Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01528/13
Data do Acordão:02/12/2014
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ISABEL MARQUES DA SILVA
Descritores:EXECUÇÃO DE JULGADO
TEMPESTIVIDADE
REMESSA DO PROCESSO À AUTORIDADE ADMINISTRATIVA
Sumário:I - O dever de cumprir espontaneamente o julgado tributário surge com o trânsito em julgado deste e não com a remessa do processo ao órgão competente para a execução.
II - Se o requerimento de execução de julgado anulatório deu entrada no Tribunal decorridos mais de três meses sobre a data em que presumivelmente o trânsito em julgado da sentença exequenda se verificou não pode concluir-se ter sido prematuramente apresentado.
III - O interessado dispõe de mera faculdade, que não do dever, de requerer a remessa dos autos ao órgão da administração competente para a execução da decisão judicial tributária.
IV - Se o facto de não ter em seu poder o processo físico dificulta o cumprimento por parte da Administração tributária do seu dever de cumprir o julgado, caberá ao Representante da Fazenda Pública procurar superar essa dificuldade (artigo 15.º n.º 1, alínea a) e n.º 2 do CPPT), designadamente requerendo ao Tribunal a devolução do processo ao órgão competente para a execução ou solicitando os elementos tidos como necessários para cabal cumprimento do julgado.
Nº Convencional:JSTA00068592
Nº do Documento:SA22014021201528
Data de Entrada:10/03/2013
Recorrente:A............, LDA
Recorrido 1:AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF PORTO DE 2013/02/26
Decisão:PROVIDO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC JULGADO
Legislação Nacional:CPTA ART173 N1 ART162.
CPPT ART146.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC073/09 DE 2009/06/17; AC STA PROC0570/08 DE 2008/12/03; AC STA PROC0983/08 DE 2009/03/19
Referência a Doutrina:RUI DUARTE MORAIS - MANUAL DO PROCEDIMENTO E PROCESSO TRIBUTÁRIO COIMBRA ALMEDINA 2012 PAG330.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- Relatório-
1 – A…………, S.A., com os sinais dos autos, recorre para este Supremo Tribunal da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto (Equipa extraordinária), de 26 de Fevereiro de 2013, que julgou procedente a excepção de caducidade do direito de deduzir a execução de julgados, absolvendo da instância a Fazenda Pública, no apenso para execução de julgado anulatório de acto administrativo proferido no processo n.º 2510/11.5BEPRT.

A recorrente termina as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:

