Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0679/12.0BEBRG
Data do Acordão:07/13/2021
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:PEDRO VERGUEIRO
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL
FUNDAMENTO DA OPOSIÇÃO
FALTA DE NOTIFICAÇÃO
LIQUIDAÇÃO FORA DO PRAZO NORMAL
CADUCIDADE
Sumário:A falta de notificação da liquidação dentro do prazo da caducidade do direito à liquidação constitui não só fundamento de oposição à execução fiscal, por expressa previsão legal na al. e) do nº 1 do art. 204º do CPPT, mas também, por força da lei (art. 45º nº 1 da LGT), ilegalidade invalidante do acto de liquidação, susceptível de constituir fundamento de impugnação judicial (art. 99º do CPPT).
Nº Convencional:JSTA000P28021
Nº do Documento:SA2202107130679/12
Data de Entrada:02/05/2021
Recorrente:INSTITUTO DE GESTÃO FINANCEIRA DA SEGURANÇA SOCIAL, I.P. – SECÇÃO DE PROCESSOS EXECUTIVOS DE BRAGA
Recorrido 1:A.........., S.A.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Processo n.º 679/12.0BEBRG (Recurso Jurisdicional)



Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

1. RELATÓRIO

“Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P.”, devidamente identificado nos autos, inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, datada de 16-10-2020, que julgou procedente a pretensão deduzida por “A……………, S.A.” no presente processo de OPOSIÇÃO relacionado com o Processo de Execução Fiscal n.º 0301201100517844 e apensos para cobrança coerciva de dívida de contribuições e cotizações, referentes ao período de 09/2003 a 10/2004, no montante de €33.826,92, sobre o qual acrescem juros de mora no valor de €19.496,99, perfazendo a quantia global de € 53.296,91.


Formulou nas respectivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem:

“ (…)

1. Vem o presente recurso interposto da douta sentença proferida a fls…. dos presentes, nos termos da qual o Tribunal a quo julgou a presente oposição totalmente procedente e em virtude disso, determinou a extinção do Processo de Execução Fiscal n.º 0301201100517844 e apensos, instaurado contra a Oponente, para cobrança coerciva de dívida ao Instituto da Segurança Social I.P, a título de contribuições e cotizações, referente ao período de 09/2003 a 10/2004, no valor total de €53.296,91.

2. Entendeu o tribunal a quo que, nos presentes autos o que está em discussão cinge-se a verificar se o processo executivo n.º 0301201100517844 e respetivo apenso, se deve extinguir por prescrição da dívida exequenda, ou assim não se entendendo, por falta de notificação da liquidação dentro do prazo de caducidade, por falsidade do título executivo, ou, em relação aos valores alegadamente em excesso, por os mesmos não terem sido considerados na decisão do processo de averiguações.

3. Entendeu a douta sentença que, respeitando a dívida em causa a contribuições e cotizações referentes ao período compreendido entre 09/2003 a 10/2004, verifica-se que quando a notificação da liquidação foi feita à Oponente, já tinha decorrido o prazo de caducidade das contribuições/cotizações em cobrança no processo executivo n.º 0301201100517844 e respectivo apenso.
4. O art. 204.º n.º 1 do CPPT, apresenta uma lista taxativa dos fundamentos da oposição à execução, nos termos do qual, a ilegalidade da liquidação da dívida exequenda só é fundamento da oposição à execução nos casos em que a lei não assegure meio judicial de impugnação ou recurso contra o ato de liquidação, já que, na fase administrativa da execução fiscal, aquela ilegalidade pode ser atacada através de outros meios.
5. Donde que, o fundamento ilegalidade da liquidação da dívida exequenda apenas é suscetível de configurar fundamento legalmente válido de oposição à execução fiscal no caso de “ a lei não assegurar meio judicial de impugnação ou recurso contra o ato de liquidação”.
6. Contudo, a caducidade, por contender com a legalidade, que não com a exigibilidade da dívida, deve visualizar-se como fundamento típico do processo de impugnação judicial e não do processo de oposição à execução fiscal. (neste sentido o Ac. 2724/05.7BELSB do TCA do Sul, de 31-01-2019, secção CT)
7. Assim, a questão da caducidade do direito à liquidação, bem como, a falta de notificação da liquidação do tributo no prazo de caducidade, sendo questões de legalidade, teriam que ser suscitadas no processo de impugnação que pende termos pela 2.ª UO sob o n.º de Proc. 1859/11.1BEBRG do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, ou seja, meio processual inclusivamente usado pela Oponente.
8. E porque assim é, o fundamento da falta de notificação à oponente no prazo da caducidade, não pode servir de fundamento legalmente admissível à oposição judicial, ou seja, o meio próprio e adequado para discutir a legalidade é a impugnação judicial, e não o processo de oposição à execução fiscal, conforme foi decidido na douta sentença, motivo pelo qual há uma errada interpretação da al. e) do art. 204.º do CPPT.
9. Ao manter-se a interpretação e o entendimento perfilhado na douta sentença, há uma interpretação inconstitucional do art. 204.º do CPPT, porquanto, na hipótese da impugnação judicial que pende termos pela 2.ª UO sob o n.º de Proc. 1859/11.1BEBRG do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, ser decidida a favor da exequente, por via da sentença proferida nos presentes autos, o Instituto da Segurança Social, IP, enquanto credor, fica sem a possibilidade de cobrar a dívida em sede de execução fiscal.
10. Assim, ao manter-se esta interpretação do art. 204.º n.º 1 do CPPT há uma clara violação do art. 20.º da Constituição da República Portuguesa, que determina o acesso ao Direito e a tutela jurisdicional efetiva, de todas as pessoas, singulares e coletivas.
Nestes termos, e nos que mais V. Exc.ªs doutamente suprirão, deve ser concedido provimento ao presente recurso, e consequentemente revogada a sentença recorrida, e substituída por outra no sentido de julgar a oposição judicial improcedente, com o que se fará a necessária e costumada JUSTIÇA

