Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0367/18.4BEPNF
Data do Acordão:11/28/2018
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ANTÓNIO PIMPÃO
Descritores:AUTOLIQUIDAÇÃO
RECLAMAÇÃO GRACIOSA
PRAZO DE RECLAMAÇÃO
Sumário:Em caso de erro na autoliquidação, ainda que apresentada após a realização de inspeção tributária, a impugnação será, obrigatoriamente, precedida de reclamação graciosa, no prazo de dois anos após a apresentação da declaração, nos termos do artigo 131º 1 do CPPT.
Nº Convencional:JSTA000P23894
Nº do Documento:SA2201811280367/18
Data de Entrada:10/31/2018
Recorrente:A..., LDA
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
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1.1. A…………….., Lda., deduziu reclamação, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, contra o despacho do Chefe de Serviço de Finanças de Viana de Trofa que indeferiu o pedido de reapreciação da decisão que determinou a extinção do procedimento a que se reporta o artigo 169.º, n.º 3 do CPPT, peticionando a anulabilidade do despacho referido.
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1.2. Aquele Tribunal, por sentença de 13/01/2018 (fls.107/118), julgou improcedente a reclamação.
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1.3. Inconformada com essa decisão a reclamante, ora recorrente, interpôs o presente recurso jurisdicional concluindo da forma seguinte:
«A – A autoliquidação é a liquidação cuja iniciativa pertence ao contribuinte, por disposição legal, consubstanciando-se na apresentação de uma declaração, da qual constam as operações de qualificação e quantificação necessárias para apuramento do montante de imposto a pagar ou a restituir;
B – Nos termos do artigo 29º, nº 1, alínea c) do CIVA, os sujeitos passivos devem «enviar mensalmente uma declaração relativa às operações efectuadas no exercício da sua actividade no decurso do mês precedente, com indicação do imposto devido ou do crédito existente e dos elementos que serviram de base ao respectivo cálculo;» ou seja, devem proceder à autoliquidação do imposto;
C – Prevê o artigo 87º do CIVA, que a AT possa proceder à liquidação adicional do imposto autoliquidado, quando considere que foi liquidado imposto inferior ao devido ou efectuada uma dedução superior à devida, ou ainda, nos termos dos artigos 88º e 89º do CIVA, possa proceder à liquidação oficiosa do imposto, nos casos de não ter sido efectuada a autoliquidação pelo sujeito passivo, por falta de apresentação da declaração periódica prevista no artigo 29º, nº 1, alínea c) do CIVA;
D – Deste modo, em sede de IVA, só estão previstos na lei dois tipos de liquidação de imposto: a que é levada a cabo pelos contribuintes, sujeitos passivos do imposto, e que é denominada autoliquidação; e a liquidação administrativa, efectuada pela AT e denominada adicional ou oficiosa;
E – Estando assente na decisão sub judice que foi o sujeito passivo, aqui recorrente, que procedeu à autoliquidação do IVA relativo ao período de 2012/12, através da apresentação de declaração periódica em 12/08/2016, a impugnação desse acto de autoliquidação está dependente da apresentação de prévia reclamação graciosa, conforme determina o artigo 131º, nº 1 do C.P.P.T. a apresentar no prazo de dois anos a contar da data em que a declaração periódica foi apresentada;
F – Para este efeito, é irrelevante o facto de ter havido uma acção de inspecção que conduziu a que o sujeito passivo apresentasse aquela declaração periódica;
G – Neste mesmo sentido, i.e., no sentido de ser irrelevante, para a aplicação do regime do artigo 131º, nº 1, do C.P.P.T., a precedência de acção inspectiva que motiva ou conduz à apresentação da declaração periódica que contém a autoliquidação do imposto, já se pronunciou o Supremo Tribunal Administrativo, designadamente nos Acórdãos de 31.10.2007 (Proc. 593/07) e de 21.05.2008 (Proc. 863/07),
H – Expressando claramente que «I - Em caso de autoliquidação, a via contenciosa abre-se apenas depois da reclamação necessária apresentada pelo contribuinte (artigo 131.º CPPT). II - Estamos perante uma autoliquidação ainda que o contribuinte apresente a respectiva declaração fiscal referente a IRC para evitar um processo de natureza criminal e na sequência de inspecção desencadeada pela AF.»;