i. Está em causa nos autos a execução de uma sentença proferida pelo tribunal de 1.ª instância, que anulou o despacho de indeferimento de fiança como garantia idónea para suspensão do processo de execução fiscal – pelo que a execução do julgado deverá reger-se pelo estipulado nos termos do artigo 173.º n.º 1 do CPTA, e não pelo artigo 162.º sgs. do CPTA, como pretendido pelo tribunal “a quo”.
ii. Por força da tutela judicial no processo de execução fiscal, surgindo um diferendo entre a AF e o Contribuinte e sendo esse diferendo resolvido a favor deste último, a AF tem de conformar-se com o judicialmente exigido, retirando todas as consequências dessa anulação – mormente registando a suspensão da execução com a prestação da garantia judicialmente considerada como idónea.
iii. Com efeito, «Na execução de julgado anulatório, a AT deve reconstituir a situação que existiria se a ilegalidade que determinou a anulação não tivesse ocorrido, não lhe bastando repor a situação anterior ao cometimento daquela ilegalidade.» (Ac. TCAS, de 30.03.2004, dado no proc. n.º 00889/03).
iv. É essa, aliás, a recente posição deste Supremo Tribunal (Cfr. Ac. do STA de 14.03.2013, dado no proc. n.º 108/13): « (…) a anulação do acto tem implícita a aceitação da garantia (…) e a suspensão do processo de execução fiscal, a determinar pela administração tributária (…)».
v. Salvo o devido respeito, não vislumbra a Recorrente como possa o preceituado no n.º 2 do artigo 146.º do CPPT sobrestar ao dever da AT executar a sentença de anulação do acto administrativo julgado ilegal – configurando um claro erro de julgamento da matéria de direito, o entendimento do tribunal ”a quo” segundo o qual o pedido de remessa do processo judicial para o órgão de execução fiscal constitui uma condição para o dever de execução (tempestiva) e espontânea do julgado anulatório.
vi. Ao contrário do que parece entender o Tribunal “a quo”, o interessado na execução da sentença não está obrigado a pedir a remessa dos autos à AT, para execução espontânea, não podendo (nem devendo) ser-lhe imputadas as consequências resultantes da inexecução espontânea e tempestiva do julgado anulatório.
vii. Aliás, atendendo ao dever consagrado nos termos do artigo 100.º da LGT, fica a AT obrigada, a partir do trânsito em julgado da sentença, a proceder à imediata e plena reconstituição da legalidade do acto ou situação objecto de litígio, não sendo obrigatório o requerimento da remessa do processo para que essa realização espontânea se realize.
viii. Esta posição é, de resto, reforçada por este Supremo Tribunal: “A obrigação da administração tributária de executar os julgados surge imediatamente com o trânsito em julgado da decisão judicial e não com a remessa, a requerimento do contribuinte, do processo para o serviço competente para a execução, sem prejuízo de ao mesmo ser concedido, no prazo de oito dias, a faculdade de requerer a remessa dos autos ao serviço de finanças competente no prazo de oito dias após o trânsito em julgado da decisão (artigo 146º, nº 2 do Código de Procedimento e Processo Tributário).” (Ac. do STA de 09.05.2012, dado no proc. n.º 01015/11 nosso realce e realce).
ix. A obrigação de prover pelo cumprimento voluntário e tempestivo do julgado anulatório conhecimento deve, desde logo, recair sobre o representante da Fazenda Pública, na medida em que lhe compete representar a administração tributária nos processos de execução fiscal (artigo 15º nº 1 al. a) do CPPT) – sendo que, no exercício das suas competências, deve promover o rápido andamento do processo, solicitando aos serviços da administração tributária as diligências necessárias (artigo 15º nº 2 do CPPT).
x. Aliás, como resulta da nossa melhor doutrina (Ibidem), e bem assim, nos termos da Jurisprudência deste Supremo tribunal (Ac. do STA de 03.12.2008, dado no proc. n.º 0570ª/08, destaque nosso) “(…) o referido nº 2 do artigo 146º do CPPT, na parte referente em que condiciona o dever de execução de julgados a pedido do interessado e em que difere o momento da contagem do prazo, será organicamente inconstitucional, se entendido como criando um período posterior ao trânsito em julgado em que não há dever de executar, um período durante o qual a administração tributária não suporta as consequências de ter praticado um acto ilegal.”
xi. Ao decidir como decidiu, o Tribunal “a quo” não teve em conta a supremacia do dever de execução de uma sentença judicial, legal e constitucionalmente consagrado, e bem assim, o direito de o contribuinte ver executada, de forma imediata e plena, a sentença de anulação de um acto tributário julgado ilegal por parte da entidade administrativa obrigada – tendo conferido (indevidamente) relevância apenas um formalismo emanado por uma norma de carácter processual.
xii. Estabelece o artigo 21º a) do CPPT, relativo aos prazos dos actos a praticar nos processos judiciais, que os despachos que não sejam de mero expediente devem ser proferidos no prazo de 10 dias – sendo que, nos termos do artigo 103º n.º 1 da LGT, o processo executivo tem natureza judicial.
xiii. O prazo de execução de julgado anulatório, de três meses, previsto no artigo 175.º n.º 3 do CPTA, quando muito, seria compatível com o prazo previsto no artigo 58.º do CPA para a conclusão do procedimento administrativo, mas afigura-se excessivo e desconexo com o referido prazo de 10 dias previsto para a emissão de despachos no processo de execução fiscal.
xiv. Não é minimamente razoável admitir que, por via da execução espontânea de uma decisão judicial, a AT venha a ter um prazo (três meses) muito superior ao que tinha inicialmente para proferir o mesmo despacho (10 dias).
xv. Também por aqui se conclui pela tempestividade da execução de julgados, e pelo erro de julgamento da matéria de direito – a impor a revogação da sentença recorrida.
NESTES TERMOS e nos melhores de direito, deve conceder-se provimento ao presente recurso, revogando-se a decisão recorrida, o que se deverá fazer por obediência à Lei e por imperativo de JUSTIÇA!

2 – Contra-alegou a recorrida, concluindo nos seguintes termos:

1. O órgão de execução fiscal procedeu ao envio do processo de execução fiscal onde o despacho, em cumprimento do julgado, teria de vir a ser proferido, para o Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto em 5.08.2011, através do ofício n.º 11073.

2. Até meados de Julho, mais exactamente até 10.07.2012, o processo ainda não tinha sido devolvido, mantendo-se tal situação à data da interposição da presente execução de julgados.

3. Estabelece o art. 146.º, nº 2 do CPPT em vigor, que:

4. “2 – O prazo de execução espontânea das sentenças e acórdãos dos tribunais tributários conta-se a partir da data em que o processo tiver sido remetido ao órgão da administração tributária competente para a execução, podendo o interessado requerer a remessa no prazo de 8 dias após o trânsito em julgado da decisão.

5. A requerente e ora recorrente, uma vez a reclamação de actos do chefe transitada em julgado, poderia ter solicitado a baixa do processo de execução onde a mesma foi apreciada como incidente, para execução de sentença no prazo indicado no normativo transcrito, o que não fez.

6. Aplicando o normativo em apreço à questão “sub judice”, e estando em causa não uma execução para pagamento de quantia certa, mas sim a prática de um acto pelo órgão de execução fiscal, traduzido no proferimento de um novo despacho no processo, onde proceda à reapreciação da idoneidade da garantia em cumprimento do julgado, obviamente que é pressuposto para a respectiva concretização o acesso físico pelo órgão de execução fiscal ao processo onde tinha que proferir o novo despacho.

7. O que não sucedia até à data acima indicada, nada constando no sentido de que o processo já tivesse baixado ao serviço de finanças, com vista a tal finalidade.

8. Pelo que, até ao momento, no mínimo, da interposição da execução de julgados existia uma impossibilidade objectiva, física mesmo, de execução do julgado, considerando-se que esta se traduz na prolação do despacho de reapreciação de garantia, tendo em conta que o processo não tinha sido enviado ao serviço de finanças, nem tinha sido solicitada a sua remessa nos termos do art. 146.º, n.º 2 do CPPT.

9. Tal como se observa na douta sentença recorrida, citando Jorge L. Sousa, obra e págs mencionados (III vol, pág. 527), “Na verdade está subjacente a esta norma (n.º 2 do art. 146.º do CPPT) o entendimento legislativo de que só com o processo em seu poder a administração tributária estará em condições de dar execução ao decidido, pelo que seria incongruente considerar iniciado a contagem do prazo de execução antes do momento em que esta recebe o processo”.

10. Face ao preceito do CPPT atrás transcrito e à situação descrita, estando em causa a execução de julgado de um acto anulatório em matéria tributária cujo objecto não se traduz numa obrigação de pagamento de quantia certa, o prazo para a execução, tal como vem estabelecido no art. 175º, nº 1 do CPTA, ainda não tinha decorrido à data da apresentação da petição de execução de julgados.

11. Sendo tal asserção igualmente válida para o caso de se entender como aplicável ao objecto do julgado sub judice o art. 162.º do CPTA, em conjugação com o art. 146º nº 2 do CPPT, tal como entendeu a douta sentença recorrida.

12. Em qualquer das situações, ainda não tinha decorrido o prazo de execução espontânea da sentença objecto da presente execução de julgados.

13. Pelo que bem andou a douta sentença recorrida de 26.02.2013, quando julgou provada e procedente a excepção de caducidade do direito de deduzir a execução de julgados, considerando que a mesma era extemporânea por não ter decorrido o prazo de execução espontânea da sentença de anulação do acto praticado pelo órgão de execução fiscal.

Nestes termos e nos demais de direito deverá manter-se a douta sentença recorrida uma vez que a mesma fez uma correcta interpretação e aplicação da lei aos factos, não padecendo de qualquer vício ou irregularidade e, em consequência, ser julgado improcedente o recurso interposto.

3 – O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu o parecer de fls. 344 a 346, concluindo no sentido de que o recurso deve ser julgado improcedente e confirmar-se a sentença recorrida, na parte da absolvição da instância da Fazenda Pública, mas com fundamento na extemporaneidade da acção e impropriedade do meio processual (e não caducidade do direito de acção, como ali se deixou exarado).

Notificadas as partes do parecer do Ministério Público, veio a recorrente responder, nos termos de fls. 352 a 366, pugnando por que o processo de execução de julgados é o meio próprio para coagir judicialmente a AT a cumprir e retirar todas as consequências de uma decisão judicial anulatória e pela improcedência das excepções invocadas no parecer do Ministério Público.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
- Fundamentação -
4 – Questão a decidir

É a de saber se, como decidido, foi extemporaneamente deduzido o requerimento de execução do julgado tributário.

5 – Matéria de facto

Na decisão objecto do presente recurso foram dados como provados os seguintes factos:

1. Através do ofício n.º 11073, datado de 05.08.2011, o órgão de execução fiscal, Serviço de Finanças da Maia, remeteu a este Tribunal a reclamação de atos do órgão de execução fiscal, referente ao reclamante A…………, S.A. e processo de execução fiscal (fls. 1 do processo 2510/11.5 BEPRT, de que os presentes autos são apensos);
2. Em 21.10.2011, foi proferida sentença, a qual deu provimento à reclamação anulando o ato reclamado, conforme consta de fls. 148 a 166 do processo n.º 2510/11.5 BEPRT;
3. A representante da Fazenda Pública interpôs recurso para o STA, o qual por acórdão de 05.01.2012, julgou incompetente, em razão da hierarquia, para conhecer o recurso jurisdicional (fls. 293 a 297 do processo 2510/11.5 BEPRT);
4. Em 30.01.2012, foi o processo remetido pelo STA, a este Tribunal (fls. 302 do processo 2510/11.5 BEPRT);
5. Em 24.05.2012 a Fazenda Pública procedeu ao pagamento da conta (fls. 310 do processo 2510/11.5 BEPRT);
6. Em 18.04.2012, veio o exequente requerer a emissão de certidão da sentença com data de prolação de 21.10.2011, proferida no processo, e a respectiva data do trânsito em julgado a qual foi emitida em 24.04.2012 (fls. 312 e 313 do processo 2510/11.5 BEPRT).
7. Em 05.06.2012 foram os autos em visto em fiscalização e em 08.06.2012 em visto em correição (fls. 317 do processo 2510/11.5BEPRT);
8. Em 28.05.2012, pela exequente foi apresentada a petição de execução fiscal

6 – Apreciando.
6.1 Da extemporaneidade da execução do julgado

A sentença recorrida, a fls. 263 e 264 dos autos, julgou provada e procedente a exceção de caducidade do direito de deduzir a execução de julgados, absolvendo da instância a Fazenda Pública, no entendimento de que resulta da conjugação do art. 146.º, n.º 2 do CPPT e art. 162.º, n.º 2 do CPTA, que as sentenças dos tribunais administrativos que condenem a administração à prestação de facto devem ser espontaneamente executadas pela própria administração no prazo máximo de três meses, salvo a ocorrência de causa de inexecução, após a remessa do processo ao órgão de execução fiscal e que, não tendo a ora exequente requerido a remessa dos autos ao órgão de execução fiscal e encontrando-se o processo ainda no tribunal, ainda não tinha decorrido o prazo de execução espontânea da sentença proferida, pelo que, não tendo em 29.05.2012, data da apresentação da presente execução, sido remetidos ao órgão de execução fiscal o processo é extemporânea a execução de julgados (cfr. decisão recorrida, a fls. 264, frente e verso, dos autos).

Discorda do decidido a recorrente, alegando que se está perante a execução de um julgado anulatório (de um despacho de indeferimento de aceitação de fiança como garantia idónea para suspender a execução) e não perante execução de uma sentença que condene a administração a prestação de facto, pelo que é aplicável à execução do julgado o disposto no n.º 1 do artigo 173.º do CPTA e não os artigos 162.º e seguintes do CPTA, como decidido, que o dever de execução espontânea da sentença surge com o trânsito em julgado da mesma, e não com a remessa do processo ao órgão de execução, tendo o interessado uma mera faculdade, que não um dever, de requerer tal remessa e que o cumprimento da sentença implica que a AF tem de conformar-se com o judicialmente exigido, retirando todas as consequências dessa anulação – mormente registando a suspensão da execução com a prestação da garantia judicialmente considerada como idónea, sendo excessivo e irrazoável que a Administração possa dispor de um prazo de 3 meses para cumprimento espontâneo do julgado, quando o acto devia, em regra, ser praticado no prazo de 10 dias. Pugna, a final, pela tempestividade do pedido de execução de julgado por si formulado.

A recorrida contra-alegou defendendo a manutenção do julgado recorrido, entendendo o Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste Supremo Tribunal que deve confirmar-se a decisão recorrida no que respeita à absolvição da instância da Fazenda Pública, embora com fundamento na extemporaneidade da acção e impropriedade do meio processual, porquanto entende que sem o processo físico estava a Administração impossibilitada de cumprir o julgado.

Vejamos.

A sentença cuja execução é requerida nos autos de execução de julgado que estão na origem do presente recurso - no qual se requer a revogação da decisão que julgou caducado o direito de requerer a execução de julgado, por à data da sua interposição o processo não ter ainda sido remetido ao órgão de execução fiscal - foi proferida em 21.10.2011 (cfr. o n.º 2 do probatório fixado) e nela se julgou procedente a reclamação deduzida contra o despacho do Chefe do Serviço de Finanças da Maia 1 que indeferiu à ora recorrente a prestação de garantia para suspender a execução através de fiança prestada pela Sociedade B…………, S.A., e, em consequência, se anulou o acto reclamado, para que outro seja proferido em conformidade com o vertido supra (cfr. sentença exequenda, a fls. 166 do respectivo processo).
Da sentença exequenda foi interposto recurso para este STA, que se veio a julgar incompetente em razão da hierarquia para o seu conhecimento e competente o TCA-Norte em 05.01.2012 (cfr. o n.º 3 do probatório fixado e o Despacho do Relator de fls. 293/297 dos autos do processo principal). Não tendo a recorrente Fazenda Pública requerido a remessa dos autos ao Tribunal julgado competente, foi o processo remetido, a título definitivo, ao TAF do Porto em 30/01/2012 (cfr. o n.º 4 do probatório fixado e o termo de remessa de fls. 302 daqueles autos), tendo registo de entrada nesse Tribunal em 31 de Janeiro de 2012 (cfr. fls. 302, verso, dos autos do processo principal).

Sendo certo que a decisão ora recorrida não fixou, como devia, a data do trânsito em julgado da sentença exequenda - pois que se lhe impunha fixar os factos relevantes segundo as diversas soluções plausíveis da questão de direito, sendo obviamente relevante, designadamente em face da jurisprudência pacífica deste STA quanto ao termo inicial de contagem do prazo para execução espontânea dos julgados tributários, que fixasse a data do trânsito em julgado da sentença exequenda -, e sendo igualmente certo que a data constante da certidão do TAF do Porto de fls. 313 do processo principal não se afigura conforme à realidade dos factos (pois que dela consta como data do trânsito em julgado da sentença exequenda o dia 7/11/2011 quando nessa data estava dela pendente recurso no STA), não é menos certo que o trânsito em julgado da sentença exequenda terá necessariamente ocorrido em data anterior à da remessa daqueles autos do STA para o TAF do Porto, ou seja, em data anterior a 30 de Janeiro de 2012, pelo que, pelo menos a partir dessa data, começou a correr o prazo para execução espontânea do julgado tributário, que, como é jurisprudência pacífica deste STA e decorre do artigo 100.º da Lei Geral Tributária (em conformidade com o n.º 2 do artigo 205.º da Constituição da República), se conta do trânsito em julgado da decisão e não da remessa do processo ao órgão da administração tributária competente para a execução, como pretende, mas em termos reiteradamente julgados contrários à Lei Fundamental, o n.º 2 do artigo 146.º do CPPT.
Segundo RUI DUARTE MORAIS (Manual de Procedimento e Processo Tributário, Coimbra, almedina, 2012, nota 672 de p. 330) o n.º 2 do artigo 146.º do CPPT terá tentado resolver, na perspectiva da administração fiscal, um problema resultante da descoordenação entre os seus vários serviços. Sendo o representante da Fazenda Pública notificado da sentença (sabendo, portanto, quando esta transitou em julgado), caber-lhe-ia informar o órgão competente para lhe dar execução espontânea. O que, pelos vistos, não acontece. Ora, como diz o mesmo autor (op. cit., p. 330) a efetivação dos direitos dos contribuintes, reconhecidos por sentença judicial transitada em julgado não pode ficar dependente da “inércia discricionária” das secretarias judiciais ou de se entender que o interessado teria a obrigação de, em oito dias, requerer a remessa à administração fiscal. A “conveniência dos serviços” não é razão ponderosa bastante para que se protele o termo inicial do dever de cumprimento do julgado ou que se o faça depender de requerimento do contribuinte, porquanto a obrigatoriedade de acatamento da decisão judicial transitada decorre directa e imediatamente da própria Lei Fundamental (cfr. o n.º 2 do artigo 205.º da Constituição).

Ora, se o trânsito em julgado da decisão exequenda ocorreu em data necessariamente anterior a 30 de Janeiro de 2012 e o requerimento a pedir a respectiva execução deu entrada no TAF do Porto em 28.05.2012, sendo manifesto que entre estas datas decorreram mais de três meses – prazo máximo concedido à Administração para cumprir espontaneamente o julgado anulatório que não consista no pagamento de quantia certa, antes de se admitir que se requeira ao Tribunal a sua execução forçada (cfr. o n.º 1 do artigo 175.º do CPTA) – manifesto é que, ao contrário do decidido, não foi prematuramente deduzido o pedido de execução de julgado anulatório, não podendo manter-se a decisão recorrida que isso mesmo decidiu.

A circunstância de o processo não ter sido ainda devolvido ao órgão de execução fiscal ou de o interessado não ter requerido a sua remessa não são, contrariamente ao decidido, razões que obstem a que o dever de cumprimento espontâneo tenha surgido com o trânsito em julgado da decisão, pois que, uma vez transitadas, as decisões são de imediata execução obrigatória, não dependendo de qualquer requerimento do interessado. - cfr., neste sentido, os Acórdãos 17.06.2009, recurso 73/09, de 3.12. 2008, rec. n.º 570A/08 (do Pleno) e de 19.03.2009, rec. n.º 983/08 todos in www.dgsi.pt. e se o facto de não ter em seu poder o processo físico dificultava o cumprimento por parte da Administração do seu dever de cumprir o julgado caberia, como bem alegado, ao Representante da Fazenda Pública procurar superar essas dificuldades (artigo 15.º n.º 1, alínea a) e n.º 2 do CPPT), designadamente requerendo ao Tribunal a devolução do processo ao órgão competente para a execução ou solicitando os elementos tidos como necessários para cabal cumprimento do julgado, se a notificação da decisão exequenda se lhe afigurasse insuficiente. Se fica, ao invés, a aguardar passivamente que o processo lhe chegue – remetido pelo Tribunal oficiosamente ou a requerimento do interessado – para cumprir voluntariamente as decisões dos tribunais - que são obrigatórias (artigo 205.º n.º 2 da Constituição), pode ver-se, sem necessidade, judicialmente compelido a ter de as cumprir.

Pelo exposto se conclui que o recurso merece provimento, sendo de revogar a sentença recorrida que julgou verificada a caducidade do direito de deduzir a execução de julgado, o que não se verifica, baixando os autos ao tribunal “a quo” para que prossigam, se a tal nada mais obstar.

- Decisão -
7 - Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, em conceder provimento ao recurso, revogar a decisão recorrida, baixando os autos ao tribunal “a quo” para que prossigam, se a tal nada mais obstar.

Custas pela recorrida.

Lisboa, 12 de Fevereiro de 2014. - Isabel Marques da Silva (relatora) - Pedro Delgado - Ascensão Lopes.