A Recorrida “A……………, S.A.” apresentou contra-alegações, nas quais enuncia as seguintes conclusões:

“(…)

A. A Sentença recorrida considerou que “[r]espeitando a dívida em causa a contribuições e cotizações referentes ao período compreendido entre 09/2003 a 10/2004, e aplicando-se as regras acabadas de enunciar, verifica-se que quando a notificação foi feita à Oponente, em 13/01/2009 - e não tendo sido alegado ou provado qualquer facto integrante de causa suspensiva do prazo de caducidade nos termos do artigo 46º da Lei Geral Tributária - já tinha decorrido o prazo de caducidade das contribuições/cotizações mais recentes - ocorrido em 10/2008 - pelo que por maioria de razão tinha igualmente decorrido o prazo de caducidade da liquidação referente às dívidas mais antigas.

Assim, não pode a Exequente exigir à Oponente dívidas cuja liquidação não foi notificada à Oponente dentro do respectivo prazo de caducidade”, pelo que julgou “a presente oposição totalmente procedente e em virtude, determino a extinção do Processo de Execução Fiscal n.º 0301201100517844 e apensos, instaurado contra a Oponente, para cobrança coerciva de dívida ao Instituto da Segurança Social I.P., a título de contribuições e cotizações, referente ao período de 09/2003 a 10/2004, no valor total de € 53.296,91”;

B. A Recorrente não coloca, em momento algum, em causa que a liquidação de contribuições e cotizações de Segurança Social que originou o processo de execução em causa nos presentes autos “não foi notificada à Oponente dentro do respectivo prazo de caducidade”;

C. A Recorrente meramente se insurge contra a Sentença recorrida porque, no seu entender, “o fundamento da falta de notificação à oponente no prazo de caducidade, não pode servir de fundamento legalmente admissível à oposição judicial, ou seja, o meio próprio e adequado para discutir a legalidade é a impugnação judicial, e não o processo de oposição à execução fiscal conforme foi decido na douta sentença, motivo pelo qual há uma errada interpretação da alínea e) do art.º 204.º do CPPT”, assim como alegadamente se verifica uma “interpretação inconstitucional do art. 204.º do CPPT, porquanto, na hipótese da impugnação judicial (…) ser decida a favor da exequente, por via da sentença proferida nos presentes autos, o Instituto da Segurança Social, IP, enquanto credor, fica sem a possibilidade de cobrar a dívida em sede de execução fiscal”, o que, alegadamente, constituiria uma “violação do art. 20.º da Constituição da República Portuguesa, que determina o acesso ao Direito e a tutela jurisdicional, de todas as pessoas, singulares e colectivas”;

D. Ao contrário do que alega a Recorrente, a procedência do processo de execução fiscal não contende com qualquer juízo de ilegalidade da liquidação que possa encontrar-se em discussão em sede de impugnação judicial, mas, atendendo a que não é contestado que a liquidação em causa foi notificada para além do prazo de caducidade, também em sede de Impugnação Judicial, resultaria num “obstáculo definitivo à prática de um acto de liquidação eficaz pelo que será de aventar a possibilidade de se conhecer daquela como um fundamento de inutilidade superveniente da lide, por não ter qualquer utilidade apreciar se é válido um acto que não pode vir a ter eficácia” (vide Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado – Volume II, Áreas Editora, 2007, pág. 359), resultando tal inutilidade superveniente da lide na extinção da instância por facto imputável ao ISS;

E. É pacificamente aceite que à liquidação oficiosa de contribuições e de cotizações de Segurança Social, em suprimento das obrigações dos contribuintes, é aplicável, por força dos art.ºs 1.º, 2.º e 3.º da LGT, o regime de caducidade do direito à liquidação previsto no art.º 45.º da LGT (neste sentido, vide Douto Acórdão de 26 de Fevereiro de 2014, proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo no processo n.º 01481/13), que dispõe, no seu n.º 1 que “[o] direito de liquidar os tributos caduca se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de quatro anos, quando a lei não fixar outro”;

F. Dispondo a alínea e) do n.º 1 do art.º 204.º do CPPT, que a oposição pode ter como fundamento a “[f]alta de notificação da liquidação do tributo no prazo de caducidade”, torna-se claro que esta notificação para além daquele prazo afecta, não a validade, mas a eficácia do acto de liquidação, pelo que é em sede de oposição à execução que deve ser invocada e apreciada a mesma;

G. Em consequência, ainda que a falta de notificação da liquidação dentro do prazo de caducidade possa ser invocada em processo de impugnação judicial, o contribuinte não fica impedido de se opor à execução, nos termos e para os efeitos da alínea e) do n.º 1 do art.º 204.º do CPPT caso, para além das restantes ilegalidades que ferem a liquidação de contribuições e de cotizações em causa nos presentes autos, ocorra, como ocorre, a sua inoponibilidade por falta de notificação tempestiva;

H. Com efeito, verifica-se uma inexistência de exclusividade de utilização do fundamento da falta de notificação da liquidação dentro do prazo de caducidade na impugnação judicial ou na oposição à execução, pelo que “podemos dizer que a falta de notificação da liquidação dentro do prazo da caducidade do direito à liquidação constitui, por força da lei (art. 45.º n.º 1 da LGT) ilegalidade invalidante do acto de liquidação (cf. art. 99.º do CPPT), susceptível de constituir não só fundamento de impugnação judicial, mas também fundamento de oposição à execução fiscal, por expressa previsão legal na alínea e) do n.º 1 do art.º 204.º do CPPT” (vide Douto Acórdão de 30 de Outubro de 2019, proferido por este Supremo Tribunal Administrativo no processo n.º 01528/08.0BELRS);

