que seja possível praticar sobre as normas discutidas, mas de uma relevância prática que deve ter como ponto obrigatório de referência, o interesse objectivo, isto é, a utilidade jurídica da revista e esta, em termos de capacidade de expansão da controvérsia de modo a ultrapassar os limites da situação singular (a «melhor aplicação do direito» deva resultar da possibilidade de repetição num número indeterminado de casos futuros, em termos de garantia de uniformização do direito: «o que em primeira linha está em causa no recurso excepcional de revista não é a solução concreta do caso subjacente, não é a eliminação da nulidade ou do erro de julgamento em que porventura caíram as instâncias, de modo a que o direito ou interesse do recorrente obtenha adequada tutela jurisdicional. Para isso existem os demais recursos, ditos ordinários. Aqui, estamos no campo de um recurso excepcional, que só mediatamente serve para melhor tutelar os referidos direitos e interesses») - cfr. o ac. desta Secção do STA, de 16/6/2010, rec. nº 296/10, bem como, entre muitos outros, os acs. de 30/5/2007, rec. nº 0357/07; de 20/5/09, rec. nº 295/09, de 29/6/2011, rec. nº 0568/11, de 7/3/2012, rec. nº 1108/11, de 14/3/12, rec. nº 1110/11, de 21/3/12, rec. nº 84/12, e de 26/4/12, recs. nºs. 1140/11, 237/12 e 284/12.
E igualmente se vem entendendo que cabe ao recorrente alegar e intentar demonstrar a verificação dos ditos requisitos legais de admissibilidade da revista, alegação e demonstração a levar necessariamente ao requerimento inicial ou de interposição – cfr. arts. 627º, nº 2, 635º, nºs. 1 e 2, e 639º, nºs. 1 e 2 do novo CPC (Correspondentes aos arts. 676º, nº 2, 684º, nºs. 1 e 2, e 685º-A, nºs. 1 e 2, do anterior CPC.) - neste sentido, entre outros, os acórdãos do STA de 2/3/2006, 27/4/2006 e 30/4/2013, proferidos, respectivamente, nos processos nºs. 183/06, 333/06 e 0309/13.

3.3. No caso vertente, o recorrente deduzira reclamação judicial (nos termos do art. 276º so CPPT) do acto (despacho) praticado pelo chefe do Serviço de Finanças de Oeiras-3 que indeferiu o pedido de dispensa de garantia, alegando, no essencial, que essa prestação lhe causa prejuízo irreparável e também não foi por responsabilidade sua que os bens da devedora principal se tornaram insuficientes ou inexistentes.
E tendo a reclamação judicial sido julgada improcedente no TT de Lisboa, o reclamante interpôs recurso da respectiva sentença, para o TCA Sul, onde foi proferido, em 27/2/2014, o acórdão de fls. 250/269, no qual se negou provimento ao recurso, no entendimento de que, definindo a lei, como pressupostos da isenção de prestação de garantia, a existência de prejuízo irreparável que seja causado pela prestação da garantia e a manifesta falta de meios económicos para a prestar, bem como, em ambos os casos, que a insuficiência ou inexistência de bens não seja da responsabilidade do executado, no caso vertente, atenta a factualidade provada
(i) - o executado revela manifesta e inequívoca falta de meios económicos para efeitos de prestação da garantia, dado que dispõe (depois de subtraídas as despesas que suporta com as pensões de alimentos devidas aos filhos) de uma quantia mensal de € 641,85, único rendimento disponível para as suas despesas essenciais, e não lhe sendo conhecidos outros bens móveis ou imóveis;
(ii) – mas, quanto ao requisito previsto na parte final do nº 4 do art. 52º da LGT, (desde que em qualquer dos casos a insuficiência ou inexistência de bens não seja da sua responsabilidade), por um lado, o reclamante/recorrente limitou-se a dizer que não alienou ou, por qualquer outro modo, dispôs, de qualquer património mobiliário ou imobiliário suscetível de satisfazer a dívida exequenda, sendo que sempre viveu de rendimentos gerados pelo seu trabalho próprio e que impõe-se concluir, portanto, que a insuficiência de meios económicos do requerente não se deve a qualquer acto de dissipação de património comum com o intuito de diminuir a garantia dos credores mas, tão somente, à identificada e inalterada situação patrimonial do requerente (só juntou prova por documentos) e, por outro lado, do que decorre da matéria de facto constante do Probatório da sentença recorrida, também nada se mostra provado relativamente à invocada insuficiência de bens penhoráveis não ser da responsabilidade do ora recorrente, requisito que igualmente lhe cabia provar para lhe ser deferida a dispensa da prestação de garantia (dos documentos apresentados juntamente com o requerimento de dispensa não resulta a verificação do pressuposto da irresponsabilidade do ora recorrente na génese da situação de insuficiência de bens).
