Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0146/20.9BALSB
Data do Acordão:05/26/2021
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:ANÍBAL FERRAZ
Descritores:UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO
Sumário:I - É inviável recurso para uniformização de jurisprudência, quando ocorre, manifesta, ausência de identidade, substancial, entre as situações fácticas, versadas nos arestos em confronto.
II - As questões de valoração da prova não podem servir de fundamento ao recurso para uniformização de jurisprudência.
Nº Convencional:JSTA000P27770
Nº do Documento:SAP202105260146/20
Data de Entrada:12/11/2020
Recorrente:A..............., S.A.
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA), com sede em Lisboa;
# I.

A………………, S.A., …, ao abrigo do disposto nos artigos (arts.) 25.º n.ºs 2 a 4 e 26.º do Decreto-Lei (DL.) n.º 10/2011 de 20 de janeiro, que estabeleceu o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAMT) e 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), interpôs, para o Pleno da Secção de Contencioso Tributário, do Supremo Tribunal Administrativo, recurso, objetivando uniformização de jurisprudência, da decisão proferida, no âmbito de pedido de pronúncia arbitral, formulado no processo nº 871/2019-T, do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), a qual julgou improcedente o pedido arbitral (“legalidade dos actos de liquidações adicionais em IRC com o n.° 20178310027866. no montante de € 328.207,29 e n.º 20178310027872, no montante de € 23.316,00, referentes a 2013 e 2014, a que acresceram os correspondentes juros compensatórios, no quantitativo total de € 386.686,79”).
Aponta-lhe contradição/oposição com o decidido na, também, decisão arbitral (colegial), datada de 21 de novembro de 2017, emitida no processo nº 198/2017-T, do CAAD.

A recorrente (rte) apresentou alegação, finalizada com as seguintes conclusões: «

1.ª O primeiro objetivo do presente recurso, que constitui também o seu fundamento e os seus pressupostos, é obter a uniformização da jurisprudência face a decisões arbitrais opostas proferidas sobre situações tributárias idênticas quanto aos factos, quanto aos períodos tributários e quanto ao direito aplicável;

2ª O presente recurso incide sobre o mérito da decisão recorrida visando obter a sua anulação e uma nova decisão que reconheça que os custos suportados pela recorrente, junto de uma empresa sediada em Hong Kong, para obter a venda de fracções autónomas a cidadãos chineses, não constituíram qualquer fraude ou evasão fiscal tendo antes correspondido a uma operação efectiva e verdadeira de promoção do seu empreendimento imobiliário e de angariação de clientes e que os seus montantes não foram anormais nem exagerados;

3ª Para sustentar as suas pretensões a recorrente vem requerer uma reanálise da prova documental e testemunhal que foi apresentada no processo arbitral pela recorrente e pela recorrida (processo administrativo) e que, como supra demonstrado, não foi devidamente valorada e interpretada pelo tribunal arbitral que proferiu a decisão recorrida;

4.ª A requerida reanálise da prova produzida no processo visa desde logo responder à questão essencial que motivou o indeferimento do pedido arbitral sobre o que deve entender-se por “operações efetivamente realizadas” ou nas expressões utilizadas pela decisão arbitral recorrida o que deve entender-se por “efetividade das operações” ou por “efetiva prestação de serviços” (vd. supra alegações 14.ª, 15.ª, 19.ª e 20.ª);

5.ª Ora, como está demostrado no processo (vd. supra alegação 28.ª) para o tribunal arbitral, em linha com a posição da AT (vd. números 46 e seguintes da Contestação junta a páginas 128 da certidão do CAAD), só seria aceitável a dedução fiscal dos gastos incorridos com a promoção do empreendimento e angariação de clientes no mercado chinês se fosse feita prova da realização material de publicidade na China e se fossem comprovados os vários gastos com a vinda dos chineses a Portugal, caso em que, aí sim, segundo esses entendimentos é que estaríamos perante “operações efetivamente realizadas”, “efetividade das operações” ou “efetiva prestação de serviços”.

6.ª Para o tribunal arbitral que proferiu a decisão recorrida, a situação de crise vivida em 2012 e 2013, o contexto económico-financeiro em que a ora recorrente celebrou o contrato com a B…….. sediada em Hong Kong (que contratualmente angariou e suportou as despesas com a vinda dos chineses), a prova da vinda de 119 clientes chineses visitar o empreendimento (vd. supra alegação 67.ª) dos quais sete fizeram compras de frações autónomas, os proveitos efetivos gerados na esfera da Requerente, entre outras provas, nada disso contou, o que era necessário, para demonstrar a “efetividade das operações”, na aceção referida na conclusão anterior, era provar as campanhas de publicidade nos jornais e nas televisões chinesas e as despesas com a vinda dos chineses;

7.ª Sobre a prova da publicidade na China e o absurdo e inutilidade desse tipo de prova para demonstrar a efetividade dos serviços remete-se para as alegações supra, mormente para 36.ª e 37.ª, e sobre os gastos com a vinda dos chineses que foram suportados pela contraente B………… e não pela recorrente, como exemplo de exigências igualmente inadequadas e inúteis, remete-se nomeadamente para as alegações 21.ª, 29.ª e 30ª;

8.ª Como se demonstra pela análise das provas produzidas e pelo apelo a uma interpretação racional dessas provas (vd. supra alegações 29.ª e seguintes) aceita-se a exigência de prova clara, efetiva e convincente, no sentido de mostrar a materialidade da operação, de mostrar que os pagamentos não foram ilícitos ou fraudulentos, de mostrar que os gastos incorridos incrementaram os proveitos da recorrente (como o relatório de inspecção até fez - vd. alegações 32.ª a 34.ª), mas seria um absurdo exigir provas desnecessárias e inúteis e que pouco ou nada demonstrariam sobre a tal reivindicada “efetividade das operações”;

9.ª A recorrente reconhece que o tribunal arbitral não tinha o dever de pronúncia sobre toda a matéria de facto apresentada e que o princípio da livre apreciação da prova lhe dá algum poder de apreciação subjectiva. Porém esse poder não pode ser arbitrário nem lhe permite fazer tábua rasa de um conjunto de factos que, se devidamente analisados e ponderados à luz de critérios de bom senso e do conhecimento comum, levariam certamente a uma decisão diversa da que foi proferida (vd. reanálise das provas nas alegações 41.ª a 55.ª);

10.ª Um bom exercício sobre a utilização das regras do bom senso e do conhecimento comum na análise da operação sub judice seria uma comparação entre o contrato de promoção e angariação celebrado entre a ora recorrente e a B…………. e a generalidade dos contratos de venda de imóveis no mercado nacional em que qualquer empresa ou particular que pretenda vender os seus imóveis, em regra, entrega o “serviço de venda” a uma empresa especializada, que é totalmente autónoma quanto à publicitação que faça dos mesmos e em que a comissão de intermediação, como aconteceu neste contrato, só é devida e paga em caso de sucesso;

11.ª Sobre outra razão conexa com a motivação que levou à improcedência da decisão arbitral recorrida, a de que não foi feita prova que a B………, a quem foram pagas as comissões referentes às frações autónomas vendidas a chineses, teve intervenção nessas vendas, nas alegações 64.ª e seguintes demonstra-se como, mais uma vez, a decisão recorrida revela um claro déficit de analise das provas do processo arbitral (incluindo do processo administrativo), neste caso não levando em conta os documentos e também o facto de se tratar de um dado que não foi controvertido pela AT que até fez um reconhecimento expresso dessa intervenção (vd. transcrição na alegação 66.ª);

12.ª E também se anota outra motivação insustentável da decisão recorrida, aqui em linha com a posição da AT, que invocou que a B…………. não teve intervenção nas vendas a chineses porque, como observa, até as escrituras de compra e venda dizem que não houve mediação imobiliária nessas vendas (vd. supra alegações 70.ª e 71.ª);

13.ª Esta invocação de conferir valor a meras denominações, aqui no sentido em que extraiu a conclusão de que a B……….. talvez não tivesse tido intervenção nas vendas a chineses porque nas escrituras não foi mencionada como mediadora imobiliária, sem atender ao que já tinha sido esclarecido nas alegações subsequentes à produção da prova testemunhal no sentido que, em 2013 e 2014, a mesma não tinha ainda legalizado o seu processo de mediadora face à legislação nacional (vd. supra alegação 55.ª) mostra outra nota que presidiu à decisão recorrida de fazer prevalecer a forma e as aparências em vez de tentar atingir a verdade material, como lhe competia (vd. alegações 72.ª e seguintes);

14.ª Para demonstrar a falta de consistência com que a decisão recorrida sustentou o seu julgamento é pertinente observar como invocou algumas decisões judiciais proferidas sobre situações tributárias idênticas e sobre a questão da valoração da prova, o que é feito supra nas alegações 77.ª e seguintes, para onde se remete;

15.ª Invoca-se finalmente a parte do pedido arbitral, sobre a qual a decisão recorrida não se pronunciou, conexa com a exigência legal de se provar que os pagamentos à entidade offshore B………….. não foram anormais nem exagerados face aos serviços adquiridos;

16.ª A presente petição, mormente nas alegações 85.ª a 90.ª, apresenta razões válidas, no seu entender, para demonstrar que o requisito da normalidade e do não exagero da comissão de 15% que pagou a quem lhe prestou um efectivo serviço de vendas que incrementaram os seus proveitos, como supra se invocou, em mais de cinco milhões de euros (vd. supra alegação 32.ª).

17.ª Em conclusão final e como fica amplamente demonstrado foram assim violados os artigos do Código do IRC, n.º 65.º, n.º 1 in fine, na sua redação vigente em 2013, e n.º 23.º-A, n.º 1, alínea r) in fine, na sua redação vigente em 2014, o artigo 99.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária, o artigo 123.º, n.º 2, do Código de Procedimento e de Processo Tributário e o artigo 607.º, números 4 e 5 do Código de Processo Civil aplicável ex vi do artigo 2.º, alínea e), daquele Código.

DOS PEDIDOS

Nestes termos e nos que doutamente não deixarão de ser supridos, perante a invocada e demonstrada oposição de decisões arbitrais e perante a igualmente demonstrada interpretação errada que a decisão arbitral recorrida fez da prova produzida no processo administrativo e também no processo arbitral onde foi proferida, bem como da errada declaração do direito aplicável, requer-se que seja proferida uma nova decisão, em substituição e anulando a decisão arbitral recorrida, e se uniformize a jurisprudência em conformidade, decidindo que a efectividade das operações a que se referem os artigos do Código do IRC, n.º 65.º, n.º 1 in fine, na sua redacção vigente em 2013, e n.º 23.ºA, n.º 1, alínea r) in fine, na sua redacção vigente em 2014, aplicável a um contrato de promoção de imóveis e angariação de clientes chineses para compra desses imóveis, celebrado com uma entidade sediada num território de baixa tributação, exige que seja demonstrado que os imóveis eram da propriedade do sujeito passivo adquirente desses serviços, que a sua venda efectiva decorreu da celebração do contrato, que o pagamento das comissões ficou subordinado à venda dos imóveis e que essas vendas incrementaram o lucro tributável do seu proprietário em medida adequada.

Mais se requer que a decisão que vier a ser proferida supere a omissão da decisão arbitral recorrida, declarando que as comissões pagas por um integral e efetivo serviço de vendas a clientes chineses não tiveram, dadas as condições em que foram acordadas, um carácter anormal nem foram de montante exagerado. »


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Por despacho do relator, foi o recurso admitido, liminarmente, com efeito suspensivo, nos termos do art. 26.º n.º 1 do RJAMT.

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A recorrida (rda), autoridade tributária e aduaneira (AT), contra-alegou e concluiu: «

1) No presente recurso não se verificam os pressupostos, contemplados nos arts. 25º nº 2 do RJAT, 152º nº 2 do CPTA e 27º nº 1, al. b) do ETAF, que permitam a apreciação de recurso para uniformização de jurisprudência interposto por A…………. SA.

2) Diga-se, antes de mais, que as conclusões do presente recurso não se adequam ao meio processual utilizado configurando, antes de mais, um mero recurso, em segundo grau de jurisdição, para reapreciação da matéria de facto, o que determina, liminarmente, a não admissibilidade do presente recurso.

3) No caso em concreto, a recorrente pretende que o STA proceda a uma reapreciação da matéria de facto, o que está claramente fora do âmbito do presente recurso para uniformização de jurisprudência.

4) Na verdade, assentando os sentidos das decisões, recorrida e fundamento, em diferente valoração da prova produzida nos respectivos processos, no âmbito do exercício do poder de livre apreciação que ao tribunal é conferido (art. 607º, nº 5 CCivil), na esteira do Acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário de 27.06.2018, proferido no Recurso n.º 165/18 (Em sentido idêntico se pronunciaram os Acórdãos do Pleno da Secção de Contencioso Tributário de 06.06.2106, recurso 63/16 e de 14.12.2016, recurso 535/16), «as questões de valoração da prova não podem servir de fundamento ao recurso para uniformização de jurisprudência. A oposição entre os arestos situa-se num plano simplesmente de facto (…).Essa discrepância verifica-se em sede de julgamento de facto, pelo que não pode afirmar-se que as decisões em confronto tenham decidido a mesma questão fundamental de direito em sentido divergente, divergência essa que poderia servir de fundamento ao presente recurso para uniformização de jurisprudência.»

5) Atendendo à matéria de facto dada como provada em ambos os acórdãos, verifica-se que o que esteve em causa no Ac. recorrido foi uma desconsideração da prova testemunhal e também documental efectuada que se considerou como insuficiente para comprovar a efectividade das operações, enquanto no Ac. fundamento se considerou a prova aí realizada, documental e testemunhal, suficiente para comprovar e convencer o Tribunal sobre a efectividade das operações.

6) Assim, a diferente solução a que se chegou nos Acórdão recorrido e fundamento, verifica-se em sede de julgamento de facto, deste modo, não existe qualquer oposição sobre a questão fundamental de direito, uma vez que não há qualquer divergência sobre a interpretação e aplicação das normas em confronto, art. 65º do CIRC na redacção aplicável ao exercício de 2013 e art. 23º-A, nº 1 al. r) do mesmo CIRC na redacção aplicável ao exercício de 2014.

Acresce que:

7) Nem sequer se pode falar em diferente consideração dos meios de prova que foram dados como necessários a demonstrar a efectividade das operações.

8) Contrapondo o deliberado em ambos os Acórdãos, recorrido e fundamento, facilmente se conclui que também quanto aos concretos meios de prova que os Tribunais considerariam como aptos a demonstrar a efectividade das operações, não existe qualquer contradição.

9) Donde, não havendo identidade de situações de facto, constata-se que os Acórdãos, recorrido e fundamento, não perfilharam solução jurídica diferente quanto à mesma questão fundamental de direito, que, aliás diga-se, nem sequer é identificada claramente, como se impunha, pela recorrente.

Por outro lado, ainda,

10) Também não só não pode o recurso para uniformização de jurisprudência servir para reapreciar a matéria de facto decidida pelo Tribunal Arbitral, como também, não pode o STA em sede deste recurso decidir em substituição superando “a omissão da decisão arbitral recorrida, declarando que as comissões pagas por um integral e efetivo serviço de vendas a clientes chineses não tiveram, dadas as condições em que foram acordadas, um carácter anormal nem foram de montante exagerado”, como pretende a recorrente.

D) Do pedido de dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça:

Atendendo ao facto de o valor do recurso ser superior a € 275.000,00 requer-se que esse Venerando Tribunal se pronuncie e decida, a final, pela dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, atendendo a que estamos em sede de recurso para uniformização de jurisprudência, que não há lugar à produção de prova testemunhal e que ao Tribunal se pede que analise e decida sobre questão que não se afigura revestir grande complexidade, cfr. art. 6º nº 7 do RCP.

Nestes termos, e nos mais de direito, deve o presente recurso para uniformização de jurisprudência ser julgado findo, não se tomando conhecimento do mesmo, por não se encontrarem reunidos os requisitos que permitem a admissão do recurso para efeitos de uniformização de jurisprudência, nos termos do disposto no artigo 152.º do CPTA.

Caso assim não se entenda, deverá o presente recurso ser julgado totalmente improcedente, com todas as legais consequências. »


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A Exma. magistrada do Ministério Público, notificada, emitiu pronúncia, nos termos e para os efeitos do art. 146.º n.º 1 do CPTA, onde conclui “no sentido do não conhecimento do presente recurso”.

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Cumpridas as formalidades legais, compete conhecer e decidir.

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# II.


A decisão arbitral recorrida (acórdão recorrido) efetuou julgamento factual, da forma que se transcreve: «

4. No que diz respeito à factualidade com relevo para a decisão da causa consideram-se provados os seguintes factos:

a) A Requerente é uma sociedade anónima de direito português registada com o NIPC …………, com sede social na Alameda …………, lote …, piso ….., sala ….., ….., Santo António dos Cavaleiros, concelho de Loures, encontrando-se enquadrada no regime geral de tributação, sendo o seu período de tributação coincidente com o ano civil.

b) O objeto social consiste na compra, venda, compra para revenda, construção e exploração de prédios rústicos e urbanos, gestão de urbanizações e compra e venda de participações sociais, tendo como principais clientes cidadãos da República Popular da China, a que corresponde o CAE Principal 41100 e o CAE Secundário 68100, cfr. certidão permanente constante do PA.

c) No ano de 2007 adquiriu dois edifícios contíguos, na cidade de Lisboa, tendo em vista a reabilitação dos mesmos através de 19 novos fogos habitacionais, dois espaços comerciais e 35 estabelecimentos cobertos, correspondentes a 21 frações urbanas, tendo o início das obras ocorrido no 2º semestre de 2007 e a conclusão no 1º semestre de 2010.

d) O prédio reabilitado, afecto ao regime de propriedade horizontal, encontra-se situado em …….., …….., números ….., ……. e …… e Travessa …………., números …. e ……, freguesia de Santa Catarina, concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número 534 e inscrito na respetiva matriz predial sob o artigo ……

e) A fase de comercialização começou no último trimestre de 2009, faltando, no início de 2013, vender 13 frações.

f) Em 15 de Abril de 2013 a Requerente celebrou um contrato de prestação de serviços com a B………. Co. Limited, com sede em ………….. ………. ….-…., ……….., Hongkong, redigido em inglês, tendo em vista a venda das referidas frações autónomas, englobando a prestação de serviços de publicidade e divulgação na China; pagamento das despesas de deslocação, alojamento, alimentação e outras despesas com a estada dos potenciais clientes nas visitas aos imóveis; auxilio na obtenção de vistos para entrada e estadia em Portugal; contratação de motoristas para os acompanhar permanentemente em Portugal: serviços de intérprete; acompanhamento na abertura de contas: após a aquisição dos imóveis assistiam na decoração dos imóveis, ligação de eletricidade, água e gás; e contratação de advogados, estabelecendo unicamente o pagamento em regime de sucesso, do valor correspondente a 15% do valor de cada negócio imobiliário, não existindo qualquer pagamento fixo de honorários, cfr. documento constante do PA.

g) A Região Administrativa de Hongkong encontra-se submetida a um regime fiscal claramente mais favorável em virtude de constar da lista aprovada pela Portaria n.° 150/2004, de 13 de Fevereiro, do Ministro das Finanças, alterada pela Portaria n.° 292/2011, de 8 de Novembro.

h) No ano de 2013 foram vendidas as fracções autónomas identificadas pelas letras “C”,“F”, “I”, “N”, “P” e “T”, constando das respetivas escrituras que as transacções foram realizadas sem a intervenção de qualquer mediadora imobiliária, cfr. documentos juntos ao PA.

Foi ainda vendida a fracção autónoma identificada pela letra “O’’, com mediação da “Porta da Frente”, sendo a comissão de 7% (€ 870 000.00 (preço venda) x 7% (comissão) x 1.23 IVA), cfr. mapa constante do artigo 51.° do ppa.

i) No ano de 2014 foi vendida a fracção autónoma identificada pela letra “B”, constando da respetiva escritura que a transacção foi realizada sem a intervenção de qualquer mediadora imobiliária, cfr. documento constante do PA.

