Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0500/17
Data do Acordão:02/21/2018
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ANTÓNIO PIMPÃO
Descritores:FUNDAMENTAÇÃO
Sumário: Ocorre falta de fundamentação se a AT não classificou os empréstimos dos sócios à sociedade, nem como suprimentos, nem como operações financeiras e se limitou a afirmar que eram tributadas nos termos do ponto 17.1.4 da Tabela anexa ao CIS.
Nº Convencional:JSTA000P22929
Nº do Documento:SA2201802210500
Data de Entrada:04/28/2017
Recorrente:AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A......, LDA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
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1.1. A…………., Lda., impugnou, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, o ato de liquidação do imposto de selo e respetivos juros compensatórios relativo ao ano de 2006, no montante de 10.515,00 €, tendo peticionado a anulação deste ato.
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1.2. Aquele Tribunal, por sentença de 25/05/2011 (fls.190/199), julgou procedente a impugnação.
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1.3. Inconformada recorreu a FP para o Tribunal Central Administrativo Norte que, por decisão de 02/02/2016 (fls.255/260), se julgou incompetente em razão da hierarquia, para conhecer do presente recurso jurisdicional, declarando competente para o efeito o Supremo Tribunal Administrativo, para onde os autos foram remetidos.
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1.4. Alegou a recorrente apresentando as seguintes conclusões:
«A) A interposição do presente recurso tem por base a não aceitação da douta decisão proferida, no que concerne à falta de fundamentação do acto impugnado.
B) Sendo que a liquidação aqui posta em crise advém da constatação da existência de várias contas correntes entre os sócios e a sociedade aqui impugnante, relativos a empréstimos efectuados pelos sócios à sociedade passíveis de tributação em IS em conformidade com a verba 17.1.4 da Tabela Geral de IS – cfr. capítulo III.2 do referido Relatório e do ponto 2 da informação prestada pelos SIT já juntos aos autos, sob doc. 4 da p.i..
C) A douta sentença ora recorrida decidiu julgar procedente a impugnação deduzida por considerar que o “acto administrativo se encontra indevidamente fundamentado”.
D) Posto isto, e com o devido respeito que é muito, não pode a Fazenda Pública conformar-se com o assim doutamente decidido por entender que a sentença a quo incorreu em erro de julgamento quer no tocante à matéria de facto (insuficiência desta, sem delimitação adequada dos factos relevantes para a solução) quer em matéria de direito, uma vez que não efectuou correctamente a interpretação dos art.s 7º, n.º 1 al. g) e h) do CIS e respectiva Tabela Geral, bem como do art. 77º da LGT e 62º do RCPIT.
E) Fundamentar o acto tributário consiste na indicação dos factos e das normas jurídicas que o justificam na exposição das razões de facto e /ou de direito que determinam a AF a proferir uma decisão, enfim, em deduzir expressamente a resolução tomada das premissas em que assenta, ou em exprimir os motivos por que se resolve de certa maneira, e não de outra.
F) Assim, o acto tributário tem de ser sustentado por um mínimo suficiente da fundamentação expressa, ainda que operada por forma massiva e sendo produto de um poder legalmente vinculado, aspectos estes que só poderão ser valorados dentro do grau de exigibilidade da declaração de fundamentação, quer porque a massividade intui maior possibilidade de entendimento dos destinatários, quer porque a vinculação dispensa a enunciação da motivação do agente que decorrerá imediatamente da mera descrição dos factos - pressupostos do acto.
G) Estando expressamente referidos no acto os elementos indispensáveis à formação de um correcto juízo de valor, não se omitindo os fundamentos que, de acordo com as bases legais, permitiram aferir do acerto jurídico do acto final, o mesmo está fundamentado existindo, insofismavelmente, o mesmo nexo lógico que entre as premissas de um silogismo e a sua conclusão.
H) Tendo a fundamentação do acto impugnado aduzida pelo Fisco, assentado no relatório de inspecção elaborado pelos Serviços de Inspecção Tributária de cujo projecto e conclusões a Impugnante foi notificada, face ao qual, ao abrigo do princípio da participação consagrado no artigo 60.º da L.G.T., exerceu o direito de audição e tendo sobre o relatório de inspecção, contendo já a apreciação dos fundamentos invocados ao abrigo do princípio da participação, recaído o despacho de concordância com o relatório o qual determinou, também, a notificação da Impugnante nos termos dos art.ºs 77º da LGT e 62º do RCPIT na sequência do que foi enviada à Impugnante a liquidação agora sindicada, esteada em tal fundamentação deve considerar-se que a fundamentação formal existe e é manifestamente suficiente e clara e dela se apropriou per relationem.
I) E o despacho está fundamentado ao ponto da impugnante ter entendido e ter exercido eficazmente o direito de defesa o que passa necessariamente por um conhecimento claro dos factos.
J) Está fundamentada a liquidação de juros compensatórios quando se dá a conhecer ao contribuinte qual o período em que incidiram os juros, sobre que montante e qual a taxa aplicada, não permitindo o contribuinte conhecer as razões dessa liquidação de molde a com ela conformar-se ou impugná-la.
K) Por força do disposto no n.º 1 do artigo 77º da LGT, a fundamentação deve consistir, no mínimo, numa sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito que motivaram a decisão, ou numa declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas.
L) Conforme decorre suficientemente dos autos e, nomeadamente, das conclusões da acção inspectiva, delas consta a qualificação do facto tributário, a sua subsunção à norma legal aplicável e a respectiva quantificação.
M) Assim sendo, a recorrente conhecia as razões por que lhe foi liquidado aquele imposto, tendo podido analisar os critérios de que a Administração Fiscal se socorreu para chegar àquele montante.
N) E a jurisprudência vai no sentido de que “não é insuficiente a fundamentação do acto administrativo cujo iter lógico dá a saber a um destinatário normal o necessário para que opte conscientemente pela aceitação da legalidade do acto ou pelo contencioso do mesmo” (Ac. do STA de 23.04.97, Recurso 20 168. No mesmo sentido, cfr. Ac. do TT de 2ª Instância, de 10.03.92, P. 60 860, in CTF. 367/121 e Ac. do STA de 11.11.98, 2ª Secção – Pleno, Recurso 20 168).
O) Aliás, se a impugnante entendesse que a notificação da liquidação não continha a sua fundamentação sempre poderia fazer uso do disposto no artigo 37º do CPPT, o que não aconteceu, embora lhe tenham sido facultados todos os esclarecimentos adicionais que solicitou, como, aliás, bem se deu conta na sentença a quo.
P) Daí que não ocorra, no caso dos autos, o apontado vicio de forma, por falta de fundamentação da liquidação.
Q) Estando expressamente referidos no acto os elementos indispensáveis à formação de um correcto juízo de valor, não se omitindo os fundamentos que, de acordo com as bases legais, permitiram aferir do acerto jurídico do acto final, o mesmo está fundamentado existindo, insofismavelmente, o mesmo nexo lógico que entre as premissas de um silogismo e a sua conclusão.
R) A liquidação aqui posta em crise advém da constatação da existência de várias contas correntes entre os sócios e a sociedade aqui impugnante, relativos a empréstimos efectuados pelos sócios à sociedade passíveis de tributação em IS em conformidade com a verba 17.1.4 da Tabela Geral de IS – cfr. capítulo 111.2 do referido Relatório e do ponto 2 da informação prestada pelos SIT já juntos aos autos, sob doc. 4 da p.i..
S) Propugna a impugnante a ilegalidade da liquidação porquanto, em seu entender, “os empréstimos dos sócios à sociedade beneficiam de isenção de IS, nos termos do artigo 7º/n,º1 do CIS” nas situações das i), g) e h) – cfr. art. 16 da p.i..
T) Admite, e bem, a impugnante que a isenção prevista na alínea i) do n.º 1 do art. 7º do CIS “não tem, de facto, aplicação na situação dos autos, por não estar cumprido o requisito de permanência pelo período mínimo de um ano”.
U) Com efeito, nos termos daquela alínea, os empréstimos com as características de suprimentos feitos pelos sócios à sociedade beneficiam de isenção de IS, sob a dupla condição de ser estipulado um prazo inicial de reembolso não inferior a um ano e de o mesmo não ocorrer antes desse prazo.
V) A verificação desta hipótese implica a caducidade da isenção e o consequente nascimento da obrigação tributária que, de acordo com a alínea m) do art. 5º do CIS, se constitui no momento do reembolso.
W) O devedor do imposto é, nos termos do disposto nos art.s 2º, n.º 1 al. d) e 3º, n.º 3 al. f) do CIS, o utilizador do crédito, neste caso, a sociedade, que é, igualmente, obrigada à liquidação e entrega nos cofres do Estado do imposto devido.
X) Quanto à argumentação de que se aplicaria a isenção prevista na al. h), conjugada com a al. g) do art. 7º, n.º 1 do CIS, tal não poderá proceder porquanto tais dispositivos se aplicam, tal como decorre da letra da lei, a sociedades de capital de risco (SCR) a favor de sociedades em que detenham participações, bem como a sociedades gestoras de participações sociais (SOPS) a favor de sociedades por elas dominadas ou a sociedades em que detenham participações, e, bem assim, efectuadas em benefício da sociedade gestora de participações sociais que com ela se encontrem em relação de domínio ou de grupo.
Y) Ou seja, nos termos desta al. g), estão isentas de imposto a que se refere o n.º 17 da Tabela geral de IS, as operações financeiras, incluindo os respectivos juros, efectuadas por sociedades gestoras de participações sociais (SGPS) e sociedades de capital de risco (SCR) a favor das sociedades dominadas (vd. Art. 486º do CSC) ou em que legalmente detenham participações.
Z) É condição da isenção, porém, que as operações não excedam o prazo de um ano e se destinam exclusivamente à cobertura de carência de tesouraria. Nas mesmas condições, beneficiam também de isenção as operações de tesouraria e respectivos juros, efectuadas pelas sociedades participadas em benefício da sociedade gestora de participações sociais, desde que com esta se mantenham em relação de domínio ou de grupo.
AA) Não podendo, pois, a sua interpretação ser dissociada, não pode a aqui impugnante ver a sua situação subsumida na previsão aí consagrada, nem olvidado o facto de a mencionada al. h) referir expressamente “As operações, incluindo os respectivos juros, referidas na alínea anterior (...)”.
BB) As isenções referidas nesta al. h) incluem assim, para além das operações financeiras, os respectivos juros, implicando esta referência que o seu âmbito é extensivo, mas às operações realizadas entre instituições de crédito e outras entidades financeiras a sociedades participadas.
CC) Não se verificando a ilegalidade sentenciada, a douta sentença padece de erro de julgamento no âmbito da valoração da prova produzida e na aplicação do direito, por violação ao disposto no 7º, n.º 1 al. g) e h) do CIS e respectiva Tabela Geral, bem como do art. 77º da LGT e 62º do RCPIT, devendo considerar-se válido o acto tributário de liquidação e, como tal, manter-se na ordem jurídica.»
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1.5. A recorrida contra-alegou, sem concluir, pugnando pela improcedência do recurso e sustentando, em síntese, que o recurso apenas versa sobre matéria de direito.
Nos artigos 6 a 25 das suas alegações limita-se a tecer considerações e comentários de natureza jurídica, não explicitando onde e como fundamentou a liquidação impugnada pois que cabia à recorrente mostrar onde explicou porque liquidou o imposto em causa.
Que a AT não classificou os empréstimos do sócios à sociedade, nem como suprimentos, nem como operações financeiras tendo-se limitado a dizer que eram tributados nos termos do ponto 17.1.4 da tabela anexa ao CIS esquecendo-se de ver se beneficiavam ou não de isenção.
A recorrente sustenta que não se verifica a isenção que a recorrida entendia ser-lhe aplicável e que esta isenção apenas se aplica a sociedades de capital de risco e a sociedades gestoras de participações sociais.
Apesar de tal resultar do artigo 7º 1 g) contudo a alínea seguinte (h) estende a isenção das operações financeiras de curto prazo para cobertura de carências de tesouraria “aos detentores de capital social a entidades nas quais detenham directamente uma participação de capital não inferior a 10%.
Da conjugação destas alíneas resulta a mencionada isenção.
A recorrida beneficia desta isenção por possuir três sócios, cada um com 33,33% do capital social.
Quanto ao pressuposto de se tratar de operações financeiras para cobrir carências de tesouraria, a sua verificação resulta da simples consulta dos saldos que a tesouraria da recorrida apresenta no final de cada mês do exercício de 2004
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1.6. O TCAN decidiu julgar-se incompetente e competente o STA por o recurso questionar apenas matéria de direito.
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1.7. Recebidos os autos neste Supremo Tribunal, foi dada vista ao Ministério Público que emitiu a seguinte pronúncia:
«Insurge-se a Fazenda Pública contra a sentença do TAF de Penafiel de 25.05.2011 que, julgando procedente a impugnação, anulou as liquidações impugnadas. Fê-lo por considerar verificado o vício da falta de fundamentação acrescentando, no entanto, que se “os empréstimos revestem a denominação de operações de tesouraria de curto prazo, não superior a um ano, se essa realidade não foi sequer contestada pela administração tributária, então beneficiam da isenção de Imposto de Selo nos termos do art. 7º, n.º 1, alíneas g) e h) do CIS.
Nas Conclusões da sua Alegação de Recurso, que definem e delimitam o objecto do recurso, a recorrente sustenta que o acto de liquidação do imposto, bem como a liquidação dos juros compensatórios estão devidamente fundamentados. Sustenta, concretamente, que a sentença recorrida padece de erro de julgamento, por violação do disposto no art. 7º, n.º 1, als. g) e h) do CIS e respectiva Tabela Geral, bem como os arts. 77.º da LGT e 62.º do RCPIT.
Não se me afigura que assista razão à ora Recorrente.
Por imperativo constitucional e legal, todos os actos da Administração, susceptíveis de afectarem os direitos e interesses legítimos dos administrados, devem ser devidamente fundamentados.
A fundamentação deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito, equivalendo à falta de fundamentação a adopção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclarecem concretamente a motivação do acto (cfr., nomeadamente, o art. 268º, nº 3 da CRP e art. 77º, nº 2 da LGT).
A exigência da fundamentação dos actos administrativos tem em vista, além do mais, levar ao conhecimento dos interessados as concretas razões que os motivaram, de modo a possibilitar o seu acatamento ou a adequada e informada reacção administrativa ou contenciosa.
Essencial é que o discurso fundamentador esclareça as razões de facto e de direito que levaram a administração a praticar o acto, ou seja, que o mesmo dê a conhecer ao respectivo destinatário, de forma clara, suficiente e congruente, os motivos pelos quais o autor do acto proferiu determinada decisão e não outra.
O vício da falta de fundamentação é, pois, um vício de natureza formal.
No caso em apreço, a fundamentação produzida não dá a conhecer, com o detalhe que era exigível, a razão de ser do acto de liquidação do imposto, não possibilitando a adequada reacção administrativa ou contenciosa.
Com efeito, no que à fundamentação respeita, limita-se a AT a afirmar no relatório da acção inspectiva, sem concretizar, que se constatou “a existência de várias contas correntes entre sócios e a sociedade relativos a empréstimos efectuados pelo sócios à sociedade passíveis de tributação em imposto de selo em conformidade com a verba 17.1. 14”, circunstância que levou a impugnante a estruturar a sua argumentação impugnatória com base em meras hipóteses e deduções que formulou a partir do que vem referido no relatório da acção inspectiva, sem deixar de invocar a insuficiência deste ao nível da fundamentação.
A insuficiente fundamentação, equivalente à falta de fundamentação, determina a anulação do acto que dele padece, não havendo lugar, salvo melhor entendimento, ao conhecimento da alegada violação do art. 70.º, n.º 1, alíneas g) e h) do CIS pois que este vício vem invocado relativamente a um segmento da sentença recorrida de conteúdo meramente hipotético “Se os empréstimos (...)”, nele não se estribando a decisão anulatória,
Nesta conformidade, sem mais considerações, negando-se provimento ao presente recurso, sou de parecer que deverá ser mantida a decisão recorrida.».
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1.8. Colhidos os vistos legais cabe apreciar e decidir.
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2. A decisão recorrida deu como provada a seguinte matéria de facto:
«1.º - A ora Impugnante é uma sociedade por quotas que tem por actividade o comércio por grosso não especificado (CAE 51900, segundo a Ver. 2.1), encontrando-se na área do Serviço de Finanças da Trofa - doc. de fls.10 dos autos.
2.° - Por ofício de 11.06.2008, com a referência n.º 43499/0607, remetido pelo Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças do Porto, foi a ora Impugnante notificada, nos termos do art. 77º da Lei Geral Tributária (LGT) e do art. 62º do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária (RCPIT) do Relatório de Inspecção que acompanhava esta notificação - doc.de fls. 11 a 53 dos autos.
3 - No âmbito desse Relatório foram propostas várias correcções, designadamente em matéria de IS - cfr. Relatório de Inspecção (fls.13 a 48 dos autos).
4 - A ora Impugnante entendeu que o referido Relatório enfermava de algumas deficiências ao nível da sua fundamentação, e em 10.07.2008 remeteu aos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças do Porto requerimento em que solicitava que lhe fossem fornecidos todos os elementos necessários ao cabal esclarecimento das correcções propostas, em sede de IR - cfr. doc. de fls. 49 a 53.
5 - Pelo ofício com a referência n.º 54975/0507, datado de 30.07.2088, proveniente dos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças do Porto, foram remetidos à Impugnante os elementos em falta - cfr. doc.de fls. 54 a 92 dos autos.
6 - A liquidação em causa decorre, quanto aos fundamentos invocados pela Administração Fiscal, da acção de inspecção desenvolvida pelos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças do Porto, cujas conclusões constam do Relatório de Inspecção.
7 - A liquidação em causa apresenta como data limite de pagamento o dia 28.07.2008.».
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3.1. Sustenta a recorrente FP, na conclusão D das suas alegações, que não pode conformar-se com a sentença recorrida por entender que a mesma incorreu em erro de julgamento quer no tocante à matéria de facto (insuficiência desta, sem delimitação adequada dos factos relevantes para a solução) quer em matéria de direito.
Afirmou a recorrida, fls. 229, que se dirige ao TCAN “por a recorrente referir, nas suas alegações que o recurso interposto versa sobre matéria de facto e de direito” acrescentando que “se é certo que … a recorrente ataca a matéria de facto, também é certo que posteriormente não aponta qual o concreto facto que pretende ver alterado”.
Concorda-se com a recorrida pois que apesar de a recorrente afirmar, de forma vaga e genérica que o recurso interposto versa sobre matéria de facto não individualiza qual o concreto facto ou factos que pretende ver alterado.
Conclui-se, por isso, que no presente recurso não se questiona matéria de facto sendo, por isso, da competência deste STA apreciar o presente recurso.
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3.2. A sentença recorrida anulou a liquidação impugnada, por não se encontrar a mesma fundamentada, afirmando o seguinte:
“Resulta do relatório da acção inspectiva junto a fls. 13 a 42 dos autos que, a administração tributária fundamentou a liquidação pela seguinte forma:
Constatou-se a existência de várias contas correntes entre os sócios e a sociedade relativas a empréstimos efectuados pelos sócios à sociedade passíveis de tributação em Imposto de Selo em conformidade com a verba 17.1.4.
Para cálculo do imposto de selo em falta aplicou-se a taxa de...à média mensal obtida através da soma dos saldos valor...».
No Parecer junto no PA diz-se que a AF concluiu, sem menção expressa, não haver lugar à aplicação da isenção prevista na alínea g) e h) do art. 7º do CIS.
No mesmo Parecer diz-se que a sociedade impugnante deduziu que seria devido imposto do selo quando aos créditos concedidos pelos seus sócios à sociedade pela circunstância de, relativamente a alguns desses valores, ter havido devolução dos mesmos antes de decorrido um ano, donde se concluir não haver lugar à referida isenção.
De acordo com a posição defendida pela Impugnante, os empréstimos concedidos pelos sócios à sociedade beneficiam de isenção de imposto do selo nos termos do art. 7º, n.º 1, alíneas i), g) e h) do CIS.
Os empréstimos com a categoria de suprimentos estão isentos se for estipulado um prazo mínimo de um ano e não forem reembolsados antes de decorrido esse prazo - alínea i).
As operações financeiras estão igualmente isentas desde que celebradas por período não superior a um ano e se destinem exclusivamente à descoberta de carências de tesouraria - alíneas g) e h).
A administração tributária não classificou os empréstimos dos sócios à sociedade, nem como suprimentos, nem como operações financeiras.
Limitou-se a dizer que eram tributadas nos termos do ponto 17.1.4 da Tabela anexa ao CIS esquecendo-se de ver se beneficiavam ou não de isenção.
A administração tributária devia ter fundamentado de forma expressa que aquela isenção não tinha lugar.
Assim, a liquidação sofre de vício de falta de fundamentação, o que determina a sua anulabilidade nos termos do art. 135º do CPA.
O acto administrativo encontra-se indevidamente fundamentado.”.
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3.3. Resta, por isso, determinar se o acto de liquidação impugnado se encontra fundamentado, como sustenta a FP, ou se sofre de vício de falta de fundamentação como decidiu a sentença recorrida, com a concordância da recorrida e do MP.
Concorda-se que o direito à fundamentação dos actos administrativos e tributários que afetem direitos ou interesses legalmente protegidos resulta de uma imposição constitucional, nos termos do nº 3 do artigo 268º da Constituição da República.
Por força do artigo 153º 1 (anterior artigo 125º n.º 1) do CPA, a fundamentação deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão, podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, que constituem, neste caso, parte integrante do respetivo ato.
Nos termos do n.º 2 deste mesmo preceito legal, equivale à falta de fundamentação a adoção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do ato.
Por força do artigo 77º, n.º 1 da LGT, a decisão do procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integram o relatório da fiscalização tributária.
Por força do n.º 2 desta última disposição legal a fundamentação dos atos tributários pode ser efetuada de forma sumária, devendo sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo.
Importa, por isso, determinar se o ato de liquidação questionado se encontra fundamentado.
Como consta do ponto anterior (3.2) a administração tributária fundamentou a liquidação por haver constatado a existência de várias contas correntes entre os sócios e a sociedade relativas a empréstimos efetuados pelos sócios à sociedade, passíveis de tributação em Imposto de Selo em conformidade com a verba 17.1.4, pelo que aplicou, para cálculo do imposto de selo em falta, a taxa identificada à média mensal obtida através da soma dos saldos referidos.
Acrescentou a AT, no Parecer junto no PA, que não havia lugar à aplicação da isenção prevista na alínea g) e h) do artigo 7º do CIS e que seria devido imposto do selo quando aos créditos concedidos pelos seus sócios à sociedade pela circunstância de, relativamente a alguns desses valores, ter havido devolução dos mesmos antes de decorrido um ano.
Sustentava a impugnante e ora recorrida que os empréstimos concedidos pelos sócios à sociedade beneficiam de isenção de imposto do selo, nos termos do artigo 7º, n.º 1, alíneas i), g) e h) do CIS.
Os empréstimos com a categoria de suprimentos estão isentos do imposto liquidado se for estipulado um prazo mínimo de um ano e não forem reembolsados antes de decorrido esse prazo - alínea i).
Igualmente estão isentas as operações financeiras desde que concretizadas por período não superior a um ano e se destinem exclusivamente à cobertura de carências de tesouraria - alíneas g) e h).
Como se escreveu na sentença recorrida a administração tributária não classificou os empréstimos dos sócios à sociedade, nem como suprimentos, nem como operações financeiras tendo-se limitado a dizer que eram tributadas nos termos do ponto 17.1.4 da Tabela anexa ao CIS, esquecendo-se de ver se beneficiavam ou não de isenção.
Concorda-se, por isso, com a sentença recorrida quando refere que a administração tributária devia ter fundamentado de forma expressa que aquela isenção não tinha lugar.
Acompanha-se, ainda, a sentença recorrida quando afirma que o ato administrativo se encontra indevidamente fundamentado e que a liquidação sofre de vício de falta de fundamentação, o que determina a sua anulabilidade.
Neste sentido se pronuncia o MP quando afirma que a fundamentação produzida não dá a conhecer, com o detalhe que era exigível, a razão de ser do ato de liquidação do imposto pois que se limita a afirmar no relatório da ação inspetiva, sem concretizar, que se constatou a existência de várias contas correntes entre sócios e a sociedade relativos a empréstimos efetuados pelo sócios à sociedade passíveis de tributação em imposto de selo em conformidade com a verba 17.1.4, circunstância que levou a impugnante a estruturar a sua argumentação impugnatória com base em meras hipóteses e deduções que formulou a partir do que vem referido no relatório da ação inspetiva, sem deixar de invocar a insuficiência deste ao nível da fundamentação.
Acompanha-se, ainda, o MP quando afirma que a insuficiente fundamentação, equivalente à falta de fundamentação, determina a anulação do ato que dele padece, não havendo lugar ao conhecimento da alegada violação do artigo 7º, n.º 1, alíneas g) e h) do CIS pois que este vício vem invocado relativamente a um segmento da sentença recorrida de conteúdo meramente hipotético “Se os empréstimos (...)”, nele não se estribando a decisão anulatória.
Entende-se, por isso, que o recurso não merece provimento.
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Ocorre falta de fundamentação se a AT não classificou os empréstimos dos sócios à sociedade, nem como suprimentos, nem como operações financeiras e se limitou a afirmar que eram tributadas nos termos do ponto 17.1.4 da Tabela anexa ao CIS.
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4. Face ao exposto acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, em conferência, em negar provimento ao recurso.
Custas pela recorrente FP.

Lisboa, 21 de fevereiro de 2018. – António Pimpão (relator) – Ascensão Lopes – Ana Paula Lobo.