Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:03229/15.3BEBRG
Data do Acordão:06/17/2020
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ANÍBAL FERRAZ
Descritores:AUTOLIQUIDAÇÃO
RECLAMAÇÃO GRACIOSA
PRAZO
Sumário:I - Nas situações de impugnação (judicial) em casos de autoliquidação, desde 1 de janeiro de 2015 (e, já, antes), o interessado, mesmo na hipótese (específica) positivada no art. 131.º n.º 3 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), pode, se quiser, reclamar graciosamente, no prazo de 2 anos (em vez do de 120 dias, previsto no art. 70.º n.º 1 do CPPT), após (a data) apresentação da declaração de autoliquidação a visar, com a cobertura do disposto no n.º 1 do citado art. 131.º.
II - Outrossim, decidida a reclamação graciosa ou que sobre a mesma se tenha formado presunção de indeferimento tácito, ao contribuinte assiste o direito/possibilidade de impugnar, judicialmente, no prazo de três meses, nos termos do art. 102.º n.º 1 alíneas e) e d) do CPPT, respetivamente.
Nº Convencional:JSTA000P26077
Nº do Documento:SA22020061703229/15
Data de Entrada:09/23/2019
Recorrente:A....... LDA. (.......).
Recorrido 1:DIRECÇÃO GERAL DE ALIMENTAÇÃO E VETERINÁRIA.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral:
***

Acórdão proferido no Supremo Tribunal Administrativo (STA), com sede em Lisboa;

# I.


A…………, Lda. (………..), com os demais sinais dos autos, recorre da sentença proferida, no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Braga, em 26 de abril de 2019, que, nesta impugnação judicial, dirigida contra atos de autoliquidação de “taxas para financiamento do Sistema de Recolha de Cadáveres de Animais Mortos nas Explorações” (vulgo, taxas SIRCA), referentes ao período compreendido entre março de 2013 e março de 2015, julgou verificada a exceção de caducidade do direito de ação e absolveu a Direção Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV) dos pedidos.
A recorrente (rte) apresentou alegação, finalizada com as seguintes conclusões: «

1) Não corresponde à verdade que a reclamação graciosa e subsequente impugnação judicial se fundem exclusivamente na invocação de uma inconstitucionalidade orgânica:

A) Desde logo, quer a referida reclamação graciosa, quer a presente impugnação judicial, não se baseiam exclusivamente na inconstitucionalidade do diploma regulador da referida taxa SIRCA, mas também no vício de violação de lei, mais concretamente na violação do disposto no art. 4°/2 da LGT. Consequentemente, a tese de que a DGAV, em sede de revisão oficiosa, não podia anular os actos de autoliquidação das taxas SIRCA por estar sujeita ao princípio da legalidade, não faz qualquer sentido... Não só podia apreciar o argumento da inconstitucionalidade, como podia e devia fazê-lo relativamente ao invocado (e confirmado) vício de violação de lei do art. 4°/2 da LGT, situação que expressa e propositadamente ignorou... Daí que não faça qualquer sentido invocar no presente caso a jurisprudência do AC. STJ de 12/10/2011 pelo que o mesmo só se refere a situações em que o contribuinte invoque EXCLUSIVAMENTE a questão da inconstitucionalidade da norma ou diploma, o que manifestamente não sucede aqui. Aliás, se dúvidas houvessem as mesmas dissipar-se-iam lendo o art. 1° da p.i., no qual a Impugnante expressamente identifica os fundamentos da impugnação, sendo fácil perceber que a presente impugnação não se baseia EXCLUSIVAMENTE em questão de inconstitucionalidade.

B) Acresce que tem sido entendimento unânime (ou pelo menos maioritário) do STA, que a Taxa SIRCA é ilegal por violação do princípio da igualdade, na sua dimensão de equivalência (artigo 13.° da Constituição) e não apenas em virtude de uma violação da reserva de lei formal da Assembleia da República, nos termos do disposto nos arts. 103°, n.° 2 e 165°, n.° 1 alínea i) da CRP.

C) Face ao exposto, temos de concluir que não corresponde à verdade que a reclamação graciosa e subsequente impugnação judicial se fundem exclusivamente na invocação de uma inconstitucionalidade orgânica, pois a mesma também se funda no vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de direito, porquanto as autoliquidações supra mencionadas violam o art. 4°/2 da LGT, e ainda no vício de violação de lei derivado da violação do princípio da igualdade, na sua dimensão de equivalência (artigo 13.° da Constituição)

D) A sentença recorrida parte assim do princípio falso que a Recorrente apenas invocou uma inconstitucionalidade orgânica, recusando-se aparentemente a pronunciar quer sobre a questão do vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de direito, porquanto as autoliquidações supra mencionadas violam o art. 4°/2 da LGT, quer sobre o vício de violação de lei derivado da violação do princípio da igualdade, na sua dimensão de equivalência (artigo 13º da Constituição), tendo em conta que a taxa “SIRCA” tal como configurada pelo Decreto-Lei n.° 19/2011, de 7 de Fevereiro, na medida em que configura o “estabelecimento de abate” como contribuinte directo de tal tributo, quando o presumível beneficiário do serviço que esta se destina a financiar é, não ele, mas o titular da exploração.

E) No entanto, a posição do Tribunal “a quo” é contraditória e sem sentido, pois, por um lado, parte do princípio falso que a Recorrente apenas invocou o vício de inconstitucionalidade orgânica, o que não corresponde à verdade e, no seguimento desse entendimento, julgar procedente a excepção de caducidade do direito de ação, abstendo-se assim de se pronunciar sobre as restantes questões levantadas: quer o vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de direito, porquanto as autoliquidações supra mencionadas violam o art. 4°/2 da LGT, quer sobre o vício de violação de lei derivado da violação do princípio da igualdade, na sua dimensão de equivalência (artigo 13.° da Constituição); Mas para fazer isso teve de concluir na sua argumentação (embora sem decidir a questão), que aquilo que argumentou, em sede de pedido de revisão, foi que o Decreto-Lei n° 19/2011 viola o artigo 4°, n.° 2 da LGT o que, a ser verdade, implicaria que um acto normativo estivesse a violar outro de igual valor, o que não poderia suceder.

F) Ou seja, o tribunal “a quo” julgou procedente a excepção de caducidade do direito de ação, mas para o fazer teve de decidir “camufladamente” a questão do vício de violação de lei, por violação do art. 4°/2 da LGT.

G) Isso comprova que a decisão não faz sentido. Tendo em conta que não corresponde à verdade que a reclamação graciosa e subsequente impugnação judicial se fundem exclusivamente na invocação de uma inconstitucionalidade orgânica a sentença recorrida merece censura.