I. Pelo que não merece qualquer censura a Sentença recorrida ao determinar que “[o] processo é o próprio e não enferme de quaisquer nulidades insupríveis”, e bem assim, que “[n]as situações em que a liquidação é feita dentro do respectivo prazo de caducidade, mas notificada ao sujeito passivo depois daquele prazo, essa liquidação será válida, mas ineficaz, pelo que, sendo ineficaz, é fundamento válido de oposição. Com efeito, a falta de notificação afecta a eficácia do acto e não a sua validade, pelo que é na oposição à execução, havendo Processo de Execução, que deve ser invocada essa falta de notificação. O mesmo sucederá nas situações em que quer a liquidação, quer a respectiva notificação ocorreu depois de decorrido o prazo de caducidade, desde que tenha sido instaurado um Processo de Execução Fiscal”;

J. E bem assim, ao concluir que, “[r]espeitando a dívida em causa a contribuições e cotizações referentes ao período compreendido entre 09/2003 e10/2004 , e aplicando-se as regras acabadas de enunciar, verifica-se que quando a notificação foi feita à Oponente, em 13/01/2009 - e não tendo sido alegado ou provado qualquer facto integrante de causa suspensiva do prazo de caducidade das contribuições/cotizações mais recentes – ocorrido em 10/2008 - pelo que por maioria de razão tinha igualmente decorrido o prazo de caducidade da liquidação referente às dívidas mais antigas. Assim, não pode a Exequente exigir à Oponente dívidas cuja liquidação não foi notificada à Oponente dentro do respectivo prazo de caducidade”;

K. Assim, bem andou a Sentença recorrida ao decidir que “[e]ntende-se que deve proceder o argumento da Oponente, ou seja, de que ocorreu a falta de notificação da liquidação das contribuições/cotizações em causa, no prazo de caducidade, pelo que deve extinguir-se o Processo de Execução Fiscal n.º 0301201100517844 e apensos, que lhe move o Exequente, para cobrança coerciva de dívida ao Instituto da Segurança Social, a título de contribuições e cotizações, referente ao período de 09/2003 a 10/2004, ficando assim, dada a procedência deste argumento, prejudicada a apreciação dos demais fundamentos invocados”;

L. A Sentença recorrida faz uma correcta apreciação da matéria de facto e, bem assim, de aplicação do Direito ao caso sub judice, pelo que não merece reforma nem censura.

Termos em que, sempre com o Mui Douto Suprimento de Vossas Excelências, Colendos Juízes Conselheiros do Supremo Tribunal Administrativo, deverá o presente recurso jurisdicional ser julgado improcedente e, em consequência, ser mantida in totum a Sentença Recorrida,

Assim se fazendo JUSTIÇA!”

O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.

Cumpre decidir.




2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que a matéria apontada nos autos resume-se, em suma, em indagar se a sentença incorreu em erro de julgamento ao apreciar em sede de oposição à execução fiscal a caducidade do direito à liquidação com base na falta de notificação da liquidação dentro do prazo da caducidade.




3. FUNDAMENTOS

3.1. DE FACTO

Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:

“…

1. No ano de 2008, o Instituto da Segurança Social I.P, efetuou uma ação de fiscalização à Oponente, tendo aberto e instruído um processo de averiguações, ao qual foi atribuído o nº 200803016073 [facto não controvertido e cfr. informação a fls. 132 e ss. e documentos a fls. 147 e ss. da Cópia Certificada do Processo de Execução Fiscal, e documentos 2 a 4 juntos com a Petição Inicial a fls. 8 a 31 do ficheiro a fls. 51 do SITAF, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais].

2. Em 16/05/2008, na sequência do referido no ponto anterior, a Oponente tomou conhecimento de que no dia 27/05/2008, na sua sede, deveria ter disponível um conjunto de documentos [cfr. «notificação» a fls. 2 da Cópia Certificada do Processo de Execução Fiscal, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais].

3. Em 17/09/2008, na sequência da ação inspetiva referida em 1), pelo Instituto da Segurança Social I.P., foi remetido ofício nº 247362, para a Oponente, que esta rececionou em 18/09/2008, com o seguinte teor:

«(…) constatou-se a existência de remunerações não declaradas por V. Exa(s). à Segurança Social, referentes aos meses de novembro e dezembro de 2003; julho de 2004; maio de 2005; julho de 2006 e junho de 2007, a que correspondem omissões nas contribuições devidas, no valor de 48.763,83€, conforme cópias dos mapas de apuramento que se anexam e se dão como integralmente reproduzidos. As citadas omissões resultam de não terem sido declaradas como base de incidência de contribuições as verbas pagas a alguns trabalhadores a título de “prémios de desempenho”.

Uma vez que estes prémios têm natureza regular fazem parte integrante da retribuição do trabalhador de acordo com o disposto nos n.ºs 1, 2 e 3 do art.º 249.º do Código do Trabalho, conjugado com os n.ºs 2 e 3 do art.º 261.º do referido Código.

Tendo a natureza de um prémio com carácter de regularidade são, portanto, passíveis de contribuições para a Segurança Social, de acordo com o disposto no DR nº 12/83, de 12 de fevereiro, com as alterações do DR n.º 53/83, de 22 de junho.

Assim, notifica-se V.Exa. de que serão elaboradas as correspondentes Declarações de Remunerações com os elementos em falta ao abrigo da al. c) do nº 2 do art. 10 da Portaria n.º 638/2007, de 30 de maio e ao abrigo do artigo 33.º D.L n.º 8.º-B/2002, de 15 de janeiro, se, findo o prazo de 10 dias úteis a contar da data de receção deste ofício, não der entrada, nestes Serviços, resposta por escrito, devidamente fundamentada que possa obstar ou alterar o sentido provável da decisão ora notificada (…)».

[cfr. ofício e aviso de receção a fls. 147 a 149 da Cópia Certificada do Processo de Execução Fiscal e documento 2), junto com a Petição Inicial a fls. 10 e 11 do ficheiro a fls. 51 do SITAF, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais].
4. Na mesma data referida no ponto anterior, na sequência da ação inspectiva referida em 1), pelo Instituto da Segurança Social I.P., foi remetido ofício nº 247363, para a Oponente, que esta rececionou em 18/09/2008, com o seguinte teor:
«“(…) constatou-se a existência de remunerações não declaradas por V. Exa(s). à Segurança Social, referentes aos meses de setembro de 2003 a abril de 2008, a que correspondem omissões nas contribuições devidas, no valor de 74.537,63 €, conforme cópias dos mapas de apuramento que se anexam e se dão como integralmente reproduzidos.
As citadas omissões resultam de não terem sido declaradas como base de incidência de contribuições pagas a alguns trabalhadores a título de “ajudas de custo estrangeiro”/”prémio de grande deslocação”/”subsídio de expatriação.
Estes serviços consideram que estas verbas não se enquadram no conceito de ajudas de custo.
(…) neste caso em concreto, para além do “prémio de grande deslocação”, as despesas com alimentação e alojamento já são pagas pela empresa (conforme consta nos “acordos de pessoal expatriado e regime de grande deslocação”), o que se traduziria numa duplicação de atribuição de verbas para o mesmo fim.
Assim, considerou-se que as verbas designadas de “ajudas de custo estrangeiro”/”prémio de grande deslocação”/”subsídio de expatriação” se enquadram antes no conceito de prémios, com carácter de regularidade:
• Pela frequência com que são atribuídos;
• Pela legítima expectativa do seu recebimento pelo trabalhador, uma vez que a sua atribuição está pré-estabelecida nos referidos acordos;
• Fazem parte integrante da retribuição do trabalhador de acordo com o disposto nos n.ºs 1, 2 e 3 do art.º 249.º do Código do Trabalho;
• São, assim, passíveis de contribuições para a Segurança Social, de acordo com o disposto na alínea d) do n.º 2 do DR nº 12/83, de 12 de fevereiro, com as alterações do DR n.º 53/83, de 22 de junho.
Assim, notifica-se V.Exa. de que serão elaboradas as correspondentes Declarações de Remunerações com os elementos em falta ao abrigo da al. c) do nº 2 do art. 10 da Portaria n.º 638/2007, de 30 de maio e ao abrigo do artigo 33.º D.L n.º 8.º-B/2002, de 15 de janeiro, se, findo o prazo de 10 dias úteis a contar da data de receção deste ofício, não der entrada, nestes Serviços, resposta por escrito, devidamente fundamentada que possa obstar ou alterar o sentido provável da decisão ora notificada (…)».
[cfr. ofício e aviso de receção a fls. 150 a 152 da Cópia Certificada do Processo de Execução Fiscal e documento 3), junto com a Petição Inicial a fls. 8 e 9 do ficheiro a fls. 51 do SITAF, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais].
5. Em 02/10/2008, na sequência das comunicações referidas em 3) e 4), a Oponente apresentou, junto do Instituto da Segurança Social I.P., duas exposições invocando os argumentos que no seu entendimento justificavam a não declaração dos valores mencionados naquelas comunicações como remunerações [cfr. exposições a fls. 153 a 158 da Cópia Certificada do Processo de Execução Fiscal, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais].
6. Em 18/12/2008, na sequência da ação inspetiva referida em 1), e considerando as exposições da Oponente referidas no ponto anterior, o departamento de fiscalização do Instituto da Segurança Social I.P, elaborou o respetivo relatório final, em que se concluiu que:
«(…)
Assim, reformularam-se os mapas de apuramento de remunerações, no que diz respeito “ajudas de custo estrangeiro”/ “prémio de grande deslocação”/ “Subsídio de expatriação” (…).
O valor das contribuições apuradas, do período de setembro de 2003 a abril de 2008 foi de 113.375,47€ (48.763,83€ relativo aos “prémios de desempenho” e 64.611,64€, relativo às “ajudas de custo estrangeiro”/ “prémio de grande deslocação”/ “Subsídio de expatriação”).
Proposta
Face ao exposto, propõe-se:
- que efetivamente sejam dadas como liquidadas as contribuições totais de 113.375,47€, correspondentes aos valores que não forma objeto de incidência de contribuições para a Segurança Social;
- por força da citada liquidação, o contribuinte deverá ser considerado, em termos definitivos, devedor à Segurança Social da importância de €113.375,47€».
[cfr. relatório a fls. 178 a 187 da Cópia Certificada do Processo de Execução Fiscal, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais].
7. Em 29/12/2008, na sequência do relatório referido no ponto anterior, o Chefe de Sector proferiu o seguinte despacho: «Concordo com os termos e os fundamentos do presente relatório, devendo o contribuinte ser considerado devedor do valor de €113.375,47». [cfr. despacho a fls. 177 da Cópia Certificada do Processo de Execução Fiscal, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais].
8. Na sequência do despacho referido no ponto anterior, foram elaborados oficiosamente os mapas de apuramento de remunerações referentes ao período de 09/2003 a 04/2008, sendo que no que respeita ao período compreendido entre 09/2003 a 10/2004, foi considerado em falta: no que respeita às remunerações “ajudas de custo estrangeiro”/ “prémio de grande deslocação”/ “Subsídio de expatriação”, o valor de total de 5.765,28 a título de cotizações, e €12.447,76 a título de contribuições (no global €18.213,04); no que respeita aos «prémios de desempenho», o valor total de 4.942,52 a título de cotizações e 10.671,35 a título de contribuições (no global €15.613,87)[cfr. mapas de apuramento de remunerações referentes aos anos de 2003 e 2004, a fls. 136, 137, 167 e 168 da Cópia Certificada do Processo de Execução Fiscal, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais].
9. Em 12/01/2009, na sequência da ação inspetiva referida em 1), pelo Instituto da Segurança Social I.P., foi remetido ofício nº 008666, para o Oponente, que este rececionou em 13/01/2009, com o seguinte teor:
«(…)
Depois de analisadas as respostas remetidas a estes serviços, (…) conclui-se o seguinte:
 Relativamente ao apuramento efetuado aos “prémios de desempenho”, não constam elementos que possam obstar ou alterar o sentido da decisão na mesma comunicada;
 Relativamente ao apuramento efetuado às “ajudas de custo estrangeiro” / “prémio de grande deslocação” / “subsídio de expatriação”, constam elementos que alteraram, em parte, o sentido da decisão, conforme os factos que a seguir se enunciam.
(…)
