Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0592/12.1BEVIS 0562/18
Data do Acordão:10/23/2019
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ISABEL MARQUES DA SILVA
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
PRESSUPOSTOS
NÃO ADMISSÃO DO RECURSO
JURISPRUDENCIA CONSOLIDADA
Sumário:Não é de admitir revista para reapreciação de questão decidida pelo TCA em sentido plenamente conforme à jurisprudência consolidada da Secção de Contencioso Tributário do STA.
Nº Convencional:JSTA000P25040
Nº do Documento:SA2201910230592/12
Data de Entrada:06/14/2018
Recorrente:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:EMPREENDIMENTOS EÓLICOS DO ...... S.A.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- Relatório –

1 – A Autoridade Tributária e Aduaneira – AT vem interpor para este Supremo Tribunal recurso de revista excepcional do acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 8 de Março de 2018, que negou provimento ao recurso por si interposto da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu que julgara procedente a acção administrativa especial instaurada por Empreendimentos Eólicos do ……., S.A. contra a inscrição na matriz do prédio U-330/Feirão, confirmando a sentença recorrida.
Conclui a sua alegação de recurso nos seguintes termos:
i. Visa o presente recurso reagir contra o douto Acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Norte, o qual negou provimento ao recurso e confirmou a sentença recorrida, tendo considerado em síntese que: …”caracterizando-se como elementos ad integrum domum, sem autonomia económica relativamente ao todo de que fazem parte, fica afastada a possibilidade de classificar como “prédios” autónomos cada um dos diversos elementos constituintes e partes componentes de um parque eólico, não só porque o seu destino normal não é diferente de todo o prédio, como, também, porque não é possível avaliá-los separadamente, na medida em que não são partes economicamente independentes.
A sentença andou bem ao decidir que os elementos constitutivos de um parque eólico (os aerogeradores, os elementos de ligação, a estação de comando e a subestação) não se subsumem à figura de “prédio” de acordo com a definição constante do CIMI, atenta a falta de valor económico próprio.”
ii. É contra tal entendimento que se insurge a ora Recorrente, porquanto nos autos está em causa a inscrição oficiosa na matriz do U-330, que consubstancia um parque eólico, pretendendo submeter à apreciação desse Colendo Tribunal, questão que se reveste de elevada relevância jurídica e social, e de importância fundamental, cuja admissão é necessária para uma melhor aplicação do direito.
iii. Primeiramente urge referir que, não obstante o CPPT não prever um recurso de natureza semelhante ao estatuído no Art. 150.º do CPTA, a Secção de Contencioso Tributário desse STA tem vindo a admitir este tipo de recurso em matéria tributária (v.d. Acórdão de 14.07.2008 no âmbito do Processo: 0410/08, e em sentido semelhante se pronunciaram também os Acórdãos de 15.02.2007, Processo n.º 01015/06, de 02.04-2008, Processo n.º 01061/07, de 21.05.2008, Processo n.º 0128/08 e de 2-07-2008 Processo n.º 0173/08).
iv. Neste conspecto, é indubitável que o recurso de revista é admissível em matéria tributária.
v. No que concerne à relevância jurídica e social e à importância fundamental da questão, é entendimento deste Supremo Tribunal Administrativo que a importância fundamental da questão há-de resultar quer da relevância jurídica quer social, aquela entendida não num plano meramente teórico mas prático em termos de utilidade jurídica da revista, e esta, em termos de capacidade de expansão da controvérsia de modo a ultrapassar os limites da situação singular e que, por outro lado, a melhor aplicação do direito há-de resultar da possibilidade de repetição num número indeterminado de casos futuros, em termos de garantia de uniformização do direito (veja-se neste sentido, entre outros, os Acórdãos do STA de 20/05/09, Processo n.º 295/09 e de 29.06.2011 Processo n.º 0568/11, e Acórdão de 30/05/07, Processo n.º 0357/07).
vi. Ora, a questão decidenda subjacente ao presete recurso de revista pretende apreciar uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se reveste de importância fundamental, bem como a admissão do presente recurso é necessário para uma melhor aplicação do Direito, nomeadamente, porque a questão tem utilidade jurídica e prática, ultrapassa os limites da situação singular, bem como a melhor aplicação do Direito deve resultar na possibilidade de repetição num número indeterminado de casos futuros, em termos de garantia de uniformização do Direito.
vii. A vexata quaestio, reside então em saber se o prédio inscrito na matriz sob o n.º U-330, que configura um parque eólico (cfr. ponto 2 da III FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO), situada na freguesia de Feirão, Concelho de Resende, se pode considerar prédio para efeitos de Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI).
viii. O Acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Norte, entendeu que era ilegal o acto de inscrição oficiosa na matriz do parque eólico, como prédio urbano, por entender que não consubstancia um prédio nos termos da 2.ª parte do n.º 1 do art. 2.º do CIMI:
ix. Detendo, a questão formulada detém uma enorme relevância jurídica e social e importância fundamental, atendendo à sua relevância prática, ultrapassando inelutavelmente os limites do caso singular, conforme se passa a expor.