2) Relativamente à questão de mesmo nos casos previstos no n.° 3 do art. 131°, em que não há lugar a reclamação necessária, pode ainda assim ser apresentada reclamação graciosa facultativa:

H) Mesmo que assim não fosse, teríamos de entender como faz Jorge Lopes de Sousa (in Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, de Jorge Lopes de Sousa, 6ª edição, 2011, Volume II, anotação 3/b) ao art. 131° CPPT, pág 408 e 409), que, ao contrário do que decidiu a douta sentença recorrida, “Nos casos previstos no n.° 3 do art. 131°, em que não há lugar a reclamação necessária, pode ser apresentada reclamação graciosa, nos termos do n° 1, pois, se assim, não fosse, o contribuinte que desconhecesse a existência de orientações genéricas da Administração Tributária, que não é obrigado a conhecer, poderia perder o direito de impugnação contenciosa, por não a apresentar no prazo de 90 dias que resulta no n.° 3, o que é incompaginável com o direito à tutela judicial efetiva, constitucionalmente garantido (arts. 20°, n.° 1 e 268°, n.° 4 da CRP).

I) A aplicação do prazo de 90 dias à impugnação judicial directa da autoliquidação, em vez do prazo de 2 anos previsto para a reclamação graciosa, só se poderá compreender tendo subjacente um entendimento legislativo no sentido de que, nos casos de divergência apenas de direito em que o contribuinte seguiu instruções genéricas da administração tributária, se justifica a aplicação do regime normal de impugnação de actos de liquidação e não o regime especial previsto neste art. 131°. E, a ser assim, congruentemente com esse entendimento legislativo no sentido de aplicação do regime normal de impugnação Judicial, a reclamação graciosa deveria ser admitida nos termos gerais previstos no art. 70° do CPPT. Na verdade, apesar da incongruência que existe no estabelecimento de prazos distintos de impugnação judicial e reclamação graciosa, a interpretar-se o n° 3 do art. 131° como manifestação de uma opção legislativa no sentido da aplicação do “regime normal” de impugnação nos casos em que estiver em causa apenas matéria do direito e o contribuinte tenha seguido orientações genéricas da administração tributária, seria corolário dessa opção pelo afastamento do regime especial impugnação de actos de liquidação que a reclamação graciosa também se fizesse nos termos normais previstos nos arts. 69° e seguintes do CPTT.

J) No entanto, esta interpretação lógica no sentido de que, quando estiver em causa apenas matéria de direito e o contribuinte tenha seguido orientações genéricas da administração tributária, os prazos de impugnação judicial e de reclamação graciosa seriam os normais, previstos nos arts. 70° e 102°, é inconciliável com a indicação feita na parte inicial do n° 3 deste art. 131° de que o que aí se estabelece é “sem prejuízo do disposto nos números anteriores”, o que se traduz na possibilidade de reclamação graciosa no prazo de dois anos. Aliás, não se justificaria adoptar um prazo curto para a reclamação graciosa com base em fundamentos de direito e um prazo mais longo para a reclamação graciosa que inclui no seu objecto matéria de facto, cumulada ou não com matéria de direito, pois, o contribuinte facilmente poderia beneficiar deste prazo mais longo, mesmo que a sua discordância real assentasse apenas em direito, bastando para isso “inventar” discordância com qualquer matéria de facto para juntar ao seu fundamento de direito, o que, naturalmente, não representaria dificuldade apreciável…

K) Por outro lado, se não há razões de segurança jurídica que, nestes casos de autoliquidação em que está em causa matéria de direito e se seguiram orientações genéricas da administração tributária, exijam uma restrição de 90 dias do prazo de impugnação judicial, a imposição desnecessária da perda do direito de impugnação contenciosa directa é incompaginável com os princípios constitucionais da necessidade e proporcionalidade (art. 18°, n.° 2 da CRP).

L) Ainda por outro lado, não se pode encontrar qualquer justificação razoável para que, decorrido o prazo de 90 dias, se vá impor ao contribuinte a apresentação de uma reclamação graciosa para recuperar a possibilidade de impugnação judicial, quando a previsão da possibilidade de impugnação contenciosa directa prevista no n.° 3 só se pode justificar porque, nesses casos, na perspectiva legislativa, ela se considera desnecessária.

M) Face ao exposto, sempre teríamos de entender que, como defende Jorge Lopes de Sousa (in Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, de Jorge Lopes de Sousa, 6ª edição, 2011, Volume II, anotação 3/b) ao art. 131° CPPT, pág 408 e 409), nos casos previstos no n.° 3 do art. 131°, em que não há lugar a reclamação necessária, pode sempre ser apresentada reclamação graciosa facultativa, nos termos do n° 1. Aliás, se assim não fosse, tal teria de constar expressamente no texto da lei o que não ocorre.

N) O n° 3 do art, 131°, permitindo a via da impugnação judicial directa, apenas se justifica para evitar que, nesses casos, o contribuinte tenha a obrigação de deduzir previamente reclamação graciosa, podendo recorrer imediatamente à impugnação judicial. Mas trata-se apenas de uma mera possibilidade/opção. Não estando assim o contribuinte impossibilitado de recorrer previamente à reclamação graciosa e só posteriormente (após o seu indeferimento) à impugnação judicial, como sucedeu no presente caso,

O) Deste modo, ao contrário do que decidiu a douta sentença recorrida, não caducou o direito de impugnação judicial.

3) Relativamente à contagem do prazo de 3 meses para deduzir a impugnação judicial:

P) De qualquer modo e mesmo que assim não fosse, o prazo de 3 meses só poderia começar a contar a partir da notificação do acto de indeferimento da respectiva reclamação graciosa e não da sua autoliquidação por parte do contribuinte, pois, nas situações de autoliquidação, a Administração não tem a oportunidade de se pronunciar directamente sobre as mesmas, sendo necessário provocar uma sua tomada de posição expressa, nomeadamente mediante reclamação graciosa ou pedido de revisão oficiosa.

Q) Logo o acto impugnável será sempre o acto de indeferimento (expresso ou tácito) da reclamação graciosa e não a autoliquidação, pelo que o prazo de 3 meses só se poderia contar a partir da notificação ou da sua presunção daquele acto de indeferimento. A autoliquidação não é, em princípio, imediata e directamente impugnável, só o podendo ser em determinados casos excepcionais.

R) Ora, o acto de indeferimento tácito da reclamação graciosa (que constitui o acto aqui impugnado) apenas ocorreu 4 meses após 22/03/2016 (data em que a DGAV recebeu a reclamação graciosa), pelo que o prazo de 3 meses para impugnar só se poderia começar a contar a partir dessa data (21/07/2016). Nesse sentido, a presente impugnação judicial sempre teria de se considerar tempestiva.