Reformularam-se os mapas de apuramento de remunerações, no que diz respeito “ajudas de custo estrangeiro” / “prémio de grande deslocação” / “subsídio de expatriação”, que se anexam, tendo deduzido a verba diária fixa de 1,8% da média aritmética resultante da soma das tabelas I e II para cobertura das despesas correntes, cujo montante diário é de 8,59€/dia (…) e de 9,07€/dia (…) em função dos dias em que o trabalhador se encontrava deslocado no estrangeiro.
Assim, foram elaborados oficiosamente os mapas de apuramento de remunerações, ao abrigo da alínea c) do n.º 2 do art.º 10.º da Portaria n.º 638/2007, de 30 de maio e do artigo 33.º D.L n.º 8.º-B/2002, de 15 de janeiro, referentes no período de Setembro de 2003 a abril de 2008, a que correspondem omissões nas contribuições devidas, no valor de 113.375,47€ (…), tendo os referidos mapas de apuramento sido remetidos ao Centro Distrital de Braga, para efeitos de lançamento.
A fundamentação da decisão proferida consta no relatório final que aqui se junta e se dá por integralmente reproduzido».
[cfr. ofício e aviso de receção a fls. 174 a 176 da Cópia Certificada do Processo de Execução Fiscal, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais].
10. Em 26/05/2009, o Presidente do Conselho Diretivo do Instituto da Segurança Social, I.P. procedeu à reforma da decisão referida no ponto 7), por, analisados os pressupostos daquele ato, se ter verificado que o mesmo na parte relativa aos apuramentos efetuados por quantias pagas a título de «ajudas de custo no estrangeiro, prémios de grande deslocação, e subsídio de expatriação» não ter tomado em consideração as revisões das tabelas I e II efetuadas pelo BTE n.º 34, 1.ª Série de 15/09/2006 e BTE n.º 33, 1.ª Série de 08/09/2007, mantendo-se, porém, os valores referentes ao período de 09/2003 a 10/2004, referidos em 8) [cfr. despacho, informação e mapas a fls. 188 a 196 da Cópia Certificada do Processo de Execução Fiscal, cujos teores se dão aqui por integralmente reproduzidos para os devidos efeitos legais].
11. Em 27/05/2009, na sequência do referido no ponto anterior, pelo Instituto da Segurança Social I.P., foi remetido ofício nº 34835/2009, para o Oponente, que este rececionou, com o assunto «Proc. N.º 613/09.5BEBRG - Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga – A………….., S.A»., com o seguinte teor:
«Em cumprimento do disposto no artigo 68.º do Código do Procedimento Administrativo, junto envio cópia do meu despacho de 26-05-2009, que procedeu à reforma do ato impugnado nos autos em assunto, nos moldes da informação e dos mapas de apuramento de remunerações que se anexam».
[cfr. comunicação a fls. 197 da Cópia Certificada do Processo de Execução Fiscal, cujos teores se dão aqui por integralmente reproduzidos para os devidos efeitos legais].
Mais se provou que:
12. Em 18/07/2011, pelo Instituto da Segurança Social I.P. foi emitida a certidão de dívida n.º 58592/2011, tendo como executado a Oponente, referente a contribuições respeitantes ao período de 09/2003 a 10/2004, no valor total de €23.119,11 [cfr. certidão de dívida a fls. 6 do Processo de Execução Fiscal, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais].
13. Na mesma data referida no ponto anterior, pelo Instituto da Segurança Social I.P. foi emitida a certidão de dívida n.º 58591/2011, tendo como executado a Oponente, referente a cotizações respeitantes ao período de 2003/09 a 2004/10, no valor total de €10.707,81 [cfr. certidão de dívida a fls. 7 do Processo de Execução Fiscal, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais].
14. Em 19/07/2011, com base na certidão de dívida referida em 12), pelo Exequente foi autuado o Processo de Execução Fiscal n.º 0301201100517844 [cfr. autuação a fls. 2 do Processo de Execução Fiscal, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais].
15. Na mesma data referida no ponto anterior, com base na certidão de dívida referida em 13), pelo Exequente foi autuado o Processo de Execução Fiscal n.º 0301201100517879 [cfr. autuação a fls. 9 do Processo de Execução Fiscal, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais].
16. Em 19/07/2011, no âmbito do Processo de Execução Fiscal referido em 14) e respetivos Apensos – processo referido em 15) – pelo Exequente foi elaborado documento designado de «Citação», dirigido à Oponente, com uma quantia exequenda no valor de €33.826,92 e acrescidos - juros e mora e custas processuais - no montante de €19.469,99, com um total de €53.296.91, tendo como anexo as certidões de dívida referidas em 1) e 2) [cfr. «citação» a fls. 4 do Processo de Execução Fiscal, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais].
17. Em 25/07/2011, a Oponente tomou conhecimento do documento referido no ponto anterior, juntamente com os respetivos anexos [facto não controvertido e cfr. aviso de receção a fls. 8 do Processo de Execução Fiscal].
18. No âmbito do Processo de Execução Fiscal referido em 16), a Oponente apresentou garantia bancária [cfr. documentos a fls. 393 do SITAF, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais].
Provou-se ainda que:
19. Em abril de 2009, a Oponente instaurou ação administrativa especial - a qual corre termos na 2.ª orgânica deste Tribunal sob o n.º 613/09.5BEBRG - contra o Instituto da Segurança Social I.P. no âmbito da qual impugnou a decisão referida em 6), invocando a respetiva ilegalidade e pedindo, a final, a anulação daquela decisão, com a consequente declaração de nulidade dos mapas oficiosamente elaborados e da declaração da Oponente como devedora da quantia de €113.375,47. [facto não controvertido e cfr. Petição Inicial do processo n.º 613/09.5BEBRG a fls. 413 a 507 do SITAF, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais].
20. Em 29/09/2011, a Oponente remeteu, via CTT expresso, a presente Oposição para o Exequente, tendo a mesma dado entrada nos serviços desta em 30/09/2011 [cfr. comprovativo de envio a fls. 138 do processo físico].
21. Em novembro de 2011, o Oponente apresentou impugnação judicial - a qual corre termos neste Tribunal sob o n.º 1859/11.1BEBRG - contra a liquidação oficiosa de contribuições e cotizações do Instituto da Segurança Social I.P. referentes aos períodos de 09/2003 a 10/2004, invocando a respectiva ilegalidade e pedindo a final que a mesma fosse anulada [facto não controvertido e cfr. Petição Inicial do processo n.º 1859/11.1BEBRG a fls. 508 a 643 do SITAF, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais].
Factos não provados
Com interesse para a decisão da causa inexistem factos não provados.
Motivação
Para o julgamento da matéria de facto tomou-se em consideração a posição assumida pelas partes nos respetivos articulados, os documentos por si juntos aos autos, bem como os constantes do Processo Administrativo (Processo de Execução Fiscal e Cópia Certificada do Processo de Execução Fiscal) tudo conforme descrito em cada um dos pontos da matéria de facto supra.”

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3.2. DE DIREITO

Assente a factualidade apurada cumpre, então, entrar na análise da realidade em equação nos autos, sendo que a este Tribunal está cometida a tarefa de indagar se a sentença incorreu em erro de julgamento ao apreciar em sede de oposição à execução fiscal a caducidade do direito à liquidação com base na falta de notificação da liquidação dentro do prazo da caducidade.


Nas suas alegações, a Recorrente refere que o art. 204.º n.º 1 do CPPT, apresenta uma lista taxativa dos fundamentos da oposição à execução, nos termos do qual, a ilegalidade da liquidação da dívida exequenda só é fundamento da oposição à execução nos casos em que a lei não assegure meio judicial de impugnação ou recurso contra o ato de liquidação, já que, na fase administrativa da execução fiscal, aquela ilegalidade pode ser atacada através de outros meios, o que significa que o fundamento ilegalidade da liquidação da dívida exequenda apenas é susceptível de configurar fundamento legalmente válido de oposição à execução fiscal no caso de “a lei não assegurar meio judicial de impugnação ou recurso contra o ato de liquidação”, verificando-se que, a caducidade, por contender com a legalidade, que não com a exigibilidade da dívida, deve visualizar-se como fundamento típico do processo de impugnação judicial e não do processo de oposição à execução fiscal, o que equivale a dizer que a questão da caducidade do direito à liquidação, bem como, a falta de notificação da liquidação do tributo no prazo de caducidade, sendo questões de legalidade, teriam que ser suscitadas no processo de impugnação que pende termos pela 2.ª UO sob o n.º de Proc. 1859/11.1BEBRG do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, ou seja, meio processual inclusivamente usado pela Oponente, de modo que, o fundamento da falta de notificação à oponente no prazo da caducidade, não pode servir de fundamento legalmente admissível à oposição judicial, ou seja, o meio próprio e adequado para discutir a legalidade é a impugnação judicial, e não o processo de oposição à execução fiscal, conforme foi decidido na douta sentença, motivo pelo qual há uma errada interpretação da al. e) do art. 204.º do CPPT, além de que, ao manter-se a interpretação e o entendimento perfilhado na douta sentença, há uma interpretação inconstitucional do art. 204.º do CPPT, porquanto, na hipótese da impugnação judicial que pende termos pela 2.ª UO sob o n.º de Proc. 1859/11.1BEBRG do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, ser decidida a favor da exequente, por via da sentença proferida nos presentes autos, o Instituto da Segurança Social, IP, enquanto credor, fica sem a possibilidade de cobrar a dívida em sede de execução fiscal, existindo também uma clara violação do art. 20.º da Constituição da República Portuguesa, que determina o acesso ao Direito e a tutela jurisdicional efectiva, de todas as pessoas, singulares e colectivas.

Que dizer?
Desde logo, e para cabal enquadramento da realidade, em termos substanciais, em análise nos autos, importa notar que na situação dos autos, tal como se refere no Ac. do S.T.A. (Pleno) de 26-02-2014, Proc. nº 01481/13, www.dgsi.pt, que “… Trata-se, portanto, de uma liquidação oficiosa por iniciativa do Instituto da Segurança Social, efectuada em suprimento das obrigações dos contribuintes, e que constitui, por isso, um verdadeiro acto administrativo declarativo de liquidação de um tributo, praticado por autoridade pública.
Na verdade enquanto nas situações de autoliquidação se verifica, por via de regra uma homologação implícita pela Administração decorrente da aceitação do pagamento do imposto, já na liquidação estamos perante uma verificação constitutiva da existência da obrigação de imposto, cujos efeitos se reportam ao momento da verificação do facto tributário, por via de uma retrodatação de efeitos. (Mas não retroactividade de efeitos -cf., neste sentido, Casalta Nabais, Direito Fiscal, 6ª edição, Almedina, pag. 325 ).
Ora dúvidas não há, atento o regime previsto no referido artº 33º do Decreto-lei 8 B/2002, que esta inscrição e a declaração de remunerações bem como o cálculo das contribuições que lhe correspondam, efectuados oficiosamente pela Segurança Social, com base em elementos de prova obtidos, designadamente, no âmbito de acções de fiscalização ou de inspecção, constituem uma verificação constitutiva da existência daquela obrigação contributiva, e assumem, por isso, a natureza de uma verdadeira liquidação.
Sendo assim, ao direito de liquidar tais contribuições é aplicável, por força do disposto nos artigos 1.º, 2.º 3º da Lei Geral Tributária, o regime de caducidade do direito à liquidação previsto no artº 45.º do mesmo diploma legal, uma vez que o regime específico das quotizações e contribuições à Segurança Social não fixa um prazo especial de caducidade do direito de liquidação.
Com efeito, tratando-se, como se trata, de um acto de liquidação de tributos, está sujeito ao regime de notificação dos actos tributários nos termos do disposto nos artigos 36º nº1 do CPPT e 77º nº6 da L.G.T., devendo ser notificado ao contribuinte no prazo de caducidade de quatro anos previsto no artigo 45º da Lei Geral Tributária …”.

Ultrapassada esta nota inicial, vamos avançar para a matéria que se impõe dirimir no âmbito do presente recurso, sabido que a oposição a execução fiscal consubstancia uma espécie processual onde os fundamentos admissíveis definidos na lei se encontram consagrados no art. 204º nº 1 do CPPT, preceito que consagra uma enumeração legal taxativa, na medida em que utiliza a expressão “... a oposição poderá ter algum dos seguintes fundamentos ...”, realidade que pretende evitar o protelamento excessivo da cobrança coerciva dos créditos do Estado, o que levou o legislador a limitar as possibilidades de defesa em processo de execução fiscal aos casos de flagrante injustiça - Ac. do S.T.A. de 21-06-2017, Proc. nº 01133/14, www.dgsi.pt.