x. Desde logo, a sua relevância social, advém do facto de situação em causa apresentar contornos indiciadores de que a solução pode constituir uma orientação para a apreciação de outros casos, até porque, está em causa questão que revela especial capacidade de repercussão social ou de controvérsia relativamente a casos futuros do mesmo tipo, em que a utilidade da decisão extravasa, em muito, os limites do caso concreto das partes envolvidas no litígio.

xi. Por outro lado a mesma questão assume também relevância jurídica fundamental, uma vez que a questão a apreciar é de elevada complexidade ou, pelo menos, de complexidade jurídica superior à comum.

xii. In casu, o presente recurso é também absolutamente necessário para uma melhor aplicação do direito, uma vez que, o acórdão aqui em crise incorre em erro de interpretação, sendo certo que, o erro de julgamento é gerador da violação de lei substantiva.

xiii. Torna-se fundamental a intervenção do STA, na qualidade de órgão de regulação do sistema, como condição para dissipar dúvidas, até porque, a questão ora em crise nos presentes autos é passível de replicação num número indeterminado de casos, existindo, actualmente, muitas centenas de processos a correr nos TAF's de todo o País tendo por base a matéria aqui em causa, assim como, existem já diversas sentenças desses TAFs com decisões contraditórias, ou seja, algumas a considerar que o parque eólico é prédio (para efeitos de IMI) e outras a considerar que não, por falta do elemento de natureza económica.

xiv. Mostra-se assaz pertinente que o órgão de cúpula da justiça administrativa se pronuncie, de forma uniforme, sobre esta matéria, resultando, por isso, claramente necessária a intervenção desse STA, razão por que se crê estarem presentes - no que à questão dos autos concerne - os requisitos necessários à admissibilidade do recurso previsto no Art.º 150.º do CPTA, devendo, por isso, o presente recurso ser admitido e objecto de pronuncia.

xv. Por último, atente-se ainda que o presente recurso é necessário para uma melhor aplicação do direito, estando em causa a violação de lei substantiva, sendo que a melhor aplicação do direito, há-de resultar da possibilidade de repetição, num número indeterminado de casos futuros, em termos de garantia de uniformização do direito. (v.d. ainda Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 16.6.2010, proferido no recurso n.º 296/10).

xvi. Ora, a admissão da revista para melhor aplicação do direito terá lugar, designadamente, e segundo a referida jurisprudência, quando, em face das características do caso concreto, ele revele seguramente a possibilidade de ser visto como um tipo, contendo uma questão bem caracterizada, passível de se repetir em casos futuros, e cuja decisão nas instâncias seja ostensivamente errada ou juridicamente insustentável, ou quando suscite fundadas dúvidas, nomeadamente por se verificar divisão de correntes jurisprudenciais ou doutrinais, gerando incerteza e instabilidade na resolução dos litígios, assim fazendo antever como objectivamente útil a intervenção do STA na qualidade de órgão de regulação do sistema.

xvii. Em face do exposto, inexistem quaisquer dúvidas, que no caso concreto, se concretizam tais requisitos, desde logo, é indubitável que em face das características do caso concreto, a questão é passível de repetição em inúmeros casos futuros, pelo que, a admissão do presente recurso contribuirá, inelutavelmente, para uma melhor aplicação e uniformização do direito.

xviii. Entende, a Recorrente que o acórdão recorrido fez, em clara contradição com a jurisprudência dos tribunais superiores, uma errada interpretação e aplicação do Art.º 2.º do CIMI, razão pelo qual, não deverá o mesmo manter-se.

xix. Assente a legislação relevante, e passando à análise de mérito recorta-se que o Douto acórdão, deu como provado que "1. A autora celebrou com a Junta de Freguesia de Feirão um acordo escrito", segundo o qual os terrenos destinam-se à instalação de um parque eólico, sendo que este é composto por aerogeradores, subestação, valar de cabos, acessos. // 2. A Autora explora um parque eólico (…)

xx. E considerou que “os elementos constituintes e partes componentes de um parque eólico não podem, de per si, ser considerados como prédios urbanos da espécie “outros”, na medida em que não constituem partes economicamente independentes, isto é, não têm aptidão suficiente para, por si só, desenvolverem a referida actividade económica, caracterizando-se como elementos ad integrandum domum, sem autonomia relativamente ao todo de que fazem parte.

xxi. Concluindo que “o acto impugnado que procedeu à inscrição oficiosa na matriz do aerogerador padece de vício de violação de lei, por erro nos pressupostos, implicando a sua anulação, uma vez que o(s) aerogerador(es) não preenche(m) o conceito fiscal de prédio, como bem se decidiu na sentença recorrida."

xxii. Entende, a Recorrente que o acórdão, recorrido para além de proceder a uma errónea apreciação e interpretação do conceito de prédio para efeitos fiscais, em manifesta e clara violação do disposto no Art.º 2.º do CIMI, enferma de erro de base nas premissas em que escorou a sua fundamentação.

xxiii. Não estamos perante a questão de se saber se o aerogerador e os componentes do parque eólico se subsumem ao conceito de prédio urbano da espécie “outros” mas se o parque eólico, em causa nos autos, se subsume ao conceito de prédio.

xxiv. Trata-se de um conceito de prédio que diverge, quer do conceito de prédio constante do n.º 3 do art.º 8.º do Código do Imposto Sobre o Rendimento das pessoas Singulares (CIRS) (No entanto, para Rui Duarte Morais («Sobre o IRS», 2ª edição, Almedina, 2008, p. 116) o CIRS não define o que é prédio, pelo que, numa interpretação sistemática, entendemos dever socorrer-nos da noção contida no CIMI. Isto porque «Na realidade, o nº 3 do art. 8° do CIRS apresenta as definições de prédio rústico, urbano e misto, para efeitos deste imposto. Além de tais noções, por demasiado simplistas, não procederem a uma delimitação rigorosa destes conceitos (cfr. os art. 3° a 6.º do CIMI), existem realidades prediais não inseríveis em qualquer uma destas categorias (será o caso de prédios que não tenham como componente física uma fracção de solo).), quer do constante do n.º 2 do art.º 204.º do CC (Neste âmbito, cfr. Nuno Sá Gomes, «Os Conceitos Fiscais de Prédio», in Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, n.º 54 (e também publicado na Ciência e Técnica Fiscal n.º 101 e 102 – Maio e Junho de 1967), estudo que embora reportando à evolução legislativa que culminou no antigo Código da Contribuição Industrial, mantém alguma actualidade).

xxv. Sobre os diferentes conceitos de prédio, explica NUNO SÁ GOMES (in: GOMES, Nuno Sá – Tributação do Património. Lições proferidas no 1.º curso de pós-graduação em Direito Fiscal na Faculdade de Direito da Universidade do Porto (2004), Coimbra, Almedina, 2005, pág. 127): Ora, parece resultar da comparação entre o conceito civil de imóvel consagrado no art. 204.º do Código Civil, com o conceito fiscal de prédio, previsto no art. 2.º do CIMI, que este último parece não abranger todas as realidades que são consideradas imóveis, para efeitos civis. É o que sucede, v.g., com os direitos inerentes aos imóveis, que não tendo a referida estrutura física, nunca serão prédios. Sendo assim, parece que, para efeitos da Reforma de Tributação do Património , o conceito civil de imóvel não coincide com o conceito fiscal de prédio .».

xxvi. É entendimento generalizado da doutrina sobre a matéria que, para que uma determinada realidade seja considerada prédio para efeitos fiscais, tem de reunir os seguintes elementos: um elemento de natureza física (fracção de território , abrangendo as águas, plantações, edifícios e construções de qualquer natureza nela incorporados ou assentes, com carácter de permanência) - estrutura física; em elemento de natureza jurídica (exigência de que a coisa - móvel ou imóvel - faça parte do património de uma pessoa singular ou colectiva) - patrimonialidade ; e um elemento de natureza económica (exigência de que a coisa tenha valor económico em circunstâncias normais) - valor económico.