I – A decisão recorrida, apesar de consignar na matéria de facto que foi o sujeito passivo, aqui recorrente, que procedeu à autoliquidação do IVA relativo ao período de 2012/12, através da apresentação de declaração periódica de substituição em 12/08/2016, decidiu, a final, que a situação em apreço não se enquadra na previsão do artigo 131º, nº 1 do C.P.P.T., porque «a apresentação de declaração de substituição pelo contribuinte tem subjacente uma posição já conhecida da Administração Tributária no sentido de corrigir os valores declarados pelo sujeito passivo para o período 2012.12», não sendo, assim, aplicável o prazo de dois anos consagrado naquela norma para a apresentação de reclamação graciosa;
J – Ora, não podemos subscrever este entendimento, que “descaracteriza” a autoliquidação efectuada pelo contribuinte na sequência de procedimento inspectivo em que essa autoliquidação foi sugerida, porquanto a tipologia da liquidação tributária apenas assume dois tipos: ou é administrativa e levada a cabo pela administração tributária, ou é levada a cabo pelos contribuintes e traduz uma autoliquidação ou uma liquidação em substituição;
L – A decisão recorrida não fez, assim, uma correcta interpretação e aplicação da lei, uma vez que à situação em apreço é aplicável o procedimento de reclamação previsto no artigo 131º, nº 1 do C.P.P.T., motivo por que devia ter sido julgada procedente a reclamação judicial deduzida e, em consequência, anulada a decisão do Sr. Chefe do Serviço de Finanças de Trofa.
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1.4. – Não foram apresentadas contra-alegações.
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1.5. O Ministério Público emitiu a seguinte pronúncia:
«1. OBJETO.
Sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, que julgou improcedente reclamação judicial deduzida contra o ato do OEF que indeferiu pedido de reapreciação de decisão que determinou a extinção do procedimento a que se refere o artigo 169.º/3 do CPPT, no entendimento de que, tendo a recorrente procedido à autoliquidação do tributo, em cumprimento do determinado em ação de inspeção tributária de que foi objeto, não é de aplicar o prazo de 2 anos previsto no artigo 131.º/ 1 do CPPT para a reclamação graciosa necessária, mas antes o prazo de 120 dias previsto para a reclamação graciosa no artigo 70.º do mesmo Código.
2. FUNDAMENTAÇÃO.
A autoliquidação é a que é feita pelos particulares por contraposição à que é feita pela AT.
No caso em análise estamos, certamente, perante uma autoliquidação, feita no decurso de uma ação inspetiva, através da entrega da declaração periódica de substituição relativa ao IVA de 12/2012.
De facto, nada impedia que a recorrente, não pretendendo efetuar a autoliquidação, aguardasse a efetivação da liquidação adicional de IVA que viesse a resultar da ação inspetiva.
Nos termos do disposto no artigo 131.º/1 do CPPT em caso de erro na autoliquidação a impugnação judicial será obrigatoriamente precedida de reclamação graciosa.
E tal acontece mesmo que a autoliquidação seja efetuada pelo contribuinte na sequência de ação inspetiva desencadeada pela AT (acórdãos do STA, de 31/10/2007-P. 0593/07 e de 21/05/2008-P.0863/07, disponíveis em www.dgsi.pt).
Note-se que, nos termos do disposto no artigo 64.º do RCPIT o RIT só tem eficácia vinculativa quanto aos factos relatados e à qualificação jurídico-tributária das operações realizadas com contingência fiscal a que se refere o artigo 12.º/3, constante do relatório, desde que tal seja solicitado ao diretor-geral.
Nos termos do estatuído no artigo 131.º/3 do CPPT, na redação introduzida pela Lei 82-E/2014, de 31/12, quando estiver, exclusivamente, em causa matéria de direito e a autoliquidação tiver sido efetuada de acordo com orientações genéricas emitidas pela AT, não há lugar à reclamação necessária prevista no n.º 1, o que se justifica atento o facto de a própria a AT estar vinculada a tais orientações nos termos do disposto no artigo 68.º-A/1 da LGT.