Foi ainda vendida a fracção autónoma identificada pela letra “G”. com mediação da “C…………….. Portugal”, sendo a comissão de 5% (€ 855 000,00 (preço venda) x 5% (comissão) x 1.23 IVA), cfr, mapa constante do artigo 51.º do ppa.

j) No ano de 2013 a Requerente contabilizou como gastos do exercício a importância de € 729 375.00, na qualidade de cliente da prestadora de serviços antes referida B…………………. Co. Limited, correspondente às seguintes facturas nas quais tem como descritivo “Marketing Consulting” seguido dos nomes dos adquirentes das fracções, cfr. documentos constantes do PA:

[segue imagem, aqui dada por reproduzida]

k) No ano de 2014 a Requerente contabilizou como gastos do exercício a importância de € 52.250.00, na qualidade de cliente da mesma prestadora de serviços, correspondente à factura n.° 010/2014, na qual tem como descritivo “Marketing Consulting ………..”. cfr. documento constante do PA.

l) Em 12-07-2014 a Requerente apresentou a declaração de rendimentos modelo 22 de IRC, relativa ao ano de 2013, tendo declarado um prejuízo para efeitos fiscais de € 1 259 314,94, cfr. documento constante do PA.

m) E em 27-05-2015 apresentou idêntica declaração do ano de 2014, tendo declarado um lucro tributável de € 2 033 623.68, cfr. documento constante do PA.

n) Em 16 de Abril de 2012 (Resolução da Assembleia da República n.° 49/2012) foi publicado o acordo entre a República Portuguesa e a Região Administrativa Especial de Hong Kong da República Popular da China para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o Rendimento, assinado em Hong Kong em 22 de Março de 2011. Para este efeito a Requerente apresentou o modelo 21 -RFI, cfr. documento constante do PA.

o) Tendo por referência os referidos períodos, a AT, no período de 11 de outubro e 2 de dezembro de 2016, promoveu uma ação de inspeção externa, a coberto das ordens de serviço n.°s OI201603912 e OI201603913, para controlo de sujeitos passivos com venda de imóveis de valores elevados, tendo efetuado correções aritméticas ao lucro tributável, de € 729.375,00 e € 50.250.00, dos exercícios de 2013 e 2014, respetivamente, bem como liquidado imposto relativo a tributação autónoma nos valores de € 328.218.75 e € 23.316,00 relativamente aos mesmos períodos, cfr. PA.

p) A fundamentação para as liquidações assenta essencialmente na desconsideração dos gastos com os serviços prestados de publicidade (Marketing Consulting) pela pessoa coletiva B…………………. Co. Limited, com sede na Região Administrativa Especial de Hong-Kong, por não verificação da sua indispensabilidade, nos termos do n.° 1 do artigo 65º e alínea r), n.° 1 do artigo 23.°-A, ambos do CIRC, por referência aos anos de 2013 e 2014, respetivamente, cfr. PA.

q) Por se tratar de entidade com residência em território submetido a um regime fiscal claramente mais favorável, a AT considerou que as despesas em causa não são fiscalmente aceites como gasto do exercício, ficando sujeitas a tributação autónoma à taxa de 35%, conforme o disposto nos n.°s 1 e 8 do artigo 88º do CIRC, sendo que, quanto ao ano de 2013, a tributação foi onerada em 10 pontos percentuais, nos termos do nº 14 do mesmo artigo, por ter sido apresentado prejuízo fiscal, cfr. PA.

r) Em 11 de Outubro de 2016 a Requerente foi notificada nos termos e para os efeitos previstos no nº 4 do artigo 65º do CIRC, relativamente aos exercícios de 2013 e 2014, cfr. documento constante do PA.

s) Nos termos do artigo 60º da LGT e do RCPITA, a Requerente foi notificada do projeto do RIT para exercer, querendo, o direito de audição, cfr. ofício n.° 055081 dos Serviços de Inspecção Tributária da Direção de Finanças de Lisboa, de 05 de Dezembro de 2016, o que a mesma fez em 21 de dezembro de 2016, cfr. documento constante do PA.

t) Por despacho de 30 de Dezembro de 2016 da Chefe de Divisão dos referidos Serviços, no uso de poder subdelegado, a Requerente foi notificada do RIT, nos termos do artigo 62.° do RCPITA, bem como das correções, para mais, aos resultados fiscais declarados dos períodos de 2013 e 2014, nos montantes de € 729.375,00 e € 50.250,00. Respetivamente, cfr. documento nº 1 anexo ao ppa e constante do PA.

u) Relativamente ao período de 2013 foi Liquidado IRC, a título de tributações autónomas, nos termos dos nºs 1, 8 e 14 do artigo 88.° do CIRC, no montante de € 328.207.29 e respetivos juros compensatórios no montante de € 33.701,94, conforme liquidações n.°s 2017 8310027866 e 2017 00000040705, no total de € 361 909.23, devidamente notificado ao Requerente, cfr. documentos constantes do PA.

v) Relativamente ao período de 2014 foi liquidado IRC, a título de tributações autónomas, nos termos dos n.°s 1 e 8 do artigo 88º do CIRC, no montante de € 23.316.00 e respetivos juros compensatórios no montante de € 1.461.56, conforme liquidações n.°s 2017 8310027872 e 2017 00000041445, no total de € 24.777,56, devidamente notificado à Requerente, cfr. documentos constantes do PA.

w) Em 03 de Julho de 2017 a Requerente deduziu reclamação graciosa contra as liquidações ora impugnadas, nos termos dos artigos 68.° e seguintes do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), ao qual coube o n.° 1520201704001605.

x) Por despacho de 29 de Dezembro de 2017 do Diretor de Finanças Adjunto da Direção de Finanças de Lisboa, em regime de substituição, a Requerente foi notificada do indeferimento da reclamação graciosa através de oficio via CTT, de 02 de Janeiro de 2018, cfr. documento constante do PA.

y) Em 02 de Fevereiro de 2018 a Requerente interpôs recurso hierárquico do indeferimento da reclamação graciosa, nos termos do artigo 66.º do CPPT, ao qual coube o n.° 1520201810000041, cfr. documento constante do PA.

z) Por despacho de 19 de Setembro de 2019 da Subditetora-Geral Dra. …………., no uso de poder subdelegado, a Requerente foi notificada do indeferimento do recurso hierárquico através de oficio via CTT, de 20 de Setembro de 2019, cfr. documento nº 2 anexo ao ppa e constante do PA.

aa) Subjacente às liquidações adicionais está, principalmente, a desconsideração dos gastos relativos às faturas emitidas pela pessoa coletiva B……………… Co. Limited, no montante de € 729.375,00, referidas na antecedente alínea j), respeitantes ao período de 2013.

bb) Bem como da fatura n.° 010/2014, no montante de € 52.250,00, referidas na alínea k) supra, respeitantes ao período de 2014.

cc) Todas as faturas referidas nas antecedentes alíneas j) e k) têm como descritivo “Marketing Consulting” seguido do nome do adquirente da respectiva fracção.

dd) Em 19 de Dezembro de 2019 foi apresentado pedido de constituição de tribunal arbitral e de pronúncia arbitral tendo por objeto a declaração de ilegalidade das correções do lucro tributável e das subsequentes liquidações adicionais de IRC (tributação autónoma) e respectivos juros compensatórios respeitantes aos exercícios de 2013 e 2014.

Factos não provados

Não se encontra provado que as facturas emitidas pela pessoa coletiva “B……… Co. Limited” a que se referem as alíneas j) e k) do antecedente probatório tenham subjacente uma efetiva prestação de serviços no âmbito da promoção de imóveis ou angariação de clientes. »

Na decisão (arbitral) fundamento, foi relevada a seguinte matéria de facto: «

a) A Requerente encontra-se registada para o exercício da atividade principal de promoção imobiliária, CAE 41100, desde 02.01.2008 e ainda para o exercício de duas actividades secundárias - outras actividades de consultoria, científicas, técnicas e similares e arrendamento de bens imobiliários;

b) Com referência ao período de 2013 e 2014, foram promovidas acções inspectivas credenciadas pelas ordens de serviço n.º OI201602569 e OI201602570 emitidas pelos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Lisboa, nos termos do artigo 46.º do RCPITA (Regime Complementar do Procedimento da Inspeção Tributária e Aduaneira);

c) Tais ordens de serviço sido emitidas para comprovação e verificação das operações subjacentes aos pagamentos efectuados, nos anos em causa, em sede de IVA e de IRC, a entidades não residentes sujeitas a regime fiscal privilegiado, designadamente à mencionada B…………… Co. Limited, com sede em Hong Kong (doravante designada como “B……..”)

d) Nos anos em análise, a Requerente, no exercício da sua actividade, vendeu 34 fracções dos lotes 15A e 15B, correspondentes a dois empreendimentos sitos na Rua ……………. e na Rua ……………, em Lisboa, a 32 cidadãos de nacionalidade chinesa e a 2 de nacionalidade angolana;

e) Estas vendas foram realizadas por valores superiores aos do valor patrimonial do imóvel, estando relacionadas com a possibilidade de cidadãos estrangeiros obterem autorização especial de residência (o denominado Visto Gold) no caso de aquisição de imóveis de valor igual ou superior a 500 mil euros;

f) No decurso do procedimento inspectivo, verificou-se que, apesar de os valores de venda das fracções serem bastante superiores, (por vezes cerca do dobro), aos valores patrimoniais determinados, o lucro obtido era quase integralmente absorvido pelos gastos com fornecimentos e serviços externos prestados pela B…………..;

g) Questionada sobre este aspecto, a Requerente deu como justificação para tal facto com a situação do sector imobiliário no país, à data dos factos, e com o aperto financeiro em que se encontrava, conduzindo à venda dos imóveis nos termos que lhe foram propostos;

h) Concretamente, afirmou a Requerente serem aqueles gastos referentes a despesas com publicidade e marketing, levados a cabo pela B………., para angariação de clientes residentes na República Popular da China;

i) Tal afirmação - sobre a natureza dos serviços prestados - é consentânea com o descritivo das facturas, bem como com o registo efectuado no Balancete de Contabilidade Geral (conta 62215 e 62216);

j) Nas acções inspectivas foi elaborado o Relatório da Inspecção Tributária que consta do processo administrativo, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais o seguinte:

III. DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORREÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS

III.1 IRC

III.1.1 Alterações à matéria coletável - Gastos não aceites fiscalmente

Nos exercícios de 2013 e 2014, as operações realizadas pela D…………., corresponderam à venda de imóveis, localizados em Lisboa, a cidadãos chineses, relativamente aos quais suportou gastos registados na conta SNC "Publicidade e Propaganda12, subconta de "Trabalhos Especializados", referentes aos serviços de marketing da sociedade B…………….. CO, LIMITED, com sede em HONG KONG., nos montantes respetivos de 82.300,00 euros e de 2.582.254,00 euros.

Estes gastos com publicidade e "marketing" que se encontram refletidos na contabilidade da D…………. não vão ser aceites fiscalmente, pelos fundamentos seguintes, atendendo a que assumem valores relativamente elevados, e que foram pagos a uma entidade não residente no território nacional. À luz dos normativos fiscais, não assiste à D…………... a faculdade de os poder deduzir para efeitos da determinação do resultado fiscal.

III.1.1.1 - Enquadramento jurídico - fiscal

O n.º 1 do artigo 23.º do Código do IRC, na redação aplicável em 2013, estabelece as condições gerais a que terão que obedecer os gastos para serem fiscalmente dedutíveis: "Artigo 23.º Gastos

1 - Consideram-se gastos os que comprovadamente sejam indispensáveis para a realização dos rendimentos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, nomeadamente:"

São assim requeridos três requisitos essenciais para que os gastos suportados sejam valorados e aceites fiscalmente: a comprovação (justificação), a indispensabilidade e o da ligação aos ganhos sujeitos a imposto.

O primeiro requisito reporta à efetividade da realização dos gastos o qual consiste em várias formas de apoio escritural aos lançamentos contabilísticos, ou seja, à sua prova documental.

O segundo requisito faz depender a dedutibilidade fiscal do gasto de uma relação justificada com a atividade produtiva da empresa e esta indispensabilidade verifica-se desde que esses encargos se conectem com a obtenção de lucro.

O terceiro requisito que compõe a cláusula geral de dedutibilidade em matéria de gastos, na formulação legal introduzida pelo Código do IRC, é o da exigência de ligação aos "rendimentos sujeitos a imposto ou à manutenção da fonte produtora". Decorre do princípio geral do artigo 23.º do Código do IRC que as despesas realizadas pelo contribuinte, para serem fiscalmente dedutíveis, devem ser adstritas ou à obtenção dos ganhos sujeitos a imposto, ou à manutenção da fonte produtora.

O requisito da comprovação encontra-se preenchido se assentar numa base documental como, por exemplo, faturas ou contratos;

Contudo, o princípio geral da dedutibilidade dos gastos, sofre uma derrogação no caso de pagamentos a entidades não residentes em Portugal e localizadas em jurisdições de fiscalidade privilegiada, como forma de obviar à erosão da base tributável.

Assim e com vista a lutar contra a evasão e fraude fiscal internacional e no sentido de restringir a utilização de paraísos fiscais o legislador português optou por introduzir no nosso ordenamento jurídico, medidas genericamente designadas como de anti-abuso, através de cláusulas específicas na lei.

Neste contexto, estipula o artigo 65.º do Código do IRC o seguinte, aplicável em 2013:

"Artigo 65.º

Pagamentos a entidades não residentes sujeitas a um regime fiscal privilegiado

1 - Não são dedutíveis para efeitos de determinação do lucro tributável as importâncias pagas ou devidas, a qualquer título, a pessoas singulares ou coletivas residentes fora do território português e aí submetidas a um regime fiscal claramente mais favorável, salvo se o sujeito passivo puder provar que tais encargos correspondem a operações efetivamente realizadas e não têm um carácter anormal ou um montante exagerado.

2 - Considera-se que uma pessoa singular ou coletiva está submetida a um regime fiscal claramente mais favorável quando o território de residência da mesma constar da lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças ou quando aquela aí não for tributada em imposto sobre o rendimento idêntico ou análogo ao IRS ou ao IRC, ou quando, relativamente às importâncias pagas ou devidas mencionadas no número anterior,' o montante de imposto pago for igual ou inferior a 60% do imposto que seria devido se a referida entidade fosse considerada residente em território português.

3 - Para efeitos do disposto no número anterior, os sujeitos passivos devem possuir e, quando solicitado pela Direcção-Geral dos Impostos, fornecer os elementos comprovativos do imposto pago pela entidade não residente e dos cálculos efetuados para o apuramento do imposto que seria devido se a entidade fosse residente em território português, nos casos em que o território de residência da mesma não conste da lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças.

4 - A prova a que se refere o n.º 1 deve ter lugar após notificação do sujeito passivo, efetuada com a antecedência mínima de 30 dias.

5 - O disposto nos números anteriores é ainda aplicável às importâncias pagas ou devidas indiretamente, a qualquer título, às mesmas pessoas singulares ou coletivas, quando o sujeito passivo tenha ou devesse ter conhecimento do destino de tais importâncias, presumindo-se esse conhecimento quando existam relações especiais nos termos do n.º 4 do artigo 63.º entre:

a) O sujeito passivo e as pessoas singulares ou coletivas residentes fora do território português e aí submetidas a um regime fiscal claramente mais favorável; ou

b) O sujeito passivo e o mandatário, fiduciário ou interposta pessoa que procede ao pagamento às pessoas singulares ou coletivas referidas na alínea anterior."

Por seu turno, o artigo 23.º-A aditado ao Código do IRC pela Lei n.º 2/2014 de 16 de janeiro, que republicou este Código, e aplicável em 2014, determina:

"Artigo 23.º-A Encargos não dedutíveis para efeitos fiscais

1 - Não são dedutíveis para efeitos da determinação do lucro tributável os seguintes encargos, mesmo quando contabilizados como gastos do período de tributação:

r) As importâncias pagas ou devidas, a qualquer título, a pessoas singulares ou coletivas residentes fora do território português, e aí submetidas a um regime fiscal identificado por portaria do membro do Governo responsável pela área das finanças como um regime de tributação claramente mais favorável, salvo se o sujeito passivo provar que tais encargos correspondem a operações efetivamente realizadas e não têm um caráter anormal ou um montante exagerado.

...

7- O disposto na alínea r) do nº 1 aplica-se igualmente às importâncias indiretamente pagas ou devidas, a qualquer título, às pessoas singulares ou coletivas residentes fora do território português e aí submetidas a um regime fiscal claramente mais favorável, quando o sujeito passivo tenha ou devesse ter conhecimento do seu destino, presumindo-se esse conhecimento quando existam relações especiais, nos termos do n.º 4 do artigo 63.º, entre o sujeito passivo e as referidas pessoas singulares ou coletivas, ou entre o sujeito passivo e o mandatário, fiduciário ou interposta pessoa que procede ao pagamento às pessoas singulares ou coletivas.

8 - A Autoridade Tributária e Aduaneira notifica o sujeito passivo para produção da prova referida na alínea r) do n.º 1, devendo, para o efeito, ser fixado um prazo não inferior a 30 dias.

Estas normas visam claramente combater uma espécie de operações evasivas ou fraudulentas, por meio de pagamentos a favor de entidades não residentes e estabelecidas em jurisdições de fiscalidade privilegiada, de modo a transferir rendimentos gerados e localizados em Portugal para locais com regimes fiscais mais favoráveis, com tributação reduzida ou inexistente, e tradicionalmente avessos à colaboração no sentido da prestação de informações para efeitos fiscais.

A estatuição das mesmas determina de imediato o princípio geral de não dedutibilidade dos gastos suportados com este tipo de pagamentos consagrando, no entanto, uma cláusula de salvaguarda, que opera mediante a inversão do ónus da prova, direcionando-o para o sujeito passivo, a quem caberá cumprir cumulativamente com duas condições, caso em que se o fizer, os gastos serão admissíveis para efeitos da determinação do resultado fiscal:

- Os gastos corresponderem a operações reais;

- Não terem um carácter anormal ou um montante exagerado.

Trata-se duma dupla prova que incumbirá ao sujeito passivo produzir o qual, em primeiro lugar, tem de demonstrar que os gastos se materializaram em atos efetivos, não bastando a mera existência formal tais como contratos, faturas e transferências bancárias e, em segundo lugar, que esses gastos não são anormais ou excessivos, o que se poderá operar mediante a confrontação com situações comparáveis de mercado num contexto de plena concorrência.

A este propósito transcreve-se parte do acórdão proferido em 19/02/2015, no processo 08126/14 no Tribunal Central Administrativo do Sul (TCAS), que julgou um caso de pagamento a entidades não residentes e sujeitas a um regime fiscal privilegiado, evidenciando a importância da demonstração das provas, em detrimento da forma, cujo sumário se transcreve:

No que diz respeito à prova da veracidade da operação não bastará a exibição de documentos escritos, nomeadamente contratos celebrados entre as partes, já que estes se presumem simulados, nem a demonstração do pagamento do preço, pois tal não é posto em causa. O que deve ser objecto de prova é antes a efectiva prestação de serviços, ou o recebimento de um empréstimo, ou seja, o facto comercial que esteve na origem do pagamento do mesmo preço que surge como custo a deduzir em sede de I.R.C. Já quanto à prova da inexistência do carácter anormal ou exagerado das despesas esta deve passar pela demonstração de que o contrato, cuja veracidade se provou, se apresenta equilibrado. Para esse efeito, o sujeito passivo deverá demonstrar qual a importância real das vantagens auferidas pelo contrato em causa, tal como fazer prova que os encargos estabelecidos constituem a justa remuneração dessas vantagens, mormente. Por comparação com os custos de serviços análogos no mercado.''

Na falta da comprovação destes requisitos conclui-se pela não dedutibilidade dos gastos em apreço e o consequente acréscimo dos respetivos montantes no resultado fiscal.

A produção desta prova deverá ser feita pelo sujeito passivo perante a AT. apresentando-lhe os meios de prova da efetividade do gasto e do caráter normal e não exagerado, a quem competirá a sua apreciação com vista à formação dum juízo administrativo sobre a validade dos pagamentos.

Trata-se, pois, duma solução legislativa em que é revertido para o contribuinte um “ónus probandi" em que, por força do disposto nas normas em referência, no domínio dos pagamentos a entidades domiciliadas em territórios de baixa tributação, é afastada a presunção de veracidade das declarações do contribuinte constante do n.º 1 do art. 75.º da LGT de que são verdadeiras e de boa-fé "as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal". E se o contribuinte não lograr produzir tal prova, o gasto não é fiscalmente aceite, sendo a matéria coletável aumentada para efeitos de tributação.

(i) Quanto à existência de regime fiscalmente mais favorável

Logo à partida há que determinar se a jurisdição de fiscalidade privilegiada se integra na previsão normativa do n.º 2 do artigo 65.º aplicável em 2013, e alínea r) do n.º 1 do artigo 23-A, vigente para o exercício de 2014, ambos do Código do IRC.

Ora, no caso concreto de HONG KONG, trata-se da jurisdição constante do n.º 31 da Portaria n.º 292/2011, aplicável nos exercícios em análise de 2013 e 2014, pelo que para a situação em apreço e para os dois exercícios, releva em comum o único pressuposto da inserção na lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças.

Ou seja, constatando-se que estão a ser pagas importâncias a uma entidade, no caso à B…………….. Co Limited, residente fora do território português e situada numa jurisdição constante da citada Portaria, ocorre a condição que determina a verificação do pressuposto para a subsunção no conceito de regime fiscal claramente mais favorável.

(ii) Quanto à exigência da realização efetiva das operações

Cabe ao contribuinte demonstrar que as operações envolvendo pagamentos a não residentes submetidos a um regime fiscal mais favorável foram efetivamente realizadas. Esta inversão do ónus da prova materializa-se na demonstração da efetividade da realização da operação a qual, se não for suprida, implica que que os encargos daqui resultantes não sejam dedutíveis.

Ora, da análise documental constatou-se que o sujeito passivo (entidade inspecionada) possui as escrituras de compra e venda dos imóveis e o "Framework Agreement" e ainda:

- Faturas emitidas pelo referido prestador de serviços; e

- Meios de pagamento das faturas através de transferências bancárias.

No entanto, embora este conjunto documental dote a operação do preenchimento de requisitos formais, carece de ser comprovada substancialmente, falha que não foi preenchida pelos seguintes motivos;

- Não foi evidenciado que tenha sido praticada qualquer ação, campanha publicitária ou equivalente, concreta e efetiva, pela citada empresa prestadora de serviços visando a venda de frações;

- Que a ter havido, a mesma foi apropriada e direcionada ao objetivo, isto é, na eventualidade J de ter sido realizada destinou-se a tentar vender frações ou antes qualquer outro produto;

- A prova de que o serviço foi na realidade prestado mediante a apresentação, designadamente, de estudos de prospeção de mercados, vantagens no investimento, campanhas de marketing, porquanto não foram apresentadas evidências dos mesmos em papel, gravações, vídeo, suporte informático, digital ou qualquer outro suporte;

- E ainda que fossem exibidas as evidências físicas dos trabalhos efetuados, seria ainda necessário demonstrar a adequação de cada um deles aos requisitos do artigo 23.º do Código do IRC;

- E que, para além do contrato, não foi evidenciada troca de qualquer correspondência ou contactos com o alegado prestador de serviços, conexos com os serviços que alegadamente intermediou.

Não basta, pois, a existência de contrato, faturas ou transferências bancárias: é necessário a evidência de todo um conjunto de ações, atuações ou por exemplo de campanhas concretas de publicidade, ou seja, de elementos justificativos complementares à documentação fiscalmente relevante, de forma a afastar de forma concludente fundadas dúvidas sobre a efetiva realização das operações que as faturas pretendem titular.

Em suma, não existe qualquer comprovação da realização material das prestações de serviços (de publicidade/comissões) por parte da empresa sediada em HONG KONG.

Ora, salientando-se que nos termos da legislação já citada, assiste ao sujeito passivo demonstrar a evidência material que sustente terem sido efetuadas tais prestações de serviços e não tendo o mesmo logrado fazer, não se encontra preenchido este requisito de dedutibilidade.

(III) Quanto ao carácter anormal

Neste âmbito conclui-se que não tendo o sujeito passivo produzido qualquer prova material que permita aferir da natureza intrínseca do gasto, ou da sua consentaneidade para com a atividade negocial, não é possível aferir do seu caráter normal face à atividade desenvolvida.

Isto é, se o sujeito passivo não logrou provar a substância do gasto, não é possível aferir se o que vem qualificado como publicidade e comissões tem caráter normal face à atividade desenvolvida,

Também aqui o sujeito passivo não cumpriu com o ónus que a lei lhe impõe.

(IV) Quanto ao montante exagerado

Para aferição desta característica, isto é de que os pagamentos são adequados ao real valor dos serviços prestados, afigura-se que a «relação custo-benefício será apropriada, considerando-se cumprida a condição desde que os rendimentos compensem os respetivos gastos, isto é, que os rendimentos futuros são de tal monta que justificaram o respetivo encargo, ressalvando os casos em que a tentativa de penetração noutros mercados não foi bem sucedida e o serviço inerente ao gasto foi efetivamente realizado.

Ou seja, apesar das margens brutas de comercialização serem positivas, são absorvidas pelos gastos com fornecimentos e serviços externos relativos ao "marketing" pago ao publicitário ou às comissões, pagas ao comissionista localizados em HONG KONG.

Ora, nas situações envolvendo intervenção humana com estudos, projetos, ou publicidade no caso em apreço, o sujeito passivo deveria possuir em arquivo elementos que permitissem ajuizar da adequação do montante à finalidade e possibilitar a aferição do eventual exagero, designadamente:

- identificação dos recursos humanos envolvidos, horas aplicadas e taxas horárias por consultor;

- evidência de reuniões, "surveys";

- deslocações;

- se quem executou tem experiência profissional;

- se foram pedidos orçamentos no mercado nacional ou internacional para efeitos comparativos e, em caso afirmativo, porque razão foi preferido o de uma entidade residente numa jurisdição de fiscalidade privilegiada em detrimento doutras com outras localizações.

Haveria igualmente que permitir aferir se o montante dos serviços cobrados é apropriado, tendo em conta o mercado e o risco da operação, por comparação com as que seriam aplicadas por outras entidades num contexto equivalente, em obediência e em cumprimento do princípio "at arm's length", o que também não sucedeu, pois não foram apresentados quaisquer elementos pertinentes dirigidos a este objetivo.

III.1.1.2 - Aferição da obediência aos requisitos de dedutibilidade

Segundo a D…………. de acordo com as características do mercado chinês, a intermediação na venda consistiu em serviços prestados numa ótica de publicidade e "marketing", e como tal foram relevados contabilisticamente, e não de comissões, como seria mais habitual no mercado português.

Será, pois, necessário averiguar da eventual obediência aos requisitos que impedem a desconsideração como gastos do exercício, da publicidade em que a sociedade contabiliza como tendo incorrido, cujo montante, excluindo o IVA, foi de 82.300,00 euros em 2013 e 2.582.254,00 euros em 2014.

Neste contexto, e em obediência à formalidade do n.º 4 do artigo 65.º (para 2013) e n.º 8 do artigo 23.º-A (para 2014) do Código do IRC, foi a sociedade notificada em 25 de julho de 2016 para apresentar em 25 de agosto de 2016 documentos de prova efetiva sobre o cumprimento dos requisitos exigidos quanto à materialidade das operações e inexistência do seu caráter anormal e montante exagerado, bem como os documentos de prova referidos no nº 2 do artigo 98.º do Código do IRC (para 2013 e 2014) que comprovem a dispensa de retenção na fonte (vd. Anexo 5).

Decorrido o prazo concedido nas notificações, foi obtida a seguinte resposta, para os dois exercícios (vd. Anexo 7):

"1 - Em 2013 vivia-se uma situação para além do sustentável, na sequência de três anos sem vendas e com um serviço de dívida e amortização correspondente a empréstimos de valor global 18.000.000€ (15 M€ Montepio e 3M€ Santander)

2 - Nesta altura já se tinham esgotado todos as negociações com os bancos e implementados todas as prorrogações de prazo, deferimento do pagamento de juros, capitalização do seu valor, suportando-se sucessivamente o agravamento das condições de pricing (valor de taxas de juro, comissões e penalizações) por via do alegado agravamento do risco.

3 - Nesse ano e no âmbito do programa GOLDEN VISA foi celebrado um contrato com a B…………… com o objetivo de fazer chegar os ativos imobiliários da empresa a clientes chineses potencialmente aderentes o este programa.

O conjunto vasto de contatas que levou a assinatura deste contrato iniciou-se em Abril de 2013 tendo sido utilizados para o efeito os escritórios de advogados da ……………. bem como da …………. ADVOGADOS, que representavam, assessoravam e credibilizavam a B……………

4 - Na verdade, a relevância, dimensão e capacidade destes dois escritórios de advogados respondeu, na altura, a todas as questões que a situação colocava. Tratava-se de algo completamente novo e por isso, pela primeira vez vivido por todas as empresas na situação da nossa, que cumpriam os requisitos para poderem ter interesse para a B…………: estar completamente aflita e ter o número de imóveis interessantes para justificar a operação.

5 - De fato, estes requisitos eram os suficientes para fazer aceitar condições de comissionamento fora do "normal", tal era a anormalidade e severidade das condições da empresa e absoluta inexistência de alternativas.

6 - O que foi proposto redentoramente pela B…………. foi o acesso a um mercado de clientes e de vendas do outro mundo: tipo de cliente, a sua capacidade financeira, a sua quantidade, o curto tempo para a concretização das vendas e valores dos mesmos muito superiores às melhores perspectivas de 2009 para

7 - Assim, a perspetiva trazida por este contrato respondia à tempestade perfeita a que os promotores estavam sujeitos, determinada por incapacidade dos compradores ou interessados, tempo arrastado para a concretização de qualquer negócio, esmagamento dos respetivos valores e voracidade crescente e ilimitada dos credores na imposição de condições leoninas.

8 - Portanto, este canal de comercialização foi o responsável em exclusividade pela reversão da situação, proporcionando em 2014 a amortização da dívida ao Montepio e parte da do Santander. Mais nenhum outro canal de venda teve intervenção porque mais nenhum outro existia ou permitia este requisito básico de sobrevivência para a empresa: volume de vendas, velocidade a que se verificavam e respetivos valores.

9 - No final de 2015 e já sem frações habitacionais, que eram o foco deste mercado, encontrou-se uma solução de venda para as áreas comerciais do empreendimento, fora do circuito GOLDEN VISA, que permitiu a resolução do compromisso de dívida com o Santander.

10 - Persiste em tribunal a demanda por parte da B…….., dos últimos valores de comissionamento, já não reconhecidos a partir do momento em que o modelo RFI21 deixou de ser apresentado.

Em complemento a estas respostas constam os seguintes documentos;

- faturas (Invoice) emitidas pela B…………………. CO., Limited; (cfr anexo 5)

- provas do pagamento das faturas (cfr anexo 8);

- escrituras de venda das frações (as quais constam da contabilidade);

- contrato de prestação de serviços designado por "Framework Agreement" com a empresa B……………. CO.. LIMITED e alteração "Amendment 2 To Framework Agreement" (vd. Anexo 3.):

-Mod. 21-RF1, emitidos pela autoridade fiscal de Hong Kong, para 2013 e 2014.

Cabia ao contribuinte demonstrar que as operações envolvendo pagamentos a não residentes submetidos a um regime fiscal mais favorável foram efetivamente realizadas. Esta inversão do ónus da prova materializa-se na demonstração da efetividade da realização da operação a qual, se não for suprida, implica que que os encargos daqui resultantes não são dedutíveis.

Ora, da análise documental constatou-se que a D……….., possui em arquivo as escrituras e o "Framework Agreement" anexos às respostas e ainda:

- Faturas emitidas pelo dito prestador de serviços;

- Meios de pagamento das faturas através de transferências bancárias do Montepio Geral, em que o beneficiário dos pagamentos coincide com o emitente das faturas.

No entanto, embora este conjunto documental dote a operação do preenchimento de requisitos formais, carece de ser comprovada substancialmente, lacuna que não foi preenchida pelos seguintes motivos:

- Não foi evidenciado que tenha sido praticada qualquer ação, campanha publicitária ou equivalente, concreta e efetiva, pela citada empresa prestadora de serviços visando a venda de frações;

- Que a ter havido, a mesma foi apropriada e direcionada ao objetivo, isto é, na eventualidade de ter sido realizada destinou-se a tentar vender frações ou antes qualquer outro produto?

- Produto este que até poderá não ser comercializado pela empresa;

- A prova de que o serviço foi na realidade prestado mediante a apresentação, designadamente, de estudos de prospeção de mercados, vantagens no investimento, campanhas de marketing, porquanto não foram apresentadas evidências dos mesmos em papel, gravações, vídeo, suporte informático, digital ou qualquer outro suporte;

- E ainda que fossem mostradas essas evidências físicas dos trabalhos efetuados, seria ainda necessário demonstrar a adequação de cada um deles aos requisitos do artigo 23.º do Código do IRC;

- E que, para além do contrato, não foi evidenciada troca de qualquer correspondência ou contactos com o alegado prestador de serviços, conexos com os serviços que alegadamente intermediou.

Não basta, pois, a existência de contrato, faturas ou transferências bancárias; é necessário a evidência de todo um conjunto de realização de ações, atuações ou campanhas concretas de publicidade, ou seja, de elementos justificativos complementares à documentação fiscalmente relevante, sem os quais fundadas dúvidas ficam acerca da efetiva realização das operações que as faturas pretendem titular.

Em suma, não existe qualquer comprovação da realização material da publicidade por parte da empresa sediada em HONG KONG. Na resposta à notificação apenas foi descrita uma breve justificação da estratégia comercial seguida pela empresa, que à AT não compete avaliar ou aferir, pois se trata duma decisão do estrito foro da gestão empresarial, mas que não fornece qualquer elemento concreto sobre a publicidade alegadamente realizada pela empresa de HONG KONG.

Ora, não descurando que nos termos da legislação já citada, assiste à D………., demonstrar a evidência material que sustente ter sido efetuada publicidade, a mesma não o logrou fazer, pelo que não se encontra preenchido este requisito de dedutibilidade.

Concretamente, e conforme já anteriormente referido, as vendas foram diretamente efetuadas pela D…………. aos clientes chineses, sem intermediários, embora suportando e pagando gastos com publicidade faturados por uma única sociedade com a designação B……………….. CO., LIMITED, com sede em HONG KONG, cujos valores atingem 16% em 2013 (82.300,00 euros) e 15%, 16%. 19%, 20% e 21% em 2014 (2.582.254,00 euros), percentagens estas que se assumem como elevadas face ao valor das frações. De facto, os gastos com publicidade estão a absorver entre 15% e 21% do valor de venda das frações correspondentes, o que prejudica a rentabilidade da sociedade, que foi negativa, e que nem a margem bruta das vendas positiva conseguiu compensar, dado que foram alcançados prejuízos contabilísticos (- 43.379,25 euros em 2013 e -465.135,06 euros em 2014).

Note-se que a margem bruta foi de 95.450,09 euros em 2013 (527.000,00 - 431.549,91) e de 3.811.894,45 euros em 2014 (17.623.450,00 - 13.811.555.55), enquanto os gastos com publicidade foram de 82.300,00 euros e 2.582.254,00 euros, respetivamente. Para melhor visualização tem-se:

[segue imagem, aqui dada por reproduzida]

Ou seja, apesar das margens brutas de comercialização serem positivas e de valor significativo, são absorvidas pelos gastos com fornecimentos e serviços externos relativos ao "marketing" pago ao publicitário localizado em HONG KONG.

Ora, nas situações envolvendo intervenção humana com estudos, projetos, ou publicidade no caso em apreço, o sujeito passivo deveria possuir em arquivo elementos que permitissem ajuizar da adequação do montante à finalidade e possibilitar a aferição do eventual exagero, designadamente:

- identificação dos recursos humanos envolvidos, horas aplicadas e taxas horárias por consultor;

- evidência de reuniões, "surveys";

- deslocações;

- se quem executou tem experiência profissional;

- se foram pedidos orçamentos no mercado nacional ou internacional para efeitos comparativos e, em caso afirmativo, porque razão foi preferido o de uma entidade residente numa jurisdição de fiscalidade privilegiada em detrimento doutras com outras localizações.

Seria ainda fator de grande relevância o conhecimento e identificação dos detentores do capital da entidade "off-shore" para se aquilatar se são independentes em relação à empresa em questão, enquanto elementos relevantes para elidir a presunção de inveracidade do gasto, até prova em contrário, a qual compete à D……………. produzir.

Cabia também à D………………. provar que as operações não tinham caráter anormal, e como é do conhecimento público, esta atuação implica o pagamento à empresa imobiliária duma comissão que habitualmente é de 5% do valor de venda do imóvel, podendo nuns casos ser inferior e chegar a 3%, ou ser superior e alcançar os 6%. (a comissão paga em 2013 foi de 16% e em 2014 houve comissões de 15% a 21%)

Também aqui se conclui que, não tendo a D…………… produzido qualquer prova de que não existe exagero no montante da publicidade, se considera como não cumprido este requisito.

Conclusão:

Não foi cumprido o ónus que a lei fiscal exige para aceitar como dedutíveis pagamentos a não residentes, quando se localizam em jurisdições de baixa tributação, repartido cumulativamente pelos seguintes requisitos: -

- Da produção de prova da efetiva realização de publicidade;

- Da produção de prova da normalidade do pagamento;

- Da produção de prova de que o montante não é exagerado.

Pelo que se conclui que, não tendo a D………….. cumprido com o ónus da prova consagrado nos preceitos dos artigos 65.º e 23.º-A do Código do IRC, os gastos relativos aos pagamentos em causa são fiscalmente desconsiderados nos exercícios de 2013 e 2014. Em face do exposto, conclui-se que os elementos apresentados pelo sujeito passivo são insuficientes para aferir que os encargos correspondem a operações efetivamente realizadas e que não têm caráter anormal ou um montante exagerado, conforme prevêem os artigos 65.º, (para 2013) e 23.º-A (para 2014) do CIRC.

III.1.1.3 Alteração do Resultado Tributável

Assim o apuramento do resultado fiscal discrimina-se assim:

[segue imagem, aqui dada por reproduzida]

Atendendo a que nos exercícios anteriores estão registados prejuízos fiscais, os mesmos são dedutíveis nos termos do artigo 52.º do Código do IRC, pelo que se procede ao seu ajustamento em 2013 e 2014.

A dedução permitida em 2013 não pode exceder o montante correspondente a 75 % do respetivo lucro tributável, nos termos do n.º 2 do artigo 52.º do Código do IRC. Pelo que tomando o lucro tributável corrigido tem-se: 21.841,75€ x 0,75= 16.381,31 euros, que é o limite dos prejuízos fiscais a deduzir.

Neste caso pode deduzir os 16.381,31 de 2011. Para 2014 pode deduzir os restantes prejuízos de 2011: 70.600,28 euros mais os 80.088,44 euros de 2012, o que perfaz € 150.688,72 euros. Em 2015 já não existem prejuízos para deduzir.

Apresenta-se o apuramento da matéria coletável corrigida:

[segue imagem, aqui dada por reproduzida]

- O IVA de todas as faturas dos exercícios de 2013 e 2014 configura um gasto fiscalmente aceite em sede de IRC, aceitação esta que não coloca em crise a desconsideração do gasto com a publicidade correspondente. Tal sucede porque tendo a sociedade efetuado a autoliquidação do IVA, e dependendo a dedução do enquadramento da atividade, como está adstrito a vendas isentas sem direito à dedução, assiste-lhe a prerrogativa de o relevar em gastos do exercício. A operação de autoliquidação encontra-se conexa com o pagamento efetuado a um não residente, cujo mero ato não é posto em causa, por aplicação das regras de localização das operações previstas no artigo 6.º do Código do IVA, sem aferir da substância, caráter normal ou exagero do montante pago. Ou seja, o ato de pagamento a um não residente subsume a operação na previsão normativa da alínea a) do n.º 6 do artigo 6.º do Código do IVA, sem que daqui resulte diretamente uma validação de requisitos de comprovação do gasto, este sim, efetuado noutra sede e concretamente em imposto sobre o rendimento.

III.1.2 - Correção ao imposto

III.1.2.1 - Tributação Autónoma

A não comprovação dos gastos mencionados no capítulo anterior tem ainda como consequência a tributação autónoma à taxa de 35%, conforme o disposto no n.º 8 do artigo 88.º do Código do IRC,

Estipula este normativo o seguinte para os exercícios de 2013 e 2014:

Artigo 88.º Taxas de tributação autónoma

3 - São sujeitas ao regime do n.º 1 ou do n.º 2, consoante os casos, sendo as taxas aplicáveis, respectivamente, 35% ou 55%, as despesas correspondentes a importâncias pagas ou devidas, a qualquer título, a pessoas singulares ou colectivas residentes fora do território português e aí submetidas a um regime fiscal claramente mais favorável, tal como definido nos termos do Código, salvo se o sujeito passivo puder provar que correspondem a operações efectivamente realizadas e não têm um carácter anormal ou um montante exagerado.

Uma vez que o sujeito passivo não procedeu à comprovação atrás mencionada, e as despesas em causa não foram aceites fiscalmente como gasto do exercício, ficam sujeitas a tributação autónoma à taxa de 35%, conforme o disposto no n.º 1 e n.º 8 do artigo 88.º do Código do IRC. Pelo que se tem:

Exercício de 2013:

82.300,00 X 0,35 = 28.805,00 euros

Exercício de 2014:

2.582.254.00 x 0,35 = 903.788,90 euros

III.1.2.2 - Retenção na fonte

A sociedade apresentou os formulários modelo 21-RFI assinados e carimbados pelo beneficiário efetivo dos pagamentos, bem como os certificados de residência fiscal emitidos em nome deste, validados pelas autoridades fiscais de HONG KONG, pelo que obedece aos requisitos de dispensa de retenção previstos no artigo 98.º do Código do IRC (vd. Anexo 6.).

Desde já se assinala que o instituto da retenção ou dispensa, por obediência a estes requisitos formais, não contende com a desconsideração do gasto, uma vez que a operação de retenção consiste apenas na aplicação duma taxa de tributação a um valor pago a um não residente, e que constitui um rendimento na esfera deste, em que o mero ato de pagamento não é posto em causa dado ter ocorrido, de facto, a saída monetária, mas que não está dependente da aceitação fiscal, ou não do gasto, esta sim do cumprimento dos requisitos legais.

III.1.3 - Resumo das correções

Os procedimentos inspetivos tiveram por objetivo avaliar do cumprimento dos deveres tributários da D…………….., tendo-se constatado que ocorreram pagamentos a uma entidade não residente sujeita a um regime fiscal privilegiado, concretamente HONG KONG, e como tal qualificado por inserção na Portaria n.º 292/2011 de 08/11.

Atendendo a que este tipo de pagamentos poderá ocorrer com o intuito de praticar operações evasivas ou inclusive fraudulentas, dado que são feitos a favor de entidades estabelecidas numa jurisdição de fiscalidade privilegiada, de modo a transferir rendimentos gerados e localizados em Portugal para locais com regimes fiscais mais favoráveis, com tributação reduzida ou inexistente, o Código do IRC veio consagrar uma norma anti-abuso específica destinada a combater estas práticas.

Assim, numa primeira linha de análise, para que um gasto seja dedutível, terá que obedecer aos requisitos da cláusula geral de dedutibilidade ínsita no n.º 1 do artigo 23.º do Código do IRC. Contudo, não são dedutíveis como gastos para efeitos fiscais as importâncias pagas ou devidas a pessoas singulares ou coletivas residentes fora do território português cujo território da residência (os dois últimos pressupostos aplicam-se apenas em 2013):

A) Conste de lista aprovada por portaria;

B) Aí estejam submetidas a um regime fiscal claramente mais favorável - isento de IRS ou IRC ou

C) O imposto é igual ou inferior a 60% do que seria devido em Portugal (15%=60% x 25%).

Foi, no entanto, prevista uma cláusula de salvaguarda, isto é, os encargos poderão ser dedutíveis se forem cumpridos os seguintes requisitos de forma cumulativa:

A) O contribuinte provar a efetividade de realização das operações;

B) As mesmas não tiverem um carácter anormal ou um montante exagerado.

Não tendo o sujeito passivo logrado proceder a esta comprovação, as despesas em causa não são aceites fiscalmente como gastos do exercício, ficando sujeitas a tributação autonomamente à taxa de 35%, conforme o disposto no n.º 1 e n.º 8 do artigo 88.º do Código do IRC, tributação esta onerada em 10 pontos percentuais em 2013, dado ter sido apresentado prejuízo fiscal.

Efetuou-se ainda a tributação autónoma por aplicação da taxa de 35% a 2013 e a 2014, sendo o imposto em falta de 28.805,00 euros em 2013 e de 903.788,90 euros em 2014.

k) Na sequência da acção inspectiva foram emitidas as liquidações de IRC n.ºs 2016 8310037654 e 2016 8310037663, relativas aos exercícios de 2013 e 2014 respectivamente (documentos n.ºs 1 e 2 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos);

l) A B……………. efectuou actividades de publicidade, promoção e divulgação no território Chinês de imóveis da Requerente que levaram à aquisição dos mesmos por parte de cidadãos Chineses;

m) A B…………….. fez conferências e seminários sobre as vantagens e benefícios de se viver em Portugal, em várias cidades da China;

n) A B……………. auxiliou os cidadãos chineses na obtenção de vistos para entrada e estadia em Portugal;

o) A B……………… acompanhou os cidadãos chineses na deslocação a Portugal nas visitas aos imóveis;

p) A B…………… pagou as despesas de deslocação, alojamento e alimentação, bem como outras despesas relacionadas coma sua estadia e visita aos imóveis da Requerente;

q) A B………….. assegurou o serviço de intérprete contratando tradutores, para acompanharem os cidadãos chineses em território português;

r) A B…………… contratou motoristas para fazer as deslocações dos cidadãos chineses em Portugal, nomeadamente entre o aeroporto e o hotel, serviços de estrangeiros e fronteiras, bancos e restaurantes e os principais pontos turísticos de Portugal;

s) Acompanhou os cidadãos chineses na abertura de contas bancárias em Portugal;

t) Após a aquisição dos imóveis, a B………… assistiu os cidadãos chineses na decoração dos imóveis e na ligação de electricidade, gás e água para os imóveis adquiridos;

u) A B……………… prestava serviços jurídicos aos referidos cidadãos chineses, contratando advogados;

v) A Requerente comprometeu-se a pagar à B………….. uma remuneração por cada imóvel vendido a comprador indicado por aquela sociedade;

w) A Requerente celebrou 33 escrituras e vendas de imóveis a cidadãos chineses indicados pela B……………;

x) A Requerente efectuou à B………….. os pagamentos a que se havia comprometido;

y) Houve centenas de potenciais clientes angariados pela B…………… que não concretizaram qualquer aquisição de imóveis, situações em que a Requerente não efectuou qualquer pagamento àquela;

z) A B…………., inicialmente, exigia comissões de 15%, sobre o valor dos imóveis vendidos e, mais tarde, comissões superiores, da ordem dos 20% e 25%;

aa) A Requerente tinha de aceitar as condições exigidas pela B……….., pois havia enorme dificuldade de venda de imóveis a cidadãos nacionais nos anos de 2013 e 2014 e estava em situação de aflição económica, pois em condições normais deveria ter vendido os imóveis até 2010 (5 anos após o início do processo de construção) e, não os tendo vendido, teve de continuar a suportar os encargos bancários, com acentuado agravamento dos juros, que durante o período previsto para o processo de construção foram cerca de € 93.000 em 2006, € 144.000 em 2007, € 176.000 em 2008, € 223.000 em 2009 e de 300.000 em 2010, e agravaram-se posteriormente, passando a ser aproximadamente de € 520.000 em 2011, € 600.000 em 2012, € 483.000 em 2013, e € 486.000 em 2014:

bb) Na situação de necessidade premente de encontrar compradores para os imóveis, a Requerente não tinha qualquer possibilidade de discutir o respectivo valor das comissões exigidas pela B………………., pois não existia quem prestasse o serviço e angariação de clientes que esta prestava, aos preços de venda que a Requerente pretendia obter;

cc) As comissões da B………………. eram acrescidas aos preços dos imóveis pretendidos pela Requerente, pelo que não afectavam a sua margem de lucro;

dd) Em Janeiro de 2014, a sociedade Requerente aumenta o preço das fracções em 5% de forma a "acomodar" o aumento da comissão;

ee) O gerente da Requerente trocou muitas centenas de emails com a B…………;

ff) Foram as vantagens decorrentes dos ditos “VISTOS GOLD” que foram publicitadas pela B……….. no mercado Chinês e levaram às aquisições dos imóveis referidos nos autos;

gg) Para além das relações comerciais respeitantes à venda dos imóveis;

hh) A Requerente associou-se a outras empresas no programa de angariação de clientes que a B……………. organizou, para que fosse atingida uma dimensão de número de imóveis que interessasse a esta empresa;

ii) A B…………… actua em vários países, como o Canadá, Malta, Espanha e Portugal, sendo uma empresa especializada em angariar clientes chineses para investimentos em programas do tipo dos Golden Visa;

jj) Não foi colocada à Requerente, em sede de direito de audição, a possibilidade de virem a ser liquidados juros compensatórios;

kk) Em 23-03-2017, a Requerente apresentou o pedido de pronúncia arbitral que deu origem ao presente processo. »


***

admissibilidade do recurso;

Independentemente de, neste STA, ter sido, em despacho liminar, admitido, pelo relator, o presente recurso para uniformização de jurisprudência, impõe-se que, aqui e agora, com a intervenção de todos os Exmos. Conselheiros, desta Secção, se avalie e julgue, em definitivo, dos pressupostos da sua admissibilidade/continuidade.

Como é pronúncia, reiterada e uniforme, da jurisprudência deste Supremo Tribunal (Desde logo e em primeira linha, pelo Pleno da Secção de Contencioso Tributário.), o reconhecimento da ocorrência de oposição/contradição entre dois acórdãos, para efeitos deste tipo de apelo, pressupõe a verificação, cumulativa, das seguintes condições/requisitos:

1. que se afirme a existência de contradição entre os acórdãos recorrido e fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito, sendo que, para caracterizar esta, importa identificar (também, em cumulação):

ü identidade da questão de direito sobre que recaíram os acórdãos em confronto, o que pressupõe uma identidade substancial das situações fácticas;

ü a não ocorrência de alteração substancial na regulamentação jurídica;

ü o perfilhamento de solução oposta nos arestos em confronto e que essa oposição decorra de decisões expressas;

2. que não ocorra a situação de a decisão impugnada estar em sintonia com a jurisprudência mais recentemente consolidada do STA.

Reconfirmado o preenchimento das exigências formais de admissibilidade deste recurso (versadas no aludido despacho inicial), impõe-se avançar e indagar da verificação, cumulativa, das demais condições/requisitos, substanciais, vindos de elencar.

A mera justaposição dos cenários factuais, acima reproduzidos, objetivamente, determina, sem mais, a conclusão de que as decisões arbitrais, recorrida e fundamento, não laboraram com a mesma matéria de facto provada / não provada.

Assim, enquanto no aresto recorrido, foi considerado não provado “que as facturas emitidas pela pessoa coletiva “B………………. Co. Limited” a que se referem as alíneas j) e k) do antecedente probatório tenham subjacente uma efetiva prestação de serviços no âmbito da promoção de imóveis ou angariação de clientes Já, antes, nas alíneas aa) e bb) se haviam inscrito como factos (?) provados: «

aa) Subjacente às liquidações adicionais está, principalmente, a desconsideração dos gastos relativos às faturas emitidas pela pessoa coletiva B……………. Co. Limited, no montante de € 729.375,00, referidas na antecedente alínea j), respeitantes ao período de 2013.

bb) Bem como da fatura n.° 010/2014, no montante de € 52.250,00, referidas na alínea k) supra, respeitantes ao período de 2014.», na decisão colegial, que a rte elegeu como fundamento, com relevo, neste quadrante, foi tido por assente: «

(…).

l) A B………….. efectuou actividades de publicidade, promoção e divulgação no território Chinês de imóveis da Requerente que levaram à aquisição dos mesmos por parte de cidadãos Chineses;

m) A B……………. fez conferências e seminários sobre as vantagens e benefícios de se viver em Portugal, em várias cidades da China;

n) A B………….. auxiliou os cidadãos chineses na obtenção de vistos para entrada e estadia em Portugal;

o) A B…………… acompanhou os cidadãos chineses na deslocação a Portugal nas visitas aos imóveis;

p) A B……….. pagou as despesas de deslocação, alojamento e alimentação, bem como outras despesas relacionadas coma sua estadia e visita aos imóveis da Requerente;

q) A B…………… assegurou o serviço de intérprete contratando tradutores, para acompanharem os cidadãos chineses em território português;

r) A B……………. contratou motoristas para fazer as deslocações dos cidadãos chineses em Portugal, nomeadamente entre o aeroporto e o hotel, serviços de estrangeiros e fronteiras, bancos e restaurantes e os principais pontos turísticos de Portugal;

s) Acompanhou os cidadãos chineses na abertura de contas bancárias em Portugal;

t) Após a aquisição dos imóveis, a B………… assistiu os cidadãos chineses na decoração dos imóveis e na ligação de electricidade, gás e água para os imóveis adquiridos;

u) A B…………… prestava serviços jurídicos aos referidos cidadãos chineses, contratando advogados;

v) A Requerente comprometeu-se a pagar à B………….. uma remuneração por cada imóvel vendido a comprador indicado por aquela sociedade;

w) A Requerente celebrou 33 escrituras e vendas de imóveis a cidadãos chineses indicados pela B…………….;

x) A Requerente efectuou à B…………… os pagamentos a que se havia comprometido;

y) Houve centenas de potenciais clientes angariados pela B……………. que não concretizaram qualquer aquisição de imóveis, situações em que a Requerente não efectuou qualquer pagamento àquela;

z) A B…………., inicialmente, exigia comissões de 15%, sobre o valor dos imóveis vendidos e, mais tarde, comissões superiores, da ordem dos 20% e 25%;

aa) A Requerente tinha de aceitar as condições exigidas pela B…………, pois havia enorme dificuldade de venda de imóveis a cidadãos nacionais nos anos de 2013 e 2014 e estava em situação de aflição económica, pois em condições normais deveria ter vendido os imóveis até 2010 (5 anos após o início do processo de construção) e, não os tendo vendido, teve de continuar a suportar os encargos bancários, com acentuado agravamento dos juros, que durante o período previsto para o processo de construção foram cerca de € 93.000 em 2006, € 144.000 em 2007, € 176.000 em 2008, € 223.000 em 2009 e de 300.000 em 2010, e agravaram-se posteriormente, passando a ser aproximadamente de € 520.000 em 2011, € 600.000 em 2012, € 483.000 em 2013, e € 486.000 em 2014:

bb) Na situação de necessidade premente de encontrar compradores para os imóveis, a Requerente não tinha qualquer possibilidade de discutir o respectivo valor das comissões exigidas pela B…………, pois não existia quem prestasse o serviço e angariação de clientes que esta prestava, aos preços de venda que a Requerente pretendia obter;

cc) As comissões da B…………….. eram acrescidas aos preços dos imóveis pretendidos pela Requerente, pelo que não afectavam a sua margem de lucro;

dd) Em Janeiro de 2014, a sociedade Requerente aumenta o preço das fracções em 5% de forma a "acomodar" o aumento da comissão;

ee) O gerente da Requerente trocou muitas centenas de emails com a B……………;

ff) Foram as vantagens decorrentes dos ditos “VISTOS GOLD” que foram publicitadas pela B…………. no mercado Chinês e levaram às aquisições dos imóveis referidos nos autos;

gg) Para além das relações comerciais respeitantes à venda dos imóveis;

hh) A Requerente associou-se a outras empresas no programa de angariação de clientes que a B………….. organizou, para que fosse atingida uma dimensão de número de imóveis que interessasse a esta empresa;

ii) A B…………… actua em vários países, como o Canadá, Malta, Espanha e Portugal, sendo uma empresa especializada em angariar clientes chineses para investimentos em programas do tipo dos Golden Visa;

(…). »

Decorrência, óbvia e necessária, desta diversidade, a decisão arbitral recorrida decidiu julgar improcedente o pedido arbitral, sob o fundamento, em síntese, de que “Competindo ao contribuinte comprovar a veracidade e materialidade das operações realizadas para afastar a presunção legal de artificialidade, seria necessário que efectuasse a prova circunstanciada dos contactos efetuados com os colaboradores, intermediários, advogados, representantes dos clientes proprietários e os meios promocionais que foram desenvolvidos, não bastando a prova formal de que foi celebrado um contrato de prestação de serviços e emitidas facturas e realizados pagamentos.

A Requerente invoca ainda a jurisprudência arbitral que, em situações similares, julgou procedentes os pedidos arbitrais.

No entanto, essa jurisprudência assenta justamente cm meros juízos presuntivos justificados pela crise do mercado imobiliário nacional à época e na actividade global da B………… na angariação de cidadãos chineses que pretendiam investir em imobiliário em Portugal. Mas o que se torna exigível, como se deixou esclarecido, é a prova concreta da actividade desenvolvida em vista a justificar os pagamentos que foram efec(t)uados e que a Autoridade Tributária entendeu ser de desconsiderar, para efeitos fiscais, com fundamento nessa ausência de prova.

Não se encontrando demonstrada a efectividade das operações, não se torna necessário averiguar o requisito cumulativo do seu carácter anormal ou montante exagerado.”;

enquanto, o acórdão fundamento, ao invés, se pronunciou pela procedência do pedido de pronúncia arbitral, porque ficou provado que os, disputados, pagamentos à “B………..”, correspondiam a operações efetivamente realizadas, acrescendo a prova (pela requerente) de os mesmo não terem sido “anormais nem exagerados”.

Antes de determinarmos a inviabilidade deste recurso, por, manifesta, ausência de identidade, substancial, entre as situações fácticas, versadas nos arestos em confronto, importa consignar que o recurso para uniformização de jurisprudência, pertencente à espécie dos extraordinários, em nenhuma hipótese, pode ser utilizado para, como pretendido pela, aqui, rte, se efetivar uma reanálise de meios de prova, apresentados e versados/analisados pelo tribunal recorrido. Efetivamente, é pressuposto, necessário, desta modalidade de apelo, a estabilidade e imutabilidade dos julgamentos, concretizados nas decisões opostas, quanto à matéria de facto, assente e não provada, bem como, os apontamentos feitos em sede de motivação dos mesmos/convicção do julgador.

Aliás, neste STA, já se disse, com todas as letras (e reitera-se), que “as questões de valoração da prova não podem servir de fundamento ao recurso para uniformização de jurisprudência” - cf. acórdão de 27 de junho de 2018 (0165/18).


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# III.


Pelo exposto, em conferência, no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, acordamos não conhecer do mérito deste recurso para uniformização de jurisprudência.

*

Custas a cargo da recorrente, com dispensa do remanescente da taxa de justiça, pelo montante superior a € 275.000, ponderados o desempenho processual das partes e a menor complexidade deste recurso, derivada da circunstância de se ficar, no respetivo conhecimento, por questões menos elaboradas; fator este, unanimemente, operado, nesta secção do STA.
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Comunique-se ao CAAD.

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[texto redigido em meio informático e revisto]

Lisboa, 26 de maio de 2021


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Pelas (os) Exmas. (os.) Senhoras (es) Conselheiras (os) Isabel Cristina Mota Marques da Silva - Francisco António Pedrosa de Areal Rothes - Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia - José Gomes Correia - Joaquim Manuel Charneca Condesso - Nuno Miguel Morgado Teixeira Bastos - Paulo José Rodrigues Antunes - Gustavo André Simões Lopes Courinha - Paula Fernanda Cadilhe Ribeiro - Pedro Nuno Pinto Vergueiro e Anabela Ferreira Alves e Russo, na condição de adjuntos, foi transmitido, enquanto relator, a mim, Aníbal Augusto Ruivo Ferraz, voto de conformidade, com os fundamentos e a decisão supra, nos termos e para os efeitos do artigo 15.º-A do Decreto-Lei n.º 10-A/2020 de 13 de março.
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