E não provando, como era seu ónus, para obter a dispensa da prestação de garantia, a sua irresponsabilidade na génese da situação de insuficiência de bens, não se mostram verificados, os requisitos contidos no n° 4 do art. 52º da LGT para que a pretensão de dispensa de prestação da garantia possa ser deferida.
Discordando deste entendimento afirmado no aresto do TCA Sul, o recorrente alega, em suma, que a questão que suscita assenta na distinção teórica entre as diversas tipologias de executados abrangidas pelo n° 4 do art. 52° da LGT, e que apreciação dessa mesma questão contribuirá para uma melhor aplicação daquele normativo, evitando a sua aplicação indiferenciada, pois que se “pretende ver clarificado o alcance do requisito da irresponsabilidade na falta de meios económicos para o pagamento da dívida exequenda e acrescido” (citado n° 4) “sempre que esta norma seja aplicável a executados chamados à execução na qualidade de responsáveis subsidiários... constituindo a aplicabilidade transversal desta norma, de resto, um dos fundamentos determinativos da necessidade de clarificação do seu alcance”.
Mais alega que há necessidade de uma intervenção clarificadora do STA, uniformizando a interpretação desse n° 4 do art. 52° da LGT, “no sentido de proscrever a interpretação que imputa aos executados responsáveis subsidiários, de forma agravada, a necessidade de realização de uma dupla prova de facto negativo com vista a demonstrar o requisito da sua irresponsabilidade na falta de meios económicos para o pagamento da dívida exequenda e acrescido, e que, por esse motivo, consubstancia um sentido interpretativo manifestamente discriminatório e desconforme com os artigos 13°, 20° e 26° da Constituição da República Portuguesa”.
Dito de outro modo: para o recorrente, embora o executado devedor originário deva, nesta sede, fazer prova de que a degradação da sua presumida suficiência patrimonial (decorrente da capacidade contributiva revelada no momento da constituição da respectiva obrigação tributária) se deveu a actos de disposição patrimonial praticados sem intuito dissipatório, já relativamente ao responsável subsidiário, as coisas se passam de modo diferente: uma vez que o mesmo não manifesta, em momento anterior ao do seu chamamento para a execução, qualquer suficiência patrimonial para o pagamento da dívida exequenda e acrescido passível de subsequente dissipação (aliás, até ao momento do seu chamamento para a execução na qualidade de responsável subsidiário, ele desconhece o montante da dívida exequenda e acrescido que o seu património será chamado a satisfazer), então, é de concluir que a comprovação de uma situação de insuficiência patrimonial pré-existente relativamente ao momento do chamamento do responsável subsidiário para a execução, é passível de demonstrar, ipso facto, que a respectiva falta de meios económicos não resulta de qualquer acto dissipatório: a demonstração de uma situação de insuficiência patrimonial pré-existente é, no caso de executados responsáveis subsidiários, suficiente para acautelar o risco de dissipação patrimonial que o ónus probatório imposto pelo n° 4 do art. 52° da LGT visa prevenir.
Ou seja, de acordo até com a jurisprudência do STA, deverá considerar-se provada a falta de culpa quando o executado demonstre uma situação de insuficiência patrimonial pré-existente (a qual será, por esse simples motivo, alheia a qualquer intuito dissipatório) e porque qualquer prova exigida ao executado de que o seu património não foi positivamente incrementado por força da frustração não dolosa de um - putativo - influxo patrimonial constituirá uma dupla prova de facto negativo (manifestamente impossível e, por esse motivo, desconforme com o artigo 20° da CRP), impor-se-á igualmente concluir, à luz da transcrita jurisprudência, que deverá ser a AT a fazer prova positiva de que o executado frustrou dolosamente um ingresso patrimonial positivo susceptível de tornar o seu património suficiente para o pagamento da dívida exequenda e acrescido.

3.4. Ora, retornando aos requisitos de admissibilidade deste recurso de revista excepcional, afigura-se-nos que não estão, no caso, verificados.
Desde logo, porque, em rigor, a questão suscitada se prende, ainda, com as ilações de facto que a sentença da 1ª instância e o TCAS retiram e valoram da demais factualidade julgada provada, ou seja, a questão suscitada cai, ainda, no âmbito do disposto no nº 4 do art. 150º do CPTA.