Ora, no caso em análise não resulta evidenciado que a autoliquidação tenha sido efetuada de acordo com orientações genéricas da AT nem tão pouco que a recorrente, apenas, venha sindicar matéria de direito, pelo que parece certo que a sua impugnação judicial deve, necessariamente, ser antecedida de reclamação graciosa, a deduzir no prazo de 2 anos contados a partir da apresentação da declaração.
Tendo a apresentação da declaração sido efetivada em 12/08/2016 (ponto 3 do probatório), a recorrente poderia apresentar a reclamação graciosa até dois anos depois.
Assim sendo, o despacho sindicado, de 24/5/2018, que indeferiu o pedido de reapreciação do despacho de 03/05/2018, que havida determinado a extinção do procedimento a que se refere o artigo 169.º/2/3 do CPPT, com o fundamento de já ter decorrido o prazo de que a, ora, recorrente dispunha para apresentar reclamação graciosa está eivado de vício de violação de lei.
3. CONCLUSÃO.
Deve dar-se provimento ao recurso e revogar-se a sentença recorrida e, consequentemente, anular-se a decisão sindicada do OEF.»
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1.6. Colhidos os vistos legais, cabe decidir.
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2. A decisão recorrida deu como provada a seguinte matéria de facto:
«1. Em 30/05/20 16, a sociedade A……………., Lda., foi sujeito a uma ação inspetiva, iniciada nas instalações da própria empresa, com término em 24/08/2016. [cf. doc. de fls. 11 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido].
2. Consta do relatório da inspeção tributária designadamente o seguinte:










(...)
[cf. doc. de fls. 11 a 15 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido].
3. No âmbito da ação inspetiva, foi portanto proposta uma liquidação adicional de IVA para o período de 2012.12 não entregue e não liquidado, no montante de 126.738,51,51€, tendo a ora reclamante regularizado voluntariamente a sua situação tributária através da entrega, em 12/08/2016, da declaração periódica de substituição.
4. Em 20/08/2016, foi instaurado, no Serviço de Finanças da Trofa, contra a Reclamante, a execução fiscal n.º 4219201601070380, para cobrança coerciva de dívida de IVA, relativa ao ano de 2012, no montante de € 126.738,51 e acrescidos no valor de € 4951,53 [cf. doc. de fls. 17 e 18 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido].
5. Em 27/09/2016, deu entrada no Serviço de Finanças requerimento da ora Reclamante informando da intenção de apresentar reclamação graciosa da liquidação de IVA e solicitando a suspensão da execução fiscal, designadamente nos seguintes termos:


[cfr. doc. de fls. 21 a 27 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido].
6. Em 29/03/2017 pelo Serviço de Finanças da Trofa foi emitido mandado de penhora [cf. doc. de fls. 34 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido].
7. Em sequência foi elaborado auto de penhora, tendo sido penhorados bens do inventário, aos quais foram atribuídos o valor de 57.000,00€
[cf. doc. de fls. 35 a 49 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido].
8. Face à insuficiência dos bens penhorados, em 11/05/2017, a Diretora de Finanças Adjunta proferiu despacho com o seguinte teor:
“Mostrando-se insuficientes os bens oferecidos à penhora para efeitos da suspensão da execução e concluindo-se pela existência de outros bens detidos pelo executado, defiro o pedido de dispensa de garantia pelo eventual valor remanescente sob condição de ser constituído penhor mercantil ou efetuada a penhora do estabelecimento comercial”.
[cf. doc. de fls. 51 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido].
9. Em 29/05/2017 foi emitido mandado de penhora de estabelecimento comercial [cf. doc. de fls. 58 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido].
10. Foi elaborada informação, designadamente com o seguinte teor:
“(...) – 5 – Uma vez que os bens já penhorados se mostravam insuficientes para a suspensão da execução, foi, por despacho de 2017-05-11 da Diretora de Finanças Adj.ª, ordenada a constituição de penhor mercantil ou efetuada a penhora do Estabelecimento Comercial da executada e deferido o pedido de dispensa de garantia pelo eventual valor remanescente;
6 – Após consulta ao Sistema de Contencioso Administrativo Tributário (SICAT) não foi
7 – O executado não veio dar conhecimento aos autos da existência de qualquer outro meio de defesa que justifique a suspensão da execução, nos termos do art 169.º/9 do CPPT
8 – Nesta data, encontram-se ultrapassados todos os prazos legais para a apresentação do meio gracioso ou judicial.
[cf. doc. de fls. 59 dos presentes autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido].
11. Sobre a informação a que se reporta o n.º anterior, em 03/05/2018, recaiu despacho do Chefe do Serviço de Finanças da Trofa, com o seguinte teor:
“Face ao que vem informado e considerando que a dívida em causa teve origem em ação inspetiva em que foram determinadas as devidas correções/regularizações em sede de IVA, não declarados à Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), este Serviço de Finanças entende que o prazo para apresentação de reclamação graciosa é o que se encontra previsto no art. 70.º/1 do CPPT, isto é, de 120 dias contados a partir do termo do prazo para pagamento voluntário, pelo que indefiro o pedido de reapreciação da decisão proferida através do despacho de 2018-05-03, nos termos e nas condições em que a mesma foi requerida. [cf. doc. de fls. 59 verso dos presentes autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido].
12. Do despacho a que alude o n.º anterior, a ora Reclamante foi notificado nos seguintes termos:
“Na sequência do requerimento apresentado em 2016-09-27, a solicitar a suspensão da execução, nos termos do art. 169.º/2 do ... CPPT, em que se manifesta a intenção de deduzir meio gracioso mediante a apresentação de garantia, fica V. Ex.ª notificado do despacho de 2018-05-03 do Chefe de Finanças proferido no processo supra referenciado, cujo teor vai reproduzido pela fotocópia que se remete em anexo”. [cf. doc. de fls. 62 a 67 dos presentes autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido].
13. Em sequência da notificação, a ora Reclamante requereu a “reapreciação” do despacho de 03/05/2018, fundada na “ocorrência de erro manifesto no cômputo do prazo para a apresentação de reclamação graciosa contra a autoliquidação”, com base no entendimento de que a dívida de IVA subjacente ao processo executivo em causa provém de autoliquidação da contribuinte, tendo a respetiva declaração periódica sido apresentada em 12 de agosto de 2016, dispõe do prazo de dois anos, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 131.º do CPPT, [cf. doc. de fls. 68 a 70 dos presentes autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido].
14. Foi elaborada informação com o seguinte teor:
“1 – Ao abrigo do disposto no art. 169.º/2 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), a execução ficará suspensa até à decisão do pleito em caso de reclamação graciosa ou impugnação judicial desde que, após o termo do prazo de pagamento voluntário, seja prestada garantia antes da apresentação do meio gracioso ou judicial correspondente, acompanhada de requerimento com a indicação da intenção de apresentar meio gracioso ou judicial para discussão da legalidade ou da exigibilidade da dívida exequenda.
2 – O requerimento a que se refere o número anterior dá início a um procedimento que é extinto se, no prazo legal, não for apresentado o correspondente meio processual e comunicado esse facto ao órgão competente para a execução, aplicando-se o disposto no art. 200.º/2 do citado CPPT, cfr. art. 169.º 3/4 do mesmo código;
3 – Nos termos do art. 70.º/1 do CPPT, a reclamação graciosa pode ser deduzida com os mesmos fundamentos previstos para a impugnação judicial e será apresentada no prazo de 120 dias contados a partir do termo do prazo para pagamento voluntário;
4 – No entanto, determina o art. 131.º/1 do citado CPPT que, em caso de erro na autoliquidação, a impugnação será obrigatoriamente precedida de reclamação graciosa dirigida ao órgão periférico regional da AT, no prazo de 2 anos após a apresentação da declaração;
5 – Após o contacto com a Direção de Finanças do Porto – Serviços de Inspeção Tributária, foi este Serviço de Finanças informado que o IVA em cause se refere a uma correção/regularização em sede de IVA resultante de uma ação inspetiva (Ordem de Serviço N° OI.2016.02.11), e não de um erro na autoliquidação como é referido na petição;
6 – Refere o art 59.º/6 do CPPT que, da apresentação das declarações de substituição não pode resultar a ampliação dos prazos de reclamação graciosa, impugnação judicial ou revisão do ato tributário, quer seriam aplicáveis caso não tivessem sido apresentadas.