S) Deste modo, ao contrário do que defende a sentença recorrida, no presente caso, o prazo de impugnação judicial não se conta nos termos da al. a), do n.° 1 do art. 102° do CPPT, até porque, sendo autoliquidadas, a administração não notificou a contribuinte para qualquer pagamento de tributo (taxas SIRCA), as mesmas foram liquidadas pelo próprio contribuinte, sem intervenção da administração. Mas antes nos termos da al. d), do n.° 1 do art. 102° do CPPT, “Formação da presunção de indeferimento tácito da reclamação graciosa atempadamente deduzida pelo contribuinte,”, pelo que, ao contrário do que refere a dita sentença, a Impugnante pode, em sede de impugnação judicial, requerer a restituição das taxas pagas nos últimos 2 anos nos termos previstos no art. 131°/1 CPPT, sendo a presente impugnação tempestiva, não subsistindo qualquer caducidade do direito de ação.

4) Da interpretação do art. 131°/3 do CPPT:

T) De qualquer modo, como defende Jorge Lopes de Sousa (in Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, de Jorge Lopes de Sousa, 6ª edição, 2011, Volume II, anotação 3/b) ao art. 131° CPPT, pág 409) “De qualquer forma, na linha jurisprudencial que o STA tem vindo a adoptar em situações semelhantes em que há incontornáveis contradições na previsão de prazos de impugnação contenciosa e administrativa, nos casos em que há suporte textual na lei para os contribuintes formarem expectativas sobre a possibilidade de impugnação em prazo alargado, nunca deverá resolver-se a contradição no sentido de uma interpretação restritiva da norma que prevê o prazo alargado, pois uma interpretação desse tipo, que se reconduzisse à aplicação de um prazo mais curto do que o que resulta do texto da lei, poderia ofender o direito de impugnação contenciosa de atos lesivos, constitucionalmente garantido, que supõe que a via de acesso à impugnação contenciosa seja clara e não labiríntica, o que é reclamado com mais veemência quando estão em causa meios processuais que podem ser accionados pelo próprio contribuinte, sem representação por advogado (art. 6°, n° 1 do CPPT).”

U) Consequentemente, uma vez que existe suporte textual na lei para os contribuintes formarem expectativas sobre a possibilidade de impugnação em prazo alargado, sempre teria interpretar-se o art. 131°/3 CPPT no sentido de permitir aos contribuintes recorrer à reclamação graciosa de modo facultativo, tal como ocorreu no presente caso, não existindo qualquer caducidade do direito de ação.

5) Da ofensa ao direito à tutela efectiva, constitucionalmente garantido, violando o disposto nos arts. 20°, n.° 1 e 268°, n.° 4 CRP, bem como da ofensa aos princípios constitucionais da necessidade e proporcionalidade, violando o art. 18°, n.° 2 da CRP:

V) Face ao exposto supra (que aqui se dá integralmente reproduzido para evitar repetições desnecessárias), sempre a posição defendida pela sentença recorrida (de considerar que o contribuinte nestes casos estava impedido de recorrer à reclamação graciosa, estando antes obrigado a impugnar judicialmente no prazo de 3 meses após cada uma das autoliquidações) é manifestamente inconstitucional por ofender o direito à tutela efectiva, constitucionalmente garantido, violando o disposto nos arts. 20°, n.° 1 e 268°, n° 4 CRP, inconstitucionalidade essa que, desde já, se invoca em sua defesa. Com efeito, a restrição das possibilidades de reclamação graciosa aos casos em que a mesma é obrigatória reconduzia-se a que as possibilidades de revisão nos casos de autoliquidação fossem injustificadamente muito menores do que as que existem em relação à generalidade dos actos de liquidação.

W) For outro lado, a imposição ao contribuinte o ónus de autoliquidar tributos, reconduz-se a impor-lhe a prática de uma atividade que exige conhecimentos de direito que aquele pode não ter, pelo que seria incompreensível, abusivo, injustificado impedir o acesso do mesmo à possibilidade de reclamação graciosa como forma de reação a autoliquidações ilegais e injustificadas como é o caso destas autoliquidações de taxas SIRCA aqui postas em crise, ofendendo flagrantemente o direito à tutela efectiva, constitucionalmente garantido, violando o disposto nos arts. 20°, n° 1 e 268°, n.° 4 CRP.

X) Acresce que se não há razões de segurança jurídica que, nestes casos de autoliquidação em que está em causa matéria de direito e se seguiram orientações genéricas da administração tributária, exijam uma restrição de 90 dias do prazo de impugnação judicial, a imposição desnecessária da perda do direito de impugnação contenciosa directa é incompaginável com os princípios constitucionais da necessidade e proporcionalidade (art. 18°, n.° 2 da CRP).

Y) Consequentemente a interpretação do art. 131°/3 do CPPT no sentido de fixar unicamente um prazo de impugnação judicial de 3 meses após a autoliquidação, impedindo o acesso a reclamação graciosa facultativa é inconstitucional. Deste modo, ao contrário do que refere a dita sentença, a Impugnante pode, em sede de impugnação judicial, requerer a restituição das taxas pagas nos últimos 2 anos nos termos previstos no art. 131° do CPPT, mediante o recurso à reclamação graciosa, pelo que a presente impugnação é tempestiva, não subsistindo qualquer caducidade do direito de ação.

6) Da procedência da presente impugnação judicial:

Z) Por outro lado, a jurisprudência unânime do STA, salientando a título de exemplo o douto Acórdão STA de 03/05/2017 (com texto integral em www.dgsi.pt, Processo n.° 0914/16, Relator Isabel Marques da Silva), tem decidido no sentido de considerar que “(…) É inconstitucional, por violação do princípio da igualdade, na sua dimensão de equivalência (artigo 13.° da Constituição), a taxa “SIRCA” tal como configurada pelo Decreto-Lei n.º 19/2011, de 7 de Fevereiro, na medida em que configura o “estabelecimento de abate” como contribuinte directo de tal tributo, quando o presumível beneficiário do serviço que esta se destina a financiar é, não ele, mas o titular da exploração. (…)”, pelo que a presente impugnação judicial devia ser julgada totalmente procedente e as autoliquidações aqui impugnadas anuladas, com as consequências legais.

AA) Ou seja, o Estado cobrou uma taxa pelo serviço de recolha de cadáveres de animais mortos nas explorações (Taxa SIRCA), não ao beneficiário do mesmo (titular da exploração), mas sim a um terceiro que em nada beneficia do mesmo (estabelecimento de abate, como é o caso da recorrente). Obviamente que erro flagrante tem de ser imputável aos serviços do Estado.