Na verdade, apesar de o recorrente invocar que pretende ver clarificado o alcance do requisito da irresponsabilidade na falta de meios económicos para o pagamento da dívida exequenda e acrescido (n° 4 do art. 52º da LGT), sempre que esta norma seja aplicável a executados chamados à execução na qualidade de responsáveis subsidiários (por confronto com os responsáveis originários), o que é verdade é que o acórdão recorrido não atribuiu ao recorrente qualquer específico ónus de prova, nomeadamente qualquer ónus de dupla prova de factos negativos: o que se diz no acórdão é que o recorrente se limitou a alegar (para fundamentar a conclusão de a sua insuficiência de meios económicos não se dever a qualquer acto de dissipação de património comum com o intuito de diminuir a garantia dos credores), que não alienou ou dispôs, de qualquer património mobiliário ou imobiliário susceptível de satisfazer a dívida exequenda, sempre tendo vivido de rendimentos gerados pelo seu trabalho próprio (ou seja, se limitou a alegar que a insuficiência se deve apenas à identificada e inalterada situação patrimonial respectiva), e, ainda assim, na matéria de facto nada se mostra provado relativamente a esta invocada insuficiência de bens penhoráveis não ser da sua responsabilidade, sendo que dos documentos apresentados juntamente com o requerimento de dispensa da prestação da garantia, também não resulta essa irresponsabilidade.
O acórdão recorrido arranca, portanto, da apreciação da própria factualidade julgada provada nos autos para concluir pela «não prova», por banda do recorrente, da invocada insuficiência de bens penhoráveis não ser da sua responsabilidade.
E o juízo valorativo sobre a factualidade que foi julgada provada nos autos, nomeadamente, em termos de se concluir que dessa factualidade resulta, para este efeito, a demonstração de situação de insuficiência patrimonial pré-existente, suficiente para acautelar o risco de dissipação patrimonial a que se reporta o ónus probatório imposto pelo n° 4 do art. 52° da LGT, não deixa de ser um juízo valorativo de facto, não enquadrável na permissão ínsita no nº 4 do art. 150º do CPTA (e não se nos afigura que a invocação de que o entendimento do acórdão recorrido configura um sentido interpretativo manifestamente discriminatório e desconforme com os arts. 13°, 20° e 26° da CRP possa equipara-se à alegação de que houve ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova (nº 4 do citado art. 150º).
Acresce que, mesmo que se reconhecesse complexidade jurídica e relevância social à questão colocada, reconduzindo-se essa questão, no essencial, também a uma alegação de desconformidade constitucional da interpretação feita pelo TCAS ao apontado nº 4 do art. 52º da LGT, sempre haveria de atentar-se, como doutamente se salienta no ac. de 12/9/2013, proc. nº 0982/13, da Secção do Contencioso Administrativo deste STA, em que, embora afirmando-se «… que, no âmbito das questões que lhes cumpra decidir, compete a todos os tribunais recusar aplicação a normas que contrariem a Constituição e os princípios nela consignadas ou sejam desconformes a lei de valor reforçado (art. 204º da CRP), questões assim configuradas - repete-se, em que a constitucionalidade ou ilegalidade das normas aplicadas (ou, sendo o caso, a que tenha sido recusada aplicação com tal fundamento) é a única questão jurídica a resolver ou cuja solução determina inexoravelmente a solução ou pertinência de todas as outras - não são geralmente idóneas a abrir a via do recurso excepcional de revista.
Com efeito, a revista prevista no art. 150º do CPTA é, como se referiu, um meio excepcional, instituído para funcionar como “válvula de segurança” de um sistema que não comporta, com regra, duplo grau de recurso e em que, portanto, as decisões dos tribunais centrais administrativos constituem, segundo as regras normais, a última palavra sobre as questões submetidas a apreciação em cada processo. Perante questões de importância fundamental - pela complexidade jurídica, relevância social ou possibilidade de replicação - permite-se, então, que o Supremo Tribunal Administrativo intervenha a dizer a última palavra. Ora, para a apreciação de puras questões de constitucionalidade (ou de ilegalidade qualificada) normativa o sistema jurídico português comporta o recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade (ou ilegalidade), cabendo sempre ao Tribunal Constitucional, a pronúncia definitiva, como órgão que assegura a concentração da garantia da conformidade das normas à Constituição num sistema de fiscalização difuso (art.ºs 221º e 280º da CRP).