7 – O executado não veio dar conhecimento aos autos da existência de qualquer outro meio de defesa que justifique a suspensão da execução, nos termos do art. 169.°/9 do CPPT;
8 – Nesta data, encontram-se ultrapassados todos os prazos legais para a apresentação do meio gracioso ou judicial. [cf. doc. de fls. 81 e 82 dos presentes autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido].
15. Sobre a informação a que se reporta o n.º anterior, em 24/05/2018, recaiu despacho do Chefe do Serviço de Finanças da Trofa, com o seguinte teor:
“Face ao que vem informado e considerando que a dívida em causa teve origem em ação inspetiva em que foram determinadas as devidas correções/regularizações em sede de IVA, não declarados à Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), este Serviço de Finanças entende que o prazo para apresentação de reclamação graciosa é o que se encontra previsto no art. 70.º/1 do CPPT, isto é, de 120 dias contados a partir do termo do prazo para pagamento voluntário, pelo que indefiro o pedido de reapreciação da decisão proferida através do despacho de 2018-05-03, nos termos e nas condições em que a mesma foi requerida. [cf. doc. de fls. 82 dos presentes autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido].
16. Do despacho a que alude o n.º anterior, a ora Reclamante foi notificado nos seguintes termos:
“Em resposta requerimento apresentado em 2018-05-15..., a solicitar a reapreciação da decisão proferida através do despacho de 2018-05-03, quer determinou a extinção do procedimento a que se refere o artigo 169.0/3 do ... CPPT, fica V. Ex.ª notificado do despacho de 2018-05-24 do Chefe de Finanças proferido no processo supra referenciado, cujo teor vai reproduzido pela fotocópia que se remete em anexo
O referido despacho é suscetível de reclamação a apresentar no prazo de 10 dias, nos termos do art. 277.º n.º 1 do citado PPT”. [cf. doc. de fls. 72 dos presentes autos, cujo teor se dá por integral mente reproduzido].
17. Em 04/06/2018, foi deduzida a presente reclamação. [cf. doc. de fls. 76 dos presentes autos].»
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3.1. Segundo a reclamante e ora recorrente a dívida em causa no processo executivo provém de autoliquidação de IVA pelo que, tendo existido erro naquela liquidação, dispõe do prazo de dois anos para apresentação da reclamação graciosa necessária à impugnação judicial, nos termos do artigo 131.º n.º 1 do CPPT, não sendo aplicável o disposto no artigo 70.º n.º 1 do CPPT, que estabelece o prazo 120 dias contados do termo do prazo para pagamento voluntário.
Diversamente sustenta a FP que não estamos perante qualquer autoliquidação ou erro na autoliquidação pois que o sujeito passivo apresentou declarações de substituição baseadas nos dados revelados pela ação inspetiva já que foi a AT que propôs a liquidação adicional de IVA.
Ainda segundo a FP se a reclamante não tivesse procedido à entrega de declaração de substituição, não restaria à AT senão proceder às correções devidas e consequente liquidação adicional.
Afirmou a sentença recorrida o seguinte:
“No caso em concreto, a apresentação de declaração de substituição pelo contribuinte tem subjacente uma posição já conhecida da Administração Tributária no sentido de corrigir os valores declarados pelo sujeito passivo para o período 2012.12 em sede de IVA.
Resulta do relatório de inspeção tributária e tal não foi contrariado pela ora Reclamante que, no âmbito da ação inspetiva, foi portanto proposta uma liquidação adicional de IVA para o período de 2012.12 não entregue e não liquidado, no montante de 126.738,51,5 1€, tendo a ora reclamante regularizado voluntariamente a sua situação tributária através da entrega, em 12/08/2016, da declaração periódica de substituição.
Pelo que a reclamação graciosa subsequentemente apresentada não se enquadra no regime previsto no artigo 131.º, n.º 1, do C.P.P.T., assim não podendo beneficiar do prazo de dois anos consagrado na mesma norma, antes seguindo o procedimento constante do artigo 70.º, n.º 1, do C.P.P.T., e devendo ser apresentada no prazo de cento e vinte dias, com termo inicial a ocorrer, de acordo com os factos previstos no artigo 102.º, n.º 1, do citado diploma.
Pelo que, ao não observar o prazo estipulado no artigo 70.º do CPPT para a apresentação da reclamação graciosa, não poderá a execução fiscal ficar suspensa nos termos do artigo 169.º do CPPT. Ao que o despacho reclamado não padece das ilegalidades invocadas, devendo manter-se na ordem jurídica.”.
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3.2. A questão controvertida resume-se a saber se estamos, como sustenta a recorrente, perante uma autoliquidação de IVA, por ter existido erro na liquidação, dispondo, por isso, do prazo de dois anos para apresentação da reclamação graciosa, necessária à impugnação judicial, nos termos do artigo 131.º n.º 1 do CPPT, ou diversamente se, nos termos do artigo 70.º n.º 1 do CPPT, tinha a reclamação de ser apresentada no prazo de 120 dias contados do termo do prazo para pagamento voluntário.
É este o entendimento da FP que foi acompanhado pela sentença recorrida pois que, na situação concreta, não estamos perante autoliquidação já que o sujeito passivo apresentou declaração de substituição baseada nos dados revelados pela ação inspetiva, tendo sido a AT que propôs a liquidação adicional de IVA.
Ainda segundo a FP se a reclamante não tivesse procedido à entrega de declaração de substituição, não restaria à AT senão proceder às correções devidas e consequente liquidação adicional.
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3.3. Estabelece o artigo 70.º do CPPT, sob a epígrafe “Apresentação, fundamentos e prazo da reclamação graciosa” que a reclamação graciosa pode ser deduzida com os mesmos fundamentos previstos para a impugnação judicial e será apresentada no prazo de 120 dias contados a partir dos factos previstos no n.º 1 do artigo 102.º
Refere o artigo 131.º n.º 1 do CPPT que em caso de erro na autoliquidação, a impugnação será obrigatoriamente precedida de reclamação graciosa dirigida ao dirigente do órgão periférico regional da administração tributária, no prazo de 2 anos após a apresentação da declaração.
Do texto deste preceito normativo resulta que o mesmo se reporta à impugnação em caso de autoliquidação.
A sentença recorrida afirma que a autoliquidação é a liquidação de um tributo que não é feita pela Administração Tributária, mas pelo sujeito passivo, sendo que, de acordo com o disposto no artigo 84.º, n.º 2, da LGT, o sujeito passivo que proceda à autoliquidação deve esclarecer, quando solicitado pela administração tributária, os critérios utilizados e a sua aplicação na determinação dos valores que declarou.
Acrescenta que a doutrina e a jurisprudência se referem à autoliquidação para aludir ao ato cuja iniciativa pertence ao contribuinte por disposição legal, consubstanciando-se na apresentação de uma declaração normalmente acompanhada do respetivo meio de pagamento.
Referiu, ainda, que nos casos em que a administração tributária já tomou posição sobre a autoliquidação do imposto – através de ato tributário de correção dos valores declarados pelo contribuinte – não se está perante situação que exija nova intervenção da administração tributária antes da colocação do problema ao tribunal, isto é, não se está perante situação que exija prévia reclamação nos termos do artigo 131.º do CPPT.
Concorda-se com as partes referidas da sentença recorrida.
Não se acompanha, contudo, quando afirma que não estamos perante autoliquidação uma vez que “a apresentação de declaração de substituição pelo contribuinte tem subjacente uma posição já conhecida da Administração Tributária no sentido de corrigir os valores declarados pelo sujeito passivo para o período 2012.12 em sede de IVA” uma vez que resulta “do relatório de inspeção tributária e tal não foi contrariado pela ora Reclamante que, no âmbito da ação inspetiva, foi portanto proposta uma liquidação adicional de IVA para o período de 2012.12 não entregue e não liquidado, no montante de 126.738,51,5 1€, tendo a ora reclamante regularizado voluntariamente a sua situação tributária através da entrega, em 12/08/2016, da declaração periódica de substituição”.
Entende-se diversamente que a autoliquidação, efetuada pelo contribuinte, ainda que na sequência de ação inspetiva, desencadeada pela AT, nomeadamente para evitar um processo penal, continua a não poder deixar de se considerar uma autoliquidação com o que se acompanha a jurisprudência deste STA (acórdãos de 31/10/207, proc. 0593/07 e de 21/05/2008, proc. 0863/07).
E o acórdão citado e em parte transcrito pela sentença recorrida (STA 15-02-2006, proc. 026622) não permite concluir em sentido diverso até porque a situação aí descrita não é sobreponível com a dos presentes autos.
Com efeito neste se escreveu o seguinte:
“A razão de ser da exigência legal da reclamação graciosa prévia à impugnação judicial prende-se com o facto de a autoliquidação não ser um acto tributário da Administração Tributária do qual se possa impugnar directamente. Daí que a lei exija que o sujeito passivo provoque esse acto da Administração Tributária a fim de dele deduzir impugnação judicial.
Não havendo acto tributário da Administração, tinha a impugnante que deduzir uma reclamação graciosa prévia à impugnação judicial. Não tendo feito essa reclamação, falta um pressuposto processual para a impugnação judicial, o que faz com que exista manifesta ilegalidade da sua interposição.
A impugnante, como contribuinte numa autoliquidação feita por terceiro, teria de fazer essa reclamação, pois “só então” podia impugnar …” .
Entende-se, por isso, que a reclamação graciosa subsequentemente apresentada se enquadra no regime previsto no artigo 131.º, n.º 1, do C.P.P.T., podendo ser apresentada no prazo de dois anos.
Daí que observado o referido prazo de dois anos previsto neste preceito legal, para apresentar a reclamação graciosa, pode a execução fiscal ficar suspensa nos termos do artigo 169.º do CPPT.
É, por isso, de concluir que o despacho sindicado, de 24/5/2018, que indeferiu o pedido de reapreciação do despacho de 03/05/2018, que havida determinado a extinção do procedimento a que se refere o artigo 169.º 2 e 3 do CPPT, com o fundamento de já ter decorrido o prazo de que a, ora, recorrente dispunha para apresentar reclamação graciosa sofre de vício de violação de lei.
Acompanha-se, por isso, o MP quando afirma o seguinte:
“… no caso em análise não resulta evidenciado que a autoliquidação tenha sido efetuada de acordo com orientações genéricas da AT nem tão pouco que a recorrente, apenas, venha sindicar matéria de direito, pelo que parece certo que a sua impugnação judicial deve, necessariamente, ser antecedida de reclamação graciosa, a deduzir no prazo de 2 anos contados a partir da apresentação da declaração.
Tendo a apresentação da declaração sido efetivada em 12/08/2016 … a recorrente poderia apresentar a reclamação graciosa até dois anos depois.”.
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Em caso de erro na autoliquidação, ainda que apresentada após a realização de inspeção tributária, a impugnação será, obrigatoriamente, precedida de reclamação graciosa, no prazo de dois anos após a apresentação da declaração, nos termos do artigo 131º 1 do CPPT.
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4. Termos em que acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em conceder provimento ao presente recurso, revogar a sentença recorrida, julgar procedente a reclamação judicial deduzida e, em consequência, anular a decisão do Sr. Chefe do Serviço de Finanças referido.
Custas pela recorrida na 1ª instância e neste STA, aqui sem taxa de justiça por não ter apresentado alegações.

Lisboa, 28 de novembro de 2018. – António Pimpão (relator) – Francisco Rothes – Aragão Seia.