BB) Importa salientar que a inconstitucionalidade de uma norma é o mais profundo erro sobre os pressupostos de direito que pode afectar um acto de liquidação, por ser uma afronta à norma primária de legislação que encima o nosso ordenamento jurídico. Esse erro será tanto mais gravoso e prejudicial quando essa inconstitucionalidade resulta da violação de um princípio tão básico como é o princípio da igualdade (art. 13° da Constituição).

CC) Como refere Jorge Lopes de Sousa (in CPPT anotado e comentado, 6ª edição, 2011, vol. II, anotação 10 ao art. 131° do CPPT, pág. 412) “(...) Por este n° 2, conclui-se que A REVISÃO DE ACTO TRIBUTÁRIO É POSSÍVEL EM REVISÃO A TODOS OS ACTOS DE AUTOLIQUIDAÇÃO, uma vez que se ficciona, para efeitos do n.º 1 daquele art. 78° que o erro é sempre imputável aos serviços e, com este fundamento, a revisão é admitida dentro do prazo de 4 anos após a liquidação ou a todo o tempo se o tributo não estiver pago. Esta imputabilidade dos erros da autoliquidação aos serviços é uma ficção que está em manifesta dissonância com a realidade, pois, sendo o contribuinte quem faz a autoliquidação, o que é normal é que os erros sejam imputáveis a ele próprio, que a fez, e não à administração tributária, que não a faz… Por outro lado, a imposição ao contribuinte o ónus de autoliquidar tributos coloca-o numa situação em que é obrigado a levar a cabo uma actividade que exige, em maior ou menor medida, conhecimentos de direito tributário, que aquele pode não ter, pelo que é uma contrapartida razoável dessa imposição admitir EM TODOS OS CASOS a possibilidade de correcção de eventuais erros que prejudiquem o contribuinte, dentro do condicionalismo temporal previsto no n.° 1 do art. 78°. (…)” (in CPPT anotado e comentado, 6ª edição, 2011, vol. II anotação 10 ao art. 131° do CPPT, pág. 412 e 414)

DD) Deste modo, como defende Jorge Lopes de Sousa a possibilidade de correcção de eventuais erros que prejudiquem o contribuinte, mediante o recurso ao pedido de revisão ou à reclamação graciosa, dentro dos condicionalismos temporais legalmente previstos, existe EM TODOS OS CASOS de autoliquidação. Consequentemente, o entendimento seguido pela sentença recorrida, considerando que a Impugnante/Recorrente não podia recorrer a reclamação graciosa no prazo de 2 anos após a autoliquidação, mas apenas à impugnação judicial no prazo de 3 meses após essa autoliquidação, é manifestamente ilegal, abusivo, excessivo e ilegal, pelo que merece censura.

EE) Aliás, em relação à invocação da inconstitucionalidade na reclamação graciosa, e concretamente quanto à interpretação do conceito de «erro imputável aos serviços», como fundamento do pedido de revisão do acto tributário, a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo tem entendido que, havendo erro de direito na liquidação, por aplicação de normas nacionais que violem o direito comunitário ou constitucional é à administração tributária que é imputável esse erro.

FF) Nesse sentido conferir o Acórdão STA de 12/12/2001, processo 026487, segundo o qual «não há que fazer qualquer tipo de distinção entre as razões que levaram a tal erro. Não há assim que curar de saber se estamos perante um erro em sentido estrito, resultante de uma deficiência técnica dos próprios serviços de liquidação, ou, pelo contrário, se estamos perante um erro em sentido lato, resultante de vício de violação de lei, sendo que então a liquidação está correcta de acordo com a lei, mas esta sofre, por exemplo, do vício de inconstitucionalidade, ou do vício de violação de lei comunitária». (realce e sublinhado nosso).

GG) Consequentemente, tratando-se de um erro imputável aos serviços, parece-nos evidente que a Impugnante/Recorrente poderia recorrer, como fez, à reclamação graciosa das autoliquidações de taxa SIRCA referentes ao período temporal de 2 anos previsto no art. 131º/1 do CPPT.

TERMOS em que deve o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, a sentença recorrida ser substituída por outra que, julgando improcedente a excepção de caducidade do direito de ação, julgue procedentes os pedidos formulados na sua p.i, pela Impugnante/Recorrente, tudo com as consequências legais, assim se fazendo a devida


JUSTIÇA.»

*


A DGAV, na condição de recorrida (rda), apresentou contra-alegação, que termina concluindo: «

1)

A sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga (TAF Braga) julgou procedente a exceção peremptória de caducidade do direito de ação, absolvendo, em consequência a recorrida/DGAV dos pedidos.

2)

Em síntese, o TAF Braga entendeu, tal como defendido pela recorrida, que a questão em causa se prende exclusivamente com a alegada inconstitucionalidade do Decreto-Lei n.º 19/2011, de 7 de fevereiro.

3)

A recorrente pretende fazer crer que não é verdade que a reclamação graciosa e subsequente impugnação judicial se fundem exclusivamente na inconstitucionalidade do Decreto-Lei n.º 19/2011, de 7 de fevereiro, quando é evidente que o fundamento da reclamação graciosa (bem como da impugnação judicial) baseia-se numa questão de direito: determinar se a «taxa SIRCA» constitui um imposto ou uma taxa.

4)

A sentença recorrida considerou, e bem, que toda a argumentação subjacente à reclamação graciosa esteve relacionada com a questão da inconstitucionalidade do referido diploma.

5)

E, assim sendo, a prévia apresentação da reclamação graciosa seria (é) inútil, uma vez que o seu fundamento consiste, exclusivamente, na inconstitucionalidade orgânica do Decreto-Lei n.º 19/2011, de 7 de Fevereiro, designadamente, o n.º 1 do artigo 2.º, pelo que a Administração (no caso, a impugnada) apenas o poderia deixar de aplicar após declaração de ilegalidade com força obrigatória geral, na medida em que está vinculada ao princípio da legalidade.

6)

Estando em causa a inconstitucionalidade do n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 19/2011, de 7 de Fevereiro, a eventual intervenção da impugnada (era) é inútil, uma vez que esta não pode deixar de aplicar uma norma com base na sua inconstitucionalidade.

7)

Este é o entendimento que tem sido decidido, por diversas vezes, pelo Supremo Tribunal Administrativo, tal como defendido na sentença recorrida, pelo que os acórdãos ali invocados têm plena aplicação ao caso vertente.

8)

E, por isso, o TAF Braga reconheceu, e bem, que o prazo para apresentar a impugnação judicial já se encontrava há muito decorrido, como defendeu, e continua a defender, a recorrida.

9)

Tal como referido na sentença recorrida e passamos a citar «(...) O Supremo Tribunal Administrativo, de forma reiterada, decidiu que a liquidação de um tributo ao abrigo de uma norma inconstitucional não se mostra ferida de nulidade, mas antes de anulabilidade (…)».

10)

E não sendo nulo, a impugnação judicial só podia ser deduzida no prazo de 3 meses, tal como previsto no n.º 1 do artigo 102.º do CPPT, contados da data da apresentação da declaração em que é feita a autoliquidação.

11)

No caso em apreço, as autoliquidações foram efetuadas no período compreendido entre março de 2013 a março de 2015, tendo a petição inicial da presente ação sido remetida ao TAF Braga no dia 14.10.2015, ou seja, ultrapassado o prazo de 3 meses.

12)

E em consequência, o TAF Braga julgou que a impugnação judicial não foi tempestivamente apresentada, julgando, por isso, procedente a exceção peremptória de caducidade do direito de ação, absolvendo, consequentemente, a recorrida, dos pedidos, pelo que nada há a assacar ao que foi proferido na sentença.

13)

Tal como resulta da sentença recorrida, o meio processual próprio para a discussão da legalidade do ato de liquidação tributária é a impugnação judicial, e não a reclamação graciosa, nos termos do n.º 3 do artigo 131.º do CPPT.

14)

Pois, ao contrário do que o recorrente afirma, as autoliquidações em causa não tinham de ser precedidas de prévia reclamação como condição da sua impugnabilidade.

CONCLUSÃO

15)


A recorrida vem, com a devida vénia, aderir à motivação explanada na sentença proferida pelo TAF Braga, por concordar com os seus fundamentos, que aqui se dão como integralmente reproduzidos.

Nestes termos, nos melhores de direito e com o sempre mui douto suprimento de V.Exa, deverá o presente recurso ser julgado improcedente e, consequentemente, manter-se a sentença proferida, como é de,


JUSTIÇA!»

*


O Exmo. magistrado do Ministério Público emitiu parecer, concluindo que se impõe a revogação da sentença recorrida.

*

Cumpridas as formalidades legais, compete conhecer e decidir.

*******

# II.


Na sentença, em sede de julgamento factual, expressou-se: «

A) A 30/05/2013, a Impugnante emitiu declaração mensal da taxa SIRCA, relativa ao mês de março, do ano de 2013, constando da mesma que, no período a que a declaração se refere, foi apurado o valor a pagar de € 3.668,20 – cfr. documento junto a fls. 90 dos autos, aqui reproduzidas;

B) Na mesma data, através do cheque n.º 8705949867, do ……., a Impugnante procedeu ao pagamento do montante referido na alínea anterior – cfr. documento junto a fls. 91 dos autos, aqui reproduzidas;

C) A 28/06/2013, a Impugnante emitiu declaração mensal da taxa SIRCA, relativa ao mês de abril, do ano de 2013, constando da mesma que, no período a que a declaração se refere, foi apurado o valor a pagar de € 2.039,75 – cfr. documento junto a fls. 89 dos autos, aqui reproduzidas;

D) Na mesma data, através do cheque n.º 6225627195, do …, a Impugnante procedeu ao pagamento do montante referido na alínea anterior – cfr. documento junto a fls. 89 dos autos e 4 do PA., aqui reproduzidas;

E) A 29/07/2013, a Impugnante emitiu declaração mensal da taxa SIRCA, relativa ao mês de maio, do ano de 2013, constando da mesma que, no período a que a declaração se refere, foi apurado o valor a pagar de € 2.311,90 – cfr. documento junto a fls. 88 dos autos, aqui reproduzidas;

F) Na mesma data, através do cheque n.º 4525627240, do ……, a Impugnante procedeu ao pagamento do montante referido na alínea anterior – cfr. documento junto a fls. 88 dos autos;

G) A 28/08/2013, a Impugnante emitiu declaração mensal da taxa SIRCA, relativa ao mês de junho, do ano de 2013, constando da mesma que, no período a que a declaração se refere, foi apurado o valor a pagar de € 2.319,84 – cfr. documento junto a fls. 87 dos autos, aqui reproduzidas;

H) Na mesma data, através do cheque n.º 5325627293, do ……., a Impugnante procedeu ao pagamento do montante referido na alínea anterior – cfr. documento junto a fls. 87 dos autos;

I) A 26/09/2013, a Impugnante emitiu declaração mensal da taxa SIRCA, relativa ao mês de Julho, do ano de 2013, constando da mesma que, no período a que a declaração se refere, foi apurado o valor a pagar de € 2.273,57 – cfr. documento junto a fls. 86 dos autos, aqui reproduzidas;

J) Na mesma data, através do cheque n.º 3027907453, do ……., a Impugnante procedeu ao pagamento do montante referido na alínea anterior – cfr. documento junto a fls. 86 dos autos;

K) A 28/10/2013, a Impugnante emitiu declaração mensal da taxa SIRCA, relativa ao mês de agosto, do ano de 2013, constando da mesma que, no período a que a declaração se refere, foi apurado o valor a pagar de € 1.866,95 – cfr. documento junto a fls. 85 dos autos, aqui reproduzidas;

L) Na mesma data, através do cheque n.º 8127907512, do ……., a Impugnante procedeu ao pagamento do montante referido na alínea anterior – cfr. documento junto a fls. 85 dos autos;

M) A 27/11/2013, a Impugnante emitiu declaração mensal da taxa SIRCA, relativa ao mês de setembro, do ano de 2013, constando da mesma que, no período a que a declaração se refere, foi apurado o valor a pagar de € 1.821,76 – cfr. documento junto a fls. 83 dos autos, aqui reproduzidas;

N) Na mesma data, através do cheque n.º 392790549, do ……, a Impugnante procedeu ao pagamento do montante referido na alínea anterior – cfr. documento junto a fls. 84 dos autos, aqui reproduzidas;

O) A 23/12/2013, a Impugnante emitiu declaração mensal da taxa SIRCA, relativa ao mês de outubro, do ano de 2013, constando da mesma que, no período a que a declaração se refere, foi apurado o valor a pagar de € 1.087,00 – cfr. documento junto a fls. 82 dos autos, aqui reproduzidas;

P) Na mesma data, através do cheque n.º 1527907584, do ……., a Impugnante procedeu ao pagamento do montante referido na alínea anterior – cfr. documento junto a fls. 82 dos autos;

Q) A 27/01/2014, a Impugnante emitiu declaração mensal da taxa SIRCA, relativa ao mês de novembro, do ano de 2013, constando da mesma que, no período a que a declaração se refere, foi apurado o valor a pagar de € 869,76 – cfr. documento junto a fls. 81 dos autos, aqui reproduzidas;

R) Na mesma data, através do cheque n.º 6829939685, do ……, a Impugnante procedeu ao pagamento do montante referido na alínea anterior – cfr. documento junto a fls. 81 dos autos;

S) A 21/02/2014, a Impugnante emitiu declaração mensal da taxa SIRCA, relativa ao mês de dezembro, do ano de 2013, constando da mesma que, no período a que a declaração se refere, foi apurado o valor a pagar de € 900,37 – cfr. documento junto a fls. 80 dos autos, aqui reproduzidas;

T) Na mesma data, através do cheque n.º 6429939707, do ……., a Impugnante procedeu ao pagamento do montante referido na alínea anterior – cfr. documento junto a fls. 20 e 21 do PA., aqui reproduzidas;

U) A 24/03/2014, a Impugnante emitiu declaração mensal da taxa SIRCA, relativa ao mês de janeiro, do ano de 2014, constando da mesma que, no período a que a declaração se refere, foi apurado o valor a pagar de € 322,24 – cfr. documento junto a fls. 79 dos autos, aqui reproduzidas;

V) Na mesma data, através do cheque n.º 8829939769, do ……., a Impugnante procedeu ao pagamento do montante referido na alínea anterior – cfr. documento junto a fls. 79 dos autos;

W) A 23/04/2014, a Impugnante emitiu declaração mensal da taxa SIRCA, relativa ao mês de Fevereiro, do ano de 2014, constando da mesma que, no período a que a declaração se refere, foi apurado o valor a pagar de € 405,67 – cfr. documento junto a fls. 78 dos autos, aqui reproduzidas;

X) Na mesma data, através do cheque n.º 0632128055, do ……, a Impugnante procedeu ao pagamento do montante referido na alínea anterior – cfr. documento junto a fls. 78 dos autos;

Y) A 26/05/2014, a Impugnante emitiu declaração mensal da taxa SIRCA, relativa ao mês de março, do ano de 2014, constando da mesma que, no período a que a declaração se refere, foi apurado o valor a pagar de € 566,90 – cfr. documento junto a fls. 77 dos autos, aqui reproduzidas;

Z) Na mesma data, através do cheque n.º 343218095, do ……, a Impugnante procedeu ao pagamento do montante referido no ponto anterior – cfr. documento junto a fls. 77 dos autos;

AA) A 24/06/2014, a Impugnante emitiu declaração mensal da taxa SIRCA, relativa ao mês de abril, do ano de 2014, constando da mesma que, no período a que a declaração se refere, foi apurado o valor a pagar de € 844,78 – cfr. documento junto a fls. 75 dos autos, aqui reproduzidas;

BB) Na mesma data, através do cheque n.º 6934291536, do ……., a Impugnante procedeu ao pagamento do montante referido na alínea anterior – cfr. documento junto a fls. 76 dos autos, aqui reproduzidas;

CC) A 28/07/2014, a Impugnante emitiu declaração mensal da taxa SIRCA, relativa ao mês de maio, do ano de 2014, constando da mesma que, no período a que a declaração se refere, foi apurado o valor a pagar de € 332,84 – cfr. documento junto a fls. 74 dos autos, aqui reproduzidas;

DD) Na mesma data, através do cheque n.º 5634291559, a Impugnante procedeu ao pagamento do montante referido na alínea anterior – cfr. documento junto a fls. 74 dos autos;

EE) A 27/08/2014, a Impugnante emitiu declaração mensal da taxa SIRCA, relativa ao mês de junho, do ano de 2014, constando da mesma que, no período a que a declaração se refere, foi apurado o valor a pagar de € 361,26 – cfr. documento junto a fls. 73 dos autos, aqui reproduzidas;

FF) Na mesma data, através do cheque n.º 1534291639, do ………., a Impugnante procedeu ao pagamento do montante referido no ponto anterior – cfr. documento junto a fls. 73 dos autos;

GG) A 30/09/2014, a Impugnante emitiu declaração mensal da taxa SIRCA, relativa ao mês de julho, do ano de 2014, constando da mesma que, no período a que a declaração se refere, foi apurado o valor a pagar de € 422,45 – cfr. documento junto a fls. 72 dos autos, aqui reproduzidas;

HH) Na mesma data, através do cheque n.º 8536411383, do ……., a Impugnante procedeu ao pagamento do montante mencionando no ponto antecedente – cfr. documentos juntos a fls. 72 dos autos;

II) A 23/10/2014, a Impugnante emitiu declaração mensal da taxa SIRCA, relativa ao mês de Agosto, do ano de 2014, constando da mesma que, no período a que a declaração se refere, foi apurado o valor a pagar de € 397,91 – cfr. documento junto a fls. 71 dos autos, aqui reproduzidas;

JJ) Na mesma data, através do cheque n.º 7036411417, do …….., a Impugnante procedeu ao pagamento do montante referido na alínea anterior – cfr. documento junto a fls. 71 dos autos;

KK) A 26/11/2014, a Impugnante emitiu declaração mensal da taxa SIRCA, relativa ao mês de setembro, do ano de 2014, constando da mesma que, no período a que a declaração se refere, foi apurado o valor a pagar de € 739,32 – cfr. documento junto a fls. 70 dos autos, aqui reproduzidas;

LL) Na mesma data, através do cheque n.º 2636411465, do ……., a Impugnante procedeu ao pagamento do montante referido no ponto anterior – cfr. documento junto a fls. 70 dos autos;

MM) A 26/12/2014, a Impugnante emitiu declaração mensal da taxa SIRCA, relativa ao mês de outubro, do ano de 2014, constando da mesma que, no período a que a declaração se refere, foi apurado o valor a pagar de € 484,50 – cfr. documento junto a fls. 69 dos autos, aqui reproduzidas;

NN) Na mesma data, através do cheque n.º 7436411492, do …….., a Impugnante procedeu ao pagamento do montante referido na alínea anterior – cfr. documento junto a fls. 69 dos autos;

OO) A 26/01/2015, a Impugnante emitiu declaração mensal da taxa SIRCA, relativa ao mês de novembro, do ano de 2014, constando da mesma que, no período a que a declaração se refere, foi apurado o valor a pagar de € 585,43 – cfr. documento junto a fls. 68 dos autos;

PP) Na mesma data, através do cheque n.º 6638452028, do ……., a Impugnante procedeu ao pagamento do montante referido no ponto anterior – cfr. documento junto a fls. 54 do Processo Administrativo (PA), aqui reproduzidas;

QQ) A 25/02/2015, a Impugnante emitiu declaração mensal da taxa SIRCA, relativa ao mês de dezembro, do ano de 2014, constando da mesma que, no período a que a declaração se refere, foi apurado o valor a pagar de € 2.190,46 – cfr. documento junto a fls. 67 dos autos, aqui reproduzidas;

RR) Na mesma data, através do cheque n.º 8538452069, do ……., a Impugnante procedeu ao pagamento do montante referido na alínea anterior – cfr. documento junto a fls. 67 dos autos;

SS) A 29/03/2015, a Impugnante emitiu declaração mensal da taxa SIRCA, relativa ao mês de janeiro, do ano de 2015, constando da mesma que, no período a que a declaração se refere, foi apurado o valor a pagar de € 1.126,90 – cfr. documento junto a fls. 65 dos autos, aqui reproduzidas;

TT) Na mesma data, através do cheque n.º 0338452132, do ……., a Impugnante procedeu ao pagamento do montante referido no ponto anterior – cfr. documento junto a fls. 66 dos autos;

UU) A 27/04/2015, a Impugnante emitiu declaração mensal da taxa SIRCA, relativa ao mês de fevereiro, do ano de 2015, constando da mesma que, no período a que a declaração se refere, foi apurado o valor a pagar de € 644,13 – cfr. documento junto a fls. 64 dos autos, aqui reproduzidas;

VV) Na mesma data, através do cheque n.º 153845216, do …….., a Impugnante procedeu ao pagamento do montante referido na alínea anterior – cfr. documento junto a fls. 64 dos autos;

WW) Em 27/05/2015, a Impugnante emitiu declaração mensal da taxa SIRCA, relativa ao mês de março, do ano de 2015, constando da mesma que, no período a que a declaração se refere, foi apurado o valor a pagar de € 1.566,44 – cfr. documento junto a fls. 63 dos autos, aqui reproduzidas;

XX) Na mesma data, através do cheque n.º 5240992050, do …….., a Impugnante procedeu ao pagamento do montante referido na alínea anterior – cfr. documento junto a fls. 63 dos autos;

YY) A 28/05/2015, a Impugnante apresentou Reclamação Graciosa dos actos de autoliquidação referidos nas alíneas precedentes, com fundamento em vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de direito, decorrente da violação do artigo 4.º, n.º 2, da LGT e da inconstitucionalidade do regime legal aprovado pelo Decreto-Lei n.º 19/2011, por violação da lei formal da Assembleia da República, nos termos do disposto nos artigos 103.º, n.º 2 e 165.º, n.º 1, alínea i), da CRP – cfr. documento junto a fls. 1 a 26 do PA, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

ZZ) A 19/06/2015, foi emitida, pela Direcção Geral de Alimentação e Veterinária, a “Informação n.º 85/GJ/2015”, com o teor que, de seguida, se transcreve:

“(…).

I. ENQUADRAMENTO

1. A……………., LDA (…), requereram, nos termos dos artigos 68.º e 131.º do CPPT, uma RECLAMAÇÃO GRACIOSA dos atos de liquidação das taxas SIRCA, pedindo a sua anulação, bem como a restituição dos montantes já pagos, acrescidos de juros, alegando, em síntese, vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de direito, porquanto aquelas autoliquidações:

- Violam o n.º 2 do artigo 4.º da LGT;

- Estão feridas de ilegalidade decorrente da inconstitucionalidade do regime legal aprovado pelo Decreto-Lei n.º 19/2011, de 7 de Fevereiro, por violação da reserva da lei formal da Assembleia da República, nos termos do disposto nos art.ºs 103.º n.º 2 e 165.º n.º 1 al. i) da CRP.

2. Por determinação de V. Ex.ª cabe a este Gabinete informar.

II. DO INDEFERIMENTO DAS RECLAMAÇÕES GRACIOSAS APRESENTADAS

3. O artigo 131.º do CPPT sob a epígrafe «Impugnação em caso de autoliquidação» estabelece o seguinte:

4. Do exposto resulta que a lei exige a reclamação graciosa prévia como forma de abrir a via contenciosa, a não ser que se verifiquem os seguintes requisitos:

a) O fundamento da impugnação seja exclusivamente de direito;

b) A autoliquidação tenha sido efectuada de acordo com orientações genéricas emitidas pela administração tributária.

5. No caso em apreço, é claro que o fundamen(t)o da reclamação graciosa baseia-se numa questão de direito: determinar se a “taxa SIRCA” constitui um imposto ou uma taxa.

6. A prévia reclamação seria (é) inútil, uma vez que o seu fundamento consiste, exclusivamente, na inconstitucionalidade orgânica do Decreto-Lei n.º 19/2011, de 7 de Fevereiro, designadamente, o n.º 1 do artigo 2.º, pelo que a Administração (DGAV) apenas o poderia deixar de aplicar após declaração de ilegalidade com força obrigatória geral, na medida em que está vinculada ao princípio da legalidade.

Neste sentido vem o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 12.10.2011 (…).

(…).

9. O meio processual próprio para a discussão da legalidade do acto de liquidação tributária é a impugnação judicial que deve ser interposta no tribunal competente, e não a reclamação graciosa.

10. As reclamações graciosas apresentadas não podem ser julgadas procedentes, uma vez que a DGAV está sujeita ao principio da legalidade, não podendo, por isso, deixar de aplicar uma norma com fundamento na sua inconstitucionalidade, a menos que o Tribunal Constitucional já tenha declarado a inconstitucionalidade com força obrigatória geral ou se esteja perante o desrespeito de normas constitucionais directamente aplicáveis e vinculativas, como as que se referem a direitos, liberdades e garantias, o que não é o caso em apreço.

(…).

IV- NOTA FINAL

(…).

26. Face ao exposto, cremos que só uma alteração legislativa ao Decreto-Lei n.º 19/2011, de 7 de Fevereiro – que determine que os beneficiários do SIRCA são os donos dos animais e não os estabelecimentos de abate, tal como se encontrava previsto na legislação anterior – é que pode reverter a situação actual, impedindo, assim, a interposição de impugnações judiciais das taxas SIRCA. (…).” – cfr. documento a fls. 67 a 69 do PA, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

AAA) Na sequência da informação antecedente, foi emitido parecer, pela Chefe de Divisão da DGAV, no sentido do indeferimento - cfr. fls. 67 do PA:, aqui reproduzidas - evidenciando-se o seguinte:

“(…).

Visto.

Concordo.

Por se tratar de uma reclamação graciosa que se suporta na inconstitucionalidade da norma, a resposta a esta consubstancia-se no indeferimento por parte da DGAV, em virtude desta estar obrigada ao princípio da legalidade. (…).”;

BBB) Por despacho emitido em 24.06.2015 foi decidido o seguinte: “(…) Concordo com o proposto no parecer da Senhora Chefe de Divisão do Gabinete Jurídico (…)” – cf. documento a fls. 67 do PA, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

CCC) A presente acção deu entrada em juízo em 14/10/2015, via site – cfr. fls. 1 dos autos, aqui reproduzidas.

(…). »


***

Neste recurso jurisdicional, a questão carente de solução, presente o alegado pela rte e a síntese delimitadora das correspondentes conclusões, é a de saber se a decisão recorrida errou, ao decidir que, em casos de autoliquidação, quando não é obrigatória a reclamação graciosa para abrir a via contenciosa O fundamento da impugnação seja exclusivamente de direito e a autoliquidação tenha sido efetuada de acordo com orientações genéricas emitidas pela administração tributária e aduaneira (AT)., o sujeito passivo não pode reclamar (graciosamente) e, assim, tem de impugnar judicialmente, no prazo (de 3 meses), previsto no art. 102.º n.º 1 alínea f) do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), a contar da data da apresentação da declaração em que é feita a autoliquidação.
Esta dúvida, problemática, foi, já, repetidamente, apreciada, por este Supremo Tribunal Administrativo, e decidida, por unanimidade, além de outros, aí, identificados, no acórdão de 26 de junho de 2019, proferido no processo n.º 3230/15.7BEBRG, no sentido, doutrinado, de que: «
Nos casos em que a lei não obriga à prévia interposição de reclamação graciosa prevista no art. 131.º do CPPT para viabilizar o acesso à via contenciosa de impugnação do acto de autoliquidação - e que são os casos em que esta foi efectuada em conformidade com orientações genéricas emitidas pela administração tributária e a impugnação se restringe a matéria de direito - o contribuinte não fica sujeito, caso queira reclamar do acto, a apresentar a reclamação no prazo geral previsto no art. 70.º do CPPT, podendo deduzi-la nos termos e prazo previstos no n.º 1 do art. 131.º do CPPT. »

Por outras palavras, nas situações de impugnação (judicial) em casos de autoliquidação, desde 1 de janeiro de 2015 (e, já, antes), o interessado, mesmo na hipótese (específica) positivada no art. 131.º n.º 3 do CPPT Idem (nota 1)., pode, se quiser, reclamar graciosamente, no prazo de 2 anos (em vez do de 120 dias, previsto no art. 70.º n.º 1 do CPPT), após (a data) apresentação da declaração de autoliquidação a visar, com a cobertura do disposto no n.º 1 do citado art. 131.º. Acrescentamos, ainda, que, decidida a reclamação graciosa ou sobre a mesma se tenha formado presunção de indeferimento tácito, ao contribuinte assiste o direito/possibilidade de impugnar, judicialmente, no prazo de três meses, nos termos do art. 102.º n.º 1 alíneas (als.) e) e d) do CPPT Redação da Lei n.º 82-E/2014 de 31 de dezembro., respetivamente.
Operando estas premissas, de imediato, emerge a conclusão de que se mostra errado o julgamento produzido, na sentença recorrida, quando sustenta, essencialmente, que a impugnante (aqui, rte) apresentou reclamação graciosa sem cabimento legal, dado que tinha de impugnar diretamente (os atos de) autoliquidação, nos termos do art. 131.º n.º 3 do CPPT, procedendo-se, portanto, à contagem do prazo (3 meses), previsto no art. 102.º n.º 1 al. f) do CPPT, para a apresentação da competente impugnação judicial, considerando “como seu termo inicial a data da apresentação da declaração em que é feita a autoliquidação.”. Deste modo, sem delongas, a sentença recorrida tem de ser revogada, pois, o decisor andou mal quando julgou procedente a exceção de caducidade do direito de ação (direito de impugnar).
Não obstante esta incontornável revogação, a matéria da disputada caducidade (ou não) do direito, da impugnante/rte, apresentar impugnação judicial dos vários atos de autoliquidação, das taxas SIRCA, entre março de 2013 e o mesmo mês de 2015, mostra-se, por ausência de elemento factual determinante, impossível de, nesta sede, ser, em definitivo, resolvida.
Efetivamente, é certo e seguro (sem mais discussão) que, tendo o primeiro ato de autoliquidação ocorrido em 30 de maio de 2013 (al. A) dos Factos provados) e a rte apresentado reclamação graciosa, desse e de todos os que, mensalmente, se seguiram, até 27 de maio de 2015 (al. WW)), no dia 28 de maio de 2015 (al. YY)), cumpriu o prazo disponível, de 2 anos, para reclamar administrativamente, pelo que, por esta via, nenhuma consequência há a retirar capaz de se repercutir no cômputo do prazo de caducidade do direito de ação.
Contudo, na certeza, ainda, de que a reclamação graciosa foi objeto de decisão, de indeferimento expresso, por despacho, datado de 24 de junho de 2015 e a petição inicial desta impugnação judicial se mostra como apresentada em 14 de outubro de 2015 (als. BBB) e CCC), falta apurar e fixar a data da notificação (efetiva e eficaz) Nem o teor da conclusão R) (da alegação da rte) nos pode ajudar, pois, nitidamente, não diz respeito a estes autos., à reclamante/rte, do identificado despacho que, a final, no procedimento, impôs o não deferimento da reclamação graciosa, porquanto o dia dessa comunicação marcará o início da contagem do prazo de três meses - art. 102.º n.º 1 al. e) do CPPT - que a impugnante tinha para formalizar a presente impugnação judicial.
Em suma, desaparecendo da ordem jurídica a sentença recorrida por incorporar julgamento erróneo, importa que, no tribunal recorrido, antes que outra decisão final seja emitida, se diligencie pelo apuramento da data vinda de apontar em falta e, em função dela, se contabilize o prazo de três meses que a impugnante dispunha para dar início a este processo, retirando as competentes consequências.
*******

# III.


Ante o exposto, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, acordamos:

- conceder provimento ao recurso e revogar a sentença recorrida;

- remeter os autos, ao TAF de Braga, a fim de:

1. se proceder à diligência supra identificada e, com base na factualidade apurada, decidir a, ainda pendente, exceção da caducidade do direito de impugnar judicialmente;

2. nada obstando, serem apreciadas e julgadas as demais questões (de mérito) suscitadas nos autos.


*

Custas pela recorrida (DGAV).

*

[Elaborado em computador e revisto, com versos em branco]


Lisboa, 17 de junho de 2020. – Aníbal Augusto Ruivo Ferraz (relator) – Francisco António Pedrosa de Areal Rothes – Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia.