Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:085/17
Data do Acordão:12/06/2017
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ASCENSÃO LOPES
Descritores:INCOMPETÊNCIA TERRITORIAL
ALÇADA
Sumário:I - A decisão questionada relativa a incompetência territorial não admite recurso para este STA. Não só foi proferida no âmbito de uma acção cujo valor não excede a alçada do tribunal que a proferiu como não integra o elenco das matérias excepcionadas pelo nº 2 al. a) do artigo 629.º do CPC (sendo este preceito aplicável ex-vi do artº 2º al. f) do CPPT).
II - Não obstante ter sido proferido despacho admitindo o recurso, tal decisão não impede ou desobriga o Tribunal de recurso de a apreciar por atenção ao art. 685.º-C, n.ºs 5 e 6 do Código de Processo Civil.
Nº Convencional:JSTA000P22651
Nº do Documento:SA220171206085
Data de Entrada:01/26/2017
Recorrente:MINISTÉRIO PÚBLICO
Recorrido 1:AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA E PARQUE EÓLICO DO A...... LDA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em conferência, nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1 - RELATÓRIO

O Ministério Público, vem recorrer para este Supremo Tribunal da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou procedente a excepção da incompetência em razão do território e ordenou a remessa dos autos ao tribunal Administrativo e Fiscal de Braga.

Apresentou o seu pedido de recurso com manifestação de que atento o valor da causa de apenas 708,42 Euros, se fosse decidido que não era admissível recurso então subsidiariamente deverá ser admitida reclamação do despacho sindicado para o Sr. Presidente do TCA Norte (vide fls. 214).

O recurso foi admitido por despacho judicial para este STA a fls. 230.

Inconformado com o referido despacho que julgou procedente a excepção da incompetência em razão do território, apresentou as respectivas alegações que resumiu nas seguintes conclusões:

«1º - O despacho recorrido julgou este TAF do Porto territorialmente incompetente para julgar a presente Impugnação, e atribuiu-a ao TAF de Braga, por ser o Tribunal da área da situação dos bens, nos termos dos artigos 103 — n° 1 e 2, 12 — n° 1, ambos do CPTT e art.° 136 — n°1 do CIMI.
2° - Salvo o devido respeito, parece-nos que lhe não assistirá razão, já que resulta dos autos resulta que a liquidação foi efetuada ou, pelo menos notificada pelo SF do Porto — 4, pelo que a presunção legal da citada norma do art.° 136 — n° 1 do CIMI fica afastada ou ilidida, como se dispõe no art.° 350 — n° 2 do Código Civil.
3° - Ora, entendendo o Tribunal recorrido que o critério para fixação da competência territorial é o previsto no n° 1 do art.° 12 do CPPT, ou seja a sede do Tribunal da área do serviço periférico local onde se praticou o ato, então, com este fundamento, seria o TAF do Porto o competente para julgar a ação, pois que na sua área se situa SF do Porto - 4.
4º - Porém, parece-nos que a questão terá que ser apreciada noutra base argumentativa e em tese de que o critério para definição da competência territorial se acha plasmado no n°2 do art.° 12 do CPPT.
5° - Já realçamos que a liquidação foi pelo menos notificada pelo SF do Porto — 4, que os imóveis sobre os quais incidiu o IMI se situam em área territorial abrangida pelo TAF de Braga e que a Impugnante tem sede ou domicílio no Município do Porto, sendo questão com alguma importância saber quem procedeu à liquidação e parece-nos que esta se encontra solucionada pela norma do art.° 113 — n° 1 do CIMI, a qual dispõe que o imposto é liquidado anualmente pelos serviços centrais da DGI, atualmente ATA.
6° - E daí que, na mesma liquidação, que é notificada pelo SF do domicílio ou residência do SP, apareça atualmente o IMI de todos os prédios de cujo IMI seja o SP responsável, independentemente da área da situação dos imóveis.
7º - Ora, se são os serviços Centrais a proceder à liquidação, o critério para definição da competência territorial do TAF, encontra-se plasmado no n° 2 do art.° 12 do CPPT, em que se consagram princípios de competência cumulativa (sobre o tema, veja- se Jorge Lopes de Sousa, CPPT, nota 4 ao art.° 103 — II volume, 6ª edição, página 174).
8º - O elemento situação dos bens ou da transmissão, a par do critério do domicílio ou sede do contribuinte só terá relevância quando estivermos na presença de atos praticados por outros serviços da ATA (n° 2 do art.° 12 do CPPT), que são os previstos no n° 3 do art.° 6, do DL 433/99, de 26/10, ou seja, no caso concreto os Serviços Centrais do IMI, conforme se dispõe no art.° 113 — n° 1 do CIMI — veja-se Jorge Lopes de Sousa, CPPT, nota 6 ao art.° 12 — 1 volume, 6ª edição, página 165.
9º - Temos pois que o legislador fixou três critérios para definição da competência territorial do TAF e será o contribuinte a fazer a respetiva opção, na sequência doutras normas legais, que estabelecem idêntico critério — cf. art.° 61 — nº 4 da LGT, que dispõe que em caso de dúvida, é competente para o procedimento o órgão da administração tributária do domicílio fiscal do SP ou interessado — e veja-se Jorge Lopes de Sousa, CPPT, nota 4 ao art.º 103 — II volume, 6ª edição, página 174, transcrito no corpo desta alegação.
10º - E resulta claro dos autos a opção da autora, que até se opôs à procedência da exceção, pela competência territorial deste Tribunal, tendo por base o seu domicílio, sendo que deverá prevalecer a sua opção - veja-se mais uma vez Jorge Lopes de Sousa, CPPT, nota 3 ao art.° 73 — 1 volume, 6ª edição, página 655, que defende mais uma vez o critério da opção feita pelo contribuinte.
11º - Ou seja: sendo a liquidação ou ato tributário da responsabilidade dos Serviços Centrais do IMI e tendo a Impugnante feito a opção pelo Tribunal da área do seu domicílio ou sede, sita no Município do Porto, é o TAF do Porto o territorialmente competente para julgar a presente ação.
12° - Foram violados artigos 12 — n° 1 e 2, 103 — n° 1 e 2, ambos do CPPT, art.° 350 — n° 2 do CC e art.º 113 — n° 1 do CIMI.
Nestes termos, deve ser julgado procedente o recurso ou a reclamação, e anulado o despacho recorrido e substituído por outro que atribua a competência territorial a este TAF do Porto, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!»

Não foram apresentadas contra alegações.

O Ministério Publico, neste STA, não emitiu parecer devido à sua posição como recorrente,

2 - Fundamentação
O Tribunal “a quo” deu como provada a seguinte matéria de facto:
a) A dívida impugnada refere ao Imposto Municipal sobre Imóveis do ano de 2011, relativa aos imóveis inscritos na matriz predial urbana da freguesia de Ruivães, concelho de Vieira do Minho;
b) A petição inicial encontra-se dirigida ao Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto.
A decisão sob recurso tem o seguinte teor:
“A competência em razão do território contende com os limites de jurisdição de cada tribunal.
De acordo com o art. 12/1, do CPPT, é territorialmente competente para julgar um processo de impugnação o tribunal da área do serviço periférico local onde se praticou o acto objecto da impugnação.
Por sua vez, dispõe o art. 103/1, do CPPT que: “A petição é apresentada no tribunal tributário competente ou no serviço periférico local onde haja sido ou deva legalmente considerar-se praticado o acto”. O n.º 2, do mesmo preceito legal refere que: “Para os efeitos do número anterior, os actos tributários consideram-se sempre praticados na área do domicílio ou sede do contribuinte, da situação dos bens ou da liquidação.
A referência feita á área da situação dos bens reporta-se aos casos dos tributos que têm por base de incidência a relação com bens imóveis, como é o caso do IMI aqui em apreço.
Relativamente ao IMI, para efeitos de determinação do serviço de finanças competente, estabelece-se no art. 136/1, do CIMI que “Os actos tributários consideram-se praticados nos serviços de finanças da área da situação dos prédios.”
Ora, a presente impugnação tem por objecto as liquidações de IMI do ano de 2011, de prédios que se situam no concelho de Vieira do Minho, que pertence ao distrito de Braga.
O distrito de Braga pertence á área de jurisdição do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga.
DECISÃO.
Nestes termos, julga-se o Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto incompetente em razão do território e ordena-se a remessa dos autos ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga por ser o competente”.

DECIDINDO NESTE STA
Cumpre em primeiro lugar apreciar da admissibilidade do recurso na circunstância de o valor da causa estar compreendido na alçada do tribunal recorrido e de o mesmo recurso incidir sobre a decisão que julgou procedente a excepção de incompetência territorial suscitada pela Fazenda Pública.
Dispõe o artº Artigo 629.º do CPC (art.º 678.º CPC 1961) o seguinte:
Decisões que admitem recurso
1 - O recurso ordinário só é admissível quando a causa tenha valor superior à alçada do tribunal de que se recorre e a decisão impugnada seja desfavorável ao recorrente em valor superior a metade da alçada desse tribunal, atendendo-se, em caso de fundada dúvida acerca do valor da sucumbência, somente ao valor da causa.
2 - Independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admissível recurso:
a) Com fundamento na violação das regras de competência internacional, das regras de competência em razão da matéria ou da hierarquia, ou na ofensa de caso julgado;
b) Das decisões respeitantes ao valor da causa ou dos incidentes, com o fundamento de que o seu valor excede a alçada do tribunal de que se recorre;
c) Das decisões proferidas, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, contra jurisprudência uniformizada do Supremo Tribunal de Justiça;
d) Do acórdão da Relação que esteja em contradição com outro, dessa ou de diferente Relação, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, e do qual não caiba recurso ordinário por motivo estranho à alçada do tribunal, salvo se tiver sido proferido acórdão de uniformização de jurisprudência com ele conforme.
3 - Independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admissível recurso para a Relação:
a) Nas ações em que se aprecie a validade, a subsistência ou a cessação de contratos de arrendamento, com exceção dos arrendamentos para habitação não permanente ou para fins especiais transitórios;
b) Das decisões respeitantes ao valor da causa nos procedimentos cautelares, com o fundamento de que o seu valor excede a alçada do tribunal de que se recorre;
c) Das decisões de indeferimento liminar da petição de ação ou do requerimento inicial de procedimento cautelar.

E, por sua vez dispõe o artº 280 do CPPT:
Recursos das decisões proferidas em processos judiciais
1 - Das decisões dos tribunais tributários de 1.ª instância cabe recurso, no prazo de 10 dias, a interpor pelo impugnante, recorrente, executado, oponente ou embargante, pelo Ministério Público, pelo representante da Fazenda Pública e por qualquer outro interveniente que no processo fique vencido, para o Tribunal Central Administrativo, salvo quando a matéria for exclusivamente de direito, caso em que cabe recurso, dentro do mesmo prazo, para a Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo.
2 - Das decisões do Tribunal Central Administrativo cabe recurso, com base em oposição de acórdãos, nos termos das normas sobre organização e funcionamento dos tribunais administrativos e tributários, para o Supremo Tribunal Administrativo.
3 - Considera-se vencida, para efeitos da interposição do recurso jurisdicional, a parte que não obteve plena satisfação dos seus interesses na causa.
4 - Não cabe recurso das decisões dos tribunais tributários de 1.ª instância proferidas em processo de impugnação judicial ou de execução fiscal quando o valor da causa não ultrapassar o valor da alçada fixada para os tribunais tributários de 1.ª instância.
5 - A existência de alçadas não prejudica o direito ao recurso para o Supremo Tribunal Administrativo de decisões que perfilhem solução oposta relativamente ao mesmo fundamento de direito e na ausência substancial de regulamentação jurídica, com mais de três sentenças do mesmo ou outro tribunal de igual grau ou com uma decisão de tribunal de hierarquia superior.

Perante este quadro normativo é manifesto que a decisão questionada relativa a incompetência territorial não admite recurso para este STA. Não só foi proferida no âmbito de uma acção cujo valor não excede a alçada do tribunal que a proferiu como não integra o elenco das matérias excepcionadas pelo nº 2 al. a) do artigo 629.º do CPC (sendo este preceito aplicável ex-vi do artº 2º al. f) do CPPT).
Não obstante ter sido proferido despacho admitindo o recurso, (a fls. 230 dos autos), tal decisão não impede ou desobriga o Tribunal de recurso de a apreciar por atenção ao art. 685.º-C, n.ºs 5 e 6 do Código de Processo Civil – CPC onde se prescreve:
“5 - A decisão que admita o recurso, fixe a sua espécie e determine o efeito que lhe compete não vincula o tribunal superior nem pode ser impugnada pelas partes, salvo na situação prevista no n.º 3 do artigo 306.º.
6 - A decisão que não admita o recurso ou retenha a sua subida apenas pode ser impugnada através da reclamação prevista no artigo 643.º.

Devemos pois considerar os preceitos, já destacados e, ainda, o teor do artigo 288.º do CPPT que dispõe:
Conclusão ao relator. Conhecimento de questões prévias
1 - Feita a distribuição, serão os autos conclusos ao relator que poderá ordenar se proceda a qualquer diligência ou se colha informação do tribunal recorrido ou de alguma autoridade.
2 - O relator não conhecerá do recurso se entender que lhe faltam manifestamente os respectivos pressupostos processuais.
3 - Do despacho do relator referido no número anterior é admitida reclamação para a conferência.

Aqui chegados dúvidas não restam de que o recurso não poderá prosseguir neste STA.
4- DECISÃO:
Termos em que, face ao exposto, acordam os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do STA, em não admitir o recurso.
Os autos baixarão à primeira instância para decisão sobre o que foi requerido a título subsidiário a fls. 214 e 215.
Sem custas por delas estar isento o recorrente Ministério Público.

Lisboa, 6 de Dezembro de 2017. - Ascensão Lopes (relator) - Ana Paula Lobo - Casimiro Gonçalves.