xxvii. Aqui chegados, recorta-se que o acórdão recorrido entendeu que o artigo matricial controvertido não preenche os requisitos de prédio porquanto os aerogeradores e os componentes do parque eólico não se subsumem ao conceito de prédio urbano da espécie "outros".

xxviii. O Tribunal Central Administrativo Sul em 26/02/2017, entendeu que «Em circunstâncias normais, um aerogerador integrado num parque eólico destinado à ínjecção de energia eléctrica na rede pública , não tem valor económico próprio. Pelo contrário, é no próprio parque eólico que se encontra a manifestação de capacidade contributiva que revela a existência de tal valor, motivo pelo qual é o parque eólico, que não o aerogerador, que é remunerado (...).// Pelo que à míngua do terceiro pressuposto, não se pode concluir que um aerogerador pertencente a um parque eólico destinado à injecção de energia eléctrica na rede pública seja um prédio para efeitos de IMI, uma vez que o requisito da existência, em circunstâncias normais, do valor económico, não se verifica em relação a cada um dos aerogeradores ou de qualquer outro elemento que compõe o parque eólico (porque individualmente nenhum deles é, por si só, em circunstâncias normais, idóneo para produzir e injectar a energia na rede pública), mas apenas em relação a este (o parque eólico), na sua unidade, atenta a sua finalidade.».

xxix. Neste sentido e estando nos autos em causa a inscrição de um parque eólico, encontram-se, preenchidos, dessa forma, preenchidos os requisitos estatuídos no Art. 2.º do CIMI.

xxx. Nestes termos, entende-se que, à revelia do acórdão recorrido, o parque eólico em causa deve ser qualificado como prédio, de acordo com o disposto no art. 2.º do CIMI, constituindo realidade física distinta e autónoma dos terrenos em que se encontra implantado, possuindo, claramente, valor económico, uma vez que se verifica o preenchimento dos requisitos estatuídos na lei, para o parque eólico ser considerado como prédio para efeitos fiscais, incluindo o elemento económico.

xxxi. Atente-se que, quanto ao elemento de natureza económica, o acórdão sufragou que o mesmo não se encontra verificado por o aerogerador pertencer a um parque destinado à injecção de energia elétrica na rede pública, não se verificando, no entendimento do referido acórdão, o requisito da existência do valor económico em relação a cada um dos aerogeradores, mas apenas em relação ao parque na sua unidade, atenta a sua finalidade.

xxxii. Resulta, assim, que o acórdão a quo procede a uma errada interpretação do disposto no Art. 2.º do CIMI, na medida em que o que está em causa, como demonstrado, é o parque eólico que preenche todos os pressupostos legais (elementos jurídico, físico e económico) para ser considerado prédio para efeitos fiscais.

xxxiii. Refira-se, ainda, que o entendimento propugnado no acórdão recorrido se encontra em clara contradição com o Acórdão do TCA Sul de 26-02-2017, na medida em que aquilatou que a realidade objecto dos presentes autos não configura um prédio quando, pelo contrário, a jurisprudência tem entendido que é no próprio parque eólico que se encontra a manifestação da capacidade contributiva que releva a existência de tal valor, motivo pelo qual é o parque eólico, e não o aerogerador, que é remunerado e objecto de tributação.

xxxiv. Neste desiderato, não pode deixar de se afirmar que o parque eólico inscrito sob o artigo matricial U-330 reúne todos os requisitos legais para que seja qualificado como prédio para efeitos das normas de incidência em sede de IMI, razão pela qual o acórdão procede a uma errada interpretação e apreciação do Art. 2.º do CIMI.

Nestes termos e nos mais de direito deverão V.ªs Exºs julgar:

- a admissibilidade do presente recurso de revista por se encontrarem preenchidos os requisitos elencados no Art. 150.º do CPTA;

- conceder provimento ao presente recurso, pois o entendimento preconizado pelo Acórdão do TCAN, para além de se afastar da mens legislatoris, viola lei substantiva vertida no aludido Art. 2.º do CIMI e é contrária à jurisprudência do TCAS de 26-02-2017.


2 – Contra-alegou a recorrida, concluindo nos seguintes termos:
1. Em face da jurisprudência do STA vertida nos Ac. de 14-07-2015 e de 28-06.2017, não estão verificadas as condições de admissibilidade do recurso de revista excecional previsto no art. 150.º do CPTA pelo que o presente recurso não deverá ser admitido pelo Tribunal ad quem uma vez que (i) não existe qualquer novidade no tema que já foi objeto de dezenas de decisões dos tribunais superiores e, inclusive do STA, em mais do que uma ocasião, sendo todas as decisões no exato mesmo sentido não existindo qualquer divergência decisória e (ii) a questão suscitada não se configura como de relevância jurídica fundamental, pois de acordo com a jurisprudência do STA nem é de elevada complexidade jurídica nem de complexidade jurídica superior ao comum.
2. No presente caso aquilo que se verifica é que não existe qualquer divergência no sentido ou fundamentação nos dois graus de jurisdição porquanto quer a primeira quer a segunda instância têm decidido uniformemente a questão de saber se um aerogerador é ou não um prédio para efeitos de IMI, concluindo pela negativa, não existindo um único acórdão dos Tribunais Centrais Administrativos ou do Supremo Tribunal Administrativo em sentido diverso.
3. O acórdão recorrido não merece qualquer reparo ao ter considerado que fica afastada a possibilidade de classificar como prédios autónomos cada um dos diversos elementos constituintes e partes componentes de um parque eólico, não só porque o seu destino normal não é diferente de todo o prédio, como, também, porque não é possível avaliá-los separadamente, na medida em que não são pares economicamente independentes e portanto que inexiste o elemento económico para que se possa considerar, isoladamente, os aerogeradores como “prédios” para efeitos de IMI.
4. O acórdão recorrido não enferma de erro de base nas premissas em que escorou a sua fundamentação na medida em que a realidade em causa no presente processo são 7 sapatas e 7 torres que fazem parte de um Parque Eólico e não um Parque Eólico na sua totalidade.
5. Por todo o exposto, o presente recurso deve ser julgado totalmente improcedente mantendo-se o acórdão recorrido que não merece censura e procede a uma adequada subsunção dos factos ao direito em conformidade com aquela que é a jurisprudência constante dos tribunais superiores.
Termos em que (i) não deverá ser admitido o presente recurso de revista por não estarem reunidos os respetivos requisitos e (ii) subsidiariamente, deverá o presente recurso ser julgado totalmente improcedente, mantendo-se o douto acórdão recorrido, assim se fazendo o que é de lei de JUSTIÇA!

3 - O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal teve vista dos autos mas não emitiu parecer.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir da admissibilidade do recurso.

- Fundamentação -

4 – É do seguinte teor o probatório fixado:
1. A Autora celebrou com a Junta de Freguesia de Feirão um acordo escrito que as partes denominaram de “Aditamento ao Contrato de Cessão de Utilização de Espaço para Fins Industriais” do qual conta, entre o mais, o seguinte:
CLÁUSULA PRIMEIRA
1 – O Junta de Freguesia na qualidade de proprietária e legítima possuidora cede à arrendatário os terrenos inscritos sob os artigos 984, 901, 918 e 945, bem como uma parcela do artigo 833, todos da freguesia de Feirão, cujos limites e confrontações se encontram delimitadas e identificadas no levantamento topográfico anexo ao presente aditamento sob nº II.
2 – Os terrenos referidos no número anterior destinam-se à instalação de um parque eólico, sendo que este é composto nomeadamente por aerogeradores, subestação, valar de cabos, acessos.”.
[cfr. doc. 2 junto com a petição inicial].

2. A Autora explora um parque eólico, constituído por 7 aerogeradores situados na freguesia de Feirão, concelho de Resende. – facto não controvertido.

3. A Autora não procedeu à entrega da Declaração Modelo 1 de IMI para efeitos de inscrição dos prédios, tendo o Serviço de Finanças de Resende promovido a inscrição oficiosa na matriz urbana do artigo 330, da freguesia de Feirão, concelho de Resende. – cfr. doc. 1 junto com a petição inicial.
4. O prédio inscrito sob o artigo 330 foi objeto de 1ª avaliação, tendo sido fixado o valor patrimonial tributário de 2 074 000,00 €. – cfr. doc. 1 junto com a petição inicial.

5. A Autora, em 02.08.2012, deduziu reclamação da matriz, nos termos e com os fundamentos constantes de fls. 3 e ss. do processo administrativo apenso.

6. O Serviço de Finanças não se pronunciou sobre a reclamação referida no ponto anterior no prazo de 90 dias. - facto não controvertido.

7. Em 26.11.2012 deu entrada via SITAF a petição inicial dos presentes autos. – cfr. fls. 1 autos.

5 – Apreciando.
5.1 Da admissibilidade do recurso
O recorrente interpôs o presente recurso de revista excepcional ao abrigo do disposto no artigo 150.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), havendo agora que proceder à apreciação preliminar sumária da verificação in casu dos respectivos pressupostos da sua admissibilidade, ex vi do n.º 5 do artigo 150.º do CPTA.
Dispõe o artigo 150.º do CPTA, sob a epígrafe “Recurso de Revista”:
1 – Das decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.
2 – A revista só pode ter como fundamento a violação de lei substantiva ou processual.
3 – Aos factos materiais fixados pelo tribunal recorrido, o tribunal de revista aplica definitivamente o regime jurídico que julgue mais adequado.
4 – O erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objecto de revista, salvo havendo ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova.
5 – A decisão quanto à questão de saber se, no caso concreto, se preenchem os pressupostos do n.º 1 compete ao Supremo Tribunal Administrativo, devendo ser objecto de apreciação preliminar sumária, a cargo de uma formação constituída por três juízes de entre os mais antigos da secção de contencioso administrativo.

Decorre expressa e inequivocamente do n.º 1 do transcrito artigo a excepcionalidade do recurso de revista em apreço, sendo a sua admissibilidade condicionada não por critérios quantitativos mas por um critério qualitativo – o de que em causa esteja a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito – devendo este recurso funcionar como uma válvula de segurança do sistema e não como uma instância generalizada de recurso.
E, na interpretação dos conceitos a que o legislador recorre na definição do critério qualitativo de admissibilidade deste recurso, constitui jurisprudência pacífica deste Supremo Tribunal Administrativo - cfr., por todos, o Acórdão deste STA de 2 de abril de 2014, rec. n.º 1853/13 -, que «(…) o preenchimento do conceito indeterminado de relevância jurídica fundamental verificar-se-á, designadamente, quando a questão a apreciar seja de elevada complexidade ou, pelo menos, de complexidade jurídica superior ao comum, seja por força da dificuldade das operações exegéticas a efectuar, de um enquadramento normativo especialmente intricado ou da necessidade de concatenação de diversos regimes legais e institutos jurídicos, ou quando o tratamento da matéria tem suscitado dúvidas sérias quer ao nível da jurisprudência quer ao nível da doutrina. Já relevância social fundamental verificar-se-á quando a situação apresente contornos indiciadores de que a solução pode constituir uma orientação para a apreciação de outros casos, ou quando esteja em causa questão que revele especial capacidade de repercussão social, em que a utilidade da decisão extravasa os limites do caso concreto das partes envolvidas no litígio. Por outro lado, a clara necessidade da admissão da revista para melhor aplicação do direito há-de resultar da possibilidade de repetição num número indeterminado de casos futuros e consequente necessidade de garantir a uniformização do direito em matérias importantes tratadas pelas instâncias de forma pouco consistente ou contraditória - nomeadamente por se verificar a divisão de correntes jurisprudenciais ou doutrinais e se ter gerado incerteza e instabilidade na sua resolução a impor a intervenção do órgão de cúpula da justiça administrativa e tributária como condição para dissipar dúvidas – ou por as instâncias terem tratado a matéria de forma ostensivamente errada ou juridicamente insustentável, sendo objectivamente útil a intervenção do STA na qualidade de órgão de regulação do sistema.».

O acórdão do TCA Norte do qual a Autoridade Tributária e Aduaneira solicita revista negou provimento ao recurso interposto da sentença do TAF de Viseu que julgara procedente a acção administrativa especial deduzida pela ora recorrida contra o acto de inscrição oficiosa na matriz de alegado prédio – U-330/Feirão, anulando o acto sindicado. O TCA confirmou a decisão de primeira instância, no entendimento, plenamente conforme à jurisprudência reiterada e pacífica deste STA sobre a questão, de que “Os elementos constitutivos de um parque eólico (os aerogeradores, os elementos de ligação, a estação de comando e a subestação) não se subsumem à figura de “prédio” de acordo com a definição constante do CIMI, atenta a falta de valor económico próprio” .
Alega a recorrente AT, para justificar a admissão da revista, que nos autos está em causa a inscrição oficiosa na matriz do U-330, que consubstancia um parque eólico – cfr. conclusão ii) das suas alegações de recurso -, daí que a questão se revista de elevada relevância jurídica e social, e de importância fundamental, cuja admissão é necessária para uma melhor aplicação do direito, residindo a vexata quaestio (…) em saber se o prédio inscrito na matriz sob o n.º U-330, que configura um parque eólico (cfr. ponto 2 da III FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO), situada na freguesia de Feirão, Concelho de Resende, se pode considerar prédio para efeitos de Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI).
Embora a recorrente configure a questão a decidir na revista nos termos supra expostos, certo é que não foi desta forma que o TCA a configurou e decidiu, em conformidade, aliás, com o teor das conclusões das alegações de recurso para o TCA da recorrente – cfr. conclusões 2 a 33 das alegações de recurso da AT para o TCA, reproduzidas no relatório do acórdão.
O TCA enunciou a questão decidenda como sendo a de saber se a sentença recorrida incorreu e erro de julgamento ao concluir pela ilegalidade do acto de inscrição oficiosa na matriz dos aerogeradores, como prédio urbano, na categoria “outros” por entender que estes não consubstanciam um prédio nos termos da 2ª parte do nº 1 do artigo 2º do CIMI. E a ela deu resposta nos seguintes termos:
« A esta questão responderam já os nossos tribunais superiores no sentido de que os elementos constituintes e partes componentes de um parque eólico não podem, de per si, ser considerados como prédios urbanos da espécie “outros”, na medida em que não constituem partes economicamente independentes, isto é, não têm aptidão suficiente para, por si só, desenvolverem a referida actividade económica, caracterizando-se como elementos ad integrandum domum, sem autonomia económica relativamente ao todo de que fazem parte. - assim, entre outros, acórdãos do TCAS de 26/1/2017, Processo 516/15.4 e do STA de 15/3/2017, Processo 0140/15.
De facto, a questão que nos é colocada nada tem de novo, nem descortinamos nenhum argumento que não tenha sido abordado pela jurisprudência dos nossos tribunais superiores, designadamente o STA no já falado processo n.º 0140/15 de 15/3/2017 cuja doutrina a MMª juiz seguiu sufragou, e que permanece actual (e não só pela data recente).
Assim, por serem os argumentos seguidos pelos nossos tribunais superiores, a fundamentação que se segue não pode deixar de revestir caráter repetitivo, mas nem por isso menos legitimador. (…)»
Ou seja, contrariamente ao alegado, nenhuma questão nova relativamente à matéria foi levada ao TCA ou por ele tratada, não sendo lícito à recorrente reconfigurar a questão decidenda para efeitos de admissão da revista, pois esta sempre tem por objecto a concreta decisão proferida, nos termos em que o tenha sido.
E se porventura tivesse havido erro do TCA na configuração da questão a decidir, o que manifestamente não parece ser o caso atento o teor das alegações para o TCA, ainda assim esse hipotético erro estaria excluído da sindicância da revista, pois que não respeita ao Direito a aplicar, antes à apreciação da factualidade relevante para a decisão e, por expressa disposição legal, o erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objecto de revista, salvo havendo ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova, o que nunca seria o caso dos autos,

No que respeita ao tratamento que as instâncias deram à questão, nada lhes há a censurar que justifique admitir a revista, pois que se limitaram a acolher a jurisprudência consolidada deste STA na matéria – cfr. os nossos Acórdãos de 15 de Março de 2017, rec. n.º 0140/15 e de 7 de Junho de 2017, rec. n.º 01417/16, reiterada em múltiplos Acórdãos posteriores (cfr., entre outros, os Acórdãos de 17 de Janeiro de 2018, rec. n.º 1109/17, de 14 de Março de 2018, rec. n.º 1286/17, de 11 de abril de 2018, rec. n.º 1328/17, de 12 de Julho de 2018, rec. n.º 1072/17 e de 3 de Abril de 2019, proc. n.º 76/16.9BEMDL, para além de numerosas decisões sumárias em sentido idêntico).

Pelo exposto se conclui não ser de admitir a revista, em conformidade, aliás, com o que tem decidido este STA em casos semelhantes - cfr. os nossos Acórdãos de 13 de Setembro de 2017, rec. n.º 0543/17 e de 14 de Março de 2018, recs. nºs 53/18 e 54/18.

O recurso não será, pois, admitido.
- Decisão -
Termos em que, face ao exposto, acorda-se em não admitir o presente recurso de revista, por ausência dos respectivos pressupostos legais.

Custas pela recorrente.

Lisboa, 23 de Outubro de 2019. - Isabel Marques da Silva (relatora) - Aragão Seia - Francisco Rothes.