Perante questões assim concebidas, não é necessário chamar o órgão de cúpula da jurisdição administrativa, segundo a funcionalidade própria da revista, porque o mesmo efeito se obtém, e só se obtém com valor processualmente definitivo suposto o normal exercício das suas competências por parte dos diversos intervenientes, com o recurso previsto, consoante os casos e observados os necessários pressupostos, nas alíneas a), b), c) e f) do nº 1 do art. 70º da Lei 28/82, de 15 de Novembro (LTC). Efectivamente, nestas circunstâncias, o chamamento do Supremo Tribunal Administrativo constituiria, apenas, um passo intermédio na solução do litígio, uma vez que, qualquer que fosse o sentido da decisão, sempre seria susceptível de recurso (aliás, obrigatório para o Ministério Público, se a decisão do Supremo fosse de recusa de aplicação da norma - cf. nº 3 do art. 72º da LTC).
Só se concebe que pudesse ser de outro modo, perante as chamadas decisões negativas (as decisões de improcedência da questão de constitucionalidade ou ilegalidade), se o recurso excepcional de revista devesse ser considerado como incluído no âmbito da regra da exaustão dos meios ordinários e a sua interposição fosse condição necessária para posterior acesso ao Tribunal Constitucional. Nessa hipótese, embora com entorse à sua funcionalidade precípua no sistema de contencioso administrativo, seria defensável que se admitisse a revista por razões instrumentais de acesso à justiça constitucional. Mas não é o caso, apesar de a revista ser um “recurso ordinário”, na acepção processual corrente, a norma do nº 2 do art. 70º da LTC tem de ser interpretada, de acordo com a sua finalidade e o quadro legislativo em que surgiu, como só exigindo a exaustão dos recursos de admissibilidade tarificada. A revista excepcional, à semelhança do recurso para uniformização de jurisprudência (então um recurso ordinário), não se compreende na razão de ser da imposição da regra de exaustão constante do nº 2 do art. 70º da LTC (Cf., no mesmo sentido, Vieira de Andrade, A Justiça Administrativa, 8.ª ed., pág. 449)
E também noutros arestos o STA [Secção de Contencioso Administrativo (Cfr., entre outros, os acs. de 10/7/2013, proc. nº 01123/13; de 26/9/2013, proc. nº 01371/13; de 31/10/2013, proc. nº 01603/13; de 18/12/2013, proc. nº 01788/13.)] tem, igualmente, reiteradamente afirmado não ser de admitir o recurso de revista excepcional em que as questões colocadas se reconduzem a estritas questões de inconstitucionalidade normativa, que podem discutir-se em recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade.

4. Em suma, concluindo-se que não se preenchem os requisitos de admissibilidade do recurso de revista excepcional (atendendo à especificidade e à casuística da questão factual, sendo nessa factualidade que repousa o juízo de valoração decisória afirmado pelo recorrido acórdão do TCAS e atendendo a que a questão colocada também se reconduz a estrita questão de inconstitucionalidade normativa, que pode discutir-se em recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade) teremos, igualmente, que concluir pela não verificação de uma clara necessidade de admissão do recurso para melhor aplicação do direito, pois não se verifica capacidade de expansão da controvérsia: trata-se, antes, de uma situação pontual, casuística, e específica (situação delimitada pelo contorno factual que o recorrente ainda agora pretende ver alterado) e em que, em função da factualidade apurada, não se vislumbra que haja relevante divergência jurisprudencial ou doutrinária, quanto à solução jurídica encontrada.
Sendo que, ainda que existisse mero erro de julgamento sempre o mesmo ficaria afastado do âmbito deste recurso, que não visa - como acima se referiu – a eliminação da nulidade ou do erro de julgamento em que porventura caíram as instâncias, de modo a que o direito ou interesse do recorrente obtenha adequada tutela jurisdicional. Para isso existem os demais recursos, ditos ordinários. Aqui, estamos no campo de um recurso excepcional, que só mediatamente serve para melhor tutelar os referidos direitos e interesses.

5. Pelo exposto e porque se considera não estarem verificados os requisitos do art. 150º do CPTA, o presente recurso não pode ser admitido.

DECISÃO
Nestes termos, acorda-se em não admitir o presente recurso, por se considerar que não estão preenchidos os pressupostos a que se refere o nº 1 do artigo 150º do CPTA.
Custas pelo recorrente.
Lisboa, 10 de Setembro de 2014. – Casimiro Gonçalves (relator) – Dulce NetoIsabel Marques da Silva.