Nesta sequência, crê-se pertinente ter presente o exposto no Ac. deste Supremo Tribunal de 30-10-2019, Proc. nº 01528/08.0BELRS, www.dgsi.pt, que faz a análise da questão, tendo como ponto de partida o processo de impugnação judicial, o que vem dar resposta às preocupações da Recorrente face à pendência da impugnação judicial pela 2.ª UO sob o n.º de Proc. 1859/11.1BEBRG do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, fazendo a integração da matéria em apreço perante as duas figuras processuais em presença.
Pois bem, pondera-se no citado aresto que:
“…
Como ficou dito no acórdão deste Supremo Tribunal citado pela sentença recorrida (Acórdão da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 4 de Outubro de 2017, proferido no processo com o n.º 660/15, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/98fd1f769da5dee4802581b6004f33b0.), «o termo liquidação na LGT é empregue com um duplo sentido: o de procedimento e o de acto administrativo que culmina o procedimento e quer num sentido quer noutro a sua função consiste em fixar o “an e o quantum” da obrigação tributária e exigi-la ao obrigado tributário
A liquidação contém, assim, uma manifestação unilateral, da Administração Tributária sobre o montante da prestação que fixa de modo exacto indicando para tanto ao obrigado tributário o prazo e o órgão onde efectuar o pagamento, bem como os meios de defesa quer administrativos quer contenciosos que pode utilizar.
E só com a notificação válida do acto da liquidação é que se pode considerar totalmente encerrado o procedimento de liquidação.
[…]
Neste entendimento há que convir que embora quer conceptualmente quer materialmente distintos o acto administrativo da liquidação e o acto que o notifica, a notificação não deixa de integrar o procedimento de liquidação e embora não seja pressuposto da legalidade do acto da liquidação na medida em que a notificação é sempre um acto posterior é contudo pressuposto da sua eficácia donde o prazo de caducidade continuar a correr enquanto não ocorrer a notificação válida do acto que o interrompa.
E dado que neste caso e em todo o direito público a notificação adquire a relevância de princípio essencial no procedimento administrativo, como direito e garantia dos administrados ex vi do disposto no artigo 268.º do CRP, o artigo 45.º da LGT explicitando essa relevância e exigência constitucional, integrando a exigência de notificação da liquidação no prazo de caducidade do direito à liquidação faz decorrer a interrupção do prazo da caducidade do direito de liquidar pela AT não do momento em que pratica o acto de liquidação mas do momento da sua notificação ao sujeito passivo desse acto.
E decorrido o prazo de caducidade da liquidação sem que a sua notificação válida tenha ocorrido tal acto ainda que praticado dentro do prazo não deixa por força do artigo 45.º da LGT de estar ferido de ilegalidade» (sublinhado nosso).
Esclarecedor a este propósito é CASIMIRO GONÇALVES; após se pronunciar sobre a notificação como requisito da eficácia do acto, elucida: «a obrigatoriedade da notificação da liquidação no prazo de caducidade não retira ao próprio acto da notificação a natureza de requisito de eficácia, embora para efeitos de caducidade tal notificação tenha, por força da lei, definido um regime especial, pois que releva, agora, também como pressuposto da caducidade do direito à liquidação por parte do Estado, esta sim, uma ilegalidade concreta que afecta a validade do acto de liquidação e que, como tal, é susceptível de fundamentar a respectiva impugnação» (Ob. cit., pág. 237.).
Acompanhamos esta jurisprudência e doutrina, no sentido de que a falta de notificação da liquidação dentro do prazo da caducidade fere de ilegalidade o procedimento de liquidação (a liquidação em sentido amplo), ainda que o acto de liquidação (a liquidação em sentido estrito) tenha sido praticado dentro desse prazo. Como tal, não vislumbramos obstáculo a que essa ilegalidade seja invocada em impugnação judicial, que é o meio próprio para a invocação de todas as ilegalidades do acto (cf. art. 99.º do CPPT), designadamente a preterição de formalidades legais ocorridas no procedimento de liquidação.
Sempre salvo o devido respeito, do disposto na alínea e) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT não pode extrair-se o argumento a contrario sensu que dele extraiu a Recorrente. Vejamos:
Desde logo, em sede de hermenêutica jurídica, como adverte BAPTISTA MACHADO, o argumento a contrario, «deve ser usado com muita prudência» (Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, 1983, págs. 187/188.).
Na verdade, a consagração na referida alínea e) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT como fundamento de oposição à execução fiscal da «[f]alta de notificação da liquidação do tributo no prazo da caducidade» não permite deduzir a conclusão de que esse fundamento é exclusivo da oposição e de que não pode ser invocado em sede de impugnação judicial. Só assim não seria se essa norma incorporasse de algum modo um elemento de taxatividade - designadamente expresso pela afirmação de que a falta de notificação da liquidação do tributo no prazo da caducidade ou apenas poderia ser fundamento de oposição à execução fiscal - que permitisse dela deduzir uma norma de sentido oposto como regime-regra, ou seja, que esse fundamento não poderia ser invocado em qualquer outro meio processual, o que não sucede.
A nosso ver, o que a alínea e) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT veio salientar foi que nas situações em que não se demonstrou a existência de notificação ocorrida dentro do prazo da caducidade, o contribuinte pode reagir contra essa liquidação, não só mediante impugnação judicial, mas também em sede de oposição à execução fiscal.
Ou seja, o legislador, em face de alguma jurisprudência que não permitia que, nos casos em que a notificação da liquidação ocorreu para além do termo do prazo da caducidade, o executado usasse a oposição à execução fiscal para reagir - por considerar que o único modo de reacção era a impugnação judicial, uma vez que estava em causa a legalidade da liquidação, atento o disposto no art. 45.º, n.º 1, da LGT [e, anteriormente, o art. 33.º do Código de Processo Tributário (CPT)] - veio, esclarecendo essas situações, consagrar mais uma possibilidade (relativamente às já existentes no CPT) excepcional de em sede de oposição à execução fiscal se discutir a legalidade concreta da liquidação da dívida exequenda, tal como acontecia já com os fundamentos hoje previstos nas alíneas a), g) e h) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT [e, antes, nas alíneas a), f) e g) do art. 286.º CPT].
Como também bem salientou o já citado acórdão de Supremo Tribunal, o art. 1.º do CPPT, reconhecendo a supremacia da LGT, nunca consentiria a interpretação de que a alínea e) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT revogou o n.º 1 do art. 45.º da LGT, na parte em que este atribui à falta de notificação tempestiva efeito invalidante.
Concluindo, podemos dizer que a falta de notificação da liquidação dentro do prazo da caducidade do direito à liquidação constitui, por força da lei (art. 45.º, n.º 1, da LGT), ilegalidade invalidante do acto de liquidação (cf. art. 99.º do CPPT), susceptível de constituir não só fundamente de impugnação judicial, mas também fundamento de oposição à execução fiscal, por expressa previsão legal na alínea e) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT (Neste sentido, se bem o interpretamos, JORGE LOPES DE SOUSA, ob. e vol. cit., nota 34 b) ao art. 204.º, págs. 488/489.) …”.

Assim, é claro que a falta de notificação da liquidação dentro do prazo da caducidade do direito à liquidação constitui fundamento de oposição à execução fiscal, por expressa previsão legal do art. 204º nº 1 alínea e) do CPPT, o que retira qualquer virtualidade ao exposto, em termos essenciais, pela Recorrente, além de que está em causa mais uma possibilidade excepcional de em sede de oposição à execução fiscal se discutir a legalidade concreta da liquidação da dívida exequenda, tal como acontecia já com os fundamentos hoje previstos nas alíneas a), g) e h) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT, o que afasta também a bondade do exposto pela Recorrente relativamente a uma interpretação inconstitucional do art. 204º do CPPT, pois que, nas condições descritas, não existe qualquer hipótese de se verificar uma situação como a descrita pela Recorrente, visto que a decisão proferida na presente oposição terá de ser considerada no âmbito da impugnação, por traduzir a discussão sobre a legalidade concreta da liquidação da dívida exequenda no domínio em apreço, o que significa a decisão recorrida não merece qualquer censura, situação que tem um verdadeiro efeito de implosão no que concerne ao presente recurso.


4. DECISÃO

Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em negar provimento ao recurso jurisdicional interposto pela Recorrente, mantendo-se a decisão judicial recorrida.

Custas pela Recorrente.

Notifique-se. D.N..




Lisboa, 13 de Julho de 2021

Pedro Vergueiro (Relator)

O Relator consigna e atesta que, nos termos do disposto no art.º 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13 de março, aditado pelo art.º 3.º do DL n.º 20/2020, de 01 de maio, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes Srs. Conselheiros integrantes da Formação de Julgamento - os Senhores Conselheiros Aragão Seia e Nuno Bastos

Pedro Nuno Pinto